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Aborto, a realidade do dia a dia em Angola

abril 11, 2017

 João Marcos

Debate sobre aborto continua

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Mãe de rapariga que abortou em Benguela responde a processo judicial

Uma adolescente de 15 anos de idade vai enfrentar um processo na Procuradoria-geral


da República (PGR), em Benguela, devido à prática do aborto.

A recuperar de complicações no Hospital Municipal, a menina terá sido obrigada a


interromper a gravidez pela própria mãe, que chegou a ser detida pela polícia angolana.

Trata-se de um caso que agita a sociedade numa altura em que se discutem os prós e os
contras de eventuais mexidas no Código Penal.

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Aborto, a realidade do dia a dia em Angola - 2:11

by VOA
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Em clínicas, postos de saúde e casas de profissionais de enfermagem, longe dos olhares
dos Serviços de Investigação Criminal (SIC), o aborto é uma prática incontornável.

Na verdade, nada que não se soubesse.

É tão visível quanto o debate em torno do assunto, que já deu lugar a manifestações,
pelo que o caso da menina, levantado na Rádio Benguela, ganha mais relevância.

Inimputável, já que menor de idade, ela vai enfrentar um processo no quadro da


prevenção do crime juvenil, conforme apurou a VOA.

A adolescente diz que teve de desembolsar 15 mil kwanzas, quase 100 dólares ao
câmbio oficial, e que não conhece o enfermeiro a quem a mãe terá confiado o trabalho.

"Estou a me sentir muito mal, já não consigo mais fazer nada. A minha mãe disse para
tirar porque o moço é mais velho’’, explica a rapariga.

Uma fonte do Hospital de Benguela revelou que situações do género são frequentes na
maior unidade hospitalar da província, que recebe raparigas que se limitam a ingerir
comprimidos, ignorando a curetagem (raspagem).

Agora a contas com a PGR, após ter ficado em prisão preventiva durante algumas horas,
a cidadã Rosalina Teresa, mãe da menina, indicou que o pai tem idade muito superior à
da sua filha.

Independentemente das razões, o bispo da Diocese de Benguela, Dom Eugénio Dal


Corso, não quer ouvir falar em descriminalização, uma vez que o aborto colide com os
mandamentos de Deus

"Em Angola quer-se despenalizar porque a razão última é diminuir a natalidade. Fiquei
surpreso quando soube da manifestação. O que se passa é que os países chamados
desenvolvidos, que às vezes nem são, acham que os outros, que eles chamam de menos
desenvolvidos, não devem crescer’’, salienta o bispo, apoiado em princípios bíblicos.

Uma posição pessoal manifestada antes de a Associação dos Médicos de Angola ter
repudiado a lei que proíbe na totalidade o aborto, através da revisão do Código Penal,
salientando que a mesma levaria à perda de vidas humanas de forma desnecessária e
irresponsável.

Em comunicado, lembra que as excepções previstas na lei devem manter-se, tendo em


conta aspectos como o risco de vida da mãe, inviabilidade do feto e violações que
resultem em gravidez.
A SITUAÇÃO DO ABORTO EM ANGOLA
Segundo os dados disponíveis a nível global, a cada 9 minutos morre uma mulher
em consequência de complicações de um aborto clandestino. A maioria destas
mulheres são de países mais pobres, nomeadamente de países africanos. É por
isso que a OMS e as Nações Unidas consideram que o aborto clandestino e
inseguro é um problema de saúde pública.
A penalização e criminalização do aborto não impede nem faz diminuir o número
de abortos, antes promove o aborto clandestino e inseguro, aumentando a
mortalidade e a morbilidade maternas. Isto aconteceu em Portugal e acontece em
todos os países que restringem o acesso aos cuidados de aborto legal e seguro.
Tal situação é particularmente gravosa nos países em que a pobreza e a
desigualdade social tornam mais difícil o acesso aos cuidados de saúde e,
especificamente, aos cuidados de saúde sexual e reprodutiva.
Por tudo isto, um crescente número de países, em todo o mundo, tem
progressivamente optado por mudanças legislativas que despenalizam e/ou
descriminalizam o aborto, permitindo que as mulheres que estão face a uma
gravidez não desejada, a possam interromper em serviços apropriados em
condições de segurança e dignidade, e com o consequente acompanhamento
profissional, em particular, no domínio do planeamento familiar.
A avaliação da despenalização do aborto em Portugal revelou importantes ganhos
em saúde, tais como o desaparecimento das mortes maternas associados ao
aborto, e uma redução muito significativa de todas as complicações pós-aborto
que existiam antes da mudança da lei.
A APF considera, por isso, que a recente aprovação, pela Assembleia Nacional de
Angola, da nova Lei do Código Penal, que penaliza com prisão de quatro a dez
anos a prática do aborto no país, constitui um enorme retrocesso, e considera
também que, tendo em conta a situação de enorme crise social vivida em Angola,
esta legislação irá seguramente repercutir-se num aumento de mortes maternas e
outras consequências nefastas para a saúde das mulheres angolanas.
A APF manifesta por isso a sua indignação e, simultaneamente, a sua
solidariedade com os movimentos e organizações angolanas que lutam pela
despenalização e descriminalização do aborto e pela promoção dos direitos e da
saúde sexual e reprodutiva.
Lisboa, 21 de março de 2017
A Direção Nacional

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