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Convención Internacional de Salud, Cuba Salud 2018

Saúde Mental, Retrocessos e Impasses: desafios para a Reforma Psiquiátrica


Brasileira.
Pereira, Mendes, Danúbiah1
Amarante, Duarte, Paulo2
1 FIOCRUZ/EPSJV, Rio de Janeiro, Brasil, danubiah.mendes@hotmail.com
2 FIOCRUZ/ENSP, Rio de Janeiro, Brasil, pauloamarante@gmail.com

Resumo: Esta pesquisa apresenta uma revisão bibliográfica da atual conjuntura da Saúde Mental no
Brasil, sob a ótica que reflete a privatização, a internação compulsória e as comunidades terapêuticas
como impasses e retrocesso para a Reforma Psiquiátrica Brasileira/RPB. Partimos das discussões de
autores do campo da Saúde e da Saúde Mental que fomentam a presença de retrocessos e de impasses
no contexto da RPB e do SUS ao articular com as temáticas da privatização, da internação compulsória
e das comunidades terapêuticas. Nosso objetivo traz como proposta a compreensão da atual conjuntura
da RPB através da análise das categorias impasses e retrocessos e sua relação com as temáticas acima
citadas. O desenho metodológico inclui na primeira etapa a revisão bibliográfica de artigos da base de
dados Scielo, com a combinação dos descritores: RPB, Saúde Mental, Impasses e Retrocessos, totali-
zando amostra de 24 artigos. Para a fundamentação do campo teórico da RPB utilizamos livros e artigos
de autores do campo da Saúde e, da Saúde Mental; na segunda etapa realizamos a análise documental
para a seleção destes artigos e na terceira etapa análise de conteúdo temática, momento em que articu-
lamos a fundamentação teórica para relacionar as categorias com as temáticas. Os resultados contextu-
alizam avanços e aponta a presença da articulação das categorias impasses com a privatização da saú-
de e com a baixa implantação de serviços e dispositivos de base territorial, e como retrocessos
práticas que retomam ao modelo manicomial vista na internação compulsória e nas comunidades
terapêuticas.
Palavras-chave: Reforma Psiquiátrica Brasileira, Saúde Mental, Retrocessos, Privatização.
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I. INTRODUÇÃO
Esta pesquisa de caráter bibliográfico teve como proposta fomentar a discussão sobre a atual conjun-
tura da Reforma Psiquiátrica Brasileira diante das categorias retrocessos e impasses. Partimos da leitu-
ra crítica do atual cenário da Saúde Pública no Brasil, em especial, da Saúde Mental, fundamentada pela
fala de autores que contribuíram para o levantamento de questões e profundas reflexões sobre a atual
conjuntura da Reforma Psiquiátrica no Brasil. Diante deste cenário de impasses e retrocessos que iden-
tificamos através de teóricos do campo da Saúde como Emerson Merhy (6) e da Saúde Mental o autor
Paulo Amarante (1); (2); (3) e (4) apresentaremos junto com os artigos encontrados na base de dados
Scielo, a articulação teórica entre as categorias retrocessos e impasses com as temáticas identificadas
na concepção desta pesquisa, sendo estas: o incentivo a privatização dos serviços de saúde, a internação
compulsória e as comunidades terapêuticas.
A configuração deste cenário se contrapõe a proposta da Reforma Psiquiátrica Brasileira/RPB que
teceu ruptura contra o modelo manicomial do século XX, através dos movimentos sociais, de lutas e
denúncias. É importante ressaltarmos que a RPB traz como marco histórico na década de 1970 o con-
texto de denúncias, denúncias estas feitas pelos próprios funcionários do hospital psiquiátrico diante da
precariedade do serviço prestado aos pacientes psiquiátricos, com uso do isolamento como possibilidade
de tratamento, excluindo-o da sociedade e confinando “[...] centenas de pessoas nuas, imundas, fétidas.
Imagem e odor do abandono, do descaso, da miséria e da solidão” apontado pelo militante da luta
antimanicomial Paulo Amarante (1).
O psiquiatra e militante da RPB Paulo Amarante junto com outros dois profissionais trabalhadores
do Centro Psiquiátrico Pedro II, localizado no Engenho de Dentro/RJ em 1978 decide denunciar uma
série de violências aos direitos humanos daqueles que ali estavam internados. Segundo Amarante (1),
como se tratava de uma denúncia escrita, registrada em documento oficial a resposta foi “[...] imediata e
violenta, como era comum naqueles tempos. Além de nós três, foram demitidos mais 263 profissionais
que ousaram nos defender ou que confirmaram nossas denúncias” (1).
As 263 demissões dos funcionários em denúncia aos hospitais psiquiátricos da Divisão Nacional de
Saúde Mental ficou conhecido como a “a crise da Dinsan”, que culminou na criação do primeiro movi-
mento social organizado na área da saúde mental do país, o Movimento dos Trabalhadores em Saúde
Mental – MTSM:
Assim nasce o MTSM, cujo objetivo é constituir-se em um espaço de luta não institucio-
nal, em Locus de debate e encaminhamento de propostas de transformações da assistência
psiquiátrica, que aglutina informações, organiza encontros, reúne trabalhadores em saúde,
associações de classes, bem como entidades e setores mais amplos da sociedade (2).
Esse movimento para o autor Amarante (3) desencadeia uma crítica reflexiva sobre a “[...] função
social da psiquiatria, a natureza e o estatuto epistemológico do saber psiquiátrico, e o caráter de institui-
ção total dos hospitais psiquiátricos”. Tudo isso dará origem ao Movimento Nacional da Luta Antima-
nicomial que impulsionou as transformações da política nacional de saúde mental.
Ainda no ano de 1978 o Brasil recebe a visita de Franco Basaglia, o psiquiatra que constituiu o Mo-
vimento da Psiquiatria Democrática liderando a importante experiência em Goriza e Trieste ao “[...]
colocar em prática a extinção dos manicômios, criando uma nova rede de serviços e estratégias para
lidar com as pessoas em sofrimento mental e cuidar delas” (4).
Essa importante experiência de caráter revolucionário de Basaglia propõe uma nova forma de cuidar,
expressa não apenas pelos novos serviços substitutivos aos manicômios, mas, “[...] pelos mais variados
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dispositivos de caráter social e cultural, que incluíam cooperativas de trabalho, ateliês de arte, centros
de cultura e lazer, oficinas de geração de renda, residências assistidas, entre outros” (4).
Em 13 de Maio de 1978 na Itália a experiência de Basaglia inspira a Lei 180 que é aprovada com ca-
ráter de “[...] extinção dos manicômios e a substituição do modelo psiquiátrico por outras modalidades
de cuidado e assistência. A Lei Basaglia, como ficou conhecida, é, ainda hoje, a única no gênero em
todo o mundo” (Id, 2006) (4).
Retomando a visita de Franco Basaglia ao Brasil, Amarante (4) afirma que sua chegada vai reforçar
as denúncias de maus-tratos e violência presenciadas no Hospital Colônia de Barbacena, Minas Gerais,
“[...] um dos mais cruéis manicômios brasileiros”, chegando a compará-lo como um campo de concen-
tração. Sua estadia aqui no Brasil neste momento foi importante e decisiva para a trajetória da RPB, um
marco para a luta antimanicomial brasileira.
Através dos movimentos dos trabalhadores na década de 1970 que impulsionou uma ruptura com o
modelo hospitalocêntrico, e, a vinda e a experiência de Franco Basaglia são marcos para a Reforma da
Psiquiatria aqui no Brasil, o que contribuiu para a concepção da atenção a saúde dos usuários de saúde
mental de forma digna e humana, articulando não mais a exclusão social, mas sim, a sua inserção soci-
al na família, na comunidade e no serviço, agora garantido pela criação da lei 10.260 de 6 de abril de
2001, registrada no Diário Oficial da República Federativa (5).
E, é sobre essa conquista que este trabalho se propõe a refletir dialogando com os autores de refe-
rencia a presença de impasses e retrocessos. É importante ressaltarmos que quando nos referimos a
categoria impasses relacionamos a fala dos autores que apontam o “enfraquecimento dos serviços de
saúde mental devido ao redirecionamento do investimento do fundo publico para, os serviços privatiza-
dos”, e, quando nos referimos a categoria retrocessos fomentamos a discussão diante de “práticas que
retomam ao modelo manicomial do século XX”.
Por isso nossa pesquisa se propôs compreender a atual conjuntura da RPB, através da articulação en-
tre as categorias retrocesso e impasses com as temáticas: da privatização da saúde, da internação com-
pulsória, e das comunidades terapêuticas. Os objetivos desta pesquisa são:
-caracterizar o contexto histórico e atual da Reforma Psiquiátrica no Brasil, relacionando à proposta
da Saúde Mental aos possíveis retrocessos e impasses presente no atual cenário brasileiro;
-identificar autores do campo da saúde e da saúde mental, que aponta a privatização da saúde, a in-
ternação compulsória, e, as comunidades terapêuticas como retrocessos e impasses para a RPB;
-compreender a atual conjuntura da saúde mental pelo dialogo com os referenciais teóricos no con-
texto da privatização da saúde, da internação compulsória, e das comunidades terapêuticas.

II. MÉTODO
O desenho metodológico inclui na primeira fase a revisão bibliográfica qualitativa de conceitos bá-
sicos do campo da RPB articulado as categorias retrocesso e impasses. Como referencial teórico, inclu-
ímos trabalhos de autores do campo da RPB/Saúde Mental como Paulo Amarante (1) e (2); e, artigos
que apontam: a privatização da saúde pelo autor Emerson Merhy (6), a temática da internação compul-
sória fundamentada pelo referencial Isabel Coelho e Oliveira (7) e, a temática das comunidades terapêu-
ticas pelas autoras Fernanda Ribeiro e Cecília Minayo (8) articuladas com as categorias retrocesso e/ou
impasses para o paradigma da RPB.
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Na segunda fase, realizamos análise documental do total de amostra de 24 artigos pesquisados na


base de dados Scielo, com recorte entre 2001 à 2015, dentre estes artigos: 14 contextualizando a RPB e
sua discussão com as categorias impasses e retrocesso; 4 relacionando à internação compulsória a re-
trocessos, 3 articulando as comunidades terapêuticas à retrocessos e 2 documentos e 1 artigo articulan-
do a privatização como impasses para o fortalecimento e avanço da Reforma Psiquiátrica Brasileira.
A terceira fase, a análise de conteúdo temática, consistiu na construção da discussão dialógica com
os referencias teórico sobre as categorias retrocessos e impasses e sua articulação com as temáticas da
privatização dos serviços de saúde, da internação compulsória e das comunidades terapêuticas.
Neste momento da pesquisa, após analise dos artigos selecionados construímos de forma crítica e refle-
xiva os resultados desta pesquisa, relacionando os discursos do “desinvestimento e/o enfraquecimento
dos serviços de saúde”, “do incentivo aos serviços de cunho filantrópico”, “do direcionamento do fun-
do público para serviços privatizados” à categoria impasses; e, os discursos que evidenciam e denun-
ciam práticas que retomam ao modelo manicomial à categoria retrocessos.
Cabe ressaltarmos que quando selecionamos as palavras impasses e retrocessos respectivamente
nos referirmos ao significado literal da palavra: no primeiro caso aos empecilhos e/ou impedimentos
que se apresentam para dificultar e/ou enfraquecer os serviços de saúde e saúde mental; e, no segundo
caso o significado de recuo e/ou ação de voltar no tempo e no espaço ao identificar em pleno século
XXI práticas que retomam a lógica do modelo manicomial do século XX.

III. RESULTADOS
Os resultados apontam as categorias retrocessos e impasses no cenário da RPB. Na temática da
privatização da saúde: a categoria impasses aparece com a fala do “desinvestimento do Estado para
com a saúde pública e seu direcionamento para as filantropias/planos de saúde”, fundamentadas pelo o
autor Merhy (6), que aponta o desinvestimento do Estado não só na saúde mental, mas, principalmente
no Sistema Único de Saúde/SUS; e, pelo autor Amarante (2), que denúncia o Estado assumindo mais os
interesses privados, como o estímulo aos planos de saúde e as filantropias, e que para a saúde pública
tem se mostrado muito tímido quando o assunto em questão é o seu investimento.
Na temática da Internação Compulsória: a categoria retrocesso aparece com a fala do “retorno as
práticas manicomiais que resgatam o modelo hospitalocêntrico”, com praticas de internação compulsó-
ria com “a finalidade de higienização da cidade para eventos internacionais” segundo os autores Coelho
e Oliveira (7), pois não era assim que faziam com os ditos loucos, alcoólatras, leprosos naquela época?
Na temática das Comunidades Terapêuticas: a categoria retrocesso aparece com a fala do “trata-
mento da moralidade” com “práticas de espiritualidade e de abstinência das drogas”, retomando as prá-
ticas da idade média ao espiritualizar o uso das drogas como uma fraqueza espiritual, como um distan-
ciamento de Deus, segundo apresentado pelas autoras Ribeiro e Minayo (8) divergindo assim, da
proposta da redução de danos e do cuidado psicossocial.
Encontramos ainda temas que dizem respeito à baixa implantação de serviços e dispositivos de base
territorial, a centralidade do trabalho ainda no CAPS com pouco trabalho territorial, pouca participação
de usuários e familiares e pouca articulação com outros setores e seguimentos que tem haver com cam-
po da saúde mental apresentadas pelo autor Amarante (1), aparecendo como impasses para o fortaleci-
mento e avanço da RPB.
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IV. CONCLUSÃO
Através da análise dos resultados que fomentam a presença das categorias retrocessos e impasses
no cenário atual da Reforma Psiquiátrica Brasileira, podemos considerar que na temática da privatiza-
ção referenciada pelo autor Merhy (6) e (10) a categoria impasses se presentifica com o redireciona-
mento do investimento do fundo público para os serviços privatizados. Como resposta deste posiciona-
mento, temos o enfraquecimento e a falta de investimento nos serviços públicos sejam eles relacionados
diretamente ao campo da saúde, nosso objeto de pesquisa, ou vista de modo mais amplo, que também
considera outros determinantes sociais como fundamentais para a garantia da saúde pública. Merhy (10)
afirma que este redirecionamento do fundo público tem culminado no enfraquecimento da garantia dos
direitos sociais, para o autor, este posicionamento do atual governo tem contribuído para o aumento da
desigualdade social por estar vinculado ao modelo:
[...] proposto pelo governo Temer, teremos uma sociedade com menos investimento no
campo social e aumento real da desigualdade, penalizando especialmente as dezenas de
milhões mais pobres. Ou seja, segundo essa linha de apostas, o país pode produzir mais
riqueza, mas terá também mais pobre. (10)

O posicionamento do atual governo segundo Merhy (10) “[...] considera qualquer gasto com di-
reitos sociais um desperdício de recursos, pois deveriam ser usados somente no campo econômico para
beneficiar os setores empresariais”. Com isso o médico sanitarista Emerson Merhy e a médica Laura
Camargo (10) afirmam que o governo atual quer extinguir o seu dever quanto ao direito a saúde e a
educação do cidadão independente se este poderá ou não pagar pelos serviços privatizados, como os
planos de saúde, redirecionando os investimentos do fundo público para os serviços de ordem privada.
De acordo com os autores “O ministro da Saúde afirmou que o Sistema Único de Saúde é um
gasto desnecessário e que o ideal é que cada um tivesse o seu plano de saúde. Ou seja, a saúde não seria
um bem universal, mas um bem privado, que se obtém comprando no mercado” afirma Merhy e Ca-
margo (10). Esta fala nos remete ao discurso que fortemente têm se propagado pela mercantilização da
saúde, isto é, a privatização. Merhy (6) inverte a lógica do cuidado em saúde do SUS, como um cuidado
complementar e suplementar aos serviços privados. E, que têm sustentado o discurso que permeia a
sociedade com a valorização da cultura de consumo dos serviços de saúde privatizados, em face da saú-
de pública como garantia de direitos, que têm se mostrado deficitária diante das demandas do cuidado
em saúde, reflexo este, dos desinvestimentos e ausência do fortalecimento do próprio Estado.
Essa postura que o Estado vem assumindo em favor dos interesses privados tem enfraquecido a saú-
de pública como afirma o autor Amarante (11) e (12) através do estímulo aos planos de saúde e das fi-
lantropias, e, que para a saúde pública têm se mostrado muito tímido quando o assunto em questão é o
seu investimento para os serviços de saúde como direito universal e gratuito. Diante deste cenário de
privatização e de desinvestimento para o SUS, temos a presença de outros dispositivos como a Interna-
ção Compulsória fundamentada por Isabel Coelho e Oliveira (7) e a Comunidade Terapêutica pelas au-
toras Ribeiro e Minayo (8) se apresentando nesta conjuntura como proposta de atenção a saúde para os
usuários drogas, em resposta a demanda de pessoas que necessitam de algum atendimento em Saúde
Mental, seja ele contínuo ou eventual (11).
Ao analisarmos a categoria retrocesso na RPB, identificamos nas temáticas da Internação Com-
pulsória e das Comunidades Terapêuticas práticas manicomiais que resgatam o modelo hospitalocêntri-
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co e sua forma segregada, estigmatizada, excludente e desumana por de trás do discurso de ações de
cuidado à saúde para os usuários de drogas.
Essas ações desumanas que apontamos neste trabalho como retrocesso presente neste século XXI,
retoma do século XX como proposta de cuidado de saúde, e, que outrora, diante desta proposta falida,
movimentos sociais de trabalhadores, usuários e familiares se levantaram contra essa lógica manicomi-
al. Fomentar a presença de retrocessos na contemporaneidade já conquistados pela RPB que trouxe
como proposta o cuidado humanizado, é retroceder com praticas de internação compulsória com a fina-
lidade de higienização da cidade para eventos internacionais como afirmam Coelho e Oliveira (7), pois
não era assim que faziam com os ditos loucos, alcoólatras, leprosos naquela época?
Segundo a militante da luta antimanicomial Danúbiah Mendes Pereira (9) “[...] excluir o usuário do
meio social trancafiando-os em locais sem perspectiva de cuidado humanizado é retroceder com “dito
tratamento” que já inicia pela lógica judicial, autoritária, que retira esse usuário do convívio social sem
o seu consentimento, antes mesmo de ter acesso aos serviços de saúde”. Que cuidado é este? Que em
vez de empoderar o usuário através de sua implicação no tratamento, desempodera qualquer possibili-
dade de ser protagonista do seu cuidado, delegando a outros o poder de decidir o que é melhor para este
ou aquele usuário dos serviços de saúde e saúde mental.
Pensar em retrocesso é desconsiderar as lutas antimanicomiais, suas conquistas e avanços que se
articularam em prol do tratamento humanizado para os usuários de saúde mental, resgatando sua digni-
dade e sua reinserção na sociedade. Não atribuindo seu tratamento a questões morais, com práticas de
espiritualidades e de abstinência das drogas vista nas Comunidades Terapêuticas, que acabam retroce-
dendo a práticas da idade média ao espiritualizar a dependência de drogas como uma fraqueza espiritu-
al, e/ou um distanciamento de Deus. O que fomenta um discurso que induvidualiza e culpabiliza o usuá-
rio de drogas pela sua condição de dependência, sem considerar outras condições do contexto social e a
própria complexidade do cuidado/atenção à saúde.
É claro que as pesquisas mostram os impactos positivos da espiritualidade e da religiosidade na qua-
lidade de vida e na saúde mental dos usuários de drogas como citadas pelas autoras Ribeiro e Minayo
(8), mas, também mostram o reconhecimento de líderes religiosos sobre a insuficiência de que dispõem
seus instrumentos de tratamento para, lidar com um problema tão complexo quando o assunto em ques-
tão é o tratamento à saúde dos usuários que fazem o uso abusivo de drogas, qualificando suas ações
como muito aquém da necessidade (8).
Consideramos assim, que não se pode anular a complexidade que constitui esse indivíduo quando o
assunto em questão é o cuidado em saúde e saúde mental. E, que para a efetivação desse cuidado huma-
nizado como garantia de direitos sociais, a atual conjuntura dos serviços de saúde pública precisa de
investimentos e, do fortalecimento nos dispositivos de saúde e de saúde mental, como o exemplo, o dis-
positivo conhecido como Centro de Atenção Psicossocial de álcool e outras drogas/CAPSad, que atende
este perfil de usuários. Deste modo, com o fortalecimento dos serviços de saúde pública para a atenção
à saúde do usuário que faz uso abusivo de álcool e outras drogas, contribuirá para a efetivação da pro-
posta de cuidado humanizado, cuidado este que, resgate a dignidade e o respeito ao usuário em poder
decidir e implicar-se no seu projeto terapêutico, através de práticas que restabeleçam seu processo de
saúde e seus vínculos sociais.
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REFERENCIAS

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PDC, editor. RIO DE JANEIRO: FIOCRUZ; 2013. (2)
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4. Amarante PDC. Rumo ao fim dos manicômios. (Entrevista). Rev. Mente e Cérebro: 2006. (4)
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm>. Acesso em: 30 maio, 2017. (5)
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drogas: o caso de Manguinhos. As Comunidades Terapêuticas religiosas na recuperação de
dependentes de drogas: o caso de Manguinho. 2015 setembro: p. 515-526. (8)
9. Pereira DM. Reforma Psiquiátrica Brasileira e Retrocessos: uma revisão bibliográfica qualitativa da
atual conjuntura da Saúde Mental no Brasil. CADERNO DE TRABALHOS DO IX PRÊMIO
MARGARETE DE PAIVA SIMÕES FERREIRA.CRP-RJ: Rio de Janeiro. 2017. (9).
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11. ESCOLA POLITÉCNICA EM SAÚDE JOAQUIM VENÂNCIO/EPSJV. Amarante P. Entrevista.
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http://www.epsjv.fiocruz.br/noticias/reportagem/avancos-e-retrocessos-na-luta-antimanicomial.
Acesso em 08 de jun. 2016. (11)
12. ESCOLA POLITÉCNICA EM SAÚDE JOAQUIM VENÂNCIO/EPSJV. Amarante P. Entrevista
Avanços e retrocessos na luta antimanicomial. Entrevista. (org.): Viviane Tavares. Rio de Janeiro:
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