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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA.

MONOGRAFIA FINAL DE LITERATURA JAPONESA IV.

PROFESSORA: Joy Nascimento Afonso.

ALUNA: Karina Beatriz González.

ANO: 2022.
Implicações estéticas, simbólicas e sociais na obra de Yasunari
Kawabata

“Lua de inverno que vem das nuvens


a fazer-me companhia:
O vento é penetrante, a neve, fria.”
Monje Myôe (1173-1232)

“Em realidade, a beleza de um quarto japonês,


produzida apenas por um jogo de opacidade da sombra,
dispensa acessórios.”
Junichiro Tanizaki (1886-1965)

1.Introdução
Em este trabalho me proponho a percorrer a vida e obra de Yasunari Kawabata, tendo
em conta suas preocupações estéticas e seu trabalho simbólico na escrita, sem descuidar
o contexto social onde este escritor, ganhador do prêmio Nobel de Literatura, se
desenvolveu. Nesta ocasião, vou trabalhar com três contos recopilados na coleção
Contos da Palma da Mão (Tanagokoro no Shôsetsu), traduzido ao português por Meiko
Shimon. Eles são: Frágil Recipiente (Yowaki Utsuwa, 1924), Dezesseis anos
(Junanasai, 1944), e O guarda chuva (Amagasa, 1932).
Yasunari Kawabata nasceu a 14 de junho de 1899 em Osaka, e morreu a 16 de abril de
1972. Ele foi um destacado escritor do século XX, pertencente a uma família tradicional
e reconhecida em sua região. Órfão de pais, e logo de avós, havendo perdido também a
sua irmã, Kawabata tornou-se interno em um colégio onde conheceu outros rapazes
apaixonados pela literatura. Em 1917 mudou-se para Tóquio, onde ingressou no curso
de literatura inglesa e mais tarde optou pela literatura japonesa. Em esta época o escritor
se preocupou muito pela expressão técnica em sua obra, e também se interessou na
literatura ocidental, a qual influenciou ele. Ademais, por essa época, Kawabata integrou
uma corrente literária chamada de Shinkankakuha (Neo-sensorialismo). Isto foi virando
a medida que ele foi sendo adulto, e depois da Segunda Guerra Mundial e os atentados
dos EE.UU em Hiroshima e Nagasaki, Kawabata dedicou-se a escrever contos com
ênfase na cultura tradicional japonesa, se bem isto já era tema em sua escritura, logo se
acrescentou.
2. Contexto histórico do autor
O autor nasceu a finais do período Meiji (1868-1912), e viveu em o período Taisho
(1912-1926) e em o período Showa (1926-1989). Em estes períodos o Japão passou por
múltiplos câmbios políticos e sociais. Herdeiros de um passado aristocrático no período
Edo (1615-1868) onde reinavam o clã guerreiro Tokugawa, conhecido como Tokugawa
bakufu, seu líder, o Shogun governava desde a cidade de Edo (hoje Tóquio). Ele
estabeleceu um sistema hereditário do poder que dividiu as classes, inspirado no
pensamento confuciano onde os samurais governavam, com os Tokugawa na cabeça e
os chamados Dimyo como senhores feudais. Os agricultores e artesãos estavam por
baixo desses, e logo, os comerciantes como última corrente. Além disso, neste período
foi proibido o cristianismo e só permitiram o comércio com os holandeses, chinos,
coreanos e okinawenses.
No século XIX as coisas começaram a mudar, os senhores Dimyo gastavam muito
dinheiro em segurar seus privilégios, e os samurais de rango mais baixo e dos domínios
externos sentiram moléstias e frustrações por não poder acessar a postos mais altos no
governo. É assim que alguns comerciantes ficaram ricos, enquanto alguns samurais
viviam na pobreza. Ademais, o comércio marítimo foi aberto a navios estrangeiros e,
em 1854, Japão fez um acordo comercial com os EE.UU, este foi o primeiro de vários
acordos que o país firmou com as potências ocidentais. Em resposta a esses tratados que
deram poder aos ocidentais, os samurais excluídos unificaram seu poder contra os
Tokugawa, destruíram o bakufu e fundaram um novo governo com o objetivo de
eliminar as distâncias de classes, modernizar o país e fazer frente aos potenciais
ocidentais.
O estabelecimento deste novo governo em 1868 marcou o começo do período Meiji no
Japão, conhecido pelo nome de Restauração Meiji. Em teoria, o novo governo restaurou
o poder à antiga linha de imperadores no Japão (os imperadores eram testaferros
impotentes na época de Tokugawa). Em realidade, o jovem imperador Meiji ficava
controlado por seus principais assessores, esses eram samurais que se converteram em
ministros de estado. Eles implementaram importantes programas e políticas para
unificar o país: Em primeiro lugar, eles aboliram os domínios dos senhores da guerra.
Em seu lugar, criaram prefeituras similares aos 50 estados dos EE.UU. Aos ex Daimyos
outorgar-lhes grandes assentamentos para recompensá-los pôr as terras que perderam.
Em resumo, o governo de Meiji obteve o controle do país. Além disso, eliminaram
formalmente o sistema hierárquico de classes. Essa reforma eliminou o status formal de
samurai, todo o povo foi declarado cidadão em pé de igualdade. O terceiro câmbio que
fez o governo foi exigir aos meninos que assistiram à escola primária formalmente. O
objetivo foi que os jovens serviram ao exército partindo de uma educação que fazia
ênfase no serviço militar e na educação moral, o qual serviu para criar um sentido de
identidade comum entre pessoas de diferentes origens e regiões. Também, deu ao
governo a oportunidade de ensinar lealdade, aos estudantes sê-los ensino a venerar ao
imperador. Cada aula tinha uma imagem do imperador na parede. Essas crenças foram
fortalecidas com o patrocínio estadual da fé xintoísta, onde o imperador era divino. Só
ele poderia nomear ministros, controlar ao exército, a marinha e dissolver o parlamento
se assim o considerava. Em quanto ao voto, só os homens que pagavam 15 ienes o mais
em impostos poderiam fazê-lo.
Os símbolos e lemas deste período foram o trem, a eletricidade, o telégrafo, estes
simbolizavam a indústria. Um dos seus lemas foram civilização e ilustração, outro foi
enriquecer o país e fortalecer o exército, Fukoku Kyohei. O tempo do Japão
imperialista foi começando. Em 1876 as canhoneiras japonesas obrigaram os coreanos a
um acordo que os prejudicava, e uma expedição militar ajudou os japoneses a afirmar o
poder e controle sobre as ilhas Ryukyu. Porém, os melhores logros foram as vitórias
sobre China em 1895 e Rússia em 1905, essas guerras liberaram-se para proteger os
interesses japoneses na Coreia.
Contudo, no século XX os novos problemas que se apresentaram foram a dívida pela
guerra. O descontento do povo, e a consequente formação de sindicatos anarquistas, a
mobilização feminista das mulheres, e os reclamos e protestas do povo obreiro. Isso
levou o governo a tomar medidas repressivas contra esses grupos e foi proibido pela lei
de Representação da Paz que as pessoas pudessem debater e se defender livremente. O
voto foi outro problema, porque os homens apenas no ano 1925 puderam votar em sua
totalidade, enquanto que as mulheres continuaram-lhe negando este direito. Elas foram
vítimas da ideologia criada pelo Ministro da Educação ligado ao Ministério Militar, pela
qual as mulheres foram educadas para ser mães e esposas que serviram ao estado para
formar filhos que serviram na Nación. Isto sucedeu no período Taisho, que começou
com a morte do imperador Meiji a seus 60 anos, e sua sucessão por seu filho que passou
a chamar-se Imperador Taisho. Ele, devido a uma enfermidade cerebral não podia
governar e anos mais tarde seu filho o faz, sendo chamado de Imperador Showa. Além
disso, em esse período, mais concretamente em 1920 as mulheres buscaram através do
feminismo sua individualidade como pessoas livres para tomar suas decisões. Embora, o
sufrágio feminino em Japão foi estabelecido em 1947, quando entrou em vigor a
constituição para o Japão da pós-guerra.
Apesar de esses acontecimentos, o Japão seguia com a ideia de avançar com sua política
imperialista e quer expandir-se nas colônias russas. Ademais, depois dos terremotos
Kanda e Nipponbashi, e em 1923 em Tóquio, e a explosão da via ferroviária em 1930, o
país necessitava pagar dívidas e pretendia expandir-se pela Ásia. É assim que viu que
precisava-se envolver na Segunda Guerra Mundial como aliado da Alemanha. Logo a
seguir, quando aconteceu a derrota, e depois da bomba lançada pelos EE.UU em
Hiroshima e Nagasaki, o Japão perdeu peso a nível mundial. Aliás, EE.UU ocuparam
suas terras e obrigaram o imperador a renunciar à qualidade de pessoa divina através de
um comunicado oficial. Consequentemente, a constituição japonesa foi criada baseada
na de EE.UU. Além disso, foi criado o Ministério do Comércio Internacional e
Indústria, e em 1947, a educação obrigatória foi mista. Devido à derrota, o Japão se
retirou da Coreia, perdendo assim poderio imperial. É assim que Japão entra em um
declive econômico e social que expandiu-se por toda sua população, chegando inclusive
a nosso escritor, que se viu intensamente comovido pelo avence da cultura ocidental
sobre a japonesa.

3.Implicações estéticas e simbólicas.


Para poder entender a literatura de Yasunari Kawabata há que ter em conta algumas
questões relacionadas com o contexto social do Japão e sua religião. Como diz mais
acima, o Japão passou por muitos acontecimentos que o foram cambiando. Sua cultura
tradicional foi sendo substituída pela ocidental. Isso afetou muito a Yasunari e a sua
literatura.
Para começar a entender as implicações estéticas e simbólicas, temos que remontar-nos
à religião budista e xintoísta do Japão. O Budismo entrou no país no século VI de nossa
era, e aportou como na China, o elemento religioso contemplativo, místico e intelectual.
Porém, este elemento, se sobrepõe ao antigo ritual do sinto, onde cada família tinha seu
altar doméstico e adoravam aos kami. Os kamis foram espíritos que viviam nos objetos
e seres vivos da natureza. Trago isto porque os fundamentos da arte no Japão tem que
ver com a espiritualidade, os fundamentos de sua estética descansam sobre o elemento
sagrado, sobre o contato com mundos supra-humanos, sobre a comunhão das esferas
sutis do espírito. Com respeito a isto, Jean Riviére (1975) opina:
A simplicidade domina a estética japonesa. A simplicidade dos médios e da
matéria, o wabi japonês, caracteriza a grande arte deste país. O elemento
ornamental desaparece, as linhas simplificam-se, o artista persegue ante todo as
formas naturais: uma velha cepa torcida, uma simples pedra de estranho
aspecto, uma flor silvestre. Seus olhos conseguiram captar uma coisa bela em
si, rica em evocações estéticas [...]. (p.107)
Além disso, outro elemento que sinaliza o Riviére como importante na estética japonesa
é o conceito de vazio. A solidão, e o vazio não tem que ver com o niilismo ocidental,
eles são elementos fundamentais porque conectam o artista com o objeto em sua
essência espiritual, sem preocupações banais. Consequentemente, o arte no Nara, região
do país, caracteriza-se pelo desenvolvimento da escultura búdica, que união a vitalidade,
a naturalidade, a sensibilidade dela estética sinto com na grande espiritualidade do
budismo mahayana, como vamos ver mais diante, Kawabata recupera a figura da deusa
Sho Kannon em um dos contos dele. Também, o budismo zen tem grande influência
sobre o Kawabata (1968), ele diz:
O discípulo zen permanece durante muito tempo sentado, imóvel e silencioso com os
olhos fechados. Pronto chega a um estado de impassibilidade, sem nada em que pensar,
nem nada que evocar. Vai apagando seu eu até alcançar a nada. Esta não é a nada nem o
vazio, segundo o conceito ocidental. Pelo contrário, é um cosmos universal onde tudo
se intercomunica, transcendendo fronteiras, sem limites espaciais nem temporais. (p.
10)
E ainda, segundo o dito em seu discurso fecho para receber o Prêmio Nobel de
Literatura, seu trabalho literário é influenciado pelas obras representativas e
fundamentais da cultura japonesa do período Heian, elas são: O livro da almofada
(Makura no Soshi) da autora Sei Shonagon, dama da corte da imperatriz Sadako, o livro
foi elaborado entre os anos 966 e 1017; Os contos de Ise (Ise Monogatari) recopilação
de relatos breves acerca do poeta Ariwara no Narihira no ano 905; A história de Genji
(Genji Monogatari), nos anos 907 ao 1002, escrita por Murasaki Shikibu. Todas elas
foram escritas pelas mulheres cortesãs e seus livros se destacam no discurso de
Kawabata como leituras fundamentais para sua escrita. Aliás, posso dizer, a partir da
leitura de seu ensaio A existência e o descobrimento da beleza (1969), que o belo para o
autor reside na experiência particular do artista-em um tempo e um espaço- frente a
natureza do objeto, produzindo-se assim quase uma fusão entre o artista e seu objeto de
contemplação. Ele dá um exemplo sobre a contemplação do belo, que experimenta
enquanto olha um conjunto de vasos expostos à luz do sol, ele diz:
“[...] Ao contrário daquele nas bordas que se alargavam em certos pontos, ele se
espelhava suavemente sobre a superfície arredondada deles. Cada um desses dois tipos
de luz, à sua maneira, era uma beleza extraordinariamente pura[...].” (KAWABATA,
1969, p. 15).
Isto pode-se relacionar, ademais do pensamento zen, com as pesquisas impressionistas
pelas variações da luz em objetos em diferentes horas do dia. Vale lembrar-se da obra
da série de Monet sobre a Catedral de Rouen, onde estudou as diferentes gamas de cores
que se formaram pelo impacto da luz do sol contra a catedral ao longo do dia. Até
mesmo, a obra do Kawabata pode-se relacionar com o surrealismo por sua interação
entre a realidade material e a onírica, e também, a animação de objetos.
Segundo Meiko Shimon (1999) a obra de Kawabata pode-se dividir em três períodos
criativos: a) O primeiro período vai desde o início até os trinta e quatro anos, foi este
seu período modernista. Ali ele se aventura na busca de criar novos universos literários,
valendo-se das imagens sensoriais que logo seriam estruturadas intelectualmente. A
corrente que ele integra é da Neo-sensorialista, caracterizada pela oposição ao realismo
e ao naturalismo predominante no Japão. A corrente Neo-sensorialista expressa
sentimentos e ideias através de sensações percebidas, sem buscar respaldo na
racionalidade. b) O período de 1934 até o fim da II Grande Guerra é chamado de
“período de Yukiguni”, esse período marca seu ponto culminante na obra do autor, e ali
ele publica poucas obras. Yasunari passou a adotar uma linha que focaliza na psicologia
humana, nas paixões e nas fantasias emocionais. Isto ele o faz através da análise da
alma humana e a caracterização de seus personagens. Se pode ressaltar a sensibilidade
lírica cultivada pela leitura das obras clássicas do Japão, seu amor pelas viagens e a
natureza mesclada com uma técnica expressiva atravessada pelo Neo-sensorialismo. c)
O terceiro período inicia com o final da Segunda Guerra Mundial, aqui o escritor vendo
a seu país abatido pela guerra, e o avance da cultura ocidental sobre ao oriental, decide-
se submergir na cultura tradicional japonesa, aprimorando-se na expressividade sutil e
refinada do estilo clássico, entrecortando isto com imagens surreais. Kawabata
encontrava-se na alma dos antepassados japoneses, em sua filosofia zen. Suas obras
mais ressaltantes foram escritas nesta época: Yama No Oto (1954), Nemureru Bijo
(1961), entre outras. Ademais, dedicou-se à divulgação da literatura japonesa no âmbito
internacional. Também, suas obras têm presença de fatores autobiográficos, embora não
se caracterizem como uma escrita intimista.

4.Análisse dos contos


O primeiro conto que quero analisar é o intitulado Frágil Recipiente (Yowaki itsuwa,
1924). Segundo a classificação da obra de Kawabata elaborada por Meiko Shimon
(1999), este conto pode pertencer ao período modernista do autor japonês, localizado
nos tempos de Taisho.
O conto começa com a narração em primeira pessoa do protagonista. Ele passa por uma
loja de antiguidades onde vê uma estátua da deusa Kanzeon que estava colocada entre a
porta da loja e a rua, como se ela marcasse um umbral. Podemos lembrar aqui, que a
deusa Kannon o Kanzeon é uma divindade do budismo, como já diz o budismo
influenciou muito a Kawabata em sua escrita. Mas diante da narração, também o autor
utiliza a voz do personagem para fazer referência ao cristianismo, lembremos que
Kawabata foi um conhecedor da literatura ocidental fortemente marcada pela religião
cristiana.
Continuando com o tempo da narração, o momento crucial onde apareceu o fusão entre
a realidade cotidiana e a fantasia do personagem é através do sonho dele, na forma de
Lewis Carroll em seu obra Alice’s Adventures in Wonderland (1865), aqui também
podemos notar a influenza da literatura inglesa na obra de Kawabata. Logo a seguir, o
personagem descreve a ação do abraço que Kannon lhe dá: “Era como se os braços de
um objeto inanimado se transformassem em um ser vivo.” (KAWABATA, 1968, p.32).
Esta ação de dar vida a um objeto inanimado podemos relacioná-lo com a estética
surrealista, onde a imaginação é a norma, o relacionamento de objetos, e a relação com
o mundo dos sonhos.
Por outro lado, a expressão que utiliza Kawabata para descrever quando seu
personagem é assustado pela deusa e dá um salto para trás e, ela cai e quebra em
pedaços. Isto é que o autor diz: os cacos da porcelana espalhados cintilam, o fato dos
cacos brilharem construí uma imagem poética que podemos relacioná-la com o Neo-
sensorialismo e o impressionismo pôr a sensação criada pela luz através dos brilhos.
Além disso, não posso deixar de mencionar que o conto faz referência ao modelo de
mulher boa da época Taisho. O autor lembra através da memória do personagem os
mandatos cristianos para a mulher, que é frágil como um recipiente, como um vaso de
porcelana. Esta descrição também tem relação com as características que o governo
japonês impôs na época Taisho: Uma boa mãe e esposa, dedicada e amorosa com seus
filhos e seu marido, uma servente do Estado.
O segundo conto que vou analisar é O guarda-chuva (Amagasa, 1932). Pôr a data de
publicação também posso classificá-lo na primeira etapa de Kawabata. A narração é
muito sensível, conta a história de dois garotos, uma menina e um menino que se
gostam e, em o médio surge uma viagem ao pai do garoto, então eles vão para a loja de
fotografia do pai do menino, assim podem tomar uma para o recordo. A estética do
conto é totalmente Neo-sensorialista, desde a chuva que cai e molha aos meninos, até as
sensações que sentem os dois com a cercania do corpo de um com outro. Também, a
melancolia torna-se um elemento chave para o ambiente da narração, com construções
narrativas como: “Por toda sua vida, ele se recordaria desse calor sempre que olhasse
aquela fotografia.” (KAWABATA, 1932, p.333) Esse calor é a sensação que o garoto
sentia quando seu corpo roçava o corpo da garota.
Para finalizar, vou analisar o conto Dezesseis anos (Junanasai, 1944). Segundo a data
dele, posso classificá-lo no período chamado Yukiguni, que é o período onde transcorreu
a Segunda Guerra Mundial, já finalizando no ano 1944. Em esta etapa, o autor dedica-se
a escrever histórias fazendo ênfase na psicologia de seus personagens, as paixões e nas
fantasias emocionais humanas. Além disso, já aqui se pode olhar o apego de Kawabata
pela tradição japonesa.
O conto narra a história de uma menina que fica doente em uma clínica no contexto da
Segunda Grande Guerra. Ela lembra coisas de sua infância, com este recurso Kawabata
invade a narração de melancolia. Um dia qualquer no hospital, a irmã mais velha a
visita, com muita sensibilidade o autor narra a sequência deste encontro, onde a visita
diz que vem a vê-la a irmã mais pequena, e a mostrar-lhe um objeto que será um
presente para a criança que leva em o ventre a irmã mais velha. A narração finaliza com
uma imagem do presente da irmã mais pequena dormindo e despertando ao lado de seu
marido.
Há muitos recursos em esta narração. Vou começar reconhecendo os elementos da
tradição japonesa que Kawabata introduz: O conto começa com a lembrança da irmã
pequena de sua infância, quando ela brincava em um templo no jardim, baixo um
ginkgo, uma árvore japonês de qual suas folhas são usadas para fazer medicina. Ela
escreveu sobre um cartaz que proibia brincar ali, a palavra Iyadesu, que significa “não
quero”. Desde ali sua família a chamava assim quando ela fazia travessuras. O elemento
do templo, da árvore, do jardim, e a eleição do tradutor de manter as palavras em
japonês, são sinais de querer manter estes elementos tradicionais.
Consequentemente, em uma lembrança mais da pequena doente, aparece sua mãe
olhando o orvalho noturno nos umeboshi, um prato tradicional japonês, e a menina com
pressa por ver isto, tropeça e derruba o incenso repelente de mosquitos. O incenso
também é um objeto muito usado em oriente nessa época. Também, em outro momento
da narração a irmã mais velha mostra um furoshiki, que é um pano quadrado que pode
ser usado para envolver e transportar todo tipo de objetos. Ali, a irmã tinha um kimono
de criança, o kimono é um traje tradicional japonês, este era de festa. Kawabata o
descreve da seguinte maneira:
“O quimono com uma estampa de grous espalhados em vermelho e branco; a jaqueta
forrada e sem manga para o quimono, cor de zarcão, com a pintura em ouro de um
crisântemo; o casaco para quimono tingido em violeta com uma peônia branca; o
quimono longo baixo em crepe de seda escarlate [...]” (KAWABATA,1944, p. 375-
376).
Daí passo a analisar os elementos que geram uma emoção de melancolia, produzida
pelo recurso do elemento surrealista: “[...]Enquanto observava, ela começou a ter a
sensação de que seu corpo se encolhera e ficará do tamanho da formiga, e percebia a
imensidão do lençol. Sem saber o motivo, sentiu-se triste.” (Idem, p 375). Este episódio
sucede quando a menina encontra uma formiga em seu lençol. O detalhe de que a garota
se sentisse pequena como uma formiga, que ela tivesse essa sensação realmente em seu
corpo, faz que os leitores podemos sentir da mesma forma dela esse encolhimento.
Além disso, outro recurso que posso identificar para provocar as sensações em os
leitores é o monólogo interior, a maneira de James Joyce- embora este escritor não
costumava a usar aspas para assim distinguir o monólogo do resto da narração-,
Kawabata a partir deste recurso nos introduz na consciência de seu personagem:
““Hoje em dia, quimonos tão bonitos chamariam a atenção”, ia dizer a mais nova, mas
se surpreendeu ao reconhecer que pareceria estar se apegando aos quimonos ou sentido
inveja da irmã” (Idem, p. 376). O personagem se encontra refletindo sobre seus
pensamentos e arrependendo-se de falar assim sobre o quimono de sua irmã morta
quando as três eram só umas meninas pequenas.
5.Conclusão
Como se viu ao longo deste trabalho, a narrativa de Kawabata é uma construção
artística para nada simples, embora alguns de seus contos sejam breves, eles têm muito
conteúdo estético e simbólico. Depois da Segunda Guerra Mundial e durante esta, o
autor se refugiou no prazer estético e espiritual de sua literatura. Embora, como vimos
em o conto Dezesseis anos, ele foi bem consciente de seu contexto histórico e social. O
trabalho com a linguagem foi seu forte, a busca da palavra simbólica, da imagem
poética, e o ênfase na psicologia de seus personagens, fazerem de sua escrita uma
verdadeira obra de arte. Além disso, o retorno de um Japão feudal encontra-se nos
elementos empregados para recriar cenários tradicionais do povo japonês, e assim
resguardá-los da invasão ocidental.
Kawabata não ficava de acordo com as práticas suicidas, nem sequer com o ritual do
seppuku dos samurais da antiguidade, o método que foi utilizado por seu amigo Yukio
Mishima para apagar sua vida. Porém, aos 73 anos segundo se crie, ele decidiu tirar a
vida inalando gás. Me pergunto, até que ponto a literatura poderia protegê-lo dos
terríveis acontecimentos que viveu em sua vida? De todas formas quero destacar, que
ele foi um grande escritor, representante do século XX, nada pode apagar sua marca da
história da literatura japonesa. Ele foi um homem idealista que amava apaixonadamente
sua cultura e que lutou para protegê-la.
6.Bibliografia

ALBIZURI, Sebastián. El espacio velado. Kawabata: Algunas consideraciones


estéticas. IV Jornadas Hum. H.A. (2017)

KAWABATA, Yasunari. Frágil Recipiente; Dezesseis anos; O guarda-chuva. Em:


Contos da Palma da Mão. Tradução: Meiko Shimon. (2008).

KAWABATA, Yasunari. El bello Japón y yo; La existencia y el descubrimiento de la


belleza. En: Dos ensayos de Yasunari Kawabata. Traducción: Cristina Tsumura.
EPUB (2012).

OKAMOTO, MÔNICA S. Breve análise dos reflexos da Segunda Guerra Mundial nas
obras literárias japonesas. Em: Estudos Japoneses. São Paulo, n. 27. (2007).

RIVIÉRE, Jean. A arte japonês. Em: O arte oriental. Biblioteca Salvat de Grandes
Temas. (1973).

SEGAL, Ethan. Meiji and Taisho Japan: An Introductory Essay. Department of


history, Michigan State University. (2015).

SHIMON, Meiko. Yasunari Kawabata e Os contos que cabem na palma da mão. Em:
Os fragmentos do universo de Yasunari Kawabata. Cadernos de tradução n. 7.
Instituto de Letras. (1999)

WIKIPEDIA. Biografía de Yasunari Kawabata. Recuperado en:


https://es.wikipedia.org/wiki/Yasunari_Kawabata

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