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RESUMO: Por mais de 27 anos, O Repórter Esso informou o Brasil nos horários
tradicionais e nas surpreendentes edições extras. Devido à censura militar, em pelo
menos um momento histórico ele frustrou a sua audiência cativa: 1º de abril de 1964.
Quando as tropas do Exército ocupavam as ruas e o presidente João Goulart havia
deixado a Presidência da República, “a testemunha ocular da história” não pôde falar e
os ouvintes ficaram sem saber o que acontecia nos primeiros instantes do golpe militar.
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De 1943 a 1952, o Ibope acompanhava a audiência em unidades de 15 minutos, o que impossibilita
distinguir quem ouvia O Repórter Esso dos programas anteriores e posteriores. No entanto, fica claro que
durante a Segunda Guerra, em especial, o noticiário era extremamente popular, pois os módulos onde ele
estava apresentavam índices cerca de 25% mais altos que as unidades anteriores. O auge foi no primeiro
semestre de 1945, quando o crescimento alcançou 50%. Após a guerra, os índices começaram a cair de
maneira paulatina até a saída da síntese do ar em 1968, motivada por fatores de ordem interna - decisões
da área de Relações Públicas e Publicidade da Esso - e de ordem externa - procura do público pela nova
mídia eletrônica, a televisão.(Arquivo Edgar Levenroth, UNICAMP. Pesquisa de Audiência, Serviço de
Rádio, IBOPE, Agosto de 1950. Pesquisas Especiais, IBOPE, vol. 7, 1948, p. 367. Pesquisas Especiais,
IBOPE, vol. 11, 1952, pesquisa 18).
O estilo objetivo, contrastando com a realidade da programação da maioria das
emissoras, e a voz marcada de um único locutor, deram ao noticiário vibração,
agilidade, garantindo credibilidade junto ao público. As notícias da Segunda Guerra
Mundial, as primeiras transmitidas pelo noticioso, estimularam ainda mais a curiosidade
dos ouvintes para o novo formato que estreava no rádio brasileiro.
A primeira edição foi ao ar na Rádio Nacional do Rio de Janeiro em 28 de agosto de
1941. Um mês depois era retransmitido também em São Paulo e, a partir de meados de
1942, ocupava as emissoras de outros três centros políticos e econômicos do País: Porto
Alegre, Recife e Belo Horizonte.
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A partir de 1958, quando há a fusão com a International News Service
(INS), a UPA altera a sigla para UPI - United Press International.
O manual preconizava alguns cuidados e ações da equipe de produção, visando a evitar
problemas. Intitulado de Instruções básicas para a produção do Repórter Esso no
rádio: orientação geral e sugestões para as estações de rádio, locutores e a United
Press, era atualizado periodicamente, e foi inspirado no Manual Radionoticioso de la
United Press em America Latina, editado em 1944. Nele, a primeira instrução alertava
para a necessidade de isenção e de máxima imparcialidade, devido à associação natural
de O Repórter Esso à Esso Standard do Brasil. “É justamente esta a razão pela qual as
notícias não podem, não devem, de forma alguma, ter qualquer traço de partidarismo,
qualquer caráter opinativo. Reportar as notícias por mais duras que elas sejam, expondo
todos os fatos, esta é, realmente, a responsabilidade da nossa imprensa livre”
(KLÖCKNER, 2003, P. 67).
As recomendações tinham por objetivo evitar problemas para a United Press, para as
emissoras e para a Esso. Isso porque mesmo divulgando notícias, sem comentários, por
mais de uma vez o patrocinador esteve envolvido em situações desagradáveis, por causa
do programa. Um dos casos foi nos anos 50, durante a campanha do governo Vargas, O
Petróleo é Nosso, pouco antes da criação da Petrobrás, pois justamente o noticioso era
patrocinado por uma empresa multinacional interessada em que a exploração do
petróleo não fosse nacionalizada.
Uma das normas redacionais vinculava que as declarações expressas das notícias
somente poderia sair se partissem de altas autoridades (Presidente da República,
Governadores de Estado, Ministros e Secretários de Estado). Também desestimulava a
polêmica, que deveria ser descartada em detrimento do caráter puramente informativo
da notícia.
O quinto locutor de O Repórter Esso na Rádio Farroupilha de Porto Alegre,
Lauro Haggemann, recorda de um momento em que a censura recaiu sobre o noticiário.
Foi em 1955, durante a tentativa de impedir que Juscelino Kubitschek assumisse a
presidência. Embora as agências de notícias de São Paulo e Rio de Janeiro estivessem
proibidas de fornecer qualquer informação sobre o movimento, a Rádio Farroupilha
passou toda a noite transmitindo edições extraordinárias do Esso.
Através do noticiário internacional, vindo de Nova Iorque, transmitido por
Montevidéo, a rádio foi ouvida em todo o País. Segundo Lauro Haggemann, apenas na
manhã seguinte os censores perceberam, mas “ai a festa já tinha passado e o ambiente
estava desanuviado”. (ESSO CONTA..., 1977, p. 18 e 19).
3. A TESTEMUNHA VIU O GOLPE, MAS NÃO PÔDE FALAR
Na manhã do dia 1º de abril de 1964, assustados com o desfile de soldados e tanques de
guerra pelas ruas do país, milhões de brasileiros aguardaram, ansiosamente, uma hora
sagrada. A primeira edição radiofônica do Repórter Esso, às oito em ponto, certamente
passaria a limpo o Brasil daquelas tumultuadas horas. (O DIA EM QUE..., 1988, p.12 e
13).
Fábbio Perez permaneceu como locutor de O Repórter Esso de São Paulo até 1965.
Dois anos antes, ele concorreu com outros 400 candidatos para a escolha do titular do
noticiário no rádio e na televisão. Ele venceu para o rádio, substituindo o legendário
Dalmácio Jordão, enquanto na televisão o escolhido foi Lívio Carneiro Júnior.
Eu fiquei mais de um ano no Repórter Esso e depois houve um certo desinteresse, pois
estava tudo sob censura. A própria Esso já começava a se desinteressar. Tanto que anos
mais tarde, o Repórter Esso acabou de vez. Até chegar ao fim,. Depois de 64 ele
começou a perder prestígio, pois a censura no rádio e na televisão era muito severa. Eu
fui locutor até 1965 e o próprio pessoal da Esso mostrava sinais de desinteresse. Quem
produzia o noticiário não era a emissora, era a United Press, que era uma agência
internacional. E esse pessoal da agência, que era o Armando Figueiredo, o Belmiro
Madeira, todos aqueles velhos jornalistas que tomavam conta do Repórter Esso,
achavam que, com essa nova ordem, o Repórter Esso não iria longe, como de fato
acabou ocorrendo.
Vinte quatro anos se passaram até que Fábbio Perez pôde ler, como se ao vivo fosse, as
17 notícias, da edição das 8 horas da manhã, do dia 1º de abril de 1964. Desde 1988, o
documento sonoro consta do acervo do Museu da Imagem e do Som (MIS) de São
Paulo.