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AS MARCAS DA IGREJA

Una, Santa, Católica e Apostólica


Ensina o Credo Niceno (aceito por todas as confissões de fé cristãs) que a Igreja é objeto de
nossa fé.
Repete-se, no mesmo, que cremos na Igreja. Entretanto não é qualquer igreja que é objeto
da fé cristã. A Igreja, na qual se crê, tem marcas distintivas, como emblemas que a definem e
qualificam.
A primeira destas marcas da Igreja é que ela não é múltipla, mas uma única Igreja, ela
é Igreja UNA.
A unidade da igreja procede de seu fundamento do único Deus (Ef 4.1-6). Todos os que
pertencem verdadeiramente à igreja são um só povo e, portanto, a igreja verdadeira será
distinguida por sua unidade.
Esta unidade, porém, não implica necessariamente uniformidade total. Na igreja do Novo
Testamento havia uma variedade de ministérios (1 Co 12.4-6) e de opiniões sobre assuntos de
importância secundária (Rm 14:1-15:13).
Embora houvesse uniformidade nas convicções teológicas básicas (1 Co 15.11, BLH; Jd 3), a
fé comum recebia ênfases diversas, segundo as diferentes necessidades percebidas pelos
apóstolos (Rm 3.20; cf. Tg 2.24; Fp 2.5-7; cf. Cl 2.9s).

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Havia também uma variedade de formas de adoração. O tipo de culto em Corinto (1 Co
14.26ss) não era comum nas igrejas palestinas, onde a adoração se baseava no modelo da
sinagoga judaica e tinha um padrão mais formal, centrado na exposição da palavra escrita.
Este modelo tirado da sinagoga justifica o fato de as igrejas do primeiro século serem
consideradas um ramo do judaísmo. Tiago 2.2 usa até mesmo a palavra sinagoga para a
reunião dos cristãos. Existem também elementos discerníveis de mais de uma forma de
governo da igreja.
A verdadeira unidade no Espírito Santo de todo o povo regenerado é um fato independente
da desunião denominacional exterior.
Só existe uma Igreja: a Igreja de Jesus Cristo, ou a Igreja Cristã. A Igreja tem por marca a
sua singularidade. Isso significa que as igrejas que conhecemos, com nomes variados
(romana, grega, anglicana, luterana, presbiteriana, batista, metodista...) são denominações e
não Igreja, no sentido teológico do termo e que, por isso, não são objetos de nossa fé.
Ninguém deve crer na igreja católica, ortodoxa, episcopal etc.
A Igreja não é somente singular, mas também unida. Este é o sentido de Igreja Una. É uma
só e unida Igreja. As muitas caras da Igreja (as denominações) e que desembocam, tantas
vezes, em grupelhos que alimentam até ódio religioso são, na verdade, a negação da Igreja.
Isso significa que a unidade da Igreja não está em suas doutrinas particulares (estas,
estabelecem as diferenças), mas em Cristo que morreu pela Igreja.
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Cristo é o centro da unidade da Igreja e a razão de sua singularidade. Afirma Calvino sobre a
Igreja que: Onde quer que vemos a Palavra de Deus ser sinceramente pregada e ouvida, onde
vemos serem os sacramentos administrados segundo a instituição de Cristo, aí de modo
nenhum se há de contestar está a Igreja de Deus (Institutas, IV, I, 9).
A Igreja é una, visto que a ela tem uma missão só. Ela não tem muitas tarefas, muitas
obras, muitas missões.
Ser Igreja é que é a missão. Ela recebeu esta missão do Senhor: ser instrumento de Deus na
implantação do Seu Reino, ou seja, fazer com que a criação chegue ao alvo determinado por
Deus: a redenção!
Os frutos deste Reino: paz, amor, justiça, fé, esperança, entre outros mais, são modos
distintivos da missão da Igreja. Assim, a missão, base da unidade da Igreja, não é fazer
proselitismo (roubar gente de outras denominações para a "nossa igreja"): isso é trabalhar
contra a unidade da Igreja.
A Igreja é que é a missão assumida pelos eleitos que sabem ser ela instrumento de Deus
neste mundo para levar a cabo os propósitos de Deus para a Sua criação.
Ser fiel à pregação da Palavra e à ministração dos sacramentos é, em última análise,
permanecer na luta pela libertação deste mundo.
Pois esta é a sua preocupação: anunciar o Evangelho que promove a justiça, a paz, o amor,
a fé, a esperança.
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A segunda destas marcas da Igreja é que ela é santa. Isso significa dizer que ela é
separada deste mundo. Realmente este é o significado de Igreja (e k k l e s i a = e k
(preposição, deu origem ao sufixo latino "ex", "de fora") + k a l e w (verbo "chamar", numa
tradução literal do termo teríamos: "chamados de fora").
O povo de Deus forma a nação santa (1 Pe 2.9). No sentido mais profundo a igreja é santa,
da mesma forma que todo indivíduo cristão é santo em virtude de estar unido a Cristo,
separado para ele e revestido com sua justiça perfeita. Na sua posição diante de Deus em
Cristo, a igreja é irrepreensível e isenta de qualquer mancha moral.
Esta é a santidade da Igreja: ela foi chamada por Deus para servi-lo. Este serviço, que se
origina do chamado de Deus, é a santidade da Igreja.
Santa, neste caso, não pode ser visto de modo meramente moral (sem pecados ou maldades
– neste sentido, somente Deus é Santo, ou seja, sem pecado).
A santidade da Igreja é o seu serviço: ela está a serviço do Deus que é Santo. Quem quiser
encontrar santidade na Igreja olhando para os membros da Igreja e reparando como eles são
"santos", certamente terá uma grande decepção.
A Igreja presta este serviço a Deus no mundo. Ela é separada para servir a Deus e não
separada do mundo para ser de Deus.
Ela é separada para servir a Deus dentro deste mundo. Se julgar que sua santidade é o seu
afastamento do mundo, na verdade afastar-se-á do lugar do serviço de Deus e, por isso,
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servir-se-á e não ao Deus que a convocou, perdendo, assim, a santidade para qual foi
chamada.
Este é o ser da Igreja: servir a Deus no mundo. As tarefas realizadas pelas comunidades, em
situações históricas diferentes e diante dos desafios das várias e diferenciadas situações, têm
como princípio, meio e fim o serviço a Deus.
Isso significa dizer que a Igreja não faz evangelização, atendimento aos necessitados,
publicações, cultos dominicais, e seja lá mais o que fizer, a não ser dentro desta perspectiva
de sua santidade.
Razão porque o Novo Testamento conhece e reconhece que o Culto de Deus é o Serviço de
Deus: servir e cultuar a Deus são uma e a mesma coisa. Pode-se, pois, afirmar, com plena
convicção, que o culto prestado pela Igreja ao Seu Deus está na vida de serviço que tem.
Isto, porém, não é um "esforço" da Igreja. A sua santidade foi conquistada e é realizada em
Cristo: Jesus Cristo é quem apresenta a Igreja, diante de Deus, como santa, inculpável,
irrepreensível, sem ruga, sem marca.
E, assim como Seu Senhor, a Igreja serve ao Pai no serviço que presta à humanidade neste
mundo, lutando pelo amor, a paz e a justiça.
O Espírito, que é Santo, é quem garante a unidade e comunhão desta Igreja, reunindo-a no
mundo para proclamar as virtudes d’Aquele que a tirou das trevas para a Sua maravilhosa luz.

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Ao, pois, dizer que deve-se depositar confiança (cre) na santa Igreja, afirma-se o amor que
Deus tem por esta Igreja, chamando-a, separando-a, vocacionando-a, purificando-a dos seus
pecados e dando-lhe comunhão para que seja o "plano-piloto" do seu Reino em meio a este
mundo.
A terceira destas marcas da Igreja é que ela é católica. Este é um termo que, lido
assim, parece referir-se à Igreja Romana.
Pode até ser que sim, mas não só! O termo quer dizer Universal. Mas este é outro termo
problemático hoje em dia, pois pode parecer que se está falando da Igreja Universal do Reino
de Deus. O termo quer dizer Ecumênica. Mas isso também traz muito problema na maioria das
comunidades cristãs.
Primeiramente deve-se destacar que ao falar-se católica não se está pensando
quantitativamente, mas qualitativamente. A Igreja não é católica porque é grande, imensa,
quantitativamente, espalhada por toda a face do planeta (embora, a bem da verdade, isso
seja ótimo!).
Se de um lado o termo que dá emblema à Igreja, católica, quer dizer Igreja "abrangente",
isso significa, também, Igreja "integral". A Igreja que é objeto de nossa fé não é propriedade
de um povo, uma raça, uma nação, de uma classe social, de um segmento etário ou de um
dos sexos.

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A Igreja destina-se à todos, assim como a salvação em Cristo, objeto central, fundamental e
principal da Igreja. Ela transcende as barreiras que dividem a humanidade, sejam fronteiras,
sejam governos, partidos, culturas, raças, sexos, classes sociais.
Por isso, a Igreja afirma a sua catolicidade na medida que trabalha sempre para derrubar as
barreiras criadas pelos homens e que acabam gerando discriminações as mais variadas.
Vê-se, pois, que a questão fundamental que envolve a catolicidade da Igreja é, antes de
tudo uma questão qualitativa e que, como conseqüência, acaba por atingir a via quantitativa.
Porém, mesmo antes, no início, quando a Igreja era um minúsculo movimento recém saído
do judaísmo e constituída de poucas raças e seguimentos sociais, mesmo ali era ela católica,
pois apontava seus esforços na direção de todas as nações, de todos os povos, de todas as
pessoas e lutava, ainda que pobre e sem poder, contra as barreiras que separavam os seres
humanos.
A Igreja, é claro, é a expressão do amor de Deus, revelado na Sua eleição. Entretanto, a
Igreja em sua militância não tem como determinar os eleitos, mas somente anunciar a todos o
Evangelho do amor de Deus em Cristo: A saber: que Deus estava em Cristo reconciliando
consigo mesmo o mundo (Paulo).
Por isso a Igreja insere-se em todas as culturas, em todos os espaços humanos, para trazer
a mensagem transformadora do Evangelho de Deus em Cristo.

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A quarta destas marcas da Igreja é que ela é apostólica. Este é o fundamento sobre o
qual se ergue a Igreja. Aprendemos isso no N.T.: Jesus Cristo é a Pedra Angular que sustenta
o edifício; o fundamento é o testemunho, a doutrina, o ensino apostólico; as colunas são os
ministérios da Igreja; e, todos nós, as pedras vivas. Deus não tem, nem reconhece, nenhum
outro templo onde habitar.
O apóstolo é uma testemunha do ministério e da ressurreição de Jesus; é um arauto
autorizado do evangelho (Lc 6.12s; At 1.21s; 1 Co 15.8-10).
Os arautos tomam posição entre Jesus e todas as gerações subseqüentes da fé cristã; nós só
nos achegamos a ele por meio dos apóstolos e de seu testemunho sobre ele, incorporado no
Novo Testamento.
Neste sentido fundamental, toda a igreja é "edificada sobre o fundamento dos apóstolos" (Ef
2.20; cf. Mt 16.18; Ap 21.14). A apostolicidade da igreja encontra-se, portanto, no fato de ela
conformar-se à fé apostólica "que uma vez por todas foi entregue ao santos" (Jd 3; cf. At
2.42).
Os apóstolos ainda governam e organizam a igreja na medida em que esta permite que sua
vida, seu entendimento e sua pregação sejam constantemente reformados pelos ensinos das
Sagradas Escrituras.

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Foram os apóstolos de Jesus Cristo, fundadores da Igreja, que edificaram a Igreja. Por isso
receberam o ofício das chaves, ou seja, as "chaves da Igreja", pois a Igreja é, antes de tudo,
apostólica.
Ela não é de uma pessoa, de um bispado que se prolonga em linha de continuidade, não é
propriedade de uma raça, uma nação, um grupo, uma denominação.
Isso significa que na Igreja não se acredita no que se tem na cabeça, como se a fonte de
nossa fé fosse somente a nossa exclusiva relação com Deus.
Nossa relação com Jesus Cristo, sua doutrina, seus ensinos, suas intenções santas, estão
relacionadas aos apóstolos. Ora, o ensino apostólico encontra-se nas Escrituras Sagradas do
Novo Testamento, assim, as questões doutrinárias de fé, de prática e de consciência devem
estar coerentes com o ensino dos santos apóstolos de nosso Senhor Jesus Cristo.
Esta é a única autoridade da Igreja: ser apostólica. Ela fala com autoridade porque fala
conforme os apóstolos. Porém, e mais importante, ela age com autoridade porque age
conforme agiram os apóstolos.
Ela dá testemunho apostólico e exemplo apostólico. Os ministérios da Igreja estão sob uma
ordem: a ordem apostólica. Por isso, quer na palavra (pregação sobre a obra redentora de
Jesus Cristo), quer nos sacramentos (apresentação da obra redentora de Jesus Cristo), a
Igreja segue os apóstolos e, assim, e somente assim, podemos falar com toda a tranqüilidade
em sucessão apostólica (que nada tem haver com episcopado monárquico).
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A Igreja vive dessa seqüência (de seguir, ou suceder) aos apóstolos. Isso significa que de
um lado ela preserva, guarda, defende o que recebeu por herança dos apóstolos, persevera
naquilo que deles aprendeu.
De outro, na imitação de suas práticas, a Igreja renova e inova, recriando nos diferentes
contextos da história e da geografia deste mundo (ela é católica) a prática libertadora,
purificadora, santificadora, dos apóstolos de Cristo.
Na pobreza e simplicidade apostólicas a Igreja estende ao mundo a mão abençoadora de
Jesus livrando os homens das garras do mal, da opressão, das injustiças e do diabo.
Reivindicar o cargo apostólico em nossos dias é compreender erradamente o ensino bíblico e
oferece na prática um desafio grave com respeito à autoridade e finalidade da revelação divina
do Novo Testamento.
É igualmente errado entender a apostolicidade como uma continuidade histórica do
ministério, retrocedendo até Cristo e seus apóstolos através de uma sucessão de bispos. Esta
interpretação não tem nenhum apoio bíblico.
Toda noção da graça de Deus comunicada mediante uma sucessão histórica de dignatários
da igreja contraria o caráter da própria graça, conforme os escritos bíblicos.
O catolicismo romano estende esta interpretação de "apostólico" para incluir a reivindicação
de que o Bispo de Roma é o sucessor histórico de Pedro e o guardião especial da graça de
Deus na igreja. A alegação é insustentável.

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A primazia de Pedro entre os apóstolos não passou de uma clara liderança no período da
primeira missão cristã. Ele claramente recuou para um segundo plano à medida que a igreja
avançou fora de Jerusalém, sendo Paulo nomeado para liderar a missão fora da Palestina e
quando João lutava para corrigir as igrejas prejudicadas pelos falsos mestres.
É bem significante que Pedro não apareceu no papel principal no Concílio de Jerusalém (At
15), e que ficou claramente à sombra de Paulo no incidente registrado em Gálatas 2.
Roma alega ainda que esta suposta supremacia de Pedro deveria continuar para a salvação
eterna e bem contínuo da igreja. Nenhum dos versículos citados como apoio escriturístico (Mt
16.18s; Jo 21.15-17 e Lc 22.32) faz qualquer referência a um sucessor de Pedro.
Essas duas reivindicações romanas contrariam a evidência manifesta no Novo Testamento, e
a terceira, de que a primazia de Pedro se estende ao bispo de Roma, é ainda menos digna de
crédito.
O fato de Pedro ter terminado sua vida como mártir em Roma é uma tradição primitiva que
encontra apoio razoável; as dificuldades histórica, porém, para mostrar que houve uma
sucessão estabelecida de bispos monárquicos de Roma, a partir do primeiro século, são
intransponíveis.
A sucessão apostólica é na verdade a sucessão do evangelho apostólico, quando o depósito
original de verdade apostólica é passado de uma para outra geração: "homens fiéis ... para
instruir a outros" (2 Tm 2.2).

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A igreja é apostólica à medida que reconhece na prática a autoridade suprema das escrituras
apostólicas.
Aprendemos com João Calvino que "onde quer que vemos a Palavra de Deus ser
sinceramente pregada e ouvida, onde vemos serem os sacramentos administrados segundo a
instituição de Cristo, aí, de modo nenhum, se há de contestar, está uma Igreja de Deus..."
(Institutas, IV, I, 9). Isso significa que, por esses sinais identifica-se a Igreja.
A Igreja, por ser apostólica, tem como sinal claro a pregação apostólica, ou seja,
conforme ensinaram os apóstolo. Tudo o que deveríamos conhecer e saber foi-nos dado por
Deus, através dos santos apóstolos, na Escritura Sagrada.
Por essa razão, este sinal da Igreja (a correta pregação da Palavra de Deus) está ligado à
sua marca preponderante (ser a Igreja apostólica).
A Palavra de Deus deve ser pregada sinceramente. Este é um termo muito cheio de
significado: sincero quer dizer sem cera. As ceras eram usadas para esconder rachaduras em
vasos por comerciantes que desejavam enganar os consumidores.
A correta pregação da Palavra não esconde a verdade, antes a coloca claramente aos
ouvintes. Por isso, parte dessa marca não é somente a sincera pregação, mas a
correspondente escuta da mesma. Na Igreja a Palavra deve ser acolhida, quando pregada na
linha apostólica e com sinceridade, de modo manso e obediente. Por isso diz Tiago: Acolhei

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com mansidão a Palavra em vós implantada, a qual é poderosa para salvar as vossas almas
(1:21).
Vê-se, pois, que a pregação e o acolhimento da Palavra de Deus são indiscutíveis sinais da
Igreja de Jesus Cristo. Mas o que Calvino quer destacar é que não é somente um mero falar e
um mero ouvir.
Não é uma questão de comunicação somente. Está implícito que este falar e este ouvir
correspondem a um praticar. Considerando que na tradição calvinista o único intérprete fiel da
Palavra é o Espírito Santo, pois é Ele quem nos revela a Cristo e aplica os benefícios da graça
ao nosso coração, a aplicação da Palavra de Deus ao coração do cristão é obra eficaz do
Espírito Santo.
Consequência disso é a prática desta Palavra: Tornai-vos, pois, praticantes da Palavra, e não
somente ouvintes, enganando-vos a vós mesmos (Tg. 1:22).
Neste sinal fala-se de duas submissões: do ministro no falar e da comunidade no ouvir.
Ambos, como sinal da Igreja, quer no anunciar, quer no ouvir e praticar, devem estar
submissos a Deus que opera, pela Palavra, através do Espírito Santo.
A Igreja de Cristo está submissa à Palavra de Cristo, pois é a Igreja Apostólica, unida no
poder do Evangelho, santificada pelo Espírito que a consagra para si.
A Igreja, por ser apostólica, expressa como seu claro sinal, conforme o ensino de Jesus que
nos advêm destes mesmos apóstolos, os Santos Sacramentos. Este é um termo latino,
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tradução do termo grego bíblico mysterion (m u s t h r i o n ). Este termo, na Bíblia, é usado
para descrever todas as coisas ou sinais que representam sublimidades espirituais.
A pregação da Palavra de Deus nos orienta a fé e a conduz às verdades de Deus, os
Sacramentos, foram instituídos por Deus para o mesmo fim.
Eles consistem em um sinal externo mediante o qual o Senhor sela a nossa consciência com
as verdades eternas de suas promessas (que outra coisa não é senão a Sua bondade para
conosco), para sustentar a debilidade de nossa fé e nos fortalecer nas promessas de Sua
Palavra.
Seria como que um modo de calcar e recalcar as verdades do Evangelho de Jesus Cristo em
nosso coração tardo e néscio para compreende-las.
Na pregação da Palavra de Deus existe um sinal externo (a Escrituras Sagradas), nos
Sacramentos há, também, um sinal externo (que é o elemento material neles usados – água,
pão e vinho).
Como a Palavra de Deus nos promete a boa e misericordiosa graça de Deus, os Sacramentos
também não existem sem uma promessa que os fundamente e garanta. Por isso, Calvino,
ensinando sobre o Sacramento, diria que o mesmo é a Palavra visível (...) Destrate, certo é
serem-nos pelo Senhor oferecidos a misericórdia e o penhor de Sua graça tanto por Sua
sagrada Palavra, quanto pelos Sacramentos (Institutas, IV, XIV, 6 e 7).

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Assim como na Palavra torna-se necessária a fé para que a sua mensagem seja
compreendida e apreendia, nos Sacramentos, também, sem a fé de nada aproveitam.
Não há outro modo de atuação da graça de Deus, que nos é apresentada na Sua Palavra, a
não ser pela fé. Assim, também, a graça de Deus, que nos é apresentada nos Sacramentos,
torna-se eficaz e eficiente no coração que tem fé. Como a fé é um dom de Deus aos eleitos,
deve-se afirmar, com toda a certeza, que os Sacramentos de Deus são oferecidos, somente,
aos Seus eleitos que já foram despertados pelo dom da fé.
Assim como a atuação da graça de Deus torna-se eficiente ao coração que a recebe por fé,
somente por meio do Espírito Santo, também, o Sacramento, somente pela atuação poderosa
do Espírito Santo, aplicando-nos os benefícios apresentados no Sacramento, torna-se eficaz na
vida do crente. Por isso, os Sacramentos confirmam a Palavra Deus, pois, representam a
Cristo e nos apresentam a Sua graça bendita, no poder do Espírito.
Outro sinal fundamental da Igreja de Cristo é a sua disciplina. Tal disciplina está
relacionada à sua fidelidade à Palavra de Deus. Razão porque nós, presbiterianos, ao
recebemos um membro à comunhão de nossa fé exigimos fidelidade à disciplina às
autoridades constituídas para seu governo enquanto forem fiéis à Palavra de Deus.
Infelizmente este termo tem sido muito mal interpretado dentro da Igreja, confundindo-se
disciplina com castigo e governo com autoritarismo. Mas disciplina tem muito mais a ver
com ensinar, educar, corrigir do que com julgar, condenar e punir.
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Veja-se, por exemplo, o verbo grego que traduzimos por exortar. Pode parecer a alguns que
seu sentido seja "chamar a atenção" no sentido de "passar um ‘sermão’", o que nada se
coaduna com o significado do termo.
Exortar vem do verbo grego p a r a k a l e w (parakaleo), que é a junção da preposição p a r
a (para = do lado, ao lado, junto de) e do verbo k a l e w (chamar), literalmente, significa
chamar ao lado, ou chamar para ficar ao lado.
A idéia seria um apelo, ou rogo para estar ao lado, estar no mesmo caminho, estar junto.
Por esta razão ele é traduzido por pedir, convidar, rogar, consolar, encorajar. Esta não é outra
senão a missão do Espírito Santo, que foi denominado por Jesus de outro Õ a r a k l h t o s
(parakletos) ou seja Consolador.
Disciplinar, neste sentido, significa ficar ao lado de alguém, instar, ensinar, encorajar, dar o
suporte e o amparo necessários para que não haja quedas, ou tropeços, ou desvios do
caminho. Isso nada tem a ver com julgar, punir, condenar.
Antes é um chamado à Igreja se responsabilizar pela educação, correção, orientação
pedagógica e pastoral de todos os seus membros. Destarte tem mais ligação com
misericórdia, amor, consolo e animação.
Por esta razão Paulo exorta "através de Cristo", "por meio de Cristo", "na misericórdia do
Senhor" (Rm. 12:1), "pelo amor do Espírito" (Rm. 15:30), por meio da "mansidão e da
benignidade de Cristo" (II Co. 10:1).
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Em Paulo o termo é o oposto de tribulação, sofrimento, morte (I Co. 1: 3-11). Razão porque
prometeu Jesus que os que choram, receberiam consolo (Mt. 5:4). Não é outra a disciplina da
Igreja senão curar, educar, assumindo o lado do outro, entrando no seu caminho para lhe
endireitar as veredas. Julgar, condenar e punir gera tribulação, sofrimento e dor e nada tem
que ver com o consolo amoroso do Espírito.
Vê-se, pois, que a primeira Igreja, descrita pelo autor do Livro dos Atos dos Apóstolos, a
destacar o modo apostólico de viver-se Igreja, que a mesma "perseverava na doutrina dos
apóstolos, na comunhão, no partir do pão e nas orações" (At. 2:42).
O ensino apostólico (didaskalia), a comunhão que gera e produz unidade (koinonia), o
repartir do alimento e dos bens (diakonia) e a vida de culto onde ouve-se a Palavra e fala-se
com o Senhor da Igreja (liturgia), eram as características da Igreja de Cristo. A Igreja de
Cristo está, pois, fundamentada na Palavra, nos Sacramentos e na Disciplina, garantia de sua
unidade, santidade, catolicidade e apostolicidade.

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