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INTERVENÇÕES PSICOTERÁPICAS EM LUTO PERINATAL

Aldo Schirmer Neto


Aluno concluinte do curso de Psicologia da Atitus Educação

Profº Mestre Cristiano Pereira de Oliveira


Professor orientador do presente artigo científico

Resumo

Pouco material têm se produzido acerca da temática “luto perinatal”, apesar do alto

índice de falecimento gestacional e neonatal. Diante disso, o presente estudo objetivou

elencar as possíveis intervenções psicoterápicas para esta modalidade de luto. Trata-se de

uma revisão de escopo baseado na metodologia do Instituto Joanna Briggs e na

recomendação PRISMA. Utilizou-se as bases de dados da PubMed e do Google Acadêmico,

onde foram selecionados 7 estudos para análise. As intervenções elencadas nesta revisão

demonstram evidências de eficácia e podem ser consideradas para a prática clínica,

observando as peculiaridades de cada caso.

Abstract

Little material has been produced on the theme of perinatal mourning, despite the high

rate of gestational and neonatal deaths. Therefore, the present study aimed to list the possible

psychotherapeutic interventions for this type of mourning. This is a scope review based on

the Joanna Briggs Institute methodology and the PRISMA recommendation. PubMed and

Google Scholar databases were used, where 7 studies were selected for analysis. The

interventions listed in this review demonstrate evidence of effectiveness and can be

considered for clinical practice, observing the peculiarities of each case.

Resumen

Poco material se ha producido sobre el tema del duelo perinatal, a pesar de la alta tasa

de muertes gestacionales y neonatales. Por lo tanto, el presente estudio tuvo como objetivo
enumerar las posibles intervenciones psicoterapéuticas para este tipo de duelo. Esta es una

revisión de alcance basada en la metodología del Instituto Joanna Briggs y la recomendación

PRISMA. Se utilizaron las bases de datos PubMed y Google Scholar, donde se seleccionaron

7 estudios para su análisis. Las intervenciones enumeradas en esta revisión demuestran

evidencia de efectividad y pueden ser consideradas para la práctica clínica, observando las

peculiaridades de cada caso.

Introdução

Muitos estudos têm retratado o processo do luto, no entanto, pouca atenção é

dispensada ao luto perinatal. A perda perinatal ocorre na situação de falecimento fetal ou

neonatal até 28 dias de vida (Woods & Woods, 1997). Segundo o Painel de Mortalidade

Infantil do Ministério da Saúde (2021) ocorreram, no ano de 2021, 74.010 óbitos fetais e

neonatais. Diante desta informação, ressalta-se sobre a importância de um olhar mais acurado

aos pais que estão na condição de luto em virtude destas perdas (Mercer, 2002) .

No que diz respeito a experiência da perda, Doka (2016) pontua que todos que

experimentam os atributos relacionados ao vínculo, afeto e amor, também estão suscetíveis a

experimentar as emoções relacionadas ao luto. Na verdade, luto e amor são dois conceitos

que caminham juntos, de acordo com Parkes (2022). O entendimento do luto é ampliado

quando se analisa a natureza do ato de se vincular e de se ter afeto, haja vista que o luto se

apresenta como o resultado de um vínculo que se formou durante a vida (Parkes, 2022).

O luto é um processo que envolve uma gama de sentimentos e comportamentos que

são considerados normais após o falecimento de alguém cujo afeto se fazia presente (Worden,

2013). Worden (2013) destaca que existe um padrão no que se refere às características do luto

normal, a saber: 1. Alguma perturbação somática; 2. Ruminação com a pessoa falecida; 3.


Sentimento de culpa; 4. Irritabilidade; 5. Não capacidade de realizar atividades da mesma

forma que antes a perda.

A morte carrega em si um símbolo de radicalidade, choque e surpresa, segundo a

professora Maria Helena Franco (2000). Tais aspectos fazem emergir sentimentos profundos

e singulares que são carregados durante um longo período de tempo e que causam impacto

não somente no âmbito individual, mas também no ambiente familiar e social (Franco, 2000).

O luto ocorre de forma individual, ou seja, é uma experiência que ocorre de pessoa

para pessoa. Apesar da presença dos sentimentos pesados e intensos, o luto é uma

oportunidade de abertura para experiências relacionadas à gratidão, amor e benevolência

(Luz, 2021).

Parkes (1998) entende o luto como um processo. Em outras palavras, trata-se de um

estado onde sentimentos, emoções e comportamentos se fazem presentes em diferentes

tonalidades e, além disso, se misturam. Além disso, o autor pontua que o luto traz consigo

outros tipos de perda além da própria pessoa que se despediu. Isso significa que a perda

também se dá no âmbito da amizade, no espaço profissional ou, ainda, um cidadão que

influenciava o seu entorno. Dá-se o nome de “perda secundária” para esta visão de luto

(Parkes, 1998).

A luz dos conceitos supracitados, verifica-se que o luto é uma experiência natural de

um indivíduo que sofreu com o rompimento de um vínculo afetivo. Contudo, em alguns casos

esta experiência pode não encontrar espaços para processamento. Para estas situações,

observa-se a existência de lutos não reconhecidos socialmente. É o caso do falecimento de

um animal de estimação, situações de divórcio, luto perinatal, etc.

O conceito de luto não reconhecido está relacionado à construção de nossa sociedade.

As relações sociais estão amparadas em regramentos que estão generalizadas socialmente.

Diante desta realidade, algumas perdas não são validadas e o luto não é experimentado e
processado corretamente. Como consequência, muitas pessoas não são assistidas

adequadamente, uma vez que muitos profissionais não observam a necessidade de realizar

intervenções nestas situações de luto não reconhecido (Casellato, 2015).

No contexto do luto não reconhecido, as experiências agonizantes e profundas que

precisam de um espaço para vivência são escanteados e deixadas de lado. Sendo assim, a

experiência do luto torna-se uma caminhada solitária e sem o devido auxílio para este

percurso e, além disso, o próprio enlutado percebe-se como indigno para ter sentimentos

oriundos de uma perda (Casellato, 2015).

Em suma, o luto não reconhecido se reflete na ausência de empatia com o sofrimento

alheio e trata-se do fracasso de uma sociedade que não se permite olhar para o sofrimento

enquanto uma experiência singular e multifatorial. Além disso, trata-se do não exercício de

validar e acolher sofrimentos que são genuínos, autênticos e importantes para quem vive. Ao

contrário, tais aspectos são ignorados e não tratados corretamente (Casellato, 2015).

No caso do luto perinatal, a morte do bebê é negada, segundo Iaconelli (2007), uma

vez que para os outros tipos de morte, existem rituais e tratativas que atribuem a esta perda o

status de morte: o corpo é vestido, limpo e velado em uma cerimônia. Contudo, para

recém-nascidos falecidos isto não é oportunizado da mesma forma pois os pais não são

consultados no que tange aos rituais que podem ser criados (Iaconelli, 2007). A escuta a estes

enlutados não ocorre da mesma forma, como se estes não tivessem perdido um filho(a). Na

verdade, o que se registra é exatamente isso: o que se perdeu foi a gestação e não um filho(a)

(Iaconelli, 2007).

Neste cenário, se estabelece uma condição de trauma para aqueles que vivem o luto

perinatal, haja vista que a dor ocasionada pela perda não encontra espaço para ser vivida

(Iaconelli, 2007). É um cenário de não compreensão, onde a ordem natural da vida não se

observa, pois o que ocorreu foi a partida de um filho antes do próprio pai (Iaconelli, 2007).
Diante desta realidade, Iaconelli (2007) destaca a importância dos pais enlutados participarem

de grupos cujas pessoas passaram pela mesma situação.

A respectiva temática será o assunto protagonista para a presente revisão e será

abordado, principalmente, as formas de intervenção para aqueles que passam pelo luto

perinatal. Portanto, o objetivo geral do presente estudo corresponde a elencar as possíveis

intervenções em luto perinatal.

Método

Trata-se de uma revisão de escopo que consiste em apresentar as evidências de

pesquisas no que se refere a intervenções em luto perinatal. O presente estudo foi realizado

com base nos Principais Itens para Relatar Revisões Sistemáticas e Meta-análises: a

recomendação PRISMA, bem como baseado no manual do Instituto Joanna Briggs.

Para tanto, adotou-se a seguinte questão norteadora: quais as possíveis intervenções

terapêuticas para o luto perinatal? Diante desta questão, discorreu-se sobre as intervenções

utilizadas e os resultados obtidos em cada estudo.

Critério de Elegibilidade dos Estudos

Considerou-se, para a presente revisão, estudos de caráter quantitativo e qualitativo

que contemplem intervenções para o luto perinatal. Foram incluídos artigos, não

considerando teses, livros, banners ou documentos técnicos e governamentais. No tocante ao

limite temporal, elegeu-se estudos que estivessem no período de 2012 a 2022 e não houve

restrições para idioma. Como descritores de pesquisa, utilizou-se a expressão “Intervenção

em Luto Perinatal”. Excluiu-se estudos que contemplam intervenções não psicoterápicas

(como intervenções farmacológicas), intervenções cuja praticidade não foi detalhada e

estudos de revisão sistemática.


Fontes de Informação e Estratégia de Busca

Realizaram-se buscas entre o período de Julho de 2022 até Novembro de 2022.

Utilizou-se, como fonte de busca, as plataformas PubMed e Google Acadêmico. Como

estratégia de busca, a pesquisa foi realizada com o descritor “Perinatal Grief Intervention” na

PubMed. No Google Acadêmico, utilizou-se o mesmo descritor, com o filtro “no título do

artigo” selecionado.

Processo de Coleta de Dados e Síntese de Resultados

A extração dos elementos mais importantes de cada estudo foi sistematizada em uma

planilha do Google Docs, para a organização dos artigos. Considerou-se para esta planilha os

autores, ano de publicação, país de origem do estudo, critérios de elegibilidade (para

aceitação ou não do estudo), objetivo do estudo, desenho, período gestacional cuja perda

ocorreu, nº de participantes do estudo, intervenção utilizada e nível de evidência..

No tocante ao nível de evidência e o grau de recomendação, utilizou-se a classificação

da JBI, conforme apresentado na Tabela 1.

Tabela 1
Nível de evidência e Grau de Recomendação
NÍVEL DE EVIDÊNCIA GRAU DE RECOMENDAÇÃO
1.a – Revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados
controlados.
Nível 1: Estudos 1.b – Revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados
experimentais controlados e outros desenhos de estudo.
1.c – Ensaio clínico randomizado controlado.
1.d – Pseudo ensaio clínico randomizado controlado
2.a – Revisão sistemática de estudos quase experimentais.
Nível 2: Estudos quase 2.b – Revisão sistemática de estudos quase experimentais e
experimentais outros desenhos de menor evidência.
2.c – Estudo prospectivo controlado quase experimental.
2.d – Pré-teste e pós-teste ou estudo de grupo controle
histórico/retrospectivo.
3.a – Revisão sistemática de estudos de coortes comparáveis.
3.b – Revisão sistemática de coortes comparáveis e outros
Nível 3: Estudos analíticos desenhos de estudo de menor evidência.
observacionais 3.c – Estudo de coorte com grupo controle.
3.d – Estudo caso controle.
3.e – Estudos observacionais sem um grupo controle
4.a – Revisão sistemática de estudos descritivos.
Nível 4: Estudos descritivos 4.b – Estudo transversal.
observacionais 4.c – Séries de casos.
4.d – Estudo de caso

Nível 5: Opinião de 5.a – Revisão sistemática de opinião de especialistas.


especialista e pesquisas de 5.b – Consenso de especialistas.
bancada 5.c – Pesquisa de bancada/opinião de um especialista

Resultados

Através das estratégias de busca, identificaram-se um total de 14 estudos, sendo que

todos foram lidos na íntegra. Após análise, 7 artigos foram excluídos em virtude de não

estarem dentro dos critérios de elegibilidade, uma vez que apresentaram intervenções não

psicoterápicas, intervenções farmacológicas e intervenções que não possuíam detalhamento

prático da técnica psicoterápica. Por fim, obteve-se um total de 7 estudos elegíveis para a

presente revisão conforme ilustrado na Figura 1 e descrito na Tabela 2.


Tabela 2
Intervenções em Luto Perinatal
DESENHO
NÍVEL DE
TÍTULO AUTOR(A) PAÍS OBJETIVO DO INTERVENÇÃO
EVIDÊNCIA
ESTUDO
Analisar os
resultados de
uma Protocolo de Intervenção durante a
intervenção permanência da enlutada no hospital,
A Randomized Trial of
realizada em baseado no Guidelines For Medical
a Bereavement Johnson et al.
EUA um centro Quantitativo Professionals Providing Care To The 1.C
Intervention for (2015)
obstétrico para Family Experiencing Perinatal Loss,
Pregnancy Loss
mulheres que Neonatal Death, Sids Or Other Infant
sofreram com Death
aborto
espontâneo
Analisar os
resultados da
intervenção
Women generating
cognitiva
narratives after an
narrativa em
unwanted prenatal Rocha et al.
Portugal mulheres que Quantitativo Terapia Cognitiva Narrativa 1.C
diagnosis result: (2018)
precisaram
randomized controlled
interromper a
trial
gestação por
motivos
clínicos
Analisar a
Interpersonal eficácia da
Psychotherapy (IPT) for terapia
Major Depression interpessoal em
Johnson et al.
Following Perinatal EUA mulheres que Quantitativo Terapia Interpessoal 1.C
(2016)
Loss: A pilot sofrem de
randomized controlled depressão após
trial a perda
gestacional
Analisar a
eficácia da
Development and terapia
Preliminary Evaluation cognitiva
of a Bennett et al. comportamenta Quali -
EUA Terapia Cognitivo Comportamental 2.C
Cognitive-Behavioral (2012) l adaptada a um Quantitativo
Intervention for grupo de
Perinatal Grief mulheres que
sofreram uma
perda perinatal
Analisar a
viabilidade e
Mindfulness-based aceitabilidade
Intervention for Roberts et al. do conceito e Quali -
EUA Mindfulness 2.C
Perinatal Grief after (2015) aplicação do Quantitativo
Stillbirth in Rural India Mindfulness
para a
população
Indiana

Analisar a
Mindfulness-based
eficácia de uma
intervention for
intervenção
perinatal grief in rural Roberts et al. Quali -
EUA baseada no Mindfulness 2.C
India: improved mental (2016) Quantitativo
Mindfulness
health at 12 months
adaptada a
follow-up
cultura indiana

Mindfulness-based Analisar a
Intervention for eficácia de uma
Perinatal Grief intervenção
Roberts et al. Quali -
Education and EUA baseada no Mindfulness 2.C
(2016) Quantitativo
Reduction among Poor Mindfulness
Women in Chhattisgarh, adaptada a
India: a Pilot Study cultura indiana
Características das Publicações

Diante dos 7 estudos selecionados, observa-se a presença de artigos de caráter

quantitativo (n = 3) e quali-quantitativa (n = 4). Os estudos foram realizados em sua maioria

nos EUA (n = 6) e em Portugal (n = 1). No que se refere ao nível de evidência, identificou-se

1.C (n = 3) e 2.C (n = 4), conforme o nível de evidência apresentado no Tabela 1.

No que diz respeito às intervenções, identificou-se a utilização da Terapia Cognitiva

Comportamental (n = 1), Terapia Cognitiva Narrativa (n = 1), Terapia Interpessoal (n = 1),

Mindfulness (n = 3) e o Protocolo de Intervenção durante a permanência do enlutado(a)

baseado no Guidelines For Medical Professionals Providing Care (n = 1).

Intervenções

TERAPIA COGNITIVA NARRATIVA

Rocha, J., Nunes et al (2018) retrata a intervenção da terapia cognitiva narrativa para

mulheres que precisaram interromper a gravidez devido a uma condição clínica. O prisma

utilizado na referida terapia refere-se ao conjunto de histórias que lançam a base e tornam-se

protagonistas na vida psíquica de um indivíduo (Morgan, 2006). Neste viés, o terapeuta

centraliza sua atuação nas narrativas destas histórias bem como o significado atribuído a elas

(Morgan, 2006). Busca-se analisar quais são as histórias “rasas” e “superficiais" relatados

pelos pacientes, a fim de analisar, sob a luz de outras histórias, conclusões alternativas para

cognições desadaptativas (Morgan, 2006). Em suma, objetiva-se uma re-autoria e re-narração

das narrativas (Morgan, 2006).

No estudo da presente revisão Rocha, J., Nunes et al (2018) estruturou a intervenção

em quatro etapas, sendo a primeira ocorrida antes da interrupção da gestação, a saber: 1.

Contextualizar o significado do problema clínico detectado; 2. Exploração dos componentes

cognitivos e as emoções desencadeadas em virtude do procedimento de interrupção; 3.


Desenvolver outras perspectivas do ocorrido por intermédio de metáforas; 4. Continuação no

desenvolvimento de metáforas e outras narrativas para o episódio de interrupção.

Como forma de avaliação de resultados, utilizou-se o Inventário de Depressão Beck, a

Escala Zung e a Escala de Luto Perinatal, nos primeiros 15 dias após a interrupção. A

avaliação foi repetida 06 meses após a perda. De forma geral, a intervenção se mostrou

eficaz, com resultados melhores em comparação ao grupo controle.

TERAPIA INTERPESSOAL

Trata-se de uma abordagem com um foco nos relacionamentos interpessoais e

considera este aspecto como um dos principais fatores para problemas psíquicos. Sob o

prisma do luto, a referida intervenção visa analisar o relacionamento do paciente com a

pessoa falecida, visando identificar possíveis negações relacionadas a morte e sentimentos

conflitantes, a fim de abrir novos vínculos que possibilitem ao sujeito sair de um estado de

estagnação frente às possibilidades da vida (Mello, 2004).

Visando adaptar a TI para a perda perinatal, o estudo elencado nesta revisão

estruturou a intervenção com o objetivo de: 1. saber administrar a reação dos outros quanto a

perda, contemplando habilidades frente a estereótipos sociais que podem acarretar em

dificuldades para a passagem do luto; 2. refletir sobre questões de culpa e significado; 3.

explorar possibilidades de dar continuidade ao vínculo com o filho que faleceu (Johnson et

al., 2016).

A intervenção deste estudo foi estruturada em 12 sessões, realizadas em grupo. As

temáticas a seguir foram abordadas em, pelo menos, três oportunidades: 1. Os sentimentos do

luto; 2. Entender o que aconteceu; 3. Atravessar o luto com os outros; 4. Honrar a memória

de quem partiu (Johnson et al., 2016).


No tocante aos resultados da intervenção, comparou-se as avaliações com um grupo

controle cuja terapia adotada abordou a “Coping With Depression” que, basicamente, aborda

aspectos cognitivos comportamentais para depressão. Diante desta comparação, constatou-se

que a Terapia Interpessoal mostrou-se mais eficaz (Johnson et al., 2016).

PROTOCOLO DE INTERVENÇÃO BASEADO NO GUIDELINES FOR MEDICAL

PROFESSIONALS PROVIDING CARE

O estudo que contemplou a intervenção supracitada foi baseado no Guidelines For

Medical Professionals Providing Care, que é uma cartilha criada pelo US Departament of

Health Resources and Services Administration com instruções e princípios para situações de

luto perinatal .

O setting para aplicação deste protocolo, segundo o referido artigo, trata-se da

emergência do hospital, onde ocorreram as perdas gestacionais. Neste sentido, o estudo

sugere os seguintes princípios para intervenção com mães que estiveram neste contexto: 1.

Prévia identificação do quarto e prontuário; 2. Contato com o líder espiritual da paciente; 3.

Atender a pedidos especiais da mãe, como, por exemplo, batismo ou orações. 4. Conceder um

pacote de sementes para a paciente levar para casa; 5. Conceder um urso de pelúcia macio; 6.

Demais recordações físicas do bebê que partiu; 7. Realização de uma cerimônia de nomeação

do bebê; 8. Preenchimento de um cartão de lembrança auto-endereçado (Johnson et al.,

2015).

Utilizou-se para avaliação desta intervenção a Perinatal Grief Scale. Os resultados do

grupo de intervenção foram comparados a um grupo de pacientes cuja perda foi tratada

apenas com cuidados para dor física. Constatou-se que os aspectos “luto ativo” e “dificuldade

em lidar”, não obteve diferenças significativas. Porém, no tocante a variável “desespero”

houve a constatação de um escore menor para o grupo de intervenção (Johnson et al., 2015).
TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL

A intervenção retratada em Bennett, S. M et al (2012) retrata a aplicação de 8 sessões

da TCC clássica a 5 mulheres que sofreram perda perinatal. Segundo Rangé (2011), a terapia

consiste em apresentar ao enlutado sobre o que se esperar para o percurso do luto. Neste

sentido, objetiva-se desenvolver novas habilidades cognitivas e comportamentais, a fim de

readaptar o sujeito em sua rotina de vida (Rangé, 2011). Para tanto pondera-se a criação de

rituais de despedida e transição (cartas de despedida, etc). Além disso, visa-se monitorar os

pensamentos disfuncionais e ansiosos através do Registro de Pensamentos Disfuncionais

(Rangé, 2011).

No estudo em questão, houve o emprego de 08 sessões da Terapia Cognitiva

Comportamental, a saber: I - Psicoeducação: Esclarecimento sobre os principais sintomas e

emoções na ocorrência de uma perda; II - Desenvolvimento de habilidades de manejo

emocional; III - Desenvolvimento de habilidades cognitivas e avaliação de pensamentos

disfuncionais; IV - Análise do suporte social e alternativas para este suporte; V - Trabalho de

exposição às emoções (imaginário, in vivo, narrativo); VI - Continuação da exposição a

sentimentos e emoções; VII - Exposição com avaliação de outras narrativas para a perda; VIII

- Revisão das habilidades aprendidas e desenvolvimento de um plano para dar continuidade

(Bennett, S. M et al, 2012).

O estudo trata-se de uma avaliação de aplicabilidade da intervenção, no entanto, não

possui grupo controle para comparação. Os resultados foram analisados através do Perinatal

Grief Scale que demonstrou redução nos sintomas de luto para alguns participantes. Contudo,

os escores não diminuíram o suficiente diante da significância clínica para alguns

participantes, o que demonstra, segundo o artigo, a necessidade de ponderação sobre a

quantidade de sessões para a prática clínica desta intervenção (Bennett, S. M et al, 2012).
MINDFULNESS

Trata-se de uma técnica que visa auxiliar o enlutado(a) a plena atenção ao presente e

no aqui e agora. Nossa mente atenta-se em situações passadas e em aspectos futuros que, se

desadaptados, causam sofrimento. Neste contexto, o mindfulness ajuda o indivíduo a

manter-se conectado com o presente (Gillihan, 2020).

A intervenção descrita nos artigos desta revisão descrevem a aplicação do

Mindfulness na população indiana, especialmente em mulheres do interior e de origem

humilde. Apesar de dificuldades de aplicação em virtude de fatores culturais, a aplicação se

mostrou eficaz em alguns aspectos do luto.

Discussão

Este estudo veio corroborar com a temática luto perinatal e lutos não reconhecidos,

haja vista que contempla possíveis intervenções para enlutados(as) que não possuem

validação social para a vivência deste processo crucial da existência humana. As intervenções

contempladas neste estudo englobam técnicas para diferentes contextos e situações. Além

disso, apresenta formas diferentes de atuar em situações de luto perinatal.

Primeiramente, ressalta-se a ausência de uma quantidade mais significativa de estudos

que contemplem intervenções para o luto perinatal. Na presente revisão, foram selecionados

apenas 7. Provavelmente, esta realidade esteja atrelada ao fato do luto perinatal estar dentro

das perdas que não são reconhecidas socialmente. Doka (2016) salienta que as perdas não

reconhecidas socialmente, como o luto perinatal, não possuem espaço para que haja a

expressão dos sentimentos oriundos de um rompimento de vínculos afetivos. Logo, as

emoções que partem de uma quebra de afeto não encontram reconhecimento, validação e

acolhimento dentro de uma sociedade que não reconhece certas perdas (Doka, 2016).
Identificou-se três estudos com máximo nível de evidência - 1.C, isto é, experimentos

controlados randomizados, que são descritos abaixo:

A terapia cognitiva narrativa mostrou-se como um elemento novo, pois a bibliografia

desta temática é escassa. No entanto, a intervenção supracitada cumpre um importante papel

para a terapia do luto: a reavaliação de pensamentos e a ponderação de uma nova perspectiva

acerca do agonizante processo do luto. Isso ocorre por intermédio de uma revisão das

“histórias” ocorridas em relação ao luto bem como uma reflexão mais aprofundada das

mesmas (Rocha et al., 2018). Neste interím, Rangé (2012) destaca a necessidade de

realizar-se avaliações de pensamentos disfuncionais que estejam impedindo o enlutado a

seguir em frente.

A Terapia Interpessoal, conforme descrito em Johnson et al. (2016) contribui para o

desenvolvimento de uma conexão com a pessoa que faleceu. Importante ressaltar que a

intervenção retratada nesta revisão foi aplicada em grupo (Johnson et al., 2016), o que

contribui para uma validação das dores e sofrimentos em conjunto com outras pessoas que

enfrentam este mesmo processo, haja vista que trata-se de um luto não reconhecido

socialmente. Desenvolver e manter uma conexão duradoura com quem partiu é um elemento

de grande importância para a psicoterapia do luto e trata-se de uma das tarefas do luto

descrita por Worden (2013).

O Protocolo de Intervenção baseado no Guidelines for Medical Professionals

Providing Care (Johnson et al., 2015) traz a luz a aplicação de um protocolo no contexto de

uma emergência obstétrica. O propósito desta intervenção foi respeitar os interesses e

necessidades espirituais da enlutada, assim como auxiliar em possíveis rituais de nomeação

durante a estadia no hospital. Esta intervenção se destaca porque é realizada enquanto a

enlutada está no contexto hospitalar, a fim de facilitar a passagem do luto.


Além das intervenções supracitadas, a presente revisão também elencou a Terapia

Cognitiva Comportamental e o Mindfulness, cujos artigos têm um nível de evidência menor,

isto é 2.C, segundo a classificação da JBI, pois não possuem grupo controle para comparação

de resultados. No entanto, consolidam técnicas elementares para o contexto clínico, uma vez

que contribuem para a redução de ansiedade e sintomas depressivos.

Considerações Finais

Primeiramente, considera-se que o luto perinatal corresponde a um aspecto do luto

cujo reconhecimento social não acontece. Em outras palavras, os pais cujo filho(a) faleceu

durante a gestação ou durante as primeiras semanas de vida, não recebem o suporte

necessário para o enfrentamento deste momento. Esta realidade ocorre devido aos

estereótipos socialmente construídos, haja vista que, nesta situação, não se reconhece o luto

como a criação de um vínculo e, neste sentido, o vínculo gestacional não é suficiente para que

os pais passem pelo momento do luto. Na realidade, os pais enlutados são forçados a

superarem o problema rapidamente e consequentemente, não encontram espaços onde esse

luto possa ser trabalhado.

Além disso, a literatura oferece poucas opções para intervenções a esta classe de

enlutados. Pouco se fala sobre este assunto quando o assunto perda gestacional é

mencionado. Na realidade, o que prevalece são os estereótipos sociais do tipo: “você é muito

nova(o), ainda pode ter outros filhos”, “pelo menos você não teve tanta convivência” ou,

ainda, “foi melhor assim”.

Na academia, pouco se estuda sobre o luto e, a abordagem sobre o luto perinatal,

tampouco. Consequentemente, a formação de profissionais da psicologia perpassa por

contexto onde os mesmos também tornam-se não conhecedores desta temática, o que revela a

importância da temática elencada nesta revisão.


Apesar da ausência significativa de estudos dentro desta temática, o presente estudo

apresenta algumas intervenções que podem auxiliar na prática clínica no contexto de luto

perinatal. Neste sentido, as intervenções aqui apresentadas podem ser melhor verificadas a

fim de serem aproveitadas, auxiliando, assim, para a reflexão e um aprofundamento desta

temática, cuja relevância precisa ser colocada em pauta.

Revela-se, diante da temática exposta neste artigo, a importância do profissional de

saúde estar ciente das peculiaridades do luto perinatal. Mais importante ainda, destaca-se a

necessidade dos profissionais estarem munidos de um manejo clínico para as situações de

luto perinatal.

Portanto, urge a colocação deste assunto em pauta no âmbito acadêmico e

profissional, a fim de criar um espaço com maior entendimento e empatia para com o

sofrimento daqueles cujo sofrimento é silenciado diariamente.

Referências

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