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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA


MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA

Renata de Morais Machado

LUTO NA CONTEMPORANEIDADE: DISCURSOS, PRESCRIÇÕES E


EXPERTISE

Rio de Janeiro – RJ
2016
Renata de Morais Machado

ASSISTÊNCIA AO LUTO NA CONTEMPORANEIDADE: DISCURSOS,


PRESCRIÇÕES E EXPERTISE

Projeto de Dissertação de Mestrado


apresentado ao Programa de Pós-Graduação
em Saúde Coletiva do Instituto de Estudos em
Saúde Coletiva, como requisito para o
desenvolvimento da Dissertação de Mestrado
em Saúde Coletiva.

Orientadora: Rachel Aisengart Menezes

Rio de Janeiro – RJ
2016
Sumário

Introdução ................................................................................................ 1

1. Construção do objeto de investigação ................................................. 5

1.1. Gestão contemporânea do processo do morrer ............................ 5

1.2. O luto na contemporaneidade ..................................................... 16

2. Objetivos ............................................................................................ 20

2.1. Objetivo geral .............................................................................. 20

2.2.Objetivos secundários .................................................................. 20

3. Campo de investigação e metodologia .............................................. 21

4. Cronograma ....................................................................................... 24

Referências bibliográficas ...................................................................... 25

Anexos ................................................................................................... 22

I. Tabela do levantamento bibliográfico .............................................. 22

II. Cronograma ................................................................................... 34


Introdução

A inspiração para esta pesquisa surgiu a partir de minha experiência


profissional e acadêmica. Ainda durante o processo de formação em
Psicologia, na UFRJ, meus interesses se direcionaram para as áreas de
pesquisa e da clínica, quando, pela primeira vez, me deparei com os conflitos e
dilemas, na passagem da teoria à prática. Dois anos após minha graduação,
em 2013, iniciei um curso de especialização em Psicologia da Saúde, na PUC,
quando tive a oportunidade de estagiar como psicóloga em um Centro de
Terapia Intensiva (CTI) de um hospital privado da cidade do Rio de Janeiro.
Neste contexto, a maioria dos pacientes que acompanhava era acometida por
doenças crônicas degenerativas. Nos atendimentos aos enfermos e familiares
identifiquei que possuía dificuldade em me posicionar enquanto profissional
supostamente detentora de um saber especializado sobre os processos saúde-
doença, o morrer e o luto. Afinal, com que finalidade são formulados saberes
que delimitam um tempo e uma forma de expressão de sentimentos
considerados ‘normais’, sobre o sofrimento decorrente da perda de um
familiar? Até que ponto deveria aplicar propostas diretivas, nos diferentes e
particulares casos por mim acompanhados? A bibliografia referenciada na
especialização em Psicologia da Saúde indica, por exemplo, concepções de
pacientes com comportamentos considerados problemáticos e sugestões de
manejo (BOTEGA, 2012) e formas de mensurar a dor (STRAUB, 2014). O
trabalho do psicólogo que objetiva uma resolução deste tipo de situação atende
aos interesses dos enfermos e/ou da instituição hospitalar?
A análise das formulações científicas acerca dos processos saúde-
doença, morte e luto evidencia as transformações culturais ocorridas em
determinado contexto sócio-histórico. Na sociedade ocidental contemporânea,
marcada por seu caráter hedonista, os significados de sofrimento – e os
sentimentos articulados a essa categoria – são transformados (MENEZES e
VENTURA, 2008, p. 224). A partir da secularização da sociedade, a ênfase no
sofrimento vivido em vida, como garantia de uma salvação na vida eterna
transcendental, perde sentido. O sofrimento deixa de cumprir uma “função

1
social” acarretando na preeminência da busca pelo prazer – intenso e imediato.
Emerge uma ênfase no presente e na legitimação da vontade (livre arbítrio) do
indivíduo. Deste modo, o sofrimento, se não evitado, deve ter a menor duração
e intensidade possível. É neste contexto que se afirma a defesa pelo direito do
doente a não sofrer, por parte da classe médica e da sociedade em geral. É
neste sentido que as propostas de construção de uma “boa morte” e um
cuidado sobre o luto1 irão se inserir. Pelo fato de o luto constituir um processo
em que o sofrimento é inerente, ele deve ser compreendido, cuidado e, na
medida do possível, elaborado e amenizado ou, até, evitado.
Na gestão contemporânea do processo do morrer, profissionais de
saúde buscam uma preparação para o luto, na proximidade de uma perda, e
aceitação da morte, por todos os atores sociais envolvidos. Nesta elaboração,
de acordo com os pressupostos teóricos formulados acerca do processo de
morrer, os sujeitos poderiam absorver a realidade da perda gradualmente,
resolver questões sociais, legais e afetivas relativas ao doente e produzir
transformações nas configurações familiares. Viver-se-ia a experiência do “luto
antecipatório”, termo cunhado pelos profissionais para se referir ao luto vivido
enquanto a morte ainda não ocorreu, é iminente. O cuidado com o “luto
antecipatório” se insere nas práticas profissionais de modo a garantir uma
vivência de luto considerada normal, evitando o desenvolvimento na direção de
um “luto patológico”. A partir da noção presente na sociedade ocidental
contemporânea de que, quando não evitado, o sofrimento deve ser o menor
possível, surgem saberes e práticas sobre o que seria um luto ‘normal’ e um
luto ‘patológico’.
Esta pesquisa tem como ponto de partida a constatação da formulação
do que seria um luto normal no Manual de Diagnóstico e Estatística de
Transtornos Mentais, o DSM, elaborado pela Associação Americana de
Psiquiatria, evidenciando uma construção teórica sobre a experiência subjetiva
do luto. O DSM-4, formulado e publicado em 2000, se refere ao luto como
diagnóstico diferencial do transtorno de humor Episódio Depressivo Maior. Por

1
A partir do advento da Psicanálise, o luto passa a ser objeto de reflexão e atenção. Freud
(1996) define luto como “a reação à perda de um ente querido, à perda de alguma abstração
que ocupou o lugar de um ente querido, como o país, a liberdade ou o ideal de alguém, e
assim por diante” (p. 249). O luto, portanto, seria uma reação intrapsíquica normal subsequente
a uma perda, opondo-se à melancolia, que se refere a uma disposição patológica.

2
compartilhar características com este transtorno de humor, o Manual explicita
que, “se os sintomas começaram dentro do período de dois meses após a
perda de um ente querido, e não persistirem para além desses dois meses, são
geralmente considerados como resultante do luto” (2002, p. 252). Assim,
destaca a duração e expressão do luto ‘normal’, ainda que admitindo variações
culturais. Caso os sintomas permaneçam presentes dois meses após a perda,
deve ser considerado o diagnóstico de Episódio Depressivo Maior.
No DSM-5 publicado em 2013, o luto permanece como diagnóstico
diferencial do Episódio Depressivo Maior, porém a duração normal considerada
é de doze meses. Além desta distinção, observa-se nesta edição do Manual a
formulação do Transtorno do Luto Complexo Persistente, inserido no tópico
“Condições para estudos posteriores”. Apesar de ainda não ser categorizado
como diagnóstico oficial, o Manual propõe o conceito de luto patológico, que se
distingue do luto normal pelo tempo de vivência: patológico é o luto que
persiste com severidade para além dos 12 meses que sucedem o falecimento.
O luto é posto em discurso. Guias e manuais, nacionais e internacionais,
são organizados, por autores ou instituições especialistas, para orientar
profissionais no acompanhamento a pessoas enlutadas. Estas obras contêm
afirmativas sobre o que esperar do processo do luto 2, quais sentimentos,
sensações físicas, cognições e comportamentos, e como intervir sobre a
pessoa enlutada. Estas produções acadêmicas indicam que, com auxílio da
intervenção profissional, os familiares do doente podem se preparar para a
perda para ultrapassá-la.
A partir da aproximação com o objeto de pesquisa, chamou atenção a
oferta crescente de cursos de especialização3 e grupos de discussão sobre o
luto4. A divulgação em sites evidencia a ideia de que falar sobre a experiência
da perda, seja com profissionais ou em grupo com quem viveu situações
semelhantes propiciaria um atravessamento saudável pelo processo de luto.
Deste modo, para uma elaboração passível de ser considerada normal do
evento da perda, seria necessário um compartilhamento da experiência íntima

2
Para maiores informações ver capítulo da Genezini (2012) contido no Manual de Cuidados
Paliativos da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP).
3
Como exemplo, ver site “Instituto Entrelaços” (http://www.institutoentrelacos.com).
4
Como exemplo, ver site “Mãe sem nome” (http://www.maessemnome.com.br).

3
do sofrimento em ambiente público, controlado 5. A troca de experiências torna
o tema público, que começa a ilustrar filmes e a literatura, como no caso do
bestseller “O ano do pensamento mágico” de Joan Didion, e produções
dirigidas a profissionais.
Parto aqui do princípio de que os saberes “psi”6 e a biomedicina7
objetivam responder questões estabelecidas em dado contexto histórico, social
e cultural. Uma vez formuladas, tais construções científicas transformam a
sociedade e as subjetividades, gerando novas demandas. Quais seriam os
constructos teóricos e prescritivos referentes ao luto na sociedade ocidental
contemporânea? O que esses discursos e prescrições produzem, em termos
de mudanças nas subjetividades? Qualquer vivência de luto deve contar com
acompanhamento profissional? Quais situações e/ou ‘sintomas’ de luto seriam
patológicos? Esta pesquisa tem a finalidade de apreender e analisar as
formulações teóricas referentes à proposta de intervenção em torno do luto na
contemporaneidade. A partir de análise socioantropológica sobre o luto,
objetivo apreender como ele se constitui como um objeto de um saber
específico, entre profissionais de saúde, desencadeando novos discursos,
novas categorias profissionais e novas propostas de intervenção por estes
“experts da conduta humana”.

5
Para exemplos de depoimentos sobre o benefício da terapia do luto ver links
(http://mulher.uol.com.br/comportamento/noticias/redacao/2011/06/09/entendi-melhor-a-morte-
diz-cissa-guimaraes-sobre-a-terapia-do-luto-entenda-o-tratamento.htm e
http://mulher.uol.com.br/comportamento/noticias/redacao/2015/08/25/anne-ficou-nove-anos-de-
luto-e-precisou-de-tratamento-especial-para-superar.htm).
6
Os saberes “psi” englobam a Psiquiatria, a Psicologia e a Psicanálise, sendo os dois primeiros
“profissões oficialmente reconhecidas e controladas pelo Estado, que exigem um diploma
específico para seu exercício” (RUSSO, 2002, p. 8), enquanto a Psicanálise é um ofício “extra-
oficial”, transmitida de forma artesanal por “iniciados”.
7
Segundo Camargo Jr. (2003, p. 101), Biomedicina é uma racionalidade médica vinculada ao
conhecimento produzido no campo da Biologia, composto por cinco elementos teóricos
fundamentais: morfologia, fisiologia, sistema de diagnósticos, sistema de intervenções
terapêuticas e uma doutrina médica. Esta racionalidade pode ser delineada em três
proposições: caráter generalizante (discursos com validade universal), caráter mecanicista
(modelos tendem a naturalizar máquinas produzidas pela tecnologia humana) e caráter
analítico (o funcionamento do todo é necessariamente dado pela soma das partes).

4
1. Construção do objeto de investigação
1.1. Gestão contemporânea do processo do morrer

A morte não é apenas um fato biológico, mas um fenômeno que sofre


alterações, de acordo com o momento histórico e o contexto sociocultural
(MENEZES, 2004, p. 24). Este tema, que integrava os primeiros estudos
etnológicos, recebeu maior atenção como objeto de estudo das ciências sociais
no início do século XX, ganhando força a partir da década de 1960. Pesquisas
realizadas (ARIÈS, 2012; ELIAS, 2001; ADAM e HERZLICH, 2001; MENEZES,
2004), por sociólogos, antropólogos e historiadores apontam significativas
mudanças nas práticas e representações relativas à morte e ao morrer.
O modo como os indivíduos lidam com o processo de morrer está
inserido no campo simbólico da vida humana. Seus elementos contêm
significados que refletem as formas como os grupos e as culturas vivem e se
relacionam, suas crenças e valores, relações com os corpos e os cuidados
sobre eles. Philippe Ariès (2012) formula a ideia de diferentes modelos de
morte, de acordo com as atitudes sociais frente a este evento, em momentos
históricos distintos. Este autor distingue o modelo de morte “tradicional” e o
modelo de morte “moderna”. No modelo de morte “moderna”, os cuidados aos
doentes são institucionalizados e rotinizados, pela instituição e saber
biomédicos – assim, a morte ocorre apesar dos investimentos médicos – com
um processo de ocultamento e exclusão social de quem está em processo do
morrer. Este modelo foi formulado em contraste ao modelo denominado
“tradicional”, característico dos séculos anteriores ao XIX, quando a morte era
ritualizada, comunitária e, portanto, socialmente aceita.
Na constituição da sociedade ocidental moderna, em um longo processo
histórico, os hospitais tornaram-se centro de referência na assistência à saúde,
à doença e à morte. Em “O nascimento do hospital”, Foucault (2014) aborda
como o hospital passou a se configurar como instituição terapêutica,
deslocando os cuidados dos doentes e a atenção ao processo de morte, dos
religiosos para os médicos. No final do século XVIII, a construção da
racionalidade anatomoclínica – que inaugura a medicina ocidental moderna – e
a introdução de mecanismos disciplinares foram responsáveis pela

5
estruturação de um saber, com suas propostas de intervenção curativa, que
conduziram à organização do hospital da maneira como é atualmente
conhecido. Menezes (2004) afirma que a consolidação da instituição hospitalar
– medicamente administrada e controlada – iniciou um processo de
‘medicalização do social’, em que “[a] medicina, seu saber e sua instituição
tornam-se referências centrais no que se refere à saúde, vida, sofrimento e
morte” (p. 28).
Ao longo do século XX, especialmente após a Segunda Guerra Mundial,
foi desenvolvida uma prática médica padronizada e tecnologizada. Novas
técnicas e tecnologias médicas, como a reanimação, alimentação e respiração
artificiais, viabilizaram um prolongamento do tempo de vida.
Esta medicina tecnologizada tem sua expressão máxima nos Centros ou
Unidades de Tratamento Intensivo. Este setor hospitalar surgiu entre 1946 e
1948, nos Estados Unidos, no tratamento de doentes com poliomielite e com o
uso dos respiradores artificiais para a manutenção de suas vidas. No final da
década de 60, pesquisadores ingleses e americanos demonstraram que
pacientes graves têm problemas fisiopatológicos comuns, demandando uma
série de cuidados e tecnologias específicas para suprir funções corporais
deficientes. Deste modo, foi necessário o desenvolvimento de equipamentos e
terapêuticas e sua devida organização para concretizar esta unidade de
tratamento. A UTI tem o objetivo de concentrar os doentes mais graves, o
equipamento técnico mais caro e sofisticado e a equipe com conhecimento e
experiência específica para manipular tais doentes e aparelhos tecnológicos
(MENEZES, 2006, p. 30).
Com o emprego de tecnologia médica para a manutenção da vida,
especialmente com o advento do respirador artificial, a morte deixa de ser um
fato pontual, transformando-se em um processo prolongado, vivido em etapas.
Tanto o processo do morrer como o próprio conceito de morte sofrem
transformações com o uso de técnicas de manutenção da vida. O fenômeno da
morte torna-se mais complexo, pois com o uso do respirador artificial a
referência deixa de ser a parada cardiorrespiratória, e passa a ser o
funcionamento cerebral – é construído o conceito e diagnóstico de morte
cerebral.

6
Com a mudança do cenário da morte, antes vivida na comunidade, para
os hospitais, este fenômeno torna-se alvo da ação e eficácia técnica da
medicina. Torna-se inconveniente morrer em casa. A morte é monitorizada e
controlada para que possa ser evitada ao máximo. Na medida em que os
cuidados são rotinizados, a assistência se caracteriza como impessoal,
mecânica e asséptica. É neste sentido que se orientam as críticas ao modelo
de “morte moderna”, julgando-o como um processo de desumanização,
assujeitamento ou objetificação do doente.
Na década de 1970, com o crescimento de uma população com doenças
crônicas degenerativas, movimentos sociais de caráter antimédico criticam a
situação de uma “perda de autonomia” dos pacientes devido ao excesso de
poder médico com práticas racionalizadas e automatizadas que objetivam a
sobrevivência acima de qualquer custo. Emerge um discurso pelos direitos dos
doentes, com propostas que abrangem desde o direito de “morrer bem”, com
“dignidade”, até reivindicações pela regulamentação da eutanásia. Evidencia-
se a inserção do tema da saúde no conjunto dos direitos humanos.
A filosofia hospice8, criada por Cicely Saunders, enfermeira, assistente
social e médica inglesa, postula uma assistência baseada na preservação da
autonomia do doente, no controle dos sintomas e respeito aos desejos dos
enfermos. Nos Estados Unidos, a partir de críticas aos excessos de poder
médico, o movimento inicial pelos Cuidados Paliativos teve origem em
organizações populares, dirigidas por voluntários e enfermeiras, com caráter
antimédico (MENEZES, 2004, p. 54). Com a adesão da classe médica ao
movimento, configura-se um novo campo de saber, com novos conhecimentos
e competências técnicas, que dão aos Cuidados Paliativos maior legitimidade
social.
A ideologia dos Cuidados Paliativos propõe um novo modo de prática
em relação à morte, com uma assistência ativa e integral aos pacientes cuja
doença não responde mais ao tratamento curativo. Entende-se que, neste
estágio, o paciente denominado como “fora de possibilidades terapêuticas de
cura” (FPTC) pode ter seu sofrimento associado a diversas origens, referentes

8
St. Christopher Hospice, fundado em 1967 em Londres, foi o primeiro hospice inaugurado e
reconhecido como instituição de assistência, ensino e pesquisa no cuidado de “pacientes
terminais” e seus familiares.

7
à sua “totalidade” ‘bio-psico-social-espiritual’. É sob este prisma que as
intervenções dos paliativistas devem atuar para garantir um processo de morrer
que propicie uma “boa morte” com “qualidade de vida”. As intervenções
profissionais não se direcionariam mais à manutenção e prolongamento da vida
a todo custo, mas aos desejos e vontades do enfermo, oferecendo conforto e
autonomia. Para tanto, é necessário envolvimento de uma equipe
multiprofissional, alinhada no mesmo propósito, composta por médicos,
enfermeiros, farmacêuticos, fisioterapeutas, psicólogos, assistentes sociais e
outras categorias profissionais, criadas na implantação dos Cuidados Paliativos
enquanto novo campo de saber específico, como, por exemplo, assistente
espiritual, “midwifes for the dying”, entre outras.
A morte é colocada em discurso, tanto no meio profissional como na
sociedade em geral. O objetivo central dos Cuidados Paliativos é que,
permitindo “autonomia” e “independência” do paciente, seria possível garantir
“qualidade de vida” até o final da vida do enfermo. Para atingir este objetivo, os
paliativistas têm como referência o conceito de “dor total” cunhado por
Saunders, que é um tipo de dor complexo abrangendo aspectos físicos,
mentais, sociais e espirituais. Para que o suporte ao doente seja pleno é
preciso, portanto, a atenção e a ação de uma equipe interdisciplinar. Diante da
proposta paliativista de cuidado sobre a totalidade do indivíduo, Menezes
(2003, p. 141), formula a hipótese de que o modelo de “morte contemporânea”
consiste em uma busca de acesso a uma totalidade perdida na fragmentação
da identidade individual.
De acordo com o ideário paliativista, a meta da assistência é propiciar a
produção de uma “boa morte”, a partir da expressão dos desejos do doente.
Para tanto, é fundamental que ele efetue escolhas terapêuticas e referentes ao
final de sua vida, a partir das informações sobre as possibilidades terapêuticas,
transmitidas pela equipe de saúde. Para que seja possível tomar decisões, é
preciso uma “comunicação franca” entre todos os atores sociais envolvidos no
processo do morrer. Este aspecto contrapor-se-ia ao modelo curativo da “morte
moderna” uma vez que, explicitados os limites da medicina e os desejos do
paciente, passou a ser possível que este efetue escolhas e tome decisões
quanto ao seu último período de vida.

8
O modelo de morte “contemporânea” valoriza, portanto, o morrer com
“autonomia” e “dignidade” – categorias relacionadas aos sujeitos e suas
vontades – valores importantes na cultura individualista em que a vida de um
sujeito é considerada única e singular. A morte não é mais ocultada, pelo
contrário, ela deve ser anunciada para que o paciente, a partir da consciência
de sua proximidade, possa tomar decisões. No modelo da “morte
contemporânea” o foco se desloca da doença, como na “morte moderna”, para
o doente propondo um tratamento mais “humanizado”. Neste sentido, a “boa
morte” é aquela que acontece à maneira do paciente na busca de uma “morte
digna”.
O trabalho possibilitado pelo anúncio da proximidade da morte, em
contraposição ao modelo de “morte moderna”, representa, de certa forma, um
resgate do modelo da “morte tradicional”, que perdurou da Idade Média até o
século XX, com a institucionalização do hospital. Assim como no modelo
tradicional, o ideário paliativista propõe que a morte aconteça, sempre que
possível, na residência do doente cercado por seus familiares, que cumpririam
ritualmente os desejos do paciente, visibilizando a morte na cena social.
Conforme apontado por Menezes (2004), a proposta da “qualidade de
vida”, até a última etapa da vida, objetiva dar a “oportunidade” de um último
trabalho sobre si e sua identidade pessoal, condição valorizada na cultura
individualista. Segundo Rose (2011, p. 136), por meio da confissão de seus
sentimentos e desejos, o indivíduo constrói sua identidade, afirmando uma
verdade própria. É neste sentido que este processo da “boa morte” representa
a possibilidade de um trabalho sobre si para o doente e, também, para os que
o cercam, pois o processo não se resumiria à reflexão, exigiria também a
expressão e o compartilhamento de sentimentos e desejos.
Desta forma, contrapondo-se à temida imagem da “morte moderna” do
doente internado em um leito de hospital, no ideário do modelo da “morte
contemporânea” o doente, seus familiares e a equipe dos profissionais de
saúde mobilizariam esforços no sentido de produzir uma “boa morte”. A
construção deste processo, embora se baseie nas vontades do doente, está
associada à ideia de uma estetização da morte como um fenômeno aceito
socialmente, calmo, harmonioso, pacífico e que configure uma cena bela.

9
A proposta de construção de uma “boa morte” está alinhada a valores
característicos da sociedade ocidental moderna9, como a autonomia e o
hedonismo. Deste modo, uma vez informado sobre as possibilidades
terapêuticas, ninguém melhor do que o doente para tomar decisões acerca dos
investimentos a serem feitos para viver bem, e não apenas sobreviver. A “boa
morte” seria então construída no encontro da maximização da extensão da
vida10 enquanto esta possibilitar qualidade de vida que é entendida como a
busca por prazer e a perda de sentido transcendente do sofrimento. De acordo
com o modelo dos Cuidados Paliativos, a produção efetiva de uma “boa morte”
depende da aceitação social do processo do morrer. Elizabeth Kübler-Ross,
psiquiatra suíça radicada nos Estados Unidos, se tornou referência mundial na
assistência a doentes terminais, a partir de suas pesquisas, quando escutou
pacientes com câncer avançado, em estágio terminal, e seus familiares. A
partir do acompanhamento e das entrevistas com os doentes, Kübler-Ross
postulou a existência de repetidos padrões de respostas emocionais
adaptativas, frente à noticia da proximidade da morte pela equipe médica. Esta
pesquisa resultou no primeiro livro publicado pela autora, em 1969, intitulado
“Sobre a morte e o morrer”. Nele, Kübler-Ross apresenta o modelo de cinco
etapas que considerou que o enfermo vivencia a partir do conhecimento do
avanço da doença na direção da morte. Os estágios são: negação, raiva,
negociação, depressão e, por fim, aceitação. As etapas não indicam um
percurso necessariamente vivenciado pelo doente, mas um modelo de
compreensão deste processo subjetivo. A teoria de Kübler-Ross representa
uma inovação no tema, pois sugere uma modificação nas representações do
morrer como um fenômeno da vida humana que deve ser vivido e elaborado,
passível de receber intervenções de profissionais capacitados com
conhecimentos específicos (MENEZES, 2004, p. 59). Para alcançar uma “boa

9
Segundo Duarte (2005), algumas dimensões da sociedade ocidental contemporânea se refere
ao “’individualismo ético’ (subjetivismo, culto do eu, privilégio da escolha, ênfase na adesão ou
na responsabilidade pessoal), do ‘hedonismo’ (privilégio da satisfação pessoal, desqualificação
da dimensão moral do sofrimento, afirmação do self etc.) e do ‘naturalismo’ (fisicalismo,
cientificismo etc.)” (p. 143).
10
De acordo com Duarte (1999), o “hedonismo moderno” opera com uma estratégia qualitativa,
com uma busca de intensidade sempre maior, ao contrário do “hedonismo tradicional” que
opera com um consumo quantitativo. Duarte afirma que as diversas estratégias de
maximização da vida e otimização do corpo presentes nas especialidades médicas e de saúde
só puderam surgir em função da sistemática exploração do corpo como sede de intensificação
do prazer.

10
morte”, o doente, seus familiares e equipe de saúde devem aceder à quinta
etapa, de aceitação, como última fase de elaboração do morrer.
Apesar da atribuição de responsabilidade ao modelo dos Cuidados
Paliativos, pela construção de um discurso crítico em relação aos excessos de
intervenções médicas, o modelo da “boa morte” se baseia em diferentes níveis
de intervenção. As ações dos profissionais de saúde são direcionadas ao
controle e alívio da dor e demais sintomas, por meio do uso de medicamentos
e bloqueios neurais. Os procedimentos não se restringem à dimensão corporal,
mas à “totalidade” do doente, se estendendo aos aspectos psicológicos, sociais
e espirituais, a partir do conceito de “dor total” cunhado por Saunders. Neste
sentido, são formuladas intervenções que estimulam uma elaboração
psicológica em torno dos sentidos da própria vida, uma expressão de
sentimentos dos pacientes e de seus familiares, com enunciação para
subsequente realização de seus desejos, resolução de pendências legais,
sociais e afetivas, planejamento em relação ao período final da própria vida e
os rituais após a morte. As medidas também estimulam um equilíbrio
“espiritual”, passível de ser alcançado por técnicas que seguem o modelo da
Nova Era, como mentalizações, visualizações, meditação, uso de mantras,
aromaterapia, cromoterapia e, mais recentemente, até ingestão de substâncias
psicoativas, como a psilocibina (POLLAN, 2015).
Para a produção de uma “boa morte”, o ideário dos Cuidados Paliativos
recomenda um cuidado personalizado e integral para controlar o sofrimento,
por meio de uso limitado da tecnologia médica. Contudo, segundo Juan Pedro
Alonso (2013, p. 2545), a proposta de um cuidado mais “humanizado” ocorre
por intermédio de habilidades e saberes técnicos específicos, mediante um
avanço profissional sobre áreas tidas como da intimidade das pessoas.
Portanto, trata-se de uma expansão da esfera do controle médico para além
das áreas às quais a atenção médica se centrava, passando a englobar
aspectos psicológicos, sociais e espirituais.
A fim de proporcionar uma “morte digna” mediante um processo único e
singular daquele indivíduo, os profissionais de saúde devem solicitar e registrar
informações relevantes acerca do paciente. Constrói-se um conhecimento
íntimo sobre ele, objetivando detectar possíveis problemas ou vulnerabilidades
em sua experiência ou de seus familiares para que, a partir de uma intervenção

11
mediada pelos profissionais envolvidos, tais aspectos possam ser elaborados
para viabilizar uma “boa morte”. Deste modo, os Cuidados Paliativos
aconteceriam na confluência de aspectos caracterizados por competência
(linguagem, conhecimento e habilidades da medicina) e aspectos do cuidado
(compaixão e empatia). Esta integração compõe um saber técnico e discurso
específicos sobre a morte e o morrer.
Novos espaços de intervenção profissional são construídos e
legitimados, medicalizando a experiência do morrer em sentido mais amplo, em
comparação com o modelo da “morte moderna”. Os defensores da “boa morte”
postulam que a proposta paliativista se afasta dos excessos do modelo de
“morte moderna”, tido como medicalizado, tecnologizado, frio e “desumano”. No
entanto, a produção das ciências sociais que investiga o modelo de “morte
contemporânea” apresenta dois debates críticos: a rotinização e crescente
medicalização das unidades paliativas (CLARK e SEYMOUR, 1999, p. 104;
MENEZES, 2004, p. 66). Uma vez que a biomedicina e os saberes “psi”
possuem status de autoridades enquanto saberes científicos nas sociedades
ocidentais contemporâneas, poderia a construção teórica e prática acerca do
processo de morrer apontar para uma consequente normatização deste
evento? Deste modo, tais normas e práticas científicas acerca deste evento
transformariam subjetividades e demandas dos indivíduos de um determinado
contexto social, histórico e cultural.
De acordo com Peter Conrad (2007, p. 4), medicalização é o processo
pelo qual fenômenos ‘não-médicos’ são definidos e tratados sob a esfera da
medicina. Assim, cada vez mais a medicina atua sobre eventos da vida,
afirmando-se como autoridade sobre comportamentos e cuidados corporais. É
neste conjunto que o processo do morrer se torna objeto de intervenção do
saber e práticas médicas. A produção de uma “boa morte” está associada ao
fluxo da vida daquele indivíduo único e singular, uma vez que medicalização e
individualização são processos intrinsecamente vinculados e articulados
(MENEZES e GOMES, 2011, p. 103).
A formulação do conceito de uma “boa morte” abre espaço para a
expressão dos desejos e temores do indivíduo doente. Ao posicioná-lo no
centro deste processo, possibilita que ele tome decisões sobre sua trajetória,
inclusive na negociação acerca de intervenções médicas. Tais escolhas não

12
são isentas da influência de valores socialmente compartilhados e
normatizados.
Ainda de acordo com Alonso (2013, p. 2547), a ampliação das esferas
de atuação profissional pode dar lugar a intervenções normativas sobre a
experiência de morrer ao abordar sentimentos, relações e dinâmicas familiares.
A “humanização” dos cuidados no processo do morrer não significa, portanto,
uma “desmedicalização”, mas a afirmação de uma nova especialização
profissional dotada de habilidades técnicas e discursos específicos. A
constituição do processo de morrer como um trabalho sobre si ocorre mediante
auxílio de técnicas e intervenções da ação de profissionais especializados
orientados por um modelo considerado ideal. Cabe então questionar que
transformações sociais esta nova especialização profissional produz a partir da
difusão de novos saberes e propostas de intervenção na busca por uma “boa
morte” ideal.
O modelo de “morte contemporânea”, assim como o modelo da “morte
moderna”, deve ser entendido como “tipo ideal”, no sentido weberiano11. A ideia
de um modelo de “morte contemporânea” não sugere a evidência de um único
modelo de “boa morte” numa determinada cultura. Entretanto, pode ser
entendido como uma norma, servindo como norteador das intervenções e
expectativas dos atores sociais envolvidos.
A normatização de um evento mediante sua apropriação por um saber
técnico especializado categoriza, nos termos de Nikolas Rose (1988, p. 35), o
“governo”, em que, por meio de uma ação calculada sobre os indivíduos,
busca-se a realização de fins sociais e políticos. Para governar os sujeitos é
preciso primeiro conhecê-los. No caso dos fenômenos da vida humana, como a
morte e o morrer, são os saberes “psi” que fornecem os conceitos pelos quais a
subjetividade e intersubjetividade podem ser calculáveis. Desta forma, os
indivíduos são objetos de intervenção externa, mas também sujeitos de uma
ação sobre si próprios em nome de suas capacidades subjetivas. A expertise

11
O “tipo ideal” é um reurso metodológico com a finalidade de orientar o pesquisador diante da
gama de fenômenos observáveis na vida social. Consiste em enfatizar determinado traço de
realidade, não correspondendo, de fato, às situações observáveis. Desta forma, é “ideal” em
sentido puramente lógico, não correspondendo à ideia de “deve ser”, de “exemplar” (WEBER,
2008).

13
da subjetividade12 trabalha, portanto, por intermédio da persuasão inerente às
suas verdades, fornecendo aos indivíduos a ilusão de permanecerem livres a
agir conforme suas escolhas, desejos e condutas. Estaria então o modelo de
morte “contemporânea”, a partir de suas prescrições biomédicas,
representando uma forma de normatização sobre as condutas sociais frente a
este fenômeno?
Na medida em que o processo de morrer é elaborado como um trabalho
sobre si com o auxílio da ação de profissionais especializados, é possível
elaborar metas e etapas para alcançar este fim ideal. Esta busca pela
objetivação de aspectos subjetivos poderia caracterizar uma normatização do
morrer. Assim, é possível aventar a hipótese de um processo de domesticação
do final da vida, para garantir uma construção de uma morte pacífica e
controlada pelo aparato biomédico.
A “boa morte” não representa, portanto, um trabalho sobre si isento de
influências do aparato médico, mas um “refinamento e capilarização das suas
formas de exercício de controle” (MENEZES, 2004, p. 214). Assim como a
sexualidade, conforme analisado por Foucault (2006), o morrer, enquanto
processo da vida, é apropriado como objeto do saberes científicos. O
desenvolvimento de conhecimentos e técnicas sobre a vida produzem
procedimentos de poder e de saber que objetivam controlar e modificar este
evento e seus significados. Deste modo, o processo de morrer se configuraria
como fonte de exercício de biopoder, uma vez que o domínio sobre ele
implicaria em um poder-saber, agente de transformação da vida humana. De
acordo com Menezes (2004),
“[A]ssim como o sexo se tornou significante único e significado
universal, possibilitando acesso à identidade individual, o mesmo
ocorre com a morte administrada pela assistência paliativa. Um
dispositivo da morte é gestado e gerado, incitando à produção de um
desejo de aceder à morte, de descobri-la, liberá-la, articulá-la em
discurso, formulando-a como a verdade última da vida do doente” (p.
214).
Os dispositivos do biopoder podem ocorrer tanto por intermédio do que é
público, visível e anunciado como pelo que é privado, oculto e silenciado. É

12
Segundo Rose (2011), “[p]or expertise entende-se a capacidade que a Psicologia tem de
gerar um corpo de pessoas treinadas e credenciadas alegando possuir competências especiais
na administração de pessoas e de relações interpessoais, e um corpo de técnicas e
procedimentos pretendendo tornar possível a gerência racional e humana dos recursos
humanos na indústria, na força militar e na vida social de forma geral” (p. 24).

14
neste sentido que a gestão do processo do morrer, no modelo de “morte
contemporânea”, por meio das prescrições de uma expressão de emoções e
de comportamentos considerados adequados, transforma o social, criando
(in)sensibilidades.
“De acordo com ideólogos da ‘boa morte’, o processo de morrer deve
ser vivido na intimidade. Cabe indagar a que intimidade está se
referindo, pois, certamente, não é a do paciente, já que este
personagem é exposto a uma rede de profissionais. Sua biografia
passa a ser tema de investigação e de discussão entre a equipe. A
privatização do morrer é instrumentalizada pela conversão da morte
em um problema psicológico” (MENEZES, 2004, p. 216).
Segundo Sennett (2014), na sociedade ocidental contemporânea os
sentimentos são compreendidos como da ordem do natural, do biológico,
enquanto a expressão dos sentimentos estaria sujeita às regras sociais. Deste
modo, os indivíduos seriam dotados de um domínio interno, entendido como
um “sentimento verdadeiro”, e um domínio público, que poderia ser falso na
medida em que os sentimentos devem ser modulados para que sua expressão
seja adequada.
Esta construção de noção de indivíduo define, nos termos do autor, o
declínio do homem público. Uma vez que a interioridade é valorizada, a
expressão das emoções de forma ritualizada pode ser interpretada como falsa.
Por outro lado, é quando a expressão foge do controle do indivíduo que ela é
considerada autêntica, permitindo acesso ao seu domínio privado. Em uma
sociedade intimista (SENNETT, 2014) as motivações e intenções, por serem
reveladoras dos verdadeiros sentimentos, contam mais que as ações.
É neste sentido que as propostas da construção de uma “boa morte”
caminham. O estímulo ao compartilhamento de emoções no período final da
vida objetiva produzir uma “morte íntima”, conforme denominação criada por
Hennezel (2004). Para esta psicóloga, trata-se de uma última oportunidade de
um trabalho sobre si, quando o doente deve compartilhar suas emoções com
os paliativistas, de modo a reescrever a própria biografia, produzindo sentido
para sua vida. Contudo, cabe questionar qual intimidade é possível, no modelo
de “morte contemporânea”. A partir da construção prescritiva sobre a totalidade
do doente, expressões de sentimentos que fogem de um roteiro pré-
determinado pelo ideário paliativista, , seja por intensidade ou duração,
estariam passíveis de intervenções profissionais, para adequá-las ao

15
ambiente pacífico e controlado dos Cuidados Paliativos. Tornar público o que
era privado permitiria o governo, nos termos de Rose (1988), sobre a
experiência do morrer e do luto.

1.2. O luto na contemporaneidade


O modo como a morte emerge socialmente – como evento que deve ser
evitado e afastado a qualquer custo ou que deve ser aceito e vivenciado
socialmente – implica consequências na forma como o luto poderá ocorrer. Em
um contexto em que a morte é entendida como etapa natural da vida, seu
entorno ideal de acordo com os paliativistas é caracterizado como um momento
calmo e tranquilo.
A partir do momento em que o paciente é diagnosticado como “fora de
possibilidades terapêuticas de cura”, as intervenções paliativistas, direcionadas
a todos os atores sociais, propõem uma aceitação deste evento. A preparação
para a morte ainda em vida possibilita um processo de luto denominado pelos
profissionais de saúde como “luto antecipatório”, entendido como o conjunto de
sentimentos associados à notícia do diagnóstico de uma doença
potencialmente mortal, indicando uma eminente perda concreta ou simbólica
para o doente e seus familiares (GENEZINI, 2012, p.571). Diante desta
categoria, é formulada uma modalidade de assistência específica, dirigida a
todos os envolvidos no acompanhamento do processo do morrer. Desde o
final do século XX são criados e proliferam cursos de especialização para
profissionais de saúde – sobretudo psicólogos – em terapia do luto, com uma
produção bibliográfica prescritiva, voltada à prevenção de um “luto patológico”.
A busca de produção de uma morte controlada, em uma cena ordenada,
harmoniosa e pacífica, denota um processo de normatização do luto. O
sofrimento acarretado pela situação de perda, quando não evitado, deve ser
vivido de forma calma, tranquila e comedida, a fim de não interferir na
configuração do ambiente construído pelos paliativistas. Especialistas em luto
formulam o que seria uma experiência normal após uma perda.
De acordo com Rose (2011, p. 118), na sociedade ocidental moderna,
os saberes “psi” configuram disciplinas científicas de conhecimento positivo dos
indivíduos, afirmando uma verdade sobre os humanos e uma forma de agir
sobre eles. De modo geral, a construção desse conhecimento não emerge da

16
reflexão do indivíduo normal, da personalidade normal ou, ainda, da emoção
normal, mas, pelo contrário, a própria noção de normalidade emerge da
preocupação com o que é considerado problemático, perigoso ou patológico.
Assim como na designação dos modelos de “morte moderna” e “morte
contemporânea”, a ideia de um modelo de conduta normal, em contraste a um
patológico, não pretende sugerir a evidência de um único modelo de pessoa
numa determinada cultura. Conforme o conceito de tipo ideal weberiano,
“[E]m nosso próprio tempo, (...) a Psicologia, na forma de um modelo
de indivíduo psicológico, têm sido a base de tentativas similares de
unificação da conduta de vida em torno de um único modelo do que
seja subjetividade apropriada. Mas a unificação da subjetivação deve
ser vista como um objetivo de programas específicos, ou como um
pressuposto de certos estilos de pensamento, não como uma
característica das culturas humanas” (ROSE, 2011, p. 48).
A elaboração de conhecimento acerca da subjetividade gera uma
expectativa sobre as condutas humanas. É neste recorte que busco analisar a
experiência do luto. A expertise “psi” fornece conhecimento, a partir observação
da vivência social do luto dentro de um contexto histórico-cultural, que instaura
uma norma, uma forma de como o luto deve ser vivido. A partir da construção
deste conceito, são elaboradas as categorias referentes à experiência normal e
patológica deste fenômeno, como formulado no DSM-5.
A construção de saberes sobre o luto, pela delimitação de uma vivência
esperada e outra que seria passível de intervenção por ser considerada uma
ameaça à vida, gera regras que seriam interiorizadas pelos indivíduos inseridos
naquele contexto. A construção destes saberes produz uma nova categoria de
sintomatologia e, portanto, novas necessidades cultivadas. É neste sentido em
que propostas são elaboradas para cuidar do luto preventivamente, de forma
que ele não evolua para uma experiência patológica. Na medida em que
saberes, práticas institucionais e profissionais são reconfigurados, com oferta
de modelos para elaboração de perdas, com a possibilidade de intervenção de
“experts da conduta humana”, novas subjetividades e sensibilidades – e
insensibilidades – são produzidas socialmente.
As técnicas da conduta humana pretendem agir sobre os indivíduos sem
violar sua autonomia. Os saberes “psi” não configurariam uma dominação
sobre os indivíduos, mas uma “condução da conduta”, uma orientação ao
governo de si (ROSE, 2011, p. 139). Desta forma, a partir da concepção de

17
uma experiência de luto patológico, delimitada pelos saberes “psi”, o indivíduo
busca autorregular suas emoções, para adequá-las a um padrão normal. De
acordo com Elias (1993, p. 193), os indivíduos da sociedade ocidental
moderna se configuram como sujeitos com emoções autocontroladas, uma vez
que controles externos são interiorizados. Deste modo, a partir da formulação
de um luto normal e um luto patológico, os indivíduos controlariam a duração e
intensidade de suas emoções e comportamentos, enquadrando suas
experiências em um conceito normatizado do luto.
Neste cenário são criadas técnicas inovadoras e, consequentemente,
demandas de atendimento especializado a partir da interiorização destes
valores. A apropriação deste fenômeno pelos saberes psi fornece um modelo
de elaboração dos eventos traumáticos ou de perda, ocorridas na vida, e uma
possibilidade de ação pelos “experts da conduta humana” tanto com propostas
curativas de uma vivência patológica, como intervenções preventivas.
Na sociedade ocidental contemporânea, caracterizada pela busca
contínua do prazer, configura-se um campo científico, com especializações
para profissionais psi, direcionado ao controle do sofrimento pela perda. A
estruturação de um saber, uma teoria e uma prática específicos para esta
etapa da vida possibilita a oferta e, consequentemente, a construção de
demanda por serviços específicos para acompanhamento do luto. Observa-se
a oferta de clínicas e cursos de especialização direcionados para este fim. O
tema começa a ser amplamente divulgado nos meios profissionais e por
intermédio dos meios de comunicação destinados à população geral. De
acordo com Menezes e Gomes (2011, p. 121), a crescente visibilidade de
temas acerca da morte e morrer pode ser interpretado como um meio de
elaboração coletiva em consequência de uma secularização da sociedade,
reverenciando o indivíduo até o último momento de sua vida. Grupos
terapêuticos, encontros, conversas e relatos de experiências vividas por
enlutados são divulgados na internet. O luto se configura, portanto, como um
período da vida que merece acompanhamento profissional, seja como
tratamento do luto patológico ou como acompanhamento na elaboração do luto
normal, a fim de garantir que aquele status de sofrimento tenha a menor
duração possível, prevenindo-se de um luto patológico. O achatamento do
processo de luto com um controle da duração e intensidade de sua expressão

18
configura uma situação paradoxal, em relação à visceralização do processo do
morrer.

19
2. Objetivos
2.1. Objetivo geral

Apreender e analisar a construção de um corpus teórico acerca do luto


na contemporaneidade, assim como as prescrições terapêuticas a ele
referidas.

2.2.Objetivos secundários
 Identificar as formas de construção de especialização em assistência ao
luto e de uma expertise profissional sobre o tema. Identificar os saberes
que o profissional deve adquirir para sua habilitação no manejo do
cuidado com o luto.
 Identificar as modalidades de luto sujeitas à recomendação de
acompanhamento profissional.

20
3. Campo de investigação e metodologia

Com o objetivo de analisar as construções e particularidades da forma


como o luto é vivenciado nas sociedades ocidentais contemporâneas, faz-se
necessário analisar o discurso produzido acerca deste tema. Deste modo, o
campo de investigação de especial enfoque será de manuais e livros-texto
destinados aos profissionais da área da saúde sobre o tema da morte e luto,
como o DSM e manuais de Cuidados Paliativos; análise do conteúdo abordado
em cursos de especialização na área; análise de notícias acerca do tema,
destinadas ao público leigo ou profissional, em mídia impressa e virtual. Dentre
as fontes bibliográficas destinadas aos profissionais de saúde, serão
considerados os documentos produzidos a partir do final do século XX,
momento em que se inicia a produção de conteúdos prescritivos acerca da
morte e luto sob a perspectiva dos Cuidados Paliativos. As notícias destinadas
ao público leigo serão compostas principalmente por mídias nacionais,
veiculadas concomitantemente com a elaboração da pesquisa, a fim de melhor
analisar as atuais perspectivas culturais sobre o tema na sociedade brasileira
contemporânea.
A escolha de livros-texto, manuais e conteúdo dos cursos de
especialização como objeto de análise permitirá o exame da ideologia que
caracteriza as normas de conduta do sofrimento devido à perda. Enquanto que
o conteúdo observado em mídias destinadas ao público leigo tem por objetivo
analisar a difusão do tema no âmbito social, assim como possíveis
consequências que isto produz. Neste sentido, a ausência de neutralidade
destes documentos, por cumprir uma função social, permite emergir certas
características sobre o tema (LUCA, 2006). Uma vez que estes materiais são
produzidos a partir de um contexto social e produzem intervenções sobre a
sociedade, a marca da intencionalidade de seu conteúdo reflete características
daquela determinada cultura. Segundo Mendoza (2000), são considerados,
portanto, como fonte legítima de dados por “possibilitar a construção racional
de um processo de pesquisa e/ou desenvolvimento científico” (p. 98).
O levantamento bibliográfico será composto por textos produzidos por
profissionais militantes da proposta dos Cuidados Paliativos com o intuito de

21
difundir esta expertise e por textos da área das Ciências Sociais que
possibilitem o diálogo entre o objeto observado e o tema da pesquisa. No
levantamento realizado em base de dados foram utilizados os seguintes
descritores em diversas relações: pesar, morte, adaptação psicológica, atitude
frente à morte, assistência terminal, ética, cuidados paliativos, doente terminal
e revisão. Inicialmente utilizaram-se os filtros para a busca de textos completos
e em português a fim de viabilizar uma primeira aproximação do campo com
maior foco. Esta primeira fase do levantamento bibliográfico se deu por
encerrada ao averiguar a contínua repetição de artigos. Possivelmente será
realizada nova etapa com busca em outros idiomas (inglês e espanhol) a partir
da necessidade de aprofundamento em algum aspecto de acordo com o
avançar da pesquisa.
Por meio de uma pesquisa de metodologia de análise documental, essas
diversas fontes serão examinadas com o objetivo de apreender um possível ‘fio
condutor’ que explicite características do luto na contemporaneidade. Para os
fins desta pesquisa, esta metodologia foi selecionada como mais vantajosa
devido à possibilidade de levantamento e análise de grande volume de
documentos e informações em um breve período de tempo (VÍCTORA,
KNAUTH e HASSEN, 2000, p. 72), adequando-se, inclusive, ao tempo restrito
de realização do mestrado.
De acordo com Sá-Silva (2009, p. 2), a metodologia empreendida
depende de fatores característicos da pesquisa. No caso da pesquisa
documental, esta possibilita a extração e resgate de grande quantidade de
informação. Seu uso é frequentemente justificado nas Ciências Sociais por
ampliar a análise de objetos cuja compreensão necessita de contextualização
histórica e sociocultural. Permite ainda analisar a dimensão temporal a partir da
compreensão do social ao possibilitar a observação do processo de maturação
ou de evolução de indivíduos, grupos, conceitos, comportamentos, práticas,
entre outras categorias.
Ainda de acordo com o autor (SÁ-SILVA, 2009, p. 5), a pesquisa
documental engloba a busca de informações em fontes primárias, que são os
documentos que não receberam nenhum tratamento científico e, portanto,
serão analisados primeiramente pelo pesquisador. Esta análise é relevante,

22
pois, segundo o conceito de documento apresentado pela Escola dos Anais13
(SÁ-SILVA, 2009, p. 7), documento é qualquer fonte que, por apresentar um
vestígio do passado, tem a função de testemunho de uma história construída
social e culturalmente.
Segundo Cellard (2012, p. 299) a interpretação dos documentos deve
ser precedida de uma avaliação crítica sobre o contexto, o autor, a
autenticidade e confiabilidade do texto, sua natureza e seus conceitos-chave.
Esta análise do corpus documental é de suma importância, pois, devido a sua
ausência de neutralidade, o pesquisador deve considerar a intencionalidade
expressa no documento. Deste modo, a análise destes documentos possibilita
produzir ou reelaborar conhecimentos e criar novas formas de compreender os
fenômenos. Uma vez que os fatos, por si mesmos, nada explicam, é a
interpretação do pesquisador que poderá sintetizar as informações e, na
medida do possível, realizar inferências.

13
A école des Annales funda a chamada Nova História, movimento de oposição ao paradigma
tradicional. Como características desse movimento pode-se citar seu interesse por quase
qualquer atividade humana, uma vez que a realidade é construída social e culturalmente;
formula a história mediante análise das estruturas ao interpretar as transformações das
mentalidades; interesse pela cultura popular descentralizando o discurso dos “grandes
homens” e, para isto, utiliza-se de outras fontes além dos documentos oficiais, englobando
fontes visuais, orais e até estatísticas; associa os fatos tanto aos movimentos coletivos como a
ações individuais e, por fim, considera ser impossível a objetividade na história. Portanto, se
faz sempre necessário justificar a perspectiva de inserção de seu relato uma vez que este,
assim como qualquer documento, não será neutro (BURKE, 1996, p. 14).

23
4. Cronograma
Durante todo o ano de 2016 darei continuidade ao levantamento
bibliográfico14 e à coleta de dados, ambos iniciados em junho de 2015. A
análise dos dados será realizada de julho a dezembro de 2016. A redação da
dissertação terá início em outubro de 2016, com planejamento de defesa em
março de 201715.

14
Ver Anexo I.
15
Ver Anexo II.

24
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EDUSC, 2001.
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26
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quanlitativa em saúde: uma introdução ao tema. Porto Alegre: Tomo Editorial,
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G. Sociologia. São Paulo: Ática, 2008. p. 79-127.

27
Anexos
I. Tabela do levantamento bibliográfico
Título Autor Descritores Resumo
1. O luto antecipado diante GIACOMIN, Karla Cristina; pesar AND Estudo etnográfico observacional que
da consciência da finitude: SANTOS, Wagner Jorge dos; adaptação objetiva compreender o luto
a vida entre os medos de FIRMO, Josélia Oliveira Araújo psicológica antecipado percebido entre a velhice
não dar conta, de dar e os processos saúde-doença e
trabalho e de morrer. incapacidade. Compreender essa
questão é crucial para um cuidado
humanizado e integral da pessoa
idosa e das famílias.
2. Cuidar do processo de MINAYO, Maria Cecília de Souza pesar AND Editorial para revista com foco em
morrer e do luto (editorial) adaptação "Finitude, Morte e Luto". Sobre os
psicológica textos e temas apresentados a partir
de chamada pública.
3. Tudo ao mesmo tempo: NICOLACI-DA-COSTA, Ana Maria pesar AND Examinar como o espaço é
Realidade ou ilusão? adaptação concebido por jovens. Resultado
psicológica aponta um espaço liso (Deleuze e
Guattari) e dimensão temporal da
simultaneidade.

22
4. Cuidados Paliativos em SILVA, Adriana Ferreira da; ISSI, pesar AND Pesquisa qualitativa, exploratória e
oncologia pediátrica: Helena Becker; MOTTA, Maria da adaptação descritiva para conhecer as
percepções, saberes e Graça Corso da; BOTENE, Daisy psicológica percepções, saberes e práticas da
práticas na perspectiva da Zanchi de Abreu equipe multiprofissional. Os temas
equipe multiprofissional revelam que a equipe sofre com a
morte da criança de forma
semelhante à família, recorrendo à
construção de mecanismos de
enfrentamento para a elaboração do
luto.
5. Os lutos da AIDS: da SOUZA, Tânia Regina Corrêa de pesar AND Pesquisa qualitativa com objetivo de
desorganização à adaptação identificar e descrever as perdas de
reconstrução de uma nova psicológica pacientes com HIV/AIDS. Resultados
vida. (dissertação) apontam perdas como a
imortalidade, identidade, saúde e
esperança; na categoria
reorganização as figuras de apego
religião, família e profissionais de
saúde. Sugere política de
humanização com aconselhamento e
trabalhos de grupo como
facilitadores.

23
6. Sintomas de estresse e SOUZA-TALARICO, Juliana Nery pesar AND Identificar sintomas de estresse
estratégias de coping em de; CARAMELLI, Paulo; NITRINI, adaptação devido às mudanças biopsicossociais
idosos saudáveis Ricardo; CHAVES, Eliane Corrêa psicológica do envelhecimento e o estilo de
coping utilizado. Resultados apontam
predomínio do coping focado no
problema.
7. Tanatologia clínica e FARBER, Sonia Sirtoli pesar AND Aborda os cuidados paliativos e a
cuidados paliativos: assistência tanatologia tendo como premissa a
facilitadores do luto terminal necessidade de competências
oncológico pediátrico específicas por parte dos cuidadores.
Educação para a morte favorecendo
a resiliência, facilitando o luto.
8. Como cuidar de um MORAES, Tania Mara de pesar AND Revisão bibliográfica (1992-2008)
doente em fase avançada assistência sobre o cuidar de pacientes em fase
de doença terminal avançada de doença para ter melhor
qualidade de vida e morte digna.
9. Sedação paliativa do NOGUEIRA, Fabíola Leite; pesar AND Revisão com objetivo de verificar a
paciente terminal SAKATA, Rioko Kimiko assistência melhor forma de sedação dos
terminal pacientes com câncer. Conclui que
ainda falta consenso sobre a forma e
esclarecimentos éticos.

24
10. Ética em cuidados PAIVA, Fabianne Christine Lopes pesar AND O objetivo é destacar a importância
paliativos: concepções de; ALMEIDA JÚNIOR, José assistência dos cuidados paliativos e da prática
sobre o fim da vida Jailson de; DAMÁSIO, Anne terminal do cuidado humanizado diante do
Christine processo de terminalidade. Pensa o
processo de morte e morrer a partir
da perspectiva das fases do luto,
estimulando a reflexão dos dilemas
bioéticos associados aos aspectos
da dignidade da pessoa.
11. Proposta psicossocial RIBEIRO, Clécio Ramires pesar AND Por sofrer de uma dor total, o olhar
para pacientes com assistência do profissional de saúde necessita
enfermidades graves ou terminal ser integral para que realmente
terminais possa auxiliá-los no processo de
morrer.

25
12. Sofrimento e dor em SANTOS, Otavio Marambaia dos pesar AND "Cuidado, solidariedade e
cuidados paliativos: assistência compassividade são as novas
reflexões éticas terminal palavras a fazer parte do ideário
médico e das equipes de saúde ante
as novas realidades para melhor
tratar pacientes nos estágios finais
de vida. Sem nenhuma dúvida, é do
cuidado integral e humanizado que
os pacientes precisam - bem mais
que da última tecnologia disponível!"
13. Estudo fenomenológico VALENTE, Silvia Helena; pesar AND Pesquisa qualitativa e
sobre a visita domiciliária TEIXEIRA, Marina Borges assistência fenomenológica para compreender o
do enfermeiro à família no terminal fenômeno vivido por enfermeiros do
processo de terminalidade PSF e o cuidado em domicilio no
processo de terminalidade.
14. O envolvimento do AGUIAR, Isabella Rocha; pesar AND Pesquisa qualitativa com objetivo de
enfermeiro no processo de VELOSO, Tatiana Maria Coelho; atitude frente à compreender a participação do
morrer de bebês PINHEIRO, Ana Karina Bezerra; morte enfermeiro no processo de morrer de
internados em Unidade XIMENES, Lorena Barbosa bebês internados. Profissionais não
Neonatal tem embasamento de Tanatologia.
Buscam o equilíbrio entre o cuidar do
outro e de si mesmo.

26
15. O significado da morte BARBOSA, Caroline Garpelli; pesar AND Compreender como pessoas em
para adolescentes, MELCHIORI, Ligia Ebner; NEME, atitude frente à diferentes etapas desenvolvimentais
adultos e idosos Carmen Maria Bueno morte lidam com perdas e com a própria
finitude. Entrevistas e análise de
conteúdo.
16. Luto da equipe: COSTA, Juliana Cardeal da; LIMA, pesar AND Investigar como os profissionais de
revelações dos Regina Aparecida Garcia de atitude frente à enfermagem vivenciam o luto de
profissionais de morte crianças/adolescentes
enfermagem sobre o hospitalizados. Entrevista.
cuidado à Profissionais necessitam de suporte
criança/adolescente no emocional para viverem o luto e
processo de morte e prevenir Síndrome de Burnout.
morrer Sugere mudança no currículo e
educação permanente como
estratégia.
17. O luto no processo de GESTEIRA, Solange Maria dos pesar AND Relato de experiência. O tabu e
aborto provocado Anjos; BARBOSA, Vera Lúcia; atitude frente à preconceito concorrem para uma
ENDO, Paulo César morte assistência mais técnica da
enfermagem. A melhor qualidade da
assistência de enfermagem poderá
ajudar as mulheres na vivência do
luto.

27
18. Morte na família: um LIMA, Vanessa Rodrigues de; pesar AND Comunicação de morte de parente à
estudo exploratório acerca KOVÁCS, Maria Julia atitude frente à criança (entre 2 e 8 anos) e verificar
da comunicação à criança morte sua adequação ao nível cognitivo e
compreender o papel da família na
elaboração do luto. Entrevistas
abertas.
19. Impacto da morte do filho MORELLI, Ana Bárbara; pesar AND Estudo de caso. Entrevista com
sobre a conjugalidade dos SCORSOLINI-COMIN, Fabio; atitude frente à roteiro semiestruturado com casal
pais SANTOS, Manoel Antônio dos morte unido há 39 anos que perdera o filho
mais novo há 3 anos.
20. Morte e criança NASCIMENTO, Estelina Souto do; pesar AND Compreender o significado da morte
MACIEL, Antônia Matilde; Teixeira, atitude frente à para crianças que vivenciaram a
Virginia Mascarenhas Nascimento; morte perda de uma colega.
NASCIMENTO, Rosane Geralda
do
21. O jardim de Julia: a OISHI, Karen Lie pesar AND Compreender a vivência de uma mãe
vivência de uma mãe atitude frente à durante a elaboração do luto após a
durante o luto morte perda de um filho no período
neonatal. Estudo de caso a partir de
atendimentos psicoterápicos
individuais. Rituais e psicoterapia
como facilitadores na elaboração de

28
um luto saudável.

22. A percepção da equipe de RIBEIRO, Maria Cecília; BARALDI, pesar AND Avaliar a percepção de funcionários
enfermagem em situação Solange; SILVA, Maria Julia Paes atitude frente à da equipe de enfermagem e o
de morte: ritual do preparo da morte sentimento presente durante o
do corpo "pós-morte" preparo do corpo pós-morte.
Entrevista.
23. Cuidando de pacientes em SADALA, Maria Lucia Araújo; pesar AND Entrevista com alunos de graduação
fase terminal: a SILVA, Fernanda Machado da atitude frente à em enfermagem. Atribuem suas
perspectiva de alunos de morte dificuldades à própria incapacidade
enfermagem de aceitar a morte e ao despreparo e
inexperiência.
24. Idosas viúvas: da perda à SUZUKI, Milena Yuri; SILVA, Thaís pesar AND Compreender o processo de luto e as
reorganização Lima Bento da; FALCÃO, atitude frente à estratégias de enfrentamento para
Deusivania Vieira as Silva morte sua elaboração. Revisão
bibliográfica.

29
25. Luto e fenomenologia: FREITAS, Joanneliese de Lucas pesar AND Objetiva apresentar uma
uma proposta atitude frente à compreensão descritiva dos
compreensiva morte processos de luto. O luto é uma
vivência que aparece com uma forte
exigência de ressignificação do
mundo-da-vida, onde o que é perdido
pelo enlutado não é apenas um ente
querido, mas também formas
próprias de ser-no-mundo.
26. A morte do filho ALVES, Elaine Gomes dos Reis pesar AND Não autorização do luto pela morte
idealizado. ética AND do filho idealizado (déficit no
(depoimento/testimonial) morte desenvolvimento).

27. Cuidados Paliativos e luto: FERNANDES, Maria Andréa; pesar AND Estudo exploratório por meio de
compreensão de médicos PLATEL, Indiara Carvalho dos ética AND análise de conteúdo sobre a
residentes Santos; COSTA, Solange Fátima morte compreensão de médicos residentes
Geraldo da; SANTOS, Franklin acerca dos cuidados paliativos e do
Santana; ZACCARA, Ana Aline luto.
Lacet; DUARTE, Marcella Costa
Souto

30
28. A não-escuta do analista SCOZ, Maria Carolina pesar AND Debate sobre o filme "La stanza del
enlutado: desafio psíquico, ética AND figlio" em que o pai, psicanalista,
dilema ético morte para de clinicar após a morte de seu
filho.
29. Cuidados paliativos em VALADARES, Maria Thereza pesar AND Revisa aspectos relevantes na
pediatria: uma revisão Macedo; MOTA, Joaquim Antônio ética AND abordagem paliativa uma vez que se
César; OLIVEIRA, Benigna Maria morte torna mais frequente a assistência a
de crianças com doenças crônicas e
ameaçadoras à vida.
30. Cuidador principal de ARAÚJO, Laís Záu Serpa de; pesar AND Objetivo de identificar o perfil dos
paciente oncológico fora ARAÚJO, Carolina Záu Serpa de; morte AND cuidadores de pacientes oncológicos.
de possibilidade de cura, SOUTO, Andrezza Karine de doente Aplicou-se um questionário fechado.
repercussões deste Barros Almeida; OLIVEIRA, terminal Maioria era do sexo feminino.
encargo Maxwell da Silva Também foram observadas
repercussões negativas de natureza
física e/ou psíquica; 60%
responderam que o local mais
conveniente para o óbito é no
hospital.

31
31. Esporte competitivo na BAPTISTA, Cláudio Aparício Silva; pesar AND Estudo de revisão. Objetiva a
criança e no adolescente - FORONDA, Antonio; BAPTISTA, morte AND necessidade do envolvimento de
Exame Pré-Participação: Luciana de Pádua Silva revisão entidades médicas na elaboração de
Eletrocardiograma um protocolo EPP inserido na
obrigatório? realidade brasileira devido à
ocorrência de mortes súbitas e a
demora de uma avaliação - que pode
causar desmotivação.
32. A influência do luto no CAMPOS, Maria Teresa Fialho de pesar AND Abordam os efeitos do luto recente
comportamento alimentar Sousa morte AND no comportamento alimentar,
e suas implicações nas revisão seguindo-se da análise de alguns
condutas nutricionais pontos de vista da entrevista
dietética. A identificação dessa
influência permite melhor
planejamento das estratégias
alimentares, contribuindo
sobremaneira para ações de
enfrentamento e de apoio ao luto.

32
33. Análise da SANTOS, Fernanda Batista pesar AND Objetiva avaliar as publicações
morbimortalidade de Oliveira; CARVALHO, Luciana morte AND buscando identificar o perfil de
vítimas de acidentes de Wildhagen de revisão morbidade e mortalidade dos
trânsito: uma revisão acidentes de trânsito. Identificam a
cabeça como local mais afetado e
confirma a alta morbidade e
mortalidade. Indica educação da
população como prevenção.

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II. Cronograma
Ano 2015 2016 2017

Mês 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1 1 1 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1 1 1 1 1 3
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 1 2 3

Levantamento X X X X X
Bibliográfico

Coleta de X X X X X X X X X X X X
dados

Redação do
projeto

Análise dos X X X X X X
dados

Redação da X X X X X X X X X X X
dissertação

Defesa da X
dissertação

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