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PREFÁCIO.
Objetivo da obra: fazer conhecer o budismo e, particularmente, “sua expressão máxima” (pg.
9), os ensinamentos de Nichiren Daishonin.
Objetivo do budismo: “revitalizar a vida humana ... atingir a felicidade absoluta” (pg. 9); “atingir
o estado de buda e atingir os requisitos de bodisatva” (pg. 14). O meio para atingir tal meta
seria a prática correta do budismo de ND, com empenho na fé e na prática.
Afirma-se que todos os ensinamentos de Shakyamuni (sábio dos Shakya, Sidarta Gautama),
fundador histórico do budismo foram registrados na forma de sutras. Tais ensinamentos
visariam solucionar os quatro sofrimentos inevitáveis que se impõem a todos os seres viventes:
nascimento, envelhecimento, doença e morte e “capacitar cada indivíduo a estabelecer sua
própria identidade” (p. 13), ou iluminação.
O QUE É O BUDISMO?
Sistema de pensamento religioso que não faz distinção “entre divindade e ser humano” (p. 14)
e que, consequentemente, reconhece a dignidade de todos os seres humanos. Revela, de
forma prática, a oposição entre o verdadeiro eu e o mundo dos fenômenos.
FASES DO BUDISMO.
BUDISMO HINAIANA (pequeno veículo) – Premido pelas tendências das pessoas de sua época,
que, amiúde, confundiam felicidade com a satisfação de prazeres mundanos, Shakyamuni
ensinou, inicialmente, a futilidade da vida terrena e das múltiplas reencarnações, processo que
prolonga o sofrimento. Daí, passou a atacar o desejo como o principal causador do sofrimento
e ensinou as pessoas a combatê-los e, eventualmente, suprimi-los. “As pessoas aprendiam a
almejar o estado de nada, o vazio. Esses ensinamentos constituíam-se em uma simples
introdução ao conceito mais profundo da não substancialidade (ku)” (pg. 16).
BUDISMO MAHAIANA (definitivo) – Nesta fase, Shakyamuni impeliu seus discípulos a voltarem-
se, de novo, para si mesmos, afastou a ideia de paraíso exterior ao mundo fenomenal. “Ensinou
que se compreendessem a realidade máxima que estava dentro de sua própria vida, mesmo o
mundo em que habitavam tornar-se-ia uma terra eternamente pacífica”, (p. 17). Essa revelação
de Shakyamuni originou o Sutra de Lótus (Myoho-renge-kyo), cuja essência foi exposta mais
tarde por N.D.
BUDISMO NICHIREN – Em vista da profusão de sutras, apropriados por várias seitas, que faziam
deles o que lhes aprouvesse, N.D., após estudo acurado e munido de “provas documentais
irrefutáveis” (p. 18), provou o descaminho doutrinário imposto pelas várias seitas. Afirmou,
então, que “os verdadeiros ensinamentos budistas são encontrados no Sutra de Lotus” (idem).
N.D., ao considerar a infinitude do tempo e não apenas o tempo histórico, no âmbito em que o
budismo foi revelado à humanidade por Shakyamuni, foi despertado para a verdade suprema
da vida no infinito passado. Ou seja, cronologicamente, N.D., apreendeu tal verdade bem antes
de Shakyamuni. Este seria um buda provisório, enquanto N.D., o buda original, por ter atingido
a iluminação por si próprio e ter revelado a verdade fundamental da vida. A título de nota, N.D.
cumpre os dois objetivos do budismo: atuar como buda e bodisatva (na pessoa do bodisatva
Práticas Superiores).
SIGNIFICADO DE FÉ.
Crer, ou ter fé, é a capacidade de aceitar uma premissa, ainda que seja necessário empregar
critérios ou disposições suprarracionais. Portanto, as ações empreendidas por aqueles que
professam qualquer fé, ostentarão as características desta própria fé. Enfim, tais ações podem
causar estranheza entre aqueles que não compartilham desta fé, sobretudo por esta não se
enquadrar totalmente aos ditames de suposta racionalidade universal, isto é, valer-se de
parâmetros suprarracionais. “A fé budista opõe-se à irracionalidade e harmoniza-se
perfeitamente com a razão em todos os campos em que esta pode penetrar, assim como
também requer a aceitação de uma verdade suprarracional” (p. 24). Distinguem-se, pois,
racional e suprarracional.
É provável que o próprio Shakyamuni tivesse afirmado ser o Sutra do Lótus o “seu único
ensinamento verdadeiro e teve prazer em ver seus discípulos acreditarem apenas nesse
ensinamento” (p. 25). A título de esclarecimento: “Além disso, não se sabe quando exatamente
os ensinamentos de Shakyamuni sobre a verdade suprema foram compilados na forma do
Sutra do Lótus. Nichiren Daishonin afirma, em seus escritos, que o Sutra do Lótus, apareceu
imediatamente após o falecimento de Shakyamuni, e isso parece plausível.” (pp. 120 e 121).
“A força e o espaço vital não são limitados pelo corpo físico, mas se estendem até incluírem os
domínios dos seres vivos e do meio ambiente. Uma mudança na vida influencia
automaticamente o ambiente, e essa mudança ambiental é o significado da boa sorte. O
ideograma chinês que designa a ‘boa sorte’ significa ‘plenitude dos deuses’, ou, no budismo, os
poderes inerentes ao meio ambiente”, (p. 27). Os benefícios dividem-se em dois: sabedoria,
reforma da vida humana; boa sorte, reforma do meio ambiente.
SEIS PARAMITA.
São as práticas a serem realizadas pelos bodisatvas com vistas a abandonar a margem da
ilusão em direção à margem da iluminação, processo que se finalizaria após inúmeros kalpas.
São os que seguem: (1) doação; (2) observância dos preceitos; (3) perseverança ou resistência;
(4) assiduidade; (5) meditação; e (6) prática da sabedoria adquirida nesse processo gradual.
“Em contraste, as pessoas dos dois veículos (ouvintes da voz e aqueles que despertaram para a
causa) que buscam apenas a própria felicidade, podem ser definidos como aqueles que são
arrastados para uma direção diferente da ‘outra margem’, apesar de terem sido bem sucedidos
em deixar ‘esta margem’ da ilusão e terem embarcado em uma viagem rumo à iluminação” (p.
31).
SIGNIFICADO DE FELICIDADE.
“O principal ingrediente para a felicidade encontra-se na própria vida. Ela está diretamente
relacionada ao grau em que se pode extrair a própria força vital e a esperança no futuro. Se
uma pessoa não tem estas qualidades, ela compara o seu presente com o passado ou com o
seu ambiente. A felicidade por comparação é, na verdade, uma ‘felicidade relativa’”. (p. 32). O
que tornaria a felicidade possível é a capacidade de exploração da força vital e da esperança no
futuro.
“A Lei ensinada do budismo não foi estabelecida por nenhum ‘ser’ específico. Ela existe
inerentemente como o âmago do Universo e é a causa e a sustentação de tudo o que existe ...
o Buda não criou nem estabeleceu a Lei, mas esclareceu o que originariamente governa o
universo ... para que as normas e leis na vida diária possam atuar harmoniosamente, elas
devem estar de acordo com as verdades contidas na natureza essencial de um ser humano e de
todos os fenômenos. As leis do mundo da política, da jurisprudência e da ciência social não
devem ser estabelecidas arbitrariamente por alguma pessoa ou autoridade especial, mas sim
com base num discernimento que penetre a verdade subjacente à existência da vida
humana ... No nível mais profundo da vida, a verdade fundamental que sustenta todos os
fenômenos e leis universais é a Lei Mística da forma como é indicada no Sutra do Lótus, o Nam-
myoho-renge-kyo, e buda é a pessoa que se iluminou para ela.” (pp. 33, 34).
FATALISMO E LIBERDADE
DEUS E BUDA.
“O budismo descreve os deuses como forças benéficas inatas no meio social e natural e que
atuam protegendo os seres humanos, especialmente aqueles que praticam o budismo
corretamente. As forças inerentes ao meio ambiente são chamadas ‘boa sorte’, as ações dos
deuses budistas que as pessoas ativam para extrair sua própria sabedoria do Buda.” (p. 39).
“O budismo elucida as verdades com base nas capacidades subjetivas das pessoas, extraindo
assim sabedoria prática da vida ... Na busca da verdade, a ciência aproxima-se principalmente
do raciocínio analítico e indutivo, ao passo que o raciocínio budista é um método global de
dedução e intuição.”(pp. 42 e 43). [Diferentemente da ciência, que tende a reduzir as
particularidades do objeto a padrões objetivos, o budismo, ao contrário, como certos tipos de
filosofia, busca incluir o particular em tipologias que, embora generalizantes, não
desconsideram as particularidades, mas valorizam o caráter subjetivo, único. Ou seja, a relação
sujeito versus objeto é, no mínimo, atenuada. Em suma: enquanto à ciência interessa reduzir a
diversidade do particular a padrões observáveis e reproduzíveis pelo método experimental
avalizado pela indução generalista, ao budismo apetece a essência do particular, que age
segundo características próprias, ainda que a seguir parâmetros preestabelecidos, mas sem
qualquer tipo de determinismo comportamental. Ao budismo interessa o vivido].
PARTE 2 – FILOSOFIA BUDISTA DE VIDA.
Os dez estados são condições que qualquer pessoa pode experimentar em sua vida. Também
chamados de mundos por, em determinada época, serem considerados regiões geográficas
onde os que, supostamente, os habitavam, compartilhavam de suas características
particulares. O S.L. desconstruiu essa visão e instituiu o conceito de possessão mútua dos
mundos. Isto é, os mundos deixaram de ser determinados geograficamente e passaram a ser
considerados estados psicológicos, subjetivos, portanto. Os estados são: [1] inferno (jigoku-kai)
– desespero e sofrimento extremos, que provocam a destruição de si mesmo e dos outros; [2]
espíritos famintos (gaki-kai) – caracterizado por ganância e egoísmo extremos, busca ilimitada
de prazeres; [3] animalidade (chikusho) – domínio dos instintos sobre a capacidade de pensar;
[4] perversidade (ashura) – excessiva valorização do eu, desprezo por outras pessoas; [5]
humanidade ou tranqüilidade (nin) – controle dos desejos e impulsos, uso da razão para o
estabelecimento de harmonia com os outros; [6] seres celestiais (ten) – “condição de
contentamento e alegria, sentidos quando a pessoa se liberta do sofrimento ou satisfaz algum
desejo” (p. 53). [7] ouvintes da voz ou erudição (shomon) – dedicação à autorreforma pela
apreensão de ideias e experiências edificantes, transmitidas pelos ensinamentos ancestrais e
contemporâneos; [8] despertos para a causa ou autorreeducação (engaku) – empreendimento
da autorreforma por meio da observação dos fenômenos, equipara-se ao estado anterior; [9]
bodisatvas (bosatsu) – caracterizado pela compaixão e devoção à felicidade dos outros, à custa
do sacrifício do praticante; [10] buda (butsu) – obtenção da sabedoria para compreensão da
realidade máxima da vida e do seu eu eterno perfeito [amala].
“Os seis mundos inferiores, do mundo do inferno ao mundo dos seres celestiais, se manifestam
por meio de impulsos ou desejos, mas são totalmente controlados pelas restrições impostas
pelo ambiente e extremamente vulneráveis às circunstâncias instáveis ... As pessoas do mundo
dos ouvintes da voz e do mundo dos que despertaram para a causa tendem a carecer de
compaixão, chegando a extremos na busca de sua própria perfeição. Em contraste, um
bodisatva descobre que o caminho para a autoperfeição encontra-se unicamente [grifo nosso]
no ato da compaixão – de salvar outros do sofrimento”. (pp. 53 e 54).
O “princípio dos dez fatores é uma análise dos aspectos imutáveis da vida, os quais são comuns
a todos os fenômenos mutáveis ... Os dez mundos ou estados expressam as diferenças entre os
fenômenos, ao passo que os dez fatores [tudo grifo nosso] descrevem o modelo de existência
comum a todos os fenômenos manifestados pela entidade de vida a cada momento. Esses
fatores comuns nos ajudam a compreender como nossa vida muda de um estado para outro e
a verdadeira entidade da vida da forma como ela se revela nos aspectos mutáveis dos dez
mundos. Tiantai da China usou essa passagem do Sutra do Lótus a respeito dos dez fatores
para comprovar o estabelecimento da doutrina do ichinen sanzen”. (p. 56 e 57).
As partículas atômicas que formam, em ordem crescente, os átomos e moléculas (ou íons) e,
enfim, o bloco de granito em si, existem, ou se organizam no espaço, de uma forma
completamente diversa daquela pela qual nós os percebemos. Ou seja, aquilo que, de fato,
constitui tudo o que existe fisicamente, as partículas atômicas, não existe da mesma forma
como nós percebemos, pelos nossos sentidos, o produto final da sua organização no
espaço/tempo, o mesmo bloco de granito. As partículas atômicas existem como padrões
ondulatórios: ora existem, são; ora não existem, não são. (CF. CONCEITO DE VIRTUALIDADE).
Logo, a rigor, a matéria constituída por tais partículas, assim como elas próprias, não se podem
incluir na categoria de substância, na acepção corrente da palavra. O conceito da não-
substancialidade corresponde à “percepção da essência ou aspecto espiritual” (p.65) da
entidade.
A combinação de partículas atômicas que constituem tudo o que existe no reino da matéria, se
manifesta no espaço e no tempo. O referido bloco de granito, como tudo mais que é
constituído de matéria, carece de perenidade.
TRÊS CORPOS.
“O conceito dos três corpos (san-jin), ou três tipos de corpo que um buda possui, está
intimamente relacionado com as três verdades da não substancialidade, da existência
temporária e do caminho do meio. Ao estudar e compreender a vida do Buda de acordo com
as três verdades, pode-se compreender os três corpos,” (p. 61).
Tal iluminação está de acordo com o princípio da unicidade da vida e do seu ambiente: “ ... o
pensamento budista sustenta que a vida e o seu ambiente são inseparáveis. Existe entre os
seres sensíveis e insensíveis uma relação mútua de apoio, sustento e influência. Assim, ambos
podem ser considerados como essencialmente um só [cf. conceito de funi]. Portanto, não se
pode considerar que atingir o estado de buda seja restrito apenas aos seres sensíveis ... Por
exemplo, quando os seres sensíveis que atingiram o estado de buda veem uma montanha, esta
lhes parece como a entidade do estado de buda. No entanto, ao ver a mesma montanha, os
seres sensíveis do mundo dos espíritos famintos enxergam-na como se fosse a entidade da
fome. Os seres insensíveis não possuem a capacidade de desenvolver a si próprios. Se
estiverem para atingir o estado de buda, deve ser por causa de algum ser sensível que está
atuando em favor deles, permitindo-lhes assim manifestar sua natureza inata de buda” (p. 69).
O unicidade da vida e do seu ambiente explica o modo como a fé no Gohonzon (causa interna à
vida, ou ser) se relaciona ao próprio Gohonzon (causa externa, ambiental). O poder do
Gohonzon se manifesta mediante a harmonização entre o ambiente e a vida, a causa externa e
a interna.
NOVE CONSCIÊNCIAS.
GLOSSÁRIO:
Bodisatva – Aquele que realmente se empenha pelos outros, ao auxiliá-los a atingir o estado
de Buda, inspirados pela jihi (cf.).
Gohyaku jintengo – passado longínquo; envolve o tempo em que Shakyamuni teria alcançado
sua iluminação, só muito depois teria se manifestado como Buda histórico.
Budismo – Filosofia de vida que ensina como purificar a vida, desenvolver a sabedoria e
estabelecer a real independência.
Unicidade da vida e do seu ambiente (esho funi) – “Esho é a contração dos termo em japonês
eho e shoho. Eho indica o ambiente insensível, ou mundo objetivo; e soho, a personalidade
ativa, ou mundo subjetivo. A sílaba ho significa o efeito manifesto, ou resultados do carma. Os
efeitos do carma de um ser vivo manifestam-se tanto em sua vida subjetiva como em seu
ambiente objetivo” (p. 66). Para o significado de funi cf. Unicidade do corpo e da mente, neste
Glossário; “... é um princípio que sugere como as pessoas podem influenciar e reformar seu
ambiente por intermédio de uma mudança interior, ou a elevação de seu estado de vida. Neste
princípio está contida a ideia de que assim como o ambiente influencia o indivíduo, esse
também pode causar uma mudança no ambiente ... O meio ambiente é um reflexo da vida
interior do indivíduo que nele habita. Esse ambiente assume as características que estão de
acordo com a condição de vida do indivíduo em questão. Em outras palavras, a vida estende
sua influência ao seu redor ... A consciência do ser vivo pode ser descrita como soho e os
outros quatro dos cinco componentes – forma ou corpo, percepção, concepção e volição –
existem para fazer com que o indivíduo interaja com os outros seres vivos e com o ambiente
natural que juntos formam o eho ... o budismo considera que a vida abrange uma vasta
extensão de influência e atividade, as quais integram tanto os seres vivos como seu ambiente”
(pp. 67 e 68).
Revolução Humana – “O termo ... indica a elevação gradativa do estado que forma a tendência
básica de uma pessoa e o estabelecimento do estado de buda como base de sua vida. Quando,
em consequência dessa elevação, as atividades da vida dessa pessoa centram-se em torno do
estado mais alto possível, o estado de buda, isso significa que a pessoa atingiu a iluminação.”
(p. 56).
Mappo- Os Últimos Dias da Lei, o momento presente em que a pessoa vive.
Kuan e mappo – Conceito que expressa a capacidade de retorno ao estado de vida original
(amala).