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História da ultra-sonografia intra-operatória

Article  in  Radiologia Brasileira · November 2002


DOI: 10.1590/S0100-39842002000600008 · Source: DOAJ

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11 authors, including:

Márcio André Martins Vincenzo Pugliese


Universidade Estadual do Centro-Oeste do Paraná (UNICENTRO) University of São Paulo
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Paulo Herman Marcel C Machado


University of São Paulo University of São Paulo
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Artigo Original Machado MM et al.

HISTÓRIA DA ULTRA-SONOGRAFIA INTRA-OPERATÓRIA*


Márcio Martins Machado1, Ana Cláudia Ferreira Rosa2, Nestor de Barros3, Vincenzo Pugliese4,
Paulo Herman4, William Abrão Saad5, Marcel C.C. Machado6, Luciana Mendes de Oliveira Cerri7,
Joaquim J. Gama-Rodrigues8, Angelita Habr-Gama9, Giovanni Guido Cerri10

Resumo A ultra-sonografia intra-operatória foi realizada especialmente a partir de 1960, com alguns relatos de expe-
riências iniciais nos anos 50. Inicialmente foram avaliados tumores cerebrais, posteriormente estudando-se
também cálculos de vias biliares e cálculos renais. Entretanto, a ultra-sonografia intra-operatória em modo
A ou modo B estático não adquiriu grande aceitação no meio médico. Não obstante, os primeiros estudos
forneceram as bases para o desenvolvimento da moderna ultra-sonografia intra-operatória, com a utilização
dos equipamentos ultra-sonográficos em modo B em tempo real. Os autores discorrem sobre a utilização da
ultra-sonografia intra-operatória desde o seu início até os dias atuais.
Unitermos: Ultra-sonografia intra-operatória; Ultra-sonografia em modo A; Ultra-sonografia em modo B es-
tático.

Abstract History of intraoperative ultrasonography.


Intraoperative ultrasonography was initially used after 1960. There are also few reports on initial experi-
ences published during the 50’. This technique was firstly used to study cerebral tumors and later on it was
also used to evaluate biliary and renal calculi. At that time, intraoperative ultrasonography with A-mode or
nonreal-time B-mode imaging did not achieve great recognition by surgeons and clinicians. However, the
efforts of the initial reports were used in the development of modern intraoperative ultrasonography using
real-time B-mode imaging. The authors comment on the evolution of intraoperative ultrasonography since
its birth up to date.
Key words: Intraoperative ultrasonography; Ultrasonography with A-mode imaging; Ultrasonography with
nonreal-time B-mode imaging.

INTRODUÇÃO lativamente nova(1–3). A USIO desenvol- Schlegel et al.(4) relataram o uso com
veu-se a partir de 1960, podendo ser iden- sucesso da USIO em modo A na localiza-
A ultra-sonografia intra-operatória tificadas três fases que marcaram a evolu- ção de cálculos renais. Os autores referi-
(USIO) é uma modalidade diagnóstica re- ção desse método ao longo do tempo(1). ram que a USIO foi útil na identificação de
O primeiro período ocorreu na década diversos cálculos não-palpáveis, permitin-
* Trabalho realizado no Departamento de Radiologia do de 60, sendo marcado pela USIO usando do nefrotomias pequenas, exatamente ao
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Univer-
sidade de São Paulo (HC-FMUSP) e no Departamento de o modo A ou o modo B com imagens es- nível dos cálculos.
Radiologia do Hospital Sírio Libanês, São Paulo, SP. táticas. O segundo período compreende o A ultra-sonografia em modo A aplica-
1. Médico Radiologista do Hospital das Clínicas da Fa-
culdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (HC-
final dos anos 70 e os anos 80, quando da na via biliar também se iniciou nos anos
FMUFG), Doutor em Radiologia pela FMUSP. ocorreu uma expansão do método, com a 60. Entretanto, os primeiros estudos rea-
2. Médica Radiologista do HC-FMUFG, Pós-graduanda ultra-sonografia em modo B com imagens lizados para identificar cálculos biliares
do Departamento de Radiologia da FMUSP.
3. Professor Doutor do Departamento de Radiologia da em tempo real. O terceiro período teve com a USIO foram feitos por via laparos-
FMUSP. início nos anos 90, marcado pela utiliza- cópica, por um grupo japonês, liderado por
4. Médicos Assistentes do Serviço de Cirurgia do Fíga-
do e Hipertensão Portal do HC-FMUSP, Doutores em Ci- ção do Doppler e da ultra-sonografia lapa- Wagai, conforme citado por Makuuchi et
rurgia pelo Departamento de Gastroenterologia da FMUSP. roscópica. É importante observarmos que, al.(1). Já em 1958, esse grupo, por intermé-
5. Chefe do Serviço de Cirurgia do Fígado e Hiperten-
são Portal do HC-FMUSP.
durante esse período, foram identificadas dio de Yamakawa et al.(9), relatou a utili-
6. Professor Titular da Disciplina de Transplante e Ci- influências vindas principalmente da Eu- zação de um protótipo de transdutor lapa-
rurgia do Fígado da FMUSP. ropa, EUA, Japão e Austrália(1). roscópico para visualizar cálculos de vesí-
7. Chefe do Setor de Ultra-Sonografia da Divisão de
Clínica Urológica do HC-FMUSP. cula biliar e câncer gástrico. Esse transdu-
8. Professor Titular da Disciplina de Cirurgia do Apare- tor possuía 5 mm de diâmetro e 30 cm de
lho Digestivo da FMUSP. USIO EM MODO A OU MODO B
9. Professora Titular da Disciplina de Coloproctologia da ESTÁTICO comprimento, com a freqüência de 5,0
FMUSP. MHz. Os resultados clínicos dessas avalia-
10. Professor Titular do Departamento de Radiologia da A partir do início dos anos 60, a USIO ções em 81 pacientes foram publicados
FMUSP.
Endereço para correspondência: Dr. Márcio Martins Ma- em modo A foi utilizada por diversos au- posteriormente por Hayashi et al.(5), repre-
chado. Rua 1027, 230, Ed. Fabiana, apto. 304. Goiânia, tores para a localização de cálculos re- sentando o pensamento do grupo que era
GO, 74823-120. E-mail: marciommachado@ibest.com.br
Recebido para publicação em 9/4/2002. Aceito, após
nais(4), cálculos biliares(5–7) e massas cere- liderado por Wagai, novamente conforme
revisão, em 23/7/2002. brais(8). relatado por Makuuchi et al.(1).

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História da ultra-sonografia intra-operatória

Knight e Newell(6) relataram seus estu- utilizados no futuro. Ainda devemos men- esses trabalhos, a USIO foi importante para
dos com a USIO na identificação de cálcu- cionar que, logo antes do desenvolvimen- a localização do ducto dilatado e para de-
los biliares, também com o modo A. Seus to da USIO com o modo B em tempo real, finir se este se apresentava dilatado o sufi-
resultados iniciais foram reproduzidos de houve a introdução da USIO em modo M ciente para uma adequada anastomose, nas
maneira mais precisa pelo estudo de Eise- durante cirurgias cardíacas. Johnson et derivações biliares internas intra-hepáticas.
man et al.(7). Esses investigadores, após al.(10) iniciaram o uso da ecocardiografia As imagens em modo B em tempo real
realizarem estudos in vitro e in vivo usan- em modo M durante cirurgias cardíacas apresentavam importantes vantagens quan-
do animais, realizaram o estudo em huma- para afecções na válvula mitral. do comparadas àquelas obtidas em modo
nos, em que analisaram 46 operações so- A ou em modo B estático. Dentre elas, es-
bre as vias biliares. Utilizaram um instru- USIO COM O MODO B EM TEMPO ses autores relataram a rapidez na obten-
mento com 1,8 cm de diâmetro, com trans- REAL ção das imagens, a facilidade em repeti-las,
dutor de 2,25 MHz de freqüência. Aprimo- e a interpretação mais fácil dessas imagens.
raram ainda mais a técnica, sendo que nos A partir dos meados dos anos 70, com Esses autores concluíram que o método
últimos oito pacientes desenvolveram um o desenvolvimento da tecnologia e o aper- requer pessoal experiente e familiarizado
transdutor com 3 mm de diâmetro e com feiçoamento do instrumental técnico, a com o instrumental e a interpretação das
freqüência de 7,5 MHz, que foi introduzi- ultra-sonografia bidimensional em tempo imagens da USIO. Deve ser notado que
do no interior da via biliar. Esse artifício foi real com o modo B tornou-se disponível. esses preceitos permanecem atuais, mesmo
utilizado para identificar cálculos intra- Nesse particular, foi especialmente impor- decorridos mais de 20 anos desde que foi
hepáticos e coledococianos. Com esse es- tante o desenvolvimento dos transdutores feita esta referência. O transdutor inicial-
tudo, foi demonstrada a possibilidade de se de alta freqüência, o que propiciou a aqui- mente utilizado por Makuuchi et al.(12) era
avaliar a via biliar durante a cirurgia, tanto sição de imagens de melhor qualidade. o mesmo que havia sido desenvolvido para
externamente no campo operatório quan- Portanto, com esse desenvolvimento dos a realização da ultra-sonografia abdominal
to introduzindo o transdutor no interior da transdutores e com as imagens bidimen- convencional, sendo, portanto, muito gran-
via biliar. Isto possibilitaria auxiliar na sionais em tempo real com o modo B, a de e inadequado para o manuseio intra-
identificação e remoção dos cálculos nas USIO beneficiou-se à medida que passou operatório(1).
vias biliares e, adicionalmente, poderia a contar com imagens de alta qualidade e Nesse contexto, entendia-se a necessi-
corroborar o exame final das vias biliares imediatas, superando as dificuldades das dade de se encontrar instrumental adequa-
após a remoção dos cálculos. imagens obtidas com o modo A e com o do para a realização de USIO nos países
Em meados dos anos 60, muitos auto- modo B estático. Entende-se, portanto, o orientais, onde a incidência de cirrose e
res relataram a utilidade da USIO em modo ressurgimento do interesse pela USIO em hepatocarcinomas é alta. Nesses pacientes
A durante cirurgias neurológicas. Sugar e diversos setores da cirurgia, observado no com fígados cirróticos, muito freqüente-
Uematsu(8) usaram transdutores com fre- final dos anos 70 e início dos anos 80(1). mente os tumores não são palpáveis e nem
qüência de 2,0 a 5,0 MHz. Esses autores Nessa nova perspectiva de utilização da visíveis. Desta feita, os japoneses foram
aplicavam os transdutores após a cranio- USIO, foram Cook e Lytton(11), nos EUA, pioneiros na tentativa de desenvolver um
tomia, sobre a dura-máter úmida. Com essa e Makuuchi et al.(12), no Japão, quem pri- transdutor adequado para a realização da
técnica, avaliaram uma série de lesões co- meiro descreveram o uso da USIO com o USIO (Figuras 1A, 1B e 2). Foram Makuu-
mo tumores cerebrais (astrocitomas, glio- modo B em tempo real. chi et al.(14) e Akimoto et al.(15) quem pri-
blastomas, ependimomas e metástases), Cook e Lytton(11) utilizaram um trans- meiro desenvolveram transdutores lineares
hemorragias, cistos, abscessos e hidrocefa- dutor com freqüência de 10,0 MHz para especificamente desenhados para o uso
lia. Nesses estudos, a USIO foi considera- estudar o rim no intra-operatório, na pro- intra-operatório. O transdutor de Makuu-
da como método simples, seguro e rápido, cura de cálculos durante nefrolitotomias. chi et al.(14) apresentava o formato em “I”
auxiliando o procedimento cirúrgico. Esses autores demonstraram, ao ultra-som, (Figura 1B), medindo 1,4 × 1,9 × 6,2 cm,
Mesmo com esses esforços, os exames a presença de cálculos não-palpáveis de 2 e apresentava a freqüência de 3,5 MHz.
com o modo A ou com o modo B estático mm e de 3 mm. Esses mesmos autores re- Este transdutor foi fabricado pela Aloka
não alcançaram grande aceitação por par- lataram, em outro trabalho(13), a remoção, Co. (Tóquio, Japão). Este transdutor me-
te dos médicos. Mesmo que esses resulta- com sucesso, de pequenos cálculos e frag- rece destaque, pois foi o primeiro que po-
dos iniciais não fossem representativos, mentos de cálculos. dia ser segurado facilmente entre os dedos
eles expressavam o desejo dos médicos em Makuuchi et al.(12) fizeram uso de um do examinador, e desta forma permitiria
complementar a avaliação de seus pacien- transdutor linear de 2,5 MHz e 3,5 MHz uma varredura mais adequada do parênqui-
tes, procurando aprimorar a capacidade de para a avaliação intra-operatória do fíga- ma hepático. Posteriormente, foi desenvol-
detectar e localizar lesões. Esses esforços do e do pâncreas. Eles determinaram a lo- vido outro transdutor, com o formato em
contribuíram para que se acumulasse co- calização do ducto biliar dilatado para a “T” (Figura 1A), de 5,0 MHz, o que faci-
nhecimento sobre a aplicação da USIO nos realização de derivação biliar interna e litava a orientação do examinador duran-
primeiros anos de sua utilização(1), e mui- externa. Esses autores avaliaram também a te a realização de biópsias(14). Já o trans-
tos ensinamentos dessa época puderam ser USIO nas doenças pancreáticas. Segundo dutor de Akimoto et al.(15) (Figura 2) era

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Machado MM et al.

triangular, medindo 2,1 × 8,5 × 8,2 cm,


com freqüência de 3,5 MHz, fabricado
pela Toshiba Co. (Tóquio, Japão).
Deve ser mencionado, também, que
Cook e Lytton(11,13) utilizaram um transdu-
tor em modo B, oftálmico (tipo “Bronson-
Turner”), que era adaptado para o uso in-
tra-operatório. Este mesmo transdutor foi
usado por outros pesquisadores no final
dos anos 70(16). Dessa forma, pode-se di-
zer que nos EUA, no Reino Unido e na
Austrália os instrumentos em modo B, ini- Figura 1. A: Transdutor intra-operatório em “T”. B: Transdutor intra-operatório em “I”.
cialmente introduzidos na cirurgia no final
dos anos 70 e início dos anos 80, eram apa-
relhos setoriais mecânicos e cilíndricos
(formato de lápis) (17). Diferentemente des-
sa tendência, no Japão, os estudos dessa
época utilizavam transdutores lineares ele-
trônicos, como descrito por Makuuchi et
al.(14) e Akimoto et al.(15).
Portanto, durante a década de 80, a
USIO foi utilizada para a execução de vá-
rios procedimentos, incluindo cirurgias
abdominais, endócrinas, cardiovasculares
e neurológicas(1). Makuuchi, do Japão,
Lane, da Austrália, e Sigel, dos EUA, fo-
ram os pioneiros da USIO em modo B na
cirurgia geral(1,16,18). Esses autores foram os
responsáveis pela introdução dessa moda-
lidade de ultra-sonografia durante as cirur-
gias hepáticas, biliares, pancreáticas, endó-
crinas e vasculares(1).
A experiência adquirida por esse grupo
de investigadores estimulou a comunidade Figura 2. Transdutor tipo “Akimoto”.
científica européia a introduzir a USIO em
seus procedimentos cirúrgicos. Essa expan-
são foi tal, que em meados da década de tomada de conduta nas cirurgias abdomi- rurgias hepáticas, modificava o procedi-
80 a USIO passou a ser considerada práti- nais (como hepatectomias e aquelas sobre mento cirúrgico inicialmente proposto(33).
ca rotineira durante hepatectomias realiza- as vias biliares); b) era método auxiliar à Alguns autores consideravam que a USIO
das no Japão e na Europa(1). colangiografia intra-operatória; c) guiava a tornava os procedimentos cirúrgicos mais
Posteriormente, seu uso foi sendo ex- execução de vários procedimentos cirúrgi- simplificados e rápidos(33).
pandido cada vez mais em outras localida- cos (como biópsias); d) contribuía para a No decorrer da última década, duas no-
des, como nos EUA, conforme relatado execução segura de procedimentos cirúr- vas alternativas foram introduzidas durante
por Machi et al.(19) e por Makuuchi et al.(1), gicos (minimizando a ocorrência de cálcu- os procedimentos de ultra-som intra-ope-
e no Brasil, segundo os estudos de Cerri(2), los residuais após manipulações sobre as ratório. A USIO com Doppler foi iniciada
Cerri e Cerri(3), Machado et al.(20), Gama- vias biliares; assegurando as relações dos nas cirurgias cardiovasculares, na medida
Rodrigues et al.(21), Machado e Cerri(22,23) tumores com os vasos hepáticos durante em que possibilitava o estudo do fluxo san-
e Machado et al.(24–32). hepatectomias, dentre outros)(1). guíneo(34). Alguns trabalhos (Machi et
Durante os anos 80 ocorreu um aprimo- Ficava então bem estabelecido que a al.(35)) demonstraram a utilidade da adição
ramento nos aparelhos de ultra-sonografia. USIO podia apresentar alto impacto quan- do Doppler colorido nos exames de USIO
Dessa forma, a expansão da utilização da do introduzida no algoritmo de estudo dos em modo B, durante as cirurgias carotí-
USIO prosseguiu. Nessa fase, algumas con- pacientes. Seu uso rotineiro diminuía a deas, vasculares periféricas e após revascu-
clusões dos benefícios dessa metodologia necessidade de uso de raios-X para a rea- larização renal. Esses autores relataram
já estavam bem definidas: a) a USIO forne- lização de colangiografias intra-operató- que o Doppler tornava as cirurgias mais rá-
cia informações que eram úteis durante a rias, diminuía o tempo operatório e, nas ci- pidas e melhorava a detecção de alterações

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História da ultra-sonografia intra-operatória

vasculares após a reconstrução. Adicional- por vídeo-laparoscopia, houve um ressur- de 10 mm poderiam ser usados alternada-
mente, fornecia dados sobre as condições gimento do interesse pela ultra-sonografia mente pela óptica e pelo transdutor lapa-
hemodinâmicas locais, que auxiliavam du- laparoscópica. Nos anos 90, muitos estu- roscópico, permitindo sua alternância de
rante a decisão de reintervir e corrigir as al- dos foram feitos com a ultra-sonografia por posição, facilitando o estudo do fígado.
terações encontradas. vídeo-laparoscopia (USIO-LAPA), em es- Dessa forma, todas as superfícies hepáticas
Em cirurgia geral, especialmente duran- pecial por pesquisadores europeus(39). Nos seriam visualizadas pela laparoscopia e o
te procedimentos hepatobiliopancreáticos, EUA, inicialmente foram usados cateteres parênquima hepático poderia ser estudado
também ocorreram estudos com o Doppler em “miniatura”, com transdutores na extre- de maneira mais precisa pelo ultra-som
(Machi et al.(19)). Esses autores referiram midade, que, passados pelo laparoscópio laparoscópico. Posteriormente, esses mes-
que com essa nova modalidade de ultra- ou mediastinoscópio, avaliavam a cavida- mos autores analisaram a importância da
sonografia era mais fácil o reconhecimen- de abdominal ou o mediastino(40). A reali- evolução tecnológica dos transdutores na
to de pequenos vasos sanguíneos e a dis- zação de ultra-sonografia endoluminal bi- ultra-sonografia laparoscópica. Nesse sen-
tinção dos vasos sanguíneos de outras es- liar, utilizando transdutores semelhantes, tido, ficou demonstrado que a adição dos
truturas hipoecogênicas, como os ductos também foi relatada na busca de cálculos transdutores ultra-sonográficos laparoscó-
biliares. Segundo esses mesmos autores, o biliares durante colecistectomia vídeo-la- picos de extremidade flexível e de alta fre-
Doppler tornava o exame de mais fácil in- paroscópica(41). Entretanto, esses transdu- qüência, em substituição aos transdutores
terpretação pelos cirurgiões. tores, originalmente desenhados para a de extremidade rígida, veio facilitar ainda
Com o desenvolvimento dos transplan- realização de ultra-sonografia endolumi- mais o estudo das estruturas abdominais,
tes hepáticos, alguns autores descreveram nal, não adquiriram grande popularidade permitindo um acoplamento adequado
suas experiências com a USIO com Dop- nos procedimentos laparoscópicos. com os órgãos abdominais, ampliando a
pler. Relataram que o Doppler seria váli- A primeira metade dos anos 90 foi mar- qualidade das imagens obtidas e melhoran-
do para a avaliação do fluxo da artéria cada pelo desenvolvimento de transduto- do a detecção das lesões(23).
hepática e veia porta após as anastomoses, res para serem usados, especificamente, Ainda no Brasil, Machado et al.(26–29)
na tentativa de reconhecer complicações durante procedimentos vídeo-laparoscópi- ressaltam que a USIO poderia identificar
precoces(36). cos. Dessa forma, eles seriam introduzidos metástases hepáticas e tumores hepáticos
Conforme referido anteriormente, a ul- na cavidade abdominal através dos portos intraparenquimatosos e subcapsulares pe-
tra-sonografia intracorpórea durante pro- de 10 mm. Esses transdutores tinham ex- quenos (especialmente os menores que 1
cedimentos laparoscópicos foi inicialmente tremidade rígida ou flexível, podendo ser cm). Especialmente nessas formas de apre-
utilizada por investigadores japoneses há lineares, convexos ou setoriais(42). sentação, os nódulos hepáticos comumen-
mais de 30 anos(5,9). Nesses trabalhos ini- Com o incremento do uso da vídeo-la- te não são identificados pelos exames pré-
ciais eram utilizadas imagens em modo A, paroscopia para o estadiamento das neo- operatórios (como a tomografia computa-
que não alcançaram popularidade devido plasias do aparelho digestivo, a USIO- dorizada convencional ou helicoidal, a
à dificuldade de interpretação. No início LAPA foi introduzida para que se imple- ressonância magnética, ou a ultra-sonogra-
dos anos 80 foram desenvolvidos protóti- mentasse a investigação desses pacientes. fia abdominal(28,29,32,44–47)).
pos de aparelhos para a realização de ul- Muitos estudos foram publicados na área
tra-sonografia durante os procedimentos de cirurgia hepatobiliar, pancreática e gás- REFERÊNCIAS
laparoscópicos. Esses transdutores apre- trica, demonstrando que a USIO-LAPA 1. Makuuchi M, Torzilli G, Machi J. History of intra-
sentavam alta freqüência e as imagens eram forneceria informações adicionais impor- operative ultrasound. Ultrasound Med Biol
1998;24:1229–42.
em modo B, e quando colocados no inte- tantes no manuseio desses pacientes(43).
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rior da cavidade abdominal forneciam ima- No Brasil, Machado e Cerri(22,23) publi- operatória em fígado, vias biliares e pâncreas. [Tese
gens de boa qualidade. Esses equipamen- caram os primeiros estudos sobre USIO- de doutorado]. São Paulo: Universidade de São
tos foram desenvolvidos no Japão(37) e na LAPA no estadiamento do fígado. Nesse Paulo, 1995.
3. Cerri LMO, Cerri GG. Intraoperative ultrasonog-
Europa(38). Entretanto, a despeito das ima- sentido, Machado e Cerri(22) relataram uma raphy of liver, bile ducts and pancreas. Rev Paul
gens de alta qualidade obtidas, o método sistemática de exame do fígado com a Med 1996;114:1196–207.
não ganhou grande aplicabilidade. Isto USIO-LAPA, visando maximizar os bene- 4. Schlegel JU, Diggdon P, Cuellar J. The use of ul-
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provavelmente decorreu devido a dois fa- fícios do método. Seriam utilizados três
86:367–9.
tores. Primeiro, durante esta fase inicial, a portos: um de 5 mm no epigástrio (para 5. Hayashi S, Kikuchi Y, Ishikawa S, et al. Ultrasonic
ultra-sonografia por laparoscopia era uti- elevar os lobos hepáticos, facilitando a vi- diagnosis of breast tumor and cholelithiasis. West
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