Você está na página 1de 5

16/05/2023

Ludwig Wittgenstein
Dimensão apofântica do enunciado: todo enunciado tem uma pretensão de
verdade ou falsidade, e essa dimensão depende de sua relação com a realidade. Essa
ideia de verdade ou falsidade depende de uma forma lógica que deve servir como
fundamento da proposição propriamente dita. Ou seja, o fundamento da proposição não
está na sua forma gramatical, pois esta pode nos induzir ao erro, ela nem sempre tem
uma dimensão capaz de espelhar a verdade ou falsidade de uma sentença. É necessário
entender a forma lógica como aquela que irá espelhar/retratar a realidade.
Vemos que isso se verifica na seguinte proposição ou em proposições parecidas,
pelo fato de que a proposição nos engana sobre a verdade ou falsidade acerca de um
enunciado.

Ex.: Lula é o atual presidente do Brasil.


N.P. Descrição definida

Tudo que eu digo e atribuo a Lula eu o faço ao “atual presidente do Brasil”, e


vice-versa.

Ex.2: Lula é Lula.

Há uma diferença de sentido. É necessário entender a forma lógica como


fundamento da realidade. Por isso é necessário entender Wittgenstein, pois afirmará que
a leitura da linguagem através da forma lógica nos permite a leitura da realidade.
Realidade= estado de coisas/relação da totalidade dos fatos.
Aqui é interessante estabelecermos uma diferença que nos ajuda a entender a
proposição. A totalidade das coisas que existem nos remete à totalidade dos fatos. Um
fato significa uma relação de individuais, uma relação entre as coisas. Ao entendermos a
realidade dos fatos/a totalidade dos fatos como relações individuais, entendemos que as
coisas se constituem não a partir de sua existência enquanto referidas por uma realidade
anterior a si próprias, mas os fatos fundamentam a realidade porque a existência precede
a uma determinação, ou seja, uma coisa só é à medida em que ela existe. Existir é ser
um fato, é ser jogado na realidade e ao mesmo tempo interagir com outras realidades.
Não existe algo que pré-determina o fato, mas o fato, à medida em que ele é, e ele
sempre é em relação ao outro, é o que faz com que a existência aconteça.
Isso fica muito claro na análise lógica de uma proposição, pois esta é sempre a
ligação de um elemento x com um elemento y, e o fato só acontece quando há essa
ligação, que é expressa pela cópula “é”. O “é” não retrata só um indivíduo, mas a
relação que um indivíduo tem para com o outro, e é a lógica que irá expressar essa
relação proposicional presente na linguagem que, por sua vez, é a expressão da
totalidade dos fatos.
Esse é o 1º Wittgenstein. Temos aqui uma doutrina dogmatizante em relação à
linguagem. Há na realidade uma estrutura lógica. Um fato é a relação de um indivíduo
com outro indivíduo (um x com um y). Isso nos mostra que uma realidade x só é x à
medida em que se relaciona com y, e a linguagem nos mostra essa relação entre as
coisas.
É por isso que a preocupação do 1º Wittgenstein, demonstrada em seu Tractatus
Logico-Philosophicus (TLP), tem a preocupação de mostrar que a linguagem se
preocupa em mostrar aquilo que pode ser dito, e o que pode ser dito é a relação entre os
individuais. A proposição determina/demonstra essa realidade dos fatos à medida em
que x só é x enquanto se relaciona com y, ou seja, em que ele é um fato, e está lançado
em sua relação com o outro. A linguagem consegue expressar através da lógica essa
relação entre o estado das coisas que é a relação entre a totalidade dos fatos.
O objetivo do Tractatus é o desenvolvimento de uma linguagem perfeita. Essa
linguagem perfeita é uma noção abordada no TLP, que tem como pretensão responder à
seguinte questão: o que pode ser dito? A linguagem perfeita é uma linguagem que dá
conta dessa resposta, e o que pode ser dito é justamente a relação que uma coisa tem
com outra coisa. A coisa só existe à medida em que é relacionada com outra coisa, e
essa relação nós chamamos de fato. A coisa não existe separada das outras, mas só
existe enquanto acontecimento, e esse acontecimento só se dá pela relação entre as
coisas e não pela coisa separada em si.
Para dar conta dessa linguagem perfeita, Wittgenstein estabelece que a percepção
de mundo é sim a percepção da totalidade dos fatos. A linguagem não descreve as
coisas, mas a relação entre as coisas. Essa é a linguagem perfeita, porque x só é x à
medida em que está relacionado com y. É essa relação que faz x ser verdadeiro ou falso.
Ele não é x estando sozinho.
A estrutura lógica de uma proposição linguística é: X é Y. Você só é enquanto
está no mundo sendo determinada por outras coisas, e a linguagem mostra essa relação.
Por isso não há conhecimento sem a linguagem. A linguagem dá conta do que pode ser
dito, e o que pode ser dito é aquilo que a estrutura lógica presente na linguagem me
permite dizer, ou seja, a totalidade dos fatos. A realidade não é a caneta/o homem/a
bola, mas a realidade é relação de coisas, porque as coisas só serão fatos à medida em
que estão relacionadas a outras coisas. A realidade só será verdadeira ou falsa à medida
em que há essa relação.
A linguagem consegue, por meio de uma estruturação lógica que é inerente a ela,
expressar essa relação de fatos que muitas vezes nessa proposição gramatical não é
possível.
O que é o estado das coisas? Ele pode ser entendido como sendo a constante
modificação que ocorre com todas as coisas existentes em decorrência das relações
entre as coisas. As coisas se relacionam e uma implica a existência da outra.
O que é a teoria do conhecimento em Wittgenstein? O pensamento tem uma
figuração lógica. É possível transformá-lo em uma figuração lógica dos fatos.
O pensamento (consciência) não é uma realidade pensada como separada da
realidade. Ele nos permite uma figuração da realidade porque, para pensar (e aqui temos
uma crítica a Descartes, que falava que a natureza do homem é uma natureza pensante
e, deste modo, temos portas abertas para um dualismo entre consciência e coisa/sujeito e
objeto), eu tenho que pensar alguma coisa. Eu não apenas penso, eu penso alguma coisa,
e isso significa essa relação que a linguagem consegue estabelecer a partir da expressão
da totalidade dos fatos. O que é a realidade dos fatos? É a relação entre individuais, e o
homem só pode ser pensado como um fato, à medida em que ele está em relação a
outras coisas. Ele não apenas pensa, mas pensa no objeto. Por isso o pensamento é a
figuração da realidade. Eu não sou porque eu penso. Eu sou porque eu sou relação com
o outro, sou porque eu penso o outro. Essa figuração da realidade que se faz através do
pensamento se expressa na linguagem, porque é nela que eu vejo essa estrutura de
relação lógica da realidade. O homem não é um ser que pensa, mas um ser que pensa
alguma coisa. Esse pensar alguma coisa se demonstra através da linguagem, porque essa
é que expressa a totalidade dos fatos por meio de uma estrutura lógica que a linguagem
consegue trazer em sua natureza. Daí vem a máxima do Tractatus: sobre o que não pode
ser dito deve-se calar, porque é justamente a linguagem que vai expressar a existência,
que vai expressar um fato.
A função da linguagem, portanto, é descrever a realidade, porque, em rigor, nada
pode ser dito fora da linguagem. Com isso, os limites da linguagem significam os
limites do mundo. Por isso nada pode ser dito fora da linguagem, e aquilo que esta não
pode dizer, nós devemos calar. Por isso a linguagem não está preocupada com a
metafísica, mas somente com o que está no terreno do físico, das relações, com aquilo
que está no mundo.
No 1º Wittgenstein, a linguagem é a estrutura do mundo porque tem uma estrutura
lógica que é a estrutura da realidade. No 2º Wittgenstein, temos uma posição
radicalmente diferente. Enquanto no primeiro eu tenho uma estrutura lógica no “é” que
fundamenta a realidade como verdadeira ou falsa, o significado, no 2º Wittgenstein, não
estará presente nessa estrutura lógica, mas numa série de acontecimentos que
independem desse “é”, independem dessa estruturação lógica, para dizer o significado
da realidade. Esse é o Wittgenstein das Investigações Filosóficas (IF). O que garante a
verdade é o fato de o contexto de uma realidade ser decisivo para defini-la enquanto tal,
e não a relação que essa realidade vai manter com outra. É o contexto que vai
determinar o que a linguagem vai significar, e não o “é”.
O contexto em que surge o pensamento de Wittgenstein é o de uma tentativa de
superação da metafísica pela filosofia através do ressurgimento ou regate da lógica, no
final do séc. XIX e início do XX. Uma figura chave para isso é Gottlob Frege, que
funda, junto com Russell, a filosofia analítica, que sugere a aplicação da lógica
matemática n análise do significado dentro da linguagem e, a partir daí, possibilitar que
se possa chegar à certeza.
No Tractatus, Wittgenstein trabalha a ideia de que as análises visam explicitar a
função figurativa da linguagem, i.e., a linguagem deve ser uma cópia fiel dos fatos no
mundo. O mundo é uma totalidade de fatos. O fato é, na sua etimologia, aquilo que está
aí, aquilo que está “jogado” no mundo. Ora, aquilo que “está aí” só pode ser entendido
enquanto tal à medida em que se relaciona com outra coisa, e assim nós devemos
entender a natureza humana. Não entendê-la como uma realidade apartada da dimensão
objectual, da dimensão da realidade enquanto um outro. Não existe dualismo entre
sujeito e objeto, entre pensamento e coisa, porque para pensar eu tenho que pensar uma
coisa. Pensar é algo que define o homem. O homem só é um existente à medida em que
pensa o outro, e é esse pensar o outro que o determina. Há uma relação entre homem e
mundo, e é essa relação que define o homem. O homem não é definido antes do mundo,
mas é definido no mundo, e a linguagem expressa essa relação histórica do mundo, que
é um fato, a totalidade das coisas, porque na linguagem se observa uma estruturação
lógica: X é Y.
A linguagem é espelho, ela funda o mundo, e o funda porque expressa sua lógica:
X é Y ou X não é Y. O mundo é relação, e é essa relação que produz verdade ou
falsidade. A linguagem vai indicar essa verdade ou falsidade.
Para o 1º Wittgenstein, a natureza da linguagem é “enganadora”, isto é, a forma
gramatical de um enunciado poderá esconder ou torcer sua real estrutura lógica, não
revelando a verdade contida na sentença. A função da filosofia, a partir disso, é analisar
essas formas gramaticais dos enunciados à luz da lógica, resolvendo os problemas.

Você também pode gostar