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Este poema, constituído por um dístico e duas sextilhas, foi datado de 9 de dezembro de

1956, quando Jorge de Sena acabara de completar 37 anos, vivia ainda em Lisboa como
engenheiro e se preparava, a convite do British Council, para se deslocar para Inglaterra,
para um estágio sobre betão armado.

O título do poema ("Quem a tem") é constituído por uma frase incompleta com

uma referência não concretizada. Tendo em conta que o pronome pessoal «a» se refere à
liberdade, essa frase reticente deixa por saber quem é que possui liberdade ou o que faz
quem a tem.

No dístico, o sujeito poético manifesta o desejo de não morrer sem assistir à

chegada da liberdade, isto é, de a ver chegar ao seu país. Tendo o poema sido escrito em
1956, facilmente se conclui que a ausência de liberdade referida é a que se vivia em
Portugal durante o Estado Novo, o regime salazarista. Por outro lado, este dístico
repete-se como os dois versos finais da última estrofe. Esta repetição traduz a convicção
do sujeito lírico na crenca de que um dia verá a liberdade chegar ao seu país. Essa
convicção é tal que ele está determinado a viver o tempo que for necessário para que o
desejo/a situação se concretize. Neste contexto, há também a destacar o recurso à
metáfora, ao atribuir-se à liberdade uma cor. Esta estrofe inicial indicia um profundo
sentimento de esperanca na humanidade e no movimento de mudança próprio da
História. Os versos inscrevem-se em duas realidades distintas: a realidade da censura
que se vivia em Portugal na época de escrita do texto; a presentificação de um futuro
assente na certeza de que a liberdade haverá de chegar, mais tarde ou mais cedo.

No início da segunda estrofe afirma a impossibilidade de, sendo português, não poder
ser outra coisa que não português, ainda que possa viver noutros espacos (Dor exemplo,
de exílio), na ânsia de viver em plena liberdade. A pertença a uma pátria específica
torna plena a consciência de que, apesar de ser um cidadão do mundo, é e será sempre
português. Há aqui, nomeadamente nos versos 3 a 5, a noção de uma pertenca dupla ao
mundo e a Portugal.

No verso 7, o sujeito poético questiona-se acerca da verdade da liberdade, isto é, como


ela será quando chegar a Portugal? Já o verso 9 ("Trocaram tudo em maldade") coloca-
nos perante outro traço do regime salazarista: a denúncia e a difamação.
Os versos 11 e 12, pontuados pela metáfora, denunciam a ocultação de informação e da
realidade que o Estado Novo cultiva (aparentemente Portugal era um paraíso, um
mundo perfeito), bem como a política de manter os portugueses na ignorância e de
desencorajar a intervenção pública e as limitações à liberdade de expressão ("mudo").

O estado de espírito do sujeito poético é caracterizado pela tristeza e ansiedade, mas


temperado pela esperança na chegada da liberdade. O seu tom ao longo do poema é
marcado pela melancolia e pela especulação, associado a um certo desânimo e à
ansiedade do «eu», mas também à tal esperança que tem na mudança deste
estado de coisas.

Jorge de Sena

Poema: "Quem a tem.

O poema começa com a revolta do sujeito poético perante a falta de liberdade, sendo
este poema uma forma de manifestação, por parte do sujeito poético, do desejo de ver a
terra em que nasceu em liberdade, sem o sentimento de exílio, sendo também a
denúncia da opressão vivida.

(V.1-2) Ânsia de liberdade do sujeito poético.

(V.3-8) Refere que não há-de morrer sem saber o sentimento de liberdade, acentuando a
indignação e sentimento de exílio presente na sua vida, referindo que mesmo que ele
pertença a um mundo livre é difícil saber no seu ponto de situação qual a liberdade que
lhe pertence.

(V.9-12) Realça o sentimento causado pela falta de liberdade, referindo a falta de


liberdade de expressão e a polícia política ou polícia do pensamento, que escondiam
tudo o que sabiam do povo, pois a ignorância dos mesmos representava mais poder
político.

(V.13-14) São uma repetição do (V.1-2) conferindo uma estrutura circular ao poema,
acentuando mais uma vez a ânsia de liberdade do sujeito poético, apesar do clima da
opressão referida entre (V.3-8) e o grito da liberdade (V.9-12), sendo que
Sena expressa-se através da sua poesia.

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