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Odontologia

Osteonecrose Induzida por


Bifosfanatos: Patogenia,
Características Clínicas
e Terapêutica
Dra. Leticia Mello Bezinelli1 • Dra. Fernanda de Paula Eduardo2 • Dra. Karin Sá Fernandes3
Prof. Dr. Paulo Sérgio da Silva Santos4 • Prof. Luiz Alberto Soares Valente Junior5 • Dra. Rosana
Claudia Scramin Wakim6 • Dra. Maria Elvira Pizzigatti Correa7 • Profa. Dra. Luciana Correa8

A
osteonecrose induzida por bifosfanato real frequência entre os pacientes usuários de
(OIB) foi inicialmente abordada na lite- bifosfanatos, os fatores de risco, sua patogenia e
ratura em 2003 por Migliorati,(1) Marx,(2) os motivos de predileção pelos ossos maxilares,
Wang et al.(3) e Carter et al.,(4) os quais repor- bem como as medidas terapêuticas de maior
taram casos de pacientes com extensa lesão eficiência. O objetivo deste trabalho é descrever
osteolítica semelhante a osteomielite nos ossos as características principais dessa lesão, princi-
maxilares, cuja origem foi atribuída à terapia com palmente no tocante às suas características clí-
altas doses de bifosfanatos.(5) Esses autores nicas, sua patogenia e os tratamentos em vigor.
descreveram que uma característica marcante
dessas lesões era terem predileção pela maxila e TIPOS DE BIFOSFANATOS E
mandíbula, bem como estarem frequentemente MECANISMOS DE AÇÃO
associadas a extração dentária prévia. Os repre-
sentantes de empresas farmacêuticas criticaram Os bifosfanatos são análogos dos pirofosfa-
o fato de atribuir aos bifosfanatos a origem tos orgânicos naturais, cuja propriedade principal
dessas lesões,(6) porém a partir desses primei- é inibir a precipitação do fosfato de cálcio, tendo
ros relatos surgiram outros que mantiveram os
bifosfanatos nitrogenados como determinantes 1 - Membro do Corpo Clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, Responsável pelo Departamento de
Marketing da Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico da Odontologia e Membro
do aparecimento da OIB. Esta é definida então do Comitê Científico de Odontologia da ABRALE. CROSP 84.561.
como exposição e necrose do tecido ósseo dos 2 - Doutora em Diagnóstico Bucal pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Atua
no Hospital Israelita Albert Einstein – Unidade de Transplante de Medula Óssea. CROSP 67.191.
ossos maxilares resistente a terapia convencional
3 - Cirurgiã-Dentista do Centro de Atendimento a Pacientes Especiais, Faculdade de Odontologia da
por mais de oito semanas em pacientes sob Universidade de São Paulo. CRO 94.266.
terapia com bifosfanatos e sem episódios de 4 - Cirurgião-Dentista, Professor Doutor do Departamento de Estomatologia da Faculdade de
Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo e Membro do Comitê Científico de Odontologia da
radiação ionizante.(2,7) ABRALE. CROSP 51.737.
Alta morbidade e resistência a medidas tera- 5 - Cirurgião-Dentista do Departamento de Onco-Hematologia do Instituto da Criança FMUSP.
pêuticas convencionais, tais como antibioticote- Coordenador do Comitê Científico de Odontologia da ABRALE, Professor Colaborador do Curso
de Especialização da Escola de Aperfeiçoamento Profissional da Associação Paulista de Cirurgiões
rapia, debridamento e cirurgias ósseas(7) fazem Dentistas e atua na Divisão de Odontologia – Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
com que a OIB seja um dos efeitos colaterais Universidade de São Paulo. CROSP 49.475.
6 - Especialista em Ortodontia e Ortopedia Facial; Membro da Equipe de Odontologia Hospitalar do
mais importantes dos bifosfanatos. É crescente Hospital Santa Isabel, atua no Serviço de Hematologia e Hemoterapia da Santa Casa de Misericórdia
o número de trabalhos na literatura descrevendo de São Paulo. Membro do Comitê Científico de Odontologia da ABRALE. CROSP 65.357.
esses casos. Contudo, vários aspectos da OIB 7 - Responsável pelo Ambulatório de Odontologia do Centro de Hematologia e Hemoterapia Universidade
Estadual de Campinas e Membro do Comitê Científico de Odontologia da ABRALE. CROSP 35.606.
ainda continuam controversos, tais como sua 8 - Professora Doutora da Disciplina de Patologia Geral da FOUSP. CROSP 52.772.

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Quadro 1. Principais mecanismos de ação dos bifosfanatos alta adsorção às moléculas de hidroxiapa-
e suas aplicações clínicas atuais tita. Têm baixa absorção intestinal (1-4%)
Tipos de bifosfanato Mecanismo de ação Efeitos biológicos Aplicações clínicas e alta seletividade pelo tecido ósseo.(8)
Não-nitrogenados - Adsorção à - Concentração em Com base na propriedade Possuem meia-vida plasmática curta (entre
(metabolizados em hidroxiapatita regiões no tecido ósseo de adsorção à 20 min a 2-3h) e meia-vida longa no teci-
análogos do ATP): - Incorporação com índice menor de hidroxiapatita: do ósseo (muitos meses a anos).(9) Além
Etidronato Clodronato intracelular em mineralização (ex.: lacuna Escaneamento do osso em de inibir a calcificação, os bifosfanatos
Tiludronato análogos do ATP, de Howship) exames de imagem para o
inibem também a reabsorção óssea. As
resultando em - Internalização em diagnóstico de metástases
nucleotídeos não- osteoclastos por e patologias ósseas
drogas disponíveis no mercado constituem
hidrolizados pinocitose ou fagocitose Com base na propriedade produtos melhorados dos pirofosfastos,
de complexos de cálcio de inibição da reabsorção no sentido de potencializar seu efeito
- Modificação e/ou ruptura óssea: inibidor da reabsorção óssea sem grande
do citoesqueleto dos Osteoporose: etidronato interferência na calcificação.(10) Com isso,
osteoclastos
está sendo possível aplicar, com grande
- Indução de apoptose
(principalmente eficiência, esses metabólitos no controle
clodronato, pamidronato e da osteoporose, das hipercalcemias e das
risedronato) metástases ósseas. Essa potencialização
Nitrogenados (não- - Interferência na - Inibição da prenilação Com base na propriedade é obtida a partir da introdução de átomos
metabolizados e via biossintética de proteínas ligantes de inibição da reabsorção de nitrogênio em posições específicas da
incorporados no do mevalonato, de GTP, tais como Ras, óssea: cadeia lateral dos bifosfanatos. Assim,
citosol): responsável Rab, Rho e Rac, o que Doença de Paget:
duas características químicas distinguem
Alendronato pela síntese de interfere no citoesqueleto pamidronato, zoledronato
Pamidronato colesterol, de Metástases ósseas:
os tipos de bifosfanato: 1) sua capacidade
do osteoclastos, na
Risedronato outros esteroides e sua capacidade de zoledronato, alendronato de interagir, por quelação, com os íons
Zoledronato lipídeos, bem como proliferação, no tráfico de Mieloma múltiplo: cálcio da hidroxiapatita, que depende da
Ibandronato do GTP vesículas em seu citosol zoledronato, alendronato presença de um radical hidroxila na molé-
e na permeabilidade de Osteoporose: alendronato, cula; 2) sua capacidade de antirreabsor-
membrana plasmática risedronato, ibandronato
ção, que é potencializada pela presença de
Osteogênese imperfeita:
pamidronato um radical do grupo amina na molécula.(10)
Informações obtidas a partir de Rogers et al. (1997) e Russell (2007).
Os mecanismos de ação de bifosfanatos
contendo um radical amina são diferentes
Quadro 2. Potência relativa de ação, via de administração, indicações e doses dos bifosfanatos daqueles somente com radical hidroxila.
mais frequentemente observados nos casos de osteonecrose por bifosfanato (OIB) Boa parte desses mecanismos de ação
Bifosfanato Potência de ação* Via de administração Indicação e Dose** ainda não está elucidada. O quadro 1
Baixo risco para OIB mostra os tipos de bifosfanato atualmente
Alendronato 1000 Oral Tratamento de osteoporose: mais indicados em termos clínicos e seus
70 mg/semana supostos mecanismos de ação.
Profilaxia de osteoporose: 35 mg/semana
Os tipos de bifosfanato e suas dosa-
Doença de Paget: 40 mg/dia por 6 meses
gens/vias de administração mais frequen-
Risedronato 1000 Oral Profilaxia e tratamento de osteoporose: 35
temente detectados nos casos de OIB
mg/semana
Doença de Paget: 30 mg/dia por 2 meses estão listados no quadro 2. Os compostos
Alto risco para OIB nitrogenados mais potentes são os mais di-
retamente ligados ao aparecimento de OIB.
Zoledronato 10.000 Intravenoso Neoplasias malignas e hipercalcemia:
4 mg x 1 dose
Mieloma múltiplo e metastases ósseas: INCIDÊNCIA
4 mg cada 3-4 semanas
Doença de Paget: 5 mg x 1 dose Nos primeiros anos de relatos da OIB,
Tratamento de osteoporose: 5 mg/ano
não foi possível precisar a sua incidência
Adaptado de AAOMS (2007).
em função do baixo número de casos e
* O bifosfanato de menor potência é o etidronato, com valor igual a 1 e o de maior potência é o zoledronato, com valor igual a 10000.
**Segundo tendências observadas nos EUA. da ausência de informações como um

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todo dos usuários de bifosfanatos. Há afetada do que a maxila, uma vez que a
diferenças marcantes, contudo, ao se
Alguns marcadores primeira possui anatomicamente menos
comparar as vias de administração endo- séricos têm sido vascularização que a segunda. Os ossos
venosa e oral. gnáticos, assim, em especial a mandíbu-
Considerando a via endovenosa, são sugeridos para predizer la, seriam locais de eleição para a OIB
citadas frequências entre 1 e 12% de OIB por que são os únicos ossos suscetíveis
em usuários de bifosfanatos de uma ma-
o risco de OIB em a microtraumatismos constantes em
neira geral.(11) Essa variação depende da pacientes submetidos função da presença dos dentes, o que
posologia, da população estudada e da estimula o turnover constante ósseo. Os
doença primária. Durie et al.(12) sugeriram a cirurgias nos ossos dentes por sua vez constituem porta de
uma frequência com base em um levan- entrada de micro-organismos patogêni-
tamento feito pela Web por intermédio da
maxilares durante a cos via endodôntica ou periodontal, o que
International Myeloma Foundation, de pa- terapia com bifosfonatos facilita a instalação de focos infecciosos
cientes com mieloma múltiplo e tumor de e inflamatórios cujo reparo é prejudicado
mama. Os autores detectaram que, num pelos bifosfanatos.(7,17,18,20)
período superior a 36 meses de terapia, citados no quadro 1, bem como de sua Trabalhos ainda apontam o papel das
haveria chance de 10% e 4% dos pacien- potencial indução de apoptose dessas infecções bacterianas, sendo estas mais
tes, usuários, respectivamente, de ácido células, da inibição de seus precursores importantes na OIB do que na osteorradio-
zoledrônico e pamidronato, apresentarem na medula hematopoiética e de sua ação necrose.(20,21) São detectadas colonizações
OIB. Nesse estudo, foram estimados que antiangiogênica.(17) Particularmente a ini- por Actinomyces, Staphylococcus aureus,
cerca de 13% dos pacientes com mieloma bição das células endoteliais é bastante Streptococcus sp(13) e por bactérias da flora
múltiplo e que 12% dos pacientes com enfatizada, fato que levou essa lesão a normal da cavidade oral.(7) Nesse sentido,
neoplasias de mama usuários de bifos- ter a sinonímia de “necrose avascular por a terapia com antibióticos é fundamental
fanato teriam OIB. Outro estudo mostrou bifosfanatos”. São descritos mecanismos para o controle da doença.
frequência de 17% de OIB em pacientes que envolvem distúrbios na microcircula- Marx et al.(2) e Merigo et al.(9) consi-
com mieloma múltiplo tratados com zole- ção, com o surgimento de microtrombos deram ainda outras propriedades dos
dronato via endovenosa.(13) que impedem a vascularização no local,(18) bifosfanatos que podem estar envolvidas
Para as terapias por via oral, trabalhos bem como inibição de fatores angiogêni- na patogenia da OIB, tais como inibição de
de revisão sistemática mostraram uma cos, tais como do fator de crescimento adesão das células tumorais sobre a matriz
prevalência baixa de OIB (1/10.000 a angiogênico vascular. (7) Allegra et al. (19) óssea e inibição de metaloproteinases, o
1/100.000 pacientes/ano).(14) Nos casos demonstraram menor quantidade de que interferiria diretamente nos processos
de terapia para controle da osteoporose, precursores de células endoteliais na de angiogênese e reabsorção óssea.
essa frequência também é baixa. Um es- circulação sanguínea de pacientes com Cofatores não estão descartados
tudo demonstrou que, entre os 368 casos osteonecrose induzida por bifosfanatos na patogenia da OIB, tais como fumo,
de OIB registrados, cerca de 4% eram administrados via endovenosa, bem diabetes, uso de esteroides e outros me-
em mulheres usuárias de bifosfanato para como maior índice de apoptose de célu- dicamentos, anemia, hipóxia e disfunções
tratamento ou prevenção da osteoporose las endoteliais circulantes em pacientes renais.(22)
(cerca de 92% ocorreram em pacientes com mieloma múltiplo tratados com Alguns marcadores séricos têm sido
com mieloma múltiplo).(15) Essas estimati- bifosfanato, com ou sem presença de sugeridos para predizer o risco de OIB
vas envolvem na sua grande maioria casos OIB. Esses índices apoptóticos provavel- em pacientes submetidos a cirurgias nos
tratados com alendronato via oral, e não mente interferem não só na capacidade ossos maxilares durante a terapia com bi-
com etidronato e ibandronato.(16) angiogênica em mecanismos do reparo fosfonatos. O telopeptídeo C do colágeno
ósseo, bem como na hemostasia, favo- tipo I (CTX) é considerado um marcador
PATOGENIA E MARCADORES recendo elementos procoagulantes que importante da atividade osteoclástica
BIOQUÍMICOS acarretam a agregação de neutrófilos e e pode ser indicado para monitorar os
plaquetas, o que induz episódios de is- níveis de reabsorção óssea nessas con-
A origem da OIB é descrita consi- quemia e trombose. As modificações da dições.(23,24) Lee et al.(23) verificaram não
derando as propriedades inibidoras da vascularização inerentes a OIB explicam haver alterações significativas nos níveis
função osteoclástica dos bifosfanatos em parte por que a mandíbula é mais de CTX, fosfatase alcalina específica do

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osso, osteocalcina, paratormônio intacto, CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS
T3, T4, TSH e vitamina D25 em 7 pa-
Filleul et al.,(27) em
cientes com OIB. Lazarovici et al.,(24) em revisão sistemática ampla, O quadro 3 resume as características
casuística maior com 78 pacientes sub- clínicas e radiográficas das lesões de OIB,
metidos a terapia oral e endovenosa com observaram que 66% dos bem como a história dental associada a
bifosfanatos, com ou sem OIB, verificaram elas. Ruggiero et al.(7) estabeleceram uma
haver associação entre baixos níveis de
casos citados na literatura classificação clínica das lesões com base
CTX (menos que 150 pg/mL) e OIB, bem enquadram-se no estágio nos níveis de destruição do tecido ósseo
como níveis significativamente menores e da sintomatologia, apresentada no qua-
de fosfatase alcalina óssea em pacientes II, 16%, no I e 18%, dro 4. Filleul et al.,(27) em revisão sistemática
com bifosfanatos administrados por via ampla, observaram que 66% dos casos
oral portadores de OIB.
no estágio III citados na literatura enquadram-se no
estágio II, 16%, no I e 18%, no estágio III.
Quadro 3. Características clínicas, radiográficas e história Hutchinson et al.(28) descreveram as
dental associada aos casos de osteonecrose induzida por bifosfonato características radiográficas dos pacientes
Características clínicas Características radiográficas História dental associada ao em estágio 0, ou seja, sem evidências
aparecimento da lesão clínicas de lesão de OIB, porém com alto
• Exposição do tecido ósseo, com • Aspecto normal nos estágios • Extrações dentárias prévias risco para desenvolvê-la. Proeminência do
ou sem sequestro ósseo iniciais da osteonecrose • Focos infecciosos de origem canal do nervo alveolar inferior, ruptura da
• Focos de supuração intraoral • Rarefação óssea irregular, endodôntica ou periodontal
cortical óssea, pouco osso formado e ca-
• Áreas de ulceração isoladas ou mesclada com pontos • Próteses mal adaptadas
múltiplas radiopacos, sugestiva de • Colocação de implantes ou vidade alveolar persistente após a extração
• Sintomatologia dolorosa necrose óssea próteses sobre implantes mal foram achados frequentes.
• Parestesia* • Imagem de sequestro ósseo adaptadas O risco de OIB quando da colocação
• Manifestações extraorais de • Ruptura da cortical alveolar • Movimentações dentárias de implantes dentários ainda é controverso
fístula ou edemaciamento, ortodônticas
na literatura. Bedogni et al.(29) descreve-
principalmente na região
submandibular ram o décimo caso de OIB associado a
* Pode indicar envolvimento do nervo alveolar inferior.
implante dentário citado na literatura em
um paciente usuário de alendronato para
Quadro 4. Principais medidas terapêuticas para a
tratamento de osteoporose. Enfatizaram
ostenecrose induzida por bifosfanatos em função do seu estágio clínico
que esse risco não está descartado,
Estágio clínico Medidas terapêuticas
sendo fundamental o esclarecimento ao
0 – Sem evidência clínica de lesão, • Monitorização dos cuidados orais, sem tratamentos
pacientes desse risco, bem como orienta-
porém com risco de desenvolvê-la. específicos
ções rigorosas de higiene oral. Não foram
1 – Exposição de tecido ósseo necrótico, • Monitorização e reforço dos cuidados orais
porém sem sintomatologia. • Bochechos com antimicrobianos (por ex., clorexidina 0,12%) estabelecidos também os níveis de risco
• Contraindicação de cirurgias orais para OIB quando das movimentações
• Acompanhamento clínico periódico (a cada 4 meses) dentárias ortodônticas. Há relatos de que
2 – Exposição do tecido ósseo • Bochechos com antimicrobianos (por ex., clorexidina 0,12%) os bifosfanatos impedem essas movimen-
sintomática, com ou sem infecção • Prescrição de antibióticos de amplo espectro (penicilina, tações devido a sua ação inibidora sobre
secundária e supuração. amoxicilina, clindamicina, cefalexina)* os mecanismos de reabsorção e aposição
• Controle da dor (com analgésicos ou outras vias)
óssea.(30) Em função disso, naturalmente
• Debridamento superficial, retirando somente tecido ósseo
agressivo ao tecido mole esses pacientes têm um tratamento mais
prolongado, por vezes com alocação de
3 – Exposição de tecido ósseo • Bochechos com antimicrobianos (por ex., clorexidina 0,12%)
sintomática, ampla, com infecção • Antibioticoterapia com antibióticos de amplo espectro* forças maiores para promover o desloca-
secundária, acompanhada de • Controle da dor mento dentário. Esse fato, aliado a maior
algum dos seguintes itens: fratura • Debridamento cirúrgico ou ressecção parcial concentração de bifosfanato em regiões
patológica, fístula extraoral e lise de alto turnover ósseo, como é o caso
óssea estendendo-se até a borda
do osso perirradicular submetido a tração
inferior da mandíbula.
Adaptado de AAOMS (2007).
e pressão, pode significar maior risco de
* O tempo de antibioticoterapia está em função da evolução clínica da lesão, sendo necessária por vezes a administração prolongada de antibióticos. desenvolver OIB.(30)

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TERAPIA PREVENTIVA E CURATIVA mentos instituídos para OIB. Em boa parte da interrupção prolongada da droga para a
dos casos, o paciente demonstra remissão resolução da lesão, quando as condições
Terapia preventiva satisfatória de sintomatologia dolorosa e de sistêmicas do paciente assim permitirem.
A terapia preventiva para as OIB é parestesia, porém são raros os casos em
atualmente bastante enfatizada na literatu- que há cura ou mesmo redução do tama- CONCLUSÕES
ra. A Associação Americana de Cirurgiões nho da lesão. Em geral, são recomendados
orais e maxilofaciais propôs algumas dire- antibioticoterapia principalmente com A alta morbidade da OIB e os níveis al-
trizes de tratamento em pacientes usuários amoxicilina e outros derivados da penicilina tos de insucesso terapêutico caracterizam
de bifosfanatos:(31) por período prolongado, debridamento essas lesões como sendo de alto impacto
• Previamente à instituição da terapia das lesões, bochechos com clorexidina e clínico para o paciente, interferindo de for-
por bifosfanatos, o paciente deve ter cirurgias para retirada do tecido necrótico, ma substancial na sua qualidade de vida,
orientação cuidadosa de cuidados tanto conservadoras quanto amplas.(5,18) bem como na cura de sua doença primá-
com a saúde oral, revisão do aparato Em especial, alguns relatos não recomen- ria. Apesar de os estudos atuais indicarem
protético se houver, bem como eli- dam cirurgias amplas como um possível uma incidência baixa em usuários de bifos-
minação de focos infecciosos, com tratamento, em função dos altos índices fanato por via oral, e média nos usuários
extrações dentárias se necessário. de insucessos.(5,7) A reconstrução com por via endovenosa, o risco da OIB não
No caso destas, o uso de bifosfanatos retalhos também é descrita como sendo pode ser negligenciado pelos oncologistas
deve ser adiado até que haja reparo ineficaz. (7) Foi considerada também a e cirurgiões-dentistas, que juntos devem
completo da mucosa e, preferencial- terapia com oxigênio hiperbárico, a qual prescrever medidas preventivas e esclare-
mente, reparo adiantado do tecido demonstrou insucesso nas OIB, sendo cer ao paciente as características do curso
ósseo. contraindicada.(5,7) clínico dessas lesões. t
• Para os pacientes já usuários de bifos- A interrupção da terapia com bifosfa-
fanatos, deve-se evitar a colocação de natos é controversa. Lenz et al.(18) enfatiza- REFERÊNCIAS
implantes em regimes de 4-12 aplica- ram a importância de não se interromper
1. Migliorati CA. Bisphosphonates and oral ca-
ções de pamidronato ou zoledronato essa terapia diante de OIB, uma vez que vity avascular necrosis of bone. J Clin Oncol
por ano. os mecanismos dessa lesão, bem como 2003;21:4253-4.
2. Marx RE. Pamidronate (aredia) and zoledronate
• Para os usuários de bifosfanatos os fatores determinantes de seu apare- (zometa) induced avascular necrosis of the
orais menos de 3 vezes ao ano sem cimento, ainda não eram conhecidos. jaws: a growing epidemic. J Maxillofac Surg
2003;61:1115-8.
associação a outros fatores de risco, Merigo et al.,(9) por outro lado, realizaram 3. Wang J, Goodger NM, Pogrel MA. Osteonecrosis
a interrupção do tratamento com bifosfa- of the jaws associated with cancer chemotherapy.
como terapia com corticosteroides, J Oral Maxillofac Surg 2003;61(9):1104-7.
nenhuma alteração na rotina odonto- nato, porém alertaram que não existem 4. Carter GD, Goss AN. Bisphosphonates and
evidências de que essa medida auxilie no avascular necrosis of the jaws. Aust Dent J
lógica deve ser adotada. Quando da 2003;48(4):268.
necessidade de intervenções cirúrgi- tratamento. Migliorati et al.(32) comentaram 5. Melo MD, Obeid G. Osteonecrosis of the jaws in
patients with a history of receiving bisphosphona-
cas, ao haver a associação de fatores que a interrupção dos bifosfanatos deve te therapy: strategies for prevention and early re-
de risco (terapia com corticosteroides ser decisão do oncologista, em função cognition. J Am Dent Assoc 2005;136(12):1675-
81.
e outros esteroides), deve-se interrom- do impacto dessa interrupção no controle 6. Tarassoff P, Csermak K. Avascular necrosis of the
per a terapia com bifosfanato 3 meses das neoplasias; porém não estão descar- jaws: risk factors in metastatic cancer patients. J
Oral Maxillofac Surg 2003 Oct;61(10):1238-9.
antes e 3 meses depois da intervenção tadas algumas vantagens da diminuição 7. Ruggiero SL, Fantasia J, Carlson E. Bisphos-
dos teores da droga no tecido ósseo, tais phonate-related osteonecrosis of the jaw: back-
odontológica. ground and guidelines for diagnosis, staging and
A interrupção dos bifosfanatos deve como menor inibição da angiogênese, o management. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral
que poderia ajudar na cicatrização das Radiol Endod 2006 Oct;102(4),433-41.
estar de acordo com as orientações do 8. Russell RG. Bisphosphonates: mode of action
oncologista, que avaliará as condições lesões. Para os pacientes usuários de and pharmacology. Pediatrics 2007 Mar;119
Suppl 2:S150-62.
sistêmicas do paciente para tal. bifosfanato por via oral, a Associação Ame- 9. Merigo E, Manfredi M, Meleti M, Corradi D,
ricana de Cirurgiões Orais e Maxilofaciais(31) Vescovi P. Jaw bone necrosis without previous
dental extractions associated with the use of
Terapia curativa recomenda a interrupção da terapia por bisphosphonates(pamidronate and zoledrona-
O quadro 4 resume as medidas tera- 3 e 6-12 meses, respectivamente, para te): a four-case report. J Oral Pathol Med 2005
Nov;34(10):613-7.
pêuticas em função do estágio clínico da situações de risco de OIB e quando há 10. Rogers MJ, Watts DJ, Russell RG: Overview of
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11. Mavrokokki T, Cheng A, Stein B, Goss A. Nature
ênfase é dada aos insucessos dos trata- essa Associação afirma haver vantagens and frequency of bisphosphonate-associated

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Odontologia

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R. Pamplona, 518 - 5º andar - Jardim Paulista
nates induce apoptosis of circulating endothelial Apr;67(4):850-5.
cells in multiple myeloma patients and in subjects 27. Filleul O, Crompot E, Saussez S. Bisphosphonate- CEP 01405-000 - São Paulo - SP.

ABRASTA - Associação Brasileira de Talassemia


É uma entidade sem fins lucrativos, que tem como missão melhorar as condições de tratamento
e a qualidade de vida dos portadores de talassemia no Brasil.

O bjetivos

Divulgar a talassemia em nosso país, esclarecendo aos profissionais da saúde a


importância do diagnóstico precoce;
Realizar a prevenção da talassemia junto aos casais no planejamento familiar;
Dar suporte para o tratamento adequado e apoio para que os exames de
acompanhamento sejam feitos regularmente;
diagnóstico, fornecer aos familiares esclarecimento e informações, apoio jurídico
Após o diagnóstic
e psicológico;
Incentivar a doação de sangue no Brasil;
Contribuir para a atualização dos profissionais de saúde, com a finalidade de
disponibilizar no país o melhor tratamento possível.

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56 Mais
Prática Hospitalar • Ano XII informações no www.abrasta.org.br.
• Nº 72 • Nov-Dez/2010

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