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Design:
Miguel Duarte
Desenho na capa:
Rui Vasconcelos
Pormenor de Desenho, 1467 x 2049 mm,
tinta - da - china, grafite e acrílico branco s/papel, 2000
Desenho e ‘Modelo’
Actas do colóquio
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Nota de apresentação
Carlos Cruz Corais
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Sobre o gesto que reúne e aquilo que o encoraja
(desenho e modelo revisitados) *
Manuel Castro Caldas
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Do exercício de desenho e da disposição para ele.
João Queiroz
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Caricatura. modelo, desenho e imagem.
Vitor da Silva
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Modelo e Representação
Rui Vasconcelos
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Entrevista feita a Gaetan
por correspondência, em Setembro de 2004
Carlos Corais
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O exame ao mundo voluptuoso
O desenho do natural como prática corpo/mente.
O modelo como objecto de direccionamento/fixação da consciência.
Suzana Vaz
Nota de apresentação
Carlos Corais
Nota de apresentação
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desenho e ‘modelo’
Os nossos agradecimentos a:
Manuel Castro Caldas, Director Executivo do AR.CO, João Queirós, Rui
Vasconcelos, Victor da Silva, da Faculdade de Arquitectura da Universidade
do Porto e Pedro Sousa Vieira, do Instituto de Estudos da Criança da
Universidade do Minho, Gaetan pela entrevista concedida e Susana Vaz do
Departamento de Arquitectura da Universidade do Minho pelo texto que
elaborou, entusiasmo e apoio prestado.
Ao Miguel Duarte do Departamento de Arquitectura da Universidade
do Minho pela coordenação gráfica e toda a colaboração prestada a esta
iniciativa.
Finalmente, a Carolina Leite, Directora do Museu Nogueira da Silva, pela
disponibilidade e cedência das instalações do Museu para a realização do
Colóquio, pelo interesse manifestado na publicação destas actas.
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Sobre o gesto que reúne e aquilo que o encoraja
(desenho e modelo revisitados)*
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Sobre o gesto que reúne e aquilo que o encoraja
Yves Bonnefoy
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desenho e ‘modelo’
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Sobre o gesto que reúne e aquilo que o encoraja
Nesta lógica, diríamos que admitir uma ligação “natural” entre desenho
e modelo só parece plausível se aplicarmos ao modelo a regra que, no
fundo, aplicamos ao desenho. Tal como não haverá desenho para além do
desenhar, não haverá modelo para além do modelar. Este termo - modelar
- estamos habituados a encontrá-lo associado à escultura, onde significa
dar forma, pressionando com as mãos ou com instrumentos, a uma matéria
moldável, plástica. Mas na realidade estamos a falar daquilo que todas as
artes fazem: dar forma a uma matéria plástica. E não há grande distinção,
nas artes, entre o que chamamos modernas e antigas (ou clássicas, ou
pré-modernas, ou o que lhes queiramos chamar) para além desta: se nas
segundas pomos a tónica no dar forma, nas primeiras colocamo-la na
modelação ela mesma, bem como na plasticidade das matérias. A arte é
ofício enquanto existe algo a que dar forma (o mundo criado e ordenado
por Deus, que cumpre simplesmente descrever) e torna-se arte, no sentido
moderno, quando a actividade descritiva passa a ser impossível sem que, ao
mesmo tempo ou em primeiro plano, se apresente uma forma experimental
(de entre o número ilimitado de possibilidades) de configuração das
matérias. Que o mundo (ocidental e cristão) tenha deixado de ser sagrado,
não quer dizer outra coisa: ele transformou-se num infindável repositório de
matérias plásticas. Nada do que já foi modelado por Deus escapa a ter de
ser modelado outra vez e incessantemente pelo Homem, na sua moderna
negociação da Verdade. Poderá uma aproximação ao desenho, tal como
uma aproximação ao modelo, deixar de considerar este enquadramento
prévio?
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Sobre o gesto que reúne e aquilo que o encoraja
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Sobre o gesto que reúne e aquilo que o encoraja
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Do exercício de desenho e da disposição para ele.
João Queiroz
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Do exercício do desenho e da disposição para ele.
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Do exercício do desenho e da disposição para ele.
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desenho e ‘modelo’
toda a gente aquela letra comum, ou aquele estilo comum, que possuíamos
no início da aprendizagem, quando o escrever e o desenhar ainda estavam
indistintos nos gestos.
Esta incorporação tão profunda da escrita em cada um de nós estabe-
lece que, no acto de desenhar, tenhamos já a priori orientações privilegia-
das no espaço e intervalos privilegiados no tempo. Mesmo a forma como
olhamos, como colocamos o olhar sobre a superfície do desenho, se não
intencionalmente determinada de outra forma, depende do hábito que ad-
quirimos ao escrever. No fundo, na escrita comum, vulgar e cursiva, existe
uma espécie de encontro de duas irrealidades, a irrealidade do traço e a
irrealidade da superfície onde ele se inscreve. Do traço que verdadeiramen-
te não sentimos ou controlamos, e da superfície que verdadeiramente não
vemos. O desenho, pelo contrário apela ao encontro de duas realidades. E
mesmo que o desenho aparente ser automático, é um automatismo por ele
e nele adquirido, uma opção, e não a manifestação aparente de um hábito
constrangedor. Mesmo nestes casos, deles há exemplos brilhantes, é o en-
contro dessas duas realidades que está presente.
Há muitas formas de manusear os instrumentos de desenho, no entanto
o que observamos é que a maioria das pessoas agarra o lápis ou qualquer
outro instrumento como se fosse escrever. É uma forma possível, mas é
apenas uma entre muitas possibilidades, e na maioria das vezes não é a
melhor. Não há decerto “a melhor”, mas convém experimentar e verificar
como o simples facto de modificar o modo habitual de manusear um ins-
trumento tem a capacidade de modificar a ordem dos gestos privilegiados
do nosso corpo e modificar os intervalos de tempo, ou mesmo o tipo de
atenção. Há aqui um grande campo de exercício que se relaciona com este
tema da disposição.
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desenho e ‘modelo’
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Do exercício do desenho e da disposição para ele.
João Queiroz
Lisboa, Julho, 2004
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Caricatura. modelo, desenho e imagem.
Vitor da Silva
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Caricatura, Modelo, Desenho e Imagem
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desenho e ‘modelo’
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Caricatura, Modelo, Desenho e Imagem
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Caricatura, Modelo, Desenho e Imagem
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Caricatura, Modelo, Desenho e Imagem
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Modelo e Representação
Rui Vasconcelos
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Modelo e Representação
(…) Queria dar relevo ao facto de, ao longo deste tempo ter vindo a
usar o mesmo local como modelo, a que recorro com frequência e onde
efectuo os registos fotográficos, os elementos que irão servir de base para
os trabalhos; acentuar que o modelo é um só, e que, até à data, salvo raras
excepções, é sempre o mesmo sítio que é representado.
(…) Relativamente às fotografias, cheguei mesmo a efectuar registos
nocturnos, que me permitissem experienciar o local de forma diversa. Voltei,
portanto, com alguma frequência ao mesmo sítio, e fui-me apercebendo,
a cada visita, espaçada no tempo, que este ia sofrendo alterações, e, na
mesma medida, a percepção foi-se alterando, o contexto transformou-se
e o que quer que restasse do local deu origem a outras manifestações;
uma vegetação própria que mudou apesar de se manter intacta a sua
matriz. Os registos fotográficos foram sendo feitos e captados uma série de
momentos.
No meu trabalho tem que haver sempre uma fuga ao registo fotográfico
original, daí a necessidade de se manifestarem acontecimentos sobre
o suporte, o desencadear de uma pulsão, um movimento nervoso, a
possibilidade de gerar um elemento estranho à paisagem, alheio, na sua
natureza, ao modelo que serve de base. Porque a mera representação
naturalística é em si a forma, e uma forma que é dada à partida, facilmente
reconhecível e familiar, aceite como modelo de representação, catalogado,
datado, etc. Em consequência, o processo é um contínuo lutar contra
esta forma, esta ordem, a capacidade de nomear. E este movimento de
resistência é o veículo que permite o transporte, o desligar do modelo inicial
ou fotográfico e o imiscuir-se na sua proximidade: uma necessidade que
não se revê ou reflecte no registo do modelo original, mas precisa dele
para se manifestar, para ter lugar, tornar-se presente. É isto o que está
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Entrevista feita a Gaetan
por correspondência, em Setembro de 2004
Carlos Corais
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Entrevista feita a Gaetan
C. C.: “…há momentos em que estou a olhar para o espelho e devo estar
completamente alheio a tudo o que estou a ver. Porque o que aparece no
papel não tem nada a ver com o que eu estou a ver, certamente” *.
O retrato é associado à semelhança, mas pratica a inexactidão da cópia pela
utilização da mão esquerda, embora seja dextro. Podemos falar da procura
de expressividade ou de uma “distância moderna”, uma atitude casual e
espontânea relativamente ao “modelo”?
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desenho e ‘modelo’
Gaetan: No desenho, o modelo físico, seja ele qual for, é a presença do real,
a chamada de atenção para o real, para aquilo que pode ser captado pelos
sentidos, para o real visível. É esta a função do modelo para o comummente
chamado “desenho à vista”.
Gaetan: Uma vez mais, não se trata de “procurar passar mensagens, etc.”.
Os desenhos transmitirão naturalmente “energias, tensões, pulsões”, mas
não porque pretendam fazê-lo. Em todo o caso, e em todos os casos, o que
“é próprio” do desenho e o próprio desenho, aquilo de que é feito: traços e
riscos.
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Entrevista feita a Gaetan
questões anteriores.
C. C.: A partir de 1989, a mão esquerda adquire um controle, permitindo
uma maior “sofisticação” técnica.
Para além de um maior domínio do registo gráfico, este controle da mão
contribui para um novo relacionamento com o rosto do modelo?
C. C.: Os títulos das séries surgem logo de início, contribuindo para a pose,
adereços ou surgem depois como elemento agregador e organizador?
* Machado, José Sousa, “Do lado de lá do espelho”, in Artes & Leilões, ano 4, junho-julho,
1993, pags. 55-60.
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Suzana Vaz
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NOTAS
1 - Charles de Tolnay, em History and Technique of Old Master’s Drawings, Hacker Art
Books, New York, 1983.
2 - POPPER, Karl, Knowledge and the Mind-Body Problem: In Defence of Interactionism, M.
A. Notturno (ed.), Routledge, London, 1994.
3 - Como índice de representação entendemos a quantidade de elementos de representação
gráfica, correspondentes a dados visuais de informação da realidade percepcionada. Por
exemplo: num exercício de desenho do natural de espaço interior, podemos considerar
como índice de representação geral, as rectas verticais e oblíquas de caracterização geral
desse espaço, correspondentes a elementos visuais de carácter estrutural que representam
a articulação de planos desse espaço; como índice de representação médio, podemos
considerar as rectas verticais e oblíquas correspondentes a elementos visuais integrados
nesses planos, que caracterizam morfologias e tipologias desse espaço, e que localizam
e descrevem estruturalmente os elementos arquitectónicos desse espaço, por exemplo,
aberturas, rampas, etc; como índice de representação detalhado, podemos considerar
as demais rectas subsidiárias, que correspondem às morfologias e às tipologias dos
elementos arquitectónicos. Como índice iconográfico entendemos a combinação particular
de elementos iconográficos constituintes da imagem, correspondentes a dados visuais da
realidade percepcionada e portadores de significado, e que permitem a interpretação da
imagem segundo os três níveis de interpretação previstos na iconologia: um primeiro, de
significados relativos ao conteúdo plástico, um segundo, de significados relativos aos motivos
representados, e um terceiro, de significados relativos ao sentido (intenção comunicativa) da
imagem. Estes elementos correspondem, na imagem, às decisões relativas à composição e
ao regime gráfico adoptado (linha, mancha), aos motivos da representação gráfica, e a um
intento comunicativo, respectivamente.
4 - EDELMAN, Gerald M., Wider than the sky, the phenomenal gift of conciousness, Yale
University Press, London, 2004, pp. 72-73. Na sua teoria da selecção de grupos neuronais
(theory of neuronal group selection, TNGS), Edelman explica como, no desenvolvimento
biológico humano, as primeiras discriminações da consciência (qualia) se reportam a
categorizações perceptivas relacionadas com o próprio corpo, “relatando a relação do corpo
com o ambiente externo e com o ambiente interno”, dependentes de sinais designados como
proprioceptivos, cinestésicos ou somatosensoriais, bem como componentes autonómicos.
“Estes componentes sinalizam, respectivamente, a posição do corpo, a acção de músculos e
articulações e a regulação do ambiente interno. (…) Assim, previamente ao aparecimento da
consciência superior, é construída uma cena [conjunto de qualia], com base em referências
centradas no espaço e no corpo e de base corporal neural”.
5 - DAMÁSIO, António, O Sentimento de Si, 9ª ed., 2000, À Procura de Espinoza, 2003,
Europa América.
6 - LENT, Roberto, org., Cem Bilhões de Neurónios, Conceitos fundamentais de neurociência,
Atheneu, São Paulo, 2001, p. 296.
7 - TOLNAY, Charles de, History and Technique of Old Master’s Drawings, Hacker Art Books,
New York, 1983.
8 - L’Homme Neuronal, Librairie Arthème Fayard, Paris, 1983, pp. 174-177.
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