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Pré-história e Antiguidade
Pintura medieval
Românico
Gótico
O eclético Renascimento português do século
XVI: Maneirismo
Barroco e Rococó
Proto-Barroco
O Barroco Joanino
O Barroco Pombalino e o Rococó
Neoclassicismo e Romantismo
Naturalismo e escolas associadas
Decadentismo, a persistência do Naturalismo, e
o primeiro Modernismo
Modernismo
Neo-Realismo x A segunda geração
modernista
Arte contemporânea
Ver também
Referências
Pré-história e Antiguidade
As pinturas pré-históricas que sobreviveram ao tempo estão inseridas geralmente em um contexto religioso,
em monumentos funerários, possivelmente possuindo funções mágicas e evocativas, representando os
mortos, os deuses e elementos na natureza, típicos da arte das sociedades caçadoras-coletoras e mais tarde
agropastoris. Dentre as mais importantes são o conjunto da Gruta do Escoural, com pinturas rupestres do
Paleolítico, e o do Abrigo Pinho Monteiro, datado do Neolítico, que mostra um par de imagens
antropomórficas vestidas, portando capacetes de cornos e bastão, junto com animais esquematizados, que se
supõe representarem divindades astrais gémeas, os acólitos, relacionadas ao nascer e pôr-do-sol e ao deus do
trovão. Outro exemplo significativo é o da Anta pintada de Antelas, da Idade do Cobre, consistindo de
padrões abstratos e figuras em preto e vermelho. Segundo Mário Varela Gomes, essa iconografia deriva de
duas fontes possíveis: uma de herança caucasiana, decorrente da chegada à Península Ibérica de levas de
migrantes indo-europeus, e outra aparentada com a cultura do Oriente Próximo e do Mediterrâneo oriental,
produzida no contacto que havia entre o Portugal pré-histórico e essas regiões, corroborado por uma
quantidade de artefactos arqueológicos de origem oriental ou dela derivada que se acharam associados,
embora em outros materiais, mais resistentes à degradação.[1][2]
Pintura medieval
Românico
Durante a primeira Idade Média há registos de que se produziu pinturas murais em igrejas e conventos, que
não chegaram aos dias de hoje. A pintura desse período é representada apenas por alguns manuscritos
iluminados produzidos em scriptoria dos mosteiros de Santa Cruz de Coimbra, São Mamede do Lorvão e
Santa Maria de Alcobaça. Dentre eles se destacam o Apocalipse do Lorvão, o Livro das Aves e a Bíblia de
Santa Cruz de Coimbra, todos realizados em torno do século XII.
Pela arte da iluminura pode fazer-se uma ideia
do que teriam sido os frescos e retábulos
medievais que o tempo destruiu, mas apenas
como uma aproximação, já que a decoração de
livros tinha cânones nalguns aspetos exclusivos
a este género de pintura. As pinturas presentes
nesses manuscritos empregam suas cores com
fins simbólicos e ao mesmo tempo expressivos.
A temática é quase sempre cristã, e quando
trata de assunto profano, tem fins moralizantes.
Essa iconografia reflete a arte típica da
Ante-rosto da Bíblia de
Península Ibérica no período Românico, que
Santa Cruz de Coimbra
cristalizava uma variedade de influências
diversas, temperando a tradição cristã com a
herança figurativa pagã que sobrevivia através dos bestiários, com a arte Página do Apocalipse de
Lorvão
hiberno-saxónica, visível nos intrincados entrelaçamentos de formas zoo e
fitomórficas fantásticas, e com o estilo moçárabe, onde o arco mourisco é
frequente no desenho das arquiteturas de fundo.[5][6][7]
Gótico
Ao longo de toda Idade Média a Igreja Católica esforçou-se por dar uma face unificada à Europa através da
religião, onde as artes tinham um papel de relevo na veiculação de ideologias, mas a partir do século XIII,
através do trabalho das ordens mendicantes, essa pressão intensifica-se. Especificamente em Portugal a
Arquidiocese de Braga assume um papel de liderança nesse processo.[8] Na passagem do século XIV para o
século XV o Gótico consolida-se como um estilo internacional requintado e aristocrático, fundindo a
influência da arte italiana da Escola de Siena com as conquistas dos iluminadores franco-flamengos como
Barthélemy d'Eyck e os Irmãos Limbourg na representação do espaço tridimensional. A dissolução
definitiva da rigidez da herança medieval primitiva aconteceria com a contribuição de uma outra vertente, a
do naturalismo do primeiro Renascimento que se desenvolvia na Itália com Giotto no fim do século XIV, e
se abrem as portas para uma nova concepção de arte que se definia por um crescente domínio da
perspectiva, do chiaroscuro e da representação do corpo em um estilo menos transcendente e idealizado,
mais imitativo da natureza.
O Gótico começa a florescer em Portugal a partir de fins do século XIV,
através da importação de pinturas flamengas e de manuscritos iluminados
franceses. Figura importante na evolução local da arte foi a do grande Jan
van Eyck, que permanece no país por mais de um ano, fazendo escola na
arte portuguesa junto com outros pintores conterrâneos seus.[9][10] Logo os
pintores nativos dominam o estilo, que chega a uma culminação com Nuno
Gonçalves, um dos primeiros pintores primitivos portugueses, a quem se
atribui a autoria do célebre Políptico de São Vicente, do final do século
XV, hoje no Museu Nacional de Arte Antiga. É a obra maior do gótico
português, e um exemplo superior de todo o estilo.
A tradição das iluminuras prossegue e se destaca o trabalho de António de Holanda, co-autor das ilustrações
do Livro de Horas de D. Manuel, o mais importante manuscrito decorado da transição para o Renascimento
produzido no país, mas encontram-se outros manuscritos ainda mais ricos em Portugal realizados por
encomenda expressa de D. Manuel, como a fantástica Bíblia dos Jerónimos, em sete volumes, pintada pelo
italiano Attavanti Gabriello di Vante e seus assistentes, que constituem o
primeiro grande marco e o primeiro sintoma da predileção manuelina pelo
belo e o luxo. Dessa Bíblia Paolo d´Ancona disse ser "a obra mais
sumptuosa de quantas saíram das oficinas florentinas do século
XV".[12][13][14][15]
"Italianizamo-nos, sem dúvida, mas, em regra, sem uma subordinação perfeita aos
moldes italianos, ainda que num decidido caminho de modernização. Os nossos
artistas como que souberam, por instinto, incorporar, em certas constantes
tradicionais, a nova expressão cultural que seduzia quase toda a Europa. Não já, bem
entendido, a renascentista propriamente dita, que não recolhêramos em devido tempo,
vinculados então aos flamengos, quem sabe para guardar o nosso próprio caráter.
Mas seguimos afinal, discretamente, os novos padrões do Maneirismo, não tanto na
finura, elegância e voluptuosidade dos mestres de Parma ou Florença, mas sobretudo
na feição mais austera e clássica dos romanistas, a que mais quadraria, certamente, a
uma sociedade que aderira à Contra-Reforma".[18]
Holanda foi um dos maiores vultos do Maneirismo português, sendo humanista, pintor, arquiteto, historiador
e teórico da arte. No seu tratado Da Pintura Antigua (1548), expõe as suas ideias sob a forma de diálogos
fictícios com Miguel Ângelo, com quem entrara em contacto em Roma e por quem fora profundamente
impressionado. Sua filosofia, influenciada pelo pensamento neoplatónico italiano, via na pintura uma
segunda Natureza, um espelho do gênio criativo de Deus, a quem considerava "O primeiro pintor". A arte
assim não era tanto uma imitação da Natureza, mas uma nova Criação diretamente a partir da fonte divina,
origem de todas as ideias e do mundo manifesto, e justamente por isso não necessitava primariamente
agradar ao público, mas antes ao próprio artista. Ao mesmo tempo, a sua concepção de história era toda
apologética, estruturada por valores onde "todo o prestígio do mundo é evocado com o único fim de revelar
e comprovar o valor e utilidade das artes", tendo a cultura da antiguidade como seu modelo ideal.[23] Essa
interação entre arte, classicismo e misticismo, de índole libertária e individualista, implicava ainda uma ética
de austeridade e virtude, identificando o Bem com a Beleza, e não desdenhava a importância do aprendizado
técnico sólido, dizendo que o engenho inato do pintor não era o bastante, devendo sim cultivá-lo
assiduamente através do estudo das ciências e humanidades e da prática continuada das virtudes morais e
dos ofícios artísticos. Daí se compreendem os seus esforços no sentido de fundar uma Academia de Pintura
em Portugal, esforços que não obstante não encontraram eco na mentalidade dos seus contemporâneos,
ainda presa ao antigo sistema corporativo de produção.[24]
A segunda geração quinhentista agudiza a italianização da pintura
portuguesa e leva adiante os ensaios de inovação dos seus predecessores.
Mas é um período agitado por uma atmosfera espiritual confusa - estamos
nos anos da Reforma Protestante -, ainda não foi suficientemente estudado,
e há pouca informação biográfica sobre os seus artistas. O único pintor
desse grupo com um grande conjunto de obras seguramente identificado e
com um perfil bem estabelecido é Diogo de Contreiras, antigamente
conhecido como o Mestre de São Quintino, inovando na paleta de cores,
dando uma nova expressividade às figuras e realizando experimentações
compositivas inéditas. Outro autor é apenas identificado como Mestre de
Abrantes, desenvolvendo um desenho nervoso e expressivo e adotando
uma técnica de pincelada mais livre, além de criar acordes cromáticos de
grande originalidade em tons cítricos. Merecem nota ainda António
Nogueira, com uma obra já claramente italianizante, toda maneirista, com
intenso dinamismo composicional, Jooris van der Straten, retratista
flamengo, e Francisco de Campos, flamengo radicado e dono de um estilo
maneirista bizarro e antinaturalista, autor do exemplo único de pintura
quinhentista profana em painéis decorativos no Paço dos Condes de Basto.
Com a obra de Campos a pintura portuguesa se abre definitivamente para
um novo ciclo internacionalista.[16] Joaquim Oliveira Caetano diz desse
período:
A terceira geração deste século, tipificada por Gaspar Dias e António Campelo, terá experiência direta da
arte italiana mas trabalhará numa sociedade abalada pela perda da soberania nacional para a Espanha e pelo
peso da presença repressora da Inquisição, dissolvendo-se o entusiasmo experimentado no período
manuelino com a expansão marítima e o status português de potência européia, criando uma atmosfera de
amargura e desesperança que se refletiria na arte através do dogmatismo estético e ideológico contra-
reformista. Entretanto, essa mesma fase conturbada e limitada pela imposição de um rígido programa
ideológico religioso, verá se multiplicarem as oficinas regionais de pintura, acompanhado, na dissolução da
corte lisboeta, o recuo da nobreza para o campo, que formava pequenas cortes provinciais. Somente agora,
ultrapassada a metade do século, é que se consolida em Portugal o Maneirismo, com suas tensões e
ambivalências irresolvidas, depois de décadas de tentativas hesitantes, e permanecerá como o estilo
hegemónico até o início do século XVII, quando seu dinamismo compositivo e gosto pelos contrastes serão
as bases para a formação do Barroco. Nessa fase final do século XVI lembrem-se ainda os nomes de Diogo
Teixeira, Cristóvão de Morais, Álvaro Nogueira, Pedro Nunes, Amaro do Vale, Domingos Vieira Serrão,
Simão Rodrigues, Ambrósio Dias (o Mestre da Romeira) e do espanhol Francisco Venegas..[16][25][26]
Francisco Gregório Lopes: Frei Carlos: Cristóvão de
Henriques: Os Visitação, c. 1527. Ascensão, c. 1530. Figueiredo:
mártires do Museu Nacional de Museu Nacional de Exalçamento da
Marrocos, c. 1508. Arte Antiga Arte Antiga Santa Cruz, c. 1530.
Museu Nacional de Museu Nacional de
Arte Antiga Machado de Castro
Barroco e Rococó
O século XVII, quando se inicia o percurso do Barroco em Portugal, é um período ainda relativamente
pouco estudado na história da arte portuguesa. Sua primeira metade coincidiu com o domínio filipino, e
esteve por isso mesmo durante muito tempo negligenciada pelos estudiosos nacionais e cercada de
preconceitos de fundo nacionalista, o que é compreensível. Outro fator para seu desconhecimento foi a
percepção equivocada de que nestes anos a pintura portuguesa constituiu uma mera extensão periférica e
pouco significativa da espanhola. Se bem que o deslocamento do centro do poder para a Espanha tenha
realmente repercutido de muitas formas negativamente sobre a cultura e sociedade nativas, os historiadores
e críticos modernos têm conseguido reverter a situação de quase completa ignorância que pairava até pouco
tempo atrás sobre a pintura portuguesa do século XVII, e seus estudos mais recentes têm revelado que este
foi um período de grandes e importantes mudanças estéticas, guardando muito interesse tanto pelas
surpresas positivas que têm vindo à luz sobre obras e autores como pelo seu próprio contexto político e
social atípicos que serviram como pano de fundo para a criação artística. Entretanto, o terreno apenas
começou a ser desbravado e ainda há muito a ser feito para a reintegração adequada do século XVII na
história da pintura portuguesa.[27][28]
Proto-Barroco
Neste contexto o Tenebrismo teria um papel importante ora para realçar o dramatismo e pungência da
imagem, ora sua poesia, inspirando uma piedade maior no devoto.[31] Também se popularizam, através da
influência flamenga e espanhola, as vanitas, um híbrido de natureza-morta com alegoria moralizante,
centradas no comentário da mortalidade humana e da efemeridade das coisas do mundo.[34]
No campo profano, se inicia a exploração de uma temática mais variada, crescendo o interesse pelo retrato,
pela pintura de género, pela paisagem, e se popularizando as naturezas-mortas. Também se aprofunda uma
pintura mural decorativa derivada das grottescherie italianas maneiristas, que em Portugal assumiria traços
originais e se praticaria intensamente em especial para decoração de tetos.
Conhecido também como brutesco, esse género foi divulgado muito
através de gravuras e era regido por convenções bem frouxas,
independentes da censura eclesiástica, dando amplo espaço para a
imaginação.[35]
O Barroco Joanino
Na pintura desse período a paleta de cores diversifica-se e ilumina-se, o André Gonçalves: Ascensão
Tenebrismo é coisa do passado, as formas adquirem maior fluência, a de Nossa Senhora, 1730.
composição ganha maior desenvoltura e um sentido expansivo e dinâmico, Palácio Nacional de Mafra
e ensaia-se uma recuperação dos valores clássicos. André Gonçalves, de
obra vasta, é um dos melhores representantes do Barroco Joanino. Foi muito influente, fazendo escola onde
se destacou José da Costa Negreiros. Roma é o principal centro de referência para esta fase, mas a influência
dos barrocos franceses e holandesa também se faz sentir.[39]
Em 1696 o pintor Félix da Costa iniciara um movimento para que se fundasse uma Academia, um projeto
que porém só viria a se concretizar de forma oblíqua, não em solo pátrio, mas em Roma, em 1712. A
Academia de Portugal em Roma seria um posto avançado da arte Joanina, fundamental para o contacto
direto com os principais mestres europeus de alguns dos pintores portugueses de maior relevo dessa geração,
como Inácio de Oliveira Bernardes e José de Almeida. Outros que merecem uma lembrança são Jerónimo da
Silva, o italiano João Baptista Pachini, Francisco Pinto Pereira, Bernardo Pereira Pegado e o pintor régio
Pierre Antoine Quillard, um precursor do Rococó em Portugal.[29][40]
A preocupação das elites ilustradas mas desocupadas com a felicidade e o prazer, que desenham a atmosfera
rococó, gerou problemas no transporte destes princípios para a arte religiosa, que atendia antes às
necessidades das classes mais baixas, cuja devoção não foi em nada afetada pelos costumes desarraigados
das elites. Mas as contradições aparentes foram solucionadas pelos moralistas cristãos do período, que
associaram desde logo a desejada felicidade dos sentidos com a felicidade proporcionada por uma vida
virtuosa, afirmando que o prazer humano seria uma das dádivas de Deus e sugerindo que o amor divino
também seria fonte de uma espécie de volúpia sensorial. Com essa acomodação, a religião, anteriormente
sobrecarregada pela noção de culpa e pelas ameaças da fogueira e da condenação eterna, assume um tom
otimista e positivo, e gera uma pintura diante da qual os fiéis podiam rezar "na esperança e na alegria" e
que serve de ponte entre a felicidade terrena e a celeste.[44]
Domingos Vieira, o Manuel Henriques: João Gresbante: Josefa de Óbidos:
Escuro: Retrato de S. Francisco Xavier, Ecce homo, 1642. Calvário, 1679.
D. Isabel de Moura, c. 1640. Sé Nova de Santa Casa da
c.1635. Museu Coimbra Misericórdia,
Nacional de Arte Peniche
Antiga
Neoclassicismo e Romantismo
O final do século XVIII vê o Rococó, enfim triunfante, rapidamente transitar para uma maior simplificação
e expurgação dos seus excessos decorativos em direção ao Neoclassicismo, por força do grande interesse
que grassava neste época em toda a Europa pela arte e cultura da Antiguidade. Diversos estudos literários e
escavações arqueológicas traziam à luz, para o grande entusiasmo de todos, uma quantidade de informações
novas e obras de arte desconhecidas, e a divulgação de imagens das ruínas clássicas através de gravuras
atingia um público que não se limitava aos especialistas e eruditos.
O classicismo é um corpo estético e ideológico que prima pela ordem, pelo equilíbrio, pela racionalidade e
pelo cultivo de altos ideais em civismo e ética pessoal, colocando o grupo acima do indivíduo. Naturalmente
todo o sistema de arte refletiria a atmosfera cultural desse momento de transformação, e assim não
surpreende o novo valor que se dá ao ensino artístico estruturado de acordo com princípios ordeiros e
hierárquicos, fortalecendo o papel das Academias. O Iluminismo estava em grande voga, e era outro fator de
repúdio ao sensualismo e frivolidade do Rococó e de uma reavaliação teleológica do papel da civilização e
do progresso.[45]
Quase ao mesmo tempo, o Romantismo começava a ganhar impulso na
Alemanha e na Inglaterra, propondo uma nova aproximação com a
Natureza e privilegiando a expressão dos sentimentos e do génio
individual, e com isso sendo veículo de ideologias revolucionárias que
contestavam várias estruturas de poder estabelecidas, como a Igreja e o
Estado. Também deu força a projetos nacionalistas em vários países,
reavaliando positivamente a Idade Média, até então relegada a uma
condição de desprezo, e reconstruindo uma história ancestral de que não
Domingos Sequeira: Junot
havia registo visível. Desta forma, o intervalo entre os últimos anos do
protegendo a cidade de
século XVIII até meados do século XIX é colorido por um vivo diálogo
Lisboa, 1808. Museu Nacional
entre dois princípios que muitas vezes se mostram antagónicos, mas sendo
de Soares dos Reis
em essência ambos idealistas e reformadores, não raro concorrem para a
formulação de uma concepção unificada de arte e cultura, baseada no novo
papel atribuído ao artista, o de profeta de uma era mais justa socialmente e
de educador do público em direção a uma moralidade mais pura,
verdadeira, positiva e benéfica para todos. Neste ambiente, torna-se muitas
vezes difícil distinguir uma pintura neoclássica de uma romântica, já que
ambas as escolas coexistiram até cerca da década de 1850, sobrevivendo o
Romantismo um pouco mais. Nas suas manifestações extremas, contudo,
uma diferença de modelos torna-se mais evidente. Numa generalização
simplista, a composição neoclássica é claramente organizada e equilibrada,
privilegia a linha sobre a mancha, e recorre com frequência a temas da Francisco Augusto Metrass:
tradição greco-romana numa expressão impessoal. A romântica por sua Só Deus!, 1856. Museu do
Chiado
vez tende à desordem, ao contraste marcante, ao drama, à primazia da cor e
da pincelada expressiva, e prefere assuntos da história contemporânea e o
retrato do povo e da Natureza, buscando um universalismo através da
interpretação individual de temas genéricos.[46][47][48]
A cena portuguesa não fugiu à força dessas ideias que agitavam toda a
Europa e as Américas, mas abrindo-se o século XIX a sociedade se viu
atordoada com a invasão napoleónica em 1807, a fuga da família real para
o Brasil e em seguida a Guerra Civil, que em conjunto resultaram numa
relativa paralisação nas artes e um enfraquecimento temporário da
influência francesa, favorecendo as expressões românticas mas não
anulando as classicistas.
Dentre os mais expressivos de inclinação neoclássica estão Vieira João Cristino da Silva: Cinco
Portuense em sua última fase, Domingos Sequeira, José da Cunha Taborda, Artistas em Sintra, 1855.
Cyrillo Volkmar Machado, Norberto José Ribeiro, António Manuel da Museu do Chiado
Fonseca e o Visconde de Meneses, um representante tardio.
A pintura entre 1840 e 1860 seria principalmente romântica, e refletiria essa busca de identidade nacional
seja enaltecendo seus heróis, seja retratando o povo poética e sentimentalmente, seja sendo atraída para a
paisagem local, idealizada por olhos sonhadores que tendiam ao saudosismo de tempos dourados e por um
bucolismo ora expansivo, ora intimista. Também se desenvolve um gosto pelo exótico, satisfeito através da
representação de cenas orientalistas e medievalistas. Na década de 1870 o Romantismo começa a perder sua
força, permanecendo porém um núcleo de resistência no Porto, com o trabalho de Francisco José
Resende.[51] Junto com o Neoclassicismo e o fortalecimento do ensino académico, o Romantismo em
Portugal significou o início do deslocamento definitivo do centro de interesse artístico da esfera religiosa
para a profana.
Deve ainda ser destacado o papel de D. Fernando II para as artes portuguesas nessa fase. Educado na Áustria
e sensível à cultura romântica germânica, foi um amante das artes, que encarnou bem o ideal romântico por
excelência, e seu mecenato foi um fator de estabilidade cultural num século de crónica instabilidade
política.[52] No grupo dos românticos fizeram nome Tomás José D'Anunciação, João António Correia,
Auguste Roquemont, João Cristino da Silva, Miguel Lupi, José Rodrigues e Joaquim Rodrigues Braga,
Francisco Augusto Metrass, além de D. Carlos I, que também foi pintor romântico de mérito, embora
cronologicamente defasado.
Domingos Sequeira: Norberto Ribeiro: António da Fonseca: Tomás
O milagre de Alegoria à Eneias Salvando D'Anunciação: Vista
Ourique, 1793. Instituição da seu Pai Anquises do da Penha de
Château d'Eu Academia de Belas Incêndio de Tróia, França, Lisboa,
Artes de Lisboa, 1855. Palácio 1857. Museu do
1840. Nacional de Mafra Chiado
A arte italiana começa a perder o seu atrativo, embora Roma ainda seja um centro importante de
aprendizagem, mas a penetração da influência francesa faz-se cada vez mais forte, e muitos dirigem-se a
Paris para estudar. Lá, entram em contacto com as novas tendências do paisagismo lírico da Escola de
Barbizon e da arte de Courbet, Daubigny, Degas e Manet, e voltam a Portugal fervilhantes de novas ideias,
rompendo o relativo isolacionismo que reinava até então, com as raras exceções de artistas bolsistas que
traziam novos dados de fora e ocasionais visitantes estrangeiros. Toda essa nova arte era essencialmente
burguesa, combatia os privilégios das elites, pesquisava novos recursos técnicos em direção a uma pintura
mais solta, distante do rigor académico e seus temas heróicos ou
mitológicos que nada tinham a ver com a realidade imediata, e cultivava
grande interesse pelas possibilidades de fazer uma arte de cunho social.
Assim, os pintores se dedicam a uma descrição mais objetiva do mundo
que os cerca, sem a intenção primária de captar o "belo", mas abordando a
vida do povo como ela era nos seus variados aspetos, e praticando ao ar
livre um paisagismo que já não tinha a atmosfera idealista dos românticos. Antonio Carvalho de Silva
António da Silva Porto, Marques de Oliveira, Henrique Pousão, Sousa Porto: Charneca de Belas ao
Pinto e Artur Loureiro estão entre os primeiros a adotar essa nova linha de Pôr-do-Sol, 1879. Museu do
trabalho.[54] Chiado
"E nós, então, formando circulo em volta do mestre, com os olhos pregados nas
taboas em que elle tanto gostava de pintar, assistíamos a um prodígio: – d’esse
pedaço de madeira surgia a seara dourada pelo sol mordente de Julho, surgiam as
azinhagas marginadas de piteiras, tão características dos arredores de Lisboa, mas
tudo tão real, tão simples, de verdade e de emoção, que dir-se-hia que o Mestre não
pintava com as cores da sua paleta insubstituível, mas sim com a própria luz, que
sobre ella jorrava, porque toda a sua obra é luz; e era a luz que, por sua inspiração,
guiava os nossos primeiros passos d’artistas; é a luz que ainda hoje nos illumina; é a
luz que brilha como a mais refulgente estrella da arte portugueza!" [57]
O fenómeno da persistência do Naturalismo em Portugal no século XX, que internacionalmente foi marcado
pela revolução modernista, se deve a vários fatores. Ao longo de todo o século XIX os intelectuais
portugueses lutaram, sem grande sucesso, para elevar a moral da nação, numa fase em que o país se sentia
frágil e inferiorizado no cenário europeu, submisso à Inglaterra e incapaz de reverter o quadro de atraso e
decadência em que se encontrava desde o início do século. O Ultimatum de 1890 pôs fim à esperança de se
reorganizar Portugal através de um novo avanço colonialista, gerando um descontentamento passadista e
melancólico que foi aprofundado com a influência de uma literatura neorromântica derivada da obra de
Garrett, que só serviu para evidenciar ainda mais o estado de ruína da cultura portuguesa coeva diante das
realizações dos séculos XIV e XV. A única redenção vislumbrada para isso seria o fim da Dinastia
Brigantina - acusada de ser a responsável pela decadência portuguesa - seguida de uma regeneração
espiritual baseada no antigo Portugal aldeão, que encarnava agora uma feição mística e arquetípica de
pureza e simplicidade.[58] Guerra Junqueiro expressou o sentimento nos versos:
"Que é da grandeza heróica do passado,
Que é das tôrres d’outrora olhando o mar?!…
Blocos no chão, vestidos d’heras,
Ameias, gárgulas, esferas,
Poeiras de sonhos, de quimeras,
Luto, nudez, desolação,
Eis os restos de tantos extermýnios,
De tanta dôr e tanta maldição!… [59] António Carneiro: Tríptico A
Vida: a Esperança, o Amor, a
É neste ambiente decadentista que se explica a obra singular de António Saudade, 1899-1901.
Carneiro, que dirigiu a técnica naturalista para uma construção simbolista, Fundação Cupertino de
privilegiando temáticas oníricas e um paisagismo que foge ao Miranda
condicionamento das descrições naturalistas, remetendo para uma
abordagem mais puramente pictórica da obra.[60] De parte do público
consumidor de arte, formado principalmente pela burguesia, nas décadas
anteriores havia sido sempre conservador e pouco exigente em termos
estéticos e críticos, primeiro pela sua desinformação, causada pela posição
periférica do país em relação aos grandes centros da vanguarda, e também
pelo apoio pouco eficiente das instâncias oficiais para uma renovação mais
profunda, e pela atmosfera política sempre conturbada, agora às voltas com
o movimento republicano, que depois do seu sucesso em 1910 assumiu o
poder.[61]
José Malhoa: O fado, 1910.
O novo governo republicano, que desde logo se aproveitou da arte com Museu da Cidade de Lisboa
fins propagandísticos, reiterava o apelo pela implantação de uma cultura
nacionalista, mitificava o progresso e realimentava velhos ideais
românticos que tiveram no Naturalismo uma nova forma de apresentação,
se apegando a uma figuração com forte referência à paisagem portuguesa e
aos costumes e folclore do povo. Esses fatores, ademais a longevidade de
muitos dos primeiros naturalistas, agora elevados ao prestígio de mestres
nacionais, só poderia resultar numa sobrevivência do Naturalismo até uma
data em que esse estilo já havia desaparecido na maior parte dos outros
países onde havia florescido.[62]
Modernismo
O Modernismo português em linhas gerais acompanhou o movimento
internacional nos seus propósitos e formas de ação. No início do século, as
inovações na ciência e na tecnologia e o novo modo de vida das grandes
cidades foram elementos que exerceram um impacto decisivo no mundo da
arte, pois o Modernismo é em essência uma arte urbana e mal pode ser
concebido fora da paisagem citadina. Todas as escolas da vanguarda da
época - Cubismo, Suprematismo, Futurismo, etc. - de uma forma ou outra
estão ligadas ao progresso e às transformações que sofriam as cidades, em
especial as metrópoles regionais, cujo desenvolvimento se acelerava a olhos
vistos. E o advento da república, derrubando uma série de monarquias
européias no início do século XX, foi apenas um reflexo de uma nova visão
Souza-Cardoso: Entrada, que despontava no horizonte sobre o mundo, a estrutura da sociedade e as
1917 relações interpessoais, onde os irracionais privilégios de berço ficavam
abolidos e o mérito e o direito do cidadão comum fundamentavam o novo
modelo social. Refletindo essa atmosfera, a arte modernista só pôde assumir
uma feição revolucionária, questionando de forma direta e agressiva todo o
sistema de representação antigo, considerado uma das expressões das
convenções das antigas aristocracias, num triunfo da visualidade, da
materialidade pura e da autonomia da obra de arte, e retratando o cenário
urbano que assumia um rosto cosmopolita, movimentado e estimulante.[65]
.[66] Como diz Inês Espada Vieira,
As promessas suscitadas pela introdução dessas novas estéticas foram abortadas com a continuação da I
Guerra Mundial e com a saída de alguns vanguardistas do país, restabelecendo-se o conformismo por mais
algum tempo. A política cultural do Estado Novo, inaugurada em 1933 com a criação do Secretariado de
Propaganda Nacional e conduzida por António Ferro, significará o fim do ciclo naturalista e uma vitória
definitiva do Modernismo, mas ora dentro de uma poderosa afirmação nacionalista e trazendo uma forte
marca do Expressionismo.[64][69][70] Seus princípios se fundaram na proclamação do valor exemplar da
História, com a sua galeria de santos e heróis, no fascínio pelo império, com uma constante reiteração da
grandeza, e na valorização daquilo que vem do povo. Esses princípios são cristalizados na I Exposição
Colonial Portuguesa (1934), no Concurso da Aldeia Mais Portuguesa de Portugal (1936) e da Exposição
do Mundo Português (1940), símbolos da chamada Política do Espírito, nome que teve em Portugal o
projeto de fomento cultural e de propaganda do regime.[71]
Arte contemporânea
Os anos 1960-70 são marcados por uma crise internacional na
arte. As tradicionais formulações da pintura encontram-se
aparentemente esgotadas, tendo sido experimentadas todas as
formas imagináveis de figuração e de abstração. O significado
da própria linguagem pictórica é posto em xeque pelo
surgimento da arte conceitual, que buscava uma dissolução de
fronteiras entre as tradicionais categorias artísticas - pintura,
escultura, dança, teatro, etc - e a criação de uma nova forma de
pensar o diálogo com o espectador, exigindo dele uma
Fernando Lanhas: O41 - 69, 1969 participação mais ativa no processo criativo e contemplativo.
Surgem as performances, a Body art, a Arte cinética, as
instalações, e a pintura migra para novos suportes, assimila
novos materiais, desmaterializa-se, redefine o caráter da representação e deixa de ter um destaque especial
entre as artes, fundindo-se num novo conceito de "arte total" onde a palavra e a ideia - o conceito - passam
ao primeiro plano de importância. A quebra de parâmetros e o experimentalismo tornam-se a regra e a
cultura começa a massificar-se. Em Portugal a fase é de contradições entre os resíduos do Modernismo e do
Naturalismo e a necessidade urgente de renovação, urgência em parte sufocada pelo início da Guerra
Colonial, o distanciamento das movimentações internacionais de 1968 e a continuidade do Estado Novo
após a morte de Salazar, e uma mudança efetiva, num clima de liberdade de expressão genuína, teria de
esperar pelo restabelecimento da plena democracia. Mesmo assim a pintura como género autónomo resiste à
pesada crítica levantada pelos conceituais contra os meios tradicionais e começa a mostrar a influência da
Arte Pop, do Minimalismo e da Op art.[78]
Dos anos 1980 em diante consolidam-se no âmbito oficial projetos de educação artística em nível escolar
para estímulo da criatividade, evidenciando que a mentalidade vigente já se mostrava recetiva a uma
libertação de convenções tradicionais e espelhando o fim da ditadura no país. Observa-se uma continuidade
de questionamentos conceituais a passo com uma vigorosa retoma das formas tradicionais de pintura, no
chamado movimento internacional Pós-moderno, que faz uma reavaliação de toda tradição pictórica
ancestral e inicia uma abertura para novos temas, tendo a vida urbana cosmopolita como foco central, com o
seu elenco de novos desafios - ambientalismo, política, choque geracional, violência, sexualidade e
igualdade de géneros, multiculturalismo e globalização da cultura, junto com o aparecimento dos novos
media como o computador, a internet e a arte das ruas. O mercado de arte expande-se, são fundadas novas
galerias, mas o momento histórico de irresistível pluralidade representa o fim das utopias. A pintura deixa de
atender a ideologias pré-estabelecidas e ora serve primariamente como expressão de poéticas individuais,
conforme o declara Miguel Leal:
A multiplicidade de estilos que se interpenetram ou se sucedem com rapidez impede uma definição desse
último período histórico senão como um novo ecletismo, que é a tónica de toda a pintura produzida até o
momento presente.[64] É também difícil listar, sem ser exaustivo, todos os nomes com obra expressiva na
pintura portuguesa recente. Aqui seguem-se apenas alguns: Nadir Afonso, Álvaro Lapa, Ângelo de Sousa,
Armando Alves e os integrantes do Grupo Puzzle como Graça Morais, Pedro Rocha, Albuquerque Mendes e
Carlos Carreiro; Abreu Pessegueiro, Paula Rego, Alfredo Martins, Fernando Pereira, Manuel Cargaleiro,
Barahona Possollo, José Grazina, Manuela Pinheiro, Miguel Petchkovsky, Raul Perez, Rui Amaral. Por fim,
lembre-se a criação da Fundação de Serralves e do Museu Colecção Berardo, os quais, apesar da sua curta
trajetória, já são referências internacionais para divulgação da arte contemporânea em Portugal.
Ver também
Lista de pintores de Portugal
Pintura
História da pintura
Arte de Portugal
Cultura de Portugal
História de Portugal
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e a Condição Acefálica. p://www.esec-josefa-obidos.
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