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TÍTULO: Pensar com as Mãos

AUTOR: Alberto Campo Baeza

COLECÇÃO: Pensar Arquitectura

TRADUÇÃO: Eduardo dos Santos

REVISÃO: Ana David


DESIGN E COMPOSIÇÃO GRÁFICA: Ana Sarmento
FOTOGRAFIAS: pp. 8 e 9 - Casa Olnick Sparu (EACB);
pp. 14 e 15 - Oficinas SM (Hisao Suzuki);
p. 25 - Caja Granada (Duc~io Malagamba);
p. 20 - Casa Asencio (Hisao Suzuki);
pp. 66 e 67:... MA (Javier Callejas); .
pp. 116 e 117-MA (Javi~r Calleja•s);
p. 144 (Javier Çallejas); ~
p. 151 (Marco Zanta)
DATA DE EDIÇÃO: Fevereiro de 2011
ISBN: 978-989-658-100-8
DEPÓSITO LEGAL: 322102/11
EDIÇÃO:
ca ei
d o se
ó io
Caleidoscópio_Edição e Artes Gráficas SA
Rua de Estrasburgo, 26 - r/c dto. ,
2605-756 Casal de Cambra . Portugal
Tel.: (+351) 21 981 79 60 . Fax· 3 1 ,
e-mail: caleido . . · (+ 5 ) 21 981 79 55
. scop1o@cale1doscopio.pt
www.cale1doscopio.pt
Da caverna à cabana
So bre O es ter eo tóm ico e o tec tón .
ico na Ar qu ,te ctu ra

Tentando clarificar e explicitar os


termos estereotómico e tectónico
aprendidos, mais não faço do que , não inventados mas
tentar transmitir algo qu e muito
me tem ajudad<> na
arquitectura que tenho construído
durante estes anos. 1
Emprego aqui os termos estereotó
mico e tectónico, _a qu e Gotfried
"categorias", porque, tanto para ent Semper 2 chama
ender o que os arquitectos faz em
preender como o fazem, são extrem como para com-
amente úteis.
Não são portanto conceitos abstra
ctos aplicáveis à arquitectura, com
com alguns sistemas de ordem filo o se tem feito
sófica que tantas vez es se têm apl
destes últimos anos num debate inte icado à arquitectura
ressante ma s estéril .
São termos eminentemente arquite
ctónicos. O per ceb er qu e pa rte
tence à terra (estereotómico) e que do edifício per-
parte se desliga d~la (tectónico),
todo o edifício trabalha em continu ou o considerar que
idade com a terra, ou qu e pe lo con
com ela contactos mínimos, pode trário, estabelece
ajudar efectivamente à pro du ção
do novo organismo
arqui tectónico. '

1 Sem per
propõe-nos esta s categorias com
o "stereotomics of the earthwork"
ralmente , seriam "estereotomia do e "tec toni cs of the tram e" que , trad
trabalho da terra" e "tectónica da uzidas lite-
serem redundantes , as segundas estrutura•. Par ece u-no s mai s sim
partes explicativas, pelo que dec ples nã o~ . por
e tectónico, sem mai s. idim os usar, com o Fram pton , os
tefTTlOS estereotómico
Durante todo o ano lectivo de 198
9/19 90, fui gastdocent na ETH de Zuri
instituição do professor Frampton que, o que· coin cidi u com uma eslf
, que aí dav a as suas aulas toda ldia n a ~
chegasse de Madrid toda s as seg s as seg und as-f eira s às 10 hora
undas-feiras, dep ois das respecti s dà manhã. Embora eu
lidade a ess as interessantes aula vas corr idas pelo s aero port os, aco
s em que Frampton explicava este rri sempre com pontua-
clareza absoluta que eu gos taria s ass unto s do ·tect ónic o e do este
de ter tam bém aqui no pres ente reotómico-corn uma
Cabe cita r aqui não só Kenneth texto.
Frampton, mas tam bém Jes ús Apa · ·
bolseiro Fullbright em Columbia, rício . O prof ess or Aparicio, nas
com enta va este s assuntos sob re s u a s ~ como
estudos sobre Semper. Os termos os qua is Fram pton disc orria por
tectónico e estereotómico em brev ess a altura nos S8Ull
No livro E/ Muro, resultado de Tese e cele briz aram -se na Esc ola de Arqu
com que o professor Aparício adq itectura de ~ d.
importante do seu tempo a abo rdar uiriu o títul o de Doutor, não só ded
este s temas, com o constituíam aliá icaVa uma parte
joco so a forma com o os alunos, s o seu /eitmotif. Por vez es, reco
mai s inocentes do que ignorantes, rdávamos em tom
"estereofónico" ou "estereotónico". nos ped iam que lhes exp licá sse
mos aqueles termos de
De características sem elha ntes
é o interessante trab alho da prof
~uadros sinópticos interessante ess ora e arqu itec ta Ana Maria
s dota dos de gran de sentido ped Leó n que inclui alg,tJfl$
interessados no tema. agó gico , e cuja con sult a e estu
2
do rec ome nda mos ~
Os textos mai s _básicos de Semper
são traduzidos pela prim eira vez
Herrmann: Got fried Semper. ln sea para O ingl ês no mui to interessante
rch of Architecture, pub licad o pela livro de WolfganQ
publicada com o p~rte do livro "La MIT Pre ss em 198 4. A sua vers
cas a de un sólo mur o" de Jua n Mig ão em cas tel~ é
da Escola de Arqu1tectura de Mad uel Her nan dez Leó n, Pro fess or Cate
rid. drático e DiredPf
É curioso o comentário de Herrma
nn sobre o inte ress e de Sem per
M~~lborou~h H~use, writt~n in Eng em difu ndir as sua s idei as em
l_ish, incidentally a lang uag e he nev inglês: "He gav, _at
nan o alemao a 1mportânc1a dos mei ar quit e mas tere d" . Bem con hec
os de comunicação, da palavra, ia o veltio revolUCIO--
para difu ndir as ideias.

26 1 PENSAR COM AS MÃOS


Kenne th Frampton, no seu livro Labor work and Archltecture ª, dedica um capítulo a
estes temas de forma certeira. Começa, como não podia deixar de ser com o conhecido
desenho do abade ~augier sobre a Cabana Primitiva. Recupera af o t~xto que publicara
já em 1990 em Arch,tectural Design com o expressivo título de "Rappel a /'ordre the case
for the Tectonic". E esclarece como a fonte destes termos é Gotfried Semper, ~ue assim
os enunciava nos seus textos mais significativos.
Escreve Frampton na introdução do seu livro: "Jlartlndo da hipótese do que se refere
à relativa autonomia da arquitectura, a forma ,construída era tanto estrutura e construção
como criação e articulação dó espaQo. Eu tento recuperar a noção do século XIX de tec-
tónica, num esforço parà ,,resistir à tendência actual em ficar só nos efeitos cenográficos"
E mais adiante explica: "f>ara considerar a arqultectura do século XX em termos de
continuidade e inflexão, ma_ is dq ·que em termos de originalidade como um fim em si
mesmo". E continua: "De~emos voltar sobretudo à unidade estrutural, como a essência
' ' '

irredutível da forma arq~jtectónic~." E nos parágrafos seguintes propõe de forma clara o


1

significado dos termo$ lester.e_ otófTJiCO,e .fect6niao. ''


"Para além destas :.distinções, S.e·~ .per .' di~id.e ~ fórma coflstruída em dois procedi-
mentos materiais djstlntosi .• ~ 1~~c,tóniÇ{l d~ ,red·~,·, ;~nd~ ~s dist.intas partes se conjugam
constituindo urna .µryi~a. ,u~id~déi e~p~d,~I". :~;·~-:'~~;t,w~o(qmica, da. mas~a que trabalha a
compressão, que qu,a,t1d6 . c'ónJ~:f~~t~~ . :-éspaçqJá-lh:por.sobrepOsi·ção de partes iguais.
o termo estereotórriico ~~~v,é,ttt: 8i;~nt~f
P'.;:~terep~,,, ll~\S,ignifica sólido., e- tomiaf que sign~-
fica cortar • · · · •
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No primeiro.. c~so,,.',.' ~ ,~~ç,(~nicoi.· 9,J;T)~rer,·~1 ,: n,'\ais,tc_


omum ao longo da história foi a
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madeira, ou os s~us ·equiV~l~ot~s/ ÇQQÍ9;·0. -~~f.n~U\.~~ eanas e o trabalho de cestaria.


1

No segundo .c~,so, .o,. · ~~~1,9~qmt,bpt ;O° ·,q)~te.r!,trw .ai~ .usado foi o tijolo, ou materiais
que trabalham á corripressijo\de
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rn~relra'
simjlal'.,a~ tijolo. GOiTl(!).a pedra ou o adobe, ou
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o betão armado. . ·, · , , . . , .
Houve excepçõàs m~ito ~i~~ific~Ú~.a~::.~~.s~a ~.ivj~ijo,. especialmente quando baseada
na estabilidade a peqra fó(qor:t~d:á é ·coloc~da,.1de um modo tal·. qu(3 toma forma e funciona
' ·, 1 1 ,1· f

como uma rede." · ,,.,. . , ,


É óbvio que Frampton -s~ es~á.a ref~rir ~qui a e~se prodígio estrut~ral que é o ~ó~co.
em que um material ctarame~_ te .estereot6mlça COfl:'O é a pedra adopta caractensticas
tectónicas numa. situação. limite, .,qu.a~e milagrosa, corist!tuindo uma estrutu~a onde ~e
distinguem as. nel uras das :ab.auJa.dos, p. mo um
.· a premo~ição daquilo que seculos mais e.

tarde fará O Movi ento Moderno na ·$Ua separação dos·p1lares e remate.


"Embora est _· factos sejam•, sobejam~nte conhecidos por todo_s, . há_ que repeti~los.
Tendemos-a--rião perceber as consequênci.as ontológicas destas d1stinçoes, ~er_diz~,
do modo em que a concepçao - da estrutura tende. para o aéreo· , para a desmatenahzaçao

3 . PhaidOn Ed l-ondres, 2002. (p. 23).


Kenneth FriJTipton. l,.abotJr warlc and archit~ure~~ h:lt3C1!,lràJ D9$ign. n.u60f.l/4/pp, 19,-25.
Este texto é o mesmo que .,-~u em 1~ em ,,.,e 1 - -

$0QRe dQUfll!CTURA 1 21
da massa , ao passo que quand o a forma da massa é telúric a funde- se sempr
e no mais
profun do, dentro da terra.
A primei ra tende para a luz, enqua nto a outra tende para as trevas . Estes
oposto s
gravita cionais , a imater ialidad e da concep ção e a materi alidad e da massa
podem servir
bem para simbol izar os dois oposto s cosmo lógicos a que aspira m: o céu e a
terra.
Apesa r da nossa secula rizada idade tecno- científ ica, estas duas po~aridades
ainda
constit uirão por muito tempo os limites experi menta is das nossa s vidas. E discutí
vel que
a prática da arquite ctura tenha empob recido e tanto não é assim, que fazem
os mal em
não reconh ecer estes valore s transcu lturais e o modo como estão latente s
em todas as
formas estrutu rais.
Com efeito, estas formas devem servir para nos record ar, segun do Heideg ger,
que Qs
objecto s inanim ados també m devem evocar o "ser", e que atravé s desta analog
ia com os
nossos próprio s corpos , o corpo de um edifício deve ser entend ido como se
fosse literal-
mente um ser físico. Isto traz-no s de novo à consid eração de Semp er da import
ância das
juntas como o elemen to arquite ctónico primordial, como o nexo fundam ental
em redor do
qual o edifício chega ao seu ser, ou melhor , chega a ser articul ado, como uma
presen ça
em si mesmo ". (Esta referên cia a Heideg ger é tomad a do seu célebr e texto
Construir,
habitar, pensar,.
A ênfase de Sempe r nas juntas implica que esta transiç ão sintác tica fundam
ental
tenha de ser entend ida como uma passag em da base estere otómic a à estrutu
ra tectó-
nica, e que tal transiç ão constitui algo muito essenc ial em arquite ctura. De tal modo
que
são estas compo nentes fundam entais que irão mar<?ar os distint os períod os da
cultura do
construir. Há um valor espiritual que reside na "coisid ade" do object o constr uído,
de forma
que as "juntas genéri cas" acabam por tornar- se em pontos de "conde nsaçã o
ontológ ica"
mais do que numa simple s ligação.

APRO XIMAÇ ÕES AOS TERM OS ESTER EOTÓ MICO E TECTÓ NICO
Tentat iva de uma maior precisã o no seu entend imento

Entende-se por arquite ctura estereotómica aquela em que a força da gravid ade
se trans-
mite de forma contínua, num sistem a estrutu ral contín uo e onde a contin uidade
f . . constru -
iva e completa. E a arquitectura maciça , pétrea , pesad a. A que assen ta na terra
como se
dela nascesse. É a arquitectura que busca a luz, que perfura as suas parede s
para que a
luz entre no
seu ·tntenor.
· E· a arqu1te
· ctura do
pódio, do envasa mento , da estilób ata. É, em
suma, a arquitectura da cavern a.
. Ente nde-se por arquitectura tectónica aquela em que a força da gravid ade
se trans-
mite de uma forma sincop ada n · t ·
, um s1s ema estrutu ral com nos com juntas e onde a
construção é articulada É a arq •t t . '
. . · u1 ec ura ossea, lenhos a, leve. A que '
poisa na terra
em bicos de pés E a arqu·t1 t como
· · ec ura que se defend e da luz, que tem que ir tapand-
o os seus

26 1 PENS AR COl\,II AS M ÃOS


orifícios para poder _controlar a luz que a inunda. É a arquitectura da casca. A do ábaco.
É, em suma, a arqu,tectura de a cabana.
É evidente ~ue esta distin~o se faz com base numa consideração "estrutural" da
arquitect~ra. VeJo cada vez ma,s claratnénte a Importância fulcral da estrutura. portadora
e transmissora de cargas e ao tnesmo tampa formadora 8 ordenadora do espaço arqui-
tectónico. A estrutura é a resposta mate•rial â gravidade que, disse-o já tantas vezes,
"constrói o espaço", do mesmo modo que a 1u2 "constrói O tempo".

GRAVIDADE
A G, a força da Gravidade

' ' '


Não me canso de repetir.:·que·a.1 gravidad~ -.11êonstrój o espaçq". A estrutura portadora não
só transmite as carga~.·.~·\ler'ra :.~ ~~ 'antes ·de.-mais, estabeleee a ordem do espaço.
A definição da estrut~ra.;~ort~dpr~i::91~r,~ :esta~l~cime~to, supõe um mOm'ento chave da
criação arquitect6ni~a_ :i~~ ~-ini~:i ~~~-t~~~-~to:ri:,def~nde este papel eentral da estrutura,
da "unidade estruturá! -.ç~tntj'.:!~:-~ss~~~j,Hrr~atíyel cta'fo_rma arquitectónica~. Pois é nesse
sentido, no gravitacion~1,· rio' \ê~i,rici~à~~l,:)IQu:e') )s··.90nceitos de ~stereotómioo e ,tectónico
adquirem o setJ signiJibâd<>'hiáfs::~laro,;:,:·}1:':!'.'. ·. ·: /.·., ,' ;·.'
. ~.:: :f,
, ,. ; . ·1\,·.·,'. . . ,1'
;1 , i11;i . . ' •;~. ·11 4.

Numa arquiteCtl:Jra es~~t~q~fl1i~t ;a!9r~vi~~d~-t.ràn$milé:.se.ém massa, de forma con-·


, . •. , . . J ,•i •'· , °' q· ,, . l ,·\ ' . . ' . . ,··, ~ \ ', ' . } ,
tí nua, num sisten;ia é~,ru.ty~~J'. ,?,g,P~ír:~~1:(:jn~~:.a9ci>ntinuidade-cor:istrutiva é- completa", onde
tudo funciona principa!~~~i~,.:;~ i~q,qa~~~s.são~I->. \ .·· . : . ·
Praticamentê tóda ·i ·b\$t~r,i~~ix~~~tiit~tµtaié'·cqnsti4Jida.por ediffaios em que isto se
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1 ·'\;l, · , , ' .
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verifica. Os recintos er~m;,f~tmáa<iís1!pqr1paredes,,maciças,d,ê·pe:dra .OU de tijolo. E 00 tecto


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os arcos, as abóbada~: e, ~~-.dú.~µ~s ·surgi:am fOn:tO invento.s, formais Gapazes de fazer


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com que tudo aquilo po·r1~tif4íss.~ °:'~m.' ~~pa@•feç_


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~~do·e.m: continuidade. Depois, com os
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mesmos materiais, o tijol~ e'a\ pedra,\:'lel'j·tou~~e'. aligàirar o ~rtifleio par~ se poder erguê-to
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até alturas maiores..A F>Qt~nte 'al~ena'r,.ia ~<>~·romanos,·eôm .as suas ~~t(Uturas de- "cofre",
como a Basílica de: Ma~~nclct.oú, ·d~ ·.to{ma··ainda,mais su_ btime, a dô Panteão. abriram
caminho às delicadas estrutura~çJe ·"óest~'' d~s_ g.p,tco.~. J;â referi comq a-ideia principal do
gótico de aligeirar a constrúçã0 pétre.~·c;om..·ija nerv,µras e os abau~ados, não era mais que
o desejo de atingir uma att1:.1ra ,maior,,para capta~ 1,Jma maiQr quantidade de luz em cima
Como se fosse un,la pr,moniç:ão do q~e no séquld XX constituiu um dos pontos centrais
a
da revolução arquitectónioa: separação dos pilares e dos remates, dos elementos por-
tadores e da pele. .
Numa arquitectura tectónica, "a gravidade transmite-se de !orma :incopada, nu~ sis-
tema estrutural com nós, com juntas, onde a cónstruçáo ~ a111culada , ond.~ ~e ~eixa ~e
trabalhar só a compressão 8 aparecem os ''momentos". E as~i~ como os ed1fíctos ~lS
importantes da história da arquit~ura passr>.da, pétreos, maclços, pert~ncem àquilo a
que chamamos O carácter estereotómic,o, outra parte importante da arqu,tactura, • mais

soeR~ ARQUITECTURA 1 29
recente, realizada com materiais mais leves, pertence ao campo tectónico. A condição
efémera daqueles materiais leves, como a madeira, fez com que, quando na história
da Arquitectura se almejou a permanência no tempo, se tenha utilizado basicamente a
pedra. Até que surgiu, já muito recentemente, o aço.
Uma das particularidades mais importantes do aço é a de conjugar a sua máxima
durabilidade com o seu carácter leve, para além da sua capacidade de resistir à concen-
tração de forças que passam por ele. A capacidade de resistir aos esforços estruturais
que os arquitectos e os engenheiros chamam "momentos". Conhecedor de tudo isto foi
Mies Van der Rohe, que ergueu toda a sua obra com um carácter claramente tectónico.
Assim como também sabia bem o que de irónico tinha a procura da permanência através
de certos elementos, os tectónicos, mais efémeros do que os estereotómicos. Talvez para
confirmar que o que permanece são as ideias e não as formas. Como aconteceria durante
tantos anos com o seu Pavilhão de Barcelona antes de ser reconstruído, e que no entanto
era um factor de aprendizagem contínua para todos, com uma força tão grande como a
dos mais imortais templos gregos. 4

ALUZ
A força da leveza

Escrevi já inúmeras vezes sobre a luz.5 E sempre sugeri que a luz em arquitectura "cons-
trói o tempo" e que a luz é o material capaz de colocar o homem em relação com a arqui-
tectura. Daí a minha insistência em que "Architectura sine luce nulla architectura est". Pois
• f

é nesse sentido, na sua relação com a luz, que os conceitos.de tectónico e estereotómico
adquirem a sua leitura mais clara.
A arquitectura estereotómica busca a luz. Perfura as suas paredes para que, atra-
vessada pelos raios do sol, possa captar a luz no seu interior. As janelas serão aqui
escavações nas paredes para poder levar essa luz ao seu interior. E só se poderão abrir
clarabóias no seu plano superior quando surgir o vidro plano em maiores dimensões.
Só o Panteão, lugar reservado aos deuses, ousa abrir esse orifício superior ao céu aberto.
Os pátios serão então os mecanismos intermédios para poder levar a luz ao interior dos
edifícios, sempre através das janelas abertas nas suas paredes perimetrais verticais.
Em muitas das igrejas do românico, a escavação das janelas nas paredes e a orien-
tação do próprio edifício faziam-se com base num estudo do percurso do sol ao longo do

4
Avaliar o grau de pertença de um edifício ao est t· · · - ·
a arquitectura dos mestres é altament . e~eo_om,co ou ao tec~ómco e de uma grande eficácia conceptual. E assim
peças tectónicas pousadas em pód·iose etxprest~,v~. Nao é toda a arqu1tectura de Mies Van der Rohe um claro exercício de
. es ereo om1cos?
5
Os ingleses têm uma expressão curiosa "Gildin th rn • ·
da criação. Este "dourando a açucena" ' . g e I Y • ~ara mostrar que a Beleza é algo mais que a mera perfeição
criação quando ela é perfeita. Esse alg~ : ; :: r~a; tradução literal, pre~e~de expri_mir que ainda se pode fazer algo mais à
em arquitectura desempenha um claro papel ag· d elez: . A Venu st_a s exigida por V1trúvio. Neste sentido, entendo que a Luz
in° so · re a perfeição conseguida ap~na s cqm a Gravid ade.

30 I PENSAR COM AS MÀOS


ano, de maneira que se sabl~ com exactidão a quantidade e a quaíidade e o momento em
1uz iria entrar em cada espaço.
que a .
E ,se como referimos, o gótico, na sua relação com
· a estrutu ra, procede a um "tour
de torce" para fazer com q~e utn orga~l~mo estereotórntco tenha aparência de tectónico,
na verdade fá-lo também em relação à luz, Abre os seus abau~ados verticais o mais alto
possível e enche-a~ de vidro pa~, permitir que a ruz entre a Jarros naqueles espaços
generosos. A belíssima Sslnte ?hape/leiem P~rls,é um Claro exemplo do que acabamos
de dizer. E depois todo O Barroco, que é ba~l~amente. um ex~rcício·brlfhantfsslmo dessa
busca de luz. · ·, · · .,
Pelo contrário, uma ~rq9itect'ura 'fect,lni~, ~1.Jrá ·o~ada! precisárá1de se proteger da
luz que a inunda. Se com ·'~,:a~o::se\!~h1ha:co~seguidó,chêgar a um delieado esqueleto no 1 i 1 1 1 . .,

limite da expressão mí~i~a, será 9'1f~9h'á'.~e·t.l,~b. verti~ I açrescentado,a servir de media~


' \,,·' '· ' ,, ' \ .. • 1'

dor entre o espaço tnterió,( ~ é{ hiz:,d~ s:o,1Jqb~,1 a~ora.:•ô:enêtie ·compl:~tamente. Reco.rde-se


aqui a esse propósito ·O~eüs,irtJ9far.r~nha~C~US·, q~j,:j~~O.s.qÚ~ 'Mi.e$ Vât:l, der Rohe nunca
1 1 1
1 , \· , , • / \; ' ~, 1 , ' , j l· t , • ,~' i'• , 1, ' ' ' 1 '., ' // • r I , f \l I 1, '

construiria, mas que ··p~~~anece·:P~r~:,:semp.r.é,:.:nas \•t,Q~sa$tment§s::, Uma estrutura pura


~ • 1-1 ; ' ' h 1 1
1 1 1 ' ' ' ,,., ,\ ,', \1 ' ,,\ 1' , \ 'f 1

com finíssimos pilares ~~e s, !\tãó.:,~~~r.~pq.rndo;:,:liÜr:ê§:•'ho'~.:.~'e\Js'cqhtornos' curvos nunca


igualados. E o envidráçárhento ,qu~··.é:i:Li,hi~t ~ài';~,;.t:rã~~pârê:h:ci~ E f 'dújó~ reflexos :atestam a
liberdade formal daq~ela phi1oih:: r ~ ã~il J~ij;J~1g•~,: ;ú+ftiqcÍh,r6(d:ie(i~ í,~a·, luz, algo. q~e ,fará
.·. :' Uir:a~:.;1!,~:\'&~;:w·~i~.·fjg:(,&1fkimr.1m1éira:', ,:~' :etade, a\mais baixa
1
M·,es no seu paradigmáti'ci/ê~~w~::~ \ .M ' / ' ' ,,, ;~~ :· - ~ ' "•',4'1,,!'·'1J\\ 11•, ~ \I. ,, _

do seu envidraçamento s'erá,l rar;r$1ir1did~kg~t~fi~~µ,lt~ µt-~.;i~'.J,éotóhiéa;,'é uma 'arquitéctura


que se defende da l~z,·: po'is'pa~~1
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tãpér:os"seu~ 'Vazios.
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Julgo que nos próximos anos


~st~ m~,ê~nl~IT:1?,. ~$ :~:~~lise:~rqui!~9tónica através das ~te-
gorias do tectónico e do
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