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1. Noções introdutórias
Juízo é o ato de estabelecer uma relação entre duas noções, ou ainda, uma ligação de
noções feitas com consciência e clareza. As relações que estabelecemos entre as noções podem ser
várias: de coexistência, de igualdade, de diferença, de proporção etc.
1.2. Raciocínio
1) O raciocínio dedutivo é aquele no qual se passa do geral ao particular, sendo este uma
consequência de algo naquele contido; exemplo: “Todos os brasileiros são sul-americanos; todos
os paulistas são brasileiros; os paulistas são, pois, sul-americanos.” Importante notar que o
intermediário entre sul-americanos e paulistas, os brasileiros - que inclui os paulistas – está
incluído nos sul-americanos. Parte-se de uma regra e sua premissas para alcançar a conclusão,
como em: “Quando a torneira fica aberta, o chão fica molhado; a torneira ficou aberta; logo, o
chão ficou molhado.” O dedutivo é o raciocínio associado à matemática.
2) O indutivo é o raciocínio tipicamente associados aos cientistas, pelo qual se partindo de casos
particulares alcança-se uma regra geral, indo-se, pois, do conhecimento dos fatos ao das leis que
os regem. A partir da observação de uma série de casos de peças metálicas submetidas a
aumento de temperatura, concluíram os cientistas: “Toda peça metálica submetida a aumento de
temperatura dilatará na proporção do aumento de temperatura”. Outro exemplo: “Todos os
cavalos até hoje observados tinham coração” e daí concluir que “Todos os cavalos que existem
têm coração”. O comumente chamado raciocínio analógico não é uma forma autônoma de
raciocínio, mas uma modalidade de indução imperfeita e com alguma probabilidade de acerto na
medida em que certas propriedades são comparadas com vistas a se extrair alguma conclusão. O
raciocínio analógico é tão mais acurado quanto bem escolhidas as propriedades comparadas.
3) O abdutivo é o raciocínio que faz uso da regra e da conclusão para conjecturar sobre as
premissas. Aproveitando o exemplo dado para o raciocínio dedutivo para aplicar o raciocínio
abdutivo: “Quando a torneira fica aberta, o chão aparece molhado; o chão está molhado, então, a
torneira pode ter ficado aberta.” É um tipo de raciocínio comumente relacionado aos detetives. A
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abdução não estabelece necessariamente a verdade das premissas no caso estudado, mas a
probabilidade delas, pois, uma determinada consequência pode advir de uma série de diferentes
relações de causalidade. No exemplo dado, pode o chão ter ficado molhado por causa de uma
chuva e não por conta da torneira aberta.
1.3. Princípios
1) Princípio da identidade: um ser é sempre idêntico a si mesmo: “S” é “S”; se algo é o que é,
certamente não é coisa diferente do que é;
2) Princípio da não-contradição: é impossível que um ser seja e não seja idêntico a si mesmo ao
mesmo tempo e na mesma relação. É impossível que “S” seja “S” e “não-S”, até porque violaria
o princípio da identidade. Duas proposições são contraditórias se uma desdiz completamente o
que a outra diz; e
3) Princípio do terceiro excluído: dadas duas proposições com o mesmo sujeito e o mesmo
predicado, uma afirmativa e outra negativa, uma delas é necessariamente verdadeira e a outra
necessariamente falsa. “S” é “x” ou “não-x”, não havendo terceira possibilidade. Ou seja, entre o
ser e o não-ser não há estado intermediário.
quantas possíveis e quantas necessárias fossem para melhor resolvê-las. Ou seja, é uma operação
do espírito que parte do mais complexo em direção ao menos complexo, devendo, então, das partes
principais, estudar cada uma das partes em separado, sem omitir nenhuma.
A síntese experimental opera-se sobre fatos e seres concretos e faz-se pela reunião das
partes físicas resultando num todo físico, procedendo do simples ao composto, das causas aos
efeitos, dos princípios às consequências. A união do oxigênio com o hidrogênio produz a água. Já a
síntese racional opera-se sobre fatos ou seres abstratos e é o caminho que o espírito percorre da
condição ao condicionado, do princípio às consequências. Na matemática, por exemplo, a síntese
racional consiste em partir da verdade conhecida – a primeira ideia suposta conhecida – e dela
passar à outra, até chegar-se à conclusão discutida, que fica provada por ser o resultado de
raciocínios estritamente concatenados.
A população pode ser classificada segundo critérios bastante variados: cor de cabelos,
peso, idade, religião, padrão econômico, etc. dependendo do propósito específico a ser suprido. O
recenseamento é feito pelos países periodicamente e visa levantar dados para avaliar quantitativa e
qualitativamente a população e os vários parâmetros pesquisados servem de base para classificar as
pessoas e orientam a adoção das políticas públicas.
1) A enumeração de todas as partes deve ser igual ao todo. Os animais podem ser divididos em dois
subconjuntos: vertebrados e invertebrados.
2) O critério eleito não deve admitir duplicidade, ou seja, a divisão deve ser irredutível. Assim, não
cabe dividir os animais em vertebrados, invertebrados e mamíferos porque mamíferos é também
subconjunto de vertebrados.
3) O critério deve ser único, ou seja, fundado no mesmo princípio. Não se recomenda, por
exemplo, dividir os seres humanos em habitantes do hemisfério sul, habitantes do hemisfério
norte e analfabetos contemplando dois critérios: local de habitação e nível de alfabetização.
4) Observar, tanto possível, a coerência da ordenação hierárquica. Existe uma estrutura sistêmica
para auxiliar na escolha de critérios coerentes. Os seres vivos, por exemplo, não devem ser
divididos em vegetais, racionais e irracionais.
5) A divisão deve ser simples e clara porque a repartição excessiva conduz à confusão e dificuldade
de entendimento. Já foi dito que a simplicidade é a maior sofisticação que existe.
1
Exemplo de classificação no Código de Trânsito Brasileiro, Lei 9.503/97:
“Art. 96. Os veículos classificam-se em:
I - quanto à tração: a) automotor; b) elétrico; c) de propulsão humana; d) de tração animal; e) reboque ou semi-reboque;
II - quanto à espécie: a) de passageiros: 1 - bicicleta; 2 - ciclomotor; 3 - motoneta; 4 - motocicleta; 5 - triciclo; 6 - quadriciclo; 7 - automóvel; 8 -
microônibus; 9 - ônibus; 10 - bonde; 11 - reboque ou semi-reboque; 12 - charrete; b) de carga: 1 - motoneta; 2 - motocicleta; 3 - triciclo; 4 -
quadriciclo; 5 - caminhonete; 6 - caminhão; 7 - reboque ou semi-reboque; 8 - carroça; 9 - carro-de-mão; c) misto: 1 - camioneta; 2 - utilitário; 3 -
outros; d) de competição; e) de tração: 1 - caminhão-trator; 2 - trator de rodas; 3 - trator de esteiras; 4 - trator misto; f) especial; g) de coleção;
III - quanto à categoria: a) oficial; b) de representação diplomática, de repartições consulares de carreira ou organismos internacionais acreditados
junto ao Governo brasileiro; c) particular; d) de aluguel; e) de aprendizagem.” (negritos não originais)
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Existe um critério operacional que facilita muito realizar uma classificação consistente
em dividir o objeto dicotomicamente, em sua expressão positiva e negativa, classes que são
complementares em relação à classe dividenda. Assim, por exemplo: o mundo se divide em
compostos orgânicos e inorgânicos; os orgânicos dividem-se em seres vivos e seres não vivos; os
seres vivos dividem-se em animais e não animais; os animais em vertebrados e invertebrados; os
vertebrados em mamíferos e não mamíferos; os mamíferos são racionais e irracionais.
1.4.3. Definição
A compreensão e a extensão são relacionadas por uma regra: quanto maior a extensão
de um conceito, tanto menor a compreensão e, reciprocamente, quanto maior a compreensão, tanto
menor a extensão. Desta forma de distinguir os termos advém uma maneira clássica de dividi-los
em três tipos: 1) gênero: extensão maior e compreensão menor. Exemplo: animal; 2) espécie:
extensão média e compreensão média. Exemplo: homem; 3) indivíduo: extensão menor e
compreensão maior. Exemplo: Aristóteles.
1) A definição deve convir a todo objeto definido2 – se a definição consiste em desenvolver uma
mesma compreensão, deve aplicar-se a todos os elementos do conjunto definido. Se a definição
deixasse de fora alguma parte da ideia a definir não serviria para delimitá-la. Definir, por
exemplo, maçã como sendo um objeto vermelho e redondo promove a exclusão das maçãs
verdes.
2
“Definitio conveniat omni definite.”
3
“Conveniat soli.”
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4) A definição deve evitar a tautologia, ou seja, não se devem aplicar na definição os termos por
meio dos quais a ideia a ser definida está sendo designada. Se a definição for tautológica só
servirá para quem já conhece o termo definido. Quando se diz “o círculo é o espaço circular
fechado”, quem não sabe o que é “círculo” não sabe o que seria “espaço circular”.
5) Evitar definição circular. A definição circular acontece quando se parte de uma definição e se
usam os termos aplicados na definição para retornar ao objeto explicado. Quando se define, por
exemplo, “consciência é o sentimento íntimo dos fatos psíquicos”, não se pode continuar e
afirmar, sob pena da circularidade, que, por sua vez, “os fatos psíquicos são aqueles revelados
pela consciência”.
6) Podendo ser positiva, a definição não deve ser negativa. A definição deve descrever o que é o
objeto definido e não o que o objeto definido não é. A definição negativa impõe saber sobre o
conjunto de todos os objetos – conjunto universo – para, a partir dele, destacar o que se pretende
definir.
As definições, assim como, em geral, as palavras bem escolhidas, têm imensa força
persuasiva e desempenham um papel relevante na argumentação, obrigando permanente atenção
não só para a definição escolhida, para os termos usados, mas também para a aplicação deles, de
modo a evitar que haja predisposição da argumentação favoravelmente ao oponente – ou
desfavoravelmente à nossa posição – desde o início do debate. Assim, a própria definição do termo
pode e deve ser preliminarmente questionada ou, no limite, rejeitada se prejudicial a alguma das
partes ou não for razoável em si mesma.
Existem propostas de definições com caráter jocoso e que não servem para o propósito
básico de identificar o objeto definido como, por exemplo, a de covarde proporcionada por
Ambrose Bierce: “Covarde: aquele que, em uma emergência perigosa, pensa com as
pernas”, pois, só emprestando às pernas cérebro poderia se justificar a alusão a
pensamento advindo delas. Servem para distrair a atenção da plateia, desviando-a do
debate, na medida em que tira a seriedade dele.
Pode ser também a hipótese de a definição ser razoável tomada em si mesma, mas
montada meticulosamente para, quando aplicada ao lado oposto para tratar do caso em questão, não
manter aquela qualidade. Indagado sobre a linha doutrinária de seu partido, um político paulistano
explicou: “Nem de direita, nem de centro, nem de esquerda.”5. Ora, no afã de tentar angariar
eleitores, pode até ser bom para um partido político fazer incluir no seu programa tudo que há de
positivo da esquerda, direita e centro, porém, o eleitorado tem de ter noção exata do
4
Exemplo: “Homens maus não têm canções. Como é que os russos têm músicas?” (Friedrich Nietzsche).
5
Gilberto Kassab, ex-prefeito de São Paulo, in As Melhores Frases em Veja, organizador: Julio Cesar de Barros, São Paulo: Editora Saraiva, 2012,
p. 223.
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2. Argumento e proposição
2.1.1. Premissas
1) Os fatos alegados não são fatos; ou as provas oferecidas não existem, não podem ser
recuperadas, estão distantes no espaço ou no tempo.
2) Mesmo sendo a premissa verdadeira não tem uma relação adequada com a conclusão (non
sequitur, no sentido amplo); e
3) Premissas paradoxais, sobre as quais é impossível decidir se são verdadeiras ou falsas, tais
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“Facts first. Facts are facts. They aren’t colored by emotion or bias. They are indisputable. There is no alternative to a fact. Facts explain things.
What they are, how they happened. Facts are not interpretations. Once facts are established, opinions can be formed. And while opinions matter,
they don’t change the facts.” (https://www.cnncreativemarketing.com/project/cnn_factsfirst/ pesquisado em 10/03/2020) Tradução livre: “Fatos
em primeiro lugar. Fatos são fatos. Eles não são coloridos por emoções ou tendências. Eles são indiscutíveis. Não há alternativa para um fato. Fatos
explicam coisas. O que são, como aconteceram. Fatos não são interpretações. Uma os fatos estabelecidos, opiniões podem ser formadas. E, embora
as opiniões importem, elas não mudam os fatos.”
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como: “Esta frase é falsa”; “A única maneira de livrar-se de tentação é cedendo a ela ... Eu posso
resistir a tudo, menos à tentação”.
2.1.1.1. Inferências
Destaques:
2) Num argumento as provas são dadas em sentenças – as premissas – ao passo que numa
inferência, quem infere é quem deve ter a prova.
3) Realizar uma inferência é uma atividade psicológica, é chegar a certas crenças e opiniões com
sustentação em outras.
4) Algumas inferências são logicamente corretas, outras não. Então, como o enunciado da
inferência é um argumento, pode ser submetido à análise lógica.
5) Inferências são frequentemente indicadas pelos vocábulos “logo”, “implica”, dentre outros, mas
são como passos em direção ao que o argumentador tem como objetivo atingir.
2.1.2. Conclusão
A conclusão é uma proposição, defendida com base nas outras, e é sinalizada pelos
vocábulos “portanto”, “logo”, “consequentemente”, “como” ou “porque”.
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No plano quantitativo, o sujeito pode ser tomado ou quando tomado em toda a sua
extensão, entendida como o conjunto de elementos – indivíduos – aos quais o conceito se amolda, a
proposição pode ser: universal se do sujeito é tomado segundo toda a extensão: “Todas as ciências
são úteis”; ou particular se o sujeito é tomado segundo uma parte de sua extensão: “Alguns alunos
são estudiosos”. Ou seja, as proposições têm uma de duas quantidades, universal ou particular.
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“Pode-se dizer que uma solução [preparar um processo, antes de condenar ou absolver] para essa questão é apresentada por uma teoria da
verdade e da certeza, e que não existe nenhuma grande vantagem em tomar os problemas pelo avesso, em vez de abordá-los de frente. Todavia,
quando se trata da questão da verdade e do erro – assim como quando se trata do bem e do mal – nem todas as obscuridades são eliminadas
quando se considera o aspecto positivo do problema: é necessário encarar também o aspecto negativo. O erro não se opõe à verdade como o
esquecimento à lembrança ou a ignorância ao conhecimento. O esquecimento nada mais é que a ausência de lembrança: ele é explicado quando
se sabe por que as causas que produzem a lembrança deixaram de agir. Porém, o erro não é só a ausência da verdade, não é só uma privação ou
uma negação. Devemos tratar de saber, pelo menos, se não contém nada de positivo. Se for positivo, é preciso explicar como essa característica
pode ser harmonizada a com a certeza. Existe, portanto, um problema do erro – intimamente unido, é verdade, ao da certeza (pois seria uma
tentativa bizarra procurar conhecer o que é o erro sem saber o que é a verdade), mas distinto desse problema, assim como a refutação de uma
antítese difere da exposição de uma tese.” (BROCHARD, Victor. Sobre o erro. Tradução de Regina Schopke. Rio de Janeiro: Contraponto,
2008. P. 10.
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Código Civil
Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por
pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.
Art. 139. O erro é substancial quando:
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A proposição “Todos os S são P” deve ser entendida como: “Se houver S, então, será
P”. Como será mais bem explicado à frente, sabe-se que esta afirmação só é falsa quando S for
verdadeiro e P falso. Logo, mesmo que não haja elementos na classe S a sentença será verdadeira.
Ou seja, será tomada como verdadeira uma proposição versando uma classe que não tenha
exemplares. Exemplos: “Os transgressores serão rigorosamente punidos” é verdadeira mesmo que
não tenha havido transgressor algum; “O centauro é uma criatura com cabeça, braços e dorso de ser
humano com corpo e pernas de cavalo” é tida por verdadeira mesmo sendo a figura mitológica
centauro uma criatura que não existe concretamente no mundo.
Já as proposições dos tipos “Alguns S são P” e “Alguns S são não-P” só podem ser
verdadeiras na condição de haver pelos menos um exemplar da classe S, ou seja, se o conjunto ao
qual S pertença não seja vazio. Assim, a afirmação “Algum transgressor foi punido” será
verdadeira só se a classe de transgressores não for conjunto vazio; por outro lado, a afirmação
“Algum centauro é criatura mitológica” será tida por falsa porque a classe dos centauros é conjunto
vazio por inexistência – até hoje – da prova da existência física de um centauro que seja.
I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais;
II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo
relevante;
III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.
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Numa proposição categórica, ou seja, nas quais em que ocorre relação de inclusão ou
exclusão, completa ou parcial, entre duas classes, diz-se que um determinado termo – sujeito ou
predicado – está distribuído quando está sendo afirmada simultaneamente alguma coisa sobre cada
um e todos os elementos do conjunto designado pelo termo. É muito importante observar que é
muito comum o caso de se atribuir algumas propriedades a uma classe – como coleção – que
deixam de sê-lo ao nos referirmos aos seus membros individualmente; e, vice-versa, algumas coisas
verdadeiras acerca dos membros de uma classe, quando tomados individualmente, deixam de ser
verdadeiras quando aplicadas à classe, tomada como conjunto.
Por outro lado, diz-se que o termo está não-distribuído num enunciado categórico
quando seletivamente se refere a alguns elementos do conjunto designado pelo termo, sem que se
afirme algo a respeito de todos os membros do conjunto.
4) Particular negativa – chamada tipo O – sujeito particular e forma negativa. A extensão do sujeito
é particular – dita não-distribuída e a do predicado é universal – dita distribuída. Uma parte da
extensão do sujeito está incluída na do predicado: “Algum homem não é sábio”; “Algum
triângulo não é isósceles”. A proposição particular negativa declara que pelo menos um dos
membros do termo sujeito é não é membro do termo predicado.
A proposição tipo A – “As baleias são mamíferos”, por exemplo – afirma que toda e
qualquer baleia está contida o conjunto dos mamíferos. Logo, o sujeito – baleia – está distribuído.
De acordo com a afirmação, o conjunto das baleias está totalmente contido no conjunto dos
mamíferos. Ou seja, se é baleia – qualquer baleia – é mamífero e não há baleia que não seja
mamífero. Entretanto, nada além é afirmado acerca dos outros elementos – e nem se há outros – do
conjunto que compreende todos os “mamíferos” (cavalos, bois, cabras, zebras, leões, carneiros,
morcegos, hienas etc.), motivo pelo qual o predicado – mamíferos – é dito não-distribuído. Na parte
escura do diagrama abaixo não pode haver elemento, pois, tal aconteceria somente se houvesse
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A proposição tipo E – “Nenhuma baleia é peixe”, por exemplo – diz que toda e
qualquer baleia é não-peixe e também que todo e qualquer peixe é não-baleia. Coletivamente,
excluídas ficam totalmente as classes das baleias e dos peixes uma da outra. Logo, o enunciado tem
os dois termos – sujeito e predicado – distribuídos. A parte escura do diagrama abaixo quer dizer
que os conjuntos das baleias e dos peixes são disjuntos, ou seja, não têm elemento em comum.
A proposição tipo I – “Alguns diamantes são joias”, por exemplo – nada declara a
respeito de todo e qualquer diamante e tampouco informa sobre toda e qualquer joia. Assim, ao não
ir além de dizer que as classes dos diamantes e a classe das joias têm elementos em comum, resta
que os dois termos – sujeito e predicado – são não-distribuídos. O máximo que se pode concluir é
que, tomadas coletivamente, a classe dos diamantes e das joias coincidem parcialmente. No
diagrama abaixo, seja D o conjunto de todos os diamantes, D1 o subconjunto do conjunto dos
“diamantes” que engloba os “diamantes que não são joias” (gênero cujo diamante industrial é
espécie) e seja D2 o subconjunto do conjunto dos “diamantes” que compreende “Toda e qualquer
joia, exceto os diamantes”. Pode-se constatar que D2 está compreendido simultaneamente nos
conjuntos dos “diamantes” e no das “joias”.
A verificação dos enunciados tipo O – “Alguns diamantes não são joias”, por exemplo
– envolve algum exercício. Primeiramente, tomados os conjuntos, está dito que a classe dos
diamantes não está totalmente incluída – e nem excluída – na classe das joias. Então, é trivial
constatar que nada é afirmado a respeito de todo e qualquer diamante, daí concluindo-se que o
sujeito – “diamante” – é não-distribuído. Considere-se agora o predicado. Tomando-se o enunciado
equivalente “há pelo menos um diamante que não é joia” que, mesmo sem informar qual seja,
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assegura a existência de um diamante que não é joia, que passará a ser chamado de “diamante
industrial”. Nosso enunciado original pode ser tomado como “toda e qualquer joia é diferente do
‘diamante industrial’”. Reformulada, então, a afirmação original, verifica-se que pode ser dito algo
sobre toda e qualquer joia: “esta joia não é o ‘diamante industrial’”, o que implica no predicado
“joia” ser distribuído. No diagrama abaixo, seja d1 o “diamante industrial”, pertencente ao
subconjunto do conjunto dos “diamantes” na parte que não coincide com o conjunto das “joias”
(lembrar que o conjunto dos “diamantes” está fracionado em dois subconjuntos: “diamantes joias” e
“diamantes que não são joias”); seja J o conjunto de “todas as joias”, consistindo de dois
subconjuntos: J1 o subconjunto “joias”, que engloba os “as joias diamantes” e J2 o subconjunto
que contém “toda e qualquer joia, exceto os diamantes”. Assim, pode-se concluir algo a respeito de
toda e qualquer joia: que não é d1, demonstrando que o predicado é distribuído.
Para resumir, as classificações feitas até agora permitem produzir a tabela a seguir:
Existe uma fórmula para memorizar sobre sujeitos e predicados distribuídos “Um
Sapato Não Presta”:
- Universais - Sujeitos distribuídos;
- Negativas - Predicados distribuídos;
- Todos os demais – sujeitos e predicados – são não-distribuídos
Existe uma terminologia para as proposições que costuma ser utilizada para designar
relações entre proposições que podem trazer falácias embutidas. O quadro das oposições está
retratado a seguir:
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Contradição é o tipo mais forte das oposições porque é uma proposição é a pura
negação da outra. Contraditórias são duas proposições que, quando tendo o mesmo sujeito e o
mesmo predicado, considerada uma em relação à outra:
1) Uma delas é universal afirmativa – Tipo A (“Todo S é P”) – e a outra é particular negativa –
Tipo O (“Algum S não é P”):
2) Uma é universal negativa – Tipo E (“Nenhum S é P”) – e a outra particular afirmativa – Tipo I
(“Algum S é P”):
É uma forma válida para argumentar, muito importante e eficaz para refutar teses
duvidosas. Chama-se subdedução – desde que uma forma válida – ao argumento que, a partir da
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1) Assumir como verdadeira a negação da proposição a ser demonstrada. Ou seja, supor que p
seja falsa, vale dizer admitir nãp-p como verdadeira;
2) Com base nesta suposição – não-p verdadeira – e usando um argumento válido deduzir uma
conclusão sabidamente falsa;
3) Então, se usando a negação da proposição for alcançado um absurdo – uma contradição: uma
proposição que não pode ser verdadeira – fica demonstrado indiretamente que a proposição
original – p – deve ser verdadeira e segue-se que a suposição feita de que não-p era verdadeira
foi falsa;
4) Logo, como não-p é falsa, p deve ser verdadeira. CQD.9
Exemplo: Premissa: Um número racional é aquele que pode ser expresso como a razão
de dois inteiros; Conclusão: Então, não existe número racional cujo quadrado seja dois.
Demonstração por meio de “reductio ad absurdum”:
a) Suponha-se haver um número racional cujo quadrado seja dois. Então, 2 = (a/b)2, segue-se que
a2 = 2b2, onde a e b são primos entre si;
b) Então, a2 é par porque é igual ao dobro de b2;
c) O número a tem de ser par uma vez que o quadrado de um número par é sempre par porque (2n)2
= 4n2 = 2(2 n2). O número a não pode ser ímpar uma vez que o quadrado de um número ímpar é
sempre ímpar porque (2n+1)2 = 4n2 + 4n + 1 = 4(n2+n) +1; como o primeiro termo – 4(n2+n) – é
par, qualquer número par adicionado de 1 é ímpar;
d) Como a é par, podemos escrever a = 2c e a2=4c2;
e) Igualmente, b é par porque a2 = 2b2 = 4c2, pois: b2 = 2c2 e usando o mesmo raciocínio feito
acima;
f) Como a e b são pares, restou contraditada a suposição que a/b era um número racional onde a e b
fossem primos entre si.
Contrárias são duas proposições que, tendo o mesmo sujeito e o mesmo predicado, uma
delas é universal afirmativa – Tipo A (“Todo S é P”) e a outra é universal negativa – Tipo E
(“Nenhum S é P”). Na oposição entre proposições por contrariedade, uma proposição nega o que a
outra afirma e o que outra menos extensa afirmaria. É menos negativa que a oposição por
contradição porque ao passar de uma à sua contrária o sujeito ainda continua sendo tomado
universalmente e justamente por isso elas podem ter a falsidade concomitante em comum.
A regra é: duas proposições contrárias não podem ser verdadeiras ao mesmo tempo,
entretanto podem ser concomitantemente falsas.
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Como se queria demonstrar, tradução da expressão latina “Quod erat demonstrandum”, às vezes referida como QED.
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Às vezes somos tentados a pensar que, dada uma afirmativa verdadeira – ou falsa – sua
contrária é falsa – ou verdadeira. Nem sempre. É de se prestar enorme atenção a afirmativas que se
referem a si mesmas. Analisem-se as seguintes afirmativas contrárias e ambas falsas: “Esta frase
tem seis palavras” – falsa porque tem cinco palavras – e “Esta frase não tem seis palavras” – falso
de novo porque tem seis palavras.
Proposições contrárias são, então, sempre não consistentes porque se tomadas umas em
relação às outras não têm como serem verdadeiras ao mesmo tempo e no mesmo contexto.
A regra é: duas proposições subcontrárias não podem ser falsas ao mesmo tempo,
entretanto podem ser concomitantemente verdadeiras. Duas proposições subcontrárias, por não
obedecerem a regras fixas quanto a serem verdadeiras ao mesmo tempo, podem ser, então,
consistentes ou não consistentes.
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MARITAIN, Jacques. Elementos de Filosofia - II - A Ordem dos Conceitos - Lógica Menor (Lógica Formal). 8ª edição. Rio de Janeiro: Livraria
AGIR Editora, 1977. P. 156.
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Várias regras:
2) Se a afirmação tipo A (subalternante) é falsa, então, a afirmação tipo I (subalterna) pode ser
verdadeira ou falsa;
6) Se a afirmação tipo E (subalternante) é falsa, então, a afirmação tipo O poderá ser verdadeira ou
falsa;
Conclusão: duas proposições subalternas por não obedecerem a regras fixas quanto a
serem verdadeiras ao mesmo tempo podem ser, então, consistentes ou não consistentes.
Por outro lado, mesmo tratando-se de um argumento válido, se as premissas não forem
todas verdadeiras, nem há que se falar da conclusão dessa forma alcançada. Os lógicos costumam,
então, falar em argumento correto, como sendo:
- Em primeiro lugar, o argumento utilizado no debate deve ser válido (uma forma de compor de
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tal maneira que seja impossível haver premissas verdadeiras e conclusão falsa) e
- Em segundo lugar, todas as suas premissas verdadeiras.
Como visto, não há como usar uma forma de argumento válida e partir de premissas
verdadeiras, prosseguir por via de um processo de inferências dedutivas corretas e alcançar uma
conclusão falsa.
Vejamos o mesmo argumento – forma que mais adiante veremos que é válida – com
premissas verdadeiras levando a uma conclusão verdadeira:
Então, para estudar a validade e invalidade dos argumentos serão eles classificados em
função da forma em que apresentadas as premissas e a conclusão. Assim, ignorando-se o conteúdo
das premissas e da conclusão, ou seja, sem considerar a verdade ou falsidade delas isoladamente,
por meio da análise da relação entre elas pode-se determinar se o argumento que as contém é válido
ou inválido.
Estes esquemas não são argumentos, mas são formas que se convertem em argumentos
se as três letras (F, G e H num caso e S, M e P no outro) forem substituídas por objetos, tais como,
por cães, gatos, diamantes etc. É muito importante notar no exemplo de esquema válido que, se
todos os G são H, e se é verdade que todos os F são G, então deve ser necessariamente verdade que
todos os F são H.
Em conclusão:
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1) A verdade da proposição tem a ver com ela tomada isoladamente refletir objetiva e
congruentemente o caso tratado com a realidade fática. Então, é da máxima importância que
cada um traga as provas fortes de suas alegações, para que sejam reputadas verdadeiras, ou seja,
desincumbir-se do ônus da prova que lhe compete.
Existe uma regra importante: nada impede que o oponente reformule seu argumento.
Vejamos o argumento abaixo. É um argumento não-válido, embora saibamos que as três premissas
sejam verdadeiras.
Vamos reformulá-lo usando uma forma válida para alcançar a mesma conclusão,
tornando-o correto:
3. Descoberta e justificação
3.1. Descoberta
A descoberta está ligada à questão fundamental: “De que modo foi concebido?” Todas
as circunstâncias pertinentes à concepção estão dentro do contexto de descoberta. A descoberta é
um processo psicológico.
Newton viu uma maçã cair de uma árvore e teve a iluminada ideia de que objetos caem
ao solo por atração gravitacional, donde advém que as órbitas dos planetas, as marés, dentre outros,
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3.2. Justificação
A justificação, por sua vez, está ligada à questão: “Que razões temos para aceitá-lo
como verdadeiro?” Todos os assuntos relacionados a esta questão cabem ao contexto da
justificação. A justificação de uma proposição é um argumento, englobando dois aspectos: 1)
verdade das premissas e 2) correção lógica.
Mostrar que uma justificação não é adequada consiste em revelar alguma fraqueza em
um desses dois aspectos, porque uma boa justificação depende de elementos de prova capazes de
dar suporte ela, apresentados de uma forma válida. Isto faz por impor a quem apresenta o
argumento prover as necessárias comprovações sob pena de vir a sofrer prejuízos na credibilidade
do que defende.
Tachar uma justificação de não adequada sob um ou outro desses dois aspectos não
equivale a simplesmente afirmar ou sugerir que ela seja inapelavelmente falsa, mas abala a verdade
das premissas ou a correção lógica do argumento que a apresenta. Assim sendo, corrói a
credibilidade da argumentação sem implicar na definitiva impossibilidade da elaboração de outra
justificação viável, desta vez suportada em boas e sólidas razões, capazes de levar à mesma
conclusão.
Para uma teoria científica ser aceita como provada, as experiências comprovadoras
podem ser reproduzidas e suas previsões devem funcionar em contextos diferentes e mediante
linhas de experimentações diversas. Por isso, a comunidade científica, de forma geral, tem como
método o questionamento sistemático das pesquisas e experiências usadas para dar suporte a
alguma teoria. Só para lembrar um exemplo emblemático: o último teorema de Fermat, que foi
conjecturado em 1637 só foi definitivamente solucionado em 1995, depois 358 anos de várias
demonstrações que não suportaram os questionamentos da comunidade dos matemáticos.
Num debate, cada um que faça a afirmação primária positiva tem o ônus de trazer as
respectivas provas, ou seja, quem alega tem de provar. Pode ser que – e isto é comum – que as
alegações de uma das partes sejam questionadas de maneira que o ônus da prova se inverta. São
casos em que as ponderações do outro participante são fracas, mas têm um conteúdo de
probabilidade que, se demonstrado, pode afastar cabalmente o primeiro argumento apresentado.
Assim, a quem fez a argumentação fraca é atribuído o ônus de prová-la. Nos debates
controvertidos, é muito comum, ao invés de provar que o argumento da parte contrária é não
aceitável, incoerente ou mesmo falso, mostrar que há margem para dúvidas razoáveis ou não há
suficiente sustentação, fazendo com que o ônus da prova sofra inversões. No trajeto de tentar
converter a outra parte para sua conclusão, o argumentador esforça-se por prová-la, oferecendo
provas.
Há dois tipos de provas que podem ser usados por quem alega desincumbir o ônus que
pesa sobre ele: a prova interna e a externa. Por prova interna, entende-se aquela inferida no curso
do diálogo a partir do que a outra parte admite. A prova externa acarreta a introdução de fatos
novos no diálogo por meio de consulta a opinião de experts, dados científicos ou fontes
especializadas.
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A lei processual civil reparte o ônus da prova da seguinte forma: ao autor da afirmação
quanto aos fatos constitutivos de seu direito e ao réu quanto à existência de fato impeditivo,
modificativo ou extintivo do direito do autor. Daí decorre um pormenor importante, quem alega em
oposição algum fato articulado para destruir situação já configurada pelo ex adverso, atrai para si o
ônus de prová-lo. Assim, se alguém exibe um título extrajudicial, por exemplo, e demanda pelo
pagamento e o suposto devedor alega não dever por já haver pagado, tem o ônus de provar que
pagou, que é um fato positivo.
Há casos em que o objetivo do diálogo deixa clara qual a conclusão a ser perseguida
por cada argumentador. Num julgamento criminal, a acusação tem que positivamente provar a
culpa do réu além de dúvida razoável e à defesa cabe rebater a argumentação da acusação,
buscando fazer concluir que as razões apontadas não são suficientes para provar a culpa do réu, ou
seja, que o argumento da outra parte é fraco ou não é suficientemente forte para condenar. Assim,
mesmo sem refutar vigorosamente a tese da acusação – estabelecer ser ela definitivamente falsa –
mas desbastando-a ao ponto de demonstrar haver margem razoável de dúvida (desacreditando as
testemunhas da acusação, introduzindo a possibilidade de algum outro suspeito, apontando
inconsistências nas provas da acusação, dentre outras), o advogado de defesa pode fazer por
absolver seu constituinte.
11
Lei 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
[...]
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do
Juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência;
12
Lei 13.105, de 16 de março de 2015 - Código de Processo Civil
Art. 373. O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
§ 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o
encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo
diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi
atribuído.
(omissis)
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“Dizem que a casa da praia é mal-assombrada. As coisas lá são diabólicas à noite. Você
é corajoso e está duvidando, passe a noite lá para provar que não é”. Casos deste tipo envolvem
duas peculiaridades: a primeira é a inversão do ônus da prova e outro é que tal inversão acontece
acerca de fato negativo absoluto, qual seja provar que a casa não é mal-assombrada. E muito
cuidado deve ser tomado com fato negativo absoluto porque constitui o complemento para o
conjunto universo dos fatos positivos, a rigor um conjunto infinito. Para exemplificar provar que
maçã não é legume impõe compará-la com todos os tipos de legumes para, só então, excluí-la da
classe dos legumes. Se o fato positivo “a casa da praia é mal-assombrada” está em debate quem
deve prová-lo é a parte que o afirmou. A tentativa de promover a transferência ilícita do ônus de
provar que “não é mal-assombrada” está sendo encaminhada em desfavor de quem deveria ser o
destinatário da prova positiva e, ademais, não é ‘passando por lá’ uma prova aceitável de que não é
mal-assombrada a casa – fato negativo.
O ser humano parece ter dentro de si um mecanismo que tende a procurar confirmação
da hipótese ao invés de negá-la. Em princípio, deve-se ver a tese como algo a ser desafiado e tentar
isentamente buscar evidências confirmadoras tanto quanto evidências não confirmadoras.
Como exemplo, sejam cartas com vogais ou consoantes escritas de um lado e um lado e
nos versos tenham números escritos, que podem ser pares ou ímpares. Então, suponham-se as
seguintes cartas sobre a mesa:
Normalmente, as pessoas apontam que as cartas com A e 2 devem ser viradas. Não são.
As cartas que devem ser viradas são as que têm escritos A e 1. A hipótese que governa a solução do
problema é carta com vogal escrita em qualquer dos lados. Preste-se atenção que nada foi dito
acerca da hipótese de haver consoante escrita em qualquer dos lados de qualquer das cartas, logo,
carta com consoante num lado pode ter número par ou ímpar no anverso sem invalidar a hipótese.
Assim, é inútil, para a finalidade de confirmar a afirmação, virar carta com o Z, porque se houver
escrito no verso qualquer número, seja par ou ímpar, não invalidará a hipótese sendo testada.
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Igualmente, a carta em que está escrito o 2 não precisa ser virada porque havendo vogal ou
consoante no anverso não invalidará a hipótese. Sobram duas cartas: A e 1. A carta com A escrito
tem de ser virada porque se houver no verso um número ímpar escrito ficará provado ser falsa a
afirmação que está sendo testada. Igualmente quanto à carta com 1 escrito, porque se houver vogal
escrita no verso provará ser falsa a afirmação.
Esta falácia é comumente praticada para economizar esforço, pois, pode ser muito
menos árduo desfechar ataque à causa ou origem de um argumento do que se dar ao trabalho de
contrapor-se à substância do que se discute. O argumento falacioso pode persuadir através de um
processo psicológico de transferir uma atitude emocional de desaprovação em relação a uma pessoa
ou grupo de pessoas – nazistas, comunistas, capitalistas, imperialistas – convertendo-a em
desacordo para com o que está sendo dito ou sustentado. A conexão formada, sendo de índole
exclusivamente psicológica, não obedece à lógica e nem é substitutivo de provas. Pode, então,
acontecer que, naquele cenário, o pior canalha do mundo esteja dizendo a verdade e apresentando
comprovações congruentes.
Os nazistas condenaram a teoria da relatividade porque Einstein, seu autor, era judeu.
De fato, muito embora Einstein fosse judeu, suas origens nacionais ou religiosas nada interferiram
no contexto da descoberta da teoria da relatividade. A política nazista, ao dar relevo à origem do
descobridor, algo totalmente independente do contexto da justificação de uma teoria no campo da
física, para repudiar a teoria da relatividade deu exemplo do cometimento de falácia genética.
falsidade da conclusão, caso em que o argumento cobra uma premissa adicional que enuncie esta
correlação objetiva. Por exemplo, a anemia falciforme, doença hereditária caracterizada pela
alteração dos glóbulos vermelhos, tornando-os parecidos com uma foice, é mais comum em pessoas
da raça negra. Se é assim, esta correlação objetiva entre pessoas da raça negra e o evento anemia
falciforme não pode ser deixada à margem, sob pena de a pesquisa sobre a doença ficar
irremediavelmente comprometida, pois, privada de um detalhe fundamental.
Há tempos, nos idos da década de 80, foi bastante difundida a crença, que se mostrou
cientificamente incorreta, de que a AIDS tinha relação com homossexualismo. Esta crença de que a
doença estava relacionada com a homossexualidade, típico exemplo de falácia genética, gerou um
preconceito com reflexos negativos até os dias de hoje.
13
CF/88
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
(omissis)
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
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Dedutivos Indutivos
I Se todas as premissas são verdadeiras, a Se todas as premissas são verdadeiras, a
conclusão deve ser verdadeira. conclusão é provavelmente verdadeira, mas não
necessariamente verdadeira.
II Toda informação ou conteúdo na A conclusão contém informação não presente,
conclusão já estava contida nas premissas, mesmo implicitamente nas premissas.
pelo menos implicitamente.
5. Argumentos dedutivos
Em linhas gerais, o argumento dedutivo é uma forma de partir de verdade mais geral e
chegar a uma verdade menos geral ou singular.
O silogismo foi definido por Aristóteles do seguinte modo: “O Silogismo é uma série
de palavras em que, sendo admitidas certas coisas, delas resultará necessariamente alguma outra,
pela simples razão de se terem admitido aquelas.”14
Se o contexto fizer variar a verdade ou falsidade, a proposição não pode ser classificada
como categórica. Para ilustrar, ainda que seja sobre guerrear, vale citar Sun Tzu15: “A ordem e a
desordem dependem da organização; a coragem e a covardia, das circunstâncias; a força e a
fraqueza, das disposições. Quando as tropas ocupam uma situação favorável, o covarde torna-se
bravo. Se estão perdidas, o bravo vira covarde. Na arte da guerra não existem regras fixas. Apenas
podem ser talhadas segundo as circunstâncias.” Ou seja, se for o caso do uso de enunciado não
categórico, atenção especial deve ser dada acerca da necessidade de provar que, naquele contexto, é
verdadeiro ou falso, bem como, explicitar que todas as conclusões que forem extraídas valem
somente naquele contexto específico. Alterado o contexto, nova demonstração porque de
14
L. Liard, Lógica, p. 42
15
TZU, Sun. A Arte da Guerra. Portugal: Publicações Europa América Lda. s/d. Tradução de Ricardo Iglésias da versão inglesa: The art of War. P.
74.
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Resumindo:
1) Premissa maior: termo médio – M – e termo maior – P, mas não necessariamente nesta ordem;
2) Premissa menor: termo médio – M – e termo menor – S, mas não necessariamente nesta ordem;
3) Conclusão: termo menor – S – e termo maior – P –, nesta ordem;
4) A ordem habitual de apresentar o silogismo categórico é: primeiro se formula a premissa maior e
em segundo lugar vem a formulação da premissa menor e, por fim, a conclusão.
Atenção: premissa maior e premissa menor não são definidas pela posição em que
aparecem no silogismo categórico. O conhecimento das formas válidas de silogismo categórico é
de extrema importância para determinar qual das proposições é a conclusão de um argumento
quando não houver nenhuma palavra indicadora explícita (logo, então, etc.). Logo, quando há um
conjunto de proposições consistente com um argumento categórico e nenhuma das proposições é
evidentemente a conclusão, deve-se escolher como conclusão aquela proposição que torna o
argumento válido, o que é conhecido como “princípio da caridade”.
Os escolásticos formularam oito regras para verificar a validade dos silogismos (L.
Liard, Lógica, p. 45):
1) Terá o silogismo três termos, o médio, o grande e o pequeno; “Terminus esto triplex, medius,
majorque, minorque”;
2) A conclusão nunca deve conter o termo médio; “Nequaquam medium capiat conclusio faz est”;
3) O termo médio deve ser tomado pelo menos uma vez em toda a sua extensão; “Aut semel aut
iterum medius generaliter esto”;
4) Nenhum termo deve ser mais extenso na conclusão do que nas premissas; “Latius hunc
(terminum) quam proemissae conclusio non vult”;
5) Se as duas premissas forem negativas, nada se poderá concluir; “Utraque si praemissa neget nil
inde sequetur”;
6) Duas premissas afirmativas não podem produzir uma conclusão negativa; “Ambae affirmantes
nequeunt generare negantem”;
7) A conclusão sempre acompanha a parte mais fraca: a premissa particular ou negativa; “Pejorem
sequitur semper conslucio partem”;
Mais modernamente, identificaram-se três regras são bem mais simples e fáceis de
aplicar que as oito regras listadas acima. A validade dos silogismos categóricos também pode ser é
aferida pelo atendimento concomitante às três seguintes regras, que afastam os casos de possíveis
falácias existenciais (fazer afirmações particulares sobre coisas que não existem):
As regras acima foram montadas excluindo os casos que envolvem falácias existenciais.
Os “Diagramas de Venn” foram concebidos por volta de 1880 por John Venn (1834-
1923) e são usados para mostrar graficamente todas as possíveis relações entre uma finita coleção
de conjuntos. Por meio destes diagramas podem-se ilustrar exemplos simples de relações lógicas
por meio de curvas planas fechadas, de modo que cada uma representa um conjunto, tornando
possível visualizar graficamente as interseções, uniões, inclusões ou exclusões entre os conjuntos.
Cada elemento representado no interior de uma curva pertence ao conjunto definido por esta curva.
Assim, duas dessas curvas que não se tocam e estão fora uma da outra representam conjuntos que
não têm elemento comum; se não se tocam e uma está dentro da outra, simboliza que o conjunto
representado pela curva interna está contido no representado pela linha externa. Espaço
compartilhado por duas dessas curvas (interseção) contém elementos comuns aos dois conjuntos,
cada um representado por uma curva. Os diagramas de Venn, embora seja simples a construção
para dois ou três conjuntos, trazem crescentes dificuldades práticas quando se tenta usá-los para um
número maior.
Será adotada a convenção de quando das premissas puder ser excluída a existência de
elemento em qualquer das regiões numeradas de “1” a “7”, a área correspondente será sombreada.
Outra convenção será usar um “x” para indicar que há pelo menos um ou algum elemento na área
onde colocado. Quando houver necessidade de marcar algum elemento e não houver certeza de
onde, colocar um “x” oscilante entre as duas regiões. Se uma região está sem sombreado e sem “x”
não será considerada um conjunto vazio, mas interpretada de modo a admitir a possibilidade de
haver algum elemento naquela área.
Nos nomes das figuras, as três primeiras vogais, por sua vez, indicam na ordem em que
aparecem os tipos dos enunciados – A, E, I ou O – da 1ª premissa, da 2ª premissa e da conclusão.
Nos exemplos, o termo médio, para facilitar entendimento, está em negrito.
Premissa maior MP PM MP PM
Premissa menor SM SM MS MS
Conclusão SP SP SP SP
Sem possibilidade BARBARA AAA-1 CESARE EAE-2 DATISI AII-3 CALEMES AEE-4
de falácia
CELARENT EAE-1 CAMESTRE AEE-2 DISAMIS IAI-3 DIMATIS IAI-4
existencial
DARII AII-1 BAROCO AOO-2 BOCARDO OAO-3 FRESISON EIO-4
FERIO EIO-1 FESTINO EIO-2 FERISON EIO-3
Com possibilidade BARBARI AAI-1 CAMESTROS AEO-2 DARAPTI AAI-3 BAMALIP AII-4
de falácia CESARO EAO-2
CELARONT EAO-1 FELAPTON EAO-3 CALEMOS AEO-4
existencial
FESAPO EAO-4
As formas com possibilidade de falácia existencial podem ser usadas validamente desde
que prova da existência, dependendo do caso, de algum S, M ou P.
BARBARA (AAA-1)
CELARENT (EAE-1)
DARII (AII-1)
Atentar que, como a 2ª premissa é do tipo I (afirmativa particular). Se for verdadeira está
confirmando a existência de algum elemento em S.
FERIO (EIO-1)
Atentar que, como a 2ª premissa é do tipo I (afirmativa particular). Se for verdadeira está
confirmando a existência de atividades.
CESARE (EAE-2)
BAROCO (AOO-2)
Atentar que, como a 2ª premissa é do tipo O (negativa particular). Se for verdadeira está
confirmando a existência de elemento em S.
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FESTINO (EIO-2)
DATISI (AII-3)
DISAMIS (IAI-3)
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BOCARDO (OAO-3)
FERISON (EIO-3)
CALEMES (AEE-4)
DIMATIS (IAI-4)
FRESISON (EIO-4)
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Alterada a forma de organizar, mas usando os mesmos termos resta num argumento
inválido:
A falácia dos quatro termos surge se um termo é empregado em diferentes sentidos num
mesmo argumento. Argumentos falaciosos deste gênero são bastante comuns e, geralmente, o
termo médio é o que figura com dois significados, um quanto relacionado com o termo maior na
primeira premissa e outro quando interagindo com o termo menor na segunda premissa. Notar que
há ambiguidade nos sentidos que a mesma expressão assume nas duas vezes em que aparece no
argumento.
1ª premissa é usada com o significado de ‘não ir longe’. Ou seja, a primeira premissa poderia ser
reescrita como: “toda mentira não vai longe”. Na 2ª premissa, a expressão ‘pernas curtas’ designa
membros inferiores menores que o normal. Observe-se que se for atribuído o mesmo sentido à
expressão ‘pernas curtas’ nas duas premissas, uma delas é falsa.
Trocando-se no argumento acima os termos ‘mentira’ por ‘cães’; ‘pernas curtas’ por
‘mamíferos’ e ‘sintoma de nanismo’ por ‘animais’ verifica-se que o silogismo, com a ambiguidade
extirpada, é válido.
16
Introdução à Lógica, p. 184
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M. Assim, para que o termo médio interligue as classes definidas pelos termos S e P, é necessário
que a totalidade da classe definida pelo termo M seja mencionada em pelo menos uma das
premissas de modo distribuído.
Alterando-se mais uma vez, agora ‘mosquito’ para ‘anarquista’, ‘6 patas’ para
‘revolucionário’ e ‘vespa’ para ‘comunista’ fica:
Esta falácia formal está relacionada com violação à regra que diz: qualquer termo
distribuído na conclusão deve estar distribuído nas premissas. Uma proposição que apresenta um de
seus termos distribuído diz mais sobre a classe designada por esse termo que outra proposição que
uma que traz o mesmo termo não distribuído. A falácia do ilícito maior acontece quando o termo
maior está distribuído na conclusão, mas está não-distribuído na premissa maior, fazendo com que
a conclusão vá além do que contido na premissa maior, tornando o argumento inválido. E, então,
será um argumento inválido aquele em que a conclusão for além ou afirmar mais do que esteja
contido ainda que implicitamente nas premissas.
Esta falácia decorre de violação à mesma regra mencionada para o ilícito maior:
qualquer termo distribuído na conclusão deve estar distribuído nas premissas. Na falácia do ilícito
menor ocorre de o termo menor estar distribuído na conclusão e não-distribuído na premissa menor.
A conclusão, então e tal qual acontece na falácia do ilícito maior, afirmará além do que contido na
premissa menor, tornando o argumento inválido.
Mais um contraexemplo:
Esta modalidade de falácia ocorre quando da violação à regra que diz: duas premissas
negativas sempre conduzem a uma inferência inválida. Qualquer premissa negativa – tipos E ou O
– promove a negação de uma inclusão de classe afirmando que todos ou alguns membros de uma
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classe estão excluídos da totalidade da outra classe. A premissa maior negativa opera a exclusão de
parte da classe referida pelo termo maior da classe referida pelo termo médio, ou vice versa; a
premissa menor negativa fará, mutatis mutandis, o mesmo com relação às classes referidas pelos
termos menor e médio. Então, a dedução de qualquer tipo de relação – afirmativa ou negativa –
entre os termos maior e menor torna-se impossível.
Outro contraexemplo:
Esta falácia advém da violação da regra que afirma: duas premissas afirmativas não
podem produzir uma conclusão negativa. Assim é porque para haver exclusão de classes num
silogismo categórico é necessário que uma das premissas seja negativa. Se nas premissas
afirmativas os predicados – termo maior e termo menor, respectivamente – não estão distribuídos e
na conclusão negativa o predicado – termo maior – sempre está, tem-se que o termo maior na
conclusão é mais extenso que na premissa maior, fazendo com que a inferência categórica negativa
na conclusão não possa advir licitamente de duas premissas afirmativas, que sempre asseveram
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inclusão de classes.
Outro contraexemplo:
Uma premissa afirmativa diz que uma classe está total ou parcialmente contida numa
segunda classe. Assim, para implicar uma conclusão afirmativa as duas premissas têm de afirmar a
inclusão de classes e a inclusão de classes só pode advir de proposições afirmativas. Em resumo, a
conclusão sempre acompanha a parte mais fraca: a premissa negativa ou a particular e, se qualquer
das premissas do silogismo for negativa, a conclusão não poderá ser afirmativa, mas tão-somente
negativa também. Será, então, inválido o silogismo se afirmativa a conclusão advinda no caso em
que uma das premissas é negativa, pois, a premissa negativa quebra a inclusão de classe necessária
à produção de uma conclusão afirmativa.
Outro contraexemplo:
Não é silogismo categórico sempre válido aquele que tenha duas premissas universais
convergindo em uma conclusão particular. Viu-se que alguns argumentos são considerados
inválidos por conta de que exigiam que as classes referidas pelos termos não fossem conjuntos
vazios.
Em matemática existe uma noção primordial: antes de qualquer coisa, sob pena de
haver definição autocontraditória, deve-se provar que existe algo que satisfaça à definição
envolvida em qualquer dedução. Por exemplo, suponha-se que ‘n’ é o ‘maior número natural’.
Então, ‘n’ só pode valer 1, pois, se assim não for, como ‘n2 > n’, temos contradição em relação à
afirmativa de que ‘n’ é o ‘maior número natural’. É falha irremediável usar qualquer propriedade de
‘n’, o ‘maior número natural’, até que se prove a existência dele. De fato, ‘n’, o ‘maior número
natural’ não existe.
São 9 os silogismos que podem levar a falácias existenciais, caso não se prove a
existência de algum elemento em alguma das classes, dependendo do caso.
Nesses 9 casos, há que se fazer prova de que existe pelo menos um elemento de alguma
classe (S, M ou P) e, caso tomada a adequada cautela, os silogismos serão válidos. É importante
deixar anotado que as três regras não serão usadas porque são aptas apenas quando não há
possibilidade de falácia existencial, que pode acontecer quando a conclusão é proposição do tipo I
ou O e as duas premissas são tipo A ou E.
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BARBARI (AAI-1)
Premissas e conclusão
Todo nascido em Marte é extraterrestre
Todo marciano é nascido em Marte
Algum marciano é extraterrestre (desde que haja marciano)
Premissas e conclusão
Todo nascido na Terra é terráqueo
Todo ser humano é ser nascido na Terra
Algum ser humano é terráqueo (desde que haja ser humano)
CELARONT (EAO-1)
Premissas e conclusão
Nenhum nascido em Marte é terráqueo
Todo marciano é nascido em Marte
Algum marciano não é terráqueo (desde que haja marciano)
Premissas e conclusão
Nenhum terráqueo é marciano
Todo nascido na Terra é terráqueo
Algum nascido na Terra não é marciano (desde que haja nascido na Terra)
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CAMESTROS (AEO-2)
Premissas e conclusão
Todo nascido na Terra é terráqueo
Nenhum marciano é terráqueo
Algum marciano não é nascido na Terra (desde que haja marciano)
Premissas e conclusão
Todo nascido em Marte é marciano
Nenhum ser humano é marciano
Algum ser humano é não nascido em Marte (desde que haja ser humano)
CESARO (EAO-2)
Premissas e conclusão
Nenhum terráqueo é nascido fora da Terra
Todo marciano é nascido fora da Terra
Algum marciano não é terráqueo (desde que haja marciano)
Premissas e conclusão
Nenhum terráqueo é marciano
Todo nascido em Marte é marciano
Algum terráqueo não é marciano (desde que haja terráqueo)
DARAPTI (AAI-3)
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Premissas e conclusão
Todo marciano é extraterrestre
Todo marciano é nascido em Marte
Algum nascido em Marte é extraterrestre (desde que haja marciano)
Premissas e conclusão
Todo ser humano é terráqueo
Todo ser humano é nascido na Terra
Algum nascido na Terra é terráqueo (desde que haja ser humano)
FELAPTON (EAO-3)
Premissas e conclusão
Nenhum terráqueo é nascido fora da Terra
Todo marciano é nascido fora da Terra
Algum marciano não é terráqueo (desde que haja marciano)
Premissas e conclusão
Nenhum terráqueo é marciano
Todo nascido em Marte é marciano
Algum terráqueo não é marciano (desde que haja terráqueo)
BAMALIP (AAI-4)
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Premissas e conclusão
Todo marciano é nascido em Marte
Todo nascido em Marte é extraterrestre
Algum extraterrestre é marciano (desde que haja marciano)
Premissas e conclusão
Todo ser humano é nascido na Terra
Todo nascido na Terra é terráqueo
Algum terráqueo é ser humano (desde que haja ser humano)
CALEMOS (AEO-4)
Premissas e conclusão
Todo terráqueo é nascido na Terra
Nenhum nascido na Terra é marciano
Algum marciano não é nascido na Terra (desde que haja marciano)
Premissas e conclusão
Todo marciano é nascido em Marte
Nenhum nascido em Marte é terráqueo
Algum terráqueo não é marciano (desde que haja ser terráqueo)
FESAPO (EAO-4)
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João Monteiro de Castro
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Premissas e conclusão
Nenhum terráqueo é nascido fora da Terra
Todo nascido fora da Terra é extraterrestre
Algum extraterrestre não é terráqueo (desde que exista nascido fora da Terra)
Premissas e conclusão
Nenhum marciano é nascido na Terra
Todo nascido na Terra é terráqueo
Algum terráqueo não é marciano (desde que haja nascido na Terra)
É preciso distinguir entre o uso coletivo e distributivo dos termos, o que às vezes
depende vitalmente do contexto. Ao se afirmar ‘os felinos são mamíferos’ normalmente interpreta-
se como ‘todo e qualquer felino é mamífero’, caso em que o termo ‘felinos’ está sendo usado
distributivamente, pois, uma propriedade está sendo atribuída a cada felino. Há, entretanto, felinos
existentes em alguns continentes que não ocorrem em outros. O tigre não existe na América do Sul,
por exemplo. Na frase ‘os felinos se distribuem por todo o planeta’ o termo ‘felinos’ está
designando uma propriedade da classe dos felinos, tomada como um todo, e não quer dizer que
todos os elementos da classe ‘felinos’ ocorrem em todas as partes do globo.
Existem propriedades das partes que também tonalizam o todo, mas não
necessariamente. Os planetas estão contidos na Via Láctea; os planetas fazem parte do Sistema
Solar, que está contido na Via Láctea. Então, a propriedade estar contido na Via Láctea é
compartilhada pelos planetas e pelo Sistema Solar. Uma máquina composta por peças leves nem
sempre pode ser reputada leve. Um carro gasta menos combustível que um ônibus, mas muito mais
combustível é gasto pelo conjunto dos carros que pelo conjunto dos ônibus. É fundamental, então,
analisar e avaliar caso a caso os argumentos, pois, a confusão entre argumentos distribuídos e não-
distribuídos pode levar à ocorrência de falácias de dois tipos: 1) das partes para com o todo, como
no exemplo das peças leves – partes – constituintes da máquina pesada – todo; 2) de um todo para o
conjunto dos todos, como no exemplo dos ônibus e automóveis quando tomados isoladamente e
quanto considerados conjuntamente.
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Não é impossível que cada parte componente goze de alguma propriedade que seja
típica do todo. “Os humanos vivem no planeta Terra” e “Todo e qualquer humano vive no planeta
Terra” são duas afirmações perfeitamente corretas. Mas nem sempre assim acontece.
Alguém que diga “O bolo está com gosto de queimado porque foram usados
ingredientes com gosto de queimado” está desconsiderando a possibilidade de haver sido queimado
na hora de assar.
Não dá para aceitar sem discutir coisas como ‘os padres fazem voto de pobreza e a
Igreja, sendo uma instituição que congrega padres, não deve, portanto, ter propriedades’ porque se
sabe que a Igreja é uma das instituições que mais propriedades tem.
Não dá para concluir que se ‘os ingredientes que estão sendo usados para fazer o bolo
são todos deliciosos, então, o bolo será delicioso também’.
Torcedores ficam exultantes quando seus times engrandecem a equipe fazendo vir
jogadores de escol. Não é raro ouvir antes do jogo algo como ‘como cada jogador do nosso time é
excelente, agora seremos imbatíveis’ e ver um monte de gente sair cabisbaixa do estádio após seu
time de astros ser fragorosamente derrotado.
6. Argumento indutivo
A regra da enumeração é a quarta das quatro regras explicitadas por René Descartes no
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livro O Discurso do Método para a investigação: fazer em toda parte enumerações tão completas e
revisões tão gerais, até atingir a certeza de nada omitir.
Para ilustrar, suponha-se uma caixa cheia de bolas brancas e pretas, bastante
misturadas. Amostras são retiradas do topo, do meio e do fundo da caixa Admitamos duas
hipóteses:
1) Imaginemos que todas as bolas extraídas sejam pretas, caso em que o argumento pode ser
assim redigido nos termos de uma generalização universal:
Todas as bolas da amostra observada são pretas
Logo, todas as bolas da caixa são prestas
2) Imaginemos agora que 60% das bolas extraídas sejam pretas, caso em que o argumento pode
ser assim redigido nos termos de uma generalização estatística:
60% das bolas da amostra observada são pretas
Logo, 60% das bolas da caixa são pretas
Isto mostra que não pode ser afastado inteiramente que a indução por enumeração pode,
mesmo baseada em premissas verdadeiras – análise de amostra –, levar a conclusões falsas.
Existem técnicas estatísticas para minimizar a probabilidade da obtenção de conclusões falsas a
partir de premissas verdadeiras. Exemplificando grosseiramente: não se obterão resultados
confiáveis sobre o comportamento dos eleitores brasileiros se a amostra consistir de 10 pessoas,
entrevistadas na hora do almoço num restaurante caro. Salta aos olhos ser a amostra muito pequena
para ser exemplificativa da população do país. Mais, o país é grande e cheio de diversidades,
impondo dividir a amostra em homens e mulheres, por classe social, por faixa etária e as pessoas
consultadas escolhidas em várias cidades, não só as grandes, mas também as médias e pequenas,
sem excluir os habitantes de áreas rurais. Para se obter maior precisão, as entrevistas não podem ser
feitas só fora de casa, porque quem pouco sai de casa também vota, e nem num só horário, porque
as pessoas mais pobres têm horário rígido de trabalho e sequer saem para almoçar fora. Isto mostra
absoluta necessidade do correto dimensionamento e estratificação da amostra, bem como forma,
horário e local de inquirição dos elementos escolhidos, para se almejar obter da amostra resultados
congruentes com o universo acerca do qual se quer extrair conclusões.
Perguntas do estilo “escolha uma das alternativas” restringem o espectro total das
possibilidades e não captam posições mistas, que não podem ser afastadas “a priori”. Estes tipos de
questionamentos tolhem as possibilidades de resposta do pesquisado, podendo dirigir a pesquisa se
contiverem falsos dilemas.
A regra da evidência é a primeira das quatro regras explicitadas por René Descartes no
livro O Discurso do Método para a investigação: jamais dar alguma coisa por verdadeira que não
fosse evidentemente conhecida como tal, ou seja, evitar cuidadosamente a precipitação e a
prevenção, para nada incluir que não se apresente tão clara e distintamente ao espírito, sem dar
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Muitas vezes as partes dedicam-se a uma discussão acalorada, mas estéril, sobre
detalhes envolvendo diferenças rigorosamente irrelevantes, sem atentar para o objeto como um
todo. Nunca se deve perder de vista que uma diferença é diferença somente se faz diferença.
Imagine-se uma pesquisa sobre aceitabilidade de cores cítricas para automóveis que inclui no
espaço amostral pesquisado pessoas cegas. Qualquer que seja o resultado poderá ser impingido de
questionável.
Deve ser sempre lembrado, quando a pesquisa é por entrevistas ou questionários é que
as perguntas formuladas são escolhidas entre todas as perguntas possíveis de serem feitas, as
repostas obtidas formam um subconjunto do universo das respostas possíveis e que os entrevistados
são uma amostra do grupo total pesquisado. Fácil fica ver que há possibilidade da incorporação de
erros em todas as fases, logo, os resultados obtidos devem ser analisados e ponderados com cautela
para tentar garantir que todas as particularidades do que se pesquisou esteja adequadamente nele
reproduzidas.
17
Disse o primeiro-ministro do Reino Unido Benjamin Disraeli (1804 – 1881): “There are three kinds of lies: lies, damned lies, and statistics.”
Tradução livre: Existem três tipos de mentiras: mentiras, mentiras deslavadas e estatísticas.
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A população pesquisada pode ser variada, caso em que maior deve ser a amostra
selecionada. É assim para haver satisfação do pressuposto da representatividade, pois, a amostra
selecionada tem de espelhar toda a população pesquisada quanto à distribuição qualitativa e
quantitativa. Na prática é dos problemas mais graves dos estatísticos assegurar a satisfação do
pressuposto da representatividade porque as populações reais podem ser menos homogêneas e mais
variadas do que se supôs originalmente. Num exame de sangue, por se saber cientificamente que a
composição química do sangue das pessoas não varia muito, uma pequena amostra é efetivamente
representativa do todo; mas, para saber o peso médio de uma manada de bois, composta de adultos
e filhotes, é preciso recorrer a um método mais elaborado. Neste caso, de pronto constata-se haver
dois estratos evidentes – adultos e filhotes com pesos médios muito diferentes – e a amostra a ser
selecionada deve representá-los equitativamente, o que obriga a escolha de uma amostra aleatória
estratificada, composta por amostras aleatórias independentes devem ser extraídas de cada estrato
da população pesquisada.
O mandamento básico é escolher uma amostra de itens aleatórios de tal forma que o
conjunto pesquisado tenda a apresentar aproximadamente as características básicas da população
inteira a ser alcançada pela generalização. Há várias técnicas científicas para orientar a forma de
escolha e dimensão numérica da amostra.
18
Flaws and Fallacies in Statistical Thinking, p. 135.
19
Flaws and Fallacies in Statistical Thinking, p. 136.
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Esta falácia ocorre quando se acredita que uma sequência de eventos, aleatórios e
independentes um dos outros, tem influência na probabilidade de acontecer o próximo evento da
série. Esta linha de pensamento é incorreta, muito embora tenha até raízes psicológicas, porque os
eventos passados não alteram a probabilidade de acontecer certo evento no futuro.
Uma moeda ‘honesta’ tem probabilidade de, quando jogada, 50% para ocorrer cara ou
coroa. Suponha uma série de 5 jogadas em que todas tenham ocorrido cara. A probabilidade de a
próxima jogada ser cara continua 50% independentemente da série anterior.
A falácia do jogador, no exemplo, envolve pensar que existe compensação entre caras e
coroas quando a série de sorteios é pequena e por isto as pessoas tendem a apostar errado no que
ocorreu menos; não é assim. A diferença entre caras e coroas tende para zero, mas quando o
número de jogadas tende para infinito.
6.3.5.1. Médias
Existe uma piada conhecida dizendo que se você está numa espelunca tomando uma
cerveja e entra o Bill Gates para comprar um maço de cigarros, na média, instantaneamente, você
se converte em um milionário sem que um centavo sequer entre no seu bolso.
20
Flaws and Fallacies in Statistical Thinking, p. 148.
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definido. E, ainda que usado neste cenário, o termo “média” ainda é vago e pode conduzir a mal
entendidos graves porque, tecnicamente, há diversas modalidades de médias.
2) Mediana – uma vez ordenado o conjunto numérico, é o número que ocupa a posição central. Se
o número de elementos é ímpar, tanto abaixo da mediana quanto acima dela, tem-se (n – 1)/2
elementos. Se o número de elementos do conjunto é par, adota-se como mediana a média
aritmética dos dois elementos centrais e tanto, abaixo quanto acima, tem-se n/2 elementos. A
mediana é uma separatriz porque separa o conjunto numérico em duas partes, cada uma com o
mesmo número de elementos.
3) Moda – é o elemento do conjunto numérico que mais se repete. Um mesmo conjunto pode ter
mais de uma moda.
Do exame dos casos 1, 2 e 3 pode-se concluir que a média aritmética dos gastos não é
adequada para ser tida como medida representativa dos três. No caso 1, em que se verifica uma
maior homogeneidade, a média aritmética, a mediana e a moda estão em patamares comparáveis. Já
nos casos 2 e 3, as introduções dos clientes 6 e 7 produzem desvios tão substanciais que
desqualificam a média aritmética como representativa. Donde se pode extrair que a média
aritmética é boa para representar o conjunto se os gastos dos clientes se distribuem mais ou menos
igualmente em torno dela. Se tal tendência central não existe, a média aritmética não serve para
representar o conjunto, tal como acontece fortemente no caso 2 e radicalmente no caso 3.
6.3.5.2. Percentuais
O valor percentual entre dois valores é obtido pela multiplicação da fração, cujo
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numerador é a parte e o denominador o todo, por 100 e acrescentando o sinal gráfico %. Por
exemplo, para calcular em percentual o que significa 12 pessoas num grupo de 200 pessoas: 12 /
200 x 100 % = 6%.
É muito importante quando se faz referência a algum valor percentual que se tenha uma
noção exata do que significa 100%, ou seja, o todo. Daí vem a regra de ouro para lidar com
percentuais: não adicionar, subtrair ou fazer média com percentuais a menos que esteja
absolutamente certo de que estejam relacionados todos com a mesma base. Outra particularidade é
que não é possível um decrescimento acima de 100% em situações onde as grandezas originais
sejam todas positivas.
1) Calculemos a evolução do preço entre 2000 e 2003. Sendo o ano base 2000: (preço em 2003 –
preço 2000) / preço 2000 x 100% = (400 – 200) / 200 x 100% = 100%. Explicando: os preços
evoluíram a partir de 200 no ano base 2000 até o valor de 400, no ano de 2003. Tomando como
ano base 2000, pode-se subtrair os valores na terceira coluna da tabela para se obter a variação
percentual. É assim só porque a terceira coluna foi calculada tendo como base o valor do preço
no ano 2000.
2) Diferente será se for calculada a evolução de preço entre 2003 e 2005. Sendo o ano base 2003:
(preço em 2005 – preço 2003) / preço 2003 x 100% = (200 – 400) / 400 x 100% = –50%.
Explicando: os preços regrediram a partir de 400 no ano base 2003 para o valor de 200, no ano
de 2005. Observe-se que não é mais possível subtrair os valores apontados para os anos 2005 e
2003 da terceira coluna da tabela porque a base para calcular a variação de preços entre 2003 e
2005 é o valor de 2003 e a tabela foi construída com preço base aquele vigente no ano 2000.
3) Vamos supor que o preço caia para zero. Calculemos a evolução do preço entre esta data
hipotética e 2000: (preço na data hipotética – preço 2000) / preço 2000 x 100% = (0 – 200) /
200 x 100% = –100%. Explicando: não é possível um decrescimento acima de 100% em
situações onde as grandezas originais sejam todas positivas.
Confusões com o uso de percentuais são comuns e nem sempre usadas de boa fé por um
dos lados. Um aumento de juros de 10% para 15% não é um mero aumento de 5%, mas de: (15 –
10) / 10 x 100 % = 50%. Esta ambiguidade é evitada pelos especialistas por meio do uso da
expressão: “Os juros avançaram 5 pontos percentuais” ao invés de: “Os juros aumentaram em 5 por
cento”. Mas, convenha-se é uma sutileza bem distante do entendimento das pessoas comuns.
Existe um exemplo histórico de cálculo com percentuais, que mostra o perigo de não se
examinar com cautela a base usada para fazer as contas em contraste com a interpretação dos
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dados. O governo soviético da época de Stalin, no esforço para provar que o plano quinquenal fora
um sucesso, manejou o cálculo. Em 1928, a produção de aço da URSS era de 4,2 milhões de
toneladas. O plano quinquenal previa um aumento 6,1 milhões de toneladas, alcançando 10,3
milhões de toneladas ao final dos cinco anos. Entretanto, ao final dos cinco anos a produção
evoluiu só para magros 5,9 milhões de toneladas, ou seja, um aumento de apenas 1,7 milhões de
toneladas. Um fracasso? Não! Aprendemos a fazer “contas”.
Se o plano fosse cumprido e a meta integralmente atingida, o cálculo deveria ser feito
da seguinte maneira: (10,3 – 4,2) / (6,1) x 100% = 100%; explicando: o aumento de produção
alcançado (10,3 milhões de toneladas em 1933 menos os 4,2 milhões de toneladas de 1928)
calculado em relação ao aumento de produção pretendido (6,1 milhões de toneladas, meta de
aumento). O que foi efetivamente alcançado (5,9 milhões de toneladas em 1933 menos as 4,2
milhões de toneladas de 1928 = 1,7 milhões de toneladas de aumento) / (6,1 milhões de toneladas,
meta de aumento) x 100% = 27,9%; explicando: o aumento de produção alcançado nos cinco anos
(1,7 milhões de toneladas) em relação ao aumento de produção perseguido – 6,1 milhões de
toneladas.
O cálculo foi maquiado da seguinte forma: (5.9 / 10,3 x 100% = 57,3%); “explicando”:
tomaram como base a produção que pretendiam alcançar ao fim dos cinco anos e a usaram como
base (10,3 milhões de toneladas) e fizeram a conta com a produção que eles efetivamente
alcançaram (5,9 milhões de toneladas). Esta maneira de calcular leva a absurdos interessantes, pois,
se não houvesse qualquer aumento de produção, teríamos: (4,2 / 10,3 x 100% = 40,8 %). Suponha-
se que a produção tivesse regredido para 2,1 milhões de toneladas, feita a conta corretamente, teria
acontecido 50% de decréscimo: (2,1 – 4,2) / 4.2 x 100% = – 50%. Entretanto, pelo jeito de calcular
do Kremlin, ainda assim teriam alcançado algum sucesso no “cumprimento” do plano da ordem de:
2,1 / 10,3 x 100% = 20,4%; explicando: produção verificada (2,1 milhões de toneladas) dividida
pela meta fixada (10,3 milhões de toneladas) x 100%.
Nem tudo é tão técnico. Distorcer o debate com argumentos mencionando percentuais
impertinentes é comum. Um argumento bem jocoso por todos: “O Rio de Janeiro é muito menos
violento que o paraíso. Temos 6 milhões de habitantes e há 6000 homicídios por ano. No paraíso,
havia quatro habitantes. Quando Caim matou Abel, o índice de homicídios chegou a 25% da
população.” (José Siqueira da Silva, então secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro)21
6.3.5.3. Gráficos
Hoje em dia é rara uma apresentação sem gráficos: recursos cujo uso foi popularizado
pela existência de vários softwares no mercado, todos muito fáceis de serem obtidos e utilizados,
algumas vezes com a impropriedade de quem não sabe tratar tecnicamente o conjunto de dados
retratados das mais variadas e coloridas formas: pizzas, barras, linhas etc. Os gráficos podem
esconder ciladas e são potencialmente perigosos porque estimulam visual e rapidamente a plateia,
em detrimento das atividades mentais de comparação, avaliação e cálculo, mais lentas e exigentes
de conhecimentos mais aprofundados. Em função da beleza das formas e multiplicidade das cores e
efeitos, os gráficos tendem a ser autoexplicativos, podendo gerar conclusões apressadas e
direcionadas, nem sempre levando em consideração todo o conjunto de evidências disponível,
corretamente avaliado e ponderado. Nossos olhos funcionam mais depressa que nossa capacidade
de digerir e interpretar as informações e, principalmente, calcular e comparar. E pior, uma pessoa
ignorante não é capaz de tratar tecnicamente uma tabela de dados e a partir de sua análise – às
vezes árida – extrair o necessário para tomar uma decisão fundamentada, porém, é mais do que apta
a visualizar o comportamento ‘retratado’ e a partir dele posicionar-se.
A escala dos gráficos tem um papel primordial na análise e não pode ser escolhida de
maneira a, por si só, introduzir distorções nos dados apresentados. O gráfico abaixo é a variação da
inflação brasileira em percentuais, desde 1980 até 200922. Imediatamente após 1993, houve o Plano
Real que implicou no desabamento da inflação. Após este período, a escala do gráfico não permite
uma avaliação adequada da inflação. Depois de 1993, continuou havendo inflação, mas a variação
dela perde significado ante os índices enormes anteriores. Assim, este gráfico dá uma ideia boa do
que era antes de 1993, mas a escala precisa ser alterada.
O gráfico a seguir mostra a variação dos índices inflacionários após 1999 e permite a
21
As Melhores Frases em Veja, organizador: Julio Cesar de Barros, São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 73.
22
Os gráficos foram obtidos no site www.ipeadata.gov.br, pesquisa feita em 03/ago/2014.
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identificação de períodos em que a inflação cresceu ou decresceu. Salta aos olhos que houve um
‘pico’ inflacionário no segundo semestre de 2002, algo que é retratado, mas praticamente passa
despercebido no gráfico anterior.
Igualmente, não isentos são os três gráficos seguintes. Eles tendem a mostrar que o
violento aumento inflacionário foi tratado e debelado. Sem discutir a maneira de retratar o eixo
horizontal, mostrar somente a queda e não dar noção do que houve depois, é tão parcial como só
mostrar o aumento.
23
Os gráficos foram obtidos no site www.ipeadata.gov.br, pesquisa feita em 03/ago/2014
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6.3.5.4. Probabilidades
Para ilustrar suponhamos uma doença – que poderia ser AIDS – infectando 1 pessoa a
cada grupo de 10.000 pessoas. Suponhamos também as seguintes características para o exame que a
detecta: i) 999 resultados positivos a cada 1.000 pessoas doentes (verdadeiros positivos); ii)
praticamente zero resultado negativo avaliando pessoas doentes (falsos negativos); iii) 1 resultado
positivo a cada 1.000 pessoas não doentes (falso positivo).
Então, a cada grupo de 10.000 pessoas há uma doente e, neste mesmo grupo, há 10
pessoas sãs que se examinadas receberão o resultado positivo (falsos positivos). A probabilidade de
a pessoa não estar doente se o resultado for positivo é o número de falsos positivos dividido pelo
número de positivo, ou seja, 10/11 (aproximadamente 91%). Isto quer dizer que a probabilidade de,
no nosso exemplo, o exame dar positivo e a pessoa não estar doente é de aproximadamente 91%.
Ou seja, só 9%, aproximadamente, de probabilidade de a pessoa estar doente se o exame der
24 Para mais detalhes, consultar o capítulo 6 de O andar do Bêbado, Leonard Mlodinow, editora Zahar.
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positivo.
Há mais, em exames – de imagem, por exemplo – em que a taxa de falsos negativos não
é desprezível, a situação fica mais nebulosa ainda.
Correlação não é causa é uma sentença famosa para cientistas, ao ponto de receber uma
sigla em inglês (CINAC – correlation is not a cause), mas é raramente aplicada na linguagem do
dia a dia. Não é um conceito fácil de entender. Para tanto, há um exemplo: imagine-se num
aeroporto e vê muitas pessoas chegando, praticamente ao mesmo tempo, e se aglomerando num
certo portão de embarque, que vai ficando lotado. Então, o avião chega e os preparativos para
embarque começam. Vêm, então, as perguntas: o acúmulo de pessoas é causa de o avião chegar? A
chegada do avião é causa de as pessoas se aglomerarem no portão? A resposta a ambas as
perguntas é não, porque tanto a aglomeração de pessoas no portão, quanto a chegada do avião
dependem da tabela de partidas de aviões daquele portão.
A ocorrência de correlação tem grande valia como evidência científica nos mais
diversos campos da ciência, tais como: medicina, psicologia, sociologia e outros. Supor que um
fenômeno é causa de outro porque há correlação entre eles é uma falácia, assim como é falácia
descartar a correlação liminarmente como se não pudesse haver a relação de causalidade entre os
mesmos fenômenos, fazendo com que grande quantidade de evidências científicas importantes não
fossem objeto de mais detida investigação, até porque muitas evidências científicas podem ocorrer
concomitantemente.
Entender que correlação não é causa pode fazer elevar o nível do debate. O exemplo
mais notável e importante de correlação, mas a prova da causa nebulosa dizia respeito, nos anos
1950, à conexão entre tabagismo e câncer de pulmão. As estatísticas apontavam que houvera um
aumento de seis vezes na taxa de câncer de pulmão nos vinte anos anteriores. Muitos cientistas
argumentavam que o aumento da incidência de câncer de pulmão poderia ter sido resultado de
técnicas mais precisas de diagnóstico; mais poluição do ar ou mais carros nas ruas e estradas
produzindo gases nocivos; poderia ser que pessoas geneticamente predispostas a fumar fossem
mais susceptíveis a desenvolver câncer. Ninguém contestava a correlação, mas provar,
definitivamente, que o tabagismo era causa de câncer de pulmão foi tarefa árdua.
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Ou seja, a correlação, por si só, não pode ser usada como evidência para uma relação
de causa e efeito entre fenômenos, sendo esse é um dos erros mais corriqueiros, porque é fácil ceder
à conclusão prematura com base na aparência preliminar. O fato é que, identificada a correlação,
deve ser mais profundamente investigada porque pode – mas não necessariamente – haver relação
de causa e efeito entre os fenômenos.
7. Argumentos analógicos
Grande parte das inferências cotidianas são feitas com base em analogia, por meio da
qual, baseando-se em alguns aspectos – propriedades compartilhadas – de objetos diferentes,
conclui-se – inferência analógica – que são semelhantes também em outros aspectos. Ou seja, pela
analogia busca-se uma semelhança imperfeita entre dois objetos ou fenômenos diferentes.
Analogia
P1 ‘P’ e ‘Q’ são similares com relação às propriedades ‘a’, ‘b’ e ‘c’
P2 Observou-se no objeto ‘P’ também a propriedade ‘d’
C Logo, ‘Q’ também desfruta da propriedade ‘d’
Em lógica, existe a expressão “a maiore ad minus” para designar casos em que se pode
fazer uma inferência óbvia acerca de algo precedente mais forte, em maior quantidade ou de
ordem geral para uma mais fraca ou mais limitada. Há vários casos:
- Do geral para o particular: o que vale para todas as pessoas, vale também para uma certa pessoa
em particular;
- Do maior para o menor: num canal portuário que passa cargueiro de grande porte, pode passar
também navios de pequeno porte;
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- Do todo para a parte: o artigo 1.858, do Código Civil prevê que: “O testamento é ato
personalíssimo, podendo ser mudado a qualquer tempo”, logo, se todo o testamento pode ser
alterado, com mais fundamento uma certa cláusula pode ser modificada pelo testador.
- Do mais forte para o mais fraco: uma corda de alpinista que suporta pessoas adultas de até 150
Kg pode ser usada com crianças de até 60 Kg.
Os argumentos com suporte na analogia são uma forma plausível de raciocinar e têm
grande força de persuasão porque veiculam, acerca de algo “a priori” desconhecido, comparação
com coisas que os destinatários conhecem bem ou a respeito da qual tem sentimento positivo.
Então, a boa escolha a ser feita dos aspectos similares a serem comparados assume
fundamental importância para estabelecer a força de uma analogia, que, assim, aumenta
proporcionalmente na exata medida da pertinência e relevância deles. Não só, o número de
semelhanças relevantes entre as situações deve ser de tal monta que autorize a extração da
conclusão natural e razoavelmente. De todo modo, se a analogia conduzir a absurdo, deve ser
imediatamente descartada.
Num argumento envolvendo analogia deve ser preocupação saber qual é exatamente o
conjunto de proposições contidas na situação conhecida e quanto as duas situações relacionadas são
plausivelmente similares para, a partir de uma delas, concluir-se algo a respeito da outra. Os
argumentos analógicos têm um viés indutivo, pois começam com a premissa de que uma coisa goza
de uma determinada propriedade e que uma segunda e outra terceira também e assim por diante até
alcançar a conclusão de que uma “n-ésima” coisa daquele conjunto provavelmente também terá a
mesma propriedade. Exemplo: sabe-se de várias pessoas cujos carros tiveram a correia dentada do
motor do automóvel arrebentada entre 50 e 60 mil quilômetros; então, é de bom alvitre decidir
trocar a correia do carro antes de 50 mil quilômetros para evitar o atropelo de vê-la arrebentar com
o carro em movimento.
O bom uso da analogia transfere à outra parte o ônus de afastá-la ou criticá-la. Há três
maneiras básicas de questionar os argumentos fundados em analogia. A primeira é questionar a
premissa principal, ou seja, da situação original e conhecida não é plausível que advenha a
conclusão apontada. O debatedor diz: “Tal qual foi feito na crise de 199325, devemos aumentar os
juros para segurar a inflação” e o outro questiona que não foi o aumento de juros que segurou a
inflação, mas um conjunto muito mais complexo associado a condições favoráveis do mercado
internacional.
Uma segunda maneira é apontar que a analogia não funciona porque a premissa da
analogia não funciona para o caso em análise. Algo mais ou menos na direção de dizer que no
presente, diferentemente de 1993, não há mais espaço para o aumento de juros porque já estão em
patamares estratosféricos e só medidas estruturais vão funcionar.
A terceira maneira é propor uma contra analogia. Numa discussão sobre liberação de
25
O Plano Real foi introduzido na economia brasileira em 1993.
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verbas, por exemplo, alguém pode dizer: “O lado A deve ser beneficiado porque se compara aos
heróis que lutaram pela nossa independência” ao passo que o oponente diz: “O lado B deve ser
beneficiado porque é tal qual os mártires da revolução, que morreram em batalha para o bem do
país.” No curso do debate, ambas as partes podem fazer analogias no sentido de endossar, cada um,
a sua conclusão perseguida e, ao mesmo tempo, contestar a analogia do oponente, transferindo de
volta o ônus argumentativo para a outra parte.
No campo penal, a analogia é sistematicamente vedada em todo caso que venha ser
desfavorável ao réu em função de vigorar o princípio "nullum crimen, nulla poena sine lege",
estampado no inciso XXXIX, do art. 5º, da Constituição Federal nos seguintes termos: “XXXIX -
não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Ou seja, só se
pode reputar crime a conduta expressamente descrita como tal em lei que exista previamente à
prática dela e, se houver crime, a pena a ser eventualmente aplicada deve estar dentre as previstas
em lei para punir aquele específico fato típico.
“A analogia me faz dar um passo a mais, a saber, o que leva à crença de que todos os
animais e plantas descenderam de algum protótipo. A analogia pode, contudo, ser um
guia enganoso. Mesmo assim, todas as coisas vivas têm muito em comum... Por
conseguinte, devo inferir, a partir da analogia, que provavelmente todos os seres
orgânicos que já viveram nesta terra descenderam de alguma forma primordial única, na
qual a vida foi pela primeira vez infundida.”
Estabelecer paralelo entre objetos e situações por meio de propriedades que não podem
ser tomadas como parâmetros de comparação leva à produção da falácia da falsa analogia. A
cautela manda que se preste muita atenção nas comparações feitas na vida cotidiana. Quanta gente
já saiu catastroficamente ferida com arrazoados parecidos ao que se segue: “O cãozinho da Flávia é
semelhante a este: mesma raça, porte e olhar atento; o cãozinho da Flávia é dócil; logo, este cão é
dócil também”.
Falsas analogias insustentáveis não são raras e são defendidas ardorosamente à revelia
de algum detalhe fundamental. Imagine-se um aluno levantando polêmica para defender consulta a
material acadêmico ou mesmo não acadêmico durante as provas. Defende ele: “Se os advogados e
juízes consultam seus códigos e livros para elaborarem suas manifestações no processo; os
engenheiros, mestres de obras e pedreiros recorrem às plantas para erguerem os prédios; os médicos
levam as radiografias e exames para auxiliá-los durante as cirurgias. Então, durante o curso tenho
direito a fazer minhas provas sempre com consulta a todo tipo de material”. Contrastando-se as
situações apontadas como termo de comparação, salta aos olhos que diferem de tal monta que
tornam a analogia absolutamente insustentável. Os profissionais usam meios auxiliares para melhor
aplicarem uma técnica que já dominam. Mas, detalhe fundamental, o estudante, por sua vez, está
em processo de aprendizado e domínio das competências próprias da atividade profissional,
objetivando o desenvolvimento para o exercício da profissão. Então, ao querer se comportar como
quem já domina a técnica, está extrapolando de sua peculiar e transitória condição de aluno.
A descida escorregadia tem início ao se reconhecer que duas ou mais coisas são
diferentes por uma insignificância. Dado este primeiro e convidativo passo, fica insustentável negar
aceitação a terceiro caso como também sendo ligeiramente diferente dos dois anteriores,
desaguando num processo sequencial e incontrolável que pode conduzir a uma conclusão absurda e
inaceitável. Com relação às regras morais e legais, a vagueza de certos conceitos e as nuances
envolvidas nos casos concretos dão margem a múltiplas interpretações, algumas levando a
resultados imprevistos e indesejados na medida em que o manejo de norma ou justificação para um
tipo de ação pode, se considerada naquele caso isolado, ser moralmente aceitável, mas se
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generalizada inadvertidamente pode dar suporte a atos “similares”, de todo inaceitáveis ou até
mesmo desastrosos.
Muitas vezes as leis fazem opções fundadas em critérios técnicos, como limites de
velocidades, por exemplo. Mas, deixar o policial de aplicar multa àquele que foi flagrado dirigindo
a 81 Km/h, num local onde o máximo é 80 Km/h, sob o argumento de que não é adequado multar
por algo tão insignificante – 1 Km/h –, pode levar a que se aceite 82 Km/h, 83 Km/h e assim por
diante até, de pouco em pouco, chegar-se velocidades absurdas. O contra-argumento do policial é,
até concordando que 1 Km/h é praticamente insignificante, que o limite da lei pode ser arbitrário,
mas incide genericamente para todos os motoristas e, como foi desrespeitado, não há opção senão
multar. A própria legislação já prevê os casos em que a diferença das situações é relevante a ponto
de configurar-se, à luz de racionalidade, caso excepcional, a exemplo de alguém que suplanta a
velocidade máxima permitida para a via quando transportando alguém que deve ser socorrido com
urgência.
Saber negar é tão importante quanto conceder e, às pessoas que estão em posição de
mando, considerar sempre eventual negação é indispensável. Não se pode, entretanto, confundir a
negação com o modo de pronunciá-la. Em nome do dever de urbanidade, a negação deve ser
motivo de prévia reflexão e deve ser pronunciada com firmeza, mas de modo cortês para evitar se
tornar por si uma ofensa e causar mágoa desnecessária.
Este tipo de situação recai no que é conhecido como Paradoxo Sorites. Este tipo de
paradoxo aparece quando se usa conceitos vagos. No exemplo, o paradoxo acontece porque não há
uma delimitação clara e objetiva a partir da qual certa quantidade de grãos de areia configura um
monte.
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Do mesmo modo, arrancando-se um fio de cabelo de alguém cabeludo não faz dele um
careca. Mas, dada continuidade ao processo de arrancar cabelos, em algum momento a pessoa
passará a ser qualificada de careca. Um homem de um metro e meio é baixo; é igualmente baixo
um homem com um metro, cinquenta centímetros e um milímetro. Ou seja, de modo geral, a falta
de limite claro nos termos vagos que cria a chamada “zona cinzenta” e faz da descida escorregadia
um perigo por não existir um momento específico em que possa haver a detenção do processo e
recusa em aceitar o próximo passo indutivo.
Nesta esteira existe também o argumento de efeito dominó que, sob a alegação da
possibilidade ou da ameaça da ocorrência de possível descida escorregadia, serve para
desaconselhar primeiros passos, sendo geralmente utilizado para obstar propostas incluindo
novidades ou modernizações, configurando uma modalidade de tática defensiva ou obstativa.
Neste tipo de argumento, as premissas são apenas prováveis, mas enunciadas como se
fossem certezas, ocultando o fato de a conclusão ser ainda menos provável que cada uma das
premissas, pois, a probabilidade de uma série de acontecimentos encadeados é sempre menor que a
probabilidade isolada de cada acontecimento. Ou seja, o que pode vir a se desenvolver não é certo
que vá efetivamente acontecer e, se assim for colocado, é que temos a falácia do efeito dominó.
Exemplificando: “Se você beber um copo de vinho, vai pedir mais um; bebidos dois copos, o
terceiro virá também; quem bebe três copos, bebe quatro e não fica em quatro; logo, se você tomar
o primeiro copo, tornar-se-á alcóolatra”.
O efeito dominó é falacioso porque acena com o estabelecimento de uma relação causal
– que não existe necessariamente – entre as premissas que convergem para a “tenebrosa”
conclusão. Na prática da vida, muitos tomam o primeiro copo e ficam nele; outros, não. Ou seja,
não é tomar o primeiro copo que fará de alguém alcoólatra, se outros componentes não estiverem
agregados. Claro que o abstêmio não corre o risco de se tornar alcoólatra, mas isto é outra conversa.
Em lógica, duas proposições podem ser juntadas por meio de operadores lógicos – ou
conectivos lógicos – para formar uma proposição composta, cujo valor verdade dependerá apenas
da verdade das proposições componentes. Na linguagem natural é comum o uso de frases que
compostas por meio de conectivos lógicos formam outras, novas, diferentes e gramaticalmente
válidas. Na linguagem natural, os operadores lógicos mais usados são: “e” (conjunção), “ou”
(disjunção), “se, então” (implicação) e “se e só se” (equivalência).
Exemplificando:
feitos. E se não foi jogar bola com os amigos, então, é o caso de que não fez todos os exercícios.
6) “Um número é múltiplo de cinco se e só se terminar em zero ou cinco” é exemplo de necessário
e suficiente. Se um número é múltiplo de cinco, então, termina em zero ou cinco. Se um número
termina em zero ou cinco, então é múltiplo de cinco.
A forma do enunciado conjuntivo é geralmente expressa por: “p . q”, onde “p” e “q”
são proposições completas. O ponto “.” colocado entre p e q é traduzível na linguagem coloquial
por “e”.
p q p.q
v v v
v f f
f v f
f f f
Note, então, que “p” e “q” combinados pela forma conjuntiva formam um terceiro
enunciado independente que para ser verdadeiro tanto “p” quanto “q” devem ser verdadeiros.
Além do usual “e”, palavras como “mas”, “todavia”, “embora”, “contudo” servem para
enunciar uma conjunção e realçar o contraste entre as proposições componentes. Se dissermos
“Lincoln foi assassinado em Washington, mas Kennedy foi morto em Dallas”, verificamos que o
significado lógico é o mesmo que se tivéssemos dito, “e” ao invés de “mas”.
Esta conjunção tem enorme utilidade no pensamento organizado para fazer análise
lógica de casos e suposições. O raciocínio humano, para tratar os acontecimentos do mundo, faz
uso dele para produzir uma árvore de possibilidades para depois tomar as mais variadas decisões.
Nos exemplos a seguir, suponha-se que alguém ao fazer afirmações minta na 2ª feira, 3ª feira e 4ª
feira e diga a verdade nos demais dias da semana26. Então, esta pessoa faz duas afirmações: 1) “Eu
menti ontem” e 2) “Eu mentirei amanhã”. Pergunta-se: em que dia da semana, partindo-se da
suposição, pode tal pessoa fazer estas duas declarações? No tratamento do problema há que se
montar uma árvore de possibilidades e analisá-las para afastar aquelas que não cumprem as
premissas e determinar o conjunto completo de soluções. A tabela a seguir retrata todos os casos
possíveis.
26
Problema adaptado a partir de “What is The Name of This Book”, p. 47.
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Pela tabela, que mostra todos os dias da semana, a pessoa só pode fazer a primeira
afirmação na 2ª feira (dia em que mente, pois, falou a verdade ontem – domingo) e na 5ª feira (dia
em que fala verdade e porque mentiu mesmo ontem – 4ª feira). Por outro lado, só na 4ª feira (dia
em que mente e falará verdade amanhã – quinta-feira) e nos domingos (dia em que fala verdade e
mentirá amanhã – segunda-feira) pode a pessoa fazer a segunda afirmativa. Assim, compostas as
soluções parciais, verifica-se que não há dia da semana que esta pessoa poderá fazer as duas
afirmativas simultaneamente sem incorrer em contradição com as premissas apresentadas.
no sábado ele fala verdade no dia, na véspera e no dia seguinte. Logo, a afirmação pode ser feita
tanto na 2ª feira quanto na 4ª feira.
8.1.1. Incoerência
A regra na negação informa que dadas duas proposições “p” e “não-p”, se uma delas é
verdadeira a outra é falsa. Ou seja, se “p” é verdadeira, sua negação “não-p” tem ser é falsa; se “p”
é falsa, sua negação “não-p” tem de ser verdadeira.
Com o advento do Art. 42229 do Código Civil de 2002, houve a imposição aos
contratantes guardar os princípios da lealdade e boa-fé. Objetivamente, o princípio da boa-fé diz
respeito ao conjunto de deveres exigidos nos negócios jurídicos, com destaque especial quanto aos
contratos, e tem por escopo regular a conduta dos contratantes, sob os prismas de honradez,
honestidade e probidade. Daí decorre o princípio que veda o “venire contra factum proprium”, este
consistindo na contraposição de duas atitudes diferidas no tempo e advindas da mesma pessoa,
lícitas isoladamente, mas causadoras de prejuízos às expectativas despertadas na outra parte por
serem incoerentes entre si. Ou seja, o “venire contra factum proprium” ocorre nas situações em que
uma das partes, por certo tempo, comporta-se de uma determinada maneira, gerando assim certas
expectativas na outra, mas a partir de certo momento desvia-se desse comportamento inicial,
modificando-o por outro, contrário, quebrando a confiança depositada pela outra parte no
andamento do negócio. Vários são os exemplos jurisprudenciais.30
28
A incoerência tem estreita relação com a prova “reductio ad absurdum” que a matemática usa bastante. Exemplo: ‘A soma de dois números é 75.
O primeiro é maior que o segundo por 15. Provar que o segundo número é 30’. Solução: suponha que o segundo número não é 30. Caso 1. O
segundo número é maior que 30. Então, o primeiro número é maior que 45 (maior que 30 + 15), fazendo que com a soma do primeiro (maior que
45) com o segundo número (maior que 30) seja maior que 75, contrariando a premissa. Caso 2. O segundo número é menor que 30. Então, o
primeiro número é menor que 45 (menor que 30 + 15), fazendo com que a soma do primeiro (menor que 45) com o segundo (menor que 30) seja
menor que 75 (menor que 45 + menor que 30). Logo, o segundo número não pode ser outro senão 30.
29
Código Civil de 2002, Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios
de probidade e boa-fé.
30
“Indenização - Dano moral - Negativação no Serasa e constrangimento caracterizado pela recusa do cartão de crédito, cancelado pela ré
(administradora) - Boa-fé objetiva - Venire contra factum proprium - Administradora que aceitava pagamento das faturas com atraso, cobrando
os encargos da mora e que, repentinamente, invoca cláusula contratual para considerar o contrato rescindido, a conta encerrada e o débito
vencido antecipadamente Simultaneamente providencia a inclusão do nome do titular no Serasa - Inversão do comportamento anteriormente
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O princípio do direito civil que veda alegar a própria torpeza em benefício próprio,
contido no brocardo de origem latina "nemo turpitudinem suam allegare potest”, também entra no
leque de proibição de comportamento incoerente.
Existe uma anedota sobre um interrogador impaciente que insistia em que o interrogado
respondesse com “sim” ou “não” às indagações feitas. O interrogado tentava explicar suas respostas
e era atalhado pelo interrogador impaciente que insistia nas respostas com “sim” ou “não”. O
interrogado, então, propôs que se o interrogador impaciente respondesse com “sim” ou “não” a uma
pergunta que ele faria, todas as demais indagações a ele dirigidas seriam respondidas também com
adotado e exercício abusivo da posição jurídica - Inviabilidade de considerar o contrato vencido antecipadamente e simultaneamente negativar o
nome do autor, quando a fatura do mês ainda não estava vencida e não havia, na comunicação de cancelamento, prazo parar quitação do débito -
Indenizatória procedente - Recurso improvido - Recurso do autor, buscando aumento da indenização, também improvido. (TJSP, Apelação com
Revisão n° 174.305.4/2-00, 3a Câmara de Direito Privado, Relator: Enéas Costa Garcia, 16/12/2005)
“SOCIEDADE EMPRESÁRIA. ADMINISTRAÇÃO. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Sócio estrangeiro, com visto temporário, impedido
de administrar as sociedades (art. 99 da Lei nº 6.815/80). Apelantes que aceitaram o encargo de administrador, com posterior outorga de
procuração ao sócio estrangeiro para atos de gestão bancária. Pretensão de se isentarem de eventual responsabilidade pelos atos de gestão.
Inadmissibilidade. Alegação da própria torpeza. Aplicação do princípio venire contra factum proprium. Precedentes. Sentença mantida. (TJSP, 2ª
Câmara Reservada de Direito Empresarial, Apelação nº 0225357-77.2009.8.26.0100, Relator: Tasso Duarte de Melo, 17/02/2014)
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“sim” ou “não”. O interrogador aceitou e foi abatido pela seguinte pergunta: “O senhor continua
deixando de sustentar seus filhos?” Observar que, tanto a resposta afirmativa quanto a negativa, não
conseguem afastar a informação implícita de o interrogador deixava de sustentar – no passado – ou
deixa de sustentar – no presente.
Só que as perguntas capciosas não estão restritas a anedotas. Algumas não são
inocentes nem inofensivas, podendo, em certos casos, englobar argumentos embutidos nos
pressupostos. Mesmo não sendo as perguntas proposições, podem conter pressupostos e acabar por
definir um conjunto de proposições. Então, se alguém responde uma pergunta dessas de maneira
direta, compromete-se decisiva e automaticamente com um conjunto de proposições que pode ser
desfavorável. No caso do exemplo acima, o pressuposto mais importante embutido na pergunta
capciosa formulada é que no passado o interrogador deixava de sustentar os filhos.
Agitadores para incitar a turba não raro recorrem a perguntas capciosas. No exemplo a
seguir parte-se do pressuposto implícito de que há intromissão – em que consiste? – imperialista –
sem especificar? – nos assuntos nacionais – que assuntos? – internos: “Até quando vamos suportar
a intromissão imperialista estrangeira nos assuntos internos da nossa nação?”.
Algumas pessoas são muito hábeis, na detecção e pronto afastamento, com elegância,
de perguntas complexas, como no exemplo a seguir, proporcionado por Mahatma Gandhi:33
repórter: “O que você acha da civilização ocidental?”, ao que Gandhi despejou: “Eu acho que seria
uma boa ideia”. Ao lidar com a pergunta complexa, Mahatma Gandhi questionou muito
elegantemente a premissa implícita, pois, se a civilização ocidental seria uma boa ideia, no futuro
do pretérito, então, não é, até o momento, uma realidade concreta.
Uma saída habitual para pergunta complexa é respondê-la com outra pergunta, com a
vantagem de, sem responder, colocar o questionador na posição de ter de dizer mais, o que pode por
fazê-lo trair a posição. Mas, este tipo de resposta pode atrair a alegação de que está usando de
evasiva para não dar resposta direta ou, então, receber de volta algo sintético como ‘a sua pergunta
não responde a minha’. Pergunta ‘respondendo’ pergunta pode esconder muitas sutilezas. Alguém
indaga: “Dizem que você ganhou na loteria, é verdade?” Pergunta direta e típica. Imaginando-se
devolvida uma observação na forma de pergunta: “Quem foi que anda dizendo isso?” pode trazer
encoberta a sugestão de que o fato ocorreu e que houve inconfidência de alguém, levando a
audiência suspeitar que a observação possa ser verdadeira e que não deveria ter sido revelada. Mas,
note-se bem, a rigor a pergunta não foi respondida.
Pode ser que a pergunta complexa não configure uma falácia, no caso em que as
pressuposições relevantes forem legitimamente assumidas pelas partes. Perguntar “Onde foi
aplicado o dinheiro que vocês roubaram?”, após o interrogado haver admitido que ele e comparsas,
de fato, surrupiaram o dinheiro não é falaciosa.
A pergunta complexa também pode ser inserida numa fala, fazendo com que o ouvinte
se imagine numa posição e dali tire conclusões não estritamente calcadas nos fatos, mas nos
aspectos emocionais, como por exemplo: “Este homem é um assassino, um facínora, alguém
pernicioso que praticou um crime hediondo. E facínora que é não pode ser libertado para voltar ao
convívio dos homens bons, honestos e trabalhadores, porque eles não ficarão seguros com alguém
tão mau à solta. Pense: será a próxima vítima dele?”
Vale advertir para um tipo de pergunta capciosa: aquela que independentemente das
circunstâncias a resposta não muda. Dependendo de como pode a resposta ser tirada do contexto,
complicações podem surgir para quem as responde incautamente. Exemplificando: pessoa do
governo, defendendo uma medida política polêmica, numa coletiva de imprensa, no encerramento
recebe a seguinte pergunta: “Alguém pode questionar essa proposta do governo em juízo?” Se, de
modo incauto, responder “Sim” sem maiores explicações pode ter o dissabor de ser tirado do
contexto e ler no dia seguinte estampado no jornal: “Fulano de tal acha que a política de estado ‘X’
pode ser questionada em juízo”. Explicando: o direito de ação é dito ser subjetivo de ordem pública
e nenhum caso pode ser subtraído da apreciação do Poder Judiciário. Só que os leigos não sabem da
possibilidade de o juiz extinguir, sem apreciação do mérito, os absurdos por sentenças terminativas,
pondo fim ao processo no nascedouro. Só que ação houve.
Tomado no sentido exclusivo o conectivo disjuntivo significa “um ou outro, mas não
ambos”. Ou seja, se as duas proposições unidas pelo conectivo disjuntivo forem verdadeiras ao
mesmo tempo, a sentença como um todo será falsa.
p q “ou” “ou”
exclusivo inclusivo
v v f v
v f v v
f v v v
f f f f
Para exemplificar com um caso de ‘ou’ exclusivo: nos países onde a bigamia é proibida,
dizer que “Fulano é casado com Beltrana ou Cicrana” não se admite a possibilidade de Fulano ser
casado concomitantemente com Beltrana e Cicrana.
p Q “ou”
Fulano casado com Beltrana Fulano casado com Cicrana exclusivo
v v f
v f v
f v v
f f f
Para exemplificar com um caso de ‘ou’ inclusivo, suponha que a bolsa de estudos seja
concedida de acordo com o seguinte: “Para pleitear bolsa o candidato tem de ter mestrado em física
ou mestrado em matemática”, obviamente quem tem mestrado em física e em matemática pode se
candidatar viavelmente.
p q “ou”
mestrado em física mestrado em matemática exclusivo
v v v
v f v
f v v
f f f
Outro bom exemplo de uso de ‘ou’ inclusivo aparece com a assinatura em cheques no
caso de a conta bancária ser do tipo conjunta – designada por “e/ou” – caso em que o título vale
quando há uma assinatura – de qualquer um dos dois correntistas – ou as assinaturas dos dois
correntistas.
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Muito embora não seja incomum na vida cotidiana haver situações em que o “ou” seja
tomado na modalidade exclusiva, em lógica, sempre se considera a modalidade de conjunção
inclusiva e o “ou” é usualmente representado por uma cunha “v”.
O dilema verdadeiro acontece das seguintes formas e funciona com o ‘ou exclusivo’:
P1 p ou q Hoje é 2ª feira ou 3ª feira
P2 não-p Hoje não é 2ª feira
C então, q Então, hoje é 3ª feira
ADCT da CF/88: Art. 29. (...) “§ 2º - Aos atuais Procuradores da República, nos
termos da lei complementar, será facultada a opção, de forma irretratável, entre as
carreiras do Ministério Público Federal e da Advocacia-Geral da União. (...)”
O falso dilema é uma falácia originada do uso abusivo de enunciado disjuntivo, porque
resta ferida a regra básica que manda sempre considerar a eventual existência de situações
intermediárias não passíveis de serem desprezadas34 entre as opções oferecidas como
aparentemente as únicas aplicáveis ao caso. Houve no passado um slogan famoso: “Brasil, ame-o
ou deixe-o”. Obviamente, há toda uma gama de situações intermediárias perfeitamente acomodadas
34
Lembrar que uma diferença só é diferença se faz diferença.
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à cidadania e que não podem ser ignoradas para dar sustentação ao propagandístico mote. E
também não pode passar despercebido que os verbos envolvidos ‘amar’ e ‘deixar’ admitem várias
acepções, fazendo sobressair um viés de ambiguidade no sentido do slogan.
Contra uma sentinela que não deu alarme quando o inimigo chegou: “Ou tu estavas em
teu posto ou não; se lá estavas, e não gritaste, atraiçoaste; se não estavas, faltaste ao dever; em
qualquer dos dois casos mereces a morte”. Há uma terceira hipótese: suponha-se que estava no
posto e fora dominado.
Existe um argumento apresentado por Grotius contra o emprego da tortura que é apontado
como falso dilema: “Ou o réu submetido à tortura é forte o bastante para poder resistir ou tão fraco
que sucumbe facilmente à dor. Se for forte, zombará da tortura. Se for fraco, mentirá para escapar à
dor. Em nenhum dos dois casos chegar-se-á à confissão da verdade por meio da tortura. Logo, em
nenhuma das hipóteses a tortura é justificada.” Consiste num falso dilema porque pode ser que o
valente torturado em algum momento sucumba à dor e fale a verdade. Pode também acontecer de o
covarde culpado admitir sua culpa tão logo lhe sejam exibidos os instrumentos de suplício.
Existe uma gama de sentenças equivalentes ao “se, então”: “no caso de p, então, q”;
“supondo que p, então q”; “toda vez que p, então q”; “todos os casos em que p, então q”; “sempre
que p, então q”; “qualquer vez que p, então q”; “em qualquer caso de p, então q”; “dado p, então q”;
“desde que p, então q”; “sob a condição de p, então q”; dentre outros. Cada uma destas estruturas
pode ser traduzida pela expressão “p => q”.
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O uso deste conectivo desempenha um papel fundamental na vida diária. “Se você não
pode convencê-los, confunda-os”35 (Harry S. Truman, Presidente dos EUA, 1884-1972) equivale a
“Se você não pode convencê-los, então confunda-os”; “A diferença entre azar e calamidade é esta:
se Gladstone caísse no Tâmisa, seria um azar. Mas se alguém arrastá-lo para fora, seria uma
calamidade”36 (Benjamin Disraeli, primeiro ministro do Reino Unido, 1804-1881) equivale a “...
Mas se alguém arrastá-lo para fora, então seria uma calamidade”.
p q p => q
v v v
v f f
f v v
f f v
35
Tradução livre de: “If you can’t convince them, confuse them.”
36
Tradução livre de: “The difference between a misfortune and a calamity is this: If Gladstone fell into the Thames, it would be a misfortune. But if
someone dragged him out again, that would be a calamity.”
37
Tradução livre de: “Someone said to me, 'If fifty percent of the experts in Hollywood said you had no talent and should give up, what would you
do?' My answer was then and still is, 'If a hundred percent told me that, all one hundred percent would be wrong.'” Marilyn Monroe
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Dado um condicional “p => q”, que, para efeitos didáticos será chamado condicional
original, derivam-se três outros que recebem nomes especiais e contam com propriedades
importantes:
2) Condicional converso de “p => q” é “q => p”, obtido pela troca do antecedente com o
consequente. A tabela verdade do condicional converso “q => p” é diferente da tabela verdade
do condicional original “p => q”:
q p q => p
v v v
f v v
v f f
f f v
3) O condicional inverso de “p => q” é “não-p => não-q”, obtido pelas negações tanto do
antecedente quanto do consequente. A tabela verdade do condicional inverso “não-p => não-q”
(abaixo) é diferente da tabela verdade do condicional original “p => q”. Entretanto,
comparando-se a tabela condicional inverso “não-p => não-q” com a do condicional converso,
ou seja, “q => p”, verifica-se que são iguais.
afã e apressado replica: “Isto é falso”. Assim fazendo, o Advogado de Defesa está complicando a
vida do seu cliente. Identificando na afirmação do Promotor serem p “réu é culpado” e q “agiu com
cúmplice” e lembrando que a proposição condicional só é falsa se p for verdadeiro e q for falso,
tem-se que o Advogado de Defesa está indiretamente admitindo que o réu é culpado (p verdadeiro)
e que agiu sem cúmplice (q falso). Logo, a afirmar, no exemplo, que o Promotor disse falsidade é
problemática para defesa.
Já sabemos: para um argumento ser válido, sempre que as premissas forem verdadeiras,
a conclusão deve também sê-lo-á. Assim, se um argumento é válido e as premissas são verdadeiras
o argumento é dito ser sólido. Na nossa vida social, de boa fé, perseguimos as situações deste tipo.
Em contraposição, o argumento estará instável se numa forma válida houver haver uso de
premissas falsas. Donde se conclui que o argumento precisa ser considerado apenas nos casos em
que a forma é válida (premissas verdadeiras implicam em conclusão verdadeira) e apenas com
premissas verdadeiras. Qualquer outro caso, estará fora do campo em que o argumento funciona de
forma sólida.
Quando alguém diz ‘se eu retornar para São Paulo antes das 6H00, então, vou encontrá-
lo na saída do trabalho’, duas situações se colocam: 1) cheguei em São Paulo antes da 6H00 e 2)
cheguei em São Paulo depois das 6H00. O argumento é para ser tomado em termos estritos,
devendo, então, ser considerada apenas a hipótese para a qual foi construído, a ‘1’. Entretanto, a
hipótese ‘2’, embora não afastada das possibilidades de ocorrência fática não é a que está cuidada
no argumento. Tanto é assim que: a) como não cheguei antes das 6H00, não vou encontrá-lo ou b)
mesmo tendo chegado depois das 6H00, resolvo ir encontrá-lo na saída do trabalho. E qualquer
uma das duas ‘a’ e ‘b’, caso aconteçam, não colide com a o argumento condicional original: ‘se eu
retornar para São Paulo antes das 6H00, então, vou encontrá-lo na saída do trabalho’.
P1 P2 Conclusão
p => q p q
v v v Ok
f v f
v f v
v f f
Tirando o caso em que o argumento é sólido (1ª linha da tabela: torneira aberta e água
no chão) e o caso em que a primeira premissa é desrespeitada (2ª linha da tabela), sobram dois
casos em que a premissa 1 é mantida: linha 3 – torneira fechada e água no chão e linha 4 – torneira
fechada e chão seco. No caso da torneira fechada e água no chão, nada impede, sem acontecer
qualquer incompatibilidade, que alguém tenha colhido água, fechado a torneira e, depois, deixado
água cair no chão. Ou seja, nada pode ser garantido – se torneira aberta ou fechada – se a situação
for analisada com base na existência de água no chão; o certo é que se a torneira for deixada aberta,
haverá água no chão. Fica patente a instabilidade do argumento no caso de excetuada a 1ª linha da
tabela.
P1 P2 Conclusão
p => não-q p Não-q
f v f
v v v ok
v f f
v f v
A tabela verdade para a negação do consequente é dada a seguir. Notar que na hipótese
em que as premissas P1 e P2 são verdadeiras (linha 4), a conclusão também é verdadeira:
P1 P2 Conclusão
p => q não-q não-p
1 v f f
2 f v f
3 v f v
4 v v v Ok
Negação do consequente
P1 Se o automóvel pega, então há gasolina no tanque de combustível
P2 Não há gasolina no tanque de combustível
C Logo, o carro não pega
A tabela verdade para a variante da negação do conseqüente é dada a seguir. Notar que
na hipótese em que as premissas P1 e P2 são verdadeiras (linha 3), a conclusão também é
verdadeira:
P1 P2 Conclusão
p => não-q q não-p
1 f v f
2 v f f
ARMADILHAS DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM
João Monteiro de Castro
14jun21
93
3 v v v ok
4 v f v
A tabela verdade tem de envolver 8 linhas porque temos três variáveis (p, q e r) e como
cada um dentre p, q e r tem duas possibilidades (v ou f), a tabela terá 8 linhas (2 x 2 x 2 = 8).
Partindo de uma tabela auxiliar mostrando as implicações materiais e, a seguir, montar a tabela do
argumento:
P1 P2 Conclusão
p => q q => r p => r
1 v v v ok
2 v f f
3 f v v
4 f v f
5 v v v ok
6 v f v
7 v v v ok
8 v v v ok
Observar que nas linhas 1, 5, 7 e 8 tem-se que, para cada linha, as premissas são
verdadeiras e a conclusão também. Observar também que não há linha em que as premissas são
verdadeiras e a conclusão falsa. Logo, este argumento é válido em caso como o seguinte.
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94
Atenção porque este argumento tem de ser lido da seguinte forma: p causa q; q causa r;
então, p causa r. Ou seja, não se aplica quando não houver necessariamente relação de causa e
efeito que não seja transitiva, como no seguinte caso: Alexandre é amigo de Bernardo e Bernardo é
amigo de Carlos, não necessariamente Alexandre é amigo de Carlos.
P1 P2 Conclusão
p => q q p
1 v v v Ok
2 f f v
3 v v f Fura
4 v f f
A negação do antecedente é uma falácia. Neste caso premissas são: “p => q” e “não-p”;
a conclusão “não-q”.
A tabela verdade para a negação do antecedente é dada a seguir. Notar que na linha 3 as
premissas P1 e P2 têm valor v e a conclusão tem valor f, o que invalida o tipo de argumento. Daí
vê-se que é possível montar caso em que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. O fato
de na linha 4 serem as duas premissas verdadeiras e a conclusão também verdadeira, por causa do
ocorre na linha 3, não tem o condão de validar o tipo de argumento. Isto acontece porque, como já
visto, um condicional não é equivalente lógico de se converso.
P1 P2 Conclusão
p => q não-p não-q
1 v f f
2 f f v
3 v v f Fura
4 v v v Ok
Mais uma vez, o argumento funciona para o caso de a torneira ficar aberta e não quando
a torneira não ficou aberta.
Os argumentos com “se”, “quando p, então, q” e “toda vez que p, então, q” funcionam
identicamente. Logo, a tabela verdade deles é a mesma que a já estudada “p => q” que é
contrapositivo de “não-q => não-p”.
São de bastante uso afirmações como “Somente se a combinação estiver correta é que o
cofre abrirá”. Há uma distinção fundamental entre as expressões “se” e “somente se”, porque têm
relevâncias comunicacionais bem diversas. A ideia transmitida é que se não acontecer a primeira
parte (combinação certa), a segunda parte (cofre abre) também não acontecerá. Há uma convenção
a ser obedecida: o “se” sempre é seguido pelo antecedente e, assim como o “então”, o “somente se”
vem atrelado ao consequente. Assim, para facilitar na avaliação deste tipo de argumento deve-se
sempre colocar o conectivo funcional no começo da primeira premissa e tratar o “somente se p, q”
como seu equivalente lógico “se não-p, então não-q”.
P1 P2 Conclusão
não-p => não-q não-p não-q
1 v f f
2 v f v
3 f v f
4 v v v ok
Usando o contrapositivo de (não-p => não-q) que é (q => p), o argumento “somente se
p, então, q” pode ser transformado em “se q, então p” mantendo a validade da forma de argumentar.
Vejamos:
q p q => p
v v v
f v v
v f f
f f v
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P1 P2 Conclusão
q => p q p
1 v v v ok
2 v f v
3 f v f
4 v f f
P1 P2 Conclusão
não-p => q não-p q
v f v
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v f f
v v v ok
f v f
Similarmente, pelo contrapositivo de (não-p => q) que é (não-q => p), tem-se que o
argumento também é válido apresentado de outra forma:
P1 P2 Conclusão
não-q => p não-q p
v f v
v v v Ok
v f f
f v f
Não pode passar despercebido que a tabela verdade do “a menos que p, então, q” é a
mesma que a do “ou inclusivo”, motivo pelo qual são equivalentes lógicos.
A menos que p, então, q A menos que o Ministério Público prove os fatos articulados
contra o réu, então, a denúncia deve ser julgada improcedente
não-p => q Se o Ministério Público não provar os fatos articulados contra o
réu, então, a denúncia deve ser julgada improcedente
Não-q => p Se a denúncia foi julgada procedente, então, o Ministério Público
(contrapositivo) provou a culpa do réu
George Bush, quando concorria pela presidência dos EUA contra Michael Dukakis, em
1988 usou duas vezes esta forma de enunciado condicional, compondo-as num enunciado
conjuntivo: “Meu oponente tem um problema. Ele não será eleito a menos que as coisas piorem e
as coisas não piorarão a menos que ele seja eleito”38. Analisando-se a primeira proposição
condicional reescrita: ‘meu oponente não será eleito’ a menos que ‘as coisas piorem’.
Considerando, para simplificar:
p = “coisas pioram”
não-p = “coisas não pioram”
q = “meu oponente não será eleito”
38
Tradução livre de: “My opponent has a problem. He won’t get elected unless things get worse – and things won’t get worse unless he gets
elected.”
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1) A frase 1: “Ele não será eleito a menos que as coisas piorem” = “A menos que as coisas piorem,
meu oponente não será eleito” = “Se as coisas não pioram, então meu oponente não será eleito =
(não-p => q). Aplicando o contrapositivo (não-p => q) = (não-q => p) e reescrevendo, temos:
“Se meu oponente for eleito, então coisas pioram”.
frase 1
não-q p não-q => p
f v v
v v v
f f v
v f f
2) A frase 2: “As coisas não piorarão a menos que ele seja eleito” = “A menos que meu oponente
seja eleito, as coisas não piorarão” = “Se meu oponente não for eleito, então, as coisas não
piorarão” (q => não-p).
frase 2
q não-p q => não-p
v f f
f f v
v v v
f v v
3) A frase 1 (“Se meu oponente for eleito, então coisas pioram”) está ligada à frase 2 “Se meu
oponente não for eleito, então, as coisas não piorarão”) pelo conector verofuncional ‘e’. Será
preciso fazer a tabela verdade para verificar se o argumento composto é válido e em casos as
premissas são verdadeiras:
p q p <=> q
v v v
v f f
f v f
f f v
P1 P2 C
p <=> q p q
1 v v v Ok
2 f v f
3 f f v
4 v f f
P1 P2 C
p <=> q q p
1 v v v Ok
2 f f v
3 f v f
4 v f f
Outro exemplo:
No plano jurídico, sendo “O” obrigatório, “V” vedado e “P” permitido e “c” conduta.
Com base no Princípio da Legalidade, tem-se: “Ninguém é obrigado fazer ou deixar de fazer
alguma coisa senão em virtude de lei”. Logo, vale o seguinte:
Quando se afirma “Se gosto de correr, então, gosto de escalar”, tem-se a seguinte tabela
verdade:
Partindo-se da proposição “Se gosto de correr, então, gosto de escalar”, vamos analisar
os casos a seguir para ver se algum deles é logicamente equivalente à afirmativa inicial:
não correr não escalar Se não gosto de correr, então, não gosto de escalar
f f v
f v v
v f f
v v v
Comparando com a tabela verdade de “Se não gosto de correr, então, não gosto de
escalar” com a tabela verdade da proposição inicial vemos que não são iguais, logo não são
ARMADILHAS DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM
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102
Note que as tabelas de “gosto de correr e gosto de escalar” e de “não gosto de correr ou
(exclusivo) gosto de escalar” são iguais, logo, são expressões equivalentes lógicas. Observe-se que
se for adotado o ou inclusivo, não serão equivalentes.
Porém, tomado o “ou inclusivo” as tabelas de “se gosto de correr, então, gosto de
escalar” e “não gosto de correr ou (inclusivo) gosto de escalar” são iguais, logo, são equivalentes
lógicos.
9. Quantificadores
Sem entrar em muitos detalhes para não ingressar ramo da lógica que usa uma notação
que vai além do que se pretende nesta introdução, existem dois quantificadores:
1) Quantificador universal – a propriedade vale para qualquer objeto “x” da classe; exemplo: “x” é
baleia, então “x” é mamífero;
2) Quantificador existencial – existe pelo menos um objeto “x” que ostente a propriedade;
exemplo: existe um número “a” de modo que a + b = b, ou seja, o elemento neutro da adição, o
zero.
Quando se diz: “Cada jogador do time de futebol tem uma bola para praticar” e não é
lícito concluir: “Logo, há uma bola com a qual todos os jogadores do time de futebol praticam”. A
premissa estabelece uma relação entre integrantes de dois conjuntos – jogadores do time e bolas
para praticar. Diz ainda mais a premissa: que existe relação entre cada elemento do primeiro
conjunto com algum – não especificamente um somente – elemento do segundo conjunto. A
conclusão extraída reafirma outro tipo de relação entre os integrantes dos dois conjuntos –
jogadores do time e bolas para praticar – dizendo que cada um dos elementos do primeiro conjunto
tem relação com apenas um elemento do segundo conjunto. Observe-se a figura abaixo. Apenas
para constar, está exemplificado no ‘caso 1’ uma – há outras – das possibilidades aventadas pela
premissa ‘cada jogador do time de futebol tem uma bola para praticar’, na qual cada jogador tem a
sua bola para praticar. Já o “caso 2” mostra a conclusão incorreta de que há uma bola com a qual
todos os jogadores praticam.
Caso 1 Caso 2
Cada elemento de A Cada elemento de A
está relacionado com está relacionado com
um elemento diferente apenas um elemento de
de B. B.
Irving M. Copi39 define falácia como uma forma de raciocínio que parece correta, mas
que, quando examinada cuidadosamente, não o é. Mais um aluno: “Tomemos a fração 16/6440;
agora, para simplificar, vamos cancelar o algarismo seis do numerador com o algarismo seis do
denominador e, então, chegamos ao resultado igual a ¼”; o professor interrompe: “Espere um
segundo! Você não pode cancelar o seis desse jeito!”; ao que o aluno concluiu sepultando os
esforços educativos do mestre: “Ah, então o senhor quer dizer que 16/64 não é igual a 1/4?”.
As falácias são acompanhantes permanentes na nossa vida social por conta de grandes
similaridades no padrão de comportamento das pessoas em geral. As pessoas se baseiam – não
deveria ser assim, mas é! – nas aparências para formar um juízo e o fazem de acordo com a própria
experiência pregressa, por boa ou ruim que seja. Isto faz com que exista uma marcante tendência a
generalizações a partir de um conjunto relativamente pequeno e setorizado de eventos e, de maneira
geral, observados, num dado momento histórico, por alguém – ou grupo de pessoas – pertencente a
certo grupo socioeconômico-cultural, produzindo uma imagem distorcida da realidade por não
considerar fatores com prevalências diferentes nas várias camadas da população em geral.
O olhar das pessoas também sofre distorção advinda dos preconceitos e outras cargas
emocionais, derivados de fatores tais como religião, profissão, classe social, dentre outros. Então,
alguns argumentos têm uma receptividade alterada, pois, as pessoas têm menor resistência a crer no
que elas querem emprestar crédito e no que evoluíram acreditando, tornando-as muitas vezes
incapazes de distinguir o que é relevante do que não é relevante. Simetricamente, as pessoas são
enormemente resistentes a aceitar influências oriundas dos grupos aos quais acreditam “não
pertencer”, até porque neste plano raramente agem racionalmente e seguindo padrões consistentes,
evitando até mesmo a preocupação de analisar as evidências disponíveis com mais profundidade e
trabalhar para alcançar conclusões mais sensatas. Assim, pensando de modo seletivo e polarizado,
as pessoas tendem a julgar prestigiando mais as superficialidades, as aparências e dando
prevalência extraordinária a aspectos de índole eminentemente subjetiva, em detrimento da
substância, que o devido senso de observação objetiva dos fatos levaria a distinguir.
39
Introdução à Lógica, p. 73
40
O mesmo acontece com 19/95 = 1/5, mas não se anime muito.... O professor só não pode querer expressar a nota do aluno, tentando valer-se da
mesma metodologia, com a fração 100/10, porque neste caso o aluno pode querer fazer a conta certa e querer nota 10, argumentando que não
pode ficar zero – nada? – no denominador.
ARMADILHAS DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM
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14jun21
105
É bem recorrente a divisão das falácias em dois grandes grupos: as formais e as não-
formais.
As falácias formais são aquelas que tendem a serem confundidas com padrões válidos
de argumentar e, por isso, são estudadas em conexão com eles (v.g. afirmação do consequente,
negação do antecedente, dentre outras).
Já as falácias não-formais são erros de raciocínio em que se pode cair por vários
motivos, conforme se verá. A doutrina subdivide as falácias não-formais em dois tipos: falácias de
relevância e falácias de ambiguidade. Nas falácias de relevância, as premissas são irrelevantes para
alcançar a conclusão pretendida e, portanto, incapazes de estabelecer a verdade desta conclusão. A
irrelevância é lógica e não psicológica, porque, neste plano, pode turvar o raciocínio e colher,
porque tivesse o contendor o cuidado de avaliar criteriosamente os argumentos falaciosos faria por,
inexoravelmente, revelar-lhes as falhas, afastando-os. E porque isso não acontece? Neste tocante,
não se pode deixar de revelar o papel desempenhado, isolada ou conjuntamente, por fatores como
emoção, contexto, medo, negligência, descuido, pressa, preguiça, necessidade, falta de
conhecimento, dentre outras causas.
Existe uma expressão latina atribuída a Augusto, “festina lente”, cujo significado é algo
como que “apressa-te devagar”41 muito útil para diferenciar rapidez e pressa. Fazer algo com
rapidez não é de modo algum desenvolver a tarefa atabalhoadamente tentando conclui-la sem
maiores considerações de qualidade. Rapidez não é pressa, é precisão, atenção e cautela
perseguindo um resultado de boa qualidade. Aliada ao raciocinar, é muito importante fazer uma
análise acurada de todas as facetas do argumento em contraste com a situação prática para não cair
em alguma simplificação indevida ou deixar de levar em consideração pormenores fundamentais.
É erro básico confundir velocidade de pensar com velocidade de agir. Perseguir sempre
velocidade faz com que negligenciemos a riqueza dos fatos. Pensar para agir é um processo prévio
à ação e se houver erro no processo de decidir bem o que, porque, onde, quando, de que modo e
quem pode levar a uma decisão comprometida, no mínimo, pela consideração de um conjunto
insuficiente de informações e sem levar em conta pormenores fundamentais.
41
A expressão é exemplo da figura de linguagem chamada oximoro ou paroxismo por relacionar conceitos contrários forçando o leitor a encontrar
um sentido metafórico para a aplicação conjunta deles.
ARMADILHAS DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM
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Aliada à pressa está a falta de atenção por qualquer seja o motivo, porque as situações
são cambiantes e uma solução boa num cenário, pode ser nefasta em outro. Uma história vale por
mil palavras. Um soldado casou-se e logo partiu para a guerra, ficando dois anos fora de casa. Ao
retornar, esperava-o toda linda e maravilhosa sua amada esposa. Tão logo a viu, beijou-a e foram
para um hotel. A farra foi boa e os dois praticamente desfaleceram, tão tórrida foi a noite de amor.
De manhã, são os dois acordados por vigorosas batidas na porta. O homem, acorda repentinamente
e ainda assonado, pergunta meio assustado para a mulher: “Será que é o seu marido?” A mulher,
também assonada responde acalmando-o: “Pode ficar tranquilo, meu marido está a cinco mil milhas
de distância”. E os dois acordaram de uma vez logo depois.
E o processo de pensar – tanto quanto agir – tem de prever folgas para acomodar
imponderabilidades e fatores não considerados – por pressa ou mesmo por ignorância – e que sejam
importantes ou mesmo vitais. Quem se atreve a pensar um plano de atravessar um deserto sem
dimensionar a quantidade de água com folga? Quem quer conquistar uma montanha gelada numa
antes escalada, tem como calcular com exatidão a quantidade de comida que vai gastar? Certo é que
quem, em casos como estes, não lida com folga, faz por aumentar exponencialmente os riscos de a
expedição terminar em tragédia. O processo de agir interferindo positiva ou negativamente no
mundo, põe em curso uma série enorme de mecanismos, alguns de difícil compreensão e apreensão
pelo intelecto, mas que não deixam de funcionar em respeito à nossa ignorância.
A emoção faz parte da forma de comportar dos humanos, está amalgamada no espírito
deles e age fortemente sobre alguns parâmetros relevantes nas tomadas de decisões, principalmente
porque tem elevado potencial poluidor e comprometedor da capacidade de raciocinar e criticar
coerentemente. Então, se não é possível humanamente eliminar completamente a emoção quando
estamos no processo de avaliar as situações e decidir, há que não se permitir que ela não impeça
que as cogitações e perguntas necessárias sejam feitas.
ARMADILHAS DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM
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14jun21
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A política é um inesgotável estoque de exemplos deste tipo de falácia que encontra eco
até na política internacional com ameaça de guerra, boicote e outras restrições. Exemplos:
42
Lições de Um Ignorante, José Álvaro Editor, Rio de Janeiro, 1967, pág. 113
43
SCHOPENHAUER, Arthur. A arte de ter razão: exposta em 38 estratagemas. 3ª edição. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. Páginas
34 e 37.
44
“In a war of ideas it is people who get killed” (Stanisław Jerzy Lec; 1909 – 1966)
ARMADILHAS DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM
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1) “The world is ruled by force, not by opinion; but opinion uses force.” (Blaise Pascal; 1623 -
1662); tradução livre: “O mundo é regido pela força, não pela opinião; mas a opinião usa a
força”;
2) “In the Soviet army it takes more courage to retreat than advance.” (Joseph Stalin; 1878 – 1953);
tradução livre” “No exército soviético é preciso mais coragem para retroceder do que para
avançar”.
3) “The Pope? How many divisions has he got?” (Joseph Stalin; 1878 – 1953); tradução livre: “O
Papa? Quantas divisões ele tem?”
4) “Speak softly and carry a big stick; you will go far” (Theodore Roosevelt; 1858 – 1919);
tradução livre: “Fale suavemente e carregue um porrete; você vai longe”.
“- Vou te dizer uma coisa, Menezes. Conheci teu pai, era um homem direito. Foi
meu amigo, eu fui amigo dele. Por isso te arranjei este cartório, te dei ele. Podia dar pra
outro. Mas se tu não fizer o que tou te dizendo eu esqueço que tu é filho do velho
Menezes...
Gritou chamando o capataz. Seu grito foi repetido através das roças pelos
trabalhadores que estavam na barcaça. O capataz veio apressado. Horácio ordenou:
- Mande Zé Comó aqui...
O escrivão olhava com medo. Medo de fazer o caxixe, aquele processo era perigoso,
medo de se negar ao que o coronel queria. O preto forte apareceu, vindo pela estrada, a
repetição no ombro.
- Boa-tarde, coronel...
- É só pra tu ver aqui seu Menezes. Guarda o rosto dele que pode ser que eu mande
tu levar um recado a ele em Itabuna... É um amigo meu... Pode ser...
45
São Jorge dos Ilhéus, 50ª edição, 1987, Rio de Janeiro: Editora Record. p. 223
ARMADILHAS DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM
João Monteiro de Castro
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Este tipo de argumentação baseada em força da posição encontra eco em muitos chefes
que com falsa cortesia fazem ameaças veladas, como por exemplo: “Há bons argumentos para
explicar a decisão de que este trabalho deve ser feito hoje. Estou ciente de suas ressalvas e até estou
disposto a ouvir suas sugestões, bem como discutir o assunto com maior profundidade antes de
você ir para sua mesa fazer a tarefa. Entretanto, pense bem por que se o trabalho não ficar pronto
ainda hoje a culpa não será minha e haverá consequências.”
Desmontar esta falácia, que tem inegável força psicológica, implica em identificar a
ameaça embutida nas afirmações falaciosas impingidas na audiência e, corajosamente, conseguir
realçar o estado lastimável da falta de argumentos racionais de quem está apelando para tão baixo
meio de coerção. Identificar exatamente qual o argumento que está sendo impingido pela ameaça
de força é necessário porque pode, em certos casos, não envolver irracionalidade.
46
Código de Processo Civil
Art. 405. Podem depor como testemunhas todas as pessoas, exceto as incapazes, impedidas ou suspeitas.
(...)
§ 3o São suspeitos:
I - o condenado por crime de falso testemunho, havendo transitado em julgado a sentença;
II - o que, por seus costumes, não for digno de fé;
III - o inimigo capital da parte, ou o seu amigo íntimo;
IV - o que tiver interesse no litígio.
§ 4o Sendo estritamente necessário, o juiz ouvirá testemunhas impedidas ou suspeitas; mas os seus depoimentos serão prestados
independentemente de compromisso (art. 415) e o juiz lhes atribuirá o valor que possam merecer.
47 As ofensas embutidas em argumentos contra a pessoa podem vir a serem consideradas crimes contra a honra. Então, muitos
argumentadores assacam-nas sutilmente e à base de indagações e sugestões para fugir à eventual configuração de crime.
ARMADILHAS DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM
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O objetivo do ataque é, por via da agressão direta à pessoa, seus motivos, seu caráter e
sua integridade criar uma atitude de desaprovação em relação a quem lançou o argumento e, por via
de uma contaminação emocional, alcançar desacordo da audiência em relação ao mérito do que a
pessoa teria defendido. No limite pode-se sugerir que o argumentador é louco ou mentalmente
desequilibrado, tornando-o não digno de fé ou que se lhe preste atenção.
Exemplos:
Exemplos:
1) Diálogo entre médico e paciente: médico: “O Senhor precisa parar de fumar”; paciente: “Doutor,
como pode o senhor dizer isto se fuma também”. Não há incompatibilidade na conduta do
médico fumante recomendar ao paciente parar de fumar porque, tecnicamente, os malefícios do
fumo são patentes e não é porque o médico não consegue se controlar e fuma que o cânone
profissional está afastado. Inclusive, é dever profissional de qualquer médico recomendar aos
pacientes práticas saudáveis, aí se inclui abandonar o cigarro. Portanto, o médico – fumante ou
48 Pesquisado em 08/08/20.
49 Pesquisado em 03/05/21.
ARMADILHAS DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM
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111
não – deve recomendar ao paciente que largue o hábito – vício – de fumar. Logo, o ataque
proporcionado pelo paciente não retira a pertinência da recomendação do profissional da
medicina.
2) Palestrante atacando a caça esportiva é questionado por alguém da plateia com argumentação
absolutamente desvinculada do mérito do que se discute, mas voltada contra peculiaridade
pessoal do expositor: “Pelos motivos apresentados, a caça esportiva não é defensável porque
implica num sacrifício desnecessário de animais apenas para divertimento humano”; plateia:
“Porque, então, o senhor usa sapato, pasta e cinto feitos do couro de inocentes reses que
perderam a vida para serem enfeites?” É de se indagar: se o expositor estivesse pelado o mérito
da argumentação dele seria diferente.
1) Alguém atacando a isenção de um parlamentar defensor de aumento de pena para delitos contra
a honra: “Como o nobre deputado Nicodemos tem imunidade parlamentar, é natural que ele
defenda aumento de pena para delitos contra a honra”. Primeiro, o mérito do conjunto dos
argumentos a favor do aumento da pena não foi sequer resvalado. Depois, a afirmação feita
coloca em dúvida a isenção do deputado no debate e, consequentemente, tachando suas razões
como viciadas porque advindas de pessoa que só as sustenta por não responder pelas regras que
entende deverem ser endurecidas.
Consiste em fazer notar – reação de igual índole: ataque pessoal – que a pessoa que
lançou o primeiro argumento fundado no ataque pessoal não pratica o que diz ou há alguma
inconsistência com algo dito ou apresentado anteriormente. Diferencia-se da falácia “red herring”
porque a réplica é, em si, um ataque autônomo e independente contra a figura do acusador.
Mesmo sendo uma tática diversionista, por voltar-se diretamente contra a pessoa que
fez a acusação inicial, a réplica “tu quoque” leva o acusador para uma posição defensiva, tirando-
lhe o ímpeto e, muito frequentemente, compelindo-o à defesa. Exemplo:
Chefe: “O senhor precisa ser mais cortês, moderar na forma que trata os clientes, que
merecem toda a nossa atenção e delicadeza.”
Subordinado: “Algum cliente pode até ter reclamado de eu ter modos rudes para tratá-
los. Mas eu já ouvi outros empregados da companhia reclamar da maneira grosseira
como são tratados pelo senhor. Logo, não é o senhor a pessoa mais indicada para
censurar-me.”
“Óbvio que Deus existe. Ninguém pôde provar o contrário”. Existem dois defeitos
nestas proposições. Primeiro, o que existe, existe por si. Ou seja, para dizer que algo existe, o
necessário é provar que existe e lidar com provas depende muito do estado da técnica. Campos
elétricos, raios cósmicos, magnetismo existem, apesar de não visíveis a olho nu, e foi preciso
acontecer a evolução da ciência para constatar a existência física dessas grandezas. Nada impede
que haja outras coisas ainda não descobertas na natureza. O certo é que a partir da constatação da
existência delas a ciência alcançará meios de aferi-las qualitativa e quantitativamente. Segundo,
sempre se pode questionar o que seria a prova da inexistência. Este método para ser aceito –
suposição para argumentar – imporia que toda e qualquer prova deveria ser tentada antes para
50
CF/88
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
(...)
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João Monteiro de Castro
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concluir pela inexistência. Aceitar argumento do tipo do apresentado pode implicar na ‘prova’ da
existência de toda e qualquer coisa, existente ou inexistente: unicórnios, grifos, elefantes, bichos de
pelúcia etc.
Outra face desta mesma linha de argumento: “A tão decantada telepatia não existe
mesmo. Ninguém jamais foi capaz de provar sua existência”. Ainda não existe certeza científica da
existência ou inexistência da telepatia, mas não é porque ninguém ainda conseguiu provar a
existência de algo que se autoriza concluir que esta coisa não exista. Houve tempo em que os
homens não detinham a técnica de provar a existência dos raios ultravioletas, por exemplo, e nem
por isso deixavam de ser queimados por eles. Por este tipo de argumento, é possível provar que as
coisas que existem e ainda não foram descobertas não existem.
Nada impede, similarmente, que mudanças de posturas não possam ser alicerçadas em
argumento de ignorância e que, diante de uma pergunta difícil de ser atacada, é feita uma afirmação
do gênero: “não há evidência neste sentido, mas, também não há no sentido contrário”.
O Princípio do “in dubio pro reo” é uma das salvaguardas jurídicas modernas contra a
aplicação do “Argumentum ad ignorantiam” pela acusação. O dilema apresentado a seguir em
função da sistemática legal imposta pelo ordenamento jurídico penal é resolvido em prol do réu:
Acusador: “Como o réu não provou sua inocência, é culpado”; Defensor: “Como a acusação não
provou que o meu cliente é culpado, ele deve ser absolvido.”
No processo penal, há uma opção legislativa no sentido de que a acusação é quem tem o
ônus de provar os fatos imputados ao acusado para lograr a condenação. A defesa, por sua vez, tem
de, no mínimo, desgastar a acusação e introduzir dúvidas acerca da culpabilidade do acusado para
lograr absolvição. Existe uma opção legislativa em prol da defesa e, então, à míngua de provas que
suportem condenar, o réu deve ser absolvido, ainda que sob o fundamento da falta ou insuficiência
de provas.
51
Código Civil
Art. 7o Pode ser declarada a morte presumida, sem decretação de ausência:
I - se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida;
II - se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra.
Parágrafo único. A declaração da morte presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações,
devendo a sentença fixar a data provável do falecimento.
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Nem sempre houve a opção em prol do réu. No direito antigo existia uma prova
judiciária, chamada ordália ou ordálio, a que se submetia o acusado para demonstrar sua inocência
– ou, indiretamente, culpa – por meio de testes envolvendo elementos da natureza e cujo resultado
era visto como Juízo de Deus (judicium Dei), como, por exemplo, mergulhar mãos e braços em
água fervente ou caminhar sobre um tapete de carvão em brasa e similares.
No processo civil, em certos casos, se o réu não apresentar defesa no prazo e forma que
a lei prevê, há situações em que se presumem verdadeiros fatos alegados pelo autor não
impugnados na defesa.
A falácia acontece quando, para que a audiência aceite certa conclusão sem maiores
indagações e sem verificar os fundamentos do pleito, é feito apelo à piedade ou à compaixão. Uma
análise não emocional da situação colocada implica reconhecer que o apelo à piedade não é
evidência pertinente para dar suporte à conclusão proposta, que, até por outros motivos pode ser –
ou não – verdadeira. Mas, muito importante, nem todo apelo à piedade é impertinente.
“Querido professor, boa tarde. Meu nome é Jundiá dos Palmares52 e sou seu aluno de
quinta-feira na P.... Venho, por este e-mail, questionar quanto a dois assuntos da aula: o
primeiro é se o senhor possui o esquema de aula e o material da matéria já ministrada
(ou pelo menos uma orientação de estudos). Minha esposa está grávida e estou com
alguns problemas pessoais graves (a gravidez dela é de risco e estou com problemas de
saúde). Assim sendo, tenho a segunda pergunta: se o senhor faz chamada e se reprova
por falta. Usualmente não questiono este tipo de informação por e-mail, mas devido à
minha situação atual neste último semestre da faculdade, não tive outra escolha.
Pretendo, obviamente, ir em sua aula o máximo de vezes possível, mas com esse
problema pessoal, a situação está delicada não só com sua matéria, mas com todas as
52
Este email foi, de fato, recebido por um professor meu amigo. O autor, para homenagear José Cândido de Carvalho e evitar expor a tão
depauperada situação do aluno lamuriento, resolvi trocar o nome dele por um dos personagens do saudoso autor de ‘O Coronel e o Lobisomem’
(Vide p. 14, da obra Os Mágicos Municipais).
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É preciso ter muito cuidado ao tratar do desmonte do apelo à piedade para a audiência
não ficar com a impressão de crueldade quanto a quem está confrontando a afirmação falaciosa.
Psicologicamente, a audiência pode vir a inclinar-se da seguinte forma: “Esse é um desalmado e
está dando vazão à pura maldade, então esta vítima da sorte merece nossa compreensão.”
Pode haver a situação inversa: “Como esta quase criança pode ser condenada? Vejam a
pobre mãe dele chorando ali na primeira fileira. Só a mãe de um inocente chora assim.” Detalhe
fundamental: nunca, nunca mesmo, despreze a “compreensão” indulgente da audiência.
Como bem coloca Irving M. Copi: “Diante da tarefa de mobilizar o sentimento público
a favor de uma determinada medida, ou contra ela, o propagandista54 evitará o laborioso processo
de reunir e apresentar provas e argumentos racionais, recorrendo a métodos mais rápidos do
argumentum ad populum. Se a medida proposta introduz uma mudança, e ele está contra essa
mudança, expressará suas suspeitas sobre as “inovações arbitrárias” e elogiará a sabedoria da
“ordem existente”. Se estiver a favor da mudança, falará das “virtudes do progresso” e opor-se-á
aos “preconceitos antiquados”.”55
A massa majoritária, entendendo em certo sentido, tende a impor sua opinião aos
minoritários. Como bem coloca D. Q. McInerny:56 “Se a maioria das pessoas de uma sociedade tem
53
Código de Processo Civil
Art. 982. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se
o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.
(...)
§ 2º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei.
Código Civil
Art. 1.512. O casamento é civil e gratuita a sua celebração.
Parágrafo único. A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão serão isentos de selos, emolumentos e custas, para as pessoas
cuja pobreza for declarada, sob as penas da lei.
54
No Brasil, usam-se indistintamente os vocábulos propaganda e publicidade, muitas vezes confundindo os dois. Publicidade e propaganda
guardam, no sentido jurídico, diferenças marcantes. A propaganda respeita a propagação de princípios, ideias, conhecimentos ou teorias de cunho
ideológico, religioso, filosófico, político, econômico ou social. A publicidade, por sua vez, é a arte de exercer uma ação psicológica sobre o
público com fins comerciais ou políticos. De modo geral, a publicidade é paga, identifica o anunciante, o que nem sempre ocorre com a
propaganda. A diferença fundamental é que a publicidade visa o benefício do anunciante em decorrência da preferência do público, ao passo que,
quase sempre, a propaganda tenta moldar a opinião, entretanto excluindo a ideia do benefício econômico imediato.
55
Introdução à Lógica, p. 80
56
Use a Lógica, p. 140.
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a opinião de que preto é branco e branco é preto, meus pêsames para a opinião da maioria das
pessoas dessa sociedade. Se alguma coisa é preta ou branca, não é questão de opinião subjetiva,
mas um fato objetivo. Assim, deve-se reconhecer que, em um nível emocional, a falácia
democrática pode ser muito persuasiva. Como muitas grandes figuras da história descobriram, não
é fácil levantar-se contra uma multidão quando esta acredita que o preto é branco e o branco é
preto.”
Muitas pessoas são sensíveis e, simplesmente porque a maioria entende num certo
sentido, diminuem a resistência e passam a assim acreditar também. As prévias de intenção de voto
antes das eleições constituem verdadeiras lutas entre institutos de pesquisas, tudo para dar margem
ao político pedir voto sob o “argumento” de que a maioria está com ele porque suas propostas são
as melhores. E este combate pelo voto, obviamente, é feito sem que o candidato se veja na difícil
posição de explicar concretamente quais seriam suas ‘excelentes propostas’. A prática mostra que
as pessoas indecisas tendem a posicionar-se de acordo com a maioria. Entretanto e
fundamentalmente, uma atitude consagrada pela aceitação popular não é necessariamente
verdadeira ou mesmo razoável. Exemplo: “Eu, assim como toda a massa de pessoas sensatas que
querem evitar que os filhos fiquem intoxicados pelos venenos alopatas, sempre tratei meus filhos
com remédios homeopáticos; são os melhores.”
“A priori” não se pode dizer que o apelo ao sentimento popular está errado. O mundo
está repleto de exemplos de pessoas confiando nas outras com base no puro instinto. Num mundo
competitivo passa-se necessariamente pela etapa de chamar a atenção da massa – consumidores ou
eleitores – para as boas qualidades do que estiver sendo divulgado, produto, serviço, campanha
eleitoral ou outro. Mas uma vez, obtida a atenção do público, devem cessar os apelos emocionais e
a divulgação prosseguir com base em argumentos objetivos e informativos para persuadir e obter a
adesão dos destinatários. Isto sem falar que, às vezes, o conjunto vem aliado a um apelo disfarçado
à autoridade.
Discorrendo sobre o argumento de autoridade, muito usado nas lides judiciárias, assim
se expressa Carlos Maximiliano58: “Sempre se usou nas lides judiciárias, com excessiva frequência,
bombardear o adversário com as letras de arestos e nomes de autores, como se foram argumentos.
O Direito é ciência de raciocínio; curvando-nos ante a razão, não perante o prestígio profissional de
quem quer que seja. O dever do jurisconsulto é submeter a exame os conceitos de qualquer
autoridade, tanto a dos grandes nomes que ilustram a ciência, como a das altas corporações
judiciárias. Estas e aquelas mudam frequentemente de parecer, e alguns têm a nobre coragem de o
confessar; logo seria insânia acompanhá-los sem inquirir os fundamentos de seus assertos, como se
eles foram infalíveis. Nullius addictus jurare in verba magistri: “ninguém está obrigado a jurar nas
palavras de mestre algum.” (...) A facilidade em achar autoridades pró e contra, sobretudo nas
questões sérias, demonstra a fraqueza de semelhante modo de persuadir e vencer. Repitam-se as
razões, não os nomes apenas; afirmações, sem justificação expressa, podem ser o fruto de
inadvertência. Quando os argumentos são fracos, insuficientes, ou nem existem sequer, diminuída
há de ser a confiança na doutrina, embora de alto tribunal, ou de grande jurisconsulto. Excetuam-se
os assertos relativos a questões pacíficas, os quais os escritores repetem sem justificar. Há um caso
em que o argumento de autoridade se torna muito forte; é se ele se reveste de característicos da boa
jurisprudência, isto é, se traduz um parecer uniforme e constante. “Quando a doutrina dos escritores
aparece como um feixe compacto, um bloco, melhor ainda quando é unânime, constitui uma
autoridade muito positiva, que, sem excluir absolutamente o critério profissional do intérprete, lhe
impõe grande prudência para romper de frente, contra o que a mesma lhe sugere”. Apesar da
fraqueza do argumento de autoridade, não deve abandoná-lo, em absoluto, o profissional. Faz efeito
na multidão; e o advogado, ou polemista, não pode desprezar esse fator de prestígio e êxito.
Convém invocá-lo para contrabalançar o triunfo resultante de citações de autores e arestos pelo
contraditor.”
Só que ninguém é campeão em tudo. É muito comum serem vistas citações, sobre os
mais variados assuntos, atribuídas a Albert Einstein, um dos maiores físicos de todos os tempos;
físico. Ou seja, numa discussão sobre física relativística, a opinião de Albert Einstein sobre o
assunto era verdadeiramente relevante. Entretanto, é preciso tomar com muita reserva suas opiniões
sobre política internacional e pacifismo porque nestes campos tão particulares ele não desfrutava de
autoridade da mesma estatura que tinha quando o assunto era física relativística.
58
Hermenêutica e Aplicação do Direito, 9ª edição, Forense: Rio de Janeiro, 1981. p. 272.
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1) Não é autoridade qualificada no assunto tratado; Exemplo conhecido é uma frase atribuída ao
excepcional jogador de futebol Pelé: “Brasileiro não sabe votar.”;
2) Mesmo que a pessoa opinante seja autoridade no assunto tratado não está agindo de forma
isenta; Exemplo: médico pesquisador de reconhecido renome técnico, porém, subsidiado pela
indústria do tabaco, dando opinião mitigada sobre os malefícios do fumo no organismo humano;
4) A autoridade fazendo piada ou por outro modo privada da seriedade necessária e senso –
embriaguez, por exemplo – quando faz comentário não pertinente sobre assunto de seu âmbito
de conhecimento. Exemplo famoso e que causou tensão no cenário internacional foi
proporcionado por Ronald Reagan, ex-Presidente do EUA de 1981-1989, por dizer, no dia
11/ago/1084, o seguinte a título de piada, quando testava o funcionamento do microfone, antes
de um pronunciamento oficial: ''My fellow Americans, I'm pleased to tell you today that I've
signed legislation that will outlaw Russia forever. We begin bombing in five minutes.” (Ronad
Reagan, 11/08/1984); tradução livre: “Meus compatriotas americanos, tenho o prazer de dizer
hoje que eu assinei a legislação que vai proibir a Rússia para sempre. Nós começamos a
bombardear em cinco minutos.” (https://www.youtube.com/watch?v=bN5wL1nw7XA
pesquisado em 26/06/17).
5) O assunto não é uma área do conhecimento legítimo, reconhecida ou válida. Exemplo: opinião
de um “especialista” em ufologia sobre a aparição do ET de Varginha ou sobre as Figuras de
Nazca ou sobre a construção das Pirâmides do Egito.
Muito embora o ideário popular diga que “Toda regra tem exceção” e que “A exceção
confirma a regra”, estas duas máximas devem ser vistas com muita reserva.
59
Tradução livre: "da asserção não qualificada para a qualificada";
60
Tradução livre: "da asserção qualificada para a não qualificada";
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De modo mais rigoroso, deve-se considerar para lidar com regras e exceções o seguinte:
- A exceção – se houver – não se submete à regra;
- A exceção não faz a regra.
10.7.1. Acidente
Comete a falácia do acidente quem, num caso que comporta exceção, aplica
indiscriminadamente uma regra geral sem maiores considerações. A sabedoria popular consagra
esta falácia com a máxima que, a rigor, é falsa: “A exceção confirma a regra”.
No direito são muito comuns exceções que devem ser aplicadas em razão de
pormenores do caso em pauta. Quanto aos dispositivos legais, todos que contenham expressões
como “salvo”, “exceto” e outros restritivos trazem exceção ao princípio geral. No arrazoado:
“Matar as pessoas é sempre um crime odioso; logo, todos que matam deveriam ser exemplarmente
punidos com a morte” cabem vários comentários, todos suportados na lei brasileira:
Nem sempre ferir as pessoas é lesão corporal, pois, se assim fosse: “Os médicos
cirurgiões ferem as pessoas seriamente quando fazem operações; logo, os médicos cirurgiões são
uns criminosos” colocaria na ilegalidade qualquer cirurgia feita em benefício dos pacientes. Mas,
sabiamente, a lei trata as lesões corporais consentidas pelo paciente – ou por quem de direito – e
perpetradas pelo médico ao tratá-lo como exercício legal da profissão de médico.
mal nas provas e recebido nota abaixo da média de aprovação, pudesse manejar viavelmente o
seguinte linha para advogar pela aprovação: “Professor, a Constituição diz que todas as pessoas são
iguais, então, como o desempenho dos meus colegas foi considerado suficiente para aprovação,
esforcei-me muito para ser reprovado; logo, exijo, em nome do princípio da igualdade, ser
aprovado também”.
Uma afirmação do gênero "Se em toda guerra é sempre lícito matar, então é sempre
lícito matar" comporta uma série de questionamentos. O primeiro é que não é lícito, mesmo em
estado de guerra, matar indiscriminadamente. Se assim fosse, coitados dos inimigos pessoais...
Depois, mesmo os combatentes inimigos não podem ser mortos sem critério, pois, se matar fosse
lícito absolutamente, numa análise puramente econômica, é mais barato e simples executar
liminarmente os prisioneiros, ao invés de gastar recursos mantendo-os aprisionados. A exceção não
faz a regra. A guerra há sempre de ser tratada como um período verdadeiramente excepcional que
cobra muitos sacrifícios e revisão de valores, impondo aos súditos de um Estado uma cruzada pela
sobrevivência, não só pessoal, mas também em conjunto, como nação. E eventualmente, os
combatentes podem vir a matar algum inimigo em situação de combate.
O princípio da razão suficiente informa: tudo que existe no universo físico tem uma
explicação para existir, sugerindo que coisa alguma há que se autoexplique ou é a causa de si
mesma.
No Novo Dicionário da Língua Portuguesa61 causa é “termo relacionado com efeito que
se concebe de maneiras diversas, que se compreendem a partir de dois enfoques fundamentais: a)
relação entre um ser inteligente e o ato que ele praticou voluntariamente e pelo qual é responsável;
b) vínculo que correlaciona os próprios fenômenos e que faz com que um ou vários deles apareçam
como condição de existência de outros”.
Os eventos na natureza não ocorrem sem mais nem menos, mas apenas sob
determinadas condições, assim entendidos os antecedentes necessários sem os quais o efeito não
ocorre. E causa difere de condição. A condição é dita necessária quando é absolutamente
imprescindível para o surgimento de determinado resultado, que não ocorrerá se não for preenchida
(não-p => não-q equivale a q => p); várias podem ser as condições necessárias. Condição
suficiente, por sua vez, é aquela que se ocorrer garante necessariamente a existência do efeito
condicionado. Suprida a condição suficiente o resultado ocorrerá (p => q).
Na vida cotidiana, o que normalmente chamamos causa é, então, uma causa necessária.
Acionar o interruptor do farol do automóvel é algo necessário para o farol acender, mas não uma
61
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 3ª edição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. P.
299.
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causa suficiente porque o farol não acenderá se a lâmpada estiver queimada, ou a bateria estiver
sem carga ou se não houver lâmpada etc.
Descobrir a cadeia de eventos que levaram, efetivamente, a certo resultado é das tarefas
mais instigantes, complexas e absorventes. Esta investigação dedicada é absolutamente necessária à
produção do conhecimento, até porque o fato de haver correlação positiva entre dois eventos é um
indício de que pode haver relação causal entre eles. Mas, a correlação inicial entre os
acontecimentos deve dar início a pesquisas para excluir outras possíveis causas até sobrar
argumentos fortes em prol de uma relação causal.
Para investigar as relações entre causas e efeitos, David Hume propôs alguns critérios
empíricos:
1) A causa e o efeito devem ser próximos no espaço e no tempo.
2) A causa deve ser anterior ao efeito.
3) Deve haver uma união constante e consequencial entre causa e efeito. É, principalmente, essa
qualidade que constitui a relação de causalidade.
62
Código Civil: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda
que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Código Penal: Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a
ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.
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4) A mesma causa sempre produz o mesmo efeito e o mesmo efeito nunca surge senão da mesma
causa.
5) Onde várias causas diferentes sempre produzem o mesmo efeito, deve ser por meio de alguma
qualidade que se revela comum entre eles.
6) A diferença nos efeitos de duas causas similares deve advir daquele particular que diferencia as
duas.
7) Quando qualquer efeito aumenta ou diminui com o aumento ou a diminuição de sua causa, isto
deve ser visto como um efeito composto, derivado da união de vários efeitos diferentes que
surgem das diversas partes da causa.
8) Um objeto, que existe em qualquer momento em sua plena perfeição sem qualquer efeito, não é
a única causa daquele efeito, mas exige ser auxiliado por algum outro princípio, que pode
encaminhar sua influência e operação.
A falácia da falsa causa está intimamente ligada à ignorância e à superstição, não sendo
raro pessoas atribuírem a certa sequência de palavras, fatos ou pensamentos a característica de
antecipação de acontecimentos nefastos. O erro básico embutido na falsa causa está em
negligenciar outros fatores, além da correlação positiva anteriormente detectada, que podem
desempenhar papel importante na avaliação causal de dois acontecimentos.
São vários os tipos de erros na identificação da relação causal entre dois ou mais
eventos correlacionados. Vejamos alguns:
2) Apesar de dois eventos estarem correlacionados, ambos podem ser causados por um terceiro
evento. Exemplo: o barulho do chuveiro elétrico fica mais forte e a água sair quente são, ambos,
causados pelo acionamento do registro diminuindo a vazão de água.
3) Às vezes a cadeia de eventos é mais complexa do que aparenta. Pode ser que a relação fique
mais evidente quando toda a cadeia de eventos seja mais bem explicitada. Exemplo: ao frear o
automóvel, acontece um barulho que começa embaixo do carro, na parte de trás, e vem
deslocando-se para frente. Melhor investigando, descobriu-se que havia um parafuso solto
dentro da longarina. A frenagem causa o barulho, mas não é a causa direta.
5) A relação causal pode ser entendida em sentido contrário. Exemplo: o antigo slogan publicitário
de biscoito: “Tostines é fresquinho porque vende mais ou vende mais porque é fresquinho?”
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6) Na relação causal às vezes a proporção entre a causa e o efeito não pode ser ignorada porque
pode mudar o efeito. A chuva é boa para as colheitas, mas muita chuva provoca a perda e falta
de chuva tem igual efeito nefasto.
Vale anotar que apresentar hipóteses de relações causais não é, em si, incorreto ou
falacioso, desde que haja abertura na formulação do argumento para haver revisão e correções em
face de investigações e novas provas. A ciência evolui assim.
Schopenhauer63 sugere no estratagema 33: “‘Isto pode ser correto na teoria; na prática
falso.’ Com esse sofisma admitem-se os fundamentos, porém negam-se suas consequências, em
contradição com a regra “a ratione ad rationatum valet consequentia” [de uma ração ao seu efeito
vigora a consequência]. A afirmação citada gera uma impossibilidade: o que é correto na teoria
deve valer também na prática: se isso não se confirma é porque há alguma falha na teoria; algo
passou despercebido e não foi levado em consideração e, por conseguinte, é falso também na
teoria.”
63
SCHOPENHAUER, Arthur. A arte de ter razão: exposta em 38 estratagemas. 3ª edição. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. P. 48.
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subdivida em duas espécies: cum hoc ergo propter hoc e post hoc ergo propter hoc.
As pessoas, muitas vezes, agem como se forças desconhecidas militam contra elas:
“toda vez que me proponho a lavar o carro, começa a chover”. Ou então, os supersticiosos de
plantão: “minha orelha começou a arder, sinal de quem está falando mal de mim”. A mera
concomitância de eventos não revela “a priori” haver uma causa comum determinando-os.
Mas, nem sempre, os argumentos vêm amalgamados em torno de ideias e fatos que
precisam ser previamente esclarecidos. Uma afirmação como “Os americanos são sempre
favoráveis às soluções bélicas porque é começar a guerra e eles lucram incrivelmente” comporta
várias instâncias de questionamentos prévios, que colocam em xeque haver uma causa comum ao
eventual lucro dos americanos com a guerra. Um primeiro e trivial é: os americanos são mesmo
sempre favoráveis às soluções bélicas? É uma generalização descabida porque há americanos e
americanos. Outra indagação é: se a solução bélica for dentro do território dos Estados Unidos será
que eles lucrarão com ela? O que é lucrar incrivelmente? Não será que, pelo perfil empresarial dos
americanos, eles sempre lucrem incrivelmente? Estes questionamentos são importantes porque
colocam dúvidas que precisariam ser antes resolvidas, amortecendo a força peremptória do
argumento e dando um contorno mais específico na afirmação, para, se o caso e oportunamente,
ingressar no mérito para rebatê-lo, vale dizer, desmontar a suposta relação de causa e efeito
embutida no argumento.
Esta falácia é cometida quando um fato que aconteceu antes é tomado sem maiores
cautelas como causa de um segundo fato superveniente. O erro amalgamado no argumento post
hoc reside na negligência de outros fatores – além da correlação positiva incorretamente apontada –
que podem ser importantes na avaliação causal entre os acontecimentos.
“Quando sua orelha está quente, é porque – já sabemos – alguém andou falando mal de
você. Vá dizendo o nome dos suspeitos, quando a orelha parar de arder, é esse”. Uma
peculiaridade: quem fez afirmação não é quem está com a orelha quente. Então, não pode ser
descartada a hipótese de o interlocutor estar caçoando do destinatário, este sim que pode achar
haver a relação de causa e efeito entre sua orelha quente e alguém falando mal dele. Outro detalhe:
que prova há de situação anterior de orelha quente do destinatário ocorreu por conta de que alguém
estaria falando mal dele. Mais: que correlação causal há entre orelha da pessoa esfriar se o nome de
quem estaria falando mal dela fosse pronunciado. Isto sem dizer que a afirmação pode ser um
engodo para que o destinatário desfie publicamente o rol de quem ele considera falar mal dele.
parecem chamar por elas”. Nas complexidades administrativas de qualquer país, sempre há crises e
desemprego e, considerados certos setores, recessão também; idem, quanto a catástrofes, estas
podem ir desde as climáticas até as econômicas. Então, trocando-se na afirmação ‘partido
Democrata’ por ‘partido Republicano”, a afirmação genérica e pouco específica – vaga – continua
retórica, mas operacional na mente dos desavisados.
1) “O sol só nasce depois que o galo canta”. Não é porque a sequência se apresenta nesta ordem é
que o primeiro fato é causa do segundo;
2) “Todo dia, lá pelas 18H00 eu mando o sol se por e em minutos sou obedecido”. Mandando
alguém ou não, depois das 18H00 o sol se põe porque a natureza assim o determina.
Esta falácia tanto pode ser cometida escancaradamente, usando até mesmo as mesmas
palavras, como de modo sutilmente disfarçado, em casos onde a conclusão é uma paráfrase
convenientemente construída de alguma das premissas. Alguém que diz ‘matar não é certo, logo,
não se deve matar’ está cometendo uma petição de princípio fácil de identificar. Mas, por paráfrase,
o argumento parece diferente e continua o mesmo: ‘matar seres humanos não é moral e nem
eticamente aceitável; logo, matar pessoas fere os mais elevados valores da personalidade’, só que
com uso de palavras diferentes e uma construção gramatical diferente.
Como coloca Copi66: “Se a proposição é aceitável sem argumento, nenhum argumento é
necessário para estabelecê-la; e se a proposição não é aceitável sem argumento, então nenhum
argumento que exija a sua aceitação como premissa terá possibilidade de levar alguém a aceitar sua
conclusão. Em qualquer argumento de tal natureza, a conclusão só afirma o que foi afirmado nas
premissas e, daí, o argumento embora perfeitamente válido, é totalmente incapaz de estabelecer a
verdade da sua conclusão.”
Exemplos:
1) Severino: “Deus existe.”
Virgolino: “Como você sabe?”
Severino: “Porque a bíblia diz.”
Virgolino: “Porque nós deveríamos acreditar em tudo o que a bíblia diz?”
Severino: “Porque a bíblia foi escrita sob inspiração direta de Deus.”
2) Eu: “Gente, vocês sabem, eu nunca minto!”
Eu, de novo: “Então, quando estou dizendo que o mundo vai acabar, estou dizendo a verdade.
66
Introdução à Lógica, p. 84.
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Preparem-se!”
3) “As mulheres escrevem as melhores novelas românticas porque os homens não escrevem
novelas tão bem.”
Esta falácia, uma vez detectada, pode ser rebatida com relativa facilidade, mostrando
que se aceitas as premissas, automaticamente, já estaria acolhida a conclusão. Entretanto,
dependendo do assunto tratado, muitas vezes relacionado a dogmas, preconceitos e crenças
sedimentadas, erigem-se barreiras severas e inflamadas, especialmente se o auditório é o que se
pode chamar hostil e não está preparado para o debate em termos razoáveis e, para não dizer,
lógicos. Ou seja, as ponderações destruindo a falácia podem ser recebidas como conversa sobre
corda em casa de enforcado.
Alguém que pede a concordância com a premissa de que “Deus tem todas as virtudes”
consegue provar que Deus tem qualquer virtude em espécie, pois, “se a benevolência é uma
virtude”, é inevitável concluir que “Deus é benevolente”.
Até pouco tempo, serviços secretos e serviços militares de vários países usavam um
argumento estruturado como petição de princípio para excluir quem tivesse opções sexuais diversas
das ditas tradicionais. A lógica do argumento era (e em alguns países ainda é): “Homossexuais não
devem ocupar cargos de governo. Qualquer servidor público que revelar sua homossexualidade
perde o emprego. Isto faz com que os homossexuais tendam a esconder sua opção sexual, o que os
torna passíveis de serem chantageados. Justamente por serem passíveis de chantagem não podem
ser admitidos em cargos de governo”.68
67
SCHOPENHAUER, Arthur. A arte de ter razão: exposta em 38 estratagemas. 3ª edição. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. P. 34.
68
Ver: http://en.wikipedia.org/wiki/Sexual_orientation_and_military_service, pesquisado em 02/set/13.
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Uma maneira prática que quase sempre funciona para detectar rapidamente falácia desta
modalidade é se perguntar: se as premissas fossem falsas, estaria implicado que a conclusão seria
falsa também? No caso negativo – a conclusão continua verdadeira – as premissas são irrelevantes
para a conclusão atingida.
Também de modo prático, é difícil, no meio do debate, perceber para onde se volta
finalmente a argumentação do outro participante. Pode ser que, em continuação, haja um
realinhamento de argumentos em prol de demonstrar a conclusão perseguida. Esta peculiaridade
impõe cautela ao acusar o outro participante de estar incidindo na falácia igonoratio elenchi antes
que ele termine a exposição, sob pena de enfrentar alegação de tentar perturbar a argumentação ou
que “Aguarde um pouco e logo entenderá o ponto”, eventualmente, alertando o adversário para
melhorar sua linha de apresentação.
Como a metáfora sugere, quem comete a falácia straw man distorce o real argumento
em debate e ataca o argumento distorcido, naturalmente escolhido muito mais fraco que o original.
Obviamente, atacar o straw man é demonstração de fraqueza argumentativa porque quem debate
usa seus melhores argumentos contra as fraquezas do argumento adversário.
A política, de novo e sempre: “Quero protestar contra os que dizem que o governo Lula
é inoperante. Em oito meses, o presidente construiu uma churrasqueira no Palácio da Alvorada e
está inaugurando seu escritório em São Paulo. Obras fundamentais para o desenvolvimento do
Brasil.” (Gedel Vieira Lima, deputado federal do PMDB baiano). Qual a pauta mesmo? Este tipo
de intervenção leva a discussão – emocionalmente – entre adeptos e defensores para assunto
inteiramente diverso, afastando-se da pauta.
O sugestivo nome da falácia vem da caça à raposa, esporte muito praticado no Reino
Unido, por conta de um arenque defumado – que tem cor vermelha – arrastado ao longo da trilha
para que os cães farejadores, assim estimulados, mantenham-se em perseguição. Consiste na
inserção de um argumento irrelevante, mas instigante ou polêmico, para distrair a plateia e desviar a
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Numa reunião de condomínio, onde estava sendo discutida a planilha de custos para
estabelecer o valor do condomínio para o próximo ano, alguém pede a palavra e solta: “Eu não sei
por que pensar em aumentar o valor do condomínio para pagar empregado limpar xixi de cachorro
dentro do elevador e na garagem?”. Todos os presentes que têm cães em casa entram na defesa da
alegação que nunca, nunca mesmo, houve cachorro fazendo xixi no elevador, no hall do prédio e
nem na rua... O assunto importante, previsão orçamentária, fica relegado a segundo plano e a
intenção que motivou o agendamento da reunião fica ameaçada de deterioração, a menos que
alguém ponha ordem e faça a solenidade retomar seu curso, mas isto depois de algum acalorado
debate. Se houver descuido de quem estiver presidindo, a reunião acaba em altercação porque as
animosidades afloram.
É o caso de a pessoa tentar justificar uma ação asseverando que alguém – na maioria
dos casos a vítima – já a praticou ou praticaria se estivesse na mesma situação. A falha no
argumento é que se algo é errado não é porque alguém o praticou ou praticaria que o
comportamento estaria legitimado. Mais, fazer o errado não é medida preventiva para evitar um
suposto segundo erro.
Um exemplo é a pessoa que após sair da loja, percebe que o caixa deu troco a mais e
resolve ficar com o dinheiro sob o pretenso argumento de que se tivesse pago a mais não teria o
dinheiro de volta.
Como justificar um ataque terrorista contra uma estação de metrô lotada de gente indo e
voltando do trabalho? O terrorismo tem oferecido como ‘justificativa’ para atacar civis a conduta
política, econômica, social ou religiosa adotada por algum país repudiado pelo grupo extremista. E
para arrepiar nada impede que o atentado, para fins mais alcançar o propósito aterrorizador ou
mesmo para chamar atenção para a ‘causa’, seja perpetrado em país diverso, como ocorrido nas
Olimpíadas de Munique.
69
A figura de estilo conhecida como metáfora, ao transferir uma palavra para um âmbito semântico que não é o do objeto designado
fundamentando-se em semelhança subentendida entre o sentido próprio e o figurado, busca suporte em analogias. Exemplos: “Um beijo seria
uma borboleta afogada em mármore." (Cecília Meireles); "Meu pensamento é um rio subterrâneo" (Fernando Pessoa); “Amor é fogo que arde
sem se ver” (Camões).
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homem tem dois pés ao passo que esta mesa tem quatro pés”. Os termos análogos, nos quais a
semelhança é parcial, e os equívocos, de semelhança nenhuma, são englobados numa só categoria e
conhecidos como ambíguos.
Sinônimas são duas palavras diferentes que indicam o mesmo conceito e, mesmo entre
vocábulos que ‘a priori’ têm o mesmo significado, há algumas discrepâncias levando a conotações
diferentes. Mulher jovem pode ser designada pelos vocábulos sinônimos ‘moça’ e ‘rapariga’,
entretanto, em alguns lugares o significado toma cores diferentes. Um dos cuidados que se deve ter
em falar línguas é escolher com critério e conforme os costumes consagrados no local as palavras
para expressar-se adequadamente sem incidir em algum erro que traga constrangimento.
Ambiguidade não se confunde com vagueza. Há palavras que são ambíguas, mas não
são vagas, como ‘perna’, definição aplicável tanto para membro como para parte de mesa. Por outro
lado, a marca identificadora da vagueza é que o termo não está claramente incluído ou excluído da
extensão do conceito tratado. Quando se diz que ‘Fulano é gordo’ não há ambiguidade, mas o
predicado não quantificado é vago.
70
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 3ª edição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. P.
1.143.
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Um terceiro tipo de ambiguidade surge a partir da relação de sentido que certos verbos
assumem com o sujeito e seus complementos, como nos casos de verbos em que existe
possibilidade de o agente praticar pessoalmente a ação ou alguém praticar esta ação por ele. Em “O
doutor João fez o transplante de cabelos” o verbo fazer admite atribuir-se os papéis de agente e
beneficiário da ação à mesma pessoa. Ou seja, o doutor João foi o médico que fez o transplante de
cabelos em algum paciente ou o doutor João submeteu-se a transplante de cabelos?
10.11.1. Equívoco
A maior parte das palavras tem mais de um sentido e se, num mesmo argumento faz-se
uso, involuntário ou não, destes diferentes significados está sendo cometida a falácia do equívoco.
A falácia dos quatro termos, anteriormente referida, ocorre quando um mesmo vocábulo
é usado com sentidos diferentes. Veja o exemplo a seguir, caso em que o vocábulo ‘fim’ foi
utilizado em duas acepções diferentes: “O fim de uma coisa é a perfeição. A morte é o fim da vida.
Então, a morte é a perfeição da vida”.
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Não é incomum uma das partes do debate insistir num significado de algum termo que
lhe é benéfico, motivo pelo qual a definição das palavras-chave quase sempre pode e deve ser
questionada e combinada. Em linha geral, o ônus da prova da ambiguidade ilícita cabe a quem
originalmente impugnou o argumento como sendo falacioso. Se uma das partes firmar posição de
atribuir definição a termo controverso de modo a sustentar seu lado do argumento em prejuízo do
argumentador contrário, a disputa para a terminologia ou o debate pode descambar para a mera
altercação. No limite, aceitar a definição imposta poderá fazer o argumento, em tese falacioso,
convergir para algo assemelhado à petição de princípio porque nos limites da definição admitida a
conclusão está insinuada.
71 Constituição Federal de 1988: “Art. 5º (omissis) II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
(omissis)”
72 Deixar dei.xar (lat laxare) vtd 1 Largar, não continuar a reter, soltar. vtd 2 Interromper, suspender: Às 18 horas deixava o trabalho. vtd 3
Desistir, prescindir de, renunciar a. vtd 4 Demitir-se de: Deixar um emprego. vtd 5 Ceder: Deixou-me o seu lugar e saiu. vtd 6 Não insistir em:
Deixemos esse assunto. vtd 7 Abandonar, desamparar. vtd 8 Desistir de, optar ou trocar por outro: Deixou o estudo. Deixou a Medicina pelo
Direito. vtd 9 Desabituar-se de: Deixa de vez a bebida. vtd 10 Produzir, dar: Deixar um lucro de 30%. vtd 11 Instituir: Deixou os enteados por
herdeiros de suas propriedades. vtd 12 Ausentar-se de: Deixou a pátria, logo que atingiu a maioridade. vtd 13 Separar-se de: Deixou a
sociedade e abriu sua própria empresa. vtd 14 Legar: Deixa-lhes um nome e riquezas. vtd 15 Comunicar, imprimir, infundir, transmitir: Esta
cerveja deixa um sabor muito amargo. Esta cena deixou na memória uma lembrança indelével. vtd 16 Poupar, respeitar: Os assaltantes
levaram o dinheiro mas deixaram as relíquias. "Sem Deus e sem pátria deixa-lhes ao menos a sua tristeza" (Alexandre Herculano). vtd 17
Consentir, permitir: Não o deixem fugir. vtd 18 Omitir: Não o expôs cabalmente, pois deixou os pormenores. vtd 19 Dar lugar a, facultar, tornar
possível: O crepúsculo vespertino mal deixava entrever os objetos. vtd 20 Esperar: Não saia já, deixe melhorar o tempo. vtd 21 Adiar: Deixo
por hoje esta questão. Deixemos a viagem para melhor oportunidade. vti 22 Abster-se: Por estar suado, deixou de beber. vpr 23 Consentir, não
evitar, prestar-se: Deixar-se enganar. vtd 24 Desviar-se de: Deixou a calçada e seguiu pelo meio da rua. vtd 25 Fazer ficar (alguém) em (algum
lugar) e ir-se embora: Ela deixou os filhos em casa dos avós. vtd 26 Não ocupar: Deixar espaço. vti 27 Cessar: Deixar de estar em vigor. vtd 28
Fazer com que (alguém ou alguma coisa) fique em algum estado particular: Deixar (alguém) satisfeito, contente, ou (algo) em suspenso, em
curto-circuito, em branco etc. vtd 29 Confiar: Deixou a escolha a seu assessor. Deixa disso!: fala para impedir ato indébito ou inconveniente,
geralmente briga. Deixar a máscara: deixar de fingir; largar a máscara. Deixar à sepultura: olvidar. Deixar atrás: a) exceder, suplantar; b)
omitir, não mencionar. Deixar a vida: morrer. Deixar barato, gír: não se importar, não ligar. Deixar claro1: pôr espaços em branco em lugares
que depois se preencherão com clichês, títulos ou composição. Deixar claro2: esclarecer, elucidar, clarear. Deixar como está para ver como fica:
ironia para sugerir não interferência em. Deixar correr: não fazer caso de. Deixar em meio: deixar incompleto. Deixar em paz: não importunar,
não molestar. Deixar estar: deixar ficar como está, não empreender nada. Deixar o coração ao largo: ter ânimo nas adversidades. Deixar o
mundo: morrer. Deixar passar: não impedir a passagem de; admitir, tolerar. Deixar-se levar pelo nariz: seguir os ditames de outrem. Deixar
ver: fazer ver, mostrar. (http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=deixar, pesquisado em
18/fev/15)
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O verbo “ficar”73 também tem vários sentidos o pode levar a equívoco: “Depois da
negociação, a solução amigável restou configurada: a empresa brasileira ficou com a empresa
alemã”. Pergunta sem resposta específica: a empresa brasileira foi vendida para a empresa alemã ou
a empresa brasileira adquiriu a empresa alemã?
10.11.2. Anfibologia
A língua portuguesa, assim como todas as línguas, pode ser traiçoeira e, por vezes,
certas supressões podem fazer por diminuir a precisão em casos em que esta é requerida com
necessidade absoluta. O exemplo a seguir fala por si.
O pronome pessoal da segunda pessoa do singular – ‘tu’ – está meio em desuso, pois,
substituído generalizadamente pelo pronome pessoal da terceira pessoa do singular – ‘ele’. Mas, o
‘tu’ dirige-se a segunda pessoa especificada – o ouvinte –, ao passo que o ‘ele’ traz em voga uma
terceira pessoa qualquer – o assunto, por assim dizer – pertencente a um conjunto que, a rigor,
exclui a segunda pessoa. Então, o uso da terceira pessoa ao invés da segunda pessoa para se dirigir
à segunda pessoa, faz por forçar a inserção dela num conjunto, ao qual a princípio não a continha,
podendo causar confusões.
Outro caso acontece quando posição relativa entre sujeito – em terceira pessoa do
singular – está posposto a verbo transitivo direto. Na frase: “Ameaçou o acusado a testemunha” o
sujeito – ele, terceira pessoa do singular – está posposto ao verbo ‘ameaçar’ – transitivo direto –
conduzindo à indagação: quem ameaçou quem? E como ameaça é, em tese, uma conduta tipificada
como crime no art. 147, Código Penal, é muito importante saber quem ameaçou quem, pois, define
a autoria. No exemplo, seria mais claro dizer: “O acusado ameaçou a testemunha” ou “A
testemunha ameaçou o acusado” para identificar com clareza o autor da ação.
Ao fazer comparações, é necessário prestar atenção porque, caso contrário, fica-se sem
saber se houve equiparação ou oposição: “Na década de 50 contribuintes brasileiros não levavam o
Imposto de Renda a sério, como acontecia com os franceses”. Não é possível saber se houve uma
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equiparação entre os contribuintes brasileiros e franceses: ambos não levavam o Imposto de Renda
a sério ou a intenção era fazer uma oposição: os contribuintes brasileiros não levavam o Imposto de
Renda a sério, ao passo que os contribuintes franceses levavam o Imposto de Renda a sério. Em
casos assim, é de, sem muitas preocupações com o estilo, fracionar e isolar as afirmativas: “Na
década de 50 os contribuintes brasileiros não levavam o Imposto de Renda a sério; igualmente
acontecia com os contribuintes franceses” ou “Na década de 50 os contribuintes brasileiros não
levavam o Imposto de Renda a sério, ao contrário dos contribuintes franceses”.
Há casos em que a preposição “de” entre dois substantivos cuja utilização desavisada
pode gerar equívoco: “Onde está a vaca da sua mãe?” Nestes tempos complicados em que crianças
até cometem crime – ato infracional mais tecnicamente – uma pergunta destas pode custar uma
vida, porque mesmo sendo o caso de a vaca – mamífero que gera bezerros e dá leite – esteja
desaparecida a indagação pode ser entendida como ofensa. Mais prudente usar uma construção do
tipo: “Onde está a vaca pertencente à sua mãe?”
“Um ladrão roubou o automóvel do estrangeiro que estava perto do banco” deixa sem
precisar quem estava perto do banco, o automóvel ou o estrangeiro. Isto acontece em certos casos
em que há mais de um substantivo num mesmo adjunto adnominal. Melhor teria sido optar entre:
“Um ladrão, que estava perto do banco, roubou o automóvel do estrangeiro” ou “Um ladrão roubou
o automóvel, que estava perto do banco, do estrangeiro”.
Há construções que deixam dúvida acerca de quem ou o que é o referido por certo
termo: “César discutiu ferozmente com Brutus sentado na cadeira”. Quem estava sentado na cadeira
enquanto discutia com o outro: César ou Brutus? Melhor teria sido dizer; “César, sentado na
cadeira, discutiu ferozmente com Brutus” ou “César discutiu ferozmente com Brutus, que estava
sentado na cadeira”.
Outra fonte de equívoco é o uso incorreto do “que”: “Fulano é o autor do crime que
deixou a população tão apreensiva”. O pronome relativo “que” tanto pode referir-se ao Fulano
quanto ao crime, gerando uma construção ambígua que poderia ficar mais clara optando-se por uma
das seguintes formas que identificam quem teria deixado a população apreensiva: “Fulano é o
autor, cujo crime, deixou a população tão apreensiva” ou “Fulano, que deixou a população tão
apreensiva, é o autor do crime”.
Enfim, vale uma regra de ouro: melhor sacrificar o estilo que a clareza. Uma frase feia
com um sentido apenas é muito melhor que um verso poético ambíguo porque as pessoas assumem
o sentido que mais lhe convenha.
Por outro lado, a vigilância é importante para esclarecer o que está sendo referido
porque se uma pessoa entende diferente da outra a comunicação não está cumprindo um papel
básico e isto pode trazer prejuízos que extrapolam o plano do debate.
11.1. A insinuação
As palavras que usamos numa afirmação podem esconder alguma outra afirmação –
conotação sugerida – implícita, com um risco grande de contagiar e, no limite, fazer com que o
receptor incorpore a ideia insinuada como se dele fosse. Ou seja, uma insinuação inserida bem
posicionada, no momento certo, com palavras bem escolhidas e no tom de voz adequado pode
funcionar como um convite à inferência dirigida. A insinuação pode advir até de um piscar de olhos
com intencionalidade.
Muita gente não consegue – ou não se esforça, pouco importa – expressar direta e
claramente suas pretensões, ideias, sentimentos e vontades, requerendo permanente atenção74 do
interlocutor para o correto entendimento, no contexto, no tempo e no espaço, da totalidade do que
está subjacente ao que insuficientemente comunicado de modo expresso. Por outro lado, muitas são
as situações que requerem o uso da dica para testar a posição do outro quanto a um assunto ou
mesmo para não haver desgaste ou comprometimento inadequado de uma pessoa em relação à
outra. Serve também para, discretamente, avisar sobre assuntos que se sabe não serem adequados
para serem tratados por aquela pessoa diretamente.
O casal está saindo junto e o rapaz pergunta: “você não gostaria de ir para o meu
apartamento, onde poderemos ficar mais confortáveis?” Dependendo de como for a resposta – ‘não’
firme; hesitação para responder; aceitação vivaz; concordância ansiosa – quem formulou o convite
se sentirá mais confiante – ou não – quanto às futuras liberdades ou até mesmo quanto ao
prosseguimento do encantamento recíproco. Neste caso, a sugestão propiciou um teste de terreno
sem fazer qualquer avanço concreto. A dica pode auxiliar na identificação e posicionamento no
conflito entre a consciência e o instinto. Para a garota também a dica tem utilidade, ela sabe do
interesse do rapaz e pode administrar a evolução do namoro, ou seja, aumentar a escalada de
intimidade da relação ou ser mais conservadora.
Outro casal passa diante de uma joalheria e a esposa, embasbacada, exclama diante de
uma gargantilha maravilhosa: “Que maravilha!!! A mamãe sempre disse que minha avó, nos bons
tempos, teve uma joia magnífica como esta”. Pode ser que ela queira muito ganhar a joia, mas
esteja relutante em pedir ao marido por saber que o orçamento está apertado ou porque eles
gastaram as economias do casal emprestando dinheiro para o irmão dela pagar o aluguel atrasado.
O comentário dela dá abertura para o marido – agora sabedor de que ela adorou a joia – tomar a
iniciativa de brindá-la com o presente, mas evita que ela seja magoada com a possibilidade de ele
repelir liminarmente a pretensão dela.
74
Existe um adágio popular muito conhecido – “Para bom entendedor meia palavra basta.” – que já ajudou que fossem tiradas muitas – algumas,
óbvio falsas – conclusões apressadas.
75
Tradução: uma palavra (é) suficiente para o sábio.
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furioso e dias depois se vingou dele – capitão – escrevendo no diário de bordo “O capitão hoje
estava sóbrio”. De modo geral, quem lê a anotação do imediato é conduzido a pensar emocional e
erroneamente que nos demais dias o capitão não se apresenta sóbrio para o trabalho. Entretanto,
analisando-se mais sensata e calmamente o comentário do imediato vê-se não ser incompatível com
o capitão apresentar-se, hoje e sempre, sóbrio para o trabalho; só que também não é incompatível
com o caso de o capitão só hoje não se estar apresentando sóbrio para o trabalho. A preferência do
destinatário da comunicação tende a, perigosamente, ignorar todas as possibilidades interpretativas,
peculiaridade que, muitas vezes, é explorada por pessoas formulando, com sucesso, comentário
insinuante e mal intencionado, que é recepcionado somente quanto a esta faceta.
Baltazar Gracián76: “XXXVII Conhecer e saber usar farpas. É o ponto mais sutil do
trato humano. São elas lançadas para sondar os ânimos, e com elas se faz o mais dissimulado e
penetrante tenteio do coração. Outras há maliciosas, audaciosas, tocadas pela erva da inveja,
untadas pelo veneno da paixão, raios imperceptíveis para derribar da graça e da estima. Perderam
muito a privança superior e inferior, feridos por um leve dito desse, a quem toda uma conjuração de
murmuração vulgar e de malevolência individual não foram bastantes para causar a mais leve
trepidação. Outras farpas, ao contrário, obram como favoráveis, apoiando-se e confirmando-se na
reputação. Mas com a mesma destreza com que a atenção as arroja, há de se recebê-las a cautela e
esperá-las a atenção, pois a defesa está resguardada no conhecer, e sai sempre frustrado o tiro
previsto.”
1) “Eu nunca soneguei ao fazer minha declaração de imposto de renda” sugere que quem
pronuncia não sonega, mas outros podem fazê-lo;
2) “Eu nunca soneguei ao fazer minha declaração de imposto de renda” sugere que quem fez a
afirmação em caso nenhum sonegou;
3) “Eu nunca soneguei ao fazer minha declaração de imposto de renda” sugere que pode ter
acontecido de inadvertidamente haver cometido erro na declaração;
4) “Eu nunca soneguei ao fazer minha declaração de imposto de renda” sugere que não sonegou
quando fez a dele;
5) “Eu nunca soneguei ao fazer minha declaração de imposto de renda” sugere que sonega em
outras áreas.
Um pormenor importante: quando impressa a frase não é passível de ser distorcida pelo
acentuar de uma ou outra palavra.
Uma mãe, preocupada com o desempenho do filho na escola, pergunta a ele: “Filho,
como você está indo em matemática?” O filho responde: “Tirei 9,0 na prova da última 4ª feira”.
Mas, se o fato foi que o rapaz foi pego ‘colando’ na prova da 6ª feira e vai ficar com média 4,5 no
bimestre, a mãe vai ficar incorretamente pensando que o filho está indo bem, quando a verdade é
inteiramente diferente. Não dá nem para excluir a hipótese de que 9,0 da 4ª feira tenha sido obtido
por meios escusos.
A sequência de palavras pode ser vital para a forma como o outro recebe a mensagem.
Imagine-se o mais isentamente possível um fato: professor entra no banheiro, encontra um aluno
fumando e vai levar o assunto ao conhecimento do diretor da escola. Maneira 1: “Tenho uma
notícia desagradável para dar. Sabe o João Carlos, aquele aluno que só tira conceito A? Pois é,
passei pelo banheiro e o vi lá dentro fumando.” Aqui, o terreno foi preparado e as palavras
escolhidas para minimizar o incidente. Ao identificar o aluno pelo nome e dando a qualidade das
notas dele, o professor constrói um ambiente favorável para o diretor receber a notícia e posicionar-
se de modo mais brando. Maneira 2: “Acabei de flagrar o Joca fumando no banheiro”. A notícia é
levada cruamente, sem rodeios. O aluno não é o João Carlos é o Joca, um qualquer. O verbo flagrar
já traduz por si a transgressão.
O tom de voz pode trair nossa atitude: insegurança, temor, hesitação, raiva, segurança,
amabilidade, dentre outras. Também pode preparar o espírito do interlocutor para pior ou para
melhor. Então, expressar-se com voz suave, pausada, em tom baixo e sereno cria um ambiente
favorável a que o assunto seja tratado com mais racionalidade. Por outro lado, expressar-se de
modo inflexível, ríspido, entrecortado, duro, gritado, rápido, urgente, etc., faz o espírito do ouvinte
ficar preparado ansiosamente para uma situação desagradável.
Imagine-se, no exemplo do aluno pego fumando no banheiro, que o professor use tons
de voz bem diferentes para dar a notícia. Na primeira maneira, o professor apresenta o assunto com
voz calma e serena. Fica, aos olhos do diretor, bastante abrandada a conduta do aluno fumante. Na
maneira 2, somando-se à escolha de passar a notícia de forma expressa, nua e crua, para o diretor,
em tom de voz ríspido, duro e severo, o caminho fica meio andado para colher a prevenção contra o
infrator e granjear-lhe uma punição agravada.
Em geral, o tom de voz é congruente com o contexto. Um dos motivos que tiram a
credibilidade da comunicação é alguém usar tom de voz que trai disposição psicológica de
conteúdo diverso quando comparada com a situação vivenciada, boa ou ruim. Mais comum em
situações difíceis ou embaraçosas. Se, diante do perigo, alguém trêmulo de medo e com os olhos
esbugalhados diz com voz mansa: “Podemos ficar tranquilos”, ninguém fica tranquilo. Mas, na
boca do líder nato que, mesmo enfrentando seus medos e fraquezas, supera-os para guiar o grupo
para fora da situação perigosa, a mesmíssima frase transmite tranquilidade.
11.5. Fraseologia
A escolha das palavras e da ordem em que utilizadas na frase pode ser muito sugestiva.
Exemplo: “Você é firme” – parece algo ponderado; “Você é obstinado” – já não é tão bom assim;
“Você é cabeça dura” – encerra um demérito, sugerindo falta de sensibilidade para particularidades
importantes e pouca disposição ante argumentos razoáveis de mudar de opinião.
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Há até a história do aluno que não parava de perguntar as maiores banalidades, de modo
meio hostil e travando o andamento da aula. Com a paciência chegando nos limites, o professor
adotou a tática de explicar com minúcia e calma uma dúvida elementar apresentada pelo indigitado
aluno. Ao terminar, perguntou para o aluno insistente “Você entendeu?”. O aluno respondeu que
“Sim” e o professou arrematou: “Então, se você entendeu tenho certeza que a turma toda entendeu
também”.
Uma “garrafa meio cheia” não deixa de ser uma “garrafa meio vazia”, entretanto, o
efeito psicológico é muito diferente e vale como alerta para quem vai apresentar-se diante de uma
plateia. Adotar a linha da “garrafa meio cheia” é mais empolgante e capta o otimismo da plateia,
porque as pessoas não gostam dos arautos da escassez. Então, cuidados especiais são necessários
para trazer os temas ao ritmo de “garrafa meio vazia”, pois, psicologicamente pode traduzir
pessimismo, ao estilo “urubu no ombro”.
11.6. Justaposição
Nas audiências judiciais, é comum haver o uso de palavras técnicas durante oitivas de
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testemunhas, que às vezes são pessoas simples, sem conhecimento técnico-jurídico do que sejam
‘partes’, ‘contradita’, ‘autor’, ‘réu’, ‘quantum debeatur’, etc. Os operadores do direito têm de tomar
enorme cuidado para que quem esteja sendo ouvido – autor, réu, perito, assistente técnico, ou outro
– entenda perfeitamente o que está sendo perguntado, sob pena de haver desastrosos mal entendidos
nas respostas. Existe até um dispositivo no Estatuto da Advocacia77 concedendo o direito de o
advogado interromper sumariamente a solenidade para esclarecer eventual equívoco.
11.8. Pontuação
1) “Um fazendeiro comprou uma vaca e a filha do fazendeiro é também o pai da bezerra.”
“Um fazendeiro comprou uma vaca e a filha; do fazendeiro é também o pai da bezerra.”
2) “Quando Maria toma banho sua Mãe diz ela não gosto de tomar banho.”
“Quando Maria toma banho sua. Mãe, diz ela, não gosto de tomar banho.”
Imagine-se que alguém rico faleceu enquanto fazia seu testamento. O falecido escreveu
a frase a seguir, mas morreu antes de pontuá-la: “DEIXO A MINHA FORTUNA PARA O MEU
IRMÃO NÃO PARA O MEU SOBRINHO JAMAIS PARA MEU ADVOGADO NADA PARA
OS POBRES”. Quem primeiro chegou foi o irmão do falecido e produziu a seguintes pontuações:
“DEIXO A MINHA FORTUNA PARA O MEU IRMÃO. NÃO PARA O MEU SOBRINHO.
JAMAIS PARA MEU ADVOGADO. NADA PARA OS POBRES.” O sobrinho do morto chegou
logo depois e propôs a seguinte maneira de pontuar a frase: “DEIXO A MINHA FORTUNA PARA
O MEU IRMÃO? NÃO! PARA O MEU SOBRINHO. JAMAIS PARA MEU ADVOGADO.
NADA PARA OS POBRES.” Para tentar colocar alguma ordem no entendimento da mensagem do
falecido seu advogado entendeu por pontuar da seguinte forma: “DEIXO A MINHA FORTUNA
PARA O MEU IRMÃO? NÃO! PARA O MEU SOBRINHO? JAMAIS! PARA MEU
77
Lei 8.906/94: Art. 7º São direitos do advogado: (...) X - usar da palavra, pela ordem, em qualquer juízo ou tribunal, mediante intervenção
sumária, para esclarecer equívoco ou dúvida surgida em relação a fatos, documentos ou afirmações que influam no julgamento, bem como para
replicar acusação ou censura que lhe forem feitas; (...)
78
LUFT, Celso Pedro. A vírgula. 2ª edição. São Paulo: Ática, 1997. P. 9.
79
https://www.youtube.com/watch?v=uWKpx5Ls1zg Pesquisado em 08/08/20.
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ADVOGADO. NADA PARA OS POBRES.” O defensor da causa dos pobres não perdeu sua
oportunidade: “DEIXO A MINHA FORTUNA PARA O MEU IRMÃO? NÃO! PARA O MEU
SOBRINHO? JAMAIS? PARA MEU ADVOGADO? NADA! PARA OS POBRES.”
Um marcante exemplo prático do mau uso da vírgula foi o convite oficial elaborado
para a festa de celebração de 2 anos do governo de Michel Temer, cuja redação, considerada
desastrosa pela assessoria, provocou crise interna e implicou em alteração de última hora. A
redação “O Brasil voltou, 20 anos em 2” foi considerada ambígua porque, se suprimida a vírgula
após o verbo, passa a mensagem de que o País regrediu 20 anos sob a gestão do atual Presidente.
(vide jornal OESP, 15/05/18, A8).
A rigor, a meia verdade é uma mentira porque, quem cala a verdade sobre ponto acerca
o qual tinha ou devia manifestar-se, está criando um cenário falso, pois, privando os destinatários
da mensagem do conhecimento de pormenor que poderia esclarecer os fatos integralmente. O
Código Penal trata do tema no tipo penal falso testemunho ou falsa perícia: “Art. 342. Fazer
afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou
intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral”.
Este caso é mais grave que a mera escolha de palavras ou assunto porque, no limite,
pode configurar a prática de crime.
Há pessoas que por qualquer motivo não são atentas – alguns não percebem mesmo –
para os verdadeiros fatores que governam os acontecimentos. E não se pode ser iludido por essas
pessoas. Para ilustrar, uma anedota. Dois praticantes de salto de paraquedas encontram-se no ar,
durante o trajeto avião-solo. Um deles, de paraquedas e sem capacete; o outro, sem paraquedas,
mas com capacete na cabeça. Ao ver o amigo sem capacete diz o infeliz sem paraquedas, mas com
a cabeça guarnecida por um reluzente capacete: “Meu Deus, você esqueceu-se de colocar o seu
capacete! Não pode saltar sem!”.
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3) Use frases sintéticas, congruentes e completas. Nada melhor que o “sujeito”, “verbo” e
“objeto”. As pessoas são simples, querem saber quem fez o quê. Pesquisas mostram que o
sujeito deve vir no começo da frase e o verbo preferencialmente deve aparecer não mais do que
seis palavras depois, para evitar que o destinatário tenha se esquecido do sujeito quando o
verbo vier.
4) As pessoas são melhores para entender o assunto quando certa pessoa é mencionada. Assim,
além de apresentar o sujeito logo, nomear uma pessoa específica provoca mais interesse da
audiência que uma coletividade impessoal (“João e Maria”, ao invés de “as crianças”, por
exemplo); objetos tangíveis ganham mais atenção que os abstratos (“a escola”, ao invés de “a
lei”, por exemplo) e quão mais abstrato o sujeito menos interesse desperta.
5) Para melhor entendimento use sempre o mesmo sujeito, evitando substituições no correr do
pronunciamento, para que a audiência não precise vasculhar o cérebro para entender de quem
se está falando. Evitar designar a mesma pessoa (José, por exemplo) de autor da ação numa
ocasião, reclamante em outra, peticionário numa terceira e assim por diante.
6) Lembre-se: a ação está no verbo e os destinatários da mensagem nele a procuram. Não se deve
sepultar a ação na substantivação: é muito mais direto e claro dizer “o Tribunal indeferiu o
pedido de liminar” ao invés de “o indeferimento pelo Tribunal do pedido de liminar”.
80
Art. 6º, inciso III e art. 9º, Lei 8.078/90.
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7) No geral, deve-se utilizar a voz ativa, que coloca o sujeito da frase no palco dos fatos, “A bola
atingiu o rosto de Mariana” é uma maneira simples e direta de descrever a mecânica de um
acidente que vitimou Mariana. O uso da voz passiva é útil para despertar os sentimentos da
plateia, ao chamar a atenção dela para sujeito paciente da ação praticada pelo agente da
passiva. Então, dizer “O rosto da Mariana foi atingido pela bola”, usando voz passiva,
emocionalmente chama atenção para a garota. Em termos de generalização, usar
prioritariamente a voz ativa; somente se deve usar a voz passiva quando decidir que o foco será
colocado em quem sofre a ação praticada. O uso da voz passiva é indicado em alguns casos
típicos. Quando não se quer revelar o autor da ação, o uso da voz passiva é útil: “Erros foram
praticados”, quando não se quer nomear quem da equipe errou. Quando se quer ser formal ou
autoritário: “Estacionar nesta vaga é rigorosamente proibido” ao invés de “Você não pode
estacionar nesta vaga”. Quando não se sabendo o sujeito da ação e não há utilidade em nominá-
lo genericamente: “Na briga de torcidas de ontem uma pessoa foi morta”, ao invés de
“Membros de torcida organizada não identificados mataram um torcedor numa briga ontem”.
8) Ser parcimonioso com adjetivos e advérbios, deixando na frase apenas as palavras necessárias
para transmitir a exata ideia que quer ver externada. Quem enche a frase de adjetivos e
advérbios não encontrou o verbo ou substantivo que indique precisamente a ação que quer ver
expressada: “falar alto” é “gritar”; “apêndice duro e recurvado que guarnece a fronte de certos
animais” é “chifre”.
9) Não tratar proposições que combinam dados objetivos e considerações subjetivas – avaliações
– como se fossem proposições tratando de fatos objetivos unicamente. Comparem-se, por
exemplo: 1) “Fulano mora na Rua Alfa, número x”; 2) “Fulano é baixo e feio”; 3) Fulano, o
baixinho feioso que mora na Rua Alfa, número x”.
10) Não usar duas negativas na mesma frase, embora, em português vulgar, usualmente tenham o
efeito conjunto de intensificar a negativa. Cuidado porque, a rigor, “não ter nada” é “ter alguma
coisa”.
11) Use linguagem compatível com o entendimento da audiência. Para a comunicação funcionar e
cumprir seu papel, o emissor deve ser compreendido pelos receptores das mensagens.
12) Evite linguagem ambígua usando, tanto quanto possível, termos unívocos, com sentido
determinado e inconfundível. Termos ambíguos são compatíveis com mais de um significado.
Exemplos: “Ama o pai o filho”; “A pedido de Fulano a reunião será em seu escritório”.
13) Evite palavras vagas usando termos mais precisos e focados, tendo em mente que quanto mais
geral a palavra, mais vaga é. Uma palavra é vaga se existem objetos que não estejam
explicitamente incluídos e nem excluídos na sua extensão. Exemplo: “São todos uns ingratos”.
14) As pessoas são, no geral, ouvintes impacientes. Coloque de início o ponto a ser defendido e, a
seguir passe para a argumentação, de preferência intercalando um “porque”. Introduções
maçantes deixam a plateia desinteressada. Há pessoas que começam uma explanação para uma
plateia especializada fazendo introitos elementares e sem utilidade para dirigir a atenção dos
destinatários da mensagem. É muito mais preciso e objetivo, ao invés de explicar o que é
cláusula contratual e fiança para advogados, dizer logo: “A cláusula de fiança existente no
contrato é inválida porque a esposa do fiador não assinou concordando com ela”.
15) Cuidado com o vocábulo ‘não’ intercalado nas frases porque dependendo de onde a vírgula for
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16) Não seja evasivo; diga exata e diretamente o que tem em mente, pois, caso contrário a
audiência pode enganar-se – ou ser enganada – ao captar a mensagem, o senso de realidade das
pessoas pode restar distorcido.
17) Muitos debates – políticos, como um exemplo que vale por todos – são travados em ambiente
impregnado por ideologias onde as palavras têm um significado peculiar para cada uma das
partes. Na época da Guerra Fria, por exemplo, à palavra “coexistência” eram atribuídos
significados diferentes pelas partes envolvidas. Assim, cuidado com termos do gênero:
“revolução cultural”, “reeducação”, “pacificação”, dentre outros.
18) Não deixe espaço para que sua posição seja “entendida” como mais extrema do que
efetivamente seja. É um truque usual em debates, o adversário desonesto distorcer o
entendimento da posição contrária, para algo um tanto mais extremo que originalmente. Este
estratagema traz enormes chances de fracasso se o declarante a incorporar e se arvorar a
defendê-la. Cair nesta armadilha pode levar o declarante ao ridículo e falhar fragorosamente
em sua argumentação, muitas vezes inicialmente correta e pertinente. Schopenhauer81, no
estratagema 1 expõe: “A expansão. Levar a afirmação do adversário para além de seu limite
natural, interpretá-la da maneira mais genérica possível, tomá-la no sentido mais amplo
possível; inversamente, concentrar a própria afirmação no sentido mais limitado, no limite mais
estrito possível: pois, quanto mais genérica se torna uma afirmação, a mais ataques ela fica
exposta.”
19) Não há segunda chance para causar uma primeira boa impressão. A plateia sempre aguarda seu
melhor argumento enunciado em primeiro lugar82. Então, não deixe seu melhor tiro para o
final, até porque a audiência pode pensar que você não soube identificá-lo como o mais
convincente. No mínimo, perderá em persuasão e, no máximo, a plateia pensará que não está
compreendendo em profundidade o assunto tratado.
13. Conclusão
Num debate sobre assunto controverso, a questão que se põe ao crítico não é demolir o
argumento do outro, lançando a pecha de falacioso, mas demonstrar que a argumentação do
adversário dá margem razoável de dúvida ou não tem sustentação suficiente para ser acatada sem
maiores considerações. Ou seja, questionar o argumento, apesar de não ter a força destrutiva do
desmonte, é suficiente para suspender o envolvimento do público a quem o argumento está sendo
dirigido. Preste-se atenção que, de modo simples e educado, colocar em xeque um argumento tem
81
SCHOPENHAUER, Arthur. A arte de ter razão: exposta em 38 estratagemas. 3ª edição. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. P. 17.
82
“If you have an important point to make, don't try to be subtle or clever. Use a pile driver. Hit the point once. Then come back and hit it again.
Then hit it a third time - a tremendous whack.” Winston Churchill. Tradução livre: ”Se você tem um ponto importante a estabelecer, não tente ser
sutil ou inteligente. Use um bate-estacas. Toque o ponto uma vez. Então, volte e toque-o outra vez. Então, bata uma terceira vez – uma tremenda
pancada”.
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duas vantagens fundamentais: cobra um esforço e uma precisão muito menores e dá ao oponente
uma saída honrosa.
A cada dia alguém cunha um nome novo para argumento falacioso, alguns com nomes
em latim. E é assim mesmo porque as situações da vida são da mais variada nuance. Normalmente,
o argumento falacioso se enquadra em mais de uma espécie porque o debate é um todo que
transcorre como uma torrente.
Mas, se o debate tiver curso, o importante mesmo é que se deve estar atento para, diante
de um argumento que comporta questionamento identificá-lo e não ficar inerte. Examinar o
argumento desde a forma em que apresentado, quem lançou, os termos utilizados, a possível
relatividade das premissas, a amplitude da conclusão, a qualidade da relação entre as premissas e a
conclusão, as provas apresentadas, todas as particularidades enfim, para ficar habilitado a fazer os
questionamentos certos e focados com vistas a atacá-lo amplamente com precisão cirúrgica em suas
– do argumento – falhas e fraquezas.
Só superada esta fase preliminar, que na maioria das vezes tira quase ou toda a força do
argumento do adversário, é que vem o ataque ao mérito. Observadas as cautelas de praxe na fase
preliminar, quando vier o exame do mérito, o argumento do oponente estará bem delimitado e
exposto à plateia. As argumentações falsas e falaciosas muito raramente resistem ao escrutínio
proposto bem executado na fase dita preliminar.