Você está na página 1de 10

Paisagem, configuração territorial e espaço: a interação da sociedade com a natureza.

Desde a constituição das primeiras civilizações, observa-se a existência de uma


intensa e nem sempre equilibrada relação entre sociedade e natureza. Essa relação diz
respeito às formas pelas quais as ações humanas transformam o meio natural e utilizam-se
deste para o seu desenvolvimento. É importante entender a complexidade com que se
estabelece a interação entre sociedade e natureza, para isso, abordaremos como essa relação
transforma três elementos chave dos estudos geográficos: A paisagem, o território e o
espaço.
A paisagem pode ser compreendida como a composição de elementos da natureza no
espaço. É a materialização da ação do homem com os elementos da natureza. A paisagem
surge da composição de elementos da natureza no espaço, dentre esses, a fauna e a flora, o
homem o que ele constrói e suas ações no espaço geográfico. Os estudos de La Blache
apontam para a relação homem-natureza na perspectiva da paisagem. Ele coloca o homem
como um ser ativo, que sofre a influência do meio, porém atua sobre este, transformando-o.
Para ele, as necessidades do homem são definidas pela natureza, contudo o homem busca
soluções para satisfazê-las nos materiais e nas condições oferecidas pelo meio,
transformando a matéria natural e criando formas sobre a superfície terrestre.
Segundo Santos (2002, p. 103), A paisagem é o conjunto de formas, que, num dado
momento, exprimem as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre
homem e natureza. A paisagem, junta elementos passados e presentes, sendo uma
construção transversal. Assim a paisagem existe através de suas formas, criadas em
momentos históricos diferentes, porém, coexistindo no momento atual. O autor agrega a
constituição da paisagem o fator da temporalidade.
Para Santos (2002, p. 62) a configuração territorial pode ser definida como o
conjunto formado pelos sistemas naturais existentes em um país ou numa área, e pelos
acréscimos que o homem faz a esses sistemas. A configuração territorial tem uma existência
material própria, mas a sua existência real, somente lhe é dada através das relações sociais.
No começo da história humana, a configuração territorial é apenas o conjunto de
complexos naturais. À medida que o homem modifica a natureza, construindo estradas,
plantações, casas, portos, fábricas, cidades, etc, a configuração territorial é criada, fruto da
produção histórica do homem, e segundo Santos (2002, p. 62), uma negação da natureza
natural, substituindo-a por uma natureza inteiramente humanizada.
Já o espaço, na perspectiva de Santos, é um conjunto indissociável de sistemas de
objetos e sistemas de ações. Para ele, esses objetos não podem ser considerados
isoladamente, mas devem ser analisados como um quadro único, no qual a história ocorre.
Para o autor, a natureza é a origem, ela provê as coisas, as quais são transformadas em
objetos pela ação do homem através da técnica. “No princípio, tudo eram coisas, enquanto
hoje tudo tende a ser objeto, já que as próprias coisas, dádivas da natureza, quando utilizadas
pelos homens a partir de um conjunto de intenções sociais, passam, também, a ser objetos.”
(p.65).
No começo a natureza era formada por objetos naturais que, ao longo do tempo, são
substituídos por objetos fabricados, técnicos, mecanizados e depois cibernéticos, fazendo a
natureza artificial funcionar como uma máquina, através da presença de objetos técnicos,
tais como: hidrelétricas, fábricas, fazendas modernas, portos, estradas, cidades, etc. dessa
maneira o espaço é marcado por acréscimos que lhe dão um conteúdo extremamente técnico.
Para Milton Santos, a técnica é “a principal forma de relação entre o homem e a natureza” e
é definida como “um conjunto de meios instrumentais e sociais, com os quais o homem
realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço.” (p.29).
Observamos que, a interação entre sociedade e natureza apresenta uma dualidade: ao
mesmo tempo em que, as sociedades se constroem através da transformação da natureza, a
natureza também gera impactos sobre a sociedade, influenciando seu desenvolvimento, que
pode ser mais rápido ou lento, dependendo das condições impostas pela natureza. O ser
humano ao longo de sua história evoluiu as suas técnicas e equipamentos para desenvolver a
exploração da natureza.
Toda a superfície terrestre está sujeita as ações dos seres humanos e é de
responsabilidade de nossos governantes buscarem soluções que visem garantir a
continuidade da existência das espécies da fauna e flora, pois os seres humanos na maioria
das vezes não são capazes de conservar e preservar a natureza devido a interesses
econômicos de obter lucro através da utilização dos recursos naturais, dessa forma acabam
explorando em excesso o meio ambiente devastando e destruindo os recursos hídricos, o
solo, a fauna, a flora, o ar sem contar a poluição que provocam com suas atividades que não
possuem seu devido planejamento, por isso é necessário políticas púbicas que visem o
desenvolvimento econômico em conjunto com a preservação e conservação da natureza
O pensamento geográfico e a compreensão das questões sociais e ambientais.

A geografia nasce enquanto ciência no século XIX e se expressa através de distintas


correntes de pensamento. Iniciando com o determinismo, e chegando atualmente a geografia
crítica, essas diferentes reflexões filosóficas têm formas distintas de compreender as
questões que envolvem a relação sociedade natureza, principal objeto de estudo da
Geografia.
O contexto social do século XIX levou o pensamento a uma corrente positivista, na
tentativa de eleger o objeto de análise da geografia. Podemos observar essa relação na
redução da analise geográfica apenas aos aspectos visíveis dos fenômenos, por meio do
método indutivo. Outra evidência da ligação da geografia ao positivismo é o fato de
Humboldt em seus estudos a definir como uma ciência de síntese, ou seja, a que considera e
analisa o resultado final de todo conhecimento produzido por outras ciências.
Nas tentativas de sistematizar o pensamento geográfico, os estudos de Ritter apontam
que a geografia deveria estudar a relação homem-natureza, partindo do pressuposto que o
homem é o sujeito da natureza e que haveria uma finalidade nesta, uma predestinação dos
lugares, que deveriam ser estudados pela geografia para explicar sua individualidade.
Do pensamento inicial pautado no positivismo, surgem através dos estudos de
diversos geógrafos, em especial, Ratzel e La Blache, duas correntes filosóficas distintas: O
Determinismo e o Possibilismo. Na escola Determinista, o meio ambiente determina as
condições de vida do homem. Esse pensamento fica evidente nos estudos de Ratzel, que
define o objeto geográfico como o estudo da influência que as condições naturais exercem
sobre a humanidade. Essa influência se daria primeiramente, na fisiologia e depois na
psicologia dos indivíduos e consequentemente, em toda a sociedade. Em um segundo
momento, a natureza influenciaria na própria constituição social e expansão de um povo,
através dos recursos do meio em que está localizada a sociedade.
Na escola Possibilista, a influência das ações do homem sobre o meio passa a ser
estudada, e o pensamento geográfico passa a entender que o meio ambiente pode ser
modificado para atender as necessidades do homem. Os estudos de La Blache definem a
geografia como a relação homem-natureza na perspectiva da paisagem. Ele coloca o homem
como um ser ativo, que sofre a influência do meio, porém atua sobre este, transformando-o.
Vital de La Blache observou que as necessidades do homem são definidas pela natureza,
contudo o homem busca soluções para satisfazê-las nos materiais e nas condições oferecidas
pelo meio. Nesse processo, o homem transforma a matéria natural e cria formas sobre a
superfície terrestre.
Do movimento de renovação da geografia, que ganha força a partir da década de
1930, a chamada geografia pragmática, estruturam-se as correntes de pensamento: a
geografia quantitativa, onde os estudos geográficos passam a interagir com a matemática e a
estatística, e a nova geografia, que segundo Santos (1986) excluiu o movimento social so
processo de realização da ciência e eliminou suas preocupações o espaço das sociedades em
movimento permanente, tornando a geografia “viúva do espaço”. Assim, essa escola de
pensamento ignora a dinâmica do espaço, como resultado de um processo onde o homem,
produção e tempo exercem papel essencial.
A partir da década de 1970 surge a escola de pensamento radical, denominada
geografia crítica. Influenciada principalmente pelos movimentos sociais e contracultura, a
escola radical procura tratar a problemática social, criticando a desigualdades e a forte
industrialização, que exerceu grande impacto sobre a sociedade e a natureza. Essa corrente
de pensamento tem sua base ideológica formada sob o marxismo, introduzindo as questões
políticas, econômicas e sociais aos estudos da geografia.
A geografia crítica vai desenvolver os estudos referentes a cidade, discutir as
relações de produção e as relações do trabalho, a ação do grande capital, os modos de
produção do espaço terrestre, observa-se que as relações homem-natureza e sociedade
passam a ter uma posição mais critica e central nesse movimento. Autores como Milton
Santos, David Harvey, Yves Lacoste e outros depois de avaliar criticamente a geografia
tradicional, passam a argumentar que é necessário discutir o espaço social e ver a produção
do espaço como o objeto da geografia.
Milton Santos em por uma nova geografia, propõe que a geografia critica deve, antes
de mais nada, se preocupar com o bem estar do homem e ser atuante em prol da restauração
da dignidade humana. Ele propõe um novo perfil de geógrafo, um pesquisador mais
preocupado com as contradições socioespaciais. Assim, os geógrafos críticos assumem a
perspectiva da transformação da ordem social. Buscam uma geografia mais generosa e um
espaço mais justo, que seja organizado em função dos interesses do homem, e não do
capital.
A dinâmica socioespacial e a produção do espaço geográfico

Esse tema nos faz refletir sobre a compreensão do processo de produção espacial em
sua determinação social. O que nos leva a uma reflexão da produção do espaço geográfico
como sendo o momento da reprodução social. O raciocínio aponta a uma orientação precisa
de compreender o espaço geográfico como produção social, ou seja, o ato de produção da
vida como ato de produção do espaço. Assim, a prática socioespacial é a base para a
sustentação da vida, visto que o espaço é condição, meio e produto da reprodução social.
No ponto de vista de Carlos (1981), o espaço geográfico, é o produto das relações
sociais que se estabelecem num determinado momento histórico entre sociedade e meio
circundante. Ele é dinâmico e componente ativo na relação da qual é o produto. Para a
autora, o espaço geográfico é fruto do processo de produção que se estabelece na sociedade,
que tem por objetivo a reprodução da vida humana. Portanto o espaço é o fruto do trabalho.
Na perspectiva de Lefebvre (1974), o espaço é visto como o produto das relações
sociais de produção e reprodução, ao mesmo tempo em que é suporte para que elas
aconteçam. Dos escritos de Lefebvre sobre o espaço, podemos destacar três pontos: a) O
espaço não é dado. Ele é produzido pelo homem através da transformação da natureza pelo
seu trabalho. b) as relações sociais são constituintes do espaço, e é a partir delas que o
homem altera a natureza. c) as relações sociais de produção, consumo e reprodução (social)
são determinantes na produção de espaço.
Soja (1993) escreve que as relações de produção do espaço são simultaneamente
sociais e espaciais. Ele fala da homologia espacial que pode ser vista na divisão do espaço
organizado em centros dominantes e periferias subordinadas, expressão do desenvolvimento
geograficamente desigual. O que nos leva pensar nos conteúdos dos processos que
constituem a produção social do espaço por meio da contradição entre a produção social do
espaço e sua apropriação privada.
Na apropriação privada temos, de um lado, a redução do humano e da vida na cidade
ao mundo da mercadoria, que produz a “cidade como negócio” (o crescimento como
estratégia da reprodução espacial) e de outro, o planejamento do espaço sob a lógica do
econômico, (espaço como valor de troca) que aprofunda a contradição entre espaços
integrados/desintegrados à globalização, também traduzida pela contradição centro-periferia,
como apontada por Soja (1993).
Visto que a produção da vida não envolve apenas a reprodução de bens para
satisfação das necessidades materiais; é também a produção da humanidade do homem,
precisamos pensar o desenvolvimento das relações de produção de mercadorias e da
produção da vida e de suas possibilidades, num sentido mais amplo e profundo. Pensar os
modos de apropriação que constroem o ser humano e criam a sua identidade. A dinâmica da
produção do espaço como condição, meio e produto da reprodução social.
Como condição para a realização da sociedade, trata-se do espaço da materialização
das relações sociais, como prática e suporte da realização das relações sociais, do uso e da
reunião dos membros da sociedade que pela atividade real vão constituindo a identidade na
prática e a partir de relações do homem com o outro, como objetividade e subjetividade,
como prática e realidade. Como meio, esse espaço realiza-se enquanto circulação de modo a
permitir a mobilidade. Como produto, teríamos o espaço enquanto valor de uso. Nessa
condição, questionaria a lógica produtiva do capital, na medida em que gera a necessidade
de produção dos espaços improdutivos.
Metropolização de Cuiabá e a rede urbana do estado de Mato Grosso

O processo de urbanização tem provocado o crescimento intensivo das cidades em


todo território brasileiro, como também o surgimento de novos centros urbanos. Esse
fenômeno é nítido no estado de Mato Grosso, o que levou a metropolização da cidade de
Cuiabá e na formação da rede urbana do estado.
Nos dois primeiros séculos após a sua fundação, Cuiabá apresentou crescimento
populacional condizente com os períodos históricos que atravessou, ficando em alguns
momentos, abaixo da média de outras áreas do território brasileiro; no século XVIII, chegou
a ter uma população maior que a de São Paulo. Segundo Moreno e Higa (2009) A distância
do litoral e vias de acesso inseguras, aliadas às incipientes atividades econômicas na
Província, foram fatores que desestimularam a colonização na época, embora as minas de
ouro em torno da vila de Cuiabá tenham constituído a princípio em atrativo da exploração.
A fundação e expansão inicial de Cuiabá esteve ligado a exploração do ouro, que
deixou marcas em seu espaço urbano, o que pode ser visto no centro histórico de Cuiabá,
que apesar de não conservar a riqueza aurífera, conserva as formas de ocupação da época. A
quase totalidade do ouro produzido aqui foi enviado para Portugal, restando apenas algumas
amostras nos ornamentos das antigas igrejas.
Cuiabá veio a experimentar um crescimento significativo somente na segunda
metade da década de 1960, quando Mato Grosso passa a fazer parte do processo de expansão
do capitalismo brasileiro em direção da Amazônia. Conforme De Lamônica (1997) Cuiabá
deixa de ser uma cidade fim-de-linha e passa a ser para assumir a posição de medianeira
urbana do projeto de “integração nacional” da Amazônia meridional, passando a ser
conhecida como “Portal da Amazônia”. A cidade passa a se destacar como entroncamento
importante para as políticas de expansão da fronteira agropecuária. Nesse momento, Cuiabá
recebe fluxos migratórios e passa por um expressivo crescimento populacional, que se
reflete na ampliação da área de ocupação urbana da cidade.
Na década de 1980, a cidade conheceu as mais altas taxas de crescimento
populacional desde a sua fundação, o que levou a uma expansão do sítio urbano sobre as
áreas periféricas e o rápido crescimento vertical, que segundo Vilarinho (2007) leva o
espaço urbano de Cuiabá a um processo de produção e reprodução, surgindo assim um novo
espaço urbano, caracterizado principalmente pela verticalização da cidade.
A cidade de Cuiabá constitui na atualidade o maior centro comercial e de prestação
de serviços do Estado, atendendo tanto ao interior quanto a outros Estados da região norte do
país, além de partes da Bolívia. A circulação rodoviária a coloca em contato com todo o
Estado, com o restante do país e com os países da América do Sul. Seu crescimento
populacional, nas ultimas três décadas do século XX, tornou-se um dos elementos
responsáveis pelo processo que transformou Cuiabá em uma metrópole regional, conforme
Vilarinho (2007).
A rede urbana até as duas primeiras décadas do século XX tinha a função de
sustentar a relação comercial do país com o exterior. Havia uma clara articulação entre as
cidades, fruto da ligação entre elas por meio dos transportes e da comunicação, que eram
responsáveis pelo fluxo de pessoas, mercadorias, informações e outras atribuições. Observa-
se que atualmente, o processo de formação da rede urbana tem se tornado mais dinâmico e
complexo, devido as novas formas de expansão do território r formação de núcleos urbanos.
No ponto de vista de Vilarinho (2007) A rede urbana do Estado de Mato Grosso
ainda está em processo de formação, visto que a principal característica do Estado é a
fronteira agrícola, e a maior partes da cidades foram fundadas há menos de 40 anos, além de
fazerem parte do processo de apoio as atividades rurais, estarem situadas em locais de difícil
acesso e serem excluídas do contexto regional.
O crescimento desses núcleos urbanos e o desenvolvimento de outros, já existentes
possibilitou a sua transformação em centros urbanos regionais, no ponto de vista de Moreno
e Higa (2009) ou de capitais regionais, conforme Vilarinho (2007). Cidades como
Rondonópolis, Sinop, Tangará da Serra, Cáceres e Barra do Garças, dispõem de melhor
infraestrutura, centro comercial estabilizado e oferecem variedade de serviços, exercendo
influência sobre os municípios vizinhos ao mesmo tempo que se articulam com outras
cidades de mesmo porte ou maiores como Cuiabá.
Precisamos entender que a formação de redes urbanas está diretamente relacionada
com a metropolização. Para que uma se forme, a outra também precisa se formar. O
processo de metropolização de Cuiabá abriu caminho para que se formassem os centros
urbanos regionais, e assim sua área de atuação. Essas novas metrópoles e capitais regionais
tem no fenômeno urbano o motor de sua existência, visto que apesar do agronegócio ser a
sua atividade econômica básica, ele é comandado contraditoriamente pelo urbano. Assim
Mato Grosso vem se estruturando no processo de metropolização, formação de regiões e
configuração da rede urbana estadual.
Mato Grosso: as novas relações campo-cidade a partir do agronegócio.

A recente urbanização do Estado, que ocorreu no contexto da produção e


modernização da agropecuária e da expansão da fronteira agrícola em direção ao norte do
país, incentivou o surgimento de novas cidades, relacionadas diretamente ao agronegócio,
indicando novas dimensões na relação campo-cidade, visto que cidade e campo são
produzidos com o objetivo de realizar a agropecuária como negócio.
Segundo Moreno (2009) Em Mato Grosso o ritmo de crescimento populacional
urbano se intensificou a partir da década de 1960, fato que refletiu diretamente na paisagem
das cidades. O campo desde 1950 começou a modernizar-se, acentuando o ritmo em 1964
através da modernização e da inserção de fertilizantes, adubos químicos, equipamento,
maquinários etc, também ocorreu a transformação dos processos tradicionais de
comercialização e criação das condições para a instalação de grandes monopólios
importadores – exportadores, como consequência a população do campo ficou sem terra,
desempregada e margens desse novo processo.
Dessa maneira, o processo de modernização da agricultura e da pecuária se
substancia em um processo de industrialização da produção que as submetem a um
movimento crescente de dependência de um pacote mecânico/químico/biológicogenético,
dominado por grandes corporações, que muitas vezes controlam todo o processo de
produção, processamento e comercialização dos produtos. A produção de alimentos se
revela aí como um grande negócio, mediação da realização de interesses externos, alheios
aos agentes imediatamente ligados à produção, ou seja, nesse processo de industrialização da
agricultura e pecuária, há também um processo de alienação do trabalho. É em um contexto
de crescente mundialização do capital, assim como de acentuação das crises do capitalismo,
que esse processo de modernização como força produtiva econômica, que se realiza em
escala mundial, se acentua.
No contexto de expansão do capital nacional para o oeste e para o norte, respaldado
pelas iniciativas estatais, o chamado agronegócio vem se expandindo rapidamente nos
últimos 30 anos no território mato-grossense. É uma atividade que demanda espaço, seja
para a produção rural em si, seja para as atividades que dão suporte e processam a produção,
que se realizam nas cidades. Segundo Moreno e Higa (2009), em Mato Grosso a relação
campo-cidade tem se estreitado nos últimos anos, levando os meios urbano e rural a partilhar
problemas e soluções.
A urbanização se torna produto e condições da realização do agronegócio, o que leva
a criação de novas cidades, que desde seu inicio são produzidas como negócio, sem passado,
reproduzindo a temporalidade da produção da agricultura modernizada. (Pádua, 2014) A
cidade é concebida e vendida por colonizadoras sob o discurso ideológico da esperança de
novos tempos, de pioneirismo e garantia de emprego e renda, o que pode ser observado nas
cidades que nasceram ao longo da BR 163.
A ligação do excedente econômico produzido no agronegócio à urbanização,
realizando esse excedente no mercado imobiliário das cidades (em muitas cidades se aceita
quantidade de produção de soja como pagamento de imóveis, por exemplo), demonstra que
a produção do campo está articulada de maneira fundamental à reprodução do espaço
urbano, seja em Cuiabá, seja nas cidades ligadas mais diretamente ao agronegócio. É uma
realidade voltada para a produção agropecuária, e cria uma espacialidade e temporalidade
específicas. Pode-se ver a cidade como uma concentração de elementos necessários à
produção. As cidades evidenciam na paisagem essa articulação com as atividades agrícolas,
lojas de máquinas agrícolas e de insumos, bancos, cooperativas, empresas de armazenagem,
consultorias, construtoras, imobiliárias, indústrias, empresas de aviação agrícola, etc.
A urbanização recente do Mato Grosso revela uma nova dimensão da relação campo-
cidade, pois produz (ou reproduz) o campo e a cidade como elementos do urbano
(concentração de inúmeros elementos, simultaneidade, fluidez). A agricultura modernizada
nos dá argumentos para pensar a urbanização do campo. Ou seja, nos colocamos diante da
questão: que campo e que urbano são produzidos nesse processo? Para pensarmos um
caminho de resposta a essa questão é preciso refletir teoricamente sobre essa realidade nova,
a partir de sua materialidade concreta, colhendo aí as indicações de seu conteúdo.

Você também pode gostar