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A geografia da industrialização

Irradiando da Grã-Bretanha, a dinâmica industrial propagou-se rapidamente. Na Europa, a


França, a Bélgica, a Suiça e a Alemanha tomam a dianteira e colocam- -se no grupo dos
países mais industrializados. Na América, agigantam-se os Estados Unidos. Na Ásia, será o
Japão o único país a industrializar-se.

A hegemonia inglesa

Berço da Revolução Industrial, a Inglaterra detém, em meados do século XIX, um claro


avanço sobre os restantes países: a sua indústria, fortemente mecanizada, permite-lhe
abastecer o mundo de têxteis, artefactos metálicos e bens de equipamento; uma densa
malha de ferrovias assegura eficazmente a circulação interna, enquanto a maior frota
mercante do planeta (cerca de 35% da tonelagem mundial) the confere o primeiro lugar nos
circuitos do comércio intercontinental.

Todo este poderio económico gera uma constante acumulação de capitais, que os
empresários ingleses aplicam um pouco por todo o mundo.

Todavia, ao aproximar-se o fim do século, a supremacia inglesa esbate-se. O equipamento


industrial britânico, outrora o mais avançado do mundo, começa a acusar os anos. Com
dificuldades em acompanhar o constante avanço tecnológico e em reorganizar, de forma
mais competitiva, as suas velhas fábricas, a Inglaterra luta contra uma concorrência cada
vez maior. Nas vésperas da Primeira Guerra Mundial, depois de mais de um século de
supremacia económica, vê-se ultrapassada pelos EUA, sua antiga colónia.

A afirmação de novas potências


A França

Segunda potência a arrancar, a França industrializou-se a um ritmo relativamente lento,


condicionado, em parte, pela falta de boas jazidas de carvão, capazes de fornecer
combustível barato. Tal não impediu, porém, o desenvolvimento de complexos siderúrgicos
como o de Le Creusot, que em 1870 empregava mais de 10 000 trabalhadores. Será
também com um monumento da "arte do ferro" que o país exprimirá, na Exposição de 1889,
o seu orgulho de potência industrial.

No início do século XX, entre 1900 e 1913, o ritmo da industrialização francesa acelerou-se.
Nos setores da eletricidade, do automóvel, do cinema e da construção, a França conseguiu
ultrapassar as outras nações. No entanto, este impulso não foi suficiente para que o país
percorresse a distância que o separava dos primeiros países industriais.
A Alemanha

A principal característica do processo industrializador alemão foi o seu dinamismo.


Cerca de 1840, sem passar pela etapa do têxtil, os Alemães lançam-se decididamente na
grande indústria, privilegiando os setores do carvão, do aço e dos caminhos de ferro. Mais
tarde, na década de 70, arrancam os setores da química, da construção naval e da
eletricidade.

No fim do século, a indústria alemã, em geral, e o setor siderúrgico, em particular, moveram


uma forte concorrência aos produtos ingleses, tanto na Europa como no resto do
mundo, o que gerou uma onda de rivalidade e ressentimento entre os dois países.

Os Estados Unidos da América

É cerca de 1830 que, tirando partido dos seus abundantes recursos naturais, os Estados
Unidos se lançam na era industrial.

Tal como em Inglaterra, foi a indústria têxtil que impulsionou as primeiras fábricas.
Favorecido pela abundância de matéria-prima (algodão, lä) e por uma política económica
protecionista, o têxtil americano prosperou rapidamente.

No entanto, o grande dinamizador do crescimento económico foi o setor siderúrgico.


Entre 1870 e 1887 formaram-se gigantescas concentrações, com destaque para a United
States Steel Corporation, que se tornou líder da siderurgia mundial. Pela mesma época,
desenvolvem-se os setores energéticos mais modernos: a eletricidade, que beneficia das
gigantescas quedas-d'água americanas, e o petróleo, favorecido pelas importantes jazidas
do subsolo. Pouco depois, é a vez da indústria automóvel, cuja rápida expansão permite
prolongar, no setor siderúrgico, os efeitos estimulantes das vias-férreas.

No fim do século XIX, os Estados Unidos tornaram-se a primeira potência industrial do


mundo: lideravam a produção mundial de carvão, petróleo, ferro, aço, cobre, chumbo, zinco
e alumínio, enquanto a sua produção têxtil detinha o segundo lugar mundial. Esta posição
ver-se-á consolidada com o declínio da Europa, fruto da Primeira Guerra Mundial.

A emergência do Japão

O Japão foi o único país asiático que se emancipou, no século XIX, da tutela económica das
grandes potências. Pondo fim a séculos de isolamento, abriu-se finalmente ao mundo,
deixando-se fascinar pela civilização ocidental.

A modernização japonesa foi personificada pelo imperador Mutsuhito que lançou o país
numa era de progresso: a era Meiji.
Iniciadas em 1868, as reformas Meiji em poucos anos transformaram a face do Japão que,
de país agrícola e atrasado, se converteu numa nação industrial com largo poder de
competitividade. O impulso industrializador ficou a dever-se, sobretudo, ao Estado, que
promoveu a entrada de capitais e técnicos estrangeiros e financiou a criação de novas
indústrias, às quais concedeu exclusivos e outros privilégios. Para o êxito do arranque
japonês, alicerçado nos setores da siderurgia, da construção naval e do têxtil da seda,
contribuíram também o intenso crescimento demográfico e o forte orgulho nacional dos
japoneses.

O resto do mundo

No século XIX, a industrialização foi sobretudo um fenómeno europeu, partilhado pelos


Estados Unidos da América e por um pequeno país da Ásia, o Japão. Excluídas do avanço
tecnológico e da elevação do nível de vida que a Revolução Industrial representou, ficaram
as vastas regiões da Ásia, da Oceânia, da África, da América do Sul. Apesar dos
progressos registados no decurso do século XX, esta industrialização desigual imprime
ainda a sua marca de pobreza a muitos países do mundo.

Desfasamentos da industrialização em espaços nacionais

A História do século XIX foi dominada pela Revolução Industrial. Entre 1815 e 1914, a
agricultura, a indústria, o comércio, o sistema bancário, os transportes e as comunicações,
entre tantos outros aspetos, sofreram uma alteração pro- funda que, pela sua importância,
distingue este século dos que o precederam. No entanto, e porque a evolução não se
processa num ritmo único, no mesmo espaço nacional, as formas económicas novas
coexistiram, durante muito tempo, com as técnicas e os sistemas de produção
antigos. Enquanto umas regiões se desenvolviam, favorecidas pelos seus recursos
naturais, pelo empreendedorismo dos seus habitantes ou pela iniciativa dos governos,
outras mantinham-se quase imutáveis.

No mundo rural, a mecanização agrícola, voltada para o mercado consumidor, coexistiu


com os velhos utensílios e uma agricultura de subsistência, pobre e arcaica.

Mas também na indústria, a produção tradicional tarda a desaparecer e o artesão mantém-


se ativo, sobretudo nos ofícios que exigem pouca tecnologia ou requerem gosto e minúcia
(confeção, artigos de luxo...). Em muitos locais persiste ainda o domestic system e a
produção continua a depender do esforço do mestre artesão que, no seu domicílio,
transforma a matéria-prima que lhe é fornecida por um comerciante.

Verdadeiro para as nações industriais mais desenvolvidas, este panorama acentua-se em


países de evolução mais lenta, como Portugal ou Itália. No século XIX, como em todos os
tempos de transformações rápidas, o mundo vive a dois ritmos e a novidade coexiste com a
tradição.
A agudização das diferenças

A confiança nos mecanismos autorreguladores do mercado: o livre-cambismo

Os princípios do liberalismo económico encontraram fortes resistências à sua aplicação.


Políticos, industriais e grandes proprietários, muitas vezes defensores convictos da
liberdade política, olhavam com desconfiança a livre circulação de mercadorias. Proteger a
produção nacional da concorrência estrangeira parecia, a quase todos, a política mais
acertada.

No entanto, a corrente livre-cambista era muito forte na Grã-Bretanha, berço de alguns dos
seus principais teóricos, como Adam Smith (1720-1790) e David Ricardo (1772-1823).
Segundo David Ricardo, a liberdade comercial asseguraria o desenvolvimento e a
riqueza de todas as regiões do mundo, na medida em que, face à concorrência, cada
uma se veria compelida a produzir o que fosse mais compatível com as suas
condições naturais. Esta especialização económica transformaria o mundo numa "imensa
fábrica" em que cada país ocupava o lugar de uma próspera oficina.

Estas ideias acabaram por se impor pela mão de Sir Robert Peel, chefe do Governo que
assumiu funções em 184. Peel começou por baixar os direitos de entrada que recaíam
sobre certos produtos básicos e, aos poucos, a pauta alfandegária do Reino Unido foi
diminuindo: em 1840, cobravam-se direitos de entrada sobre 1150 produtos; em 1860,
sobre apenas 48. A adoção do livre-cambismo em Inglaterra teve importantes
repercussões no país e no estrangeiro onde, sob o exemplo britânico, acabaria por se
implantar.

Entre 1850 e 1870, a tendência livre-cambista dominou a Europa e mesmo os Estados


Unidos, sempre protecionistas, baixaram as tarifas aduaneiras. O comércio internacional
conheceu, então, um período de forte crescimento.

As debilidades do livre-cambismo; as crises cíclicas

O liberalismo económico enquadrava-se perfeitamente na lógica do capitalismo que


dominou o século XIX. Quer nos setores produtivos quer nas trocas comerciais, a total
liberdade de iniciativa era, em teoria, o quadro mais favorável à criação de riqueza e à
obtenção de grandes lucros.

Porém, as previsões de crescimento igual e harmonioso entre todas as nações não se


verificaram, contribuindo o livre-cambismo para colocar dificuldades acrescidas ao
processo de industrialização dos países mais atrasados. Estes viam-se submersos pelos
produtos das potências industriais, com os quais não conseguiam competir.

Mesmo nas nações mais desenvolvidas, o livre-cambismo encontrou oposição, sobretudo


em tempo de crise económica, quando os efeitos da concorrência estrangeira mais se
faziam sentir.
Na verdade, o ritmo económico era abalado por crises cíclicas, que faziam retrair os
negócios e provocavam numerosas falências. Estas crises, que se sucediam numa
periodicidade de 5 a 10 anos, eram de um tipo inteiramente novo. Enquanto as crises do
Antigo Regime eram provocadas pela escassez agrícola, as crises do capitalismo deviam-
se geralmente a um excesso de investimentos e de produção industrial. Eram, pois, crises
de superprodução, resultantes da própria dinâmica capitalista.

Foi o economista francês Clément Juglar (1824-1905) quem primeiro estudou estes ciclos
económicos e os seus mecanismos. No período de crescimento, quando a procura se
sobrepõe à oferta, os preços sobem. Face a este estímulo, instalam-se e ampliam-se as
indústrias, recorre-se ao crédito, especula-se na bolsa. Em breve, porém, por falta de
previsão financeira e excesso de investimentos, a tendência inverte-se:

● os stocks acumulam-se nos armazéns (superprodução), fazendo as empresas


suspender o fabrico e proceder à redução dos salários e ao despedimento de
trabalhadores;

● os preços baixam a fim de dar saída às mercadorias acumuladas. Por vezes,


destroem-se stocks para evitar que os preços desçam demasiado;

● suspendem-se os pagamentos aos bancos, os créditos e os investimentos


financeiros. Esta contração leva ao crash bolsista, à falência de empresas e
entidades bancárias;

● o desemprego crescente faz diminuir o consumo e a produção decal ainda mais.

Estas crises, que podem iniciar-se num ou em vários países simultaneamente, propagam-se
com rapidez. Dadas as ligações financeiras e comerciais entre as nações, dificilmente se
consegue escapar a uma crise grave.

Entre 1810, ano em que se regista a primeira crise deste tipo, e 1929, quando estala a mais
grave de todas elas, verificaram-se 15 períodos de depressão económica generalizada, em
que alastrou a miséria social e a agitação política.

Vistas pelos economistas liberais como simples reajustamentos económicos, o certo é que
as crises cíclicas suscitaram protestos concertados contra os excessos do liberalismo
económico. No fim do século, o protecionismo tinha, novamente, conquistado terreno
e, após a grave depressão iniciada em 1929, desenhou-se claramente a necessidade de
intervenção do Estado na vida económica.

O mercado internacional e a divisão do trabalho

Berço da industrialização, o Velho Continente manteve, durante todo o século XIX, a


hegemonia económica e política que adquirira no tempo das Descobertas. Ao seu lado,
posicionaram-se os Estados Unidos da América, a antiga colónia britânica que partilhava os
valores e a cultura europeias.
Os países mais industrializados controlavam a produção e o comércio mundiais, que
moldaram de acordo com a sua vontade e os seus interesses. Alicerçavam esta
supremacia económica não só no avanço tecnológico e industrial, mas também no domínio
de extensos territórios, na África, na Ásia, na Oceânia.

Entre 1870 e 1914, altura em que o capitalismo industrial atingiu a plenitude, mais de 70%
da produção industrial pertencia a apenas quatro países: Reino Unido, Estados Unidos,
Alemanha e França. Autênticas "fábricas do mundo". forneciam os países mais atrasados,
aos quais adquiriam matérias-primas e produtos agrícolas.

Em tal contexto, as colónias ganharam uma importância crescente. Delas provinha a


maior parte dos produtos primários, constituindo também extensos mercados de consumo,
capazes de absorver os excessos da produção industrial. O mesmo se passava com países
como a China, por exemplo, que caíram sob a influência económica das potências
industrializadas.

Este sistema de trocas foi favorecido pelos progressos das comunicações. O caminho
de ferro fez diminuir o custo dos transportes terrestres cerca de vinte vezes e os transportes
marítimos registaram uma evolução idêntica. Com a abertura do Canal do Suez, por
exemplo, o frete da tonelada de mercadorias entre a França e as suas colónias na
Indochina passou de 950 para 86 francos.

Impulsionadas pelo crescimento industrial, pela facilidade do transporte e pela adoção do


livre-cambismo, as trocas mundializaram-se a um ritmo impressionante: em 1870,
valiam cerca de 50 biliões de francos-ouro; em 1914, quando deflagra a Primeira Guerra
Mundial, atingiam os 200 biliões. A cabeça do comércio mundial, encontrava-se a Inglaterra,
senhora da maior frota mercante do planeta.

Nos países em que se desenvolveu, o capitalismo industrial gerou um crescimento


económico nunca visto, na já longa História do mundo. Gerou também um sistema de trocas
desigual, que ainda hoje se mantém e que perpetua a diferença entre os países
desenvolvidos e o mundo atrasado e pobre que lhe fornece os produtos primários.

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