Engenheiro de Materiais & Soldagem Sênior - Inspetor de Soldagem Nível 2
Publicado em 1 de dez. de 2022 + Siga
Quando o pré-aquecimento é necessário na soldagem? Qual
é a sua importância? Como determinar a temperatura mais adequada? Como deve ser aplicado corretamente?
Neste artigo eu vou falar um pouco sobre esta etapa, muitas
vezes crucial, para se alcançar o sucesso na soldagem de uma junta de aço.
Qual é a finalidade do pré-aquecimento na soldagem dos
aços?
A maioria dos metais e suas ligas são bons condutores de calor.
Consequentemente o calor na região de soldagem é rapidamente escoado por toda a massa envolvida no processo, acarretando um resfriamento relativamente rápido. Em alguns metais esse resfriamento rápido pode contribuir para a formação de microestruturas prejudiciais na junta soldada: é o caso dos aços estruturais e de baixa-liga. O pré-aquecimento da junta a ser soldada é uma maneira de reduzir a taxa de resfriamento do metal. O pré-aquecimento aumenta a temperatura do metal adjacente à solda, de tal modo que o gradiente de temperatura (isto é, a diferença de temperatura) entre a solda e sua vizinhança seja reduzido. O resultado é que a junta soldada se resfria mais lentamente, visto que a taxa de resfriamento é diretamente proporcional ao gradiente de temperatura entre as massas quente e fria
O efeito da aplicação do pré-aquecimento na redução da taxa
de resfriamento a partir de 300°C pode ser evidenciado pela aplicação da Equação de Rosenthal para a condição de escoamento do calor tridimensional.
Considerando-se os dados abaixo tem-se que:
k = 35 J/m.s.°C, condutibilidade térmica do aço; I = 127 A,
corrente; U = 27 V, tensão v = 32 cm/min = 5,3.10-3 m/s, velocidade de soldagem; Ɛ = 0,85, eficiência do arco (FCAW); T = 300° C
Observando-se os resultados obtidos, fica claro o efeito da
temperatura de pré-aquecimento no sentido de se reduzir a taxa de resfriamento.
Durante a soldagem de aços-carbono e de baixa-liga há a
possibilidade de que o metal de solda e a zona afetada pelo calor (ZAC) contenham altos percentuais de martensita, um microconstituinte de elevada dureza e baixa ductilidade, indesejável nos aços para fins estruturais, pois aumenta de forma significativa o risco de ocorrência de trincas.
A martensita forma-se durante o resfriamento da solda e da
zona afetada pelo calor (ZAC). A quantidade de martensita formada pode ser limitada reduzindo-se a taxa de resfriamento da junta soldada.
É possível, por meio de diagramas (CCT) , determinar a
porcentagem das fases formadas durante a soldagem e, deste modo, determinar a taxa de resfriamento desejada e a temperatura de pré-aquecimento. Entretanto, para fins práticos, é usual empregar tabelas com as recomendações dos Códigos. Outro problema é que uma possível ZAC endurecida torna-se mais susceptível a trincas induzidas por hidrogênio. (TIH) – ver o artigo que eu escrevi a esse respeito deste assunto no Linkedin. Neste sentido, o pré-aquecimento também auxilia no sentido de favorecer a expulsão do hidrogênio difusível da solda para a atmosfera.
Assim, podemos citar as razões primárias do pré-aquecimento:
1.°) reduzir a taxa de resfriamento no metal de base e de
solda favorecendo a formação de estruturas metalúrgicas mais dúcteis e resistentes a trincas – quanto menor a dureza da ZAC menor a probabilidade de ocorrerem trincas a frio (TIH);
2.°) temperaturas mais elevadas favorecem a expulsão do
hidrogênio difusível para a atmosfera reduzindo assim a tendência de trincas a frio (Trinca Induzida pelo Hidrogênio - TIH)
Além disto, pode-se citar também como um efeito benéfico a
redução das tensões de contração no metal de solda e metal de base adjacente, o que é especialmente interessante para juntas com elevados graus de restrição.
Como determinar a temperatura de pré-aquecimento?
O primeiro passo para tal é conhecer a composição química do
metal de base.
Basicamente quanto maior for o teor de carbono do material
de base, maior será a temperatura de pré-aquecimento requerida. Esse raciocínio também se aplica ao teor elementos de liga.
Um método simples para determinar a necessidade de pré-
aquecimento de uma junta soldada é o do carbono equivalente (CE). A temperabilidade de um aço está relacionada ao seu teor de carbono acrescido dos teores de certos elementos de liga. Quanto maior for o carbono equivalente maior será a temperatura de pré-aquecimento requerida.
Uma equação para o carbono equivalente, largamente utilizada,
é dada pelo International Institute of Welding - IIW.
Outro fator importante para se determinar a temperatura de
pré-auecimento é a espessura do componente. De um modo geral, quanto maior a espessura, maior é a temperatura de pré-aquecimento, até um certo limite. De fato, esta função pode ser representada por uma tangente hiperbólica e assim a partir de uma determinada espessura o acréscimo na temperatura é desprezível.
A título de exemplo (digo isto pois existem outras abordagens)
é mostrado aqui uma tabela de temperatura de pré- aquecimento mínimas recomendadas para a soldagem de aços- carbono e carbono-manganês extraída da norma N-133 da PETROBRAS. Pela análise desta tabela nota-se a influência das variáveis carbono equivalente e espessura. É interessante observar que nesta tabela é utilizado o termo “espessura calculada”, o que é bastante apropriado, visto que uma junta em T é muito mais eficiente em escoar o calor do que uma junta de topo. Nos desenhos são mostradas as fórmulas para a “espessura calculada” de acordo com a configuração da junta. Apesar de muitas vezes as tabelas dos Códigos mostrarem baixas temperaturas de pré-aquecimento (por exemplo 10°C) para espessuras mais finas de certos materiais, a boa prática diz que mesmo assim deve ser realizado o pré-aquecimento, neste caso apenas com a finalidade de remover a umidade da chapa ou tubo antes da soldagem. Outro detalhe interessante que deve ser observado é que para uma soldagem realizada em condições climáticas inclementes (ex.: inverno na Rússia – temperaturas abaixo de - 50°C), uma temperatura de +10°C representa um pré-aquecimento considerável.
E o que deve ser feito quando a temperatura de pré-
aquecimento mínima recomendada pelos Códigos se mostrar inadequada?
Como foi comentado aqui, as tabelas de temperaturas mínimas
de pré-aquecimento exigidas por alguns Códigos (ex.: AWS D.1) levam em consideração apenas a composição química do metal de base e a faixa de espessura. Entretanto, isto não quer dizer que tais temperaturas serão sempre suficientes e adequadas para uma dada aplicação. Existem outros fatores que as vezes também precisam ser considerados, tais como: grau de restrição da junta e teor de hidrogênio difusível do consumível. O próprio Código AWS D1.1 prevê este tipo de situação, e no Anexo G intitulado Guideline on alternative Methods for Determining Preheat, são dadas as diretrizes para um cálculo mais completo e apurado da temperatura de pré- aquecimento, levando em consideração estes fatores.
Mesmo se, após a aplicação deste métodos alternativos a
temperatura de pré-aquecimento se mostrar inadequada, pode se fazer uso dos testes de soldabilidade para se determinar a temperatura mais adequada.
Os testes de soldabilidade, com destaque ao CTS (Controlled
Thermal Severity), Tekken (Y-Groove Restraint Test), o de restrição LEHIGH e o G-BOP, foram desenvolvidos para avaliar a sensibilidade ao trincamento a frio de juntas soldadas. Tais testes são padronizados pela norma ISO 17642-2.
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