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Franci o d O liveir
Apresentação
Fabio Mascaro Querido e Ruy Braga
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JE IT IN H O E JEITÃO
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Bra, il: uma biogi.f, •
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Brasil: uma bi , .
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s ditames da norma, de conviver sem se
. se submeter ao • , . r rec0 _
vida sem · e d . lei A moderna musica popular brasileira n . entre as centenas de dialetos do país. A le b I
1 1"do como rora a . , asc1da m rança usa m . f, fi
n 1cc • m toda a razão foi chamada de bossa nova El e restrita a Goa e Macau. ais Ortc cou
Rio de Janeiro, co _ . . , La . · a roi
no . .. h. d escapar das convençoes musicais a Vicente Celesf
umJeJtm o e , . . al" E b' ino,
. . fui d rande canto lmco lt ,ano. tam em um jeitinh d
copia . sa o g b d . f. o e Voltemos ao caso carioca, lembrado a prop · · d I
incorporar as m alandragens do sam a - e ongem a ncana e escrava _ . .
da bossa nova. F01 Juscelmo Kubirschek ourro
omo a ma andragem e
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ao universo das elites. . , ' exemp ar o homem
cordial, quem Jogou a pa de cal nas pretensões modernas d Ri d
Janeiro: retirou-lhe a centralidade de capital e não b t d
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o ou na a no 1ugar.
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Incapaz de resolver os problemas locais que i· á se aprese
Aburla das classes dominantes brasileiras às normas seria atávica? Meu . . .. ' ntavam em grau
superlauvo, deu um Jemnho e transferiu a capital para Bras,·1·
horror à burguesia (esse, sim, quase totalmente atávico) - cujo retrato 1a, nos ermos
do Planalto Central.
acabado foi a açucarocracia pernambucana, perdulária e arrogante_ ten-
Espanra-se quem anda hoje pelas ruas da cidade que amigamente
deria a confirmar que o jeitinho é um caso de mau-caratismo, um dado
ostentava sua modernidade: o Rio de Janeiro ficou a cara do Brasil. A
subjetivo. Mas prefiro a trilha aberta por Norbert Elias: a burla é uma
despeito do oba-oba em torno do renascimento carioca, basta observar
forma de adorar o capitalismo como solução incompleta na periferia do
a área ao redor do palácio do Carece, antiga residência dos presidentes
sistema. Incompleta porque o capitalismo trouxe para cá a revolução das
da República. O bairro à vista exibe mediocridade urbana, pobreza os-
forças produtivas, mas não as soluções formais da civilidade. As classes tensiva e tráfico de crack.
dominantes, então, têm de "se virar", dão um jeitinho para garantir a A fantasia da mulher carioca, linda e elegante (e que de fato disputava
coesão de um sistema uoncho e, comme ilfout, a exploração. o topo da beleza com mulheres de outras nacionalidades, com a vantagem
Sem querer atribuir tudo a nossos colonizadores, a semente do jeitinho da miscigenação), deu lugar à imagem de mulheres - e homens - que
já vicejava na irresolução que Portugal deu às questões de administração andam com sandálias surradas e se vestem pobremente. Como não per-
e governo da jovem - e enorme- colônia. Não dispondo nem de homens ceber aí sinais de uma modernidade truncada?
nem de recursos capazes da façanha de fazer a minúscula cobra engolir No caso de Juscelino e das classes dominantes, a mudança da capital
o enorme elefante, Portugal opta pela solução capenga das capitanias foi um "jeitão" de deslocar um problema: criar uma nova fronteira para
hereditárias. Na mesma época, tendo criado um novo caminho para o a expansão capitalista, catapultada pela indústria da construção civil. O
Oriente com Vasco da Gama, d. Manuel, o Venturoso, emprega até o fim jeitinho foi fazer isso por meio de candangos, trabalhadores informais,
os modestos recursos portugueses na conquista da Índia e só consegue depois abandonados à própria sorte, "sem lenço, sem documento", como
estabelecer relações comerciais em pontos isolados do sul do continente. cantaria Caetano Veloso, ele próprio, conforme a análise de Roberto
, No Brasil, as capitanias são entregues a fidalgos, alguns com recursos Sc hwarz, cultor do jeitinho uansrorma
e do em "verdade tropi·ca1" · OBrasil
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na quase sem nenhum capital. O resultado da co oniza- é assim, defende Caetano, a esquerda é que não o entende.
çao pelo meto~o das capitanias foi pífio, à exceção de duas ou três delas.
O fracasso na lnd· · d u
a meca das espe · · ·
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e o mesmo porte, senão maior: Lisboa se torno
• d" cafi'e rIderava. a expansãoB eco-
N cianas onenrais, mas Portugal nunca ocupou a ln 1ª· Na segunda metade do sécu1o XIX, 0 .
em sequer conseguiu 1' ·vo .
nomica. Não só no vale do Paraíba, em ao au 0
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p 1 ou mesmo no ras11:
que ª mgua portuguesa tivesse peso expressi
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Br;isil: urna b·
iogr,fi, nio >utoriud.t 14 S
. é . é hoje) 0 retrato mais notável da classe domina
se tornasse (e ar d - b 1 ,, nte bra A matriz desses gestos encontra-se 'd
• .. e bela viola; por entro, pao o oremo , como d' - . N 1 ev1 entemente 1
sile1ra: Por rora, . se ti. no escravag1sta. e e, o corpo dos negros . no ongo período
. ho é liberal por fora e escravista por dentro M h era propriedade 0 d'
opular. Bennn . , . ac ado e usado. O surpreendente é esses gestos ' P ia ser tocado
P ... ho literário para legar um form1davel enigma a e esses costum
usou um Je1tm , . . . , o qua) 'á ao longo de cem anos de vigência de u ·ra1· es terem persistido
. ram milhares de paginas: Capim tram mesmo ou foi vít" J . m cap1 ismo pie
se ded1ca . . trna de O escravismo e a escravidão não expli . . no.
. peraça·o de classe? Maria Capitolma, a Capitu, era mais b ,, d . e al"d d carn inteiramente "I
uma Vltu . " po re duração a mrorm i a e generalizada ne d h 'b· a onga
·ido liberal Bentinho. E, com seus olhos de ressaca" . m os a nos que a ac
ar O E d
que seu m ' , pro- Panham.. s sta os Umdos . -
tiveram um sise . om-
ema escravtsta que che ou
vavelmente tinha sangue negro. a organizar fazendas de cnaçao de negros A ru g
Nascido inicialmente das contradições entre uma ordem liberal formal , _ . · prura com o escravismo
custou a naçao . .norte-americana
. _ . uma guerra civil que deixou . marcas ate,
e uma realidade escravista, o jeitinho se transformou em código geral hoje. Mas o JeJtmho nao foi o expediente que usararn para superar os
de sociabilidade. problemas colocados pelo capitalismo que avançava.
Aqui, o jeitinho das classes dominantes se impôs na abolição da es-
cravatura. Primeiro veio a Lei do Ventre Livre: garotos e garotas negros
Recordo um caso pessoal, passado há muito tempo. Eu trabalhava eram libertados em meio à escravidão. Mas, como inexistia a perspectiva
com Celso Furtado (rigorosamente antijeitinho), que recebia um diretor de terem terra, emprego ou salário, a libertação não lhes servia para
do Banco lnteramericano de Desenvolvimento - por sinal, conterrâneo quase nada.
seu. Este, vendo-me por perco e julgando que eu não era parte da con- Depois veio a Lei dos Sexagenários. Aos sessenta anos, os negros que
versa, pediu-me água. Pediu a primeira, a segunda e a terceira vez. Fui ainda estivessem vivos eram libertados. Ora, já se sabia que a média de
obrigado a dizer-lhe que não confundisse gentileza com servilismo e que, vida de escravos não alcançava os quarenta anos. Como mostrou Luiz
da próxima vcr., ele mesmo se servisse. Não ocorria àquele senhor que Felipe de Alencastro em O trato dm viventes, depois de décadas de labuta
alguém que não fosse de sua grei pudesse tomar parte de uma conversa no eito, o consumo do trabalho pelo capital não era uma metáfora: o
com altos representantes da banca interamericana. negro era um molambo de gente, e não um homem livre, mesmo quando
A origem do jeitinho, assim como a da cordialidade teorizada por libertado pela Lei dos Sexagenários.
Sérgio Buarque, explica-se pela incompletude das relações mercantis
O que parecia cautela e previsão era, na verdade, o je~cinho (e 0
J•e1•tao
- ) em movimento.
. Gra dual mente, ate' a chamada Lei Aurea ' a es-
capitali st as. Parece sempre que as pessoas estão "sobrando". Elas são 'd• . . . pulaça·o trabalhadora que o
como resquícios de relações não mercantis não cabem no universo da crav1 ao persistiu. Isso cnou uma superpo . . .
. . Com a indusmahzaçao,
sistema produtivo não tinha como mcorporar. .
, e: E as
civilidad ' pessoas que sobram pode ser
' pedida
. qualquer c01sa,
· P ·' ravou Tendo que copiar
que e obngaça'0 do domma • do servir
. ao dominante.
. tão sonhada pelos modernos, o pro bl ema se ag · , .
. , ue tende sempre a economia
uma industrialização de mamz exogena, q ·aJmenre
d Qualq~er reunião brasileira está cheia de batidinhas nas costas na hora . . cresceram exponenc1 .
0 do trabalho, os excedentes pop acwnaisul
cumprimento ' imp on do de sai'da uma mumidade
. . ..L
. . . • · tória e
que e, mnma
mttm1ua1ória. Um d . · J ácio
Lula d s·l os cumprimentos mais característicos de Luiz 11 capira-
a 1va, por exem J , b b · a dos . fi al se tornou escrucural no
inre 1 P o, e ater com o dorso da mão na arng Assim, o chamado trabalho m orm al, . áo as normas craba-
r ocutores. Mesmo d Lula • • 1 a de s anos, n
ao se ap •
roximar de ual
em encontros formais o primeiro gesto e
, !ismo brasileiro. E ele que regu ª ª cax
q quer pessoa é tocar-lhe a barriga.
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, J Oliveira
146 Francisco e
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