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de uma desocidentalitação dos dados, não limina as consi derações iniciais de qua quer

filosofia politica. Como identificar e qualificar o politico? Como sconstruilos, se ele não é uma
expressão manifesta da realidade social? Como determinar as Suas funções específicas, se
admitirmos como muitos antro pólogos que certas sociedades primitivas são desprovidas de
uma organização política?

Maximalistas e minimalistas

A informação etnográfica, que os inquéritos directos fun damentam, revela una grande
diversidade de formas politicas primitivas»; quer se trate do dominio americano desde os
bandos de Esquimós até ao Estado imperial dos Incas do Peni ou do dominio africano desde os
bandos de Pigmeus e de Negrillos até aos Estados tradicionais, alguns dos quais, como o
Império Mossi e o reino Ganda, sobrevivem ainda. Se esta variedade exige classificações
tipologias, impõe, antes de mais nada, a questo prévia da referencição e da delimi Tação do
campo politico. A este respeito, opõemise dois campos: ira timalistas, por um lado, e
minimalistas, por outro. O pri meito, cujas referências são antigas e ainda neradas, poderia ter
como divisa a afirmação de Bonald: não lá sociedade sem governo Ja a Politica de Aristóteles
considera o homem um ser naturalmente politico e identifica o Estado com o agru pamento
social que, abarcando todos os outros e ultrapas sando-os em capacidade, pode, ao fim e ao
cabo, existir por si próprio. Este modo de interpretação, nas suas ultimas conse quências, leva
a assimilar a unidade politica à sociedade global. Assim, SF Nadel escreve no seu estude sobre
os funda mentos da antropologia social: Quando se considera uma socie dade, encontramos a
unidade política, e quando se fala Ca primeira, consideramos de facto esta ultima; de tal modo
que as instituições políticas são as que garantem a direcção e a manutenção do mais extenso
dos grupos en corpo, isto é, a sociedades E. R. Leach apropria se desta assimilaçãoe aceita
implicitamente esta igualdade estabelecida entre a socie

8. F. flade). The Foundations of Fortal Anthropology, 1951, 141.

p 181 e p.

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Capitulo II

DOMINIO DO POLITICO
A 'antropologia política é confrontada, desde o inicio, com

os debates que foram tão essenciais à existência da filosofia

política que a puseram em perigo, a tal ponto que R. Polio

entre outros, demonstra a necessidade e a urgència de se

apresentar a sua «definição» moderna e a sua «defesa». As dua

disciplinas, nas suas ambições extremas, visam atingir a pr

pria essência do politico sob a diversidade das formas que

manifestam. As suas relações, parecem, contudo, feridas d

ambiguidade. Os primeiros antropólogos denunciaram o eti

centrismo da maioria das teorias políticas: R. Lowie vê nesta

uma reflexão principalmente concentrada no Estade e qu

recorre a uma concepção unilateral do governo das sociedades

humanas. Neste sentido, a filosofia política identifica-se com

uma filosofia do Estado e adequa-se mal aos dados que resul

tam do estudo das sociedades primitivas». Os antropólogos

modernos opõem o carácter cientifico da sua investigação an

carácter normativo das filosofias políticas, a validade dos seus

resultados às conclusões não experimentadas dos teóricos.

Embora estas críticas não tenham bastado para conferir &

antropologia política bases menos vulneráveís, servirant com

tudo a causa dos politólogos radicais, como a de C. N. Par

kinson, que os pretende tirar dos «caminhos já andados» e os

incita a constituírem uma história mundial do pensamento

políticos. O seu projecto vai de certa maneira ao encontro da

exigência dos especialistas que pretendem fazer da antropologie

politie

uma

verdadeira eiáncir cinparativa

do

projecto comum, de um conhecimento que se pretende objective


rente as chamadas «segmentárias Assim, M. G. Smith cons gra um tongo artigo às sociedades
de linhagens, que encals sob um triplo aspecto: enquanto sistema que apresenta
caracteristicas formais, enquanto modo de relação distinto do parentesco, e sobretudo
enquanto estrutura com conteúdo poli tico. E levado a considerar a vida politica como um
aspecto de toda a vida social, não como produto de unidades ou de estru turas especificas, e a
recusar a pertinência da distinção rigida estabelecida entre «sociedades com Estado» e
«sociedades sem Estados Mas esta interpretação é também contestada, nomea damente por
D. Easton, no seu artigo consagrado aos proble mas da antropologia política: a análise teorica
de Smith é segundo ele efectuada a um nível tão elevado que não permite que se perceba em
que é que os sistemas politicos se assemelham, a não ser porque menospreza 0 exame do que
os distingue. Portanto a incerteza permanece

Confrontação dos métodos

A ambiguidade encontra-se, ao mesmo tempo, nos factos, nas vias e no vocabulário técnico
dos especialistas. Logo à primeira, o termo «político contém várias acepções - algumas das
quais são sugeridas pela lingua inglesa, que diferencia poltty policy e politics. Não se pode
confundir, sem riscos cientificos reais, o que diz respeito: a) aos modos de organização do
governo das sociedades humanas; b) nos tipos de acção que concorrem para a direcção dos
negócios públicos; c) as estra tégias que resultam da competição dos individuos e dos grupos.
Distinções a que conviria acrescentar uma quarta categoria: a do conhecimento politico: esta
impõe que se considerem os meios de interpretação e de justificação a que recorre a vida
politica. Estes diversos aspectos nem sempre são diferenciados nem ratados da mesma
maneira. A acentuação que incide num ou noutro desses aspectos provoca definições
diferentes do dominio politico.

Referenciação pelos modos de organização espa cial. As contribuições de Henry Maine e Lewis
Morgan atri

M. G. Smith, On Segmentary Lineage Systemas, in Journ of the Roy. Anth, Institute, vol. 86, 2,
1956,

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dade e a unidade politica definida pela sua capacidade máximn


de inclusão.

Algumas das análises funcionalistas não contradizem esta

acepção ampla do político. Quando Radcliffe-Brown define

a organização politica como o aspecto da organização total

que garante o estabelecimento e a manutenção da cooperação

interna e da independència externa, aparenta, através da

segunda destas funções, a sua noção do político com' as ante

riores.

Os minimalistas mostram-se negativos ou ambiguos acerca

da atribuição de um governo a todas as sociedades primitivas.

Muitos historiadores e sociólogos são minimalistas: salvo Max

Weber, que oube recordar a anterioridade da política relati

vamente ao Estado, o qual, longe de se confundir com ela,

não passa de uma das suas manifestações históricas. Antro

pólogos antigos e modernos situam-se igualmente entre aqueles

que contestam a universalidade dos fenómenos políticos. Um

dos fundadores, W. C. MacLeod, considera os povos que

estuda como os Yurok da Califórnia desprovidos de orga

nização política e vivendo num estado de anarquia (The Origin

and History of Politics, 1931). B. Malinowski admite que os

"grupos políticos estão ausentes entre os Vedda e os aborí

genes australianos e R. Redfield subliha que as instituições

políticas podem faltar por completo no caso das sociedades

#mais primitivas. E até Radcliffe Brown, no seu estudo dos

Andaman (The Andaman Islanders, 1922), reconhece que estes

insulares não dispõem de qualquer «governo organizado».

De facto, a constatação negativa raramente possui valor

absoluto; a maior parte das vezes apenas exprime a falta de

instituições políticas comparáveis às que regem o Estado mo


derno. Por virtude deste etnocentrismp implícito, não pode

satisfazer. Daí, as tentativas que visam quebrar uma dicotomia

excessivamente simplista, que contrapõe as sociedades tribais

às sociedades de governo nitidamente constituído e racional.

Estes empreendimentos operam segundo vias diferentes. Podem

caracterizar o dominio politico não tanto pelos seus modos de

organização como pelas funções realizadas; então, a sua exten

são alarga se. Tendem também a referenciar um limiar a partir

do qual o politico se manifesta nitidamente. L. Mair recorda-o

Alguns antropólogos teriam como adquirido que a esfera do

politico começa onde acaba a do parentesco. Ou então a difi

culdade é abordada de frente, e o conhecimento do facto político XC

é procurado a partir das sociedades em que é menos apa

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boiram importância especial ao critério tecciutat r denty

potitiko apreende se em primeiro lugar enquanier om

organização que opera no quadro de um território dell6m

da uma unidade politica ou espaço que suporta nma,

nidade politica Este critério aparece na maioria dos steigic

la organização política (em sentido amplo) e de Estudo

Weber caracteriza a actividade política, para além do

levitimo a força, pelo Facto de ela se desenrolar no

território com fronteiras definidas, ela instaura asso) M²

nitida separacão a pa tir do interiors c do exterior VƏKAWAID

de maneira significativa os comportamentos. Radkelift 109

apresenta izualmente o quadro territorials entre os ele

que definem a organização polifica E outros antropo

fazem no depois dele, entre os quais L. Schapera, que

que as sociedades mais simples organizam a sodi-lach

intera a partir do factor de parentesca e do tacion=


Trata-se, aliás, da repetição de uma afirmação de Loge qu

à compatibilidade entre o prin so de parentesco op P

territorial.

A partir do estudo de um vaso —o da sociedado auzion4

Tavia dos Nuer do Suidão-, E. E. Evans-Pritchard

a determinação do campo politico por referència à pri

territorial. Especifica ele: «Entre os grupos locais, lui reline

de ordem estrutural que se podem chamat politicas XXX

tema territorial dos Nuer é sempre a variável donorod

velação com os outros sistemas sociais

leva F

Logo, o acordo é amplo. Esta verificação

a formular uma questão de método As representac

toriais constituirão o cerne dos sistemas políticos?

fosse o seu estudo tornar-se-ia a primeira farefa da, aromete

logia e da sociologia políticas; enquanto que o recurso

de poder e de autoridade permanece contestável, ny

en que toda a estrutura social os revela

by Referenciaca) pelas fogões - Para tóm tud

minação pela territorio, sobre qualse impo.copostage

o politico é frequentemente defimdo pelas funções qucat

penha. Sob a sua forma mais getal, estas últimas savA

EE Evans-P itchard, The Mer, 1910, p. 205

FX Sutton Representation and Nature of Po

lenses In Compar, Stud, in Soc. und ist, vot 11, 1, 1969


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como garantindo a cooperação interna a defesa da integridade

da sociedade contra as ameaças exteriores, estas contribuem

Tiara a sobrevivência físicas daquela, segundo a formula de

Nadel, e permitem a regulação dos conflitos. A estas funções de

conservação juntam se em geral as de decisãe de direcção dos

negocios públicos, mesmo se, manifestando o governo sob os

seus aspectos formais, forem de natureza diferente.

Alguns dos estudos teoricos recentes levam mais longe

a análise funcionalista. E o caso da introdução de G A Al

mond à obra colectiva The Politics of Developing Areas (1960).

Nela o sistema político é definido como efectuando, em qualquer

sociedade independente, kas funções de integração e de adapta

ção", mediante o recurso, ou a ameaça de recurso, à utilização

legitima da coacção Fisica. Esta interpretação lata permite não

limitar o dominio politico exclusivamente as organizações e

estruturas especializa las; visa a elaboração de categorias

aplicáveis a todas as sociedades e, por consequência, a cons

tração de uma ciência politica comparativa

Entre as caracteristicas comuns e todos os sistemas polí

ticos, G. A. Almond sal enta duas delas: a realização das mesmas

funções por todos os sistemas políticos eo aspecto multifun

tional de todas as estruturas políticas-sem que nenhuma

seja, totalmente especializada. A comparação pode fazer se se

levarmos em conta o grau de especialização e os meios utilizados

para o desempenho das funções políticas, Quais são estas

Tunções? A sua identificação é tanto mais necessária quanto


um estudo comparativo não pode limitar-se exclusivamente à

confrontação das estruturas e das organizações; assim conce

bido, seria tão insuficiente como uma anatomia comparada

sem uma fisiologia.comparada Almond distingue duas grandes

categorias de funções: tunas dizem respeito à política entendida

lite sensit a socialização dos individuos e a preparação

para os papéis politicos, a confrontação e o ajustamento dos

interesses», a comunicação dos simbolos das mensagens:

outras dizem respeito an governo a elaboração-e-a aplicação

das regras Tal repartição de funções permite-nos encontrar

os diversos aspectos do campo político, mas a um nivel de

generalidade que facilita a comparação, reduzindo o afasta

mento entre sociedades políticas desenvolvidas e sociedades

politicas primitivas.

Ainterpretação funcional deixa em penso questões

fundamentais, Explica mal os dinamismos que garantem a

coesão da sociedade global, tais como os qur Max Glockman

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à acção politica é por natureza «segmentária», visto que se

exprime por intermédio de grupos e de pessoas em compe

tição- Inversamente, a acção administrativa é por natureza

hierarquicas, porque organiza nos diversos graus, e segundo

regras rigorosas, a direcção dos negócios públicos. O governo

de una sociedade implica sempre, e em toda a parte, esta

dupla forma de acção. Em consequência, os sistemas politicos

só se distinguem na medida em que variam no grau de dife

renciação e no modo de associação destas duas ordens de acção.


Logo, a sua tipologia não deve ser descontinua, à maneira da

que opoe as sociedades segmentárias e as sociedades centra

lizadas estatais, mas antes constituir uma série que apresente os

tipos de combinação da acção política e da acção adminis

trativas

Easton formula uma dupla crítica acerca desta via

analitica: ela contém um «postulado (a. existência de relações

hierárquicas administrativas nos sistemas linhagistas) e oculta

as diferencas significativas» entre os diversos sistemas poli

ticos. Todavia, situa a sua própria tentativa num

mesmo

contesto. A acção pode dizer-se política quando está mais, ou

menos directamente ligada à formulação e à execução de

decisões coercivas num dado sistema socials. Deste ponto de

vista, as decisões políticas são tomadas no seio de unidades

Sociais muito diversas, como familias, grupos de parentesco,

linhagens, associações, empresas, das quais algumas actividades

constiquem de algum modo o próprio sistema politico». Esta

interpretação demasiado frouxa é desprovida de eficácia cien

tífica, D. Easton irá, aliás, limitá-la e reservar para o conjunto

das actividades que implicam a tomada de decisões que

interessam à sociedade global, e às suas subdivisões principais»>

a denominação de sistema politico. Define assim o político

através de uma certa forma da acção social, a que galante a

tomaca e a execução das decisões, e de um campo de aplicação,

o sistema social mais inclusivo»-isto é, a sociedade enquanto

todo Easton considera seguidamente as condições requeridas

para que a decisão política possa operar: a formulação das

exigéncias e a redução das suas contradições, a existência de um

costume ou de uma legislação, os meios administrativos de


Vejam-se as contribuições teóricas de A G Smitli, On

Sementary Lineage Systems, Journ of the Roy, Anthr, Inst., 86.

1956,

capitulos gerais de Government in Zazeau, Londres, 1960.

evoca ao observar que esta coesão depende da «divisão da socie

dade em séries de grupos opostos provocando dependências

que se sobrepõem e quando interpreta certas formas de

*rebelião como contribuindo para a manutenção da ordem

social Além disso, deixa subsistir uma imprecisão, porque p

funções políticas não são as únicas que preservam essa ordem

Para as diferenciar, Radcliffe-Brown caracteriza as pela utili

zação, ou possibilidade de utilização, da força física». Faz sc

eco da teoria de Hobbes e da de Max Weber, para quem a

força é o meio da política, a ultima ratio, porque a dominação

(Herrschaft) está no cerne do político.

É pela coerção-legitimamente utilizada-que tanto as

funções como as estruturas políticas são mais frequentemente

qualificadas! Contudo, ela é mais um conceito de referenciação

do que um conceito de definição; não esgota o campo do polí

tico, tal com o critério da moeda não cobre totalmente o campo

do económico.

c) Referenciação pelas modalidades da acção politica

Vários estudos recentes, devidos a antropólogos da nova

geração, deslocaram o ponto de aplicação da análise das funções

para os aspectos da acção política, MG. Smith, depois de ter

observado as confusões existentes no vocabulário técnico e as


insuficiências da metodologia, propõe uma formulação nova dos

problemas. Para ele, a vida política é um aspecto da vida social,

um sistema de acção, como o atesta a sua definição gerala

Um sistema político é simplesmente um sistema de acção

política. Mas há que determinar o conteúdo desta última,

se não a fórmula reduz-se a uma pura tautologia. A acção social

é política quando procura controlar qu influenciar as decisões

respeitantes aos negócios públicos policy, no sentido dos

autores anglo-saxónicos. O conteúdo tessas decisões varia de

acordo com os contextos culturais e as unidades sociais no

seio das quais são expressas, mas os processos de que são a

conclusão situam-se sempre exclusivamente no quadro da com

peticão entre os indivíduos e entre os grupos. Todas as unidades

sociais a que esta competição diz respeito possuem, por esse

facto, um carácter político.

Por outro lado, M. G. Smith contrápõe a acção política i

acção administrativa, apesar da sua estreita associação

governo das sociedades humanas. A primeira situa-se ao nível da

decisão e dos programas mais ou menos explicitamente formu

lados, e a segunda ao nível da organização e da execucão. Uma

define-se pelo poder, outra pela autoridade; Smith especifica que

e) Avaliação. Este inventário das vias é também o dos obstáculos encontrados pelos
antropólogos que abordaram o dominio politico. Revela que as delimitações permanecem int
precisas ou ontestáveis, que cada Escola tem a sua maneira. própria de as traçar, utilizando
muitas vezes os mesmos instru) mentos. E nas sociedades ditas de governo minimos e de
governo difuso» (Lucy Mair) que a incerteza é maior; nelas. os mesmos parceiros e os mesmos
grupos podem ter funções múltiplast incluindo funções políticas que variam segunda as
situações, como numa peça de teatro com um só actor. As finalidades políticas não são
unicamente atingidas através das relações qualificadas de políticas e, inversamente, estas
últimas podem satisfazer interesses de natureza diferente. J. Van Velsen, núma obra
consagrada aos Tonga da Africa Oriental (The Politics of Kinship, 1964), verifica o a outro nivel
de generalidade: as relações sociais são mais instrumentais que determinantes das actividades
colectivas. A partir desta observação, concebe um método de análise chamado «situm.
cionale; um novo instrumento de estudo que se impõe, segundo ele, porque as normas, as
regras gerais de comportamento, são traduzidas na prática, [e] são em ultima análise manipula
das por indivíduos em situações particulares para servir fins particulares. No caso dos Tonga,
para quem o poder não está ligado a posições estruturais nem a grupos especificos, os
comportamentos politicos só se manifestam em certas situações. E esses comportamentos
inscrevem-se num dominic movediço em que os alinhamentos estão constantemente mudar».

As fronteiras do político não devem ser traçadas exclusi vamente por referência às diversas
ordens de relações sociais, mas também por referência à cultura considerada na totalidade ou
em alguns dos seus elementos. No seu estudo da sociedades kachin (Birmânia), E. R. Leach pôs
em evidência uma corre lação global entre os dois sistemas: quanto menos acentuada é a
integração cultural, mais eficaz é a integração politica, av menos por submissão a um único
modo de acção politica Do mesino mmodo, apresentou o mito e o ritual como uni -linguagem
que fornece os argumentos que justificam as rel vindicações em matéria de direitos, de
estatuto e de poder

XIV e 313.

Van Velsen, The Politics of Kinship, 1981, p. XXILI,

Uma análise de J. Pouillon, apresentals no quadro de um grupo de estudos consagrado à


antropologia politica, ilustra a via estruturalista tal como se aplica a esta disciplina, Procura
antes de mais uma definição do político: será um dominio de factos ou um aspecto des
fenómenos sociais? Na literatura clás sica, a resposta fundamenta-se no recurso às noções de
sociedade unificada (unidade política), de Estado (presente ou ausente), de poder e de subordi
zação (fundamentos da ordem social), cuja insuficiência J. Pouillon verifica. Observa ele que
nem toda a subordinação é necessariamente politica, que nem toda a sociedade ou grupo
conhecem uma unica ordem, mas várias ordens mais ou menos compatíveis e, finalmente,
que, em caso de conflito, uma orden tem de predominar sobre as outras. Este último ponto
determina, segundo J. Ponillon, a referen ciação do político: evoca a preponderancia de uma
certa estrutura sobre as outras huma sociedade unificada. Esta estrutura privilegiada varia
consoante as sociedades, consoante as suas características de extensão, de número e de
género de vida.

Dai, uma outra formulação das questões próprias da antro pologia política: quais são os
«circuitos que explicam que certos homens possam mandar noutros, como é que a relação de
mando e de obediência se estabelere? As sociedades não estatais são aquelas em que o poder
se encontra em circuitos pré polí ticus criados pelo parentesco, pela religião e pela economia.
As sociedades com Estado são as que dispõem de circuitos especializados; estes são novos,
mas não anulam os circuitos preexistentes, que subsistem e lhes servem de modelo formal
Assim, a estrutura de parentesco, mesme fictícia ou esquecida, pode modelar o Estado
tradicional. Nesta perspectiva, uma das tarefas da antropologia política vem a ser a descoberta
das condições de aparecimento desses circuitos especializados. Efectua-se assim um deslize da
ordem das estruturas para a ordem das géneses. Explica-se ele pela passagem, no decurso da
argumentação, do dominio das relações formais (da ordem das ordens) para o das relações
reais de mando e dominação). Além disso, e esta dificuldade parece fundamental, afirmar que
a estrutura que se impõe em última análise é politica, é o mesmo que enunciar una petição de
principie

Com efeito, o mito implica uma parte de ideologia, è, segundo

a expressão de B. Malinowski, uma «carta social, que garante

a forma existente da sociedade coin o seu sistema de distri

buição do poder, do privilégio e da propriedade»; possui uma

Tunção justificativa que os guardiões da tradição e os gestores

do aparelho politico sabem manejar. Situa se pois no campo

de estudo da antropologia política, pela mesma razão que o

rito, en algumas das suas manifestações, quando se trata de

rituais que são exclusivamente (caso dos cultos e cerimoniais

relativos à realeza) ou inclusivamente (caso do culto dos

antepassados) os instrumentos sagrados do poder.

As dificuldades de identificação do politico encontram-se

também ao nivel dos fenómenos económicos, se considerarmos

à parte a relação bem aparente que existe entre as relações

de produção que regem a estratificação social e as relações de

poder. Alguns privilégios económicos (direito eminente sobre

as terras, direito às prestações de trabalho, direito sobre os

mercados, etc.) e algumas contrapartidas económicas (obriga

ção de generosidade e de assistência) estão associados ao exer

cício do poder e da autoridade. Existem também confrontações

económicas, da mesma natureza que o potlach indiano, que

põem em jogo o prestígio e a capacidade de dominação dos.

chefes cu dos notáveis. Exemplos africanos, e melanesios demons


tram-no com nitidez. Uma nova análise dos ciclos de troca kula

estudados por Malinowski nas ilhas Trobriand (Melanésia)

revela que, ali, a troca regulamentada de bens precisamente

determinados; e reservados exclusivamente para esse uso, é em

primeiro lugar um modo de organização politica. O autor

desta reapreciação, J. P. Singh Uberoi (Politics of the Kula

Ring, 1962), relata que os interesses individuais se exprimem

em função dos bens kula e que os sub-clãs considerados supe

riores se encontram situados nas aldeias mais opulentas e

participam mais activamente do ciclo. Este exemplo permite

avaliar até que ponto o fenómeno politico pode ser disfarçado;

deixa entrever que a busca da essência do politico 'se mantém

ainda afastada do seu termo, apesar de tão antiga

3.

Poder política e necessidade

As noções de poder, de concção e de legitimidade impõem-se

necessariamente, e de uma forma solidaria, no decurso desta

investigação. Em qué e porque são elas fundamentais? Segundo

a as suas proprias imperfeições; limita, no seu seio, os efeitos da competição entre os


individuos e os grupos. São estas funções conservadoras que geralmente se consideram. Recor
rendo a uma fórmula sintética, definir-se d o poder como resul tante, para toda a sociedade,
da necessidade de lutar contra a entropia que a ameaça de desordem - tal como ameaça todo
o sistema. Mas não se conclua que esta defesa recorre a um unico meio-a coacção e só pode
se assegurada por um governo bem diferenciado. Todos os mecanismos que contri buem para
manter ou para recriar a cooperação interna terão também de ser postos em causa e
considerados. Os rituais, as cerimónias processus que garantem uma renovação periódica ou
ocasional da sociedade são, tanto como os sobe ranos e a sua burocracias, instrumentos de
uma acção política
assim entendida. Se o poder obedece a determinismos internos que o reve fam enquanto
necessidade a que toda a sociedade se encontra submetida, netu por isso deixa de surgir como
resultante del unia necessidade externa. Cada sociedade global está em relação com o
exterior, e está, directamente ou à distancia, em rela ção com outras sociedades, que
considera como estrangeiras ou hostis, perigosas para a sua segurança e para a sua soberania.
Por referencia a esta ameaça do exterior, ela é levada, não apenas a organizar a sua defesa e
as suas aliançns, mas também a exaltar a sua unidade, a sua coesão e os seus traços distin
tivos. O poder, necessár o por razões de ordem interna há pouco consideradas, tona forma e
reforça se sob a pressão dos perigos exteriores. reais e/ou supostos. O poder e simbolos que
lhe estão ligados conferem assim à socie os meios de afirma a sua coesão interna e de exprimir
a sua personalidades, os meios de se situar e de se proteger perante o que lhe é estranho. F. X.
Sutton, no seu estudo. das representações políticas, sublinhaa importância dos Simbolos que
asseguram a diferenciação relativamente ao exte.. rior, assim como a dos grupos e dos
individuos srepresenta tivos.

Certas circunstancias mostram bem este duplo sistema de relações, este duplo aspecto do
poder, que sempre orien tado para o interior e přia o exterior. Em muitas sociedades de tipo
clanico, em que o poder continua a ser uma espécie de energia difusa, a ordem des factos
politicos apreende-se quer pelo exame das relações externas, cuerp-lo estudo das velacões
internas. Pode encontrar.se um exemplo deste caso

Hume, o poder não passa de una categori, subjective um dado, mas uma hipotese que tem de
ser verificado uma dade inerente aos individuos, antes surge aspecto essencialmente
teleolóogico-a sua capacidad p produzir efeitos, por si próprio, sobre as pessoas e padonn
coisas. De resto, é por meio dessa eficacia que é gen-lo definido. M. G. Smith especifica que o
poder é a caporidhul actuar efectivamente sobre as pessoas e sobre as cols rendo a uma gama
de meios que vai da persuasão até à Para J. Beattie, o poder é uma categoria especifica das
sociais; implica a possibilidade de coagir os Outros T naquele sistema de relações entre
individuos e entregamor O que situa J. Beattie na esteira de Max Weber, para que tom poder e
a possibilidade dada a um actor, no selo de à sua vontade.

relação social determ nada, de estar em condições de a ilusan

De facto, o poder sejam quais forem as formas on condicionam a sua utilização é reconhecido
em Lulinen sociedades humanas, mesmo rudimentares. Na medida eux qu são sobretudo os
seus efeitos que o revelam, conveni sit estes antes de considerar os seus aspectos e atrlard O
poder esta sempre ao serviço de uma estrutura soci! ANL não se pode manter exclusivamente
pela intervenci. TE *costume» ou da lei, por uma espécie de conformidade, gon matica as
regras. Lucy Mair recordouo pertinentemente: uby existe nenhuma sociedade em que as
regras sejani hatuxoaft camente respeitadas. Além disso, toda a sociedade resit equilibrio
aproximativo, é vulnerável. Os antropologos i dos preconceitos fixistas reconhecem esta
instabilidade 4 Zz cial, mesmo num meio arcaico». Logo, o poder tem por f defender a
sociedade contra as suas próprias fraquezás, vos servá-la, poderíamos dizer, em estados; e, se
necesito promover as adaptações que não estiverem em contradic com os seus princípios
fundamentais. Finalmente, hogoran as relações sociais ultrapassam as relações do parco1
Intervém entre os individuos e os grupos uma AMZIUIN mais ou menos aparente; cada um visa
orientar as dat da colectividade no sentido dos seus interesses part puder politico, surge, em
consequêncts, CORTO ME p da competição e como um meio de a conter.

Estas observações intelais levam a mia primel clusão poder politica e mnerable voca o respeito
das reglas que a atualquer socient d

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