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© Fabio Grossi dos Santos, 2021

O conteúdo desta obra é de responsabilidade do organizador, proprietário do


Direito Autoral
Editores
Léa De Ungaro Almeida Prado
José Renato de Almeida Prado
Revisão da diagramação
Lúcia Helena Lahoz Morelli
Vinícius Emanuel Russi Vieira

Capa
Arkus Propaganda
Diagramação
João Vasconcelos Floriani

M328
Às margens do Jahu: a história ainda não contada. /
Organização de Fabio Grossi dos Santos. Bruna Castro...
[et al.]. Jaú: 11 Editora, 2021.
524 p.

ISBN: 978-65-88141-01-4

1. Jaú (SP) - História. 2. História do Brasil. I. Santos,


Fabio Grossi dos. II. Castro, Bruna. III. Título.

CDD 981.61

Catalogação na fonte: Ivy Fini Rodrigues – CRB 8/7470

1ª impressão, 2021

Revisão ortográfica e gramatical realizada sob responsabilidade do organizador


da obra
Impresso no Brasil
Direitos exclusivos do projeto gráfico reservados ao
11 Letras
Selo editorial da
11 Editora

Rua Horácio Carvalho de Paula Leite, 285


17209-001 – Jaú – SP
contato@11letras.com.br [14] 3032-2513
www.11letras.com.br
SUMÁRIO

Apresentação, 9

Introdução, 13

Jahu antes de ser Jahu: entre a História e a Arqueologia


Fabio Grossi dos Santos, 17

Jaú e Potunduva: nomes indígenas


Wilmar Rocha D’Angelis, 49

Às margens do Rio Jaú: história de um rio


José Carlos Toledo Veniziani Junior
Jozrael Henriques Rezende, 97

A República que não aconteceu


Jeferson Miranda, 131

Anna Joaquina Ferraz: de moça escravagista a senhora capitalista


Guilherme Eduardo Almeida Prado de Castro Valente, 171

Resistir para existir: mulheres pretas em Jahu


Priscila De Nadai Fonseca, 187

As meninas do telefone
Bruna Faely Mano, 211

32: importante pensar


Marcus Carmo, 245

Jahu e o jornal em 32
Marcus Carmo, 285

A italianidade na década de 1930 na região de Jaú e Bauru, e o fascismo


Fabio Paride Pallotta, 315

Prostituição: histórias renegadas


Bruna Renata Franchin Castro, 343

A história da tatuagem em Jahu


Caio Cesar Gabriel Vieira, 411

Lições não aprendidas em uma cidade do interior paulista:


febre amarela, gripe espanhola e Covid-19 em Jahu
Fabio Grossi dos Santos e
Mair Pedro Souza, 451

O Museu Municipal de Jahu: novas ações e


perspectivas a partir da nova museologia
Pedro Henrique Cezar, 489
JAÚ E POTUNDUVA:
NOMES INDÍGENAS

Wilmar R. D’Angelis1

Os nomes indígenas emprestam muita beleza à geografia


brasileira, em especial os nomes tupis, pela sua abundância
em qualquer parte do território brasileiro. Uma parte muito
significativa deles foi atribuída por bandeirantes paulistas que,
como sabemos, em sua maioria falavam Tupi como língua
materna. Como bem demonstrou Sérgio Buarque de Holanda,
o Tupi ou Língua Geral Paulista foi a língua dos paulistas até
meados do século XVIII (Holanda, 1956).
Entre os sonoros nomes tupis da toponímia paulista,
estão os de Jaú e Potunduva, situadas a cerca de 10 km uma
da outra. O presente trabalho reúne dois estudos de toponímia,
referentes a cada um desses lugares.

JAÚ: CIDADE, RIO E PEIXE

Disseminou-se, possivelmente a partir da obra de


Teodoro Sampaio, a equivocada etimologia que dá, como
significado do termo tupi jaú (ou jahú, analisado como

1
Linguista, indigenista e pesquisador da história indígena do Sul e do Sudeste
do Brasil. Professor da área de Línguas Indígenas, no Departamento de
Linguística da Universidade Estadual de Campinas, desde 1994.

49
ya-ú), “aquele que devora” (Sampaio [1901] 1987, p. 268)2.
Não deixa de ser curioso que Teodoro Sampaio completa
sua informação com o seguinte: “é o grande peixe fluvial
(Platystoma), frequente no Rio Tietê, como nos rios da
bacia do Rio da Prata (...). É o mesmo sorobim, do Rio São
Francisco e outros rios do Norte” (Idem, pp. 268-269).
A propósito, registremos, desde já, o que a ictiologia diz
a respeito desse peixe, que nos será útil adiante:

P. luetkeni3, conhecido no Brasil como jaú (ya-ú = grande


comedor na língua nativa), é o peixe mais pesado da bacia [do
Alto Paraná], com até 144 cm de comprimento e 150 kg de
peso. Tanto no rio Paraná quanto no rio Amazonas, o peixe
realiza todo o seu ciclo de vida no canal principal, abrigando-se
principalmente em áreas profundas como adultos e na foz de
riachos e outros pequenos afluentes como alevinos. (...) P.
luetkeni é um piscívoro noturno... (Agostinho et al., 2003, p.
48 – tradução nossa).

2
É importante entender a razão da variação nos registros, ora com “h”, ora
sem. Os jesuítas do primeiro século (Anchieta entre eles) não costumavam
registrar, nas suas anotações da língua Tupi, a chamada oclusiva glotal, uma
consoante inexistente em Português (veja-se a nota 9, adiante). Confundiam
isso com um mero acento ou uma emissão mais forte da sílaba. Nos séculos
seguintes, em especial nos séculos XVIII e XIX, é frequente encontrarmos (de
mais de uma língua indígena) registros em que aquela consoante é anotada
com o recurso à letra “h”, de onde provém a forma “Jahú”. Atualmente,
seguindo a ortografia adotada para a língua Guarani, os estudiosos anotam
aquela consoante, nas palavras Tupi, com o uso do apóstrofo, do que resulta
a forma “ja’u”.
3
Paulicea luekteni. No registro de Hermann von Ihering (1898, pp. 108-109),
Paulicea Jahu, e, posteriormente, Zungaro jahu. De acordo com Buckup,
Menezes & Ghazzi (2007, p. 218), “considerada sinônimo de Z. zungaro
e Paulicea luetkeni (Steindachner, 1877) até recentemente, esta espécie
[Zungaro jahu, Ihering 1898] foi revalidada por Souza Filho et al. (2003)”.

50
Em outro lugar, lemos que os jaús alimentam-se

(...) de outros peixes e vivem comumente no fundo dos rios


em regiões de cachoeiras. Ficando escondidos nos poços criados
pelas cascatas, à espreita dos outros peixes que sobem os rios para
a desova, atacando-os4.

Também se informa que o jaú


(...) possui um corpo curto e roliço, com cabeça ampla, colo-
ração cinza-amarelada coberta por pequenas manchas escuras.
(...) preferem os canais de grandes rios localizados à jusante das
corredeiras. O jaú é um peixe carnívoro (...) (Alves et al., 2014, p. 4)

E ainda:

O jaú está presente principalmente nos canais de rios, cacho-


eiras, poços profundos e junto às margens das baías5.

Voltando ao que está dito em Teodoro Sampaio (jaú


= “aquele que devora”), o fato é que a sintaxe das línguas
tupi-guarani não permite aquela interpretação. Se a porção
final da palavra é a raiz do verbo “comer, ingerir” (transitivo),
ou seja, ‘u, para ser possível dizer “o que come” ou “o que
devora” ou “o comedor”, a forma correta seria ‘uara e, logo,
gwara6. E se, efetivamente, esse final em ‘u for a raiz do
verbo “comer”, então ja’u só poderia ser traduzido por “nós
comemos” (no caso, “nós” como 1a pessoa do plural inclusivo,

4
Bio Orbis: https://www.bioorbis.org/2019/05/gigante-peixe-jau.html.
5
Agro 2.0: https://agro20.com.br/jau/.
6
A propósito, veja-se Lemos Barbosa (1970, p. 63): “comedor-guara; (...)
comilão – caru”.

51
uma vez que o Tupi e o Guarani possuem duas formas de
1ª pessoa do plural). Em todo caso, parece fazer pouco ou
nenhum sentido o peixe chamar-se “nós comemos”.
Se estiver correto identificar o final como o verbo “comer”,
talvez só reste, como gramaticalmente possível, interpretar
como iá+’u (fruta + comer) “(o que) come fruta”, ou yá+’u
(cabaça + comer) “(o que) come cabaça”. Nos dois casos,
soluções que não encontram apoio extralinguístico. A primeira
delas, pelo menos, parece contrária ao hábito carnívoro (ou,
mais propriamente, piscívoro) do jaú, que vive de comer peixes
menores. A segunda, que também parece contrária ao caráter
piscívoro desse peixe, não encontra apoio em qualquer registro
disponível. Mas, na mesma linha de hipóteses, há a possibilidade,
ainda que curiosa (partindo de uma palavra nheengatú)7, de
interpretar-se como iã+’u (macaco-da-noite + comer) “(o que)
come o macaco-da-noite”. Não conheço registros específicos a
respeito, mas em várias partes do Brasil, sobretudo na Amazônia,
ocorrem narrativas populares (talvez fantasiosas) sobre ataque
de jaús a humanos, incluindo caso de criança e, mesmo, de
adultos comidos ou engolidos por um peixe jaú. Vale destacar
que os registros atuais em manuais ou materiais de divulgação
sobre peixes brasileiros, apesar de elencarem o jaú como um dos
maiores peixes do Brasil, informam um comprimento máximo
de até 2 metros, e peso de até 200 kg. (e uma força “capaz de
arrastar a canoa por quilômetros”)8, mas registros de séculos

7
O registro é de Stradelli (1929, p. 446): iã: pequeno macaco, casta de Lemure
– Nyctipithecus felinus.
8
O registro está no Dicionário de Antonio Houaiss (2004, p. 1.678).

52
anteriores mencionam até 15 palmos (acima de 3 metros de
comprimento)9 e até 400 kg.
Outra direção de busca seria a partir de vocabulário do
Guarani Antigo, seja por meio de Montoya (século XVII), seja
por um de seus continuadores (século XVIII).
Em Montoya ([1640] 2011, p. 99), lê-se:
áu2 mancha; sujeira; (sempre se coloca a coisa onde está)
Praticamente um século depois, outro jesuíta traduziu,
ao Guarani, a obra Conquista Espiritual, escrita em espanhol,
por Montoya, em 1639. Compilando o vocabulário empregado
naquela tradução, Batista Caetano (1879, p. 53) registrou:

Apoiado nesse registro de Batista Caetano, o Dicionário


de Clóvis Chiaradia (2008, p. 375) consigna: “JAÚ” − (...) do
T.G. [Tupi-Guarani] j-au – o sujo, porque vive nos lugares
lodosos; aú – sujo (BC).
Considerando o recurso de predicar nessa língua, pa-
ra dizer “é manchado, pintado, sujo” ou “está manchado,
pintado, sujo”, agrega-se o prefixo de 3ª pessoa do singular,

9
Essa informação é de Fernão Cardim: "Entre estes há um peixe real de bom
gosto e sabor que se parece muito com o solho da Espanha; este se chama
Jaú, são de quatorze e quinze palmos, e às vezes maiores, e muito gordos, e
deles se faz manteiga" (Cardim, [1584] 1978, p. 63).

53
sendo que entre o prefixo e a raiz do verbo ou adjetivo que
se segue, ocorre uma passagem consonantal palatal: i + j +
áu, logo, ijáu. Chama a atenção, porém, que a tônica não se
encontra na última vogal10, de modo que, mesmo contando
com a coalescência da vogal “i” com a consoante homorgânica
“j”, ainda resultaria em jáu (e não jaú)11.
O problema dessa tentativa é mesmo com a questão da
tonicidade. Não fosse por isso, a aparência externa do peixe
jaú (aliás, associado ao pintado ou surubim) justificaria per-
feitamente o nome de “manchado”. E é sabido que a maior
parte dos nomes tupis para peixes é descritiva: piracanjuba
(peixe-da-cabeça-vermelha), pirajuba (peixe-dourado),
pirambu (peixe-que-ronca), piratinga (peixe-branco).
Outro problema com esse caminho está em que, ainda
que as línguas Guarani e Tupi sejam da mesma família, o
fato é que o nome Jaú foi aprendido pelos portugueses,
primeiramente diretamente do Tupi da costa brasileira, já
no século XVI (cf. Fernão Cardim [1584] 1978, p. 63). E a
forma áu (ou mesmo aú), até onde pesquisei, não se encontra
em nenhum vocabulário Tupi (ou Brasílico) com a acepção
de “sujo” (ou manchado, ou malhado, ou pintado).
A pista mais promissora, porém, veio-me da orientação

10
Veja-se o registro de Montoya. Já no registro de Batista Caetano, apesar de
a forma aú aparecer como entrada do verbete, no texto que se segue a ela
o autor mostra que se trata de um ditongo decrescente, sobretudo quando
defende sua origem em ab que passou a av (“b cai em v” quer dizer: b sofre
lenição ou enfraquecimento, e se torna v) , que por sua vez passou a au.
11
Ademais, buscando nas fontes Tupi o que Batista Caetano apontou no
Guarani Antigo, de Montoya, não encontramos nada parecido.

54
de uma pesquisa sobre a língua Tupi-Kawahib (ou Kagwa-
hiva), da Rondônia, e, mais especificamente, do Tenharim.
Analisando dados de campo de um orientando (Osmar
Marçoli), encontrei o seguinte:

Português Tenharim
Jaú ãdiau12

Ora, sabemos que ãdia, ou, mais corretamente, ãndia,


é o peixe que, em português, por corruptela, chama-se jundiá,
como se pode ler, por exemplo, em Navarro (2013, p. 334):

nhandi’a(s.) −NHANDIÁ, JUNDIÁ, nome comum a certos


peixes marinhos e de água doce (v. îundi’a).

Portanto, naquela língua irmã do Tupi Antigo, o nome


do “jaú” significa “o que come jundiá” ou “o comedor de
jundiás”, o que está totalmente de acordo com o caráter
piscívoro do jaú. É importante registrar que o Tupi-Kawahib
revelou-se, em vários aspectos morfológicos e sintáticos,
muito “conservador”, considerando-se sua relação com o
Proto-Tupi e, por parentesco, com o Tupi Antigo. Em outras

12
O trabalho do linguista registra as palavras em transcrição fonética; nela,
o símbolo [] corresponde ao “nh” ortográfico da língua portuguesa. Já
o símbolo [] representa um fonema inexistente em nossa língua, que os
linguistas chamam de oclusiva glotal (em alguns lugares, “parada glotal”):
uma interrupção da emissão das cordas vocálicas semelhante ao som que
produzimos quando, para indicar uma negativa, fazemos: ũũ ou ãã
(nas histórias em quadrinhos: hum-hum). Na ortografia de diversas línguas
indígenas (entre elas, o Guarani e o Kaingang) esse fonema é representado
pelo apóstrofo, como nos exemplos: ka’a, angu’a, pã’i.

55
palavras, das línguas remanescentes do tronco Tupi, é uma
das que mais guardam proximidade com o Tupi Antigo.
Assim, apostando na possibilidade de que nhãndi’a/
nhũndi’a tenha sido, também, a forma antiga do nome do
peixe no Tupi Antigo, faltaria descobrir por que a sílaba inicial
foi abandonada:

nhãndi’a’u >ndja’u > dja’u >ja’u


ou nhũndi’a’u13 >ndja’u > dja’u >ja’u

Para isso seria necessário reconstituir etimologicamente


o nome de outro peixe, ou seja, o jundiá14.
Teodoro Sampaio (que não era propriamente um tupi-
nólogo) traz a seguinte interpretação:

JUNDIÁ corr. Yu-ndi-á, a cabeça bem armada de barbata-


nas. (Sampaio, [1901], 1987, p. 271).

Podemos reconhecer facilmente, na segmentação feita por


Sampaio, as palavras yu (ou seja, ju ou îu), espinho15, -ndi,
com (uma posposição), e a forma -a, que em composição pode

13
Vocabulário na Língua Brasílica, de 1621:"Bagres dagua doce – Nhũdiâ; Mãdij;
Pirâacãmucú; Jaú; este he muito grande" (Vocabulario... [1621] 1952, p. 50).
14
Jundiá é o mesmo que Nhũndiá. Considerando a forma registrada pelos
jesuítas, a análise fonológica do Tupi revela que a consoante nasal inicial,
representada por nh, resulta da nasalização de um j (um processo de
espalhamento de nasalidade, comum em línguas Tupi). Essa nasalização podia
ser menos pronunciada, o que parece ter acontecido com a Língua Geral Paulista,
falada pelos bandeirantes. Isso explica por que, no falar dos bandeirantes, ficou
registrada a palavra jundiá (ver, por exemplo, jundiá’y > Jundiaí).
15
Cf. Vocabulário na Língua Brasílica 1621 (1952, p. 126); Barbosa (1956b, p.
79); Navarro (2013, p. 195).

56
significar cabeça (a palavra plena, para cabeça, é akan)16. Como
só existem esses três elementos linguísticos na composição, não
há lugar para o “bem armada” (ou, no mínimo, para o advérbio
intensificador “bem”) que aparece na tradução de Sampaio.
E como há uma palavra própria em Tupi para barbatana
(“pepocanga”)17, não faz sentido tomar a palavra “espinho”
como uma metáfora desnecessária. Portanto, seguindo-se
a interpretação de Sampaio, jundiá deveria ser traduzido
literalmente por “cabeça com espinho”.
Há, no entanto, uma outra interpretação possível. Sendo
a primeira sílaba correspondente à palavra para espinho, a
sequência ndiá pode ser interpretada como a palavra ndjá
= “pouco” (Cf. Navarro, 2013, p. 151: “îá: porção, pequena
quantidade, um pouco”)18. Nesse caso, ju-ndjá deveria signi-
ficar “pouco espinho”. Essa é, como se sabe, uma característica
ressaltada desse peixe. Veja-se, por exemplo: “Jundiá tem
um filé claro, magro, com boa textura e livre de espinhos
intramusculares...” (Fracalossi et al., s/d). Essa tradução está
mais de acordo com as práticas de nomeação Tupi.
A razão pela qual jundjá’u (nhũndjá’u) tornou-se
djá’u (e finalmente jaú) pode ter sido puramente linguística: a
simplificação que as línguas costumam fazer, ao longo dos sé-
culos, abreviando formas longas, e que acabam transformando
nomes descritivos em nomes muitas vezes indecomponíveis e

16
Cf. Barbosa (1956b, respectivamente páginas 106 e 19).
17
Cf. Vocabulário na Língua Brasílica [1621] (1952, p. 125).
18
Observe-se que, com muita frequência, os anotadores dos séculos XVI e XVII usaram
"i" para representar a aproximante [j] ou a africada [dZ], ou ambas em variação.

57
indecifráveis. Tomem-se, como exemplos, algumas palavras do
português, como meia (peça de vestuário). Pouquíssimos são os
brasileiros que conhecem a origem dessa palavra (basicamente,
apenas uma parte dos profissionais da área de linguagem:
linguistas, filólogos, docentes); meia é o singular criado, por
analogia, a partir da forma “plural” meias, que, por sua vez, foi a
forma abreviada que se passou a usar para o termo meias-calças
(cf. Houaiss; Villar, 2004, p. 571 e 1.882). Outro exemplo é o
nome da árvore açoita-cavalo (Lueheadivaricata – Mart.), que,
pelo interior todo do Brasil, o povo conhece por “soita-cavalo”,
ou, mais comumente ainda, simplesmente como “soita”, inclusive
porque o verbo açoitar não é parte do vocabulário em dialetos
populares19. E se buscarmos a origem latina de algumas
palavras portuguesas, poderemos até nos surpreender. Por
exemplo, o verbo “comer”, cuja origem é a expressão “cum
edere” = “comer em companhia (de outras pessoas)”. Ocorre
que “ed-” era a raiz do verbo “comer”, em Latim, e “cum”
apenas a preposição (o nosso “com”); no caminhar da história,
o que era apenas a preposição se tornou a raiz do verbo, em
nossa língua, e da raiz latina sobrou apenas o “e”, que virou
simples vogal temática do nosso verbo “comer”20.

19
Foi pela forma soita que aprendi a conhecer a árvore, pelo uso popular no
Oeste de Santa Catarina e no Norte do Rio Grande do Sul. Curiosamente, os
dicionaristas, por seu equivocado purismo, não a consignam, como se a forma
soita devesse ser tomada somente como pronúncia errada de açoita, o que já
não é o caso. Trata-se, sim, de um item lexical do falar brasileiro do interior.
20
Essa informação se encontra em qualquer bom trabalho sobre as origens
do português e na etimologia da palavra dada em bons dicionários, como
o Houaiss. Também em fontes de divulgação, como se pode ver em: http://
cienciahoje.org.br/coluna/etimologias/.

58
CONCLUINDO:

Jaú é nome de um peixe que foi comum no Rio Tietê


(é hoje uma espécie ameaçada), e que, por sua presença
abundante na foz de um de seus afluentes da margem direita,
levou os bandeirantes a batizar esse afluente de Rio Jaú. Em
meados do século XIX, às margens desse rio, pela riqueza de
suas terras, estabeleceram-se agricultores, formando uma
povoação que viria a ser o princípio da atual cidade de Jaú.
O nome do peixe já sofreu a erosão do tempo, que
torna opaca sua origem21, mas foi possível, com a leitura
comparativa de línguas aparentadas, concluir por sua ori-
gem na expressão “(o que) come jundiá”, compatível com a
característica piscívora do jaú. É o que pude concluir.

21
É esta uma lição de Edward Sapir: “Onde está em uso, para um conceito
simples, um termo descritivo transparente, é justo concluir, na maioria
dos casos, que o conhecimento do elemento ambiental, assim referido, é
comparativamente recente. (...) o caráter transparente ou não-transparente
de um léxico pode nos permitir inferir, ainda que um tanto vagamente, desde
quando, para um grupo populacional dado, é familiar determinado conceito”
(Sapir [1911], 1969, p. 48).

59
POTUNDUVA: ALÉM DO ESTIRÃO

Escreveu-me o amigo, arqueólogo Fabio Grossi (diretor


do Museu Municipal de Jahu, em Jaú, SP), consultando sobre
qual seria a correta etimologia e origem da denominação
Potunduva, que designa um distrito de Jaú, muito próximo
do Rio Tietê22. Contou-me ele o que se informa por lá, como
“tradição local”:

A informação que temos aqui é que Potunduva viria da língua


tupi e significaria “O lugar onde a vista escurece e se torna agra-
dável”. Isso porque Potunduva se estabeleceu no “estirão do Rio
Tietê”, ou seja, um estirão do rio que se estende por 20 km, e por
isso, a vista se perde no horizonte. Essa seria a suposta origem
do nome.

Para responder à consulta, escrevi o que apresento a


seguir.
A primeira coisa que vale comentar é que, toda vez que
a etimologia de um topônimo indígena precisa mais de três
palavras em sua tradução ao português (e, em geral, “poéti-
cas”), pode-se apostar que se trata de uma invencionice local,
que nem mesmo popular se pode chamar. Pode acontecer o
caso em que uma tal criação tenha se apoiado em memória
oral com algum fundamento histórico, mas que sofreu um
burilamento literário, com frequência voltado a criar uma

22
Jaú e Bauru – a primeira, a Leste, e a segunda, a Oeste do rio – situam-se
na região do Médio Tietê. Potunduva, salvo informação mais precisa, está
praticamente no exato meio caminho entre as nascentes e a foz do Tietê.

60
aura mística sobre a origem do nome da sua localidade23.
Para se fixar uma etimologia, o fundamental é buscar
identificar os elementos linguísticos (morfemas ou raízes)
presentes no composto (como em geral, são), sem deixar
de observar outras características linguísticas da língua em
que se origina o vocábulo: regras de formação de compostos
ou de sintagmas nominais, e regras morfofonológicas que
operam nesses casos. Explicando isso muito brevemente,
usando de exemplos: (a) regras de formação: o nome de
origem Kaingang, Xanxerê (cidade do oeste catarinense)
compõe-se de xãxã = cascavel + rê = campo; se alguém
traduzisse esse nome por “cascavel do campo”, estaria
desconhecendo a regra de composição genitiva da língua,
pela qual, na justaposição de dois substantivos, o primeiro
é o determinante e o segundo é o determinado; portanto,
Xanxerê só pode ser traduzido por “campo (ou campina)
da cascavel”. (b) regras morfofonológicas: o nome de origem
Tupi, Jaguaquara (município da Bahia) é composição de
jaguar - a = onça + kwar - a = cova, toca, buraco, que, por
regras de composição semelhantes às do Kaingang (embora
sejam línguas não aparentadas), traduz-se por “cova da on-
ça”; observe-se, porém, que o resultado da composição não é
nem jaguaraquara nem jaguarquara, por dois motivos:
primeiro, porque a vogal final átona “a” não pertence à raiz
da palavra; segundo, porque disso resulta uma composição

23
A bem da verdade, algumas dessas invenções nem precisam lançar mão de
mais de três palavras, como é o caso da fantasiosa e insustentável tradução de
Araraquara por “morada do Sol”.

61
jaguar + kwara, na qual justamente intervém uma regra
morfofonológica: em Tupi, no encontro de duas consoantes,
para uma composição, a primeira delas é suprimida (ou
seja, “cai” o “r” final da palavra jaguar).
Com esses conhecimentos gerais, tratemos agora de
esclarecer o nome Potunduva. Mas vale registrar, antes
disso, que, curiosamente, Potunduva não mereceu interpre-
tação etimológica nos grandes trabalhos de toponímia Tupi:
Teodoro Sampaio, no seu “O Tupi na Geografia Nacional” (de
1901), não o traz, e talvez desconhecesse a existência do lugar
(embora Jaú seja uma região povoada desde meados do século
XIX); e Eduardo de Almeida Navarro, no seu “Dicionário de
Tupi Antigo: a língua indígena clássica do Brasil” (2007),
que inclui uma “Relação de Topônimos e Antropônimos com
origem no Tupi Antigo”, consignou a existência do nome,
mas não arriscou dar-lhe a etimologia.
A primeira coisa que nos chama a atenção, e será
mesmo uma chave decisiva para estabelecer a etimologia
de Potunduva, é o morfema final, facilmente reconhecível
na toponímia de origem Tupi: nduva.
A língua Tupi possuía um sufixo coletivizador24 que um
linguista conhecedor da fonologia dessa língua registraria
como {-t-}. Como já dito anteriormente (em um exemplo de
língua Tupi), a vogal átona final “a” não integrava a raiz das
palavras; tinha uma função gramatical (simplificadamente
chamemos de “função nominal”).

24
Para expressar coisas como bananal, pedregal, pinheiral etc.

62
A vogal // do sufixo em questão – em geral grafada com
“y” nas línguas indígenas brasileiras (ex.: Guarani, Kaingang)
– é desconhecida em português, mas tem pontos em comum
com o nosso “i” (é uma vogal alta não arredondada) e com
o nosso “u” (é uma vogal alta posterior). Em razão disso,
os portugueses ora a registraram como um “i” (em nomes
como Itatiba, Juquitiba), ora como um “u” (em nomes como
Ubatuba, Araçatuba). Registre-se, aliás, que há nomes com o
final “tiba” que já foram grafados, oficialmente, no passado,
com “y”, como é o caso de “Curityba” (PR) e “Rerityba” (ES).
Já a segunda consoante (final) do sufixo {-t-} é o que
os linguistas caracterizam como aproximante lábiodental,
também inexistente em nossa língua, mas que guarda se-
melhanças tanto com o “b” como com o “v”, razão pela qual
foi registrada de modo variante pelos portugueses: ora como
“b” (como nos 4 nomes tupi exemplificados acima), ora como
“v” (em nomes como: Boituva, Aricanduva)25.
Sendo assim, temos que o sufixo tupi para coletivizador
(ao qual vai sempre agregada a vogal “a” de sufixo “nominal”)
foi registrado nos topônimos por formas variantes como -tyba,
-tyva, -tiba, -tuba, -tuva. Mas também como -duba, -diba,
-duva, em nomes como o já citado Aricanduva, mas também Ita-
marandiba, Maçaranduba, Tucunduva, e o próprio Potunduva.
Na explicação dessa última variante é que se encontra,
como dito antes, a chave (indireta) para solucionar a etimologia

25
Isso também se registra em composições como Itapeva e Itapeba, onde o
elemento final da composição (o adjetivo Tupi que significa “chato, baixo”)
ora se grafa com “v” (peva), ora com “b” (peba, como em “tatu-peba”).

63
em questão. Quando dois elementos se juntam para compor
uma nova palavra, em Tupi, há regras de ajuste entre eles (as
chamadas regras morfofonológicas). Uma das mais importantes
é a que transforma consoantes ditas “surdas” (como p, t, k)
em consoantes “sonoras” e pré-nasalizadas (respectivamente:
mb, nd, ng) quando, em composição, elas são precedidas por
vogal nasal ou por consoante nasal. Vejam-se os exemplos:

porã + katu>porangatu (bonito + pleno = “plenamente


belo”)
petỹ + kwá>petyngwá (fumo + buraco = “cachimbo”)
mõ + puku>mombuku (causativizador + comprido =
“fazer comprido, alongar”)
mõ + tykyra>mondykyra (causativiz. + gotejar = “fazer
pingar, destilar”)
tucum + tuba (tyba) >tucunduva (tucum + coletiv. =
tucunzal)

Se o termo inicial da composição for uma palavra oral,


jamais irá acontecer aquela alteração, como se pode ver em:
itá + tyba> Itatiba; gwará + tyba> Guaratuba; pirá + tyba>
Piratuba; indaiá + tyba> Indaiatuba; etc.
A conclusão necessária é que o nome Potunduva é
formado com o sufixo coletivizador, e por uma raiz inicial
necessariamente terminada em nasal (vogal ou consoante);
só isso explica que o morfema final (as duas últimas sílabas)
seja -nduva, e não -tuba. Trata-se, então, de resolver de onde
vem a porção inicial potũou potum.

64
Ocorre que não existe uma tal palavra em Tupi, donde
concluirmos que se trata de corruptela de alguma outra pala-
vra ou, mesmo, de uma composição. Uma pista (na verdade,
uma resposta completa), curiosamente, encontramos em
um trabalho de “curioso”, ou seja, de um não especialista26,
mas cuidadoso anotador de topônimos indígenas. Na obra
“Dicionário de palavras brasileiras de origem indígena”,
Clóvis Chiaradia – médico (e político) do interior paulista
(Botucatu) – consignou o seguinte registro:

“POTUNDUVA – 1) cidade e município (sic) de SP, Zona de


Jaú; 2) antiga localidade às margens do Tietê; 3) salto no Tietê, SP
(JMA); m.q. potenduva, a) do T.G. poti-uma – o camarão preto,
escuro; duva = tuba = tiba – lugar abundante em; lugar abundante
em camarões pretos”. (Chiaradia, 2008, p. 548 – grifos nossos).

Ou seja: potĩ + un + tyba (camarão + preto + coletiviz.)


potĩun + tuba
potiunduba > Potunduba

Portanto, um lugar no Rio Tietê onde abundaria o


camarão de água doce cujo nome científico é Macrobrachium-
potiuna, e cuja distribuição geográfica, no Brasil, se estende
pelas bacias costeiras do Sul e do Sudeste e pela bacia do Rio
Paraná (nesta última está o Tietê)27.

26
A bem da verdade, é bom registrar que Teodoro Sampaio, grande intelectual
que produziu o mencionado (valiosíssimo) trabalho sobre toponímia Tupi, era
apenas um “curioso” do assunto, sendo engenheiro, e não filólogo.
27
Cf. Coelho & Ramos-Porto (1985). Em Holthuis (1952, p. 78) lê-se, a respeito do
Macrobrachium potiuna: “Distribution: The species is known from fresh water
of the S.E. Brazilian States: Rio de Janeiro to Rio Grande do Sul. The records in

65
Do ponto de vista linguístico, a interpretação é mais
do que plausível. Não sou, porém, conhecedor da região, de
modo que não posso avaliar se a informação da abundância
desse camarão (no passado!) naquela porção do Rio Tietê é
verdadeira. Os velhos moradores ou os antigos cronistas da
região podem contribuir para esclarecer isso. Sabe-se que, em
outras porções do rio, isso era realmente um fato. Por exemplo,
tratando da região da capital paulista, mais especificamente
do Rio Tietê nas proximidades da foz do Aricanduva, veja-se
o seguinte registro do historiador Janes Jorge (s.d, p. 4):

A pesca é presença constante nas lembranças dos moradores


da São Paulo da primeira metade do século XX. (...) Imagem
marcante, para os lados do bairro da Penha, na confluência do
Tietê com o córrego Aricanduva, era a de mulheres negras de saias
sungadas, com uma bolsa de pano pendurada e peneira na mão,
mariscando pela vegetação ribeirinha. Na vazante, apanhava-se
camarões no Tietê, empurrando-se uma peneira relva acima, no
leito do rio, para depois levantá-la rapidamente. (grifos meus)28.

Concluindo, Potunduva pode mesmo significar: muito


camarão preto, ou abundância de camarão potiuna, e isso
representaria, possivelmente, uma denominação original dos
Tupi, transmitida aos portugueses29.

literature are: Rio de Janeiro, Jacarepaguá, Casal, Ponte Nova e Mauá, Rio de
Janeiro State (Moreira, 1901); Santos, São Paulo State (Luederwaldt, 1919, 1919a);
? Itapura, ? Jaboticabal, ? São Paulo, ? Raiz da Serra, e Alto da Serra, Santos, São
Paulo State (Luederwaldt, 1919)... etc.”.
28
A informação também aparece em outra obra do mesmo autor, “Tietê: o rio
que a cidade perdeu. São Paulo, 1890-1940” (São Paulo, Secretaria do Verde
e Meio Ambiente, 2017, p. 89).
29
O diretor do Museu de Jahu, tendo lido este texto até aqui, escreveu-
me contando que se comunicara, em seguida, com alguém que pesquisa a
ictiofauna do Rio Tietê, e a informação que recebeu foi a de que “realmente a

66
DE VOLTA AO ESTIRÃO DA VISTA ESCURECIDA

O leitor há de se lembrar que, ao início desse estudo


sobre a etimologia de Potunduva, transcrevi a consulta
formulada pelo diretor do Museu de Jahu. Dela retomo aqui
o trecho principal:

“O lugar onde a vista escurece e se torna agradável”. Isso


porque Potunduva se estabeleceu no “estirão do Rio Tietê”, ou
seja, um estirão do Rio que se estende por 20 km, e por isso, a
vista se perde no horizonte.

E o motivo de voltar a isso foi um segundo comentário


do amigo Fabio Grossi, depois de conhecer minhas conclusões
acima (ou seja, este texto até o final do tópico anterior). Se-
gundo ele, “os textos mais antigos chegam a citar Potunduva
como Pytunduba”30.
O problema colocado por tais “textos mais antigos” é
que eles sugerem que a raiz inicial da palavra, na língua origi-
nal, seria pronunciada, na primeira sílaba, com “y”. Essa letra
muitas vezes foi usada, em escritos antigos (especialmente
no século XIX), para representar a chamada “sexta vogal”
Tupi, a “vogal central alta não arredondada” que já mencionei
anteriormente. Sendo isso verdadeiro, a raiz original seria,
seguramente, pỹtũ, ou seja, a palavra Tupi que significa “noite,
escuro, escuridão”. Isso, de alguma forma, pareceria validar
a versão que traduz o nome do lugar por “lugar onde a vista

presença de camarão preto (o pytu) se confirma e é até abundante”.


30
Fabio Grossi, comunicação pessoal.

67
escurece”, ainda que a tradução seria apenas uma paráfrase
poética, já que no composto pỹtũ + tyb-a não há sequer traços
de itens lexicais como “visão”, “olhos” ou “vista”.
Tornou-se necessário, então, buscar os mais antigos
registros conhecidos, do nome Potunduva (em qualquer das
suas variantes). Transcrevo, a seguir, os registros do século
XVIII. Adiante, tratarei do século XIX.
A grande fonte para os registros do século XVIII, são
os “Relatos Monçoeiros”, de Afonso de Escragnolle Taunay
(1876-1958), publicados em 1953. É dessa fonte que trans-
crevo os trechos abaixo, indicando as páginas da edição aqui
empregada (edição da coleção Reconquista do Brasil, Itatiaia/
Edusp, 1981)31.

(...) por estas pedras e madeiros, que também têm atraveçados


nos canais obriga a se navegar só de dia e depois de dissiparem os
nevoeiros por não se virarem as canoas, porque ainda que a gente
se salve, sempre o mantimento se perde e se molha a pólvora e sem
uma e outra coisa se fica exposto a perecer de todo, por ser este
um sertão muito afastado do povoado e com uma única roça que
se fez a pouco tempo em Pitamduva (?), e o rio pouco abundante
de peixe ... (da relação da viagem de Rodrigo César de Meneses,
governador e capitão general da Capitania de São Paulo e suas
minas descobertas, em 1726. In: Taunay, 1981, p. 106)32.

31
Nas transcrições dos documentos originais, Taunay respeita as formas do
documento, mesmo quando divergem da ortografia oficial.
32
Afonso de Taunay avalia que “este relato venha a ser a mais antiga narrativa
pormenorizada da viagem monçoeira de Porto Feliz a Cuiabá até hoje conhecida”
(Taunay, 1981, p. 28). A interrogação, no texto transcrito, pode ser do próprio
Taunay ou da “Notícia Prática” do Pe. Diogo Juares (coleção de relatos do roteiro
das minas de Cuiabá, fonte de Taunay), e, ao que parece, indica dúvida quanto
à interpretação do que está no manuscrito. A referida coleção de relatos do Pe.
Juares intitula-se: “Notícias Práticas das Minas de Cuiabá e Goiases na Capitania
de São Paulo”, e encontra-se na Biblioteca de Évora.

68
A propósito de se tratar de “uma única roça...”, o mesmo
Taunay destacou, em outra passagem, que “o último ponto de
habitação dos civilizados do Tietê era Potunduva, onde viviam
dois brancos com alguns carijós. Daí em diante não se encon-
trava viva alma mais até o [rio] Paraná” (Taunay, 1981, p. 73).

16 dias. Daqui se parte, e logo se começa a entrar por um estei-


rão de rio, chamado Pitinduba, que vale o mesmo, que esteirão de
rio direito no fim deste esteirão está uma cachoeira, que atravessa
o rio; tem o canal à mão esquerda, e passada esta são horas de
pousar. (Notícia 7ª Prática, da coleção do Pe. Diogo Juares. In:
Taunay, 1981, p. 152)33.
Pouco abaixo dareis logo em rio limpo bastante distância que
se chama Piraridubá que vale o mesmo que estirão de Rio direito:
no fim deste vereis uma cachoeira... (Notícia 8ª Prática, da coleção
do Pe. Diogo Juares. In: Taunay, 1981, p. 175).
A 12 [de agosto] passei pelo último sítio, que se encontra até
Camapuan, onde estão vivendo dois moradores, com alguns carijós,
fora de toda comunicação mais que com aqueles que fazem caminho
para Cuiabá: chamam a este lugar Pitunduba. (Relação da viagem
do Conde de Azambuja, D. Antonio Rolim, 1751. In: Taunay, 1981,
p. 200)34.
Dia 20 de Abril. Amanheceu este dia embarcando toda a gente
largando e seguindo viagem pelas oito horas da manhã; chegamos a
uma cachoeira chamada estirão a qual passamos com muito trabalho,
e susto, indo tudo embarcado, e daí passada a cachoeira demos
em um estirão de Rio morto que tem mais de duas léguas todo ao
rumo de Noroeste35; depois passamos por outra cachoeira chamada

33
Parafraseio, para melhor entendimento, o trecho que nos interessa nessa
citação: Daqui se parte, e logo se começa a entrar por um estirão de rio,
chamado Pitinduba, que significa isso mesmo: estirão reto de rio; no fim deste
estirão existe uma cachoeira, que atravessa toda a largura do rio.
34
Parafraseando o texto, em uma linguagem mais atual: A 12 de agosto passei pelo
último sítio que existe dali até Camapuan, onde estão vivendo dois moradores,
com alguns carijós (escravos), sem nenhuma comunicação além daquela que
mantêm com os que fazem o trajeto para Cuiabá: este lugar é chamado Pitunduba.
35
Referindo-se ao maior trecho sem cachoeiras ao longo do Tietê, Sérgio Buarque de
Holanda escreveu (no capítulo 5 – As estradas móveis, de seu clássico “Monções”):

69
Putanduva que quer dizer em Português onde a vista se faz escura, é
muito perigosa, e medonha esta cachoeira, se metem as embarcações
por ela com gente dentro a Deus, e à ventura ... (Diário da Navegação
de Theotônio José Juzarte, de 1769. In: Taunay, 1981, p. 246)36.

É necessário destacar que, apesar de aparecer a forma-


Putanduva na transcrição que Taunay publicou do texto de
Juzarte, forma que igualmente aparece na transcrição publi-
cada pela Editora da Unicamp (1999, p. 41), e que também
ocorre na transcrição publicada na edição Edusp/Imprensa
Oficial do Estado (2000, p. 37), não é isso o que se encontra
escrito no manuscrito, como se pode ver na publicação fac-
-similar constante na última das publicações referidas: ali se
lê, claramente, “Putunduva” (ver Souza & Makino, 2000; p.
156, 12ª linha). Além disso, no mesmo “Diário da Navegação”
encontra-se uma relação de 46 cachoeiras do Tietê, com seus
nomes e traduções. Lá está consignado: Cachoeira Putunduva
(In: Taunay, 1981, p. 258; do mesmo modo nas duas outras
publicações referidas). E não apenas lá, mas também no
mapa que o próprio Theotônio Juzarte produziu de todo o

“Esse trecho, de águas excepcionalmente mansas e de navegação franca, recebeu


dos viajantes o nome de rio morto, que ainda presentemente lhe dão”.
36
“Diário da navegação do Rio Tietê, Rio Grande Paraná, e Rio Guatemi ... que
principia em 10 de março de 1769”, escrito pelo Sargento-Mor Theotônio José
Juzarte. Esse diário, publicado na íntegra na obra de Taunay já referida (pp. 231-
292), fora anteriormente publicado, por Taunay, nos Anais do Museu Paulista
de 1922. Posteriormente integraram os “Relatos monçoeiros” como tomo III da
obra História das Bandeiras Paulistas, pela Editora Melhoramentos. Finalmente,
o diário teve publicação como livro autônomo pelo Centro de Memória e pela
Editora da Unicamp (1999) e, novamente, em 2000, pela Edusp e pela Imprensa
Oficial do Estado, numa edição organizada por J. Souza & M. Makino (esta
última, uma edição primorosa, incluindo versão fac-similar do manuscrito e o
conjunto de estampas do roteiro ou mapa, desenhado também por Juzarte).

70
seu percurso até Cuiabá. Trata-se do documento “Plano em
Borrão de todos os rios, e todas as caxueiras, e todas as
cousas mais notáveis, que vi desde Porto de Araraytaguaba
até a Povoação do Guatemi, e dali até a Serra que divide as
duas potências fidelíssima e Católica, o qual será posto em
limpo com melhor idea e perfeição, como inda se não viu”,
onde se lê “Caxrª de putunduva” e, logo abaixo, “Ranxo de
Putunduva povoação deyxada”, como se pode ver no detalhe
reproduzido como Figura 0137.

Figura 01. Detalhe do “Plano em Borrão ...”, de T. J. Juzarte


Acervo da Biblioteca Nacional (Rio de Janeiro). Disponível em: http://objdigital.
bn.br/acervo_digital/div_cartografia/cart1033424/cart1033424.pdf

37
Na edição de Souza & Makino, 2000, ver p. 379.

71
Disso resulta a conclusão que se deve descartar, do
documento de Juzarte, a variante “Putanduva”, uma evidente
falha de transposição do manuscrito original.
Ainda do século XVIII existem dois valiosos mapas.
O primeiro deles é o “Mappa da Capitania de São
Paulo, e seu sertão, em que se vem os descobertos, que lhe
forão tomados para Minas Geraes, como também o cami-
nho de Goyases, com todos os seus pouzos, e passagens,
deleniado por Francisco Tosi Columbina”. O documento
não está datado, mas Tosi Columbina esteve no Brasil entre
1743 e 1755, estando, de 1749 a 1755, a serviço do primeiro
governador de Goiás. No referido mapa, como se pode ver
no detalhe reproduzido como Figura 02, está consignada a
localização de “Apotunduba”.
O segundo é a “Planta do Rio Tiété ou Anembý na
Capitania de S. Paulo: desde a cidade do mesmo nome até á
sua confluencia com o Rio Grande, ou Rio Paraná”, de Fran-
cisco José de Lacerda e Almeida, executado em 1788-1789,
portanto, cerca de 35 anos depois do mapa de Luzarte. Nesse
mapa encontramos o seguinte registro: “Cax. Potenduba”.
As Figuras 02 e 03 apresentam detalhes de cada um desses
dois mapas:

72
Figura 02. Detalhe de mapa de Francisco Tosi Columbina.
Acervo Biblioteca Nacional38.

Figura 03. Detalhe de mapa de Fco José de Lacerda e Almeida39.

38
http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_cartografia/cart1033415/cart1033415.html
39
http://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_cartografia/cart515185/cart515185.jpg

73
Como se vê, nos documentos transcritos (e excluído o
erro já apontado na transcrição de Juzarte), há 7 distintas
formas pelas quais o nome é citado: Putunduva, Potenduba,
Pitamduva (com dúvida, anotada nas próprias fontes, sobre
essa transcrição), Pitinduba, Piraridubá, Pitunduba e Apo-
tunduba. Por guardar muita dessemelhança com todas as
demais, considero a forma Piraridubá uma transcrição mal
feita de originais manuscritos, e a descarto como equivocada.
Restam a considerar, portanto:

Putunduva (3x) Potenduba Apotunduba < com a


sílaba Pu ou Po
Pitunduba Pitamduva Pitinduba < com a
sílaba Pi

Já ficou esclarecido, anteriormente, que a inexistência,


na língua portuguesa, de uma vogal como o “y” do Tupi, levou
os falantes dessa última língua a pronunciar e a escrever o
som desta vogal, ora com “u”, ora com “i”. E só isso pode
explicar a oscilação dos registros que se acabou de transcrever:
certamente (confirmando o que o diretor do Museu de Jahu
observou) na língua original haveria um “y” na primeira sílaba.
Isso nos afasta da interpretação de potu (em Potundu-
ba) como corruptela de potĩ-un (camarão preto), e nos leva
a admitir a presença da raiz pỹtũ (noite, escuro, escuridão)
naquele nome composto.
Antes de seguir adiante, vejamos dois registros da
primeira metade do século XIX: o primeiro, é do relato

74
de viagem de Hércules Florence, artista que integrou a
expedição Langsdorff entre 1825 e 1829, que navegou
pelo Tietê a partir de Porto Feliz, rio abaixo; já o segundo
registro é o que consta em um importante mapa finalizado
em 1837.
Hércules Florence escreveu, durante sua viagem de 1825:

Dia 5 [de julho]. Atingimos depois do meio-dia a cachoeira


chamada Cabeceira40 de Uputunduva e a transpusemos. O rio
ali se espraia muito, ficando com pouca profundidade, razão pela
qual se descarregou metade da carga. (...)
A cachoeira de Uputunduva é visitada pelos índios desta região,
porque o rio aí dá vau. (Florence [1875], 2001, p. 68).

Por fim, consideremos o registro que aparece no


Mappa Chorographico da Provincia de São Paulo, de 1837,
que vem a ser o primeiro mapa impresso da província
(impressão realizada na França, em 1841). Seu autor foi
o engenheiro militar Daniel Pedro Müller. As Figuras 04a
e 04b reproduzem detalhes desse mapa, na região que
interessa para o presente estudo.
No mapa de Müller, identificamos o registro “C. Pon-
tenduba”, ou seja, Cachoeira Pontenduba.
Portanto, reunindo os registros acima transcritos, dos
séculos XVIII e XIX, temos:

40
Estou seguro de tratar-se, aqui, de um erro de transposição; seguramente
se trata de Cachoeira, em lugar de Cabeceira (até porque, na foz do rio, ou nas
margens de um grande rio como o Tietê, nunca se há de falar em “cabeceira”. A
propósito, Theotônio Juzarte, já citado, relacionou os nomes de 46 cachoeiras
que passaram no Rio Tietê, consignando, entre elas, a Cachoeira Putunduva e
a Cachoeira Ipicu (lit. “água comprida”, ou “Estirão”).

75
Figura 04a e 04b. Detalhe do Mappa Chorográphico
da Província de São Paulo, 1827.

76
Putunduva (3x) Uputunduva < com a sílaba Pu
Apotunduba Potenduba Pontenduba < com a sílaba Po
Pitunduba Pitamduva Pitinduba < com a sílaba Pi

Sobre a relação acima:

1. Os três registros com “o” na sílaba com “p”, são


de cartógrafos, em seus respectivos mapas. Su-
põem-se que tenham aplicado uma hipercorreção,
considerando que a pronúncia brasileira produz um
alçamento da vogal átona pré-tônica, de “o” para
“u” (fala-se “cumpadre”, mas escreve-se “compa-
dre”; fala-se “custura” e escreve-se “costura”; etc.).
A hipercorreção é a aplicação, a qualquer vogal
pronunciada como “u”, de um “ajuste” na escrita,
grafando-a com “o”. Assim, por exemplo, Curitiba
passou a ser grafada “Coritiba” (que, a propósito,
manteve-se como nome de um time de futebol);
kurumĩ deu margem, entre outros, ao nome do cór-
rego Colomi; akuti-y ficou consagrado como Cotigy;
kuru-mbá deu margem a Corumbá; etc. Portanto,
em última análise, os registros com “o” são aqui
contados como pronúncias de “u”.
2. a vogal da sílaba com “t” (segunda sílaba, exceto em
dois mapas, onde é a terceira) igualmente mostra
uma variação: há 6 registros com “u”, mas há 2
registros com “e”, 1 registro com “a” e 1 registro com
“i”. Isso também se explicaria com mais facilidade se

77
soubéssemos (ou propusermos) que a vogal original,
nesta sílaba, era a mesma vogal central alta não
arredondada, porém, nasal: ỹ (lembrando que, se
não for nasal, ou seguida de consoante nasal, não
podemos justificar que o sufixo -tyba/-tuba tenha
se tornado -nduba). Nossa experiência ensinando
outros brasileiros a pronunciar essa vogal em pala-
vras Kaingang ou Guarani mostra que a pronúncia de
ỹ por falantes nativos de português costuma variar
entre “ã” (como na palavra “maçã”), “ĩ” e “ũ”.
3. Há um elemento em comum, entre o registro de
Hércules Florence e o registro de Tosi Columbina,
ambos estrangeiros (o primeiro, francês; e o segun-
do, italiano): em ambos, o nome principia por vogal:
um “A” em Columbina, e um “U” em Florence.

Ora combinadas, ora valorizando-se mais uma ou outra,


as observações (1) e (2) sugerem que uma das seguintes palavras
deve ser a raiz inicial do composto que deu origem ao nome
Potunduva: pỹtũ (noite, escuro)41 ou pytỹ (afogamento)42.

41
A propósito, já em registro jesuítico do século XVI, o Vocabulário na
Língua Brasílica, refletindo a Língua Geral, encontramos: Noite – Putuna
(o Vocabulário foi atribuído por Serafim Leite ao Pe. Leonardo Nunes, mas
Plinio Ayrosa sugeriu ter coautoria de Anchieta. Boletim n. 137 – Etnografia
e Tupi-Guarani n. 23. São Paulo, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da
USP, 1952).
42
Para a segunda palavra, nossa única fonte é o Tesoro de la Lengua Guarani,
de Montoya (1639). Se, por um lado, é certo que se deve tomar cuidado com
a mistura de línguas diferentes, mesmo que da mesma família, há algo que
poucos sabem, que é o fato de que a obra de Montoya revela duas coisas,
a saber: (i) que em suas reduções houve também população Tupi, fugida

78
Uma dificuldade que tivemos, para aceitar a raiz pỹtũ
como sendo a primeira parte daquele composto foi o fato
de que o sufixo -tyb-a normalmente se traduz por um co-
letivo, algo como “abundância de; lugar em que há muito
(disso ou daquilo)” (cf. Barbosa, 1956a, p. 156). Com isso,
soava estranho, assumindo a raiz inicial como sendo “noite”,
porque aparentemente resultaria em: “noital”? “noitadas”?
“escuridões”? “escuridal”?
Foi novamente em Montoya (Tesoro) que encontrei a
pista para uma tradução. Ao tratar do sufixo Guarani -ty (que
corresponde ao -tyb-a do Tupi)43, o jesuíta aduz exemplos
como: “ka’atydonde hayyerba (...); karuhaty donde se co-
me”. Ou seja, pỹtũ + tyba > pỹtũndyba (potunduva) pode-se
traduzir simplesmente por “(lugar) onde escurece”44.
Já adotando a outra alternativa, pytỹ + tyba > pytỹndyba
(potunduva), deveríamos traduzir por “lugar em que há muito
afogamento”. Porém, contra essa alternativa militam duas
coisas: (a) a sucinta descrição, feita por Hércules Florence a
respeito dessa cachoeira, de que “o rio ali se espraia muito,
ficando com pouca profundidade” (Florence [1875], 2001, p.
68), o que não sugere ser um lugar favorável a afogamentos;

dos escravistas portugueses da Costa Leste; (ii) que a língua Guarani, no


seu registro, guardava ainda variações que a aproximavam mais, em alguns
aspectos, do Tupi Antigo.
43
Como dito em outro lugar, o Guarani perdeu as consoantes finais de raiz (e,
com isso, também o morfema “nominal” {-a}), de modo que -tyb >-ty.
44
Outra passagem do Curso do Pe. Lemos Barbosa talvez permita interpretar
-tyba (= nduba) como “hábito, constância, frequência” que, aplicado ao caso
em tela, poderia significar: (lugar onde) costuma ser escuro (cf. Barbosa,
1956a, pp. 291-292).

79
(b) o fato de que os cronistas e viajantes que percorreram
essa rota − cujos relatos vemos reunidos na obra já citada
de Afonso de Taunay − jamais mencionam tal circunstância,
que seria notória e que não deixaria de ser lembrada em cada
passagem pelo local45.
Já a favor de “(lugar) onde escurece” ou “onde há
escuridão”, além das questões linguísticas (isto é, fonéticas,
fonológicas e morfofonológicas) já detalhadas, podemos
destacar ainda duas razões:

a. ainda que em uma paráfrase ‘poética’, a ela se


aproxima bastante a tradução registrada por
Theotônio Juzarte na segunda metade do século
XVIII. A bem da verdade, a tradução de Juzarte
(“onde a vista se faz escura”) concorre com uma
outra registrada no mesmo século XVIII: “esteirão
de rio direito” (ou estirão reto do rio), mas essa
última não tem qualquer sustentação linguística em
qualquer das variantes registradas para a origem
do nome Potunduva.
b. essa escolha também torna plausível uma explicação
para os dois registros que grafaram o nome com uma
vogal inicial: Uputunduva, em Hércules Florence,

45
Veja-se que em cachoeiras onde uma pessoa conhecida morreu afogada,
seu nome ficou para sempre associado ao acidente geográfico, como vemos
na relação das 46 cachoeiras feita por Theotônio Juzarte: “Cachoeira Dugarcia
perdeu-se este homem nela”, “Cachoeira Matias Peres: perdeu-se este
homem nela”, “Cachoeira do Cubas: perdeu-se este homem nela” (In: Taunay,
1981, pp. 258-259).

80
e Apotunduva, em Tosi Columbina. Ocorre que há
uma variante, para pỹtũ, registrada pelo Pe. Montoya
(para o Guarani, é verdade), iniciada por uma vogal:
ĭpỹtũ (Montoya, 1639, p. 177).

A ausência de referências em cronistas e viajantes, que


referi para descartar a ideia dos afogamentos, poderia ser
também argumento contra a hipótese interpretativa que
adotamos anteriormente: potĩ + un + tyba = onde há muito
camarão preto. No entanto, nesse caso poderíamos estar
diante de um topônimo indígena antigo, do qual os portu-
gueses tomaram conhecimento, e que correspondia a uma
prática indígena (a pesca do referido camarão) não continuada
pelos colonizadores naquele local. Já o nome pytũndyba
(potunduva) pode-se atribuir, muito provavelmente, aos
próprios bandeirantes (que falavam Tupi), demarcando um
passo difícil do rio, justamente onde a visão é escurecida
pelo vapor da água nas pedras, dificultando o trabalho dos
pilotos e remeiros.

POTUNDUVA NÃO É O ESTIRÃO

Concluindo pela interpretação do nome, cabe uma


olhada nos mapas para identificar exatamente o local que
ele designa.
Como vimos anteriormente, uma das interpretações
registradas já no século XVIII confundia Potunduva com
um estirão (ou esteirão, como se dizia então): “logo se

81
começa a entrar por um esteirão de rio, chamado Pitinduba,
que vale o mesmo, que esteirão de rio direito” (como está
dito na Notícia 7ª Prática, da já referida coletânea do Pe.
Diogo Juares).
Esse é um bom exemplo de como se produzem confu-
sões, que depois ganham foro de tradição, como é o caso da
interpretação, consagrada na região, para o nome Potunduba,
que me foi reportada pelo diretor do Museu de Jahu:

(...) “o lugar onde a vista escurece e se torna agradável”. Isso


porque Potunduva se estabeleceu no “estirão do Rio Tietê”, ou seja,
um estirão do rio que se estende por 20 km, e por isso, a vista se
perde no horizonte.

Curiosamente, a origem dessa tradição, como veremos


adiante, pode estar em um diário de 1788, do mesmo autor
de um importante mapa que, contrariando o próprio diário,
nos ajudará a esclarecer a questão.
Como já foi dito, não há nada em qualquer das
variantes registradas para aquele nome (e com todo o co-
nhecimento das alterações de pronúncia que a linguística
permite revelar) que permita sustentar a afirmação de que
“Pitinduba (ou Potunduba) vale o mesmo que esteirão de
rio direito”; ou, parafraseando: que Pitinduba (ou Potun-
duba) significa estirão reto do rio. E ainda mais que isso: a
designação Potunduba não tem absolutamente nada a ver
com o estirão “de 20 km” referido na tradição local. É o
que demonstrarei com o uso de dois mapas e os respectivos
relatos de viagem.

82
Os mapas são: o “Plano de Borrão...” do Sargento-Mor
Theotônio José Juzarte, de 176946, e a “Planta do Rio Tiété, ou
Anembý” de Francisco José de Lacerda e Almeida, de 1788-1789.
Juzarte passou pelo local no dia 20 de abril de 1769, descendo
o Rio Tietê (sentido Sudeste-Noroeste), viajando com destino
a Iguatemi, no Mato Grosso. Lacerda e Almeida, por sua vez,
passou no mesmo local na antevéspera do Natal de 1788, subindo
o Rio Tietê (sentido Noroeste-Sudeste), vindo de Villa Bela, no
Mato Grosso, com destino a Santos, no litoral paulista.
Potunduva no roteiro de Juzarte (1769):
Retomemos a descrição de Juzarte sobre sua passagem
por esse trecho (para acompanhar no mapa da Figura 05,
seguem-se os acidentes de cima para baixo, na direção da
corrente do rio47):

(...) chegamos a uma cachoeira chamada estirão a qual passamos


com muito trabalho, e susto, indo tudo embarcado, e daí passada
a cachoeira demos em um estirão de Rio morto que tem mais de
duas léguas todo ao rumo de Noroeste; depois passamos por outra
cachoeira chamada Putanduva que quer dizer em Português onde
a vista se faz escura, é muito perigosa, e medonha esta cachoeira
(...) (Diário da Navegação de Theotônio José Juzarte, de 1769. In:
Taunay, 1981, p. 246).

O mapa, como se vê, indica também um rancho, uma


“povoação deyxada” (abandonada), situada a jusante da

46
Quando o mapa/roteiro de Luzarte não era ainda público, Taunay escreveu:
“Consta-nos a existência de um álbum de desenhos da lavra de Teotonio José
Juzarte no arquivo de Solar de Mateus [Vila Real, Portugal]. Se assim é exato,
serão essas peças os mais antigos documentos iconográficos monçoeiros de
que temos notícia” (Taunay, 1981, p. 43).
47
Observe-se que a rosa dos ventos indica o Norte para baixo nesse mapa.

83
Cachoeira de Putunduva, e abaixo de uma ilha que ali havia
no rio. Como vimos, essa era a que Taunay destacou (com
base nos diversos relatos monçoeiros) como a derradeira
presença de não-índios antes da foz do Tietê: “o último
ponto de habitação dos civilizados do Tietê era Potunduva,
onde viviam dois brancos com alguns carijós”. A localiza-
ção exata desse rancho ou morada confirma-se em outro
relato monçoeiro (talvez de um piloto), no qual o nome da
cachoeira foi lido erroneamente no original manuscrito,
como “Piraridubá”:

Figura 05. Detalhe da prancha 12, do roteiro produzido


por Theotônio J. Luzarte (1769).

84
Pouco abaixo dareis logo em rio limpo bastante distância que
se chama Piraridubá [Potunduba] que vale o mesmo que estirão
de Rio direito: no fim deste vereis uma cachoeira: tem o canal à
esquerda e com muitas ondas: mandai remar e vinde direito ao
canal desviando-vos de uma pedra que vem logo à entrada da
parte direita porque é preciso que vá sempre a canoa ... roçando
por ela e sobre as ondas que o canal faz, à mão esquerda: em
frente vereis uma pequena ilha, caminhai pela parte direita e
nela [na margem direita] achareis um morador com sua roça.
(Notícia 8ª Prática, da coleção do Pe. Diogo Juares. In: Taunay,
1981, pp. 175-176).

O lugar desse morador, já abandonado em 1769,


também é mencionado na descrição de Lacerda e Almeida,
quando por ali passou, duas décadas depois. Segue-se o trecho
do diário, lembrando que sua viagem se fazia no sentido
contrário, ou seja, primeiro ele avista o lugar que fora uma
habitação, depois a cachoeira de Potunduva, seguindo-se o
estirão e, finalmente, a cachoeira do Estirão:

23 [dez. 1788] – A primeira cachoeira, que passei, foi o Itapuá,


e pouco depois a do Sitio, assim chamada por estar fronteira a um
logar chamado Potunduba, onde houverão moradores, e parentes
do meu guia, os quaesretirarão-se por estarem muito longe do pasto
espiritual, e não pela má qualidade do terreno, que conforme se
explica o piloto, que também ali assistio por alguns annos, era este
logar a nata das terras. (...) Este logar deserto está no princípio de
um estirão, em cujo fim está uma cachoeira chamada do Estirão.
(Lacerda e Almeida, 1841, p. 83).

Vejamos como essa descrição, com a localização de


Potunduva, se materializa no mapa de Lacerda e Almeida
(1788). No trecho do Rio Tietê, reproduzido na Figura 06,
o fluxo da corrente vai da direita (Sudeste) para a esquerda

85
(Noroeste), lembrando que o autor trafegava no sentido
contrário (de Noroeste para Sudeste), subindo o rio.
Fazendo a leitura da descrição acima, tendo à vista o
detalhe do mapa (Figura 06), vemos que em tudo ele coincide
com o mapa e descrição de Luzarte. Subindo o rio, Lacerda
e Almeida avistou, primeiramente, o sítio abandonado, pra-
ticamente defronte de uma ilha e na barra de um ribeirão,
e, logo acima dele, a Cachoeira de “Potenduba”. Segue-se,
subindo o rio, um “baixo de Sirga48” e um estirão reto, ao
final do qual está a Cachoeira do Estirão Grande. No entanto,
apesar da clareza disso tudo na representação cartográfica,
no diário ele indica ter passado pela (cachoeira) “do Sítio”,
completando: “assim chamada por estar fronteira a um logar
chamado Potunduba”. O que é fácil concluir, por meio do
mapa e dos vários relatos de viajantes, é que Potunduba
(adotando aqui a forma atual do topônimo) originalmente
foi o nome da cachoeira ao final do Estirão Grande (seguindo
fluxo do rio), e em suas proximidades, em terras férteis logo
a jusante, formou-se um sítio (que, em 1769, já estava aban-
donado). O nome Potunduba, então, passou a identificar o
lugar da última povoação na descida do Tietê, não deixando,
porém, de nomear a cachoeira, como vimos nos dois mapas.

48
Sirgas são cordas grossas para embarcações. Segundo descreveu D. Antonio
Rolim, Conde de Azambuja (que fez o trajeto de São Paulo a Cuiabá em 1751),
quando o rio é pouco fundo e o leito “é desigual com pedras espalhadas e em
altura debaixo dágua que as canoas correm risco de se virarem topando nelas”
chamam a isso de Sirga, “porque é preciso os pilotos lançarem-se e remeiros
à água, e levarem as canoas às mãos para as irem desviando devagar, sem as
deixarem tomar força com a correnteza, que aí é sempre maior” (In: Taunay,
1981, p. 199).

86
Subindo o Tietê, apesar de colocar o nome da cachoeira no
seu mapa, Lacerda e Almeida referiu-se a ela, no seu diário,
como (cachoeira) “do Sítio”.
O que fica evidente, também, é que Potunduba nunca foi
o nome do estirão, mas apenas da cachoeira ao final dele, e,
depois, do povoado ou sítio que ali se ergueu. O estirão, por
sua vez, deu nome à cachoeira que o antecedia (lembrando
que o Rio Tietê foi navegado, antes de tudo, no sentido do seu
fluxo). Sabemos disso pela lista das 46 cachoeiras do Tietê
preparada por Juzarte49, na qual encontramos essa sequência
(compare-se como o mapa da Figura 06):

12. Cachoeira Ipucu .............Estirão comprido


13. Cachoeira Putunduva .....Onde a vista se faz escura
14. Cachoeira Ibauru-guaçu ...Onde se perdeu um guaçu grande50

Ou seja, a cachoeira imediatamente a montante (an-


tes) de Putunduva, era a cachoeira Ipucu, que literalmente
significa: água ou rio comprido.

49
In: Taunay, 1981, p. 258.
50
Há um evidente erro nesse registro ou cópia. Guaçu já significa “grande”, em
Tupi. O nome dessa cachoeira fica explicado na seguinte passagem de outro
documento: “Cachoeira de Bauru, que quer dizer que Baú cahio na agoa por
ser Cachoeira grande, em que antigamente sempre se perdia canôa” (Relação
da chegada que teve a gente de Mato Groço, e agora se acha em companhia
do Senhor D. Antonio Rolim, desde o porto de Araritaguaba, até a esta Villa
Real do Senhor Bom Jesus do Cuyabá”. Lisboa, Oficina Silva, 1754, p. 5). De
fato, “mbaeuru” era um neologismo de Língua Geral do Sul que designava
qualquer veículo, mas especialmente as canoas.

87
Figura 06. Detalhe do mapa de Lacerda e Almeida (1788).

88
Curiosamente, já destaquei acima, o mesmo Lacerda e
Almeida, autor do precioso mapa que analisamos acima, é
responsável pela difundida (e equivocada) tradução para o
topônimo Potunduva, como se pode ver nessa nota de rodapé
do seu diário:
Putunduba, ou Putundyva, quer dizer logar onde escurece
a vista, por ser este um estirão grande do rio, que com a vista
se não alcança bem o fim. (Lacerda e Almeida, 1841, p. 57)
Como já vimos, não faz sentido pensar que essa deno-
minação fora dada por quem viesse da foz, subindo o Tietê,
porque esse rio foi explorado pelos bandeirantes seguindo sua
corrente, partindo de São Paulo, de Sudeste para Noroeste.
Ao entrar no “Estirão grande”, o bandeirante ou monçoeiro
acabara de descer uma cachoeira que, por causa disso, cha-
maram de Ipucu (y+puku), justamente por marcar o início
do estirão; e, ao sair do estirão, passando por um trecho de
“sirga”, deviam transpor a Cachoeira Potunduva (aqui, não
se tratava mais de olhar para trás; o estirão estava superado,
e o problema era enxergar o que vinha adiante, a começar
por uma ilha).
Para concluir, situo tentativamente essas indicações na
geografia atual da região de Jaú (Figuras 07 e 08). Investiga-
ções locais podem tornar essas indicações mais precisas e, por
sua vez, as indicações podem sugerir pesquisas e descobertas
in locu que não foram tentadas antes.

89
Figura 07. Localizando na geografia atual.

90
Figura 08. Provável localização do sítio do século XVIII.

91
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