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4.

Barreiras e sistemas de ilhas-barreiras


4.1. Introdução
4.2. Origem e desenvolvimento das barreiras e ilhas-barreira
4.3. Ambientes sedimentares
4.4. Morfodinâmica e tipos de ilhas-barreira (dominadas por ondas, por marés e mistas)
4.5. Sistemas de ilhas barreira / barreira transgressivos, regressivos e estacionários
4.6. Formação e evolução do sistema barreira-laguna de Aveiro

Bibliografia
DAVIES, Jr. R.A. (1994). Barrier island systems - a geologic overview. In Geology of Holocene Barrier Island Systems.
Ed. R.A. Davies, Jr. Springer-Verlag, p. 1-47
SHORT, A.D. (Ed.) (1999). Handbook of beach and shoreface morphodynamics. John Wiley & Sons, 379 p.
Introdução
Vista parcial do sistema de ilhas barreira de Faro
As ilhas barreiras definem corpos alongados, essencialmente
paralelos à costa. São constituídas por ilhas de sedimentos não
consolidados, que protegem zonas continentais, e estão
separadas destas por um conjunto de ambientes de transição.
Nesta definição incluem-se as restingas e as barreiras
arenosas que nunca estiveram separadas do continente,
ficando excluídas as ilhas litificadas e ilhas imóveis.

Restinga do Douro Vista parcial do sistema de barreira de Aveiro

2004 2012
Enquadramento dos sistemas de ilha-
barreira e de barreira, bem como de outros
ambientes costeiros, de acordo com o tipo de
costa, atendendo à amplitude da maré.

Sistema de ilhas barreira da costa alemã, W de


Hamburgo
As ilhas barreira e as barreiras individualizam massas de água, com
dimensões diversas, designadas lagunas (“lagoon”). As lagunas
possuem uma ligação permanente com o mar, através de um canal que
estabelece as trocas de água e sedimento; por ser um canal cuja
dinâmica é essencialmente devido à subida e descida da maré é
designado por canal de maré principal (“tidal inlet”)
Exemplos
Sistema de Ilhas-barreia de Faro (Ria Formosa)

Principal característica do sistema: existência de


vários canais de maré principais, entre a laguna e o
mar.

Em cima: as setas indicam canais de maré


Ao lado: pormenor de um canal de maré
Sistema de barreia-laguna de Aveiro (vulgarmente designada Ria de Aveiro)

Principal característica do sistema: existência de um único canal de maré principal que estabelece a ligação entre a
laguna e o mar

À direita: panorâmica do sistema lagunar de Aveiro, onde se pode observar o canal de maré principal e os canais de maré
secundários (Canal de Mira, em baixo, e Canal de S. Jacinto, em cima).
À esquerda: pormenor do canal de maré principal, também designado barra de Aveiro
Outras massas de água junto à costa: Lagoas costeiras
Principal característica: não possuir ligação permanente com o mar

Em geral, estas massa de água são de pequenas


dimensões e possuem circulação restringida
Lagoa Sto André
Exemplos na costa ocidental portuguesa

Nas Lagoas de Óbidos, Albufeira, Melides e Santo André, o canal


pode abrir naturalmente ou através da ação do homem, com
periodicidade anual pelo menos desde o século XIV, com a finalidade
de renovar as águas interiores e drenar os campos próximos para
serem utilizados na agricultura.

Lagoa de Óbidos Lagoa Sto André


Dinâmica dos sistemas de barreira e ilhas barreira

Principais fatores (subida do nível médio do mar, influência


humana, ação das correntes de maré e vento) e respetivas
escalas de interação nos sistemas de barreira e de ilhas barreira.

Cada fator atua a diferentes escalas de tempo; por exemplo, a


ação humana influencia a evolução dos sistemas desde pequeno
(dias) a grande prazo (décadas) mas, os efeitos do vento e das
ondas, afetam os sistemas barreira a uma escala de médio (anos)
a pequeno prazo (dias)
Origem e desenvolvimento dos sistemas de ilhas-barreira / barreira

Os sistemas atuais são, em termos geológicos, muito recentes; os mais antigos


ter-se-ão começado a definir há cerca de 5.000 a 7.000 anos, quando a
velocidade de subida do nível do mar diminuiu (na sequência do último máximo
glaciar*). O aparecimento destes ambientes só foi possível devido à presença
de barreiras arenosas, cuja edificação ocorreu em situações de elevada
disponibilidade de sedimentos transportados pelas correntes de deriva litoral;
em alternativa, as barreiras podem ser atribuídas à imersão de barras
submersas, desenvolvimento de restingas ou inundação de cristas arenosas
costeiras.
Durante as fases transgressivas, o desenvolvimento das barreiras, apenas é
possível se a taxa de sedimentação for superior à da subida do nível do mar;
para que isso aconteça, são necessárias fases de relativa estabilidade do nível
marinho ou mesmo pequenas regressões.
Curva de flutuação do nível médio das águas do As barreiras mantém-se, mesmo em contexto transgressivo, se a quantidade
mar durante o Holocénico (seg. vários autores)
de sedimento disponível for suficiente para que o balanço mantenha um valor
positivo, podendo ocorrer migração destas para terra.
* Ver Morf. Glaciar – Geodinâmica e Riscos Geológicos
A maioria das lagunas e lagoas portuguesas (i.e. Barrinha de
Esmoriz, Ria de Aveiro, Concha de S. Martinho do Porto, Lagoas de
Óbidos, de Albufeira, de Melides, de Sto André, Rias de Alvor e
Formosa) teve origem em estuários ou planícies costeiras.
A transgressão flandriana ou seja, o processo que levou à subida
generalizada do nível do mar, há cerca de 18.000 a 16.000 anos
poderá estar na origem destes sistemas.
No início da transgressão, a linha de costa estaria numa posição
Lagoa de Sto André
próxima ao atual bordo da plataforma ou seja, em locais onde, na
atualidade, se observam profundidades entre os -140m e os -120m; a
linha de costa ao migrar em direção ao continente até à cota atual,
atingida há cerca de 3.000-5.000 anos, terá condicionado a
morfologia costeira provocando a imersão de barras submersas ou a
inundação de zonas costeiras, aliado a um elevado volume de
sedimentos disponível na deriva litoral.
Ambientes sedimentares

Os subambientes podem-se agrupar em dois grupos, no sentido mar-terra: i) um


exposto à ação direta dos processos costeiros (sistema praia-duna); ii) um mais
interior protegido desta ação (sistema lagunar)
i) O sistema praia-duna define, em sentido estrito, a barreira ou as ilhas barreira;
os subambientes presentes são os típicos de uma praia, desenvolvida numa
costa arenosa: praia submersa (“shoreface”), praia emersa (“foreshore,
backshore” e dunas).
ii) O sistema lagunar integra a laguna, de dimensões e morfologia variáveis, e as
planícies de maré, que se desenvolvem adjacentemente e apresentam
caraterísticas próprias as quais serão abordadas em capítulo correspondente
Nas zonas de interface, é possível encontrar depósitos resultantes da
conjugação de processos que afetam os dois sistemas acima referidos: a) deltas
de fluxo (devidos à corrente gerada aquando da subida da maré) e de refluxo
(gerada aquando da descida da maré); ambos ocorrem na dependência do
canal de maré principal; b) depósitos de galgamento (“washover fan”) devido a
Esquema simplificado dos subambientes eventos de tempestade e que erodem parcialmente as dunas.
presentes num sistema de ilha barreira
Ambientes sedimentares

(Oertel, 1985)

Esquema simplificado dos subambientes Panorâmica, de “terra para o mar” e em período de maré baixa, de
uma planície de marés - laguna, assim como a barreira arenosa
Os sedimentos presentes nos subambientes lagunares provém de três fontes principais:
i) Origem marinha, através do canal de maré e episódios de galgamento; os sedimentos ficam restringidos às
proximidades do canal de maré, sob a forma de deltas de enchente ativos ou desativados, e da barreira no caso dos
galgamentos oceânicos (processo que ocorre, em geral, durante os períodos de temporal)

Depósitos introduzidos pelas


Depósitos de galgamento correntes de fluxo

Lagoa de Sto André Lagoa de Óbidos


ii) Origem continental, através da descarga das linhas de água que afluem à laguna, erosão e escorrência direta das
margens e do transporte eólico; os sedimentos mais grosseiros depositam-se na foz das linhas de água e ao longo dos
canais de maré, onde as condições energéticas são maiores, sendo os mais finos transportados em suspensão e
depositados por decantação em zonas menos energéticas.

iii) atividade química e biológica da laguna, os sedimentos formam-se por precipitação química ou por acumulação de
matéria orgânica.

Lagoa de S. Martinho do Porto. Descarga do rio Salir na sequência de forte precipitação; os sedimentos mais grosseiros depositam-se
na foz do rio e nas margens da laguna, os mais finos são transportados em suspensão e exportados para o mar
Tipos de barreiras e de ilhas-barreira: morfodinâmica

• Sistemas de barreiras e ilhas-barreira dominadas pela ondulação


• Sistemas de barreiras e ilhas-barreira de energia mista

Laguna
Oceano
Ilhas barreira dominadas pelos processos de ondulação; caraterísticas de costas micromareais

Principais caraterísticas morfológicas:


- Laguna bem desenvolvida e planície
de marés muito pouco expressiva
- Reduzido número de canais de maré
principais (ou apenas um)
- Delta de fluxo bem desenvolvido,
devido à introdução na laguna de
sedimentos (de origem marinha) pelas
correntes de fluxo
- Cristas arenosas acrecionárias, devido
ao transporte e distribuição dos
sedimentos pelas correntes de deriva
litoral (induzidas pela ação das ondas
Cristas junto à costa); por esta razão, o delta de
Depósitos de acrecionárias
refluxo está ausente
galgamentos oceânicos
- Expressivos os galgamentos
oceânicos
Ilhas barreira de energia mista, a dinâmica depende da ação conjunta das correntes de maré e da ondulação;
caraterísticas de costas mesomareais

Principais caraterísticas morfológicas:


- Laguna pouco expressiva e planície de marés bem desenvolvida
- Canais de maré (principais) múltiplos
- Deltas de refluxo bem desenvolvido, devido à ação das correntes de refluxo;
deltas de fluxo pouco expressivos ou inexistentes
Ação da
ondulação - Cristas acrecionárias pouco desenvolvidas ou ausentes
Canais de maré
multiplos
O canal principal de maré (“tidal inlet”) faz parte integrante do sistema de
barreira possuindo, com diferente desenvolvimento, três elementos
morfológicos: delta de fluxo (“flood tidal delta”), canal, delta de refluxo (“ebb
tidal delta”)
Classificação morfológica dos deltas de refluxo (“ebb-deltas”); as variações são produto da interação dos processos
induzidos pelas correntes de maré, ondulação e correntes de deriva litoral geradas pela ação das ondas
2004 2007

Evolução de um canal de maré principal no sistema de ilhas-barreira de


Faro.
Observe-se o posicionamento das barras de “swash” e o alinhamento do
canal

2011
Ilhas barreira de energia mista; observe-se o delta de refluxo bem desenvolvido, Carolina do Sul, USA
Ilhas barreira de energia mista
Como as barreiras não são fixas, o sistema tende a migrar
lateralmente, devido às correntes de deriva litoral ou seja, o
canal de maré (inlet) move-se assim como todo o sistema; por
outro lado, se o volume de sedimento disponível for
substancial podem-se formar várias cristas acrecionárias
provocando a migração do sistema praia-duna em direção ao
“mar”
Modelos evolutivos dos sistemas barreira-laguna

Barreiras agradantes ou
estacionárias
(a deposição dos sedimentos ocorre

nao se verifica preferencialmente na vertical)

Barreiras agradantes

Barreiras transgressivas ou
retrogradantes
(confinamento do sistema lagunar devido ao
avanço da barreira para o continente)

Barreiras regressivas ou progradantes


(aumento da largura da barreira,
devido à migração de todo o sistema em
direção à plataforma)
Sistema de ilhas-barreira transgressiva ou retrogradante
Galgamentos oceânicos(“washover”) e depósitos associados (“washover fans”); o sistema dunar pode ser total
ou parcialmente erodido, sendo que o processo poder ser iniciado a partir de pontos de fraqueza e/ou de rutura
(corredores eólicos), permitindo que as massas de água transponham mais facilmente o cordão dunar.
Sistemas de ilhas barreira transgressivas
Efeito da ação de temporais, provocados por
eventos extremos (no caso ciclones) sobre um
sistema de ilhas-barreira do Alabama, Estados
Unidos da América

Observe-se, em baixo, o galgamento


generalizado da barreira por duas ocasiões,
2004 e 2005, levando à quase destruição de
todo o sistema
Evolução de uma barreira regressiva ou progradante (avanço em direção ao mar)

Note-se o desenvolvimento das


cristas acrecionárias, tanto lateral
como paralelamente à linha de
costa.
Este processo ocorre em situações
de descida do nível médio do mar
ou quando o volume de sedimentos
disponível na deriva litoral é
elevado.

Cristas acrecionárias

Ilha Wrangel, Russia


1975 1995 2012 2019

Evolução de uma das ilhas (Costa Cayo) do sistema da Florida, USA, entre 1975 e 2019, onde são visíveis vários conjuntos de cristas
acrecionárias que se vão intersetando; trata-se de um sistema regressivo em que a ilha foi “crescendo” o que é bem visível até 2012
No final desta unidade é aconselhável a resolução dos exercícios 1 e 2, do conjunto III. ILHAS-

BARREIRA E BARREIRAS ARENOSAS constantes do documento disponibilizado no e-learning

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