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HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL - 1º ANO

AULA Nº 46 a 48

SUMÁRIO:

- Polifonia em Portugal:
- Influências francesa, inglesa e borgonhesa;
- A Capela Real;
- A Música profana na Corte.
- Principais centros de actividade musical.
- Fontes, compositores e Mestres-Capela

______ ___________________________Influência Francesa

Os primeiros indícios que encontramos do conhecimento da prática polifónica em


Portugal surgem-nos somente nos finais do séc. XIV, com a presença do compositor
franco-flamengo Jean Simon de Haspre (Hasprois) na corte portuguesa, ao serviço
do rei D. Fernando, o Formoso (entre 1367-1383), e da rainha D. Leonor Telles.
O conhecimento da Ars Nova francesa do séc. XIV e de Guillaume Machaut (um
dos seus maiores representantes) por parte da corte de Lisboa está patente na
referência que D. João I (meio-irmão de D. Fernando) faz no seu Livro da Montaria
em que afirma que as fanfarras de caça, os gritos dos monteiros e os latidos das
matilhas lhe agradam mais do que a música do maior polifonista francês do séc. XIV,
Guillaume de Machaut, o que prova que a música polifónica avançada era conhecida
pelas elites da corte.
D. Fernando queria polifonia em Portugal mandando vir artistas de todo o tipo de
fora para a Corte Portuguesa, influenciando a nossa música. Um deles foi o famoso
Hasprois.

Após a morte de D. Fernando há uma crise dinástica na corte portuguesa, pois o rei
não tinha herdeiros masculinos. Após um Interregno de dois anos (1383-1385), e
após vitória na Batalha de Aljubarrota sobre a investida espanhola a Portugal, na
tentativa de ficar com o Reino, as cortes de Coimbra escolheram um meio-irmão de
D. Fernando para sucessor do trono português – D. João, Mestre de Avis, que
reinou entre 1385 e 1433) - (ver “Crise dinástica de 1383-1385” - Wikipédia)

_________________________________ Influência Inglesa

O casamento de D. João I, o de Boa Memória, com D. Filipa de Lencastre em


1387 teve um papel decisivo na evolução da música da corte portuguesa,
introduzindo uma influência inglesa (juntamente com a noiva, emigravam os
músicos da corte) que viria a perdurar pelo menos ao longo de toda a primeira
metade do século XV.
Deste casamento nasceu o Infante D. Duarte (O Eloquente), D. Pedro (O Viajante),
D. Henrique (O Navegador), D. Fernando (O Santo) e D. Isabel, que foram educados
segundo padrões ingleses – ficando esta conhecida posteriormente como a Ínclita
Geração.
Os Infantes promoveram uma intensa actividade polifónica na corte portuguesa:
todos eles tinham uma capela com músicos de grande qualidade à sua
disposição.

______________________________________ Capela Real

No centro de actividade polifónica da corte estava a Capela Real, que se preocupava


com a manutenção do mais alto nível musical. A prática regular da música
polifónica da Capela Real durante o século XV deduz-se na Ordenança elaborada
pelo rei D. Duarte, O Eloquente, (entre 1433-1438) em que o rei:
 menciona os quatro cargos directivos da instituição: capelão-mor, mestre
da capela, tenor e mestre dos moços,
 discrimina três naipes de cantores: alto, contra e tenor,
 recomenda normas precisas de execução musical (não entoar o canto
numa tessitura mais aguda, articulação do texto, técnica de dobragem
polifónica improvisada sobre uma melodia dada) e de disciplina
 estabelece como princípio a presença de oito a doze moços de coro, dos
quais metade deve ter sete a oito anos de idade e a outra metade três a
quatro anos mais, de modo a evitar excessivas oscilações de qualidade no
conjunto sempre que os moços mais velhos cheguem à idade de mudança de
voz.
 proíbe admissão de cantores castrados na Capela Real.
 exige que os seus cantores “cantem de papo” (voz de peito e não voz de
garganta)

Cabia à Capela Real celebrar diariamente a Missa, assim como celebrar ao longo
de todo o ano litúrgico o Ofício Divino, abrangendo o conjunto das horas canónicas
estabelecidas: Matinas, Laudes, Prima, Terça, Sexta, Nona, Vésperas e Completas,
sendo a maior parte destas cerimónias litúrgicas apenas recitadas, na maioria
das vezes sem qualquer intervenção de música e sobretudo sem a presença do
monarca.

______________________________ Influência de Borgonha

Em 1430, a Infanta D. Isabel, filha de D. João I casa com o Duque de Borgonha,


Filipe, o “Bom”, do que resultou no intercâmbio de músicos e influências
musicais entre a corte portuguesa e a corte ducal de Dijon, que era no séc. XV,
a corte mais importante a nível musical e artístico. A influência portuguesa na música
de Borgonha está bem patente numa dança franco-flamenga, peça instrumental
intitulada La Portingaloise e ainda numa obra de Guillaume Dufay, Portugaler.

O interesse que a música profana franco-flamenga terá despertado em Portugal é


demonstrado pelo facto de D. Afonso V, O Africano, (1432-1481 - filho de D. Duarte
– e que reinou entre 1438 e 1481) ter ordenado ao seu mestre de capela, o espanhol
Tristano da Silva, que reunisse uma colecção de canções franco-flamengas, a
qual não chegou até aos nossos dias.

Apesar de só se conhecer música escrita a partir do séc. XVI, sabe-se que existia
uma grande estrutura musical com influências vindas de início de França e depois de
Borgonha através de referências documentais, que terão sido exploradas, para
tentar reconstruir o que terá sido a nossa música. Esta carência de fontes musicais
polifónicas leva-nos a supor que terão sido entre nós escassas ou se terão perdido.

_____________________________ Música Profana na Corte

Paralelamente com a música litúrgica que se praticava na Capela Real, existia na


Corte uma intensa actividade polifónica no domínio profano, nomeadamente
as fanfarras de cariz militar que serviam para dar um carácter solene a todos os
rituais cortesãos como por exemplo a chegada e acolhimento de um visitante de
relevo, passando pelas refeições até à hora de o rei ir dormir.
Todo este tipo de música era atribuído a instrumentos altos, como as charamelas,
as trombetas ou os atabales.
A par com os menestréis encarregues dos instrumentos altos havia também os
tangedores de câmara, responsáveis pela música de dança, vocal e instrumental
profana, mas mais sofisticada: tangedores de alaúde, mestres de órgão, que ao
contrário dos menestréis eram oriundos da pequena nobreza (os instrumentos
de sopro eram considerados impróprios para um aristocrata por se considerarem
de origem popular).
Existia, deste modo, uma música alta e uma música baixa, significando a primeira
de ar livre, cerimonial ou militar, que fazia uso de instrumentos mais sonoros,
e a segunda a música de corte, particularmente a de dança, executada por
instrumentos mais suaves.
É de referir ainda a presença da Música como componente essencial dos autos e
espectáculos teatrais, particularmente o teatro de Gil Vicente, que se
representavam perante a Família Real e um círculo restrito de cortesãos. Exemplos
disso são o famoso romance Nina era la Infanta e o motete Clamabat autem mulier
Cananea de Pedro de Escobar.

____________________________Principais centros de actividade musical

As obras dos Mestres das capelas reais do início do século XVI não chegaram até nós.
Entre eles encontramos nomes como Mateus de Fonte, Fernão Rodrigues ou João
de Vilhacastim.

Os compositores dessa época cujas obras chegaram até nós são:


• Vasco Pires - Cantor e Mestre de Capela da Sé de Coimbra
• Fernão Gomes (Correia) - o primeiro compositor português a escrever um
Ordinário da Missa.
As obras de ambos os compositores estão na Biblioteca Geral da Universidade de
Coimbra.

Desta época, o compositor português de renome e cuja obra conhecemos é Pedro


do Porto (ou também Pedro de Escobar). Foi cantor da Capela da Rainha Isabel
– (Isabel de Castela, casada primeiro com Afonso V e, após a morte deste em 1491,
com D. Manuel I) – entre 1489 e 1499 e, entre 1507 e 1514, mestre dos Moços de
Coro da Catedral de Sevilha, com o encargo do ensino musical, alimentação,
vestimenta e alojamento, e provavelmente também Mestre de Capela da mesma
catedral. Pedro de Escobar e Pedro do Porto serão a mesma pessoa, pelo menos
segundo a opinião de Robert Stevenson.
As canções profanas de Pedro do Porto encontram-se no Cancioneiro do Palácio e
três delas no Cancioneiro de Elvas (ou do Padre Manuel Joaquim ou da Biblioteca
Públia Hortênsia).
Este compositor é citado por Gil Vicente nas Cortes de Júpiter, de 1521, cujo
argumento se centra na viagem de filha do rei D. Manuel, o Venturoso (entre 1495
e 1521) – D. Beatriz – para Sabóia, onde iria casar com o Duque – “Esta comédia,

que conjuga canções e dança com diálogos, desenvolve o tema da viagem de D. Beatriz.
Após o discurso da Providência, Júpiter, rei dos elementos, convoca as cortes e concerta
planetas e signos para favorecerem a viagem. Já reunidos, os deuses decidem proteger
a frota que conduzirá D. Beatriz ao seu novo país. Os habitantes de Lisboa e os membros
da corte transformam-se em peixes que escoltam os navios até ao alto mar. Marte exalta
a Fé de Portugal aquando da entrada da frota no Mediterrâneo, parcialmente dominado
pelos mouros.” (fonte: infopédia.pt). É neste auto que se apresenta a peça de Pedro de
Escobar Niña era la infanta.
O mesmo compositor chega a ser Mestre de Capela do Cardeal D. Afonso, filho de
D. Manuel, que é administrador das dioceses de Lisboa e Évora. Pedro Escobar viveu
em Évora nos anos 1534/35. É possível que tenha estado ligado à música da Sé.

Entretanto, em 1528 já tinha sido nomeado para Mestre de Capela da Sé de Évora


o espanhol Mateus d’Aranda. Foi o primeiro músico designado para esse cargo.
É nesta altura que, por toda a Europa começam a aparecer capelas das sés, à
semelhança das capelas privadas dos reis e dos infantes. Poderá ter havido um
pequeno atraso em Portugal, em relação à Europa, mas de pouco tempo.
Em Lisboa, o cargo de Mestre Capela da Sé foi criado em 1530 e talvez por
influência da Capela Real. Esta Capela possuía, em 1551, 10 cantores adultos e 8
moços de coro.

Eis dois depoimentos da época:

• Cristóvão Rodrigues de Oliveira informa no seu Sumário em que


brevemente se contém algumas coisas que há na cidade de Lisboa, que no
ano de 1551 havia na capital do Reino 150 cantores e 13 escolas para o
ensino do canto de órgão, referindo-se à escola da sé e às escolas
conventuais.

• Damião de Góis, na sua Descrição da Cidade de Lisboa, indica que nas


principais festas do ano saíam da cidade de Lisboa mais de trinta grupos de
cantores de canto de órgão a fim de participarem nas celebrações litúrgicas
das vilas e aldeias da periferia e que apesar disso as igrejas de Lisboa não
ficavam desguarnecidas de cantores para os seus serviços.

Em 1540, D. João III, o Piedoso (entre 1521 e 1557) aumentou o número de


cantores da capela Real para 52 e dos instrumentistas para 8.
Todos os membros da família real tinham a sua capela, havendo, portanto, uma
continuidade do que sucedeu no século XV. De destacar a do Duque de Bragança,
em Vila Viçosa, que virá a ter uma importância enorme no século XVII.

De grande importância para a História da Música religiosa é o facto dos filhos de D.


Manuel, D. Afonso e D. Henrique, terem sido Cardeais. Estes estiveram à frente
das dioceses de Évora, Lisboa e Braga.
Em Évora, já em 1469, havia 13 capelães cantores, mas era necessária a criação
uma escola onde as crianças dotadas para música pudessem receber a sua educação
musical. Para tal também era necessário dinheiro.
Uma vez que a Corte de D. João III esteve em Évora, a criação da Capela na Sé de
Évora teve aparente primazia no tempo e na sua formação,
Havia dificuldade em encontrar mestres de música em Portugal para iniciar este
trabalho, pelo que foi necessário trazê-los de Espanha. Foi o caso de Alonso Lobo,
em 1530, e que mais tarde seria Mestre de Capela da Catedral de Toledo.

Mateus de Aranda manteve-se em Évora de 1528 a 1544, tendo ido depois para
Coimbra onde foi Mestre de Música daquela Universidade.
Da Oficina de German Galharde, de Lisboa saíram duas das suas obras fundamentais:

• Tractado de cãtollano de 1533


• Tractado de canto mensurable de 1535

Estes dois manuais didácticos de cantochão e polifonia estão obviamente associados


à sua actividade como mestre de Capela e escola da Sé de Évora.
______________Outros compositores, Mestres da Capela e Mestres Escola

Padre Manuel Dias – 1544-1563


Francisco Velez – 1544-1580
Padre Manuel Mendes – 1578-1589
Padre Cosme Delgado – desde a década de 70 na 1596
Filipe de Magalhães – 1589-1604
Padre Manuel Rebelo – 1596-1647

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