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Passo Fundo
2018
"Comovo-me em excesso, por natureza e por ofício.
Acho medonho alguém viver sem paixões."
Graciliano Ramos
RESUMO
From a very early age, the Eritrean society organized itself into associations according
to its ethnic groups, forming, in this way, Italian, German, Polish and other clubs. Like
the other groups, the black and "non-immigrant" population constituted a space to
fraternize with "their", a space for leisure and culture, sports and parties. This
dissertation aims at the analysis of part of the black population of the city of Erechim
through the actions developed by the members of the Sport Club Treze de Maio,
founded on December 16, 1949. The temporal cut, established between 1949 and 1982,
begins in the year of the association's formation, goes through the considered period of
"glory" and arrives at the last days of the club. The focus of this reflection centered on
the organization of this association, the strategies used in the search for visibility and in
the development of new networks of relationship. To do so, it is worth analyzing the
few remaining documents of the association, among them: some pages of minutes,
photographs, complete Club status, few records of the minutes of the women's wing and
articles published in the local newspaper A Voz da Serra. Through the analyzed sources,
we present the associative network formed in the city from each ethnicity and the
reasons that led to the constitution of a Black Club. In tracing the first steps of the Treze
de Maio Sports Club and understanding its formation within society, we investigate the
process of social invisibility suffered by this part of the population and the mechanisms
used to circumvent this situation. We seek to understand the role played by black
women, as well as the importance of football, carnival and gala dances. In this way, we
verified how the association was an important space of sociability for blacks and
"people of color" collaborating in the breakdown of stereotypes and in the creation of a
positive image of the Club and its associates.
INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 8
1 A CIDADE, OS SUJEITOS E AS ASSOCIAÇÕES ............................................. 22
1.1 A formação da cidade de erechim ................................................................... 22
1.2 O negro na historiografia local ........................................................................ 31
1.3 A "capital da amizade" e a formação de clubes étnicos.................................... 37
1.4 Um espaço para os negros ............................................................................... 42
1.5 A criação do esporte clube treze de maio ........................................................ 45
1.6 "Um clube eminentemente brasileiro, para o bem da nacionalidade e o progresso
da pátria” ................................................................................................................ 52
2 CONQUISTANDO ESPAÇOS DE VISIBILIDADE EFORMAÇÃO DE REDES
SOCIAIS ................................................................................................................. 59
2.1 Através da construção da nova sede... A busca por parcerias e reivindicações . 60
2.2 O futebol ........................................................................................................ 63
2.3 As festas: a beleza dos bailes e elegância dos sócios ....................................... 70
2.4 A coroação da rainha - a representação da mulher negra e seu papel na
associação ............................................................................................................... 82
2.5 O término da associação: algumas considerações ............................................ 95
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 98
REFERÊNCIAS .................................................................................................... 101
ANEXOS .............................................................................................................. 107
8
INTRODUÇÃO
1
OLIVEN, Ruben George. A invisibilidade social e simbólica do negro no Rio Grande do Sul. In:
LEITE, Ilka Boaventura (Org.). Negros no sul do Brasil: Invisibilidade e territorialidade. Ilha de Santa
Catarina. Letras Contemporâneas, 1996. p. 26.
2
Apesar de tentativas de acesso ao trabalho monográfico defendido no curso de história da Universidade
Regional Integrada do Alto Uruguai (URI) não obtivemos sucesso na consulta ao mesmo, pois a
Universidade não possibilitou acesso ao trabalho e o autor não retornou as tentativas de contato.
10
3
PEREIRA, Rodrigo Alves. A presença negra no município de Erechim: da colonização ao Esporte Clube
13 de Maio. Erechim: URI, 2008. Monografia de conclusão de curso, p.10
4
WEBER, V. O velho Erechim. Revista Erechim, julho 1951 Ano 1.
11
condutor será a família de Arlindo e Julia da Silva [...]” 5. Cassol também contribui e
traz o resultado do censo de 1950, no qual Consta o número de negros no município 6.
H M H M H M H M H M
60.267 59.262 57.316 56.450 1.118 1.073 - - 688 1.605
Tabela 1- Censo de 1950
Fonte: IBGE – Recenseamento Geral de 1950.
5
GARCEZ, Neusa Cidade. Colonização e imigração em Erechim: a saga das famílias polonesas (1900 -
1950). Erechim, RS: [s.n.], 1997. 188 p
6
CASSOL, Ernesto. Histórico de Erechim. Passo Fundo: Instituto social Padre Berthier, 1979. p.27
7
CHIAPARINI, Enori José et. al. Erechim: Retratos do Passado, Memórias no Presente. Erechim:
Graffoluz, 2012. (CHIAPARINI, 2012, p.66).
8
A cidade recebeu o título de "Capital da Amizade" nos festejos de cinquenta anos de emancipação,
"Naquele ano, 1968, foi realizada uma grande festa. Na praça da Bandeira, foram erguidos estandes
representativos de todas as etnias que compunham a população do município: franceses, italianos,
alemães, holandeses, judeus, espanhóis, portugueses, poloneses, índios, russos, entre outros. Esses
estandes mostravam um pouco da cultura de cada povo e sua inserção no município. Lembro que houve a
visita de vários cônsules que visitaram a cidade e havia shows típicos todas as tardes. Num desses shows,
Rubens Safro - popular e localmente conhecido como Buja - animava a festa e chamou a cidade de
"Capital da Amizade". Logo a alcunha foi adotada pelo município, devido à diversidade das etnias que
compunham a sua população e à harmonia de sua convivência." Disponível em
<http://www.pmerechim.rs.gov.br/pagina/150/origem-do-nome> acesso em 26 ago 2016.
9
ZAMBONATTO, Aristides Agostinho. Os Meus Erechim. Editora São Cristovão, 2000. p.173-174
12
10
PEREIRA, Rodrigo Alves. A presença negra no município de Erechim: da colonização ao Esporte
Clube 13 de Maio. Erechim: URI, 2008. Monografia de conclusão de curso, p.48.
13
Percebe-se que a discriminação racial foi uma das motivações do grupo negro
em Caxias para a formação de associações. Dessa forma, em 12 de dezembro
de 1933, algumas mulheres negras da cidade se empenham na formação de
uma associação, de um clube, o Clube das Margaridas.11
11
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p. 7.
12
GOFFMAN, Erving. Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. Rio de Janeiro:
LTC Editora, 1988.
13
ELIAS, Norbert; SCOTSON, John L. Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de poder
a partir de uma pequena comunidade. Tradução de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.
14
grupos detentores do poder criam uma autoimagem superior em relação aos grupos
desfavorecidos.
14
ELIAS, Norbert; SCOTSON, John L. Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de poder
a partir de uma pequena comunidade. Tradução de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p. 32.
15
ALBERTI, Verena. Histórias dentro da história. PINSKI, Carla Bassanezi (Org.) Fontes Históricas. 3
ed. São Paulo: Contexto, 2011, p.155.
15
16
THOMPSON, Paul. A voz do passado: História Oral. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. p.22.
17
ALBERTI, Verena. Ouvir Contar: textos e história oral. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004. p. 9.
18
POLLAK, Michael. Memória e identidade social. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro: Ed
UFRJ, v. 5, n. 10, p. 200-212, 1992.
19
TEDESCO, João Carlos. Passado e presente em interfaces: introdução a uma análise sócio-histórica da
memória. Passo Fundo; Xanxerê; Porto Alegre: Universidade de Passo Fundo; Universidade do Oeste de
Santa Catarina; Suliani Letras & Vida, 2011.
20
TEDESCO, João Carlos. Passado e presente em interfaces: introdução a uma análise sócio-histórica da
memória. Passo Fundo; Xanxerê; Porto Alegre: Universidade de Passo Fundo; Universidade do Oeste de
Santa Catarina; Suliani Letras & Vida, 2011. p. 106.
16
21
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Tradução de Beatriz Sidou. 2ª ed. São Paulo: Centauro,
2013. p. 39.
17
No Rio Grande do Sul, os negros, como grupo social, estão em boa medida
invisibilizados como sujeitos históricos, seja por preconceito ou indiferença.
Esta invisibilidade social decorre do estigma e do preconceito que surge de
fatores sociais, econômicos, estéticos e principalmente culturais.22
22
GIRON, Loraine Slomp, RADÜNZ, Roberto. Invisíveis: negros nas memórias dos brancos. Revista
brasileira de História e Ciências Sociais, v. 4, n. 7, p. 143-161, 2012.
18
apontar que a imprensa “tem uma opinião”, é necessário percebermos em sua atuação as
delimitações de espaços, os temas demarcados e as opiniões mobilizadas23.
Independente do perfil adotado, o jogo de interesses está continuamente presente
nos periódicos, pois seus relatos nem sempre correspondem aos fatos. Estão em jogo
defesas de posicionamentos políticos, poder econômico e causas sociais. O simples fato
de algo ter se tornado notícia é significativo. O local destinado à matéria, as palavras
escolhidas, o destaque ou a minimização de determinados temas demonstram os
interesses do próprio jornal. Tania Regina de Luca afirma:
23
CRUZ, Heloisa de Faria; PEIXOTO, Maria do Rosário da Cunha. NA OFICINA DO HISTORIADOR:
CONVERSAS SOBRE HISTÓRIA E IMPRENSA. Projeto História: Revista do Programa de Estudos
Pós-Graduados de História, [S.l.], v. 35, dez. 2009. ISSN 2176-2767. Disponível em:
<https://revistas.pucsp.br/index.php/revph/article/view/2221>. Acesso em: 07 fev. 2017. p.254.
24
LUCA, Tania Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY.
p.144.
25
KOSSOY, Boris. Fotografia e história. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. p.38.
19
26
KOSSOY, Boris. Fotografia e história. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. p. 39.
27
LIMA, Aline Mendes. "Ofereço minha foto como recordação": representações negras em álbuns de
familiares (Pelotas 1930-1960). 2009. 129 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de História, Faculdade de
Filosofia e Ciências Humanas, PUC RS, Porto Alegre, 2009.
p. 28-29
20
A imagem não fala por si só, é necessário que as perguntas sejam feitas. Ela
precisa ultrapassar o caráter de mera ilustração e, dessa forma, permitir certa
"presentificação" do passado. "A história embrenha as imagens, nas opções realizadas
por quem escolhe, uma expressão e um conteúdo, compondo através de signos, de
natureza não verbal, objetos de civilização, significados de cultura” 29.
30
Conforme Miriam Moreira Leite , “a imagem não se comunica com clareza”.
Ela pode traçar fatos que somente após constantes e persistentes olhares, incorporados à
capacidade dos sentidos em captar aquilo que não observamos na superfície, pode nos
levar a reconhecer outros teores que transponham aquela primeira impressão que se
tenta estabelecer.
No caso das fotografias analisadas, na maioria delas, não sabermos quem são os
autores, tampouco como foram produzidas ou o ano exato. Mas os personagens
retratados contam histórias a partir da forma de organização das pessoas, do cenário, do
figurino, do ângulo e plano da foto. Não dispomos de retratos de estúdio pousados e
montados, mas sim de representações das ações, tiradas nos bailes e almoços festivos do
Treze.
Tendo discorrido brevemente sobre a temática e as fontes utilizadas passamos
agora a apresentar a estrutura da dissertação, que está dividida em dois capítulos. No
primeiro capítulo elaboramos uma rápida explanação sobre a formação do município,
fortemente influenciada pelo positivismo, que colocou à margem a participação de
índios, caboclos e negros, privilegiando a migração intensa de descendentes europeus.
Fizemos alguns apontamentos acerca da grande diversidade étnica e do espaço
destinado ao negro na historiografia local.
28
MAUAD, Ana Maria. Através da imagem: fotografia e história: Interfaces. 1996, Revista Tempo, vol.1
n. 2, p. 73-98. p.80.
29
MAUAD, Ana Maria. Através da imagem: fotografia e história: Interfaces. 1996. Revista Tempo, vol.1
n. 2, p. 73-98. p.87.
30
LEITE, Miriam Moreira. Imagem e educação. In: SEMINÁRIO PEDAGOGIA DA IMAGEM NA
PEDAGOGIA. Anais... Rio de Janeiro: UFF, 1996. p. 83.
21
Para tanto, foi essencial a leitura de parte da obra de Enori José Chiaparini, de
Ernesto Cassol, além de outros historiadores locais que embasaram as análises e
possibilitaram a compreensão da formação de Erechim e seu impacto para os diversos
grupos presentes, especialmente os negros. Ainda no primeiro capítulo focamos o
Esporte Clube Treze de Maio com o objetivo de traçarmos os primeiros passos da
associação e entender sua formação dentro da sociedade local.
No segundo capítulo, nosso interesse foi evidenciar os pequenos espaços
conquistados pelo clube no jornal A Voz da Serra. Abordamos a tentativa de
invisibilisar o negro e as formas encontradas para ganhar visibilidade na sociedade
local. O conceito de invisibilidade é empregado conforme entendido por Loraine Slomp
Giron e Roberto Radünz quando afirmam que "a invisibilidade social decorre do
estigma e do preconceito"31. Segundo os autores esta invisibilidade também fez com que
o negro estivesse ausente nas pesquisas realizadas pela história regional. Desta forma
foi possível perceber como parte da população de Erechim tornou-se invisível e quais
foram os meios que encontraram para driblar esta conjuntura. A partir das matérias
publicadas verificamos a importância do futebol, do carnaval e dos demais bailes para o
clube e, consequentemente, para seus sócios. Analisamos também, neste segundo
capítulo, o papel da mulher negra dentro do clube e a forte cobrança em relação a moral
de seus associados, sobre tudo das sócias.
31
GIRON, Loraine Slomp, RADÜNZ, Roberto. Invisíveis: negros nas memórias dos brancos. Revista
brasileira de História e Ciências Sociais, v. 4, n. 7, p. 143-161, 2012. p. 144.
22
Não seria possível, nesta pesquisa, tratar da formação do Esporte Clube Treze de
Maio em Erechim, sem analisarmos os fatores influentes na constituição do município e
suas especificidades, além de compreendermos a política de colonização, mediada pelo
Estado a partir dos anos finais do século XIX e início do século XX, de que foi alvo o
Alto Uruguai, juntamente com toda a região Norte do Rio Grande do Sul.
Sendo uma das últimas reservas florestais do estado, a região habitada por
índios jê/Kaingang e caboclos, a partir do século XIX, com a Revolução Farroupilha 32
32
Revolução Farroupilha, também chamada de guerra dos Farrapos, foi uma guerra civil que ocorreu no
Rio Grande do Sul entre os anos de 1835 e1845.Tratou-se de um movimento reivindicatório dos
estancieiros e charqueadores contra a taxação das terras e do charque. Sobre Revolução Farroupilha, ver,
por exemplo: FLORES, Moacyr. A Revolução Farroupilha. Porto Alegre: Martins Livreiro, 1984. Ou:
PESAVENTO, Sandra. A Revolução Farroupilha. Coleção Tudo é História. São Paulo: Editora
Brasiliense, 1985.
23
33
A Revolução Federalista foi uma guerra civil ocorrida, principalmente, no território do Rio Grande do
Sul. Colocou em lados opostos Federalistas e Republicanos e caracterizou-se por atos violentos de ambos
os lados. Sobre Revolução Federalista, ver, por exemplo: PESAVENTO, Sandra. A Revolução
Federalista. Coleção Tudo é História. São Paulo: Editora Brasiliense, 1983.
34
PIRAN, Nédio. Agricultura Familiar: lutas e perspectivas no Alto Uruguai. Erechim: EdiFAPES,
2001. p.25
35
A concepção de frente pioneira traz a ideia de avanço social, de modernização. A chegada do imigrante
ao território do Alto Uruguai possibilitou novas formas de produzir e alterações nas relações sociais.
Sobre frente pioneira, ver: GOLIN, Tau . A Fronteira: governos e movimentos espontâneos na fixação
dos limites do Brasil com o Uruguai e a Argentina. Porto Alegre: L&PM, 2002. 400p.
36
DUCATTI, Antônio Neto. O Grande Erechim e sua história. Porto Alegre: EST. 1981. p.61.
37
GRITTI, Isabel Rosa. Imigração e Colonização Polonesa no Rio Grande do Sul: a emergência do
preconceito. Porto Alegre: Martins Livreiro, 2004. p.117.
38
CASSOL, Ernesto. Histórico Erechim. Passo Fundo: Instituto social Padre Berthier, 1979. p.28
24
Entre os anos de 1911 e 1912 muitos poloneses 42 emigraram para o Brasil, vários
destes para a colônia. Embora estivessem na região desde 1907, a primeira família a ser
registrada oficialmente em Erechim data do dia 10 de abril de 1910. Os primeiros
poloneses que chegaram vieram da região do Rio das Antas e do porto de Rio Grande. 43
Orientados pela companhia JewishColonizationAssociation, em 1911 e 1912
chegaram também os primeiros judeus, originários da Romênia, Alemanha,
Bielorrússia, Áustria, Espanha e Itália, os quais se instalaram, inicialmente, em Quatro
Irmãos. Os italianos, que eram em número menor que os poloneses até 1918, tiveram
um aumento significativo com a intensificação da migração originária das colônias
antigas. Os primeiros imigrantes alemães chegam a Erechim no ano de 1912 e se
estabelecem em Paiol Grande. Entre eles encontrava-se o primeiro alfaiate, o Sr.
Augusto Stefano. Porém, a maior parcela de alemães se estabeleceu em Lageado Grande
39
Ibidem. p.115.
40
SCHMIDT. Rémis Alice Perin. Erechim cidade construída para imigrantes - Poder simbólico na
conquista do espaço urbano. 2009. Dissertação. (Mestrado) – Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas, Pós-Graduação em História, PUCRS . p.75
41
SHMITD, Remis apud ILLA FONT, 1983, p. 12
42
Para aprofundar os conhecimentos acerca da imigração polonesa ver trabalho de GRITTI, Isabel Rosa.
43
CHIAPARINI, Enori José et. al. Erechim: Retratos do Passado, Memórias no Presente. Erechim:
Graffoluz, 2012. p.66
25
(atual Ponte Preta) e em Rio Novo (atual Aratiba), com 30% da população de origem
alemã. 44
A região de Erechim foi uma das últimas a ser colonizada no Estado do Rio
Grande do Sul. A distância da capital, Porto Alegre, foi um dos motivos para a demora
na ocupação, assim como o terreno acidentado, que não despertava o interesse dos
grandes latifundiários para as terras da região.45 Localizadas no Alto Uruguai rio-
grandense, as terras começaram a ser demarcadas juntamente com a elaboração do
traçado por onde deveria passar a ferrovia que ligaria o Rio Grande do Sul a São Paulo,
cortando a região conhecida como Sertão do Alto Uruguai, ligando Passo Fundo a
Marcelino Ramos. As estações ferroviárias que foram construídas ao longo dos trilhos
deram origem a diversos núcleos urbanos 46. Segundo Enori José Chiaparini,
44
DUCATTI, Antônio Neto. O Grande Erechim e sua história. Porto Alegre: EST. 1981. p. 95-96.
45
ZANELLA, Anacleto.A trajetória do sindicalismo no alto Uruguai gaúcho 1937-2003. Passo Fundo:
UPF, 2004. p. 26.
46
CHIAPARINI, Enori José et. al. Erechim: Retratos do Passado, Memórias no Presente. Erechim:
Graffoluz, 2012. p.29.
47
Ibidem, p.62.
48
CASSOL, Ernesto. Histórico de Erechim. Passo Fundo:Instituto social Padre Berthier, 1979. p.27.
49
CHIAPARINI, Enori José et. al. Erechim: Retratos do Passado, Memórias no Presente. Erechim:
Graffoluz, 2012. p.60.
26
A linha que atravessou o Estado, com início na cidade de Santa Maria (RS),
fazendo a ligação desta com o restante do Rio Grande do Sul e também com Santa
Catarina, Paraná e São Paulo, passando pela região do Alto Uruguai, foi primordial para
a colonização desta região. Conforme o plano do governo, o local seria
progressivamente ocupado na medida em que a ferrovia fosse implantada. Cada estação
significava a origem de um novo povoado onde os excedentes de imigrantes das antigas
colônias50 e também imigrantes oriundos da Europa poderiam instalar-se. Segundo
Neusa Cidade Garcez,
50
Localizadas na região do Rio dos Sinos e de Caxias do Sul estas colônias antigas foram criadas ainda
durante o império.
51
GARCEZ. Neusa. Colonização e imigração em Erechim: a saga das famílias polonesas. 1997. p.24.
27
53
CASSOL, Ernesto. Histórico Erechim. Erechim: Passo Fundo: Instituto social Padre Berthier, 1979. p.
28.
54
CHIAPARINI, Enori José et. al. Erechim: Retratos do Passado, Memórias no Presente. Erechim:
Graffoluz, 2012. p.50.
55
Para aprofundar os conhecimentos acerca da JewishKolonizationAssociation ver trabalho de GRITTI,
Isabel Rosa.
56
CHIAPARINI, Enori José et. al. Erechim: Retratos do Passado, Memórias no Presente. Erechim:
Graffoluz, 2012. p.50.
29
57
DUCATTI, Antônio Neto. O Grande Erechim e sua história. Porto Alegre: EST. 1981. p. 95-96.
58
A cidade de Erechim teve várias designações: Paiol Grande, até 1918; Boa Vista, até 1922; Boa Vista
do Erechim, até 1938; José Bonifácio, até 1944.
59
CASSOL, Ernesto. Histórico Erechim. Passo Fundo: Instituto social Padre Berthier, 1979. p. 29.
60
O positivismo é uma corrente filosófica que surge na França e tem Augusto Comte como principal
idealizador. Para o positivismo o progresso do País está nas mãos da elite, que é também responsável pelo
governo, o trabalho cabe ao povo. Caracteriza-se por defender uma acentuada hierarquia social.
(CHIAPARINI, 2012. p. 34).
61
SCHMIDT. Rémis Alice Perin. Erechim cidade construída para imigrantes - Poder simbólico na
conquista do espaço urbano. 2009. Dissertação. (Mestrado) – Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas, Pós-Graduação em História, PUCRS. p. 27.
30
Este período caracterizou-se pela chamada Belle Époque62 que se revelou nas
construções, nos costumes urbanos e na rejeição das elites à cultura popular. Neste
mesmo período ocorreu um aumento significativo no número de casas de teatro e
cinemas.
Neste contexto, as populações nativas - principalmente indígenas e caboclas-
eram percebidas, na visão positivista do Estado, como arcaicas. Era grande a
importância dada aos imigrantes na participação comercial, industrial e na produção
agrícola durante este período.63
Neste momento, o elemento nacional representou o extrativismo e as maneiras
rudimentares de cultivar a terra. Já o imigrante, visto como elemento civilizador fez a
modernização do campo e implantou técnicas modernas na agricultura tradicional. 64
Gritti65 traz significativas contribuições para a compreensão desta visão acerca
das populações nativas e dos imigrantes ao analisar a classificação hierárquica dos
povos, criada por Augusto Comte. A autora destaca a importância de levar em
consideração essa classificação de povos e nações, tendo em vista que o Estado do Rio
Grande do Sul, e desta forma, também Erechim, tiveram forte influência da doutrina
positivista.
Outro ponto que deve ser levado em consideração é a imagem de superioridade
dos imigrantes em relação à população local. Nédio Piran66 afirma que a existência da
ideia de superioridade dos imigrantes em relação aos caboclos, índios e negros, que já
habitavam a região, era uma "questão de sobrevivência", uma vez que estes grupos
representavam uma ameaça ao sucesso dos imigrantes.
Os imigrantes que chegaram à Colônia receberam apoio e oportunidades de
desenvolvimento, o Estado os via com bons olhos. Todavia, o mesmo não aconteceu
com os antigos habitantes da região, os quais foram marginalizados e sofreram com
62
"A Belle Époque foi um movimento que perpassou o Realismo, o Impressionismo, o simbolismo, o
Pontilhismo e a Art Nouveau. O movimento da Belle Époque foi iniciado na Europa (França) nos anos de
1880, século XIX, tendo declínio, em 1914, com o início da Primeira Guerra Mundial. Muitos estudiosos
desse movimento ressaltam a dificuldade de delimitá-lo temporalmente e espacialmente, sobretudo por
sua influência em vários países do mundo e em períodos que ultrapassaram a delimitação atual: 1914. No
Brasil, a Belle Époque teve seu auge nos anos de 1889 a 1922, perdurando até 1925. A Belle Époque
brasileira foi uma verdadeira europeização dos hábitos e costumes de uma sociedade. Vale ressaltar que a
maior influencia desse movimento se deram em cidades como Rio de Janeiro e Belo Horizonte."
(CHIAPARINI, 2012. p. 35).
63
SCHMIDT. Rémis Alice Perin, op. cit.
64
ZARTH, Paulo. História Agrária do Planalto Gaucho 1850 - 1920. Ijuí, Editora Unijui, 1997.
65
GRITTI, Isabel Rosa. Imigração e Colonização Polonesa no Rio Grande do Sul: a emergência do
preconceito. Porto Alegre: Martins Livreiro, 2004.
66
PIRAN, Nédio. Agricultura Familiar: lutas e perspectivas no Alto Uruguai. Erechim: EdiFAPES,
2001.
31
Como vimos, no período de formação de Erechim o meio urbano era visto como
o lugar do progresso, identificado como racional e planejado, fazendo oposição ao
mundo rural, entendido como atrasado, ultrapassado. Estes traços, característicos do
período positivista, estiveram presentes em outros aspectos do município. Rodrigo
Pereira67 constata em sua pesquisa que, por estar alicerçada em um viés positivista, a
história local, por muito tempo, excluiu os índios, caboclos e negros, negando-lhes a
devida colaboração na formação da cidade. O autor afirma:
informações na Revista Erechim, de julho de 1951, nos artigos de Vilson Weber 70; na
revista Perspectiva o artigo A presença negra em Erechim, de Neusa Cidade Garcez,
apresentou um apanhado sobre o negro no Rio Grande do Sul, porém, no que se refere a
cidade, a autora afirma que "tentar-se-á recompor o mosaico da história negra em
Erechim. O fio condutor será a família de Arlindo e Julia da Silva [...]" 71. Cassol
também fez algumas contribuições significativas e publicou o resultado do censo de
1950 com o número de negros no município 72. Quando feitos, os apontamentos sobre a
população negra surgem de forma reduzida e são poucas informações, nunca de maneira
detalhada. Uma das últimas obras publicadas e que pretende fazer um levantamento
histórico do município ao relatar "Os primeiros imigrantes", quando se refere aos
negros, se limita à frase "também se ressalta a contribuição do negro em nossa região,
vindo de outras áreas do Estado e do País" 73.
A Revista Erechim, como mencionamos, trouxe algumas contribuições que
apontaram para a presença negra em Erechim, ainda antes da grande imigração e
colonização da região,
O Sr. Augusto Stefanus, todos o conhecem, pois nunca saiu de nossa cidade,
chegou em 28 de outubro de 1912 indo residir em rio Negro Dourado, e aqui
ainda é alfaiate. Quando ele morava lá para os lados do Dourados, existia
uma colônia de negros, no lugar denominada Italiana e onde hoje reside a
família Coan. Quatro ou cinco famílias de negros ali tinham suas casinholas e
também foram desaparecendo, sumindo, ninguém sabe para onde.74
E ainda:
Naquela época, lá pelos anos de 1912, já moravam em nossa terra três tipos, e
com o decorrer dos anos, se tornaram populares em nossa cidade. Eram eles
tia Eva, tio Avelino e Pedro Praxedes, os quais a grande maioria dos
erechinenses ainda recorda e talvez desta maneira: Era bem preta, bem preta
era a tia Eva. E nossos olhos ainda parecem ver essa figura tão popular de
tempos atrás. Tia Eva, tia Eva todos gritavam... ela não era de brincadeira e
não gostava de troças. A negra velha nada temia e coitado daquele que lhe
assoviasse... Se caísse em suas mãos sofreria um bocado, fosse grande ou
pequeno, tia Eva então nada via... e quantas pedras ela atirou nos moleques.
Na sua pobre morada lá perto da primeira ponte do rio Dourado, a tia Eva
morava com seu marido, um francês, de origem, ou que viera da França
talvez... Tio Avelino, oh que alma boa, a alma branca em corpo negro. Algum
recado, qualquer serviço, pazes de rivais, lá estava o bom Avelino, no tempo
70
WEBER, V. O velho Erechim. Revista Erechim, julho 1951. Ano 1.
71
GARCEZ, Neusa Cidade. A presença negra em Erechim. Perspectiva, v.74, 1997. p.91.
72
CASSOL, Ernesto. Histórico Erechim. Passo Fundo: Instituto social Padre Berthier, 1979.
73
CHIAPARINI, Enori José et. al. Erechim: Retratos do Passado, Memórias no Presente. Erechim:
Graffoluz, 2012. p. 66.
74
WEBER, V. O velho Erechim. Revista Erechim, julho 1951, Ano 1, p.36.
33
do cabo Cezário até parece foi autoridade. Todos lembram como falava o tio
Avelino, que sempre dizia após cada palavra um termo esquisito, um colorido
ao seu linguajar. 75
75
WEBER, V. O velho Erechim. Revista Erechim, julho 1951, Ano 1, p.14-15.
76
GUIMARÃES, Antonio Sergio Alfredo. Racismo e antirracismo no brasil. 2. ed. rev. São Paulo:
Fundação de apoio a Universidade de São Paulo, Ed. 34, 2005, p. 67.
34
77
PEREIRA, Rodrigo Alves. A presença negra no município de Erechim: da colonização ao Esporte
Clube 13 de Maio. Erechim: URI, 2008. Monografia de conclusão de curso. p.40.
35
78
PEREIRA, Rodrigo Alves. A presença negra no município de Erechim: da colonização ao Esporte
Clube 13 de Maio. Erechim: URI, 2008. Monografia de conclusão de curso
79
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
37
considerada área central da cidade) foi realocada no bairro São Vicente de Paula,
periferia de Erechim na década de 1960.
A fotografia a seguir apresenta mulheres e crianças, moradoras da vila operária.
80
TANNO, Janete Leiko. Clubes recreativos em cidades das regiões sudeste e sul: identidade,
sociabilidade e lazer (1889-1945), UNESP – FCLAs – CEDAP, v.7, n.1, p. 328-347, jun. 2011.
81
ZAMBONATTO, Aristides Agostinho. Os Meus Erechim. Editora São Cristovão, 2000. p. 173-174.
39
82
Durante o Estado Novo de Getúlio Vargas (1937-1945) houve a Campanha de Nacionalização, onde um
conjunto de medidas visou minimizar as influências dos imigrantes que estavam no Brasil. Neste período
tornou-se obrigatório o ensino da língua portuguesa nas escolas, os estrangeiros foram proibidos de
praticar a língua materna em público, ruas e clubes tiveram seus nomes nacionalizados.
83
Essa denominação se refere ao desembarque dos pioneiros alemães da primeira leva cujo desembarque
se deu no dia 25 de Julho de 1924, nas margens do Rio dos Sinos, povoado de São Leopoldo.
40
84
CHIAPARINI, Enori José et. al. Erechim: Retratos do Passado, Memórias no Presente. Erechim:
Graffoluz, 2012. p.173.
41
85
CHIAPARINI, Enori José et. al. Erechim: Retratos do Passado, Memórias no Presente. Erechim:
Graffoluz, 2012. p.170
86
Jornal A Voz da Serra, 11 de novembro de 1938, p.3.
42
87
ZAMBONATTO, Aristides Agostinho. Os Meus Erechim. Editora São Cristovão, 2000. p.180.
88
PEREIRA, Rodrigo Alves. A presença negra no município de Erechim: da colonização ao Esporte
Clube 13 de Maio. Erechim: URI, 2008. Monografia de conclusão de curso.
89
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
43
90
REIS, João José. Identidade e diversidade étnicas nas irmandades negras no tempo da escravidão.
Tempo, Rio de Janeiro, v. 2, n. 3, p. 7-33, jun. 1997. p.10.
91
DOMINGUES, Petrônio. Uma história não contada: negro, racismo e branqueamento em São Paulo no
pós-abolição. São Paulo. Editora Senac São Paulo. 2004. p. 60
92
ROSA, J. C. Sociedades Recreativas E Associativismo Negro: Agremiações em Santa
Catarina No Pós-Abolição (1903-1950). Revista ABPN, v. 9, p. 223-248, 2017.
44
93
LONER, Beatriz Ana. Construção de classe: operários de Pelotas e Rio Grande (1888-1930). Pelotas,
RS: Universidade Federal de Pelotas. Editora Universitária: Unitrabalho, 2001. p. 266.
94
MÜLLER, Liane Susan. "As contas do meu rosário são balas de artilharia" - irmandade, jornal e
associações negras em Porto Alegre (1889-1920). 252 f. Dissertação (Mestrado em História) - Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1999.
95
CARVALHO, Andréa Aparecida de Moraes Cândido. Negros de Lages: memória e experiência de
afrodescendentes no planalto serrano. Monografia (Trabalho de conclusão de Curso em História) -
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Florianópolis, 2001. p. 61.
96
MARIA, Maria das Graças. Imagens invisíveis de Áfricas presentes: experiências das populações negras
no cotidiano da cidade de Florianópolis (1930-1940). Dissertação (Mestrado em História) - Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC). Florianópolis, 1997. p. 52.
45
97
PEREIRA, Rodrigo Alves. A presença negra no município de Erechim: da colonização ao Esporte
Clube 13 de Maio. Erechim: URI, 2008. Monografia de conclusão de curso
98
Reunião social que se realiza na parte da tarde, baile que começa e termina cedo.
99
PEREIRA, Rodrigo Alves. A presença negra no município de Erechim: da colonização ao Esporte
Clube 13 de Maio. Erechim: URI, 2008. Monografia de conclusão de curso. p.49.
46
100
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
47
Percebe-se que a discriminação racial foi uma das motivações do grupo negro
em Caxias para a formação de associações. Dessa forma, em 12 de dezembro
de 1933, algumas mulheres negras da cidade se empenham na formação de
uma associação, de um clube, o Clube das Margaridas.101
101
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) –Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p. 7.
102
Refere-se aqui a existência formal de um espaço com Estatuto, atas, registro junto a Prefeitura.
48
Mas afinal, quem eram estas pessoas que, no fim da década de quarenta, uniram-
se com o objetivo de formar um Clube para os negros de Erechim? Existem
divergências nos documentos pesquisados. O Diário da Justiça informa que:
E ainda:
103
PEREIRA, Rodrigo Alves. A presença negra no município de Erechim: da colonização ao Esporte
Clube 13 de Maio. Erechim: URI, 2008. Monografia de conclusão de curso. p.48
104
(N.E) Conhecido do grande público erexinense por Panela, foi fundador do CTG Heróis do Ibirapuitã e
do Clube Treze de Maio, além de figura atuante no carnaval de Erechim.
105
Diário da Justiça, (1949?). Acervo particular de Margarete Fátima da Silva.
106
Ibidem.
107
Ata da primeira reunião.
49
É possível que esta diferença nos nomes que compõe a diretoria aconteça devido
às datas de cada documento, sendo aceitável pensarmos em uma nova eleição. A ata da
primeira reunião estabelece uma diretoria provisória e um período de noventa dias para
nova votação em que seja eleita nova diretoria. No entanto, as pesquisas nos
documentos não fornecem o dia nem mês exato da publicação no Diário da Justiça, o
que nos impede de afirmar qual a diretoria vigente no ano de 1949.
As entrevistas de antigos sócios nos fornecem mais algumas informações sobre
estes primeiros passos da associação. Segundo Dario França foram 26 as pessoas
responsáveis pela constituição do Clube 108. Porém, oficialmente, os sócios fundadores
eram onze, todos homens e brasileiros. Percebemos, através deles, que os
frequentadores do Clube exerciam ocupações variadas, na maioria profissões autônomas
e de serviços braçais como pedreiros, carpinteiros e mecânicos. Também participavam
do Clube alguns operários e funcionários públicos, principalmente ligados à Prefeitura.
Entre os fundadores do Treze se destaca o nome de Edmundo Palhano Sobrinho.
Toda cidade possui figuras folclóricas, em Erechim, Palhano permanece na memória
dos antigos moradores como uma pessoa simples, festeira e com grande amor pelo
carnaval. Mais conhecido como “Panela” este alegretense fez parte do quadro da
Brigada Militar de Machadinho e Viadutos. Aos 30 anos mudou-se para Erechim e
passou a trabalhar como funcionário na secretaria de saúde. Além de colaborar na
formação do Treze, Panela fundou o CTG Heróis do Ibirapuitã. Sua ligação com o
grupo tradicionalista pode ter contribuído com algumas características do Clube, como
veremos.
A associação estava constituída e contava com Estatuto a ser seguido por seus
sócios. Este Estatuto era composto por três capítulos: Capítulo 1º - Do Clube e seus
afins - está dividido em 11 Artigos; Capítulo 2º - Dos sócios, suas categorias, seus
direitos e deveres, sua admissão e exclusão - também dividido em 11 Artigos; e Capítulo
3º- Da administração - Assembleia Geral- Diretoria e Conselho Consultivo- dividido em
28 Artigos109.
O primeiro endereço do Esporte Clube Treze de Maio foi a residência do casal
Silva, na Rua Porto Alegre. O segundo, no Bairro da Usina e o terceiro, e último, na
Avenida Farrapos. No dia 12 de agosto de 1965 foi lavrada a escritura de compra do
108
FRANÇA, Antônio Dario. Antônio Dario França: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora Clasen
de Paula e Aldori Nascimento da Silva. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista concedida ao
Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
109
Além dos Artigos que compõem o Estatuto mais um escrito à mão foi acrescentado posteriormente.
50
terreno onde se estabeleceu definitivamente. O lote urbano nº17 "A", localizado na Av.
Farrapos, esquina com Rua General Câmara, medindo 371,70 m², foi adquirido pelo
preço de CR$ 2.602 (dois mil seiscentos e dois cruzeiros).
Conforme assegura um dos entrevistados, o terreno para a construção da sede
definitiva foi fruto da doação de uma senhora110. Esta, ao doar o terreno, fez a exigência
de que o mesmo não fosse vendido e, se por ventura algum dia o clube viesse a fechar
as portas, o terreno seria doado a outra instituição. Segundo consta no Estatuto do
Clube, Artigo 6º: "[...] no caso de dissolução todo o montante de seus bens será
depositado em um instituto de beneficência." 111.
No entanto, ao buscarmos descobrir o nome da benfeitora do 13, verificamos ser
da prefeitura o terreno adquirido. Provavelmente, a referida senhora fez a doação do
dinheiro para a compra e não do terreno propriamente dito. E, infelizmente, seu nome
não consta na documentação nem sequer na memória dos antigos sócios.
A tão aguardada construção definitiva concretizou-se em um prédio 112 de
madeira com área de 153 m². Entre os documentos consultados há uma lista113
datilografada contendo a relação dos móveis e objetos existentes nas dependências do
Clube. Esta lista, contendo uma pequena quantidade de objetos, pode nos dar uma
noção dos elementos encontrados no espaço interno do Treze de Maio e do quanto
dispunham os sócios. Este inventário nos fornece uma ideia acerca da quantidade de
pessoas que frequentavam o Clube, não descartando a possibilidade de se conseguir
mais cadeiras e mesas emprestadas para as festas maiores.
Nos documentos disponíveis para a pesquisa não foi encontrada nem sequer uma
fotografia da frente do Clube, dispomos apenas de uma planta simples, sem muitos
detalhes da fachada.
110
O nome desta senhora não consta nas documentações do clube.
111
Estatuto Esporte Clube Treze de Maio. Capitulo 1º, Artigo 6º, p. 3.
112
Cf. anexo A.
113
Cf. anexo B.
51
114
TINEM, Nelci; BORGES, Lucia. Ginzburg e o paradigma indiciário. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE
HISTÓRIA, 22., 2003, João Pessoa. Anais do XXII Simpósio Nacional de História: História,
acontecimento e narrativa. João Pessoa: ANPUH, 2003. CD-ROM. p.5.
52
PRESIDENTE ANO
Edmundo Palhano Sobrinho 1949
Arlindo da Silva 1950
Edmundo Palhano Sobrinho 1955
Arsenio Tomas da Costa 1956
Ayr Bindé Salazar 1963
Nelson do Nascimento 1972
Arlindo da Silva 1973
Arlete da Silva 1981
Arlindo da Silva 1982
Arlindo da Silva 1992
Tabela 2 – Lista de presidentes do Clube
Embora o artigo 10º do Estatuto do Esporte Clube Treze de Maio afirme que
"Não se fará distinção de raças e nacionalidades para admissão de sócios” 116, na ata da
primeira reunião, nas primeiras linhas, fica evidente a quem estava destinado o Treze,
pois, tinha a "finalidade exclusiva de congregar o operariado de COR"117.
Constatamos, por meio das entrevistas, nos primeiros anos a existência de uma
oposição em aceitar sócios "brancos". No início da associação, somente os negros
entravam. Esta prática permaneceu durante os anos sessenta, pois, algumas pessoas da
115
(N.E) Trecho retirado do Estatuto, diz muito sobre a preocupação em apresentar-se como um clube "de
bem".
116
Estatuto Esporte Clube Treze de Maio, Capítulo 1°, Artigo 10º, p.4.
117
Ata da primeira reunião.
53
Embora conhecido na cidade como pertencendo aos negros, com registro em ata
estabelecendo que estava destinado as pessoas "de cor", em momento algum o Estatuto
do Esporte Clube Treze de Maio faz referência às restrições quanto a presença de
brancos no Clube. Para ajudar a compreender essa situação é possível fazer uma
comparação com o Clube Gaúcho. Segundo Gomes:
Em nenhum momento, em seus estatutos, existe algum artigo que diga que o
clube é de negros ou que só pode ser freqüentado por negros. A existência de
um artigo nos estatutos do clube, dizendo que esse se destinava somente aos
negros, poderia impedir sua existência. Se isso ficasse exposto, o clube
poderia ser visto como uma organização do movimento negro, por exemplo,
o que não era permitido. Sendo assim, durante os seus primeiros anos de
existência, dizer que o Clube Gaúcho era um clube de negros poderia
acarretar o seu fechamento.120
118
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
119
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) –Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História p. 70.
120
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p.113.
54
121
SILVA, Joselina. A união dos homens de cor: aspectos do movimento negro dos
anos 40 e 50. Estudos afro-brasileiros, n.2, p.215-235, 2003. p.219.
122
Estatuto do Esporte Clube Treze de Maio. Capítulo 1º, artigo 10º. p. 4.
123
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p.72.
55
124
Ibidem.
125
Estatuto do Esporte Clube Treze de Maio. Capítulo 2º, artigo 16º. p. 5.
56
Por meio do trabalho, os negros buscaram fugir da imagem pejorativa que lhes
era atribuída, procuraram valorizar o grupo. Além do trabalho, outras cobranças foram
feitas, todas com o objetivo de manter a boa imagem do Clube. Alguns entrevistados
relatam a rigidez das regras de comportamento exigidas pelos sócios,
Eles lá brincavam tudo, mas dentro dos seus limites. Eu digo assim porque a
mãe sempre disse que quem não tinha um comportamento adequado né, o
adequado era beber, era sei lá enfim, tu olhar para o vizinho do lado, essas
coisas assim. Não ter um comportamento moral, dentro do clube, adequado,
era convidado a se retirar de dentro do clube. 129
Esta prática foi comum em outros clubes negros. Em Pelotas, o clube Fica Aí Pra
Ir Dizendo seguia um estatuto severo quanto às normas de conduta. Beatriz Loner
afirma que em relação às normas de conduta o clube pelotense:
126
SANTOS, Fernanda Pomorski dos. Esporte Clube Treze De Maio: O Associativismo Negro Em
Erechim. 2014. TCC (Graduação) - Curso de História, Universidade Federal da Fronteira Sul, Erechim,
2014.
127
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p.114
128
MAGALHÃES, Magna Lima. Entre a preteza e a brancura brilha o Cruzeiro do Sul: associativismo e
identidade negra em uma localidade teutobrasileira (Novo Hamburgo/RS) 2010. 219 f. Tese (Doutorado
em História) – Unisinos, São Leopoldo-RS p.145.
129
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
57
conta com uma estrita vigilância por parte da diretoria sobre a moral e o
comportamento de seus membros, especialmente sobre o sexo feminino,
mantendo uma acesa e feroz discriminação contra aqueles que não aceitavam
suas imposições de moral e de costumes. Sua influência ia muito além do
estreito espaço de sua sede, imiscuindo-se na vida privada de seus sócios,
ditando regras e comportamentos a serem seguidos em todas as
circunstâncias da vida, inclusive em termos de amizades e companhias a
serem evitadas. 130
No Artigo 19º do Estatuto do Treze fica evidente a preocupação com quem tinha
a intenção de se tornar sócio. Este "candidato" precisava ter mais de 15 anos e
apresentar sua proposta à diretoria por intermédio de um sócio. Desta forma, uma rede
de confiança era estabelecida desde o início; ao apresentar um aspirante o sócio atestava
a boa conduta e, de certa maneira, se tornava responsável por ele. Na proposta
apresentada constava nome e sobrenome, profissão, nacionalidade, residência e estado
civil. A indicação era analisada pela diretoria e, se aceita, comunicada ao candidato. 131
Na documentação disponível para pesquisa foi possível encontrar uma lista com
os nomes dos "futuros sócios" do Clube. Esta lista, datilografada, é composta por 35
nomes, sendo dois deles policiais militares (os únicos que têm a profissão ao lado do
nome).
O cuidado com a escolha dos sócios também esteve presente em outros clubes
negros do Rio Grande do Sul. Ao analisar o clube Gaúcho, Gomes afirma:
130
LONER, Beatriz Ana. Classe, etnia e moralidade: estudo de clubes negros. In: SIMPÓSIO
NACIONAL DE HISTÓRIA, 23., 2005, Londrina. Anais do XXIII Simpósio Nacional de História –
História: guerra e paz. Londrina: ANPUH, 2005. CD-ROM. p.4.
131
Estatuto do Esporte Clube Treze de Maio. Capítulo 2º, artigo 19º. p. 6
132
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p. 114
58
do prazo máximo de vinte dias contado da data da comunicação, desde que apresente a
diretoria um requerimento subscrito por vinte sócios, no mínimo, inclusive o
eliminado."133 Desta forma, ao abrir a possibilidade de apelação por parte do sócio, este
precisava contar com o apoio de parte dos associados, uma vez que estabelecia um
mínimo de 20 sócios respaldando seu retorno.
Um exemplo de caso que resultou em expulsão é relatado na Ata de uma das
reuniões da Ala Feminina do dia 20 de setembro de 1961. Veremos esse caso com mais
detalhes no capítulo seguinte.
Por meio dos bailes e do futebol, como veremos, o clube ganhou maior espaço
no jornal local e tolerância por parte da população da cidade. O cuidado com as
vestimentas, com o comportamento dos rapazes e, sobretudo, das moças, trouxeram
para os sócios do clube uma nova imagem, diferente daquela estereotipada atribuída
pela segregação e racismo local.
133
Estatuto do Esporte Clube Treze de Maio. Capítulo 2º, artigo 21º. p. 6.
59
136
Os entrevistados afirmam que as festas realizadas no clube eram famosas na cidade.
137
SANTOS, Fernanda Pomorski dos. Esporte Clube Treze De Maio: O Associativismo Negro Em
Erechim. 2014. TCC (Graduação) - Curso de História, Universidade Federal da Fronteira Sul, Erechim,
2014.
138
SEDE para o 13 de Maio. Jornal A voz da Serra, Erechim, p. 2, 13 de jan 1955.
139
Jornal A Voz da Serra, 13 de janeiro de 1955, nº 43 p.2
61
aos olhos da comunidade e aumentar sua rede de relações. Estevam Carraro140, José
Mandelli Filho 141, Ângelo Emilio Grando, João A. Franklin da Silva, Fausto
Demoliner 142, Benevenuto Faccin, Euclides Tramontini143, Santos S. dos Santos e
Salvador Donida passaram a ser considerados sócios beneméritos da entidade 144.
Esta situação também é verificada no clube Gaúcho de Caxias do Sul. Gomes
afirma que "os integrantes do clube conseguiram aumentar sua rede de relações. Esse
relacionamento com os políticos locais propiciou um aumento no status do grupo, que
em diversas ocasiões assumiu as negociações com esses políticos."145 Ao aproximar-se
de políticos, jornalistas, radialistas, comerciários e industriários, o Clube e seus
dirigentes aumentaram o seu prestígio e conseguiram um pouco de visibilidade na
sociedade.
Os dirigentes do Clube também tentaram auxílio com o governo do Estado,
durante a administração de Ernesto Dornelles146. Em 1955, após solicitar auxílio
financeiro, a secretaria do clube recebeu uma correspondência de Leonel Brizzola, então
Secretário das obras públicas, informando credito de Cr$ 30.000,00 (trinta mil
cruzeiros) da verba do plano de obras.147 No entanto, o dinheiro não chegou e, com a
troca de governo, outra correspondência foi enviada, desta vez direcionada a Estevam
Carraro, do jornal A Voz da Serra. O telegrama acabou com as esperanças da diretoria
do Clube Treze de Maio.
Adail Morais, Secretário do Governo, pediu a Estevam o favor de informar ao
presidente do Treze a negativa do Tribunal de Contas em relação ao auxilio prometido
ao clube148. Edmundo Palhano Sobrinho demonstrou grande descontentamento pela
"demagogia manifesta no governo trabalhista" e deu "graças aos céus" por este ter
acabado149.
A notícia da quebra da promessa ganhou destaque no exemplar de 21 de abril de
1955, saindo na primeira página da edição. A ênfase pode ser entendida uma vez que,
como referiu o próprio jornal, Estevam Carraro, seu proprietário, era sócio benemérito
140
Proprietário do jornal A Voz da Serra.
141
Tabelião e Prefeito eleito de Erechim entre 1960-1963.
142
Industrial de Erechim.
143
Radialista na Rádio Erechim.
144
Jornal A Voz da Serra, 29 de março de 1955, nº 88, p.4
145
GOMES p.137
146
Ernesto Dornelles foi Interventor Federal no Rio Grande do sul entre os anos de 1943-1945;
Governado- pelo PTB- eleito em Sufrágio Universal entre 1951- 1955.
147
Jornal A Voz da Serra, 21 de abril de 1955, nº 100 p.1
148
Jornal A Voz da Serra, 21 de abril de 1955, nº 100, p.1
149
Jornal A Voz da Serra, 21 de abril de 1955, nº 100, p.1
62
do Clube. O que nos ajuda a entender o espaço concedido ao Clube nas páginas do
Jornal. A matéria gerou grande repercussão, podemos entender este espaço de destaque
através do viés político. É possível pensá-la como um ataque direto, no qual jornal e
governo assumem posições político/partidárias opostas e, desta maneira, a primeira
página tem a intenção de atingir o governo, mesmo que chegando apenas ao eleitorado
local.
Sem desistir de seus objetivos, Panela continuou com suas investidas fazendo
campanhas no jornal e recordando a quebra da promessa de auxilio por parte do
governo. Atirou-se de corpo e alma na busca por parcerias e donativos.
Desta vez, apelou ao "bom povo erechinense". Solicitou a colaboração com o
que fosse possível para que a sede se concretizasse. O Presidente do Clube apontou os
sócios trabalhadores humildes, sem recursos financeiros, para erguer o local "onde farão
seu ambiente social". Afinal, "os homens responsáveis por erguer o país" merecem a
ajuda das "classes abastadas” 150. Percebemos a intenção de mostrar os sócios do Clube
como homens de valor, "trabalhadores que constroem a grandeza do país". O presidente
do Clube procurou positivar a imagem dos sócios através dos adjetivos utilizados.
Após intensa campanha para arrecadar fundos e algumas frustrações, finalmente
o clube consegue o dinheiro necessário e, no dia 13 de maio de 1956, inaugurou sua
nova sede. A solenidade contou com a presença de autoridades políticas e militares.
Edmundo Palhano, um dos grandes responsáveis por elevar a associação, deixou a
presidência no mesmo dia, lamentando ser, por muitos, incompreendido.151
Nas notícias divulgadas no jornal entre os anos de 1955 e 1956, relacionadas a
construção da sede do clube, é possível perceber o quão árdua foi esta etapa, e quais
elementos foram acionados para dar destaque à importância da sede a seus associados e
à comunidade em geral. Em quase todos os textos pode-se notar a tentativa de
evidenciar o trabalho, mostrando os sócios como fazendo parte do operariado humilde
da cidade. Esta valorização do trabalhador se faz presente em trechos como: " o clube
operário por excelência"152, "o 13 de Maio é uma entidade essencialmente operária [...].
Os operários são heróis anônimos" 153. Fazendo a relação entre o sócio do Clube e o
trabalhador humilde que impulsiona o país, Edmundo Palhano Sobrinho procurou
positivar a imagem das pessoas ligadas ao Clube perante os leitores do jornal.
150
Jornal A Voz da Serra, 24 de junho de 1955, nº 137, p.1
151
Jornal A Voz da Serra, 18 de abril de 1956, nº 115, p.4
152
Jornal A Voz da Serra, 21 de abril de 1955, nº 100, p.1
153
Jornal A Voz da Serra, 24 de junho de 1955, nº 137, p.4
63
2.2 O futebol
154
SANSONE, Livio. Negritude sem etnicidade: o local e o global nas relações raciais na produção
cultural negra do Brasil. Salvador: Edufba; Pallas. 2004.
155
SANSONE, Livio. Negritude sem etnicidade: o local e o global nas relações raciais na produção
cultural negra do Brasil. Salvador: Edufba; Pallas. 2004. p.80.
156
WESCHENFELDER, Viviane Inês. Processo de (in) visibilidade do sujeito negro: o jornal de
Venâncio Aires /RS em questão. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2015.
64
157
MACKEDANZ, Christian Ferreira. Racismo “nas quatro linhas”: os negros e as ligas de futebol em
Pelotas (1901-1930). 2016. 140 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de História, Instituto de Ciências
Humanas, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2016. p.91
158
Estatuto do Esporte Clube Treze de Maio. Capítulo 1º, artigo 2º. p. 3.
65
Figura 10 - Time de futebol do Treze da esq. p/ dir.: podemos identificar o presidente do clube, Sr.
Arlindo da Silva e ao seu lado, o Sr. João Maria Alves Pereira. Ano: 1952/1953.
Fonte: Arquivo Histórico Juarez Miguel Illa Font.
159
Não há exemplares do jornal referentes aos anos de 1949 e 1950 no acervo do Arquivo Municipal
Juarez Miguel Illa Font.
160
NOVA partida entre brancos e morenos domingo na baixada. Jornal A Voz Da Serra, Erechim, p. 4, 10
ago 1951.
66
161
SANSONE, Livio. Negritude sem etnicidade: o local e o global nas relações raciais na produção
cultural negra do Brasil. Salvador: Edufba; Pallas. 2004. p 60.
162
WESCHENFELDER, Viviane Inês. Processo de (in)visibilidade do sujeito negro: o jornal de
Venâncio Aires /RS em questão. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2015. p.117.
163
BRANCOS e morenos voltarão a cotejar na baixada. Jornal A Voz da Serra, Erechim, p. 6, 12 ago
1951.
67
jogaram: Miguel, Ivo Roschetti e Celso; Bino, Borgese Dirceu; Carlinhos, Alexandre,
Fossati, Marimba e Cirinho. Já os morenos entraram em campo com: Valdemar,
Gonzales e Francisco; Nazareno, Ribeiro e Rico; Francisco Toinho, Quinzinho, Chinês e
Peruca.164
O time de futebol do Esporte Clube Treze de Maio teve sua primeira aparição
nos exemplares disponíveis para consulta com a notícia: "União Erechim, Jacinto
Godoy, Botafogo e 13 de Maio, os vencedores da primeira rodada do varzeano." 165 A
notícia fez um apanhado geral do resultado dos jogos da primeira rodada, divulgando a
escalação de cada time e também o resultado de cada partida. Na ocasião, o Esporte
Clube Treze de Maio venceu o Brasil por 2x0. O próximo apontamento referente ao
166
Clube, "O 13 de Maio passou a liderar sozinho o campeonato varzeano” . Com uma
nota relativamente grande, a notícia divulgou o placar dos jogos da segunda rodada do
campeonato varzeano local, além da escalação dos times. Nestapartida o Treze de Maio
venceu o Flamengo, de Capo-Êre, pelo placar de 3x0, dois gols de Nenê e um de
Cassol.
164
Os brancos triunfaram na partida revanche. Jornal A Voz da Serra, Erechim, p. 4, 14 ago 1951.
165
UNIÃO Erechim, Jacinto Godoy, Botafogo e Treze de Maio, os vencedores da primeira rodada do
varzeano. Jornal A Voz da Serra, Erechim, p. 4, 18 set 1951.
166
O 13 passou a liderar sozinho o campeonato varzeano. Jornal A Voz da Serra, Erechim, p. 4, 25 set
1951.
68
A partir das fichas do Treze de Maio da Liga erechinense de futebol varzeano 167,
pudemos verificar a nacionalidade declarada, idade média dos jogadores e, também,
parte do quadro de profissões seguidas pelos associados, ma maioria operários,
mecânicos ou pedreiros. Foi interessante verificar que um dos jogadores se declarou
alemão, e desta maneira percebemos que o time do Treze não era composto apenas por
atletas negros e mulatos.
A ficha a seguir pertencia a Aristides de Almeida, na época com 22 anos.
167
No total foram analisadas 15 fichas disponíveis no acervo de Margarete Fatima da Silva.
168
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p.144.
69
por outras entidades. Eram oportunidades para o convívio com os outros, fora do espaço
físico do clube".
O time representou uma das formas empregadas para buscar interação com os
demais. Foi uma das atividades que auxiliaram na visibilidade do negro e na construção
de sua identidade étnica. Os esportistas participaram de campeonatos organizados pelo
próprio clube e por outros. Era uma oportunidade de convívio com variadas pessoas
fora do espaço físico do clube.
Se o futebol em alguns momentos reproduziu, no campeonato de várzea, o
contexto racista enfrentado por negros e/ou “não brancos” da cidade diariamente, por
outro lado, através do mesmo, a comunidade “de cor” erechinense experimentou um
espaço de sociabilidade e organização que contribuiu não somente para o lazer, mas
proporcionou contato com outros espaços de convivência.
Na foto a seguir, vemos a equipe secundaria de futebol do Treze, ou segundinha,
como era chamada:
grande parte da documentação do Treze de Maio, até mesmo atas, não possui o registro
da data, dificultando estabelecermos uma ordem cronológica. Podemos atribuir este
inconveniente à falta de hábito em registrar os fatos por escritos, devido à grande parte
dos associados, entre eles o senhor Arlindo da Silva, ser iletrado. No entanto, existem
vários convites para partidas de futebol em outras localidades, assim como pedidos de
doações dirigidos a empresários locais para a manutenção do time.
O time de futebol tornou-se mais um espaço de reivindicações por meio do qual
divulgaram a associação e suas necessidades. O esporte possibilitou as primeiras
aparições nos jornais, trazendo visibilidade positiva às “pessoas de cor”.
169
FRANÇA, Antônio Dario. Antônio Dario França: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora Clasen
de Paula e Aldori Nascimento da Silva. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista concedida ao
Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
71
fará um convite para o clube Visconde do Rio Branco, de Passo Fundo 170. O texto não
informou para qual evento destinava-se o convite e nem mesmo foi possível confirmar
se foi aceito ou não. Os contatos com outros clubes da região não aparecem nas
entrevistas e quando questionados sobre a relação com outras associações, os
entrevistados disseram não saber ou, simplesmente, que estes laços não existiam,
indicando que o Clube tinha pouco relacionamento com as demais associações
existentes. O importante aqui é perceber que, embora a memória dos entrevistados até o
momento não refira, e supondo que houvesse pouco contato com outros clubes, não
significa que os contatos com outras associações fora da sede não existissem ou mesmo
não tivessem sido tentadas pelos dirigentes do Treze de Maio.
O Clube é destacado pelos entrevistados pela beleza de suas festas,
demonstrando um investimento nos trajes por parte dos associados. As fotografias dos
bailes realizados corroboram com a preocupação da boa aparência, pois todos
compareciam muito bem vestidos. Segundo depoente, o "Treze foi um clube assim, de
gabarito!"171. A elegância dos sócios em dias de bailes é recorrente nos clubes negros,
Magalhães afirma que:
170
O clube Visconde do Rio Branco, fundado em 1916, na cidade de Passo Fundo, destinava-se a parte da
população negra da cidade, no ano de 1973 o Visconde entrou no concurso "Miss Passo Fundo" e elegeu
a primeira miss negra da cidade. http://www.projetopassofundo.com.br 30/09/2014.
171
FRANÇA, Antônio Dario. Antônio Dario França: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora Clasen
de Paula e Aldori Nascimento da Silva. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista concedida ao
Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
172
MAGALHÃES, Magna Lima. Entre a preteza e a brancura brilha o Cruzeiro do Sul: associativismo e
identidade negra em uma localidade teutobrasileira (Novo Hamburgo/RS) 2010. 219 f. Tese (Doutorado
em História) – Unisinos, São Leopoldo-RS. p. 137
173
MAGALHÃES, Magna Lima. Entre a preteza e a brancura brilha o Cruzeiro do Sul: associativismo e
identidade negra em uma localidade teutobrasileira (Novo Hamburgo/RS) 2010. 219 f. Tese (Doutorado
em História) – Unisinos, São Leopoldo-RS
72
176
Como o Arquivo Municipal Juarez Miguel IllaFont não dispõe dos exemplares do ano de 1950 não foi
possível verificar se o aniversário de um ano de fundação do Clube foi noticiado na imprensa escrita.
177
FESTEJADO o segundo aniversário do E. C. 13 de Maio. Jornal A Voz da Serra, Erechim, p. 4, 20 dez
1951.
178
BAILE de gala no E. C. 13 de Maio. Jornal A Voz da Serra, Erechim, p. 4, 10 dez 1952.
74
179
ENCERRADO o ano de 1953 com esplêndidas noitadas dançantes. Jornal A Voz da Serra, Erechim,
p.4, 3jan 1954.
180
O título de Presidente de Honra é concedido a uma pessoa de destaque na sociedade e tem o objetivo
de valorizar o Clube e aproximá-lo de pessoas importantes. O mesmo acontece com outros clubes ao
analisar o clube Gaúcho. Gomes afirma que "o clube terá entre os membros da diretoria a figura simbólica
do Presidente de Honra, [...] será um “título” concedido a pessoas importantes da cidade com o objetivo
de aproximá-las, para estabelecer algum tipo de vínculo com essas pessoas. (GOMES, 2008, p.134)
181
ANIMADO baile promoveu o E. C. 13 de Maio. Jornal A Voz da Serra, Erechim, p. 4, 24 de maio
1954.
76
Figura 16 - Coroação da rainha da primavera. À direita o presidente do Clube Arlindo da Silva, ao seu
lado a rainha Lourdes Therezinha de Oliveira.
Fonte: Arquivo Histórico Juarez Illa Font.
O Clube realizava diversas festas todos os anos, além das habituais matinês. Os
bailes de Gala davam espaço aos mais diversos festejos. "A mãe comentava, e os meus
irmãos também que as festas eram muito envolventes, [...], por exemplo, todas elas
envolviam um tema"182.Sendo assim, além dos tradicionais Aniversários do Clube e do
baile de escolha da Rainha da Primavera, havia, também,festa junina, carnaval, baile em
comemoração ao 13 de maio e a Festa da Linguiça.
As festas, todas animadas por bandas, tornaram-se famosas pela boa música que
é recordada com carinho por seus mais antigos frequentadores. Os músicos contratados
para as matinês ou bailes tocavam por aproximadamente 4 horas. Durante os primeiros
anos da década de 1970, o grupo Os Corsários animou as festas do Treze. Outras
bandas também se apresentaram na associação, entre elas The King Boys e Os Águias. O
grupo The King Boys, conjunto que acompanhava o coral do Colégio Medianeira,
formado por Rui Morcellino contrabaixo, Sérgio Monli na guitarra base, Luci Vanderlei
182
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
78
Dondé na guitarra solo, além de Paulo Souza na bateria, com influência musical vinda
de gêneros como o tango, bolero, maxixe, samba e choro. Pedro Souza tocou também
no Jazz Típica Ideal e no Grupo Os Águias Negras (em bailes de carnaval).
Na imagem a seguir vemos um grupo musical no interior do Treze. A foto não
apresenta nem uma legenda indicando quem são os músicos ou o nome do grupo, assim
como a grande maioria das fotografias disponíveis para pesquisa. Margarete Fátima da
Silva (que disponibilizou a foto) desconhece a origem da foto e seus componentes,
sendo assim não pode fornecer mais informações acerca do grupo.
carnaval no salão do Clube, durante as matinês infantis. O carnaval de rua, puxado pelo
Clube Treze de Maio, foi atribuído principalmente a Edmundo Palhano Sobrinho
(Panela). Segundo entrevistados, ele foi o grande responsável pela organização do
carnaval de rua em Erechim:
Tanto é que o clube ele é que puxou o carnaval de rua, o carnaval de rua
quem começou, iniciou o carnaval de rua aqui em Erechim foi o clube Treze
de Maio, aonde frequentava o... como é que é o nome dele que eu não
lembro... aí tinha um apelido. Panela. Ele que frequentava o clube e ele era
um dos membros do clube Treze de Maio e ele que incentivou o carnaval de
rua aqui em Erechim.184
184
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores:
Débora Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
80
de carnaval. Garcez185 afirma que existia uma união entre os clubes nesta época do ano,
quando os sócios desfilavam nas ruas indo de clube em clube onde eram bem recebidos,
festejados e homenageados186. No entanto, a pesquisa não corrobora esta afirmativa e os
entrevistados foram unânimes ao negar a participação coletiva dos clubes no carnaval de
rua, assim como as visitas supostamente feitas entre eles. As confraternizações ocorriam
das portas dos clubes para fora.
A Festa Caipira também era uma tradição do Clube e reunia os sócios que,
tipicamente caracterizados, participavam de brincadeiras e do casamento caipira. Havia
também o cuidado em decorar o salão com palhas e bambus. A festa da linguiça,
retratada na imagem a seguir, do mesmo modo, mobilizava os associados que
esmeravam nos ornamentos e trajes característicos.
185
GARCEZ, Neusa Cidade. A presença negra em Erechim. Perspectiva, v.74, p. 90, 1997.
186
GARCEZ, Neusa Cidade. A presença negra em Erechim. Perspectiva, v.74, p. 91, 1997.
81
Figura 20- Baile no Treze de Maio. Dançando Nelcido Nascimento e o prefeito Carlos Irineo Pietá; à
esquerda Machado.
Fonte: Arquivo Histórico Juarez Illa Font
A participação das mulheres nas associações negras é expressiva. Loner 187 traz
significativa contribuição para compreendermos seu papel nas associações ao destacar
as ações desempenhadas por elas. O espaço ocupado por estas senhoras difere muito das
mulheres brancas, que não exerciam nenhuma, ou quase nenhuma função na estrutura
associativa de seus clubes. Comparando com outras etnias, as negras ocupavam lugar de
maior destaque dentro de seu grupo étnico.
A administrações dos clubes, no entanto, ficava a cargo dos homens, costume
comum nas décadas de 1950 e 1960. Durante este período o homem ainda era visto
como provedor do lar e cabia à mulher os trabalhos subsidiários. O homem era o "chefe
da família". Competia à mulher o cuidado com a casa, os filhos e os maridos, o modelo
de lar do pós guerra influenciou, também, as brasileira, que foram incentivadas, através
das propagandas, a voltarem para dentro de seus lares. Delas também era cobrado
instinto materno, pureza, candura, paciência, características que, lhes eram entendidas
como intrínsecas. Entretanto, as mulheres negras, acostumadas às dificuldades da vida,
deixavam de lado, por exigência do dia a dia, a imagem de esposa submissa, passiva e
dedicada exclusivamente ao lar. Sua maior preocupação era obter meio de conseguir seu
sustento e não tornar-se dependente economicamente de seu parceiro. Estas nuances
interpuseram obstáculos na mobilidade social destes sujeitos. As mulheres conseguiam
espaço no mercado de trabalho atuando como lavadeiras, passadeiras, quituteiras,
empregadas domésticas. Ao contrário dos homens negros, que não conseguiam
colocação no mercado de trabalho, as mulheres negras arranjavam ocupações
constantes, colocando os homens em estado de dependência, devido à impossibilidade
de emprego durável.188
Ao trabalharmos com as mulheres negras integrantes do Treze de Maio,
percebemos os mesmos aspectos apontados por Loner, Magalhães e Schemes. Fica
evidente o papel de articuladoras entre brancos e negros, circulando entre os dois
mundos por meio das atividades de empregada doméstica ou mesmo lavadeiras;
entravam em contato com espaços distintos, criavam vínculos que favoreciam certa
ascensão social. Quebraram estereótipos ao serem vistas como mulheres trabalhadoras,
187
LONER, Beatriz Ana. Construção de classe: operários de Pelotas e Rio Grande (1888-1930). Pelotas,
RS: Universidade Federal de Pelotas. Editora Universitária: Unitrabalho, 2001.
188
Magalhães e Claudia Schemes
83
189
ANDREWS, George Reid. Negros e brancos em São Paulo (1888-1988). Tradução Magda Lopes.
Bauru, São Paulo: EDUSC, 1998.
84
Sempre tinha muitas candidatas, por isso que eu digo assim que essa coisa
esvaziou com o tempo. Muitas candidatas, muitas pretendentes ao trono, né.
Olha que interessante, tinha.[...] Chegava naquela época ali todas as famílias
tinham bastante filhos, chegavam naquela época ali era o comentário
(risos)de quem para seria a rainha do clube.190
Durante algumas épocas o clube ficou longos períodos longe das páginas do
jornal e, algumas vezes, uma matéria era publicada meses após o ocorrido, como o caso
do baile da escolha da rainha. Embora tenha ocorrido no dia 18 de outubro de 1952, a
190
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
85
notícia só ganhou as páginas do jornal quase dois meses depois, no dia 07 de dezembro.
Localizada na segunda página, a nota destacou o "grandioso baile" promovido pela
diretoria do Clube, "que não poupou esforços para proporcionar a seus associados uma
noite especial"191. A coroação da senhorita Lourdes de Oliveira contou com trono
cuidadosamente ornamentado.192 Esta foi a única notícia referente ao Clube Treze de
Maio encontrada no jornal, que se faz acompanhada de uma fotografia.
O ano de 1961 pode ser tomado como referência para compreendermos como se
dava o processo de escolha da titulada. Neste ano foram apresentadas três candidatas a
191
CONCURSO rainha da Primavera. Jornal A voz da Serra, Erechim, p. 2, 07 dez 1952.
192
CONCURSO rainha da Primavera. Jornal A voz da Serra, Erechim, p. 2, 07 dez 1952.
86
Foi dada a reunião a fim de ser feita a primeira apuração que ficou tendo o
seguinte resultado:
Berenice Ribeiro em primeiro lugar com 577 votos;
2º lugar Mariza Rodrigues;
3º lugar Eloy dos Santos com 150 votos. 193
A segunda apuração trazia Berenice com 135 votos, Eloy com 615 votos e os
votos de Mariza não apareceram, possivelmente significando nenhum voto194. O
resultado da apuração dos votos para a escolha da Rainha da Primavera de 1961 foi o
seguinte:
O número de votos obtidos pelas candidatas soma mais de 1.500, o que indica
grande participação da comunidade na escolha da Rainha. Não foi permitido verificar,
pois se estes votos eram vendidos, como ocorria em outros clubes. As atas são pobres
em detalhes e muitas vezes não constam nem sequer as datas das reuniões.
Mas, além dos votos, havia outros critérios para a escolha desta moça que
representaria o Clube? Mesmo que as visitações a outras associações acontecessem
esporadicamente - como é o mais provável – uma vez que a única menção sobre uma
visita foi quando o Jornal A Voz da Serra noticiou que: "O Centro de Tradições Heróis
Ibirapuitã prestará sábado próximo, uma significativa homenagem a gentil senhorita
Jane Silva, Rainha do E. C. 13 de Maio, a exma. Sra. Theodora da Silva, ex-presidente
da Ala Moça daquela sociedade."196 Assim, ela representava as mulheres da associação.
Desta maneira esperava-se que seu comportamento fosse exemplar. Um relato mais
detalhado sobre as obrigações de uma rainha de clube é fornecido por Gomes quando
apresenta as funções da rainha do clube Gaúcho:
Ao se tornar Rainha do Clube Gaúcho, a senhorita passava a representá- lo.
Dessa forma, a vencedora deveria ser possuidora de beleza, sim, mas também
de uma série de outras características valorizadas pelo grupo dirigente.
193
Livro Ata da Ala Feminina. 1961, p.18
194
Livro Ata da Ala Feminina, dia 16 de setembro de 1961 p. 21
195
Livros Ata da Ala Feminina p. 25
196
Jornal A Voz da Serra, 23 de janeiro de 1958, p.4
87
197
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) –Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p.132.
198
Uso "raça" conforme conceito defendido por Guimarães quando afirma a “Necessidade de teorizar as
“raças” como elas são, ou seja, construtos sociais, formas de identidade baseadas numa ideia biológica
errônea, mas socialmente eficaz para construir, manter e reproduzir diferenças e privilégios”
(GUIMARÃES, 2002, p.67). O que ajuda a compreender a construção do clube articulada ao contexto da
cidade, e também a relação entre o “eu” e o “outro”.
88
199
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores:
Débora Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
89
Porém, não apenas por meio da beleza a mulher negra deveria se destacar. Dela,
também, se esperava um comportamento exemplar. Podemos pensar o cuidado com a
conduta das moças, sobretudo as candidatas à rainha, como uma maneira encontrada
pelos dirigentes do clube e ala feminina, de protegê-las. Certamente não desejavam
passar uma representação errônea, o cuidado em apresentar harmonia entre a beleza e
moral pode ser entendido como uma tentativa de desvincular da mulher negra a visão
extremamente sexualizada. As moças que, por algum motivo, tivessem atitudes
consideradas inadequadas eram punidas e, às vezes, expulsas do Clube.
No dia 20 de setembro de 1961 as mulheres pertencentes a Ala Feminina do
Treze reuniram-se para tratar de um baile e também da notificação dada a uma das
sócias por mau comportamento, mas sem entrar em detalhes sobre o acontecido. Está
registrada em ata a repreensão de uma moça "por ter se comportado mal na sociedade na
última soirée realizada neste clube". 200 No dia 21 de outubro, um mês após a
notificação, em nova reunião, foi feita uma votação para decidir se esta sócia
continuaria ou não frequentando o Clube. A decisão foi pelo cancelamento de sua
200
Livro Ata do Esporte Cube Treze de Maio, 1961, p. 22. Acervo pessoal de Margarete Fátima Silva.
90
entrada, sendo 12 votos a favor e nenhum contrário. 201 A expulsão de sócios devido a
comportamento julgado inadequado também é relatada em uma das entrevistas,
E teve casos que foram expulsos do clube Treze de Maio, teve casos. Eu
lembro relatos da mãe, do meu avô e coisa e tal que teve casos que eles
expulsaram pessoas devido ao comportamento moral dentro do clube Treze
de Maio. O que é moral? É beber demais, é não ter atitudes adequadas em
relação a outros jovens que estavam ali, é não se vestir corretamente para o
evento, nossa era uma coisa assim... E esses maus comportamentos, querer
briga, essas coisas que gerariam um fato, um fato diferente para o clube. E
teve casos que eles disseram que tiveram que expulsar do clube. 202
Esta é mais uma das características do Clube Treze de Maio, que o coloca em
sintonia com o clube Gaúcho de Caxias, uma vez que lá também o autor encontrou
casos de expulsão de sócios. No episódio do clube Gaúcho a expulsão significava
também o afastamento completo da sociedade. As demais pessoas eram incentivadas a
cortar relações com o "excluído" para que não houvesse a menor possibilidade de
ligação entre os sócios do clube e as pessoas consideradas inadequadas para continuar
na associação. Assim, quando algum associado era expulso por mau comportamento,
acabavam as suas relações com o clube e com os seus sócios. Havia uma tentativa de
desvincular, completamente, o “desordeiro” do clube “203.
Esta situação pode ser pensada para o Treze de Maio, porém, a escassez de
fontes não permite uma análise mais detalhada a respeito das práticas dos sócios. A
hipótese de que uma pessoa expulsa era totalmente afastada do grupo é plausível.
Afinal, alguém que é considerado inadequado para frequentar o Clube provavelmente
também seria considerado inadequado para frequentar as residências familiares. Sendo
assim, afastado por completo.
A preocupação evidenciada pela ata da ala feminina, pelos artigos do estatuto e
pelos relatos dos entrevistados em relação ao bom comportamento dos seus sócios,
principalmente o comportamento feminino, revelam a importância da imagem passada
pelos integrantes do Clube à cidade de Erechim. Desta forma, os sócios procuravam
201
Livro Ata do Esporte Cube Treze de Maio, 1961, p. 26. Acervo pessoal de Margarete Fátima Silva
202
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores:
Débora Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
203
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p.115.
91
O Clube ele tinha um padrão moral [...]. Claro que para os padrões da época,
[...] era muito importante isso, até porque eles, uma coisa que sempre se
falava que além de eles terem um clube, eles tinham que preservar uma
imagem, por eles serem negros né. Que qual é o dito?[...] como é que eles
diziam sempre, meu avô e minha avó, eles sempre estavam com aquela coisa
de, a se o negro não faz na entrada faz na saída. Isso quer dizer o quê? Que se
eles não se portassem, não tivessem essas atitudes ou fecharia o clube, ou os
vizinhos do lado iam telefonar para a polícia, enfim. Então eles tinham que
manter uma regra dentro do clube e estabelecer isso como um limite, para
que o clube funcionasse e fosse realmente respeitado dentro da sociedade
erechinense.205
204
(N.E) Os critérios impostos pela associação refletem um esforço para afastar a sociedade e seus
associados dos estereótipos atribuídos aos negros, como ser embriaguez, preguiça e desordem.
205
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
206
NASCIMENTO, Nelson do. Nelson do Nascimento: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
207
Ibidem.
92
elas fossem ao clube. [...] Mulheres chegando sozinhas ao clube para bailes à
noite poderiam levantar suspeitas sobre sua conduta moral. [...] A presença
do pai, da mãe, ou de algum outro familiar informava sobre a boa conduta
das jovens. [...] Essa preocupação pode ser entendida também, como uma
vontade de manter o clube como um espaço de divertimento familiar.208
O movimento das mulheres sempre fazia qual parte? A parte das panelas né
(risos). Era parte desse movimento, que vendia as coisas no bar, elas faziam
essas coisas de quem sabia fazer o bolo melhor, tinha a rifa dos bolos, tinha
essas coisas que envolviam a sociedade para arrecadar um pouquinho mais de
208
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p.122
209
Ibidem, p.118
210
FRANÇA, Antônio Dario. Antônio Dario França: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora Clasen
de Paula e Aldori Nascimento da Silva. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista concedida ao
Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
211
Reunião social que ocorre a noite.
93
No Clube Gaúcho elas pertenciam a Ala Feminina [...] essa Ala, também, foi
responsável pela organização de muitos dos eventos realizados pelo clube.
Além disso, foram convocadas para prestar auxílio de outras maneiras, por
determinação do presidente Florêncio Machado, as moças deviam “visitar o
comércio e a indústria locais para arrumar fundos”. Foram, ainda, designadas
para fazer a limpeza do salão após as festividades. Mas, sua principal
atividade durante esses anos, foi, sem dúvida, a organização dos eventos da
associação. Para isso, eram acionadas em diversos momentos, mas,
principalmente, quando o clube passava por dificuldades financeiras.213
212
SILVA, Margarete Fátima da. Margarete Fátima da Silva: depoimento [2014]. Entrevistadores: Débora
Clasen de Paula e Fernanda Pomorski dos Santos. Erechim: UFFS, 2014. 1 CD sonoro. Entrevista
concedida ao Projeto A presença negra em Erechim (1908-1960).
213
GOMES, Fabrício Romani. Sob a proteção da princesa e de São Benedito: identidade étnica,
associativismo e projetos num clube negro de Caxias do Sul (1934 -1988). 2008. 219 f. Dissertação
(Mestrado) –Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História. p. 87-85
214
MAGALHÃES, Magna Lima. Entre a preteza e a brancura brilha o Cruzeiro do Sul: associativismo e
identidade negra em uma localidade teutobrasileira (Novo Hamburgo/RS) 2010. 219 f. Tese (Doutorado
em História) – Unisinos, São Leopoldo-RS, p.133-134
94
O Esporte Clube 13 de Maio, aqui representado por seu presidente, Sr.ª Arlete
da Silva, vem através do presente solicitar a V. Sa., se digne determinar o
cancelamento da dívida referente ao serviço de pavimentação executados na
Av. Farrapos e na rua General Câmara, em frente ao lote de nº 17 de
propriedade do Clube, pois os sócios do referido clube não possuem recursos
para satisfazer o pagamento de quantia tão elevada, e pelo motivo que o
Clube não está em atividade a vários anos pois está o prédio em precárias
condições de estabilidade, pelo que foi requerida também sua demolição,
217
demolição esta embargada em vista da dívida existente.
215
Documento do acervo de Margarete Fátima da Silva
216
Documento do acervo de Margarete Fátima da Silva
217
Documento do acervo de Margarete Fátima da Silva
97
deslocamento dos jovens negros em espaços antes restritos. Frequentar outros clubes e
outras festas fez o Treze perder parte de seu papel na comunidade.
O fato, independente das circunstancias, é que no início da década de 1980, mais
precisamente em 1982 a tão sonhada sede é demolida. O Esporte Clube Treze de Maio
não estava mais ativo e deixa de existir fisicamente, permanecendo proprietário do
terreno até 1992. Em 27 de fevereiro deste mesmo ano é doado à prefeitura para tornar-
se o sindicato dos municipários de Erechim. No documento de doação do terreno fica
estabelecido o direito aos sócios do Treze e seus descendentes de utilizarem as
dependências do sindicato para fins não lucrativos.
O Treze permanece nas memórias dos antigos sócios e de seus descendentes
como um espaço de lazer, reconhecimento e respeito.
98
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Levando para a rua seu estandarte, parte da população negra de Erechim buscou
diminuir sua invisibilidade por meio de um espaço de sociabilidade que se construiu ao
longo do tempo como respeitável. Este grupo de pessoas que formava o Esporte Clube
Treze de Maio procurou afastar seus associados das imagens negativas atribuídas aos
negros, estabeleceu laços com pessoas de outros municípios e se distanciou dos que
eram considerados inadequados. Acreditaram que, desta forma, sofreriam menos as
consequências da discriminação. Assim, o Clube foi um importante espaço de
sociabilidade, que contribuiu para a quebra de estereótipos relacionados a seus
frequentadores e que, embora extinto, continua vivo na memória de seus associados e
seus descendentes como exemplo da organização negra da cidade.
Por meio do Esporte Clube Treze de Maio uma parcela da população negra de
Erechim se viu representada e retratada no jornal local. A pesquisa mostrou que os anos
de "Glória" do clube foram também os anos nos quais um maior número de matérias
relacionadas a associação foram publicadas. Conforme o Clube foi perdendo força na
comunidade, as matérias foram diminuindo até cessarem por completo, encerrando-se,
também, as referências à população negra de Erechim no Jornal A Voz da Serra.
É indispensável que outros se dediquem à temática para que as lacunas
relacionadas à história da população negra de Erechim possam diminuir. Esta pesquisa
abriu uma pequena brecha e documentos estão à espera de novos olhares e novas
perguntas, tendo em vista que parte das fontes pesquisadas que pertenciam a um acervo
particular, agora estão disponíveis para consulta e certamente possibilitarão novas
pesquisas.
101
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107
ANEXO