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Bem-estar Subjetivo de Idosos


Residentes em Instituições de
Longa Permanência
Hilma Tereza Tôrres Khoury, Rafaella Cristina Campos Salgado Rêgo, Jaqueline China Silva,
Alciane de Lima Silva, Vera Ribeiro Novaes, Tatiane Rodrigues Sanches,
Jeisiane dos Santos Lima, Juliany Lopes de Castro e Marilene Alves Dantas Pereira

O crescente aumento da população de idosos aliado a mudanças


sociais como a nova configuração familiar e o papel da mulher tornaram
atualíssima a questão dos estabelecimentos residenciais para idosos,
popularmente conhecidos como asilos. Os asilos são lugares temidos e
dificilmente se imagina que alguém possa escolher morar em um lugar
desses, muito menos ser feliz lá. Este capítulo apresenta resultado de
pesquisa realizada com idosos residentes em duas instituições na cidade de
Belém do Pará, Brasil. O objetivo consistiu em investigar a percepção de
bem-estar, comparando-se algumas variáveis sociodemográficas
pertinentes ao contexto asilar.
Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) é uma
denominação adotada pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
(SBGG) nos debates de suas comissões especializadas e em seus congressos
e jornadas, como correspondente a Long-term Care Institution. Não se trata
de um termo substituto para o popular e usual asilo. A expressão Instituição
104 Hilma Tereza Tôrres Khoury et al.

de Longa Permanência para Idosos (ILPI) traz consigo um novo paradigma


de residência para pessoas acima de 60 anos que extrapola o caráter
meramente assistencial (Born & Boechat, 2006).
De acordo com documento elaborado pela Comissão de Assessoria
Técnica a Instituições de Longa Permanência da SBGG, Seção São Paulo
(apud Born & Boechat, 2006), as ILPIs devem prover atendimento
institucional integral, incluindo serviços nas áreas: social, psicológica,
médica, odontológica, de enfermagem; fisioterapia; terapia ocupacional e
outras, realizados em locais físicos adequados e equipados para proporcionar
os cuidados necessários aos internos, mediante pagamento ou não, por
período indeterminado. Além disso, devem dispor de um quadro de recursos
humanos para atender às necessidades de assistência social, saúde,
alimentação, higiene, repouso e lazer dos usuários e desenvolver outras
atividades que lhes garantam qualidade de vida.
Parece implícito na proposição da SBGG que Instituições de Longa
Permanência para Idosos não são instituições destinadas somente a idosos
carentes de recursos financeiros ou de suporte familiar, como é habitual nos
clássicos asilos. Mas se constitui em um local com condições para atender às
necessidades de pessoas idosas, proporcionando-lhes qualidade de vida e
bem-estar, independentemente de sua capacidade física, cognitiva,
condição financeira, ou situação familiar. Seria uma modalidade de arranjo
residencial para idosos, quiçá bem adequada à atual conjuntura de grandes
transformações sociais e demográficas ocorridas nas últimas décadas, onde
se possa viver a velhice com dignidade e cidadania.

Idosos e institucionalização no Brasil


Na cultura brasileira, os asilos costumam ser percebidos como um
tabu. Um lugar de exclusão; de isolamento, depósito de idosos
abandonados; local temido e para onde ninguém gostaria de ir. As marcas
de uma época em que os asilos pouco diferiam dos manicômios ainda
permanecem vivas na memória social. Contudo, esse temor tem alguma
razão de ser, visto que nos dias atuais a maior parte das instituições
brasileiras para idosos funciona em situação precária, freqüentemente
alvo de denúncia pela imprensa, ou ficam bem aquém do ideal previsto na
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definição de Instituição de Longa Permanência (Ferrari, 1991; Mazo &


Benedetti, 1999; Yamamoto & Diogo, 2002; Davim, Torres, Dantas &
Lima, 2004).
No Brasil não há dados estatísticos disponíveis acerca do número e
tipo de instituições para idosos, assim como do número de idosos
institucionalizados e suas características. Todavia, sabe-se que muitos
asilos funcionam sem registro, são irregulares (Portal do Envelhecimento).
Entre as instituições legalizadas predominam as de caráter filantrópico ou
beneficente; algumas são particulares, com finalidade lucrativa e uma
minoria é pública (Davim et al., 2004; Born & Boechat, 2006; Scharfstein,
2006) mantida pelos governos Estaduais ou Municipais. Em Belém do Pará,
tem-se conhecimento de quatro instituições destinadas a abrigar idosos.
Contrariando a realidade nacional retratada na literatura, a maior parte é
pública (duas), mantida pelo Governo do Estado, uma delas é privada, mas
tem subvenção do Governo Estadual por meio de convênio, e outra é
filantrópica.
Entre as características dos idosos institucionalizados no Brasil
destacam-se a idade e as razões que conduzem à institucionalização.
Acompanhando tendência internacional, tem crescido a procura nas
instituições por pessoas cada vez mais idosas e, conseqüentemente, mais
dependentes. Os fatores que predispõem à institucionalização variam em
função da situação socioeconômica e da região geográfica do País (Born &
Boechat, 2006). Entretanto, observa-se preponderância de dificuldade
financeira e problemas de saúde, assim como ausência ou dificuldade de
apoio social (Born & Boechat, 2006; Davim et al., 2004). Há também
pessoas que buscam a instituição por opção (Scharfstein, 2006).
A Política Nacional do Idoso estabelece como prioritário que o idoso
seja cuidado pela família (Lei 8842/1994, Artigo 4º, Parágrafo III) e
determina que o atendimento em asilos se destine aos casos de inexistência
de vínculo familiar, abandono, ou falta de condição para prover o próprio
sustento (Decreto 1948/1996, Artigo 3º, Parágrafo único).
A despeito do temor em relação aos asilos, bem como das condições
precárias de muitos deles e apesar de a legislação brasileira enfatizar os
cuidados no âmbito familiar, as mudanças recentes na configuração
sociodemográfica do Brasil colocam o tema da institucionalização de idosos
na ordem do dia. Fatos como o aumento da expectativa de vida e o
106 Hilma Tereza Tôrres Khoury et al.

crescimento progressivo da população idosa aliados à diminuição do número


de filhos nas famílias e à inserção cada vez mais ampla da mulher (cuidadora
tradicional) no mercado de trabalho fazem pensar em algumas questões.
Como e onde viverão tantos idosos? Quem cuidará deles? A nova estrutura
familiar terá condição de arcar com os cuidados de seus idosos? As
Instituições de Longa Permanência poderiam ser uma boa alternativa de vida
para pessoas idosas? Alguém escolheria o asilo como moradia para os seus
últimos anos de vida? E como vivem os idosos nessas instituições? Seriam
felizes? Cada uma dessas perguntas poderia suscitar debates acalorados e
longas investigações. Todavia, esta exposição se limitará à questão da
felicidade ou percepção de bem-estar.

Felicidade e bem-estar subjetivo


Felicidade é um conceito subjetivo e, como tal, pode variar bastante de
pessoa a pessoa. O que é necessário ou suficiente para uma pessoa se
considerar feliz pode estar associado a diversos fatores.
Em anos recentes a psicologia vem deslocando o seu foco do
estudo das patologias e do sofrimento para o exame de fenômenos capazes
de promover saúde. A chamada Psicologia Positiva (Seligman &
Csikszentmihalyi, 2000) tem se dedicado à investigação de experiências
positivas e características de personalidade que dentro de um contexto
social contribuem para a saúde e a qualidade de vida. Entre os tópicos
estudados se destacam a felicidade, o bem-estar subjetivo, o otimismo e a
autodeterminação. Poder-se-ia incluir também entre os fenômenos que
contribuem para a Psicologia Positiva a resiliência (Dell’Aglio, Koller &
Yunes, 2006), as crenças de controle (Khoury, 2005; Khoury & Günther,
2006) e as crenças de auto-eficácia (Neri, 2006).
As ciências sociais e a psicologia, em particular, têm estudado a
felicidade sob denominações bem diferentes. Entretanto, o termo bem-estar
subjetivo (BES) se refere a um construto de amplo escopo e que engloba
as mais diversas nomeações, tais como felicidade, satisfação,
estado de espírito, afeto positivo, sendo também considerado por
alguns autores como uma avaliação subjetiva da qualidade de vida
(Albuquerque & Tróccoli, 2004, p. 153).
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Desta forma, adotou-se para os fins deste estudo a designação


bem-estar subjetivo.
A literatura não é consensual quanto ao conceito de bem-estar
subjetivo. Com base em uma ampla revisão, Costa e Pereira (2007)
classificaram as diversas definições de BES em três categorias:
1. Estar no controle de sua vida – ligado a ativida des e
auto-realização;
2. Estado (de felicidade) – resultante de diversos momentos e
experiências vividos;
3. Traço – predisposição para interpretar os eventos da vida de
forma positiva.

Os diferentes conceitos de BES ora enfatizam aspectos da


personalidade; ora herdados ou ainda uma combinação de aspectos de
personalidade e circunstâncias ambientais. Uma maneira abrangente de
definir o bem-estar subjetivo é a apresentada por Rabelo e Neri (2006, p. 17),
que entendem o BES como avaliação que a própria pessoa faz sobre sua vida a partir
de seus valores e critérios pessoais.
Não obstante a diversidade de significados, a maioria dos
pesquisadores da área admite que o bem-estar subjetivo possui três
componentes: satisfação com a vida, afeto positivo e afeto negativo (Costa &
Pereira, 2007). O primeiro elemento é de natureza cognitiva e se refere ao
julgamento sobre a satisfação para com a vida em geral. O segundo e o
terceiro componentes são de natureza emocional e dizem respeito ao
equilíbrio entre afetos positivos (emoções prazerosas) e negativos (emoções e
sentimentos desagradáveis) na percepção do sujeito (Diener, 2000; Rabelo &
Neri, 2006). Assim sendo, uma percepção de bem-estar subjetivo elevada
incluiria
freqüentes experiências emocionais positivas, rara experiência
emocional negativa (depressão ou ansiedade) e satisfação não só
com vários aspectos da vida, mas com a vida como um todo
(Albuquerque & Tróccoli, 2004, p. 154).

Que fatores contribuem para que alguém perceba a vida de forma


positiva, embora muitas vezes enfrentando situações potencialmente
adversas?
108 Hilma Tereza Tôrres Khoury et al.

Bem-estar subjetivo e fatores associados


Com base em uma extensa revisão de literatura, incluindo pesquisas
em vários países, Ferraz, Tavares e Zilberman (2007, p. 241) concluíram que a
felicidade é um fenômeno predominantemente subjetivo, estando subordinada mais a
traços de temperamento e postura perante a vida do que a fatores externamente
determinados.
Os autores apontaram fatores sociodemográficos e de personalidade
capazes ou não de predizer felicidade. Entre as variáveis que não se
correlacionaram com felicidade ou bem-estar se encontram: nível
socioeconômico – evidentemente superado um limiar de subsistência com dignidade
(Ferraz et al., 2007, p. 236) –, idade, gênero, estado civil, presença de filhos e
aparência física. Entre os fatores associados à felicidade ou bem-estar estão: o
comprometimento com a fé, seja por meio da religiosidade, seja por meio da
espiritualidade (p. 237); ter boas relações sociais (p. 238); estado de saúde; fatores
herdados geneticamente, como o temperamento (p. 238) e fatores de personalidade,
cognitivos ou emocionais tais como extroversão e auto-estima (p. 238),
autodeterminação, autonomia e otimismo entre outros.
Otta e Fiquer (2004) demonstraram que existe diversidade na
literatura com respeito à relação entre bem-estar e determinadas variáveis
sociodemográficas, em particular a idade, conforme a perspectiva teórica.
Na perspectiva de indicadores sociais (Ryff, 1989, 1995 apud Otta &
Fiquer, 2004), o bem-estar diminui com o avanço da idade, sendo menor
também entre as pessoas que não têm companheiro (solteiras, viúvas,
divorciadas), bem como entre as de menor poder aquisitivo. De acordo com
a teoria da seletividade socioemocional de Laura Carstensen, as emoções
são mais bem reguladas à medida que as pessoas ficam mais velhas, o que
proporcionaria maior bem-estar (apud Otta & Fiquer, 2004, p. 145); assim, o
bem-estar aumentaria com a idade. Para a teoria do set point (Tellegen et al.,
1988 apud Otta & Fiquer, 2004), a idade seria irrelevante, uma vez que
existem diferenças individuais hereditárias quanto a emoções e percepções.
As autoras mostraram, ainda, que a relação entre idade e bem-estar pode ser
modulada por gênero.
Em pesquisa realizada em duas cidades brasileiras de regiões
geográficas distintas e com pessoas de diferentes faixas etárias, desde
jovens até idosos, Otta e Fiquer (2004) descobriram que os mais velhos se
consideraram mais satisfeitos com a vida do que os mais jovens. Como se
apresenta o bem-estar subjetivo em pessoas idosas institucionalizadas?
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Velhice, bem-estar subjetivo e institucionalização


A partir de revisão da literatura nas bases de dados da biblioteca virtual
em saúde (bvs-psi), a qual acessa o LILACS, o PEPsic, o SciELO, o Google
Acadêmico e outros Index Psi, constatou-se que as pesquisas envolvendo a
temática do bem-estar subjetivo em pessoas idosas, em sua maioria, tratam da
relação entre a percepção de bem-estar ou satisfação com a vida com fatores
muito específicos, geralmente ligados a situações potencialmente adversas. As
questões abordadas nessas pesquisas dizem respeito à amputação de membros
(Diogo, 2003; Resende, Cunha, Silva & Souza, 2007), incapacidade funcional
(Rabelo & Neri, 2005), deficiência física (Resende, 2006), ocorrência de
acidente vascular cerebral (Rabelo & Neri, 2006) ou, ainda, solidão (Capitanini
& Neri, 2004), apoio social (Guedea et al., 2006) e rede de relações sociais
(Resende, Bones, Souza & Guimarães, 2006). Estudos sobre bem-estar
subjetivo e vida nos asilos são praticamente inexistentes, pelo menos nas bases
de dados averiguadas.
O presente artigo relata resultados de uma pesquisa, cujo objetivo
consistiu em investigar a percepção de bem-estar em idosos residentes em
Instituições de Longa Permanência, comparando-se algumas variáveis
sociodemográficas tais como sexo, tempo de residência na instituição,
vínculo familiar, motivo da ida para o asilo e freqüência de visitas recebidas.
Trata-se de estudo descritivo com comparação entre subgrupos,
realizado em duas Instituições de Longa Permanência para Idosos, na cidade
de Belém, Estado do Pará, sendo uma pública e outra de caráter filantrópico.
A instituição pública sustenta-se com recursos do Governo do Estado,
mas também com contribuições mensais dos próprios internos. Alguns
pagam taxa fixa, uma espécie de aluguel (pensionistas), outros contribuem
com partes variáveis de seus rendimentos (tutelados). Os primeiros têm um
quarto só para si, os tutelados dividem o quarto com mais uma pessoa na
mesma condição. Todos os quartos possuem banheiro, camas individuais e
armário; alguns têm mesa com cadeira, ventilador e/ou televisão. Os
pensionistas podem trazer seus próprios móveis; alguns deles possuem
geladeira no quarto. Os tutelados utilizam a mobília da instituição, porém
podem comprar outros objetos e colocá-los em seu quarto. Há salão de
refeições, sala de TV, capela, duas áreas semi-abertas que funcionam como
sala de estar e amplas áreas verdes. Possuem equipe técnica integrada por
110 Hilma Tereza Tôrres Khoury et al.

Assistentes Sociais, Psicóloga, Médicos, Enfermeiros, Nutricionista,


Fisioterapeuta, Terapeuta Ocupacional e Cuidadores; alguns idosos têm
cuidador particular. Há ainda programações fora da instituição das quais os
internos participam; por exemplo, festas juninas, excursões e atividades
natalinas.
Na instituição dita filantrópica foi informado pelos dirigentes que a
manutenção fica a cargo de damas de caridade, entretanto, os idosos pagam
mensalidades de valor variável. Aqueles que pagam mais ocupam quartos
individuais; os que pagam menos ficam em quartos coletivos habitados por
três ou quatro pessoas. Os móveis, em todos os quartos, pertencem aos
moradores. A mobília é composta por camas individuais e armários; alguns
têm mesa com cadeira e ventilador; só os quartos individuais possuem
televisão. Os banheiros são coletivos, havendo apenas dois. A instituição tem
ainda um salão de refeições com televisão e uma capela. Não há corpo de
profissionais especializados, somente um fisioterapeuta voluntário e uma
clínica médica conveniada onde os internos são atendidos em caso de
necessidade. Apenas duas idosas – uma deficiente visual e outra paraplégica –
possuem cuidadores.
Foram investigados 71 idosos, sendo que 47 pertenciam à ILPI
pública (42,6% homens; 57,4% mulheres) e 24 viviam na ILPI filantrópica
(100% mulheres). A idade dos participantes variou de 60 a 97 anos na
instituição pública e de 61 a 91 anos na filantrópica. A amostra foi
constituída por todos os idosos que residiam nessas instituições
excluindo-se aqueles que possuíam algum tipo de demência (12 na ILPI
pública e 6 na ILPI filantrópica) e, portanto, não poderiam responder aos
questionários.
A percepção de bem-estar subjetivo foi medida por meio da Escala de
Bem-Estar Subjetivo – EBES (Albuquerque & Tróccoli, 2004), com 62 itens
distribuídos em duas subescalas. A primeira é composta por 47 palavras que
descrevem diferentes sentimentos e emoções – afetos positivos e negativos
(p.ex. animado, ativo, triste, amedrontado); a pessoa deve julgar o quanto
(1 = nem um pouco; 5 = extremamente) tem se sentido ultimamente. A segunda
subescala contém 15 frases afirmativas acerca da satisfação/insatisfação com a
vida (p.ex. “Avalio minha vida de forma positiva”; “Tenho mais momentos de
tristeza do que de alegria na minha vida”), avaliadas em uma escala tipo Likert
(1 = discordo plenamente; 5 concordo plenamente).
Bem-Estar Subjetivo de Idosos Residentes... 111

Durante o estudo piloto, o instrumento se revelou cansativo para a


população alvo. Desta forma, decidiu-se nesta pesquisa utilizar somente a
segunda subescala que mede a satisfação com a vida.
Foi utilizado ainda um questionário para dados sociodemográficos
in clu in do in for ma ções so bre gê ne ro; vín cu lo fa mi li ar; tempo de
residência na ILPI; freqüência de visitas recebidas; e motivos que
conduziram a ida para a instituição.
Após autorização da direção de cada ILPI para que a pesquisa fosse
realizada em suas dependências, realizou-se a seleção dos participantes. A fim
de saber quais residentes possuíam algum tipo de demência (critério de
exclusão) foram procurados os profissionais disponíveis durante a visita
(Assistente Social e/ou Psicólogo). Na instituição filantrópica, essa informação
foi fornecida pela secretaria. Os residentes foram abordados individualmente
pelos pesquisadores. O contato com o potencial participante era realizado ou
em seus aposentos ou em áreas coletivas como, por exemplo, a sala de televisão
e o salão de estar. Após a leitura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido, caso o residente concordasse em participar, então os instrumentos
eram aplicados em forma de entrevista; não houve recusas.
Para analisar o grau de bem-estar subjetivo (BES) foi construído um
índice por meio da soma dos pontos obtidos nas respostas (1 = discordo
plenamente; 5 = concordo plenamente) aos 15 itens da escala. Para tanto, a
pontuação dos itens 4, 5, 9, 10, 11, 12 e 13 (insatisfação com a vida) foi
invertida. Desta forma, quanto maior o total de pontos obtidos, maior o grau
de bem-estar subjetivo (Mínimo possível = 15; Máximo possível = 75;
Ponto Médio = 45).
Para comparar os subgrupos da amostra quanto ao grau de BES e
verificar a existência de associação entre a percepção de bem-estar e as
outras variáveis consideradas (todas elas categóricas), a variável grau de
bem-estar subjetivo foi categorizada em Baixo (Até 42 pontos), Moderado
(de 43 a 56 pontos) e Alto (57 pontos e acima). Essa classificação levou em
consideração o ponto médio do índice (45), assim como a média da amostra
(49,5) no índice de bem-estar subjetivo.
A fim de averiguar a existência de relações significativas entre o grau
de bem-estar percebido (baixo, moderado e alto) e as variáveis freqüência de
visitas recebidas (mais freqüentes – diárias a quinzenal, menos freqüentes –
mensais ou em datas comemorativas e não recebe visitas), motivos que
112 Hilma Tereza Tôrres Khoury et al.

levaram o idoso à ILPI (abandono familiar, opção e outros), sexo (masculino


e feminino), existência de vínculo familiar (sim e não) e tempo de residência
na ILPI (menos de 4 anos, 4 a 8 anos e mais de 8 anos), foi efetuada uma
análise com o qui-quadrado. Além disso, foi testado o tamanho do efeito das
variáveis consideradas sobre a variável BES por meio da conversão do
qui-quadrado na estatística V de Cramer, interpretada como qualquer outro
coeficiente de correlação. Para todas as provas foi adotado o nível de
significância convencional de 0,05.
Caracterizando os participantes, constata-se que 22,5% foram para
o asilo por vontade própria, outros 22,5% foram para lá devido a abandono
pela família, 12,5% referiram necessidade de tratamento e 8,5% a solidão
como razões para terem procurado a ILPI. Com relação a vínculo familiar,
45,1% declararam possuir família, porém, 35,2% afirmaram não receber
visitas. Quanto ao tempo de residência na instituição, 25,4% moravam há
menos de quatro anos; 18,3% residiam há 12 anos ou mais.
Verifica-se que o percentual dos que escolheram viver na
instituição é igual ao percentual dos que estão lá por terem sido
abandonados pela família e que, em ambos os casos, é uma proporção
considerável. Não há estudos, nem dados com os quais se possa comparar
e conferir se a proporção daqueles que foram para a instituição por opção
está aumentando. Contudo, um percentual superior a 20% chama a
atenção. Seria reflexo do novo contexto onde, por um lado, a estrutura
familiar já não consegue cuidar de seus idosos como antes e, por outro, o
idoso possui renda (aposentadoria ou pensão) que lhe permite pagar
instituições? Seria uma forma de fugir da solidão do dia-a-dia, garantindo
companhia e convivência social?
A primeira pergunta que esta pesquisa se propôs responder indagava
sobre como se apresenta a percepção de bem-estar subjetivo entre os idosos
residentes nas Instituições de Longa Permanência. Os resultados mostram que a
média no índice de bem-estar subjetivo foi 49,5 (Mediana = 53; DP = 11,9). A
pontuação mínima obtida na amostra foi de 23 e a máxima de 71. Observa-se,
assim, que a média da amostra investigada ficou um pouco acima do ponto
médio do índice (45). Esses dados sugerem que a percepção de bem-estar
desses idosos se encontra no nível moderado. Embora vivendo em um asilo eles
não são infelizes. Teriam maior capacidade para regular suas emoções
(Carstensen, 1995 apud Otta & Fiquer, 2004) e por isso estariam satisfeitos com
Bem-Estar Subjetivo de Idosos Residentes... 113

suas vidas? Sentir-se-iam seguros na instituição por ter os cuidados básicos


garantidos? A instituição funcionaria com uma grande família,
proporcionando-lhes convívio e apoio social?
Não houve diferença significativa quanto ao grau de bem-estar
subjetivo (baixo, moderado e alto) na comparação da amostra por tipo de
ILPI (pública ou filantrópica).
A segunda pergunta da pesquisa averiguava a relação entre o grau de
bem-estar percebido e variáveis tais como a freqüência de visitas recebidas, o
motivo que levou o idoso à ILPI, o tempo de residência na instituição, o fato
de possuir/não possuir família e o sexo do participante. De acordo com os
resultados, somente a variável freqüência de visitas recebidas evidenciou
associação significativa com o grau de bem-estar subjetivo (X2 = 11,1; gl = 4;
p? 0,05). O V de Cramer obtido foi de 0,28 indicando que aproximadamente
7,8% da variação na freqüência do grau de bem-estar subjetivo pode ser
explicado pela variação na freqüência de visitas recebidas pelos idosos que
residem nessas Instituições de Longa Permanência.

60%
52,0% Baixo Moderado Alto
50,0%
Grau de bem-estar subjetivo

50%

37,5% 37,5%
(percentagem)

40% 36,0% 36,4%

30% 25,0%

20%
12,0% 13,6%
10%

0%
Não Recebe Menos Freqüentes Mais Freqüentes

Freqüência de visitas recebidas


Figura 1. Relação entre bem-estar subjetivo e freqüência de visitas recebidas por
idosos residentes em Instituições de Longa Permanência.

Como se pode observar na Figura 1, entre aqueles idosos que


recebiam visitas mais freqüentes (diárias a quinzenais), 37,5%
apresentaram grau de bem-estar percebido alto, enquanto que entre aqueles
que recebiam visitas menos freqüentes (mensais ou em datas
114 Hilma Tereza Tôrres Khoury et al.

comemorativas) apenas 13,6% se enquadraram nessa categoria.


Surpreendentemente, 52% daqueles que não recebiam visitas revelaram
elevado grau de bem-estar subjetivo.
Nesta análise, a percepção de bem-estar subjetivo foi avaliada em
categorias (baixo, moderado e alto). É notório que a conversão de variáveis
discretas ou contínuas em variáveis categóricas tende a reduzir a sensibilidade
da análise estatística, ocasionando perda de informações importantes sobre os
participantes. Assim, compararam-se as médias no índice de bem-estar
subjetivo (variável quantitativa) procurando-se variações pelos subgrupos da
amostra conforme a freqüência de visitas recebidas. Percebe-se que há pouca
diferença entre aqueles que recebem visitas mais freqüentes e aqueles que não
recebem visitas (diferença = 0,65). Enquanto que, comparando-se o grupo dos
que recebem visitas mais freqüentes com aqueles que recebem visitas menos
freqüentes, a diferença é de quase cinco pontos (4,8).
Esses dados sugerem que receber visitas com pouca freqüência pode
ser mais negativo para a percepção de bem-estar do que não receber visitas.
Aqueles que recebiam visitas apenas raramente ou esporadicamente
mostraram-se mais infelizes do que aqueles que não recebiam visitas nunca.
Talvez a infelicidade não esteja ligada ao fato não receber visitas como se
costuma pensar, mas a recebê-las sem qualquer regularidade. Não ter o que
esperar ou por quem esperar pode ser menos nocivo psicologicamente do que
esperar alguém sem saber ao certo quando virá. Essa é uma situação
potencialmente geradora de ansiedade e capaz de despertar sentimentos de
angústia, desamparo e menos valia. Os dados indicam, ainda, que receber
visitas freqüentemente e com regularidade é fator de bem-estar e felicidade
para idosos institucionalizados. Esses achados corroboram os de Resende et
al. (2006) que, avaliando pessoas de 25 a 85 anos, encontraram maior
satisfação com a vida atual entre aquelas que recebiam maior suporte afetivo.
Oferecem apoio também às descobertas de Guedea et al. (2006) que
encontraram maior satisfação com a vida em pessoas que estavam satisfeitas
com o apoio social recebido. Além disso, concordam com a literatura que
assinala o “ter boas relações sociais” como um dos preditores de felicidade
(Ferraz et al., 2007, p. 238).
O fato de possuir/não possuir família não influenciou o grau de
bem-estar subjetivo desses idosos, mas a freqüência de visitas recebidas, sim.
Ressalte-se que mais de 45% dos participantes possuíam família, 22,5%
Bem-Estar Subjetivo de Idosos Residentes... 115

foram para a instituição por terem sido abandonados pela família e mais de
35% não recebiam visitas. Contudo, 67,6% apresentaram grau de bem-estar
subjetivo alto ou moderado. Entre os que apresentaram grau de bem-estar
subjetivo alto, 36% recebiam visitas freqüentes e regulares, porém, 52% não
recebiam visitas. Com base em revisão de literatura, Ferraz et al. (2007)
apontaram a “presença de filhos” como uma variável não relacionada à
felicidade; Deps (1993) demonstrou que o bem-estar emocional de pessoas
idosas não está associado à freqüência de interação com seus filhos adultos ou
outros parentes, mas que a interação com amigos tem efeitos positivos sobre o
bem-estar. Essas informações não desmerecem o valor da família, mas
recolocam a discussão da importância da qualidade dos vínculos sociais em
contraposição à simples existência ou quantidade dos mesmos.
Conclui-se que:
• Viver em instituições para idosos não é necessariamente
sinônimo de infelicidade;
• Receber visitas freqüentes e regulares é um indicador significativo
de bem-estar e qualidade de vida para idosos que residem em
Instituições de Longa Permanência;
• Receber visitas esporádicas é mais prejudicial ao bem-estar do que
não receber visitas;
• A ausência de visitas não impede o interno de se sentir feliz.
O que poderia ser feito para melhorar o bem-estar de idosos
institucionalizados? Do ponto de vista dos resultados obtidos nesta
pesquisa, talvez o desenvolvimento de um programa de visitas regulares aos
residentes em ILPIs que não dependesse unicamente de seus familiares ou
amigos poderia contribuir nesse sentido. Assim como existem os Doutores
da Alegria (projeto de um grande Plano de Saúde) que levam conforto aos
doentes internados em hospitais, quem sabe poderiam ser incentivadas
espécies de Visitantes da Alegria para os idosos que vivem em ILPIs?
Espera-se que esses resultados possam contribuir para orientar
políticas públicas visando promoção de saúde e qualidade de vida para
pessoas idosas, em especial as voltadas para a institucionalização. Espera-se
também que investigações futuras possam testar estas conclusões, bem como
examinar outras variáveis que se revelem importantes para a percepção de
bem-estar de idosos institucionalizados.
116 Hilma Tereza Tôrres Khoury et al.

Questões para reflexão


1. As famílias devem continuar a ser o principal responsável pelo
cuidado de seus idosos?
2. As ILPIs podem ser uma boa alternativa de vida para os idosos?
3. O que poderia ser feito para melhorar a qualidade de vida dos idosos
nas ILPIs?

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