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Acervo CONCERTO: A vida de Dmitri

Shostakovich 
por Redação CONCERTO02/07/2019
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Texto de Camila Fresca na Revista CONCERTO de agosto de 2015

Dmitri Shostakovich é um dos pilares musicais do século XX. Dono


de uma trajetória única e turbulenta, foi ao mesmo tempo combatido e
homenageado pelo regime soviético, vivenciando tanto a vanguarda
artística dos primeiros tempos pós-revolução russa quanto as
perseguições stalinistas. Criança prodígio, aos 20 anos de idade já
possuía reconhecimento internacional. Sua prolífica obra – que podia
transmitir sarcasmo, ironia e a mais profunda melancolia – é o retrato
de uma época e da personalidade de seu autor. 

Shostakovich nasceu em 26 de setembro de 1906, em São


Petersburgo, cidade que em 1914 passou a se chamar Petrogrado e,
em 1924, Leningrado. Em 1919, o jovem Mitia, que tinha se iniciado
ao piano ainda na infância, com a mãe, entrou para o conservatório da
cidade. Glazunov, que era diretor da instituição, tornou-se seu
professor de composição – Shostakovich guardaria para sempre boas
lembranças do mestre. Com a morte de seu pai, engenheiro, em 1922,
a família ficou em situação de miséria. Mas Shostakovich, que
trabalhava desde menino, logo se destacou como compositor: após
terminar os estudos de forma brilhante, ele alcançou fama com
sua Sinfonia nº 1 (1925). Seu projeto era compor 24 sinfonias; dessas,
15 se materializaram, cada uma com uma história particular.
Em 1928, Shostakovich concluiu sua primeira ópera, O nariz,
inspirada em conto de mesmo nome escrito por Gogol; quatro anos
mais tarde, escreveu Lady Macbeth do distrito de Mzensk, a partir de
texto de Nikolai Leskov. Apesar do sucesso imediato – ou talvez
devido a ele –, Shostakovich começou a ter problemas com a
burocracia soviética. O estilo ácido de Lady Macbeth, com cenas de
sexo e violência, teria irritado Stalin, que assistira à obra dois anos
após sua estreia. Shostakovich foi atacado na imprensa soviética,
recebeu a pecha de “inimigo do povo” e, temendo a prisão, cancelou a
estreia de sua Sinfonia nº 4 (1936), obra igualmente arrojada. 

No ano seguinte, sua Sinfonia nº 5 levou o subtítulo “Um artista


soviético respondendo a uma crítica justa”. Era uma tentativa de
“fazer as pazes” com o regime. E funcionou: ele foi homenageado
pela obra. Shostakovich acabaria por fazer uma versão “light”
de Lady Macbeth, intitulada Katarina Ismailovna. Para alguns
críticos, sua produção musical teria mudado radicalmente a partir de
então. Outros, no entanto, notam que mesmo a quinta sinfonia é mais
engenhosa do que se costuma acreditar, já que conseguiu satisfazer
tanto o gosto mais conservador dos censores do partido quanto os que
aguardavam algo na linha de sua produção anterior. Em 1938, ele
compôs o primeiro de seus 15 quartetos de cordas. 

Durante a Segunda Guerra, Shostakovich viveu o início do bloqueio


de Leningrado, o que o inspirou a compor sua sétima sinfonia (1941),
justamente chamada de “Leningrado” e que logo se tornou um
símbolo da resistência da União Soviética frente à invasão alemã.
Impressionados com o caráter épico e heroico, Toscanini,
Koussevitzky e Stokowski disputaram a estreia da obra no Ocidente.
A partitura microfilmada atravessou as frentes de combate e chegou a
Nova York, onde Toscanini a tocou em julho de 1942. A essa altura,
Shostakovich era conhecido no mundo todo e foi capa da
revista Time.

Apesar do prestígio de que gozava como compositor e do aparente


alinhamento com o regime, Shostakovich voltou a ser perseguido
como consequência dos ditames ideológicos dos dirigentes do país.
Em 1948, o Relatório Jdanov, emitido pelo Comitê Central do Partido
Comunista, acusava Shostakovich, Prokofiev e outros compositores
proeminentes de “perversões formalistas”. Aparentemente aceitando
mais uma vez a crítica, por algum tempo Shostakovich escreveu obras
que glorificavam a vida soviética e sua história. Com a morte de
Stalin, em 1953, a repressão artística diminuiu, mas Shostakovich
voltou a ter problemas com o regime em 1962, por causa de
sua Sinfonia nº 13, que se apoiava no grande poema Baby Yar, de
Evgeni Evtuchenko. O trabalho provocou controvérsia, sobretudo por
causa do assunto de seu primeiro movimento: a opressão russa aos
judeus.

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