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FACULDADES FACETEN |1

TIPOLOGIA BÍBLICA I

José Jacinto de
Ribamar Mendes Filho
2 |TIPOLOGIA BÍBLICA I

TIPOLOGIA BÍBLICA I

Elaboração: Me. José Jacinto de Ribamar Mendes Filho

BOA VISTA,
2019
FACULDADES FACETEN |3

TEOLOGIA BÍBLICA I
FACETEN
1. ª Edição, Fevereiro/2019
Faculdade de Ciências, Educação e Teologia do Norte do Brasil
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Mendes Filho, José Jacinto de Ribamar.

TIPOLOGIA BÍBLICA I - Boa Vista: Editora FACETEN, 2019.


32 P

INTRODUÇÃO 1 FUNDAMENTOS DA TIPOLOGIA


2 AGRUPAMENTOS DE TIPOS 3 PERSONAGENS
BÍBLICOS 4 SACERDOTES E LEVITAS

Bibliotecária responsável:
Jacquicilea Soares de Souza
CRB/11-742 CDU - 301
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Sumário
INTRODUÇÃO...................................................................................... 5
1 FUNDAMENTOS DA TIPOLOGIA ................................................ 8
1.1 Princípios da Tipologia Bíblica .................................................... 8
1.2 A Tipologia como sacramento do futuro ....................................... 12
1.3 Razões da Tipologia Bíblica.......................................................... 13
2 AGRUPAMENTOS DE TIPOS ...................................................... 15
2.1 Calvário ......................................................................................... 17
2.2 Ressurreição .................................................................................. 18
2.3 Espírito Santo ................................................................................ 20
3 PERSONAGENS BÍBLICOS .......................................................... 20
3.1 Moisés, um tipo de Cristo.............................................................. 21
3.2 José, um tipo de Cristo .................................................................. 24
4 SACERDOTES E LEVITAS ........................................................... 24
4.1 Sacerdotes ...................................................................................... 24
4.2 Levitas ........................................................................................... 26
5 REFERÊNCIAS. ............................................................................... 30
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INTRODUÇÃO
A tipologia é um tipo especial de simbolismo. Um símbolo é
algo que representa outra coisa. É possível definir um tipo como um
“símbolo profético” porque todos os tipos são representações de algo
ainda futuro. Mais especificamente, um tipo nas Escrituras é uma pessoa
ou coisa no Antigo Testamento que prenuncia uma pessoa ou coisa no
Novo Testamento. Por exemplo, o dilúvio dos dias de Noé (Gênesis 6-7)
é usado como um tipo de batismo em 1 Pedro 3,20-21. A palavra para
tipo que Pedro usa é figura.
Quando se diz que um personagem bíblico (um humano) é um
tipo de Cristo, se está dizendo que uma pessoa no Antigo Testamento se
comporta de uma maneira que corresponde ao caráter ou ações de Jesus
no Novo Testamento. Quando se diz que algo é “típico” de Cristo, se
está dizendo que um objeto ou evento no Antigo Testamento pode ser
visto como representante de alguma qualidade de Jesus.
A consideração dos tipos no Antigo Testamento (AT) é um dos
assuntos mais importantes e construtivos para o estudo da Bíblia e, ao
mesmo tempo, é totalmente necessário para se entender corretamente a
Palavra de Deus. O AT é frequentemente tratado como se não passasse
de uma coletânea de contos históricos, que apresenta a história do povo
judeu, e que ilustra os modos e costumes orientais; útil como fonte de
histórias de estudos bíblicos, mas de bem pouca importância prática
quanto ao ensino espiritual.
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A Bíblia pode ser comparada com aqueles volumes, totalmente


ilustrados, que são tão frequentemente publicados, e que possuem várias
gravuras de pinturas selecionadas no começo do livro, seguidos por
capítulos de letras impressas que descrevem os quadros, que contam a
história deles, ou que narram alguma coisa a respeito do pintor.
É declarado que a igreja não é o assunto das profecias no AT.
Mesmo se for assim, a igreja não precisa ser excluída dos tipos. Já no
segundo capítulo de Gênesis, ver-se a igreja sendo prenunciada (há
quem diga assim), pois, ali, tem-se o relato da formação de Eva e da sua
união com Adão, a qual, segundo Paulo nos diz em Efésios 5, é um tipo
de relacionamento da igreja com Cristo.
Gênesis 2,24 vai dizer o seguinte: “Os dois se tornarão uma só
carne”, acrescenta: “Este é um mistério profundo; refiro-me, porém, a
Cristo e à igreja”. A maioria esmagadora das convenções realizadas visa
ao “aprofundamento da vida espiritual”; e nos tipos, o assunto da
santidade parece ser enfatizado mais do que todos os demais.
Sem as revelações mais plenas da verdade nas epístolas, o
humano não era totalmente compreendido. Mas com esses ensinos se
percebe significados que, por certo, estavam encobertos dos que viviam
nos tempos do AT.
Há quem diga que os tipos são um só pedacinho da Bíblia, e é
provável que esta seja uma opinião geral. Mas é correta? Os tipos não
percorrem a Bíblia inteira, não envolve no seu estudo uma familiaridade
crescente com a totalidade da Palavra de Deus? Nos livros do
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Pentateuco e nos livros históricos se tem personagens, eventos, e


instituições típicas. Nos livros poéticos, se tem declarações típicas de
personagens típicas. Os Profetas, por sua vez, voltam-se a terem
personagens e eventos típicos, e o cumprimento dos tipos é predito; ao
passo que na totalidade do NT, são constantemente referidos e
explicados, e o grande antítipo é apresentado.
Com estas breves considerações iniciais, fazendo uso da Bíblia
como objeto de análise, o Curso de Tipologia Bíblica I (TB) fará seu
achado bibliográfico principal a partir de diversos assuntos. Nisto, a
primeira seção, fundamentos da tipologia bíblica, vai dizer acerca das
razões de se estudar a Bíblia por tipos; a segunda seção, o agrupamento
dos tipos, vai explicar acerca do calvário, da ressurreição e do Espírito
Santo; a terceira seção, personagens bíblicos, vai tratar da figura de
Moisés, um tipo de Cristo e de José, um tipo de Cristo; a quarta e última
seção, por sua vez, vai abordar os sacerdotes e levitas, buscando
explicar cada um deles.
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1 FUNDAMENTOS DA TIPOLOGIA

Fazer a exposição do que é a tipologia bíblica (TB) é uma


tarefa demasiadamente difícil e complexa. A dificuldade está no fato de
ser um conceito que, no trajeto milenar do cristianismo, foi
esmeradamente estudado tanto em sua essência como em sua função e
que, tendo sido descrito e classificado pormenorizadamente em seus
múltiplos aspectos, torna o ato de apresentá-lo um processo de pouca
abrangência diante da impossibilidade de lhe recolher todas as
investidas. Por esse motivo, haverá aqui um empenho em justapor
algumas abordagens a respeito da TB, privilegiando mais aquelas
trazidas por críticos da literatura do que as apresentadas por estudiosos
de teologia, perspectivando, assim, suas características constitutivas com
enfoque na área de atuação da presente pesquisa.

1.1 Princípios da Tipologia Bíblica

A TB é entendida como exegese. Trata-se de um princípio


interpretativo da Bíblia. O fato, no entanto, de ter sido amplamente
utilizada, tendo extrapolado os limites da escrita sagrada e religiosa, e de
ser hoje facilmente reconhecida por leitores especializados, não significa
que esteja identificada, nos escritos bíblicos, por sua nomenclatura:
typos ou figura. Alguns poucos exemplos são encontrados, e
recorrentemente citados nas publicações da área, para justificarem ou
explicarem tal uso terminológico.
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A certa altura da Carta aos Romanos, a pregação de Paulo diz:


“Entretanto, reinou a morte desde Adão até Moisés, mesmo sobre
aqueles que não pecaram à semelhança da transgressão de Adão, o qual
prefigurava aquele que havia de vir” (Romanos 5,14).
Além de figura, a TB pode ser identificada por outras
nomenclaturas. Na passagem de Gálatas 4,22-26, por exemplo, a palavra
“alegoria” cria a mesma relação tipológica entre o filho de Agar, Ismael,
e os judeus, e o filho de Sara, Isaac, e os cristãos. É o que diz o texto
(ARA):
“Pois está escrito que Abraão teve dois filhos, um da
mulher escrava e outro da livre. Mas o da escrava nasceu
segundo a carne; o da livre, mediante a promessa. Estas
coisas são alegóricas; porque estas mulheres são duas
alianças; uma, na verdade, se refere ao monte Sinai, que
gera para escravidão; esta é Agar. Ora, Agar é o monte
Sinai, na Arábia, e corresponde à Jerusalém atual, que está
em escravidão com seus filhos. Mas a Jerusalém lá de
cima é livre, a qual é nossa mãe;”

A TB instaura uma dinâmica de comunicação entre os


Testamentos, e dessa dinâmica surge uma chave de compreensão para o
significado gerado pelos vínculos estabelecidos entre os fatos ou pessoas
que figuram em uma e em outra ocasião “histórica”, e uma vez criado o
nexo entre as figuras, cria-se também um impedimento, do ponto de
vista da doutrina, para que sejam observadas isoladamente. Será o
procedimento interpretativo tipológico, portanto, do Antigo Testamento
como figura do Novo Testamento, em um movimento contínuo e eterno.
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A TB foi utilizada, pelos primeiros cristãos, ou judeus-cristãos,


como forma de encontrar argumentos que confirmassem a nova
doutrina. O missionário Paulo, que era um judeu-cristão, mais uma vez
faz uma variação do termo, dizendo que a lei judaica era “sombra” de
coisas futuras, e tais coisas vieram a se esclarecer e realizar na fé cristã:
“Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de
festa, ou lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das
coisas que haviam de vir; porém o corpo é de Cristo” (Colossenses 2,
16-17), ou ainda: “Ora, visto que a lei tem sombra dos bens vindouros,
não a imagem real das coisas” (Hebreus 10,1).
A proposição da TB, ou interpretação figural, é, portanto,
enigmática, dado que os acontecimentos históricos são provisórios e
incompletos; apontam para algo futuro que está por vir. Uma promessa a
ser cumprido, um mistério, de sentido espiritual, a ser desvendado. Esse
modo de retomar e explicar as velhas passagens bíblicas ultrapassou o
círculo social restrito aos personagens bíblicos e aos judeus, e
generalizou-se na educação, nos sermões religiosos, nas representações
teatrais, nas esculturas, etc., ampliando o alcance de sua significação e
de sua influência.
Indicativa de realização futura, a alegoria interpretativa
expandiu sua exegese, e os tipos deixaram de se completar apenas na
vida de Cristo. As narrativas passaram a aplicar o plano de Deus
entrevisto nas Escrituras à vida pública de indivíduos ou instituições,
celebrando também o modelo crístico em cartas, biografias e outros
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relatos de vida privada. Por exemplo, na literatura inglesa do século


XVII, o rei David não só é identificado com Cristo, mas também com a
figura de reis ingleses, assim como a Inglaterra é identificada como uma
nação eleita1.
A TB faz de algo ou alguém, de um dado momento histórico,
figura alegórica geradora de outros, algo e alguém, igualmente
históricos, em outro momento e, assim, sucessivamente, constituídos em
uma infinidade de exemplos, “E o exemplarismo não é defeito, mas
decorrência do método, que situa Cristo logicamente como premissa
menor do pensamento para produzir proporções analógicas
correspondentes”2.
A exegese tipológica é feita segundo o caráter de semelhança, o
qual permite fazer analogia entre dois eventos. Esse caráter de
semelhança não necessita de atributos fortemente evidenciados, que
justifiquem a proposição que julgue a dupla ocorrência: “muitas vezes,
vagas similaridades na estrutura dos acontecimentos ou em
circunstâncias relacionadas com eles bastam para tornar a figura
reconhecível.”3

1
ZWICKER, Steven N. Politics and Panegyric: The figural mode from Marvell to
Pope in MINER, Earl. Literary uses of typology from the Late Middle Ages to the
present. New Jersey, Princeton University Press, 1977. p. 116ss.
2
HANSEN, JOÃO H. Patrística: caminhos da tradição cristã. São Paulo, Paulus,
2008. p. 99.
3
AUERBACH, Erich. Figura. São Paulo, Ática, 1997. p. 27.
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1.2 A Tipologia como sacramento do futuro

A TB, assim como tudo o que provém da matéria bíblica, tem


uma longa trajetória de uso. Ainda que caracterizada essencialmente
pela comunicação que faz entre os dois Testamentos, a TB pode ser
identificada como técnica exegética já na prática de escrita da Bíblia
Hebraica, especialmente nos registros de caráter messiânico dos
profetas, os quais descrevem o reino vindouro como um paraíso, como
um novo Êxodo, como um novo dilúvio, criando interação semelhante
entre um acontecimento passado e uma eventualidade futura. Prática
comum, portanto, como será mostrado mais adiante, dos redatores do
Novo Testamento.
Do ponto de vista sacramental, ou seja, segundo o rito sagrado
instituído pela Igreja Católica para fins espirituais, o que se cumpriu
substancialmente em Cristo se prolonga em cada cristão através do
batismo: “O Antigo Testamento apresentava uma tipologia escatológica;
o Evangelho a mostrava realizada em Cristo; São Paulo a apresenta
continuando-se no cristão”4.
Tem-se, então, segundo o autor, uma tipologia escatológica
judaica e uma tipologia cristológica cristã. E o que caracteriza esta
última, no que se refere ao Paraíso, é que a “entrada no Paraíso não é
algo reservado ao fim dos tempos, mas já realizada em Cristo, ou, mais

4
DANIÉLOU, Jean. Tipologia Bíblica. Sus Origenes. Trad. P. Eloy Riaño. Buenos
Aires, Paulinas, 1966. p. 34.
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exatamente, o fim dos tempos está já presente em Cristo”5, e é


importante lembrar que essa atualização da escatologia não exclui, de
modo algum, a renovação universal que pertence ao final dos tempos.
Nas Igrejas protestantes históricas, são apenas dois os
sacramentos: o Batismo e a Ceia do Senhor. Martinho Lutero definiu
sacramento como a situação em que um elemento (coisa material),
através da palavra de Deus, transforma-se em outro. Em um sentido
espiritual, não no sentido material, pois o vinho continua a ser vinho e o
pão continua a ser pão.

1.3 Razões da Tipologia Bíblica

Existem muitas razões pelas quais, no estudo das Escrituras


Sagradas, não se devem negligenciar os tipos que ocupam uma posição
de tanto destaque. A própria Bíblia lhes atribui muito valor.
Na construção do Tabernáculo, todos os pormenores foram
planejados. Ao falar do véu que dividia o Lugar Santo do Santo dos
Santos, o escritor diz: “querendo com isto dar a entender o Espírito
Santo que ainda o caminho do Santo Lugar não se manifestou, enquanto
o primeiro tabernáculo continua erguido” (Hebreus 9,8). Havia
significado naquele véu. Não era mera cortina divisória entre as duas
partes do Tabernáculo, mas tinha o propósito de transmitir uma lição
grandiosa.

5
DANIÉLOU, 1966, p. 45.
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Numa leitura dos evangelhos a respeito do véu sendo rasgado, é


possível lembrar o trecho de Hebreus a respeito do véu: “o Espírito
Santo assim mostra que o caminho para o Santo dos Santos” agora foi
manifestado. O véu foi rasgado! O próprio Deus completou o tipo, e
acrescentou ao quadro os retoques finais.
A partida de Jesus, que estava para se cumprir em Jerusalém,
tinha sido o assunto quando Moisés e Elias conversavam com Jesus no
monte da Transfiguração, e a partir de então, todo o céu deve ter se
ocupado daquilo que acontecia no Calvário.
Todos os pormenores são tão exatos, que cada um deve ser
cumprido pelo grande antítipo no seu advento. Não somente são retratos
de eventos que já se passaram em tempos distantes, que se pode
comparar com aquilo que aconteceu depois, como também eram planos
com os quais os eventos subsequentes devem se corresponder.
No relato da crucificação em João:

chegando-se, porém, a Jesus, como vissem que já estava


morto, não lhe quebraram as pernas. Mas um dos soldados
lhe abriu o lado com uma lança, e logo saiu sangue e água.
Aquele que isto viu testificou, sendo verdadeiro o seu
testemunho; e ele sabe que diz a verdade, para que
também vós creiais. E isto aconteceu para se cumprir a
Escritura: Nenhum dos seus ossos será quebrado (João
19,33-36).

Isto marca o prenúncio profético de Zacarias 12,10. Os eventos


que tinham acabado de acontecer estavam todos prefigurados nas
Escrituras. Mas não tinham compreendido os antigos textos familiares
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até Jesus lhes mostrar como era necessário que se cumprisse tudo o que
a respeito de Jesus estava escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos
Salmos.
Várias passagens do NT não
podem ser entendidas de outra forma.
Hebreu consiste quase inteiramente em
referências ao AT. Cristo, como a
substância, revela ser melhor do que as
sombras, melhor do que Moisés, do que Josué, do que Abraão, do que
Arão, do que o primeiro Tabernáculo, do que os sacrifícios levíticos, do
que a totalidade da nuvem de testemunhas na galeria dos quadros da fé.

2 AGRUPAMENTOS DE TIPOS

Existem muitas maneiras construtivas de agrupar os tipos. Por


exemplo: frequentemente se descobre que aqueles que diferem entre si
em muitos aspectos têm um único fator em comum. E quando assim
acontecer, pode-se tomar por certo que o ensino transmitido por aquele
único fator é o mesmo em todos os casos, e por ligar todos eles juntos,
esse ensino é enfatizado e impressionado sobre alguém (ou o leitor).
No Tabernáculo e seu serviço, e em outros lugares, é visto
repetidas vezes os sofrimentos de Cristo tipificados pelo esmagamento
ou amassamento de diferentes substâncias. No próprio Tabernáculo, o
ouro para a tampa e para o candelabro, não era somente ouro puro, mas,
também ouro batido. As especiarias para o óleo para as unções, para o
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incenso e para o incenso aromático, deviam ser moídas, porque, caso


contrário, não liberariam o seu perfume. E o perfume assim preparado
devia ser moído muito fino (Êxodo 30,36).
O azeite com o qual se compunha o óleo para as unções, e o
óleo para a oferta de cereais, era azeite batido. E para o candelabro
azeite puro batido para a lâmpada. O trigo para a oferta de cereal era
moído a partir dos grãos cheios (Isaías 28,28). A farinha para a mesma
oferta, que fala de Cristo que oferece a Deus uma vida imaculada, era
farinha fina, como também era a farinha para os pães da Presença. Nele
não havia nada de desigualdade.
É importante, também, ligar entre si tipos que, assemelhassem
estreitamente uns com os outros, especialmente aqueles que representam
aspectos diferentes da vida e da obra de Cristo. Por exemplo: Cristo é
frequentemente prefigurado pelo pão e pelo trigo nas suas várias formas.
Já se examinou o maná e o trigo antigo, o feixe dos primeiros frutos, e
também se mencionou o trigo e a farinha fina na oferta de cereal.
Cristo era tipificado, também, pelos pães asmos que eram
comidos na festa da Páscoa. Não devia existir fermento em qualquer
coisa que tipificasse Cristo. E por essa razão era proibido oferecê-lo na
oferta de cereal, pois na totalidade da Palavra, sempre representa o mal.
Com o objetivo de compreender os principais conceitos e
ampliar a leitura dos mesmos por toda a Escritura, agrupando-os em
elencos de tipos, será possível conceber teologias e doutrinas
sistemáticas e hermenêuticas da Bíblia. Este propósito lógico constará
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em subseções, formará o estudo do Calvário, da Ressurreição e do


Espírito Santo.

2.1 Calvário

A doutrina da expiação tem suas raízes no Antigo Testamento,


onde muitas vezes é apresentada simbolicamente. A palavra hebraica
kaphar aparece primeiramente em Gênesis 6,14, onde é usada num
sentido puramente físico, e tem o significado de “cobrir por completo”.
O próximo lugar em que a palavra kaphar aparece é em Gênesis 32,20.
Esta passagem mostra ainda o sentido dessa palavra, que tem a ver com
o apaziguamento ou reconciliação de alguém que foi ofendido.
Kaphar aparece ainda em Êxodo, Levítico e Números. Mas este
texto vai citar Êxodo 30,16 para revelar mais o significado da palavra:
“Tomarás o dinheiro das expiações dos filhos de Israel e o darás ao
serviço da tenda da congregação; e será para memória aos filhos de
Israel diante do SENHOR, para fazerdes expiação pela vossa alma.”
Expiação quer dizer cobrir, expiar, reconciliar, pacificar. No
sentido de cobrir, a expiação significava, no antigo Israel, tomar um
cordeiro e sacrificá-lo para cobrir o pecado (cf. Levítico 4,13-21). A
expiação em Israel começava pelo sacerdote e sua casa, que oferecia um
novilho em sacrifício pelo pecado. Em seguida, eram tomados dois
bodes, e um deles seria enviado para o deserto como emissário, no
intuito de levar o pecado do povo. O outro bode era sacrificado e seu
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sangue aspergido no propiciatório, cobrindo o pecado do povo. (cf.


Levítico 16).
A doutrina da expiação é a descrição do efeito que o Novo Ser
em Jesus como o Cristo produz naqueles que, em seu estado de
alienação, são tomados por ele. Esta definição aponta para os dois
aspectos do processo de expiação: aquilo que, na manifestação do Novo
Ser, tem um efeito expiatório, e aquilo que acontece ao ser humano sob
este efeito expiatório.
No sentido desta definição, a expiação sempre é, ao mesmo
tempo, um ato divino e uma reação humana. O ato divino supera a
alienação entre Deus e o ser humano na medida em que ela é uma
questão de culpa humana: na expiação, a culpa humana é eliminada
como fator que separa o ser humano de Deus. Mas este ato divino só é
efetivo se o humano reagir e aceitar a eliminação da culpa entre Deus e
o ser humano, ou seja, se ele aceitar a oferta divina de reconciliação,
apesar da culpa. Portanto, a expiação possui necessariamente um
elemento objetivo e outro subjetivo.

2.2 Ressurreição

A participação do ser humano na vida eterna para além da


morte é expressa mais adequadamente pela altamente simbólica
expressão “ressurreição do corpo”. As igrejas a reconheceram como
sendo especificamente cristã. No Credo Apostólico, a expressão é
“ressurreição da carne”, isto é, daquilo que caracteriza o corpo em
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contraste com o espírito, o corpo em seu caráter perecível. Mas esta


expressão é tão desorientadora que se deveria substituí-la, em toda
fórmula litúrgica, por “ressurreição do corpo” e interpretá-la no sentido
do símbolo paulino “corpo Espiritual”. Sem dúvida, esta expressão
também requer interpretação. Ela deveria ser entendida como uma dupla
negação expressa por uma combinação paradoxal de palavras.6
A mais antiga referência na Bíblia hebraica de alguém
“subindo” do sheol “região dos mortos” está na Canção de Ana (1
Samuel 2,6). Porém, os comentaristas bíblicos geralmente indicam que
este trecho deve ser lido de forma figurativa e não enxergam nele uma
expectativa literal de Deus “descendo e subindo” ao Sheol.
Passagens sobre a ressurreição antes do Livro de Daniel lidam
principalmente da “ressurreição nacional”, como é o caso de “Os teus
mortos viverão; os meus cadáveres ressuscitarão” (Isaías 26,19). Esta
passagem em Isaías tornou-se depois um ponto de discussão rabínica
sobre a ressurreição.
Ressurreições temporárias de indivíduos estão por toda a
Bíblia, como é o caso de Elias e o filho da viúva em Sarepta: “Vê, teu
filho vive” (1 Reis 17,23). Eliseu e a mulher sunamita: “Toma o teu
filho” (2 Reis 4,36). Ou o contato com os ossos de Eliseu revivendo uma
mulher: “e, logo que o cadáver tocou os ossos de Eliseu, reviveu o
homem e se levantou sobre os pés” (2 Reis 13,21).

6
TILLICH, Paul. Teologia Sistemática. 5 ed. São Leopoldo: Sinodal, 2005. p. 838.
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2.3 Espírito Santo

O termo “espírito santo” aparece apenas três vezes na Bíblia


Hebraica (em Salmo 51,11 e duas vezes em Isaías 63,10-11). No
judaísmo, Deus é um, a ideia de Deus como uma dualidade ou trindade
entre os gentios pode ser shituf (ou “imperfeitamente monoteísta”). Já o
termo Ruach HaKodesh, “Espírito Santo de YHWH”, aparece
frequentemente no Talmud e na Midrash, significando por vezes a
inspiração profética e em outros é utilizado como uma hipóstase ou
metonímia de Deus.
O “Espírito Santo” rabínico tem certo grau de personificação,
mas permanece sendo uma “qualidade de Deus, um de seus atributos” e
não, como na representação majoritária cristã, como sendo “qualquer
tipo de divisão metafísica da Divindade”. O substantivo ruach
(literalmente “sopro” ou “vento”), em várias combinações, aparece por
diversas outras vezes na Bíblia Hebraica, significando o “espírito” de
Deus.

3 PERSONAGENS BÍBLICOS

Esta seção tratará dos personagens bíblicos. Explicará que os


humanos (personagens da Bíblia) são considerados chaves de
interpretação tipológicas. Vai especificar a figura de “Moisés e José”. E
ainda, vai ampliar a discussão destes tipos em diferentes contextos.
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3.1 Moisés, um tipo de Cristo

Esclarece o autor que “Os Padres da Igreja não se cansaram de


apresentar a vida de Cristo e da Igreja como cumprimento das figuras do
Êxodo”7. No entanto, a recordação do cativeiro e do Êxodo do Egito é
tomada como fundamento de novas esperanças já pelos profetas
bíblicos, entre eles Isaías e Jeremias, que anunciam um novo ou segundo
Êxodo, assim como anunciavam um segundo cataclismo figurado no
Dilúvio de Noé.
O quadro futuro, delineado pelos profetas, é formado pelas
etapas sucessivas da saída do Egito: passagem do mar, travessia do
deserto, rocha de águas vivas, coluna de nuvem e nova aliança.
Foram os próprios profetas que “expuseram uma primeira
exegese do êxodo, mesmo em meio ao Antigo Testamento.” Uma vez
que consideraram o Êxodo como promessa que não se havia cumprido,
tinham em mãos, diz Daniélou, “Todos os elementos necessários para
criar a tipologia do Novo Testamento”8. Mesmo os judeus da época de
Cristo, aqueles que continuavam a tradição profética, afirma Daniélou,
utilizavam os elementos do Êxodo para tratar da salvação esperada em
tempo futuro.

7
DANIÉLOU, 1966, p. 202.
8
DANIÉLOU, 1966, p. 206.
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Os escritores do Novo Testamento seguem as mesmas pegadas


tipológicas dos profetas, com a diferença de que não projetam para o
porvir a realidade figurada no Êxodo, pois, segundo eles, ela já se
cumprira em Cristo. Aqui, então, pode-se observar uma conexão
bastante importante que, descrita nas palavras do autor, constitui uma
“relação orgânica que une a tipologia e a profecia, typos e logos. Não
são coisas distantes, e sim que a profecia é uma interpretação tipológica
da história”9.
Jesus passa a ser um novo Moisés. Ele legisla, no Sermão da
Montanha, a Nova Lei, contrapondo os preceitos dessa Nova Lei aos
preceitos do Decálogo. Além disso, pode-se observar que andou sobre as
águas, assim como Moisés atravessou as águas do mar; e repartiu o pão
em lugar da repartição do maná; e enviou setenta discípulos para
propagar sua mensagem, assim como Moisés elegeu setenta anciãos para
repartir o peso do povo. E como lá não se creu em Moisés, aqui se
perseguiu Jesus.
Daniélou chega à conclusão de que todos os escritores
neotestamentários apresentam o mistério de Cristo como sendo uma
prolongação e superação da história de Israel no tempo de Moisés. As
palavras dos profetas se prestam muito a propósito, às escritas
hagiográficas do Novo Testamento, encarregadas de demonstrar que, em
Cristo, o plano divino se realizou, conforme havia sido profetizado.

9
DANIÉLOU, 1966, p. 207.
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Uma passagem típica de ser considerada tipológica é o texto de


Êxodo 3,1-6:

Apascentava Moisés o rebanho de Jetro, seu sogro,


sacerdote de Midiã; e, levando o rebanho para o lado
ocidental do deserto, chegou ao monte de Deus, a Horebe.
Apareceu-lhe o Anjo do SENHOR numa chama de fogo,
no meio de uma sarça; Moisés olhou, e eis que a sarça
ardia no fogo e a sarça não se consumia. Então, disse
consigo mesmo: Irei para lá e verei essa grande maravilha;
por que a sarça não se queima? Vendo o SENHOR que ele
se voltava para ver, Deus, do meio da sarça, o chamou e
disse: Moisés! Moisés! Ele respondeu: Eis-me aqui! Deus
continuou: Não te chegues para cá; tira as sandálias dos
pés, porque o lugar em que estás é terra santa. Disse mais:
Eu sou o Deus de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de
Isaque e o Deus de Jacó. Moisés escondeu o rosto, porque
temeu olhar para Deus.

Outra passagem importante registra o texto de Mateus 2,13-23:

Tendo eles partido, eis que apareceu um anjo do Senhor a


José, em sonho, e disse: Dispõe-te, toma o menino e sua
mãe, foge para o Egito e permanece lá até que eu te avise;
porque Herodes há de procurar o menino para o matar.
Dispondo-se ele, tomou de noite o menino e sua mãe e
partiu para o Egito; e lá ficou até à morte de Herodes, para
que se cumprisse o que fora dito pelo Senhor, por
intermédio do profeta: Do Egito chamei o meu Filho.
Vendo-se iludido pelos magos, enfureceu-se Herodes
grandemente e mandou matar todos os meninos de Belém
e de todos os seus arredores, de dois anos para baixo,
conforme o tempo do qual com precisão se informara dos
magos. Então, se cumpriu o que fora dito por intermédio
do profeta Jeremias: Ouviu-se um clamor em Ramá,
pranto, [choro] e grande lamento; era Raquel chorando por
seus filhos e inconsolável porque não mais existem. Tendo
Herodes morrido, eis que um anjo do Senhor apareceu em
sonho a José, no Egito, e disse-lhe: Dispõe-te, toma o
menino e sua mãe e vai para a terra de Israel; porque já
24 |TIPOLOGIA BÍBLICA I

morreram os que atentavam contra a vida do menino.


Dispôs-se ele, tomou o menino e sua mãe e regressou para
a terra de Israel. Tendo, porém, ouvido que Arquelau
reinava na Judéia em lugar de seu pai Herodes, temeu ir
para lá; e, por divina advertência prevenido em sonho,
retirou-se para as regiões da Galiléia. E foi habitar numa
cidade chamada Nazaré, para que se cumprisse o que fora
dito por intermédio dos profetas: Ele será chamado
Nazareno.

3.2 José, um tipo de Cristo

Gênesis 37,8 narra um pequeno trecho da história de José:


“Então, lhe disseram seus irmãos: Reinarás, com efeito, sobre nós? E
sobre nós dominarás realmente? E com isso tanto mais o odiavam, por
causa dos seus sonhos e de suas palavras.”

4 SACERDOTES E LEVITAS

Esta seção vai abordar as figuras bíblicas “sacerdotes e levitas”.


Explicará que estas representações são consideradas chaves de
interpretação. Vai explicar que, com estas chaves de leitura, a exegese
deve partir de Melquisedeque para poder entender as tradições levíticas.
Vai percorrer nessa mesma leitura algumas situações do Antigo e Novo
Testamento.

4.1 Sacerdotes

O objetivo é estudar as diversas tradições de Melquisedeque,


relacionando-as com as expectativas messiânicas apresentadas no
F A C U L D A D E S F A C E T E N | 25

contexto bíblico, mostrando como a hermenêutica cristã, em especial a


Carta aos Hebreus, realizou uma elucidação do conceito de messias ao
relacionar Jesus com Melquisedeque, num esquema de continuidade e
plenificação.
No período intertestamentário, que vai do final da dominação
grega até o aparecimento dos primeiros escritos cristãos, diversas
concepções sobre o messias encabeçaram uma coleção de escritos
conhecidos como apócrifos (ou pseudepígrafos) do Antigo Testamento.
Foi nesse ambiente que a doutrina sobre o messias tomou uma forma
mais definitiva.
A repatriação dos exilados da Babilônia foi um passo
necessário para determinar o papel do messias nos escritos mais
recentes. É nesse período que surge a pergunta “por que Yahweh
permite que o justo sofra?”
Em resposta a isso, Israel desenvolve textos apocalípticos e
escatológicos, nos quais expressavam seu anseio de justiça e de
recompensa pelos males sofridos (primeiro e o segundo livro de
Henoque, os Salmos de Salomão, Baruc e Jubileus). Esse conjunto
literário tornou-se uma saída depois do fracasso da dinastia hasmonea
em relação à efetivação de uma soberania nacional plena. Nesses livros,
o messias retratado é intensamente espiritual, escatológico e
apocalíptico.
John J. Collins, na sua obra intitulada The Scepter and the Star
“O Cetro e a Estrela”, lista figuras considerativas de Melquisedeque: um
26 |TIPOLOGIA BÍBLICA I

Messias Davídico real; uma diarquia formada por um Messias sacerdotal


e um Messias real; a combinação dos papéis de Mestre, Sacerdote e
Profeta em uma só figura; um salvador angelical ou divino que aparece
sob as designações de “Filho do Homem” ou de “Filho de Deus”.
Em Gênesis 14,17-24 nasce a tradição de Melquisedeque:

“Após voltar Abrão de ferir a Quedorlaomer e aos reis que


estavam com ele, saiu-lhe ao encontro o rei de Sodoma no
vale de Savé, que é o vale do Rei.” “Melquisedeque, rei de
Salém, trouxe pão e vinho; era sacerdote do Deus
Altíssimo;” “abençoou ele a Abrão e disse: Bendito seja
Abrão pelo Deus Altíssimo, que possui os céus e a terra;”
“e bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus
adversários nas tuas mãos. E de tudo lhe deu Abrão o
dízimo.” “Então, disse o rei de Sodoma a Abrão: Dá-me as
pessoas, e os bens ficarão contigo.” “Mas Abrão lhe
respondeu: Levanto a mão ao SENHOR, o Deus
Altíssimo, o que possui os céus e a terra,” “e juro que nada
tomarei de tudo o que te pertence, nem um fio, nem uma
correia de sandália, para que não digas: Eu enriqueci a
Abrão;” “nada quero para mim, senão o que os rapazes
comeram e a parte que toca aos homens Aner, Escol e
Manre, que foram comigo; estes que tomem o seu
quinhão.”

4.2 Levitas

As tradições dos levitas devem ser pesquisadas e analisadas a


partir do reino do norte Israel. Antigas tradições ligadas a Efraim
mostram que eles eram itinerantes desenvolvendo funções sacerdotais
em vilas e santuários locais (Juízes 19-20). Também esses levitas
gozavam de certos prestígios (Juízes 17,13).
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Ezequiel 44,10-14 faz uma clara condenação aos levitas que


atuavam nos lugares altos:

Os levitas, porém, que se apartaram para longe de mim,


quando Israel andava errado, que andavam transviados,
desviados de mim, para irem atrás dos seus ídolos, bem
levarão sobre si a sua iniquidade. Contudo, eles servirão
no meu santuário como guardas nas portas do templo e
ministros dele; eles imolarão o holocausto e o sacrifício
para o povo e estarão perante este para lhe servir. Porque
lhe ministraram diante dos seus ídolos e serviram à casa de
Israel de tropeço de maldade; por isso, levantando a mão,
jurei a respeito deles, diz o SENHOR Deus, que eles
levarão sobre si a sua iniquidade. Não se chegarão a mim,
para me servirem no sacerdócio, nem se chegarão a
nenhuma de todas as minhas coisas sagradas, que são
santíssimas, mas levarão sobre si a sua vergonha e as suas
abominações que cometeram. Contudo, eu os encarregarei
da guarda do templo, e de todo o serviço, e de tudo o que
se fizer nele.

Para o período do segundo templo (a partir de 515 a.C.), o juízo


determinará que esses levitas serão apenas encarregados de serviços
gerais. Já com o sacerdócio sadoquita, que participou do “castigo de
YHWH”, Ezequiel 44,15-31 afirma que eles ocuparão o serviço
principal do templo, terão direitos particulares sobre as oferendas e
instruirão o povo.
Para Ezequiel que está no exílio e entre os exilados, o
sacerdócio legítimo para dirigir o templo de Jerusalém no período pós-
exílico são os descendentes de Sadoc. Os levitas tornam-se meros
subordinados (Cf. I Crônicas 23,27-32).
28 |TIPOLOGIA BÍBLICA I

Em Números 3,5-10 legitima-se essa hierarquização dizendo


que os levitas devem obedecer a Aarão:

Yahweh Falou a Moisés e disse: “Faze chegar a tribo de


Levi e pôe-na à disposição de Aarão, o sacerdote: eles
estarão a seu serviço. Encarregar-se-ão dos deveres que
lhe pertencem, bem como os deveres de toda a
comunidade, na Tenda da Reunião, ao ministrarem na
Habitação. Cuidarão de todos os utensílios da Tenda da
Reunião e encarregar-se-ão daquilo que compete aos
israelitas, ao ministrarem na Habitação. Darás, pois, a
Aarão e a seus filhos os levitas, como „doados‟, eles lhe
serão doados pelos israelitas. Registrarás Aarão e seus
filhos, que desempenharão o seu ofício sacerdotal. Porém,
todo profano que se aproximar será punido de morte”.

Outra passagem que registra o texto de Deuteronômio 10,8-9 e


faz prenúncios de algo que se cumpre no Novo Testamento aparece no
pentateuco:

Por esse mesmo tempo, o SENHOR separou a tribo de


Levi para levar a arca da Aliança do SENHOR, para estar
diante do SENHOR, para o servir e para abençoar em seu
nome até ao dia de hoje. Pelo que Levi não tem parte nem
herança com seus irmãos; o SENHOR é a sua herança,
como o SENHOR, teu Deus, lhe tem prometido.

Breve conclusão

Decerto que as culturas, em suas relações de legado ou


intercâmbio, possuem uma dinâmica própria, e que a perspectiva do
analista não há de ser judicativa, mas de revelar os traços de como
funcionam suas trocas. É sabido também que, no caso específico do
judaísmo e cristianismo, as polêmicas, desencontros e divergências,
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existiram e existem reciprocamente. Foi, contudo, a tarefa pretendida


pela presente pesquisa, mostrar o quão relevante é o cerne da visão
cristã acerca de seu livro fundamental, a Bíblia, para a criação, bem
como a legitimação, da composição e da disseminação de formas
depreciativas de representar o povo judeu. Da importância dos métodos
(da tipologia) de interpretação da Bíblia, que facilitam e se engajam na e
para a reflexão teológica.
30 |TIPOLOGIA BÍBLICA I

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ciência da linguagem. Trad. Maria Stela Gonçalves. São Paulo, Loyola,
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(Amós 7,10): reflexão e estudo sobre Amós. São Paulo: Paulinas, 2004.

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Marvell to Pope in MINER, Earl. Literary uses of typology from the
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32 |TIPOLOGIA BÍBLICA I

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