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Departamento de Otorrinolaringologia e Distúrbios da Comunicação Humana

Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina

ROTEIRO DE AULA

AVALIAÇÃO AUDIOLÓGICA - Claudia Fukuda

A avaliação audiológica tem por objetivo não apenas verificar quanto e como um indivíduo ouve
mas, também, ajudar a direcionar o diagnóstico nos casos de lesão do sistema auditivo, tanto no
tocante ao local quanto à causa da lesão.

1.TESTES COM DIAPASÃO

O diapasão é um instrumento de metal em forma de forquilha que ao ser percutido produz um


tom puro cuja freqüência varia conforme a espessura de suas hastes.
Pouco usado atualmente, pode ser útil na ausência de recursos mais sofisticados devido ao baixo
custo e simplicidade de execução dos testes. Serve para diagnosticar possível perda auditiva e
tipo da perda.

Teste de Rinne – percute-se o diapasão e coloca-se primeiramente na mastóide (transmissão por


via óssea) do paciente e após nova percussão coloca-se na frente do pavilhão auricular
(transmissão por via aérea). Normalmente o som é ouvido mais intensamente e prolongadamente
por via aérea, resultando no Rinne positivo. Caso o resultado se inverta, denominamos Rinne
negativo, significando que o paciente deve ter disacusia do tipo condutivo.

Teste de Weber – toca-se o diapasão e coloca-se no vértex ou na fronte do paciente que deve
ouvir o som igualmente com ambas as orelhas. Caso o paciente ouça melhor com uma das
orelhas dizemos que o Weber está lateralizado. Ele pode lateralizar para melhor orelha no caso de
perda neurosensorial ou para pior orelha na perda condutiva.

Teste de Schwabach – é a comparação do tempo de escuta do som entre o examinador e o


paciente. O diapasão deve ser posicionado na mastóide de cada um. Se o tempo do paciente for
maior dizemos que o Schwabach está prolongado, indicando alteração do tipo condutivo. Se for
menor, dizemos que o Schwabach está encurtado, o que é sinal de alteração do tipo
neurosensorial.

2. AUDIOMETRIA

A audiometria é o teste que quantifica a audição do indivíduo. Via de regra, ela deve ser
executada em um ambiente acusticamente isolado para não sofrer interferência do ruído externo.
Este ambiente pode ser uma cabine acústica ou uma sala com isolamento acústico. O
equipamento mais utilizado é o audiômetro, que emite tons puros e permite também a emissão da
voz do examinador. Geralmente a pessoa avaliada recebe o estímulo sonoro através de fones,
porém, também poderão ser utilizadas caixas acústicas com alto-falantes (audiometria em campo).
Pode ser realizado a partir de 4 anos de idade, desde que o paciente tenha compreensão
suficiente para executar as respostas.

Audiometria tonal

Utilizado na detecção dos limiares auditivos da via aérea e óssea. Para testar a via aérea utiliza-
se um fone de ouvido sendo emitidos tons puros nas freqüências de 250, 500, 1000, 2000, 3000,
4000, 6000 e 8000 Hz, e cada freqüência é testada separadamente com intensidades decrescentes
de 120 a –5 dB . O paciente deve sinalizar com a mão ou apertar um botão cada vez que ouvir o
tom. Já para a via óssea é utilizado um vibrador colocado na região mastóide, avaliando-se
somente as freqüências de 500, 1000, 2000, 3000 e 4000 Hz até a intensidade máxima de 70 dB
devido às limitações do audiômetro. Testa-se uma orelha de cada vez Quando se suspeita de
perdas assimétricas, utiliza-se um ruído tipo chiado denominado mascarante para impedir a
interferência da melhor orelha na pior.

Crianças entre 3 e 6 anos podem necessitar de aparatos (brinquedos) que as estimulem a executar
a tarefa de ouvir e responder aos sons. Um artifício bastante usado é um boneco de palhaço com
botão no nariz. Cada vez que a criança ouve o som e aperta o botão corretamente aparece um
desenho em uma TV a sua frente.

Os resultados do exame são colocados em um gráfico (vide figura ) com as seguinte


representação:
O (círculo na cor vermelha) para os limiares da via aérea na orelha direita
X ( xis na cor azul ) para os limiares da via aérea na orelha esquerda
< ( sinal de menor na cor vermelha ) para os limiares da via óssea na orelha direita
> ( sinal de maior na cor azul ) para os limiares da via óssea na orelha esquerda
Cada um destes sinais pode vir acompanhado de uma seta para baixo caso a máxima intensidade
do aparelho tenha sido emitida e o paciente não tenha conseguido ouvir. Os sinais de cada orelha
são interligados formando uma curva.

Limiares entre 0 e 25 dB NA são considerados normais. Limiares maiores são considerados como
perda auditiva. De acordo com a média dos limiares nas freqüências de 500, 1000 e 2000 Hz a
perda auditiva pode ser classificada em graus:

Leve 26 – 40 dB NA
Moderada 41 – 70 dB NA
Severa 71 – 90 dB NA
Profunda > 90 dB NA

Em crianças o intervalo entre 16 e 25 dB NA é considerado perda discreta.

Como já foi dito, quando os limiares estão anormais dizemos que há perda auditiva. Se a curva
dos limiares aéreo e ósseo estiverem acopladas,isto é, se os limiares das duas vias forem iguais,
dizemos que a perda é neurosensorial. Quando somente o limiar da via aérea estiver aumentado
significa que temos alteração na via condutiva, havendo então, uma diferença entre o limiar da via
aérea e o da via óssea denominada gap. Caso haja gap e os limiares da via óssea também
estejam aumentados teremos uma perda mista ( condutiva e sensorial).

Audiometria vocal

Visa avaliar a capacidade do indivíduo em perceber e compreender os sons da fala. Ao invés de


tons puros o examinador fala algumas palavras e pede para o paciente repetir. É realizado em
duas etapas:

Pesquisa do limiar de reconhecimento da fala ( speech reception threshold – SRT)


É a mínima intensidade na qual o indivíduo consegue repetir pelo menos 50% das palavras que
foram faladas. Geralmente corresponde à média dos limiares nas freqüências de 500, 1000 e
2000 Hz.

Pesquisa do índice percentual de reconhecimento de fala (IPRF)


Mais conhecido como discriminação vocal, neste teste o examinador fala cerca de 25 palavras,
geralmente monossílabos, em uma intensidade 25 ou 30 dB NA acima da média dos limiares em
500, 1000 e 2000 Hz. A porcentagem de acertos corresponde ao IPRF que normalmente é maior
ou igual a 92%. Patologias retrococleares costumam cursar com IPRF baixos.
Avaliação audiológica comportamental

Utilizada para crianças menores de 3 anos de idade ou com atraso do desenvolvimento


neuropsicomotor. A estimulação sonora é feita através de instrumentos musicais, que emitem
sons com freqüência e intensidade próprios. Observa-se se a criança tem reação de susto com
sons de elevada intensidade ( reflexo cocleo-palpebral), se olha para a fonte sonora etc.

3. IMITANCIOMETRIA

É o exame no qual verificamos as condições da orelha média, mais especificamente do sistema


tímpano-ossicular, e da via do reflexo do estapédio. É composto de duas etapas: a timpanometria
e a pesquisa do reflexo do estapédio.

Timpanometria

Corresponde à medida da pressão na orelha média, obtida através da admitância ou impedância


do sistema tímpano ossicular. Ao se injetar uma pressão positiva no meato acústico externo o
conjunto tímpano ossicular é deslocado medialmente. Com +200 daPa esse deslocamento é
máximo e portanto a impedância também é. Conforme a pressão diminui, no momento em que a
pressão de ar do conduto se iguala à pressão da orelha média a membrana timpânica atinge sua
posição de menor impedância, ocorrendo um pico no timpanograma, que normalmente é igual ou
próximo de O daPa.

Curva da timpanometria:
Tipo A = curva normal com pico próximo ou igual a 0 daPa
Tipo As = pico em 0daPa mas com amplitude reduzida; sinal de rigidez do conjunto tímpano-
ossicular
Tipo Ad = pico em 0 daPa mas com amplitude muito aumentada; sinal de flacidez, desarticulação
Tipo B = ausência de pico; sinal de líquido na orelha média
Tipo C = pico deslocado para pressões negativas; sinal de disfunção tubárea.

Pesquisa do reflexo do estapédio

Este reflexo tem a função de proteger a cóclea quando o ouvido é exposto a um som de
intensidade muito elevada. Quando a via do reflexo é ativada o músculo do estapédio de ambas
orelhas se contrai, enrijecendo a cadeia ossicular, o que leva a uma mudança na imitância. Esta
via é composta pela cóclea, o VIII nervo, o núcleo coclear ventral, o complexo olivar superior, o
núcleo motor do facial e o ramo motor do nervo facial.
Neste teste detectamos a intensidade sonora mínima para qual ocorre o reflexo nas freqüências de
500, 1000, 2000 e 4000 Hz. Um tom puro é emitido com a pressão no pico de compliância
máxima. Em indivíduos normais o reflexo é desencadeado com intensidade entre 70 e 100 dB
NA acima do limiar auditivo. Quando a diferença entre o limiar do reflexo e o limiar auditivo é
menor que 60 dB NA dizemos que há recrutamento, o que é sugestivo de lesão coclear.

A ausência de reflexo significa que o paciente tem perda auditiva em grau intenso o suficiente
para inibir o reflexo ou que a orelha média apresenta alteração ou que há lesão na via do reflexo.

4. OTOEMISSÕES ACÚSTICAS

São sons de baixíssima intensidade que resultam do mecanismo ativo de recepção do som pela
cóclea no qual as células ciliadas externas desempenham o papel principal. Estes sons percorrem
o caminho reverso ao do som que entra pelas nossas orelhas, sendo imperceptíveis ao homem
mas podendo ser captados por microfones muito sensíveis colocados no meato acústico externo.
Rápido e de fácil aplicação este teste tem ganhado espaço na triagem auditiva de recém-nascidos
e crianças pequenas, auxiliando ainda no reconhecimento de simuladores. Uma sonda conectada a
um computador é colocada no ouvido do paciente com oliva igual ao da imitanciometria. O exame
dura cerca de 3 minutos e não depende da cooperação do paciente quanto a atenção e
compreensão para sua execução; exige apenas que não haja alteração na orelha externa ou
média. O exame deve ser programado no computador que se encarrega de emitir os sons que
servem de estímulo para as orelhas e de analisar a otoemissão que surge em resposta a esse som.

De acordo com o estímulo sonoro usado o exame de otoemissão pode ser do tipo transiente
evocada quando o estímulo são clicks ou por produto de distorção quando o estímulo são pares de
tons puros. Quando a amplitude das otoemissões está diminuída ou não há otoemissões podemos
dizer que há alteração no funcionamento das células ciliadas externas ou na via auditiva eferente.
Também nestes casos o limiar auditivo costuma estar aumentado, situando-se geralmente acima
de 30-40 dB NA.

5. POTENCIAIS EVOCADOS AUDITIVOS

São potenciais elétricos que surgem através de um estímulo acústico (geralmente click fornecido
através de fones)e que refletem a atividade do sistema auditivo. Estes potencias podem ser de
curta, média ou longa latência dependendo do tempo que a onda leva para ser captada. Quanto
mais distante o sítio gerador, maior é o tempo de latência da onda que representa o potencial.
Assim, os potenciais gerados na cóclea têm curta latência e os gerados no córtex, longa latência.
Estes potenciais dependem do limiar auditivo do paciente. Quanto pior o limiar, menor amplitude
eles tendem a apresentar, podendo inclusive não ser visualizados. .Na prática do dia-a-dia do
otorrinolaringologista, os únicos potenciai são os de curta latência, obtidos em 2 exames: a
eletrococleografia e as respostas auditivas de tronco encefálico.

Eletrococleografia

É o exame que confirma o diagnóstico de hydrops endolinfático. Os eletrodos são colocados nas
orelhas sendo que o mais importante deles deve ser colocado o mais próximo possível da
membrana timpânica da orelha testada ou, melhor ainda, transfixar a membrana (eletrodo em
agulha). São medidos 2 potenciais: o de somação(SP) que parece relacionar-se à a excursão da
membrana basilar em direção à escala média e o potencial de ação (AP) que representa a
despolarização das células ciliadas internas e das células do gânglio espiral ou de Corti. A
amplitude dos dois potenciais é medida e comparada. Uma relação SP/AP maior que 30-35% é
considerado como sinal de hydrops endolinfático.

Respostas auditivas de tronco encefálico (ABR)

Mais conhecida pela antiga designação BERA – brainstem evoked response audiometry – termo
inadequado pois não se trata de uma audiometria, este exame é de grande utilidade
principalmente na avaliação auditiva de crianças pouco cooperantes pois pode ser realizado sob
sedação ou anestesia geral. Os eletrodos são colocados geralmente nas orelhas, vertex e fronte.
As ondas obtidas correspondem a despolarização no nervo auditivo ( onda I e II), núcleo coclear
(onda III), complexo olivar superior e leminisco lateral ( onda IV) e colículo inferior ( onda V). O
aumento da latência das ondas acima dos valores padrões pode significar alteração patológica
nesta via; daí a sua grande indicação que é o diagnóstico de neurinoma do acústico. É normal que
com a redução da intensidade dos estímulos a latência das ondas aumente e a amplitude diminua.
A última onda a desaparecer com a redução do estímulo é a onda V. Desta forma podemos obter
o limiar auditivo para click , que corresponderá a menor intensidade onde a onda V é visualizada.
Este limiar é muito próximo do limiar audiométrico ao redor de 4000 Hz.
AVALIAÇÃO DO PROCESSAMENTO AUDITIVO CENTRAL

Existem indivíduos que queixam-se de ouvir mal mas, quando submetidos a audiometria mostram
resultados normais. Isto é possível devido a problemas no processamento auditivo central, ou
seja, o indivíduo escuta bem mas a informação auditiva ouvida não é bem interpretada. Muitas
vezes este tipo de alteração também ocorre concomitantemente a alteração de limiares auditivos
com redução da discriminação vocal. O local de disfunção não necessariamente tem de estar no
córtex cerebral, podendo localizar-se em qualquer parte da via auditiva central a partir dos núcleos
cocleares no tronco encefálico. Indivíduos com alteração de processamento auditivo central
comumente têm dificultade em conversar em ambiente ruidoso, com várias pessoas ao mesmo
tempo ou ao telefone. No caso de crianças, podem apresentar dificuldade de aprendizado na
escola, geralmente relacionado a leitura e escrita. A avaliação é feita em cabine acústica, com
fones. Os testes são padronizados, apresentados através de CD ou fita cassete. São diversos, na
maioria com palavras ou frases, podendo ou não ter estimulação auditiva contralateral simultânea
ou alternada. As alterações encontradas podem indicar o sítio de lesão da via auditiva, mas é
mais conveniente interpretá-los com relação ao tipo e grau de disfunção.

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