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E MEDICINA MATERnO-FETAL
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privada pela AGECOP – Associação para a Gestão da Cópia Privada, através
do pagamento das respetivas taxas.
ÍNDICE
Autores............................................................................................................................... XI
Introdução........................................................................................................................ XIX
Siglas e abreviaturas ................................................................................................... XXI
14 Encarceramento Uterino........................................................................................ 53
Maria Pulido Valente, Cristiana Marinho Soares, Susana Santo
VI Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
15 Insuficiência Cervical............................................................................................... 55
Sílvia Serrano, Maria de Carvalho Afonso
16 Colo Curto................................................................................................................... 57
Maria de Carvalho Afonso, Diogo Ayres de Campos, Luísa Pinto
17 Ciclorrafia Cervical por Via Transvaginal .......................................................... 60
Joana Goulão Barros, Maria de Carvalho Afonso
18 Parto Pré-Termo Espontâneo e Tocólise ........................................................... 65
Diogo Ayres de Campos, Luísa Pinto
19 Hipertensão Gestacional, Pré-Eclâmpsia e Síndrome de HELLP .............. 69
Inês Martins, Joana Goulão Barros, Diogo Ayres de Campos
20 Placenta Prévia e de Inserção Baixa................................................................... 75
Diogo Ayres de Campos, Luísa Pinto
21 Descolamento Prematuro da Placenta.............................................................. 78
Luísa Pinto, Diogo Ayres de Campos
22 Gravidez Múltipla – Vigilância Pré-Natal e Complicações.......................... 80
Andreia Fonseca, Mónica Centeno
23 Rotura Prematura de Membranas....................................................................... 87
Inês Martins, Diogo Ayres de Campos, Luísa Pinto
24 Macrossomia Fetal ................................................................................................... 91
Catarina Policiano, Cláudia Araújo
25 Polihidrâmnios........................................................................................................... 93
Sara Vargas, Susana Santo
26 Colestase Gravídica.................................................................................................. 96
Rita Mendes Silva, Diogo Ayres de Campos
27 Isoimunização Rh (D) – Prevenção e Abordagem......................................... 99
Andreia Fonseca, Susana Santo
28 Hidrópsia Fetal Não Imune .......................................................... 103
Maria Pulido Valente, Maria de Carvalho Afonso
29 Restrição de Crescimento Fetal .................................................... 107
Joana Goulão Barros, Rui Marques de Carvalho
30 Arritmias Cardíacas Fetais ........................................................... 111
Susana Santo, Mónica Rebelo
31 Morte Fetal .............................................................................. 115
Susana Rego, Rui Marques de Carvalho, Luísa Pinto, Diogo Ayres de Campos,
Cristina Ferreira
32 Interrupção Médica da Gravidez ................................................... 121
Mariana Pimenta, Inês Francisco Pereira
INTRODUÇÃO
A datação correta da gravidez é um aspeto essencial para a decisão clínica em
Obstetrícia, particularmente em situações de interrupção da gravidez, perivia-
bilidade, prematuridade e no termo da gravidez. Classicamente, a datação da
gravidez realiza-se contando os dias que decorreram desde o primeiro dia da
última menstruação (data da última menstruação ou DUM) e dividindo por 7, de
forma a ser expressa em semanas e dias. No entanto, a datação por DUM é por
vezes incerta, sendo preferível que seja realizada por ecografia, calculando-se
a chamada idade gestacional ecográfica (IGE). A datação por IGE realizada por
ecografistas experientes entre as 8 e as 14 semanas de gestação (IGE precoce)
é comprovadamente precisa na sua estimativa, tendo uma margem de erro geral-
mente inferior a 5 dias. Quando a experiência do ecografista é menor ou quando
é realizada após as 14 semanas (IGE tardia) está associada a avaliações menos
precisas e com erros que podem ser clinicamente relevantes. O presente proto-
colo estabelece os critérios a seguir para uma datação o mais correta possível
da gravidez. Sempre que se explicita o tempo de gestação em semanas e dias
deve ser descrito o método de cálculo: por DUM certa, por IGE precoce, por IGE
tardia, de forma a transmitir-se informação sobre a segurança desta datação.
BIBLIOGRAFIA
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VIGILÂNCIA PRÉ-NATAL DE ROTINA 2
M ARIANA PIMENTA, LUÍSA PINTO, CLÁUDIA M ILHINHOS, DIOGO AYRES DE CAMPOS
INTRODUÇÃO
A vigilância pré-natal tem como principais objetivos: identificar e atuar preco-
cemente perante fatores de risco e complicações que possam afetar a normal
evolução da gravidez, promover a educação para a saúde e apoiar na preparação
para o parto e para a parentalidade. As presentes orientações são a base dos
cuidados pré-natais de rotina, não contemplando cuidados específicos para
situações clínicas particulares.
PRIMEIRA CONSULTA
Consulta de enfermagem
■ Entrega ou informação sobre o local onde pode consultar panfletos informa-
tivos: “Hábitos e estilos de vida na gravidez”, “Desconfortos e modificações
corporais na gravidez”. Perguntas e esclarecimentos sobre estes assuntos;
■ Avaliação do peso e altura;
■ Avaliação da TA com aparelho automático, após um período mínimo de 5 minu-
tos de descanso. A grávida deve estar sentada, com as pernas descruzadas,
cotovelo apoiado, braçadeira colocada ao nível do coração. Se perímetro do
braço <35 cm usar braçadeira de adulto, se entre 35-45 cm usar braçadeira
grande e se >45 cm usar braçadeira extragrande.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Consulta médica
■ Identificação de fatores de risco;
■ Perguntas, esclarecimentos e medidas de alívio relativas a sintomas maternos;
■ Entrega ou informação sobre o local onde pode consultar panfletos informa-
tivos: “Leis e subsídios para proteção da parentalidade”, “Alimentação na
gravidez”, “Exames de rotina na gravidez”, “Queixas na gravidez que a devem
6 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
CONSULTAS SUBSEQUENTES
Consulta de enfermagem
■ Perguntas e esclarecimentos sobre hábitos e estilos de vida, desconfortos e
modificações corporais na gravidez;
■ Avaliação do peso e TA;
■ Avaliação da proteinúria (tira-teste) a partir das 20 semanas, se TA sistólica
≥140 mmHg ou TA diastólica ≥90 mmHg;
■ Auscultação cardíaca fetal (Doppler), a partir das 15 semanas;
■ Avaliação da altura uterina a partir das 24 semanas;
■ Inquirir sobre presença de movimentos fetais a partir das 24 semanas. No
caso de notar uma diminuição acentuada do padrão de movimentos fetais,
recomendar a contagem formal diária dos movimentos fetais a partir da hora
de acordar, parando logo que chegar aos 10 movimentos. No caso de não chegar
aos 10 movimentos até às 20:00 ou de haver um prolongamentoacentuado do
tempo que demora a chegar aos 10 movimentos, deve recorrerà urgência de
Obstetrícia e Ginecologia;
■ Entrega ou informação sobre o local onde pode consultar panfletos infor-
mativos: “O que devo preparar em casa para a altura do parto?”, “Métodos
naturais para alívio da dor do parto”, “Aleitamento materno” e “Cuidados
ao recém-nascido”, a partir das 30 semanas. Perguntas e esclarecimentos sobre
estes assuntos;
■ Cardiotocografia (CTG) a partir das 40 semanas.
Consulta médica
■ Perguntas, esclarecimentos e medidas de alívio relativas a sintomas maternos;
■ Entrega ou informação sobre o local onde pode consultar panfletos informa-
tivos: “Quando e como será o meu parto”, “Métodos farmacológicos para alívio
da dor no parto”, a partir das 30 semanas. Perguntas e esclarecimentossobre
estes assuntos;
■ Recomendar vacina da gripe entre outubro e dezembro, independentemente das
semanas de gravidez. Passar receita, mas transmitir que deve averiguar
primeiro a disponibilidade da mesma no Centro de Saúde;
Vigilância Pré-Natal de Rotina 7
ANÁLISES
Primeira consulta (idealmente no 1.º trimestre)
■ Grupo sanguíneo (AB0 e Rh) e pesquisa de anticorpos irregulares;
■ Hemograma com plaquetas. Eletroforese da hemoglobina (Hb) em grávidas
provenientes da África subsariana;
■ Ferritina se: anemia prévia, intervalo intergestacional <18 meses, adolescente,
vegetariana, história de hemorragia recente ou testemunha de Jeová;
■ Hormona estimulante da tiroide (TSH) se: bócio, antecedentes de doen-
ça inflamatória crónica do intestino ou de cirurgia bariátrica, antecedentes
pessoais ou familiares de disfunção tiroideia, clínica sugestiva de disfunção
tiroideia, tiroidectomia prévia, anticorpos antitiroideus positivos, diabetes tipo
1 ou outras doenças autoimunes, irradiação cervical, infertilidade/aborto de
repetição ou utilização de fármacos como lítio e amiodarona;
■ Glicemia em jejum de pelo menos 8 horas;
■ Serologias para: rubéola (se não imune em preconceção), toxoplasmose (se não
imune em preconceção), citomegalovírus (CMV) (se não imune em pre-
conceção), anticorpo anti-Treponema pallidum, antigénio de superfície do VHB
(Ag HBs), vírus da imunodeficiência humana (VIH) 1 e 2;
■ Antivírus da hepatite C (anti-VHC) se consumo de drogas intravenosas ou
intranasais, hemodiálise, transfusões antes de 1992, ou parceiro infetado pelo
VHC;
■ Urocultura;
■ Rastreio de aneuploidias (ver protocolo “3. Rastreio de aneuploidias”);
Rastreio de pré-eclâmpsia (ver protocolo “4. Rastreio de pré-eclâmpsia”).
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Às 18-20 semanas
■ Serologia para rubéola (se não imune no 1.º trimestre).
8 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Às 24-28 semanas
■ Pesquisa de anticorpos irregulares (se grávida Rh-);
■ Hemograma com plaquetas;
■ Prova de tolerância à glicose oral (PTGO) com 75 g de glicose (jejum de
pelo menos 8 horas);
■ Serologia para toxoplasmose (se não imune no 1.º trimestre);
■ Urocultura.
Às 32-34 semanas
■ Hemograma com plaquetas;
■ Anticorpo anti-Treponema pallidum, Ag HBs (se negativo no 1.º trimestre),
VIH 1 e 2, serologia da toxoplasmose (se não imune na avaliação anterior);
■ Urocultura.
ECOGRAFIAS
■ 1.º trimestre: entre as 11+0-13+6 semanas;
■ 2.º trimestre: entre as 20+0-2+6 semanas;
■ 3.º trimestre: entre as 32+0-34+0 semanas.
CASOS ESPECÍFICOS
Grávidas com cesariana anterior
■ Entregar folheto informativo “Tive uma cesariana no passado – o que é im-
portante saber?” às 35 semanas;
■ Propor tentativa de parto vaginal após cesariana (PVAC). Caso a grávida aceite,
obter consentimento informado escrito. No caso de a grávida não aceitar um
parto vaginal, agendar cesariana para as 39 semanas.
BIBLIOGRAFIA
D IREçãO-GERAL DA S AÚDE . Programa Nacional para a vigilância da gravidez de baixo risco.
2015.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO recommendations on antenatal care for a positive pre-
gnancy experience. 2016.
ANEXO 1
Critérios de referenciação para a consulta de nutrição
■ Índice de massa corporal (IMC) ≥30 kg/m2;
■ Antecedentes de cirurgia bariátrica;
■ Diabetes gestacional (DG) ou diabetes pré-gestacional;
■ Aumento ponderal excessivo ou deficitário durante a gestação.
■ Solicitação da grávida.
ANEXO 2
Critérios para referenciação à consulta pré-concecional
■ Diabetes mellitus, doença renal crónica (DRC), doenças do tecido conjuntivo,
■ Doença cardíaca ou pulmonar grave;
■ Abortos de repetição (≥3 consecutivos);
■ Antecedentes de aborto/morte fetal após as 14 semanas;
■ Mulheres sob terapêutica potencialmente teratogénica (cumarínicos, imunos-
supressores, ácido valproico, etc.).
Vigilância Pré-Natal de Rotina 11
Antecedentes obstétricos
■ Abortos de repetição (≥3 consecutivos) ou aborto/morte fetal após as 14
semanas;
■ Insuficiência cervical;
■ Parto pré-termo (PPT) antes das 35 semanas;
■ Pré-eclâmpsia grave ou de início antes das 34 semanas, eclâmpsia;
■ Morte fetal ou morte neonatal precoce associada a problemas da gravidez
ou parto;
■ Doença gestacional do trofoblasto.
Patologia materna
■Tromboembolismo prévio;
■Doença cardíaca;
■HTA crónica;
■DRC;
■Diabetes mellitus ou outra patologia endócrina;
■Doença psiquiátrica não controlada ou sob terapêutica;
■Doença hematológica: anemia (Hb <10,5 g/dl, após ferro oral), hemoglobino-
patia (na talassemia minor e traço falciforme apenas se eletroforese da Hb
do progenitor masculino estiver alterada), trombocitopenia;
■Doença neurológica;
■Doença oncológica, se não considerada em remissão;
■Asma brônquica com crises apesar da medicação habitual;
■ síndrome
Doença de anticorpos
autoimune [lúpus antifosfolípidos (SAAF); (LES) e outras colagenoses],
eritematoso sistémico
IDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
■ Malformação uterina;
■ Infeção atual por VIH, Toxoplasma gondii, rubéola, CMV, parvovírus ou Trepo-
nema pallidum;
■ Outra patologia materna grave;
Doenças da gravidez
■ Pré-eclâmpsia, hipertensão gestacional;
■ DG;
■ Gravidez múltipla;
■ Ameaça de parto pré-termo (APPT), colo curto;
■ Colestase gravídica.
INTRODUÇÃO
O rastreio pré-natal de aneuploidias deve ser oferecido a todas as grávidas com
≤20+0 semanas de gestação, para avaliar o risco do(s) feto(s) apresentar(em)
uma das anomalias cromossómicas mais frequentes – trissomia (T) 21, 18 ou
13. A estratificação do risco permite selecionar a população que mais beneficia
com a realização de testes adicionais. As limitações dos testes de rastreio
devem também ser transmitidas à grávida (ver abaixo).
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS, Society for Maternal-Fetal Me-
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ning for aneuploidies: updated meta-analysis. Ultrasound Obstet Gynecol. 2017;50(3):302-
-314.
RASTREIO DE PRÉ-ECLÂMPSIA 4
JOANA GOULãO BARROS , R UI M ARQUES DE C ARVALHO
INTRODUÇÃO
O rastreio de pré-eclâmpsia no 1.º trimestre da gravidez, que combina a avalia-
ção dos fatores de risco maternos com avaliações biofísicas e bioquímicas (ver
“Avaliações a incluir” abaixo), permite uma taxa de deteção de pré-eclâmpsia
antes das 32 semanas de ~89% e antes das 34 semanas de ~75%, com uma
taxa de falsos positivos de 10%. A administração de ácido acetilsalicílico (AAS)
diminui em ~80% a incidência de pré-eclâmpsia antes das 34 semanas.
INDICAÇÕES
O rastreio deve ser realizado entre as 11+0-13+6 semanas, no mesmo momento do
rastreio combinado de aneuploidias do 1.º trimestre. Deve ser proposto a todas
as grávidas exceto:
■ Se houver antecedentes de pré-eclâmpsia grave, de início anterior às 34
semanas;
■ Se houver antecedentes de restrição de crescimento fetal (RCF) grave, deinício
anterior às 32 semanas, tendo como causa provável uma insuficiência
placentária;
■ Gestação múltipla;
■ Se tiverem doença renal crónica (DRC).
Nestas situações deve ser recomendado o AAS (ver “Abordagem clínica”, à frente
neste capítulo) sem ser necessário realizar o rastreio.
AVALIAÇÕES A INCLUIR
Fatores de risco maternos
Idade, raça, peso, altura, hábitos tabágicos, antecedentes pessoais de hiper-
tensão arterial (HTA) crónica ou de pré-eclâmpsia, diabetes mellitus, lúpus eri-
tematoso sistémico (LES), síndrome de anticorpos antifosfolípidos (SAAF), mãe ou
irmã com antecedentes de pré-eclâmpsia. A serem introduzidos no software
Astraia pelo médico responsável pelo cálculo do rastreio.
ABORDAGEM CLÍNICA
Risco elevado (risco de pré-eclâmpsia antes das 37 semanas ≥1/100)
■ AAS 150 mg per os (PO) 1 vez/dia ao deitar, a iniciar entre as 12+0-15+6 semanas
(até às 36+0 semanas, até ao parto ou até ao desenvolvimento de pré-
eclâmpsia).
BIBLIOGRAFIA
GUY GP, L ESLIE K, D IAZ -GOMEZ D, et al. Implementation of routine first trimester combined
screening for pre‐eclampsia: a clinical effectiveness study. BJOG. 2021;128(1):141-142.
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POON LC, ZYMERI NA, ZAMPRAKOU A, et al. Protocol for measurement of mean arterial pressure
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e1-62.e10.
IDADE MATERNA AVANÇADA 5
M ARIA PULIDO VALENTE, RUI M ARQUES DE CARVALHO
INTRODUÇÃO
Define-se maternidade em idade materna avançada como a que ocorre depois dos
35 anos (inclusive). Em Portugal, cerca de 15% dos nascimentos de pri- meiros
filhos ocorrem nesta fase. O aumento da idade materna associa-se aum maior
risco das seguintes complicações obstétricas:
■ Aborto espontâneo: o risco aumentado deve-se sobretudo a alterações cro-
mossómicas. A taxa de aborto espontâneo em mulheres com menos de 35
anos é de 11,9%, entre os 35-39 anos é de 24,6% e após os 40 anos de 51%;
■ Gravidez ectópica (GE): risco 4-8 vezes maior, provavelmente devido à inci-
dência crescente de infeção pélvica e de doença tubária;
■ Anomalias cromossómicas: maior risco de aneuploidias, nomeadamente tris-
somias (T) (Tabela 5.1);
Tabela 5.1 – RISCO DAS PRINCIPAIS ANEUPLOIDIAS DE ACORDO COM A IDADE MATERNA
Idade Risco de Risco de Risco de Idade Risco de Risco de Risco de
materna T21 T18 T13 materna T21 T18 T13
(anos) (1: n) (1: n) (1: n) (anos) (1: n) (1: n) (1: n)
18 1495 9010 13700 34 455 4380 6345
19 1490 8985 13670 35 350 3530 5130
20 1475 8960 13635 36 265 2725 4030
21 1460 8930 13580 37 195 2025 3100
22 1440 8885 13510 38 145 1455 2370
23 1415 8825 13410 39 110 1035 1825
24 1380 8745 13275 40 85 735 1430
25 1340 8630 13090 41 66 530 1160
26 1285 8480 12840 42 54 395 970
27 1220 8280 12500 43 45 310 840
28 1140 8010 12050 44 39 250 745
29 1045 7660 11470 45 34 215 685
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
ABORDAGEM CLÍNICA
Rastreio de anomalias cromossómicas de acordo com protocolo “3. Rastreio
de aneuploidias”. Vigilância da gravidez na consulta de baixo risco, se idade
≥40 anos à data da conceção.
BIBLIOGRAFIA
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Reprod Biol. 2016;197:1-5.
ANTECEDENTES OBSTÉTRICOS RELEVANTES 6
CRISTIANA M ARINHO SOARES , I NÊS M ARTINS
INTRODUÇÃO
Algumas complicações da gravidez apresentam risco de recorrência em gesta-
ções futuras e a aplicação atempada de medidas preventivas pode melhorar os
desfechos obstétricos ulteriores. O presente protocolo indica as intervenções
clínicas preconizadas na avaliação puerperal, em preconceção e em gestações
subsequentes. A recorrência de algumas complicações da gravidez é abordada em
protocolos específicos.
INSUFICIÊNCIA CERVICAL*
■ Abstenção de atividade física intensa durante toda a gravidez;
■ Progesterona 200 mg per vagina (PV) 1 vez/dia ao deitar das 13+0-36+6 semanas;
■ Se houver antecedentes de ≥2 episódios sugestivos de insuficiência cervical,
propor ciclorrafia cervical indicada pela história às 14-15 semanas;
■ Havendo antecedentes de apenas um episódio sugestivo de insuficiência cer-
vical, propor avaliação ecográfica seriada do comprimento cervical entre as
16-24 semanas, quinzenal se o comprimento cervical for ≥30 mm, semanal
se comprimento cervical for <30 mm ou se houver um encurtamento franco
do colo. Se houver um encurtamento progressivo do colo, propor ciclorrafia
cervical indicada pela ecografia entre as 14+0-24+6 semanas A orientação é
semelhante para as gestações unifetais e múltiplas.
*(≥1 aborto tardio/parto pré-termo precoce não associados a contractilidade)
PRÉ-ECLÂMPSIA
■ Se houver antecedentes de pré-eclâmpsia grave de início anterior às 34 se-
manas, recomendar ácido acetilsalicílico (AAS) 150 mg per os (PO) 1 vez/
/dia ao deitar a partir das 12+0 semanas (não iniciar após as 16 semanas)
20 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
MORTE FETAL
■ Reavaliação da provável etiologia (clínica, hormona estimulante da tiroide
(TSH), glicemia, cariotipo, exame anátomo-patológico do feto e placenta). Entre
25-60% dos casos permanecem inexplicados após investigação;
■ Recomendar a correção de fatores de risco modificáveis (obesidade, alcoo-
lismo, tabagismo, toxicofilia);
■ Se houver história de RCF de causa placentária ou a causa da morte for des-
conhecida em feto morfologicamente normal, determinar AAF (se não tiverem sido
determinados previamente). Caso sejam positivos, repetir após pelo me- nos
12 semanas. A positividade das duas avaliações estabelece o diagnóstico de
SAAF. Perante este diagnóstico, referenciar à consulta de Reumatologia;
■ Em casos de aneuploidia fetal potencialmente herdada ou de anomalias con-
génitas sugestivas de aneuploidia, referenciar à consulta de Genética;
■ Nas situações de morte fetal de etiologia desconhecida: realizar ecografia de
crescimento às 28, 32 e 36 semanas, iniciar vigilância com cardiotocografia
(CTG) semanal a partir das 34 semanas. Ponderar terminação da gravidez
às 38-39 semanas.
Antecedentes Obstétricos Relevantes 21
DISTOCIA DE OMBROS
BIBLIOGRAFIA
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VAN OOSTWAARD MF, LANGENVELD J, SCHUIT E, et al. Recurrence of hypertensive disorders of
IDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES
■ Gravidez não evolutiva: diagnóstico feito exclusivamente por ecografia trans-
vaginal, confirmado por dois médicos, pelo menos um dos quais especialista, no
melhor ecógrafo disponível no local, com um dos seguintes achados:
– Saco gestacional intrauterino com ≥25 mm de maior diâmetro e sem
presença de estruturas embrionárias;
– Embrião intrauterino com ≥7 mm de comprimento craniocaudal (CCC) sem
batimentos cardíacos;
– Ausência de crescimento do saco gestacional ou do embrião no intervalo
de uma semana;
■ Ameaça de aborto: hemorragia vaginal de origem intrauterina sem dor abdomi-
nal relevante. Na ecografia: gravidez intrauterina sem os critérios ecográficos
de gravidez não evolutiva (ver parágrafo anterior), ou porque não se atingiram
as dimensões necessárias do saco gestacional ou embrião ou porque se
documentaram batimentos cardíacos;
■ Aborto iminente: queixas álgicas sugestivas de contrações uterinas, geralmen-
te com hemorragia vaginal mas sem dilatação do colo uterino. Na ecografia
pode encontrar-se uma gravidez intrauterina evolutiva ou não evolutiva;
■ Aborto em evolução: semelhante ao aborto iminente, mas com dilatação do colo
uterino;
■ Aborto incompleto: situação em que, após um episódio sugestivo de expulsão
de fragmentos ovulares, se documentam estruturas intrauterinas na ecogra-
fia transvaginal, podendo ser um aborto incompleto com saco gestacional
(mesmo que colapsado), ou um aborto incompleto sem saco gestacional;
■ Aborto completo: situação em que, após um episódio clínico sugestivo de
expulsão de fragmentos ovulares, na ecografia transvaginal praticamente não
se documentam estruturas intrauterinas.
ABORDAGEM CLÍNICA
Gravidez não evolutiva do 1.º trimestre
Atitude expectante: alternativa a colocar se CCC <40 mm, indicando uma taxa
de sucesso ao final de 2 semanas de ~45%, ao final de 4 semanas de ~65% e
ao final de 6 semanas de ~83%. Em 1,4% dos casos está associada a hemor-
LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Ameaça de aborto
Se hemorragia vaginal escassa e achados ecográficos consistentes com gravidez
evolutiva, a grávida deve ser informada que a maioria das vezes se trata de uma
hemorragia autolimitada e que a evolução posterior da gravidez é geralmente
favorável. A grávida pode ter alta com indicação de cessação da atividade física
Aborto e Gravidez Não Evolutiva do 1.º Trimestre 27
neamente sem complicações, pelo que a grávida pode ter alta com as seguintes
recomendações: abstinência sexual durante 15 dias, contraceção durante pelo
menos 2 meses no caso de ter havido hemorragia abundante ou esvaziamento
uterino cirúrgico. Deve regressar à urgência se: hemorragia vaginal abundante,
hemorragia vaginal >15 dias, dor abdominal que não cede a paracetamol 1 g
PO 8/8 horas, ou temperatura axilar >38,5 °C. Se forem recolhidos fragmentos
ovulares, enviar para Anatomia Patológica. Agendar reavaliação ecográfica após
28 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
a menstruação seguinte (no médico assistente ou, caso não seja possível, na
urgência).
Aborto completo
Se hemorragia vaginal escassa, a situação encontra-se resolvida, pelo que a
grávida pode ter alta com as seguintes recomendações: abstinência sexual du-
rante 15 dias, contraceção durante pelo menos 2 meses no caso de ter havido
hemorragia abundante ou esvaziamento uterino cirúrgico. Se forem recolhidos
fragmentos ovulares, enviar para Anatomia Patológica.
BIBLIOGRAFIA
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ABORTO SÉTICO 8
CRISTIANA M ARINHO S OARES , ANDREIA FONSECA
INTRODUÇÃO
Define-se aborto sético como a infeção dos produtos de conceção (feto, placenta,
fragmentos placentários), no contexto de um aborto (gravidez com ≤22+6 sema-
nas). Pode ocorrer devido à retenção de produtos de conceção, na sequência
de traumatismo uterino, ou de técnica não estéril usada para procedimentos
abortivos. Complica até 3% dos abortos e a sua incidência aumenta com aidade
gestacional na qual ocorreu. Os agentes microbianos mais frequentemen- te
envolvidos têm origem no trato genital inferior (Enterobacteriaceae, Strep-
tococcus, Staphylococcus e Enterococcus; menos frequentemente Clostridium spp.).
A infeção pode estar limitada aos tecidos uterinos, mas pode também estender-
se à pelve e afetar a circulação sistémica, com risco de septicemia, choque sético,
falência multiorgânica, coagulação intravascular disseminada e morte. A
evolução para septicemia pode ser rápida se os produtos infetados se
mantiverem no útero, principalmente quando há bactérias produtoras de toxinas.
Ocorre bacteriemia em 38-61% dos casos e, quando há hemocultu-ras positivas,
são identificadas bactérias anaeróbias em ~60%. A longo prazo,é uma causa
importante de infertilidade secundária, estando também associado a dispareunia,
dor pélvica crónica e aborto espontâneo em gestações futuras. O diagnóstico
é clínico, devendo ser suspeitado perante um quadro de febree arrepios, dor
hipogástrica, corrimento vaginal com cheiro fétido, hemorragia vaginal
persistente e dor à palpação do útero ou dos anexos no contexto deum aborto
recente, espontâneo ou induzido.
ABORDAGEM CLÍNICA
A avaliação inicial inclui: avaliação dos sinais vitais, exame abdominal e gineco-
lógico e ecografia transvaginal. Quando a doente se encontra prostrada ou he-
modinamicamente instável, é necessário assegurar imediatamente dois acessos
venosos e iniciar fluidoterapia com cristaloides. No exame ginecológico devem ser
pesquisadas lesões traumáticas resultantes de procedimentos abortivos.Se
existir corrimento endocervical purulento, este deve ser colhido para exame
bacteriológico. O restante estudo analítico deve incluir: hemoculturas (aeróbios
e anaeróbios), hemograma, proteína C reativa, provas de coagulação e grupo
sanguíneo (se desconhecido). Perante um quadro compatível com choque sético,
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
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INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ 9
R UI M ARQUES DE CARVALHO
INTRODUÇÃO
A interrupção voluntária da gravidez (IVG) corresponde ao término voluntário
de uma gravidez evolutiva, sem que exista um motivo relacionado com riscos
de saúde para a grávida ou para o feto. A Lei n.º 16/2007 confere licitude a
este ato quando realizado nas primeiras 10 semanas de gravidez e a nota da
Direção-Geral da Saúde (DGS) estabelece as 10+6 semanas, como limite máximo
para ser efetuada. Pode ser solicitada por qualquer mulher psiquicamente capaz,
com idade ≥16 anos. Nas mulheres com idade <16 anos ou psiquicamente
incapazes, a IVG pode ser solicitada pelos respetivos representantes legais
(familiar ascendente ou descendente ou, na sua falta, por quaisquer parentes
da linha colateral). As mulheres que pretendem a IVG devem telefonar, enviar e-
mail ou recorrer pessoalmente ao gabinete administrativo da consulta de
Obstetrícia indicando o tempo de gravidez que pensam ter. Caso já tenham uma
ecografia (com o centro onde foi realizada e o nome do médico devidamente
identificados) comprovando uma gravidez intrauterina com batimentos cardíacos
e com uma datação ≤10+3 semanas no dia em que fazem o contacto, deve ser
agendada a primeira consulta de IVG para logo que existam vagas. Se o tempo
de gravidez for ≥9 semanas, o agendamento da primeira consulta deve ser con-
siderado urgente. Se a datação da gravidez for >10+3 semanas a utente deve
ser informada da impossibilidade legal de realizar a IVG. Idêntica orientação deve
ocorrer nas mulheres que realizaram ecografia de datação.
ECOGRAFIA DE DATAÇÃO
A datação ecográfica da gravidez é realizada pela medição do comprimento
craniocaudal (CCC) até às 13 semanas. Caso existam critérios ecográficos
de gravidez não evolutiva (ver protocolo “7. Aborto e gravidez não evolutiva do
1.º trimestre”) a mulher deve ser encaminhada para a urgência de Obstetrícia e
Ginecologia. Caso não se visualizem batimentos cardíacos embrionários e não
estejam presentes critérios ecográficos de gravidez não evolutiva, deve ser agen-
dada nova ecografia para quando se prevê que a gravidez tenha 6-7 semanas.
Todos os resultados devem ser transmitidos oralmente à grávida, registadosno
programa informático e impressos os relatórios para entregar à grávida. A
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
IVG medicamentosa
■ Mifepristona 200 mg per os (PO), dose única presencial na consulta;
■ Misoprostol 800 µg [4 comprimidos (comp.)] per vagina (PV), leva para casa para
autoaplicação 48 horas depois. Caso a mulher não se sinta confortável com a
autoaplicação vaginal deve colocar-se a alternativa da administração oral ou
bucal (colocar na bochecha), avisando-se que tem uma taxa de sucesso
ligeiramente menor e que se associa a mais sintomas).
Cuidados adicionais e recomendações em todas estas situações:
■ Deve permanecer em casa após a autoadministração do misoprostol durante
cerca de 48 horas, preferencialmente acompanhada;
Interrupção Voluntária da Gravidez 33
BIBLIOGRAFIA
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34 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
ANEXO
Situações que necessitam de avaliação médica
■ Suspeita de infeção vaginal, pélvica ou sépsis;
■ Hemorragia genital moderada ou abundante;
■ Coagulopatia;
■ História de alergia à mifepristona ou ao misoprostol;
■ Terapêutica anticoagulante;
■ Corticoterapia crónica;
■ Suspeita de gravidez ectópica, heterotópica ou doença gestacional trofoblás-
tica;
■ Doença renal, hepática ou cardíaca grave;
■ Gravidez com dispositivo intrauterino in situ;
■ Anemia recente (hemoglobina <9 mg/dl), ou trombocitopenia grave (<100 000/
/dl);
■ Porfirias hereditárias;
■ Insuficiência suprarrenal;
■ Asma grave ou com crises, apesar da medicação;
■ Diabetes com vasculopatia;
■ Doença inflamatória intestinal agudizada;
■ Doença psiquiátrica grave;
■ Outras doenças maternas graves;
■ Quando é expectável uma má adesão ao esquema terapêutico.
ABORTO RECORRENTE 10
RITA ROSADO, LUÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
Define-se aborto recorrente como a ocorrência de três ou mais abortos espon-
tâneos consecutivos (excluindo gravidez bioquímica, molar e ectópica), tendo
uma incidência de ~1%. Pode ser classificado em primário (em mulheres sem
gestações viáveis) ou secundário (em mulheres com pelo menos um parto).
A conduta é semelhante nas duas situações mas o prognóstico é mais favo-
rável na última. Pode ainda ser classificado em precoce (quando ocorre <14
semanas) ou tardio (quando ocorre ≥14 semanas). As principais causas são:
anatómicas (12-22%), endocrinológicas (~20%), genéticas (2-5%), imunológicas,
ambientais e relacionadas com trombofilias adquiridas (15-25%). Em 40-50%dos
casos, não é possível determinar uma causa. Os principais fatores de risco são a
idade materna avançada e os antecedentes de aborto espontâneo. A taxa de
gravidez bem-sucedida após aborto recorrente é de 55-75%; nos casos de aborto
recorrente inexplicado é de 60-70% nas mulheres com <35 anos e de 40-50% nas
mulheres com ≥35 anos.
ABORDAGEM CLÍNICA
O principal objetivo é tentar determinar a etiologia e delinear uma intervenção
direcionada. A avaliação inicial consiste na anamnese: antecedentes pessoais;
antecedentes ginecológicos e obstétricos, descriminando a idade gestacionaldos
abortos ocorridos; hábitos tabágicos, consumo de álcool, cafeína ou drogas
ilícitas; profissão e condições do local de trabalho. Avaliar também se houve
estudo dos produtos de conceção nos abortos prévios. O exame físico deve incluir
uma avaliação geral, com atenção particular para sinais de endocrino- patia (p.
ex., hirsutismo, galactorreia) e o exame ginecológico. Se os abortos tiverem sido
tardios e associados a dilatação cervical assintomática, suspeitar de insuficiência
cervical (ver protocolo “15. Insuficiência cervical”). Na avaliação inicial devem
também ser solicitados os seguintes exames:
■ Ecografia pélvica e se necessário histerossonografia/histerossalpingografia para
identificar malformações uterinas, sinequias e miomas. A histeroscopia,
laparoscopia e ressonância magnética (RM) nuclear poderão ser úteis, deacordo
com os achados dos exames anteriores;
■ Avaliação da função tiroideia: hormona estimulante da tiroide (TSH) e T4 livre;
Anticoagulante lúpico, anticorpo anticardiolipina (IgM e IgG) e anticorpo anti-
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Recomendações e terapêutica
Não existe evidência de benefício na utilização de ácido acetilsalicílico (AAS),
heparina de baixo peso molecular (HBPM), progesterona, heparina, corticosteroi- des
ou terapêuticas imunológicas nas situações de aborto recorrente de causa
inexplicada. Estão aconselhadas:
■ Recomendações sobre cessação tabágica, redução do consumo de bebidas
alcoólicas e de bebidas com cafeína;
■ Em mulheres obesas ou subnutridas, medidas conducentes à normalização
ponderal, se necessário com apoio de nutricionista;
■ Oferta de apoio psicológico, se o casal o desejar.
BIBLIOGRAFIA
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GRAVIDEZ ECTÓPICA 11
M ARIA PULIDO VALENTE, M ARIA DE CARVALHO AFONSO
INTRODUÇÃO
Define-se gravidez ectópica (GE) como aquela que se implanta fora da localização
intrauterina normal, ocorrendo em cerca de 2% das gestações. A localização
pode ser tubária (90%), ovárica (2%), intersticial ou cornual (1%), abdominal (1%),
cervical (1%) ou na cicatriz de histerotomia (2%). Raramente é concomitante
com uma gravidez intrauterina – gravidez heterotópica (0,003% das gestações). Os
fatores de risco são: GE prévia (risco de recorrência: 10-25%), cirurgia tubá- ria
prévia (risco 2-7%), antecedentes de doença inflamatória pélvica, patologia
tubária, infertilidade, utilização de dispositivo intrauterino (DIU), idade materna
avançada, cirurgia pélvica/abdominal prévia, tabagismo. Em 50% dos casos não
se identificam fatores de risco. O diagnóstico é baseado na clínica e em exames
subsidiários. Em 50% dos casos observa-se a tríade clássica: amenor- reia,
hemorragia vaginal escassa e dor nos quadrantes abdominais inferiores. Outros
sintomas/sinais são: síncope, dor referida ao ombro, dor à exploração dos fundos
de saco vaginais, massa anexial, defesa abdominal, dor à descom- pressão
abdominal, taquicardia e hipotensão.
em injeção local se -hCG >5 000 mUI/ml, (50 mg: 25 mg no saco gestacional
e 25 mg no trofoblasto, injeção concomitante de 5 mEq KCl se batimentos car-
díacos visíveis). Caso haja instabilidade hemodinâmica, hemorragia profusa ou
persistente, ou falência do tratamento médico deve considerar-se embolização
pré-cirúrgica das artérias uterinas ou laqueação cirúrgica do ramo descendente
das artérias uterinas, seguido de curetagem/aspiração uterina, se necessário
complementada com colocação de balão intrauterino.
GRAVIDEZ HETEROTÓPICA
A apresentação é semelhante à da GE tubária, mas o diagnóstico é geralmente
mais tardio, devendo ser considerado em mulheres com gravidez intrauterina
evolutiva associada a dor abdominal intensa. O tratamento médico com meto-
trexato está contraindicado sendo a salpingectomia laparoscópica o tratamento
de eleição.
Gravidez Ectópica 41
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN C OLLEGE OF O BSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS . Tubal ectopic pregnancy. Practice
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
12 DOENÇA TROFOBLÁSTICA GESTACIONAL
INTRODUÇÃO
A doença trofoblástica gestacional (DTG) engloba todos os tumores resultantes de
proliferação anómala de células trofoblásticas, subdividindo-se em três tipos:
mola hidatiforme (MH) (completa, incompleta e invasiva), neoplasia maligna
do trofoblasto (coriocarcinoma, tumor trofoblástico do leito placentário, tumor
trofoblástico epitelioide), e lesões não neoplásicas e não molares (exagero da
zona de implantação, nódulo de leito placentário). Na ausência de um diagnóstico
histopatológico definitivo, a doença diagnosticada como resultado de elevação
persistente da subunidade beta livre da gonadotrofina coriónica humana (-hCG)
após o esvaziamento cirúrgico/expulsão espontânea de uma gravidez molar é
denominada DTG persistente. A DTG persistente, a MH invasiva e a neoplasia
maligna do trofoblasto são englobadas numa entidade denominada neoplasia
trofoblástica gestacional (NTG). O tumor trofoblástico do leito placentário, o
tumor trofoblástico epitelioide e as lesões benignas não molares são entidades
raras, não sendo abordadas no presente protocolo.
MOLA HIDATIFORME
É causada por uma fecundação aberrante que resulta numa gravidez genetica-
mente anómala à custa da expressão excessiva de genes paternos, podendo
ser diploide ou triploide. Ocorre uma proliferação excessiva do trofoblasto, po-
dendo coexistir tecido embriofetal (MH parcial) ou podendo este estar ausente
(MH completa). Afeta ~0,18% das gestações. Constituem fatores de risco: idade
materna >40 anos, etnia asiática e diagnóstico anterior de MH. Cercade 20%
dos casos de MH completa e ~5% dos casos de MH parcial evoluempara NTG.
Diagnóstico
A principal manifestação clínica é a hemorragia vaginal no 1.º trimestre, sendo as
restantes (hiperemese, pré-eclâmpsia precoce, hipertiroidismo) atualmente
raras, devido ao diagnóstico e tratamento mais precoces. O diagnóstico baseia-se
numa imagem ecográfica sugestiva (placenta com múltiplas vesículas hipoecogé-
nicas, com ou sem tecido embriofetal) e níveis séricos de -hCG anormalmente
elevados para a idade gestacional, sendo o diagnóstico definitivo histológico.
Nas doentes com suspeita clínica de MH solicitar: doseamento sérico de -hCG,
hemograma, função hepática, renal e tiroideia, estudo da coagulação, ecografia
transvaginal e radiografia torácica.
Doença Trofoblástica Gestacional 43
Orientação clínica
Diagnóstico
O espetro de apresentação clínica da NTG é variável, podendo a suspeita advir de
valores de -hCG >100 000 mUI/ml, hemorragia uterina anómala, presença de
cistos tecaluteínicos >6 cm, hipertensão arterial (HTA) de novo, hiperemese,
subinvolução uterina pós-parto ou, mais raramente, sintomas associados a um
quadro metastático. O diagnóstico é efetuado de acordo com os seguintes
critérios:
■ Diagnóstico histológico de coriocarcinoma ou de MH invasiva;
■ Subida dos níveis de -hCG (≥10%) em 3 doseamentos semanais;
■ Níveis estáveis de -hCG (variação <10%) em 4 doseamentos semanais.
Perante a suspeita clínica de NTG, a biópsia diagnóstica é desaconselhada de-
vido ao risco hemorrágico e por não ser considerada essencial para o início de
tratamento. Perante uma hemorragia uterina abundante, é necessário o esvazia-
mento uterino cirúrgico, devendo o material ser enviado para estudo histológico.
A biópsia de lesões metastáticas é desaconselhada, dada a hipervascularização da
NTG e o risco de hemorragia.
■
Estádio I: limitada ao útero
■
Estádio II: extensão para além do útero, mas limitada às estruturas
genitais (anexos, vagina e ligamento largo) por metastização ou ex-
tensão direta
■
Estádio III: metastização pulmonar, com ou sem envolvimento dos
órgãos genitais
■
Estádio IV: todos os outros locais metastáticos
* De Acordo com as Orientações da FIGO de 2018
Doença Trofoblástica Gestacional 45
Orientação clínica
As doentes com NTG devem manter vigilância clínica na consulta de Ginecologia
Oncológica em articulação com a Oncologia Médica para eventual instituição
de quimioterapia. As doentes consideradas de baixo risco (estádios I-III, com
score <7) têm uma sobrevida que se aproxima dos 100%. O tratamento pre-
conizado envolve monoquimioterapia, baseada em metotrexato ou actinomici-
na D. Nas doentes com projeto reprodutivo concluído, ou nas situações “de
resgate”, a histerectomia com salpingectomia apresenta taxas de cura ~80%.
Nas doentes com projeto reprodutivo poderá ser ponderado como terapêutica
inicial um segundo esvaziamento uterino cirúrgico com curetagem (taxas de
cura 9-80%). Nos casos em que este procedimento não possibilita a cura,
o efeito citorredutor permite redução do número de ciclos de quimioterapia.
As doentes de alto risco (estádios IV e/ou score ≥7) têm sobrevivência global
de ~95% em centros com experiência. O tratamento preconizado envolve poli-
quimioterapia e eventual cirurgia “de resgate” com realização de histerectomia
e/ou toracotomia nos casos de doença resistente, desde que seja exequível
uma excisão completa. A vigilância clínica pressupõe o doseamento sérico de
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
-hCG: na doença de baixo risco, a monitorização deve ser semanal atéà sua
negativação e, posteriormente, mensal durante 12 meses. Na doença de alto
risco, a monitorização deverá ser semanal até às 6 semanas e, pos- teriormente,
mensal até 12-18 meses, com seguimento individualizado até aos 5 anos. Deve-
se desaconselhar fortemente uma nova gravidez durante o período de tratamento
e no primeiro ano após terminação da quimioterapia, recomendando-se
contraceção eficaz.
46 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
BIBLIOGRAFIA
CANCRO GINECOLÓGICO. Consensos Nacionais 2020 da Sociedade Portuguesa de Ginecologia.
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HIPEREMESE GRAVÍDICA 13
ALEXANDRA M EIRA, ALEXANDRA HENRIQUES
INTRODUÇÃO
A hiperemese gravídica é a expressão mais grave do quadro de náuseas e vó- mitos
frequente no início da gravidez, afetando ~0,3% de todas as gestações. Define-se
como a ocorrência de vómitos repetitivos e persistentes (com início nas
primeiras 9 semanas de gravidez e não relacionados com outras causas),
associados a cetonúria e a perda ponderal. Os principais fatores de risco são:
hiperemese em gestação anterior, obesidade, gravidez múltipla, doença neoplási-
ca do trofoblasto e alterações da função tiroideia. As complicações graves são
raras e incluem: encefalopatia de Wernicke, síndrome de Mallory-Weiss, rotura
esofágica, neuropatia periférica, pneumotórax, aborto, restrição de crescimen-
to e morte fetal. Esta situação causa frequentemente alterações analíticas:
elevação do hematócrito, alterações eletrolíticas (hiponatremia, hipocloremia,
hipo/hipercaliemia); aumento das transaminases, bilirrubina, amílase e lípase;
alterações da função tiroideia (aumento da T4 livre e diminuição da hormona
estimulante da tiroide (TSH) com autoanticorpos negativos).
ABORDAGEM CLÍNICA
Na urgência
■ Avaliação da tensão arterial (TA), frequência cardíaca materna (FCM) e peso;
■ Ecografia obstétrica para despiste de doença do trofoblasto e gravidez ge-
melar;
■ Avaliação analítica: hemograma, ionograma, função renal (ureia, creatinina),
função hepática (transaminases, bilirrubina), função tiroideia (T4 livre e TSH),
amílase, lípase, exame sumário de urina;
■ Vigilância em jejum durante 3-4 horas na sala de observações da urgência, ex-
ceto se tiver critérios de internamento (ver “Critérios de internamento” abaixo);
■ Soro polieletrolítico 1000 ml endovenoso (EV) a 500 ml/hora;
■ Ondansetron 4 mg em bólus EV lento;
■ Após 2-3 horas, avaliação da tolerância da alimentação com líquidos (chá com
açúcar em pequenas quantidades) e, em caso de sucesso, com bolachas.
Critérios de internamento
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Tratamento em ambulatório
Terapêutica antiemética
■ Doxilamina + dicloverina + piridoxina: (Nausefe®) 10 mg per os (PO) (1 de
manhã, 2 à noite) (1.ª escolha);
■ Dimenidrinato: 25-50 mg PO de 6/6 horas (não exceder 200 mg/dia se
terapêutica concomitante com doxilamina);
■ Prometazina: 25 mg PO de 6/6 horas;
■ Ondansetron: 4 mg PO de 12/12 horas;
■ Metoclopramida: 10 mg PO de 8/8 horas.
Recomendações adicionais
■ Refeições frequentes (≥6/dia) com ingestão de pequena quantidade de ali-
mentos sólidos a cada refeição, pouco condimentados e bem mastigados. Evitar
alimentos gordurosos, doces ou ácidos;
■ Ingestão de uma bolacha de água e sal em jejum de manhã, antes de se levantar;
■ Suplemento alimentar de gengibre 250 mg PO às 3 principais refeições;
■ Evitar a exposição a cheiros intensos.
BIBLIOGRAFIA
ABAS MN, TAN PC, AZMI N, et al. Ondansetron compared with metoclopramide for hypere-
mesis gravidarum: a randomized controlled trial. Obstet Gynecol. 2014;123(6):1272-1279.
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nausea and vomiting: a systematic review. Women Birth. 2013;26(1):e26-e30.
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Situações Próprias da
III
Gravidez que Ocorrem
Predominantemente no
2.º e 3.º Trimestres
ENCARCERAMENTO UTERINO 14
M ARIA P ULIDO VALENTE , CRISTIANA M ARINHO S OARES , S USANA S ANTO
INTRODUÇÃO
Entende-se por encarceramento uterino a situação em que ao longo da gravidez
o fundo uterino fica retido na cavidade pélvica. Tem uma incidência de ~0,03%
das gestações. Os principais fatores de risco são o útero em retroversão (ocorre
em 15-20% das mulheres não grávidas e em cerca de 11% das mulheres na
fase inicial da gravidez), concavidade sagrada pronunciada com promontório
proeminente, endometriose, doença inflamatória pélvica, antecedentes de ci-
rurgia abdominal ou pélvica, aderências pélvicas ou uterinas, cistos ováricos,
leiomiomas, gestações multifetais, malformações uterinas, prolapso uterino e
encarceramento uterino anterior. O diagnóstico é clínico, ocorrendo geralmente
às 14-16 semanas de gestação. As queixas mais frequentes são retenção uri-
nária (sintoma precoce mais comum), outra sintomatologia urinária (polaquiúria,
disúria, incontinência urinária paradoxal), dor hipogástrica, obstipação, hemorragia
vaginal, dor perineal e tenesmo rectal. Ao exame objetivo encontra-se um colo
uterino difícil de visualizar (muito anteriorizado), uma massa palpável no fundo
de saco posterior e uma altura do fundo uterino inferior à esperada para a idade
gestacional. A ecografia revela geralmente um colo uterino alongado e deslocado
anteriormente. Numa minoria dos casos, as grávidas mantêm-se assintomáticas
e o diagnóstico é efetuado apenas na altura do parto. Esta situação é atual- mente
muito rara na segunda metade da gravidez, mas quando ocorre as prin- cipais
complicações obstétricas são: restrição de crescimento fetal (RCF), parto pré-
termo (PPT), necrose da parede uterina, rotura uterina e morte fetal. Pode haver
também compressão de estruturas intestinais e urinárias, gangrena rectal,
peritonite, hidronefrose, rotura vesical e insuficiência renal. A compressão dos
vasos pélvicos aumenta a predisposição para o tromboembolismo venoso (TEV).
ABORDAGEM CLÍNICA
A abordagem clínica depende da idade gestacional.
Após as 20 semanas
Deve adotar-se uma atitude expectante, porque a redução manual do encarcera-
mento tem uma taxa de sucesso reduzida e um elevado risco de complicações
obstétricas, nomeadamente morte fetal e PPT. As medidas de suporte incluem:
autocateterização vesical intermitente, analgesia e vigilância das complicações. O
parto vaginal está contraindicado nestas situações, devendo ser agendada uma
cesariana programada para as 36 semanas de gestação. A incisão abdominal
deve ser mediana, na tentativa da redução do encarceramento uterino antes da
histerotomia. Se tal não for possível, a histerotomia deve ser realizada o mais
acima possível, perto do ponto de flexão uterino. A realização de histerotomia no
local onde normalmente se localiza o segmento inferior acarreta um risco elevado
de lesão da bexiga, colo e vagina, bem como uma grande dificuldade na
extração fetal.
BIBLIOGRAFIA
GARDNER CS, JAFFE TA, HERTZBERG BS, et al. The incarcerated uterus: a review of MRI and
ultrasound imaging appearances. Am J Roentgenol. 2013;201(1):223-229.
HAN C, WANG C, HAN L, et al. Incarceration of the gravid uterus: a case report and literature
review. BMC Pregnancy Childbirth. 2019;19(1):408.
NEWELL SD, CROFTS JF, GRANT SR. The incarcerated gravid uterus: complications and lessons
learned. Obstet Gynecol. 2014;123(2 Pt 2 Suppl 2):423-427.
SHNAEKEL KL, W ENDEL MP, R ABIE NZ, et al. Incarceration of the gravid uterus. Obstet Gynecol
Surv. 2016;71(10):613-619.
INSUFICIÊNCIA CERVICAL 15
SÍLVIA SERRANO , M ARIA DE C ARVALHO AFONSO
INTRODUÇÃO
Entende-se por insuficiência cervical a incapacidade de o colo do útero man-
ter o tónus necessário para a retenção dos produtos de conceção dentro da
cavidade uterina, na ausência de contrações uterinas regulares. Manifesta-se
por um aborto tardio ou um parto pré-termo (PPT) que ocorre entre as 14-27
semanas, na ausência de sintomatologia relacionada com contrações uterinas
(perda fetal assintomática no 2.º trimestre). Tem como principais causas os
defeitos do desenvolvimento embrionário dos ductos müllerianos, as doenças
do tecido conjuntivo (p. ex., síndrome de Ehlers-Danlos ou síndrome de Marfan),
traumatismo cervical anterior (p. ex., dilatação cervical mecânica, conização), a
hiperdistensão uterina e a inflamação/infeção local. Frequentemente não é pos-
sível identificar uma causa subjacente. A incidência estimada ronda os 0,5%. O
diagnóstico baseia-se na história de duas ou mais perdas fetais assintomáticas
no 2.º trimestre; na história de uma perda fetal assintomática do 2.º trimestre,
juntamente com um colo curto na presente gravidez; ou na deteção de dilatação
e apagamento cervical entre as 14-27 semanas, na ausência de sintomatologia
sugestiva de contrações uterinas regulares. As membranas podem estar prolap-
sadas para a cavidade vaginal e pode ocorrer rotura espontânea das mesmas.
ABORDAGEM CLÍNICA
A abordagem depende do momento e dos achados na altura do diagnóstico.
GESTAÇÕES MÚLTIPLAS
A abordagem clínica perante a história de duas perdas fetais assintomáticas
do 2.º trimestre e perante a história de uma perda fetal assintomática do 2.º
trimestre é igual à das gestações unifetais. Na dilatação cervical assintomáti-
ca, a ciclorrafia reduz em 50% a incidência de PPT antes das 28 semanas e
reduz a mortalidade perinatal em 78%. Nos colos curtos e na dilatação cervical
assintomática pode ser considerada a colocação de um pessário vaginal de Arabin
entre as 14+0-30+0 semanas, em alternativa à ciclorrafia cervical, quando
tecnicamente possível.
BIBLIOGRAFIA
BERGHELLA V, RAFAEL TJ, SZYCHOWSKI JM, et al. Cerclage for short cervix on ultrasonography in
women with singleton gestations and previous preterm birth: a meta-analysis. Obstet
Gynecol. 2011;117(3):663-671.
EHSANIPOOR RM, SELIGMAN NS, SACCONE G, et al. Physical examination-indicated cerclage: a
systematic review and meta-analysis. Obstet Gynecol. 2015;126(1):125-135.
ROMAN A, ZORK N, HAERI S, et al. Physical Exam Indicated Cerclage in Twin pregnancy: a
Randomized Controlled Trial. Am J Obstet Gynecol. 2020;223(6):902.e1-902.e11.
COLO CURTO 16
M ARIA DE CARVALHO AFONSO, DIOGO AYRES DE CAMPOS, LUÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
Define-se colo curto como a deteção por ecografia transvaginal de um compri-
mento cervical ≤25 mm entre as 16+0-24+0 semanas, ou ≤20 mm após as 24+0
semanas, na ausência de contractilidade uterina relevante. O colo curto antes das
30 semanas tem uma associação forte com o parto pré-termo (PPT), mas esta
associação deixa de se verificar após este período. A avaliação do com- primento
cervical está indicada por rotina na ecografia do 2.º trimestre. Em grávidas com
história sugestiva de insuficiência cervical deve realizar-se avalia- ção seriada
entre as 16-24 semanas, com intervalo quinzenal se o comprimento cervical for
≥30 mm, e com intervalo semanal se for <30 mm. Na gravidez múltipla e nos
antecedentes de insuficiência cervical deve ser realizada por ecografia
transvaginal. Nas restantes situações, a ecografia transvaginal apenas é realizada
quando há suspeita de colo curto por ecografia transabdominal ou quando esta
última é inconclusiva.
ORIENTAÇÃO CLÍNICA
Todas as grávidas com colo curto devem abster-se de atividade física intensa
e de atividade sexual. Deve ser-lhes entregue o panfleto informativo “Tenho um
colo curto – o que preciso de saber”.
Gravidez unifetal
Sem história sugestiva de insuficiência cervical, sem dilatação cervical
■ Progesterona 200 mg per vagina (PV) 1 caps./dia ao deitar a partir da data
do diagnóstico até às 36+6 semanas (reduz em 30% a incidência de PPT <34
semanas, em 50% a incidência de PPT <37 semanas, em 50% a morte neo- natal,
em 60% a necessidade de ventilação neonatal e em 25% a admissãoem
Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais).
Gravidez múltipla
Sem história sugestiva de insuficiência cervical, sem dilatação cervical
■ Progesterona 200 mg PV 1 caps./dia ao deitar a partir da data do diagnóstico
até às 36+6 semanas;
■ Considerar a colocação de um pessário vaginal de Arabin entre as 14+0-30+0
semanas;
■ Vigilância em ambulatório.
BIBLIOGRAFIA
DODD JM, J ONES L, F LENADY V, et al. Prenatal administration of progesterone for preventing preterm
birth in women considered to be at risk of preterm birth. Cochrane Database Syst Rev.
2013;(7):CD004947.
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and neonatal morbidity and mortality in women with a twin gestation and a short cervix: an
updated meta-analysis of individual patient data. Ultrasound Obstet Gynecol.
2017;49(3):303-314.
Colo Curto 59
INTRODUÇÃO
A ciclorrafia cervical tem por objetivo promover o encerramento do colo do útero nas
situações de suspeita de insuficiência cervical, podendo ser realizada por via
transvaginal ou transabdominal. A ciclorrafia transvaginal pode realizar-se
utilizando as técnicas de McDonald ou de Shirodkar (ver “Técnica”, à frente
neste capítulo). A primeira é geralmente mais simples e rápida, estando asso-
ciada a menor hemorragia, mas pressupõe um colo anatomicamente identifi-
cável e estruturalmente íntegro. A ciclorrafia transabdominal está geralmente
reservada para os casos em que a via transvaginal não é bem-sucedida ou
não é tecnicamente possível, estando fora do âmbito do presente protocolo.
As complicações da ciclorrafia são raras (<2%), sendo a principal a rotura in-
traoperatória de membranas. Pode também ocorrer hemorragia, rotura diferida
de membranas e corioamnionite. Por vezes a fita da ciclorrafia torna-se laxa,
podendo ser considerada a realização de nova ciclorrafia quando tal acontece
antes das 24+6 semanas. Raramente, pode resultar estenose cervical.
INDICAÇÕES
Ciclorrafia indicada pela história (realizada eletivamente às 14-15 semanas por
antecedentes sugestivos de insuficiência cervical)
■ Grávidas com antecedentes de ≥2 partos antes das 28 semanas ou abortos
tardios (≥14 semanas) sugestivos de insuficiência cervical (que ocorreram
sem contractilidade uterina relevante).
Ciclorrafia indicada pela clínica (realizada entre as 14+0-24+6 semanas por dila-
tação assintomática)
■ Grávidas sem contractilidade relevante nas quais se visualizam as membranas
através de um colo dilatado ou quando há protusão das mesmas na vagina.
Constituem contraindicações para a ciclorrafia cervical: contractilidade ute-
rina rítmica ou frequente, corioamniotite, rotura de membranas, suspeita de
Ciclorrafia Cervical por Via Transvaginal 61
TÉCNICA
Previamente à cirurgia
■ Ecografia para confirmar viabilidade fetal, idade gestacional, presença de
sludge e ausência de malformações fetais;
■ Obtenção de consentimento informado escrito;
■ Abstinência sexual na semana anterior à ciclorrafia programada;
■ Colheita de exsudado vaginal para cultura (geral, Chlamydia trachomatis e
Neisseria gonorrhoeae) e tratamento de eventuais infeções cervicais e vaginais
– apenas nas ciclorrafias programadas e urgentes;
■ Quando existe protusão de membranas ou sludge, protelar o procedimento
por 24-48 horas com a grávida em repouso. Na protusão de membranas
considerar indometacina 100 mg per rectum (PR) em toma única, seguida de 25
mg per os (PO) a cada 4-6 horas para reduzir o volume de LA. Havendo
estabilidade clínica, realizar amniocentese. A ciclorrafia está contraindicada se
a concentração de glucose no LA for ≤14 mg/dl ou desidrogenase lática (LDH)
>400 UI;
■ Tocólise com indometacina 100 mg PR 2 horas antes da cirurgia;
■ Antibioterapia profilática 1 hora antes da cirurgia: azitromicina 500 mg endo-
venosa (EV) e clindamicina 900 mg EV – apenas nas ciclorrafias emergentes.
Preparação da cirurgia
■ Pode ser realizada sob anestesia locorregional ou geral;
■ Presença de dois ajudantes, para otimizar a exposição do colo;
■ Colocar a doente em posição de litotomia com as pernas em apoios, e se
necessário em Trendelenburg;
■ Esvaziamento vesical prévio;
■ Preparação de fita de politereftalato de etileno (Mersilene® 5 mm), previa-
mente embebida em lidocaína + clorexidina (Instillagel®, seringas pré-cheias), para
facilitar o deslizamento da fita;
■ Desinfetar genitais externos, períneo, hipogastro e raiz das coxas com clo-
rexidina alcoólica a 2%;
■ Após indução da anestesia, desinfeção da vagina com iodopovidona a 2%
solução aquosa.
Técnica de McDonald
■ Introduzir a agulha da fita às 12 horas, 5 mm abaixo da prega de reflexão,
fazendo-a sair às 9 horas. O ponto deve ser suficientemente profundo para
incluir o máximo de tecido cervical, mas sem atingir o canal cervical (ver Figura
17.1);
■ Utilizando as pinças de Allis para expor o colo (bordo direito, face posterior e
bordo esquerdo) e rodando as valvas vaginais, dar pontos das 9-6 horas,6-3
horas e 3-12 horas (ver Figura 17.2);
■ Retirar as pinças de Allis e tracionar as extremidades da fita;
■ Realizar ecografia para confirmar o posicionamento da ciclorrafia. Em corte
longitudinal, o centro da linha imaginária que une os pontos deve idealmente
estar a >20 mm do orifício cervical externo;
■ Encerramento da ciclorrafia com 3 nós travados e atados firmemente;
■ Cortar as extremidades da fita, deixando cerca de 5 cm livres na vagina para
facilitar a remoção.
Técnica de Shirodkar
■ Incisão transversal com cerca de 2 cm na mucosa cervical anterior e na
mucosa cervical posterior, junto às pregas de reflexão cervicovaginal e cervi-
corretal (ver Figura 17.3);
■ Disseção romba do reto posteriormente e da bexiga anteriormente, expondo a
superfície do colo até à inserção dos ligamentos uterossagrados e cardinais;
■ Com pinças de Allis curvas, pinça-se o bordo lateral do colo dos dois lados, entre
as duas superfícies desnudadas;
Ciclorrafia Cervical por Via Transvaginal 63
Pós-operatório
■Repouso moderado no leito nas primeiras 24 horas;
■Tocólise com indometacina 100 mg PR 12/12 horas, nas primeiras 24 horas;
■Alta hospitalar às 12-24 horas, na ausência de intercorrências;
■Permanecer em casa com atividade física limitada durante uma semana;
■Restrição da atividade desportiva e esforços físicos intensos até às 37+0
semanas;
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BIBLIOGRAFIA
BERGHELLA V, RAFAEL TJ, SZYCHOWSKI JM, et al. Cerclage for short cervix on ultrasonography in
women with singleton gestations and previous preterm birth: a meta-analysis. Obstet
Gynecol. 2011;117(3):663-671.
EHSANIPOOR RM, SELIGMAN NS, SACCONE G, et al. Physical examination-indicated cerclage: a
systematic review and meta-analysis. Obstet Gynecol. 2015;126(1):125-135.
M ILLER ES, GROBMAN WA, FONSECA L, et al. Indomethacin and antibiotics in examination-in-
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ROBERTSON JE, L ISONKOVA S, L EE T, et al. Fetal, infant and maternal outcomes among women with
prolapsed m admitted before 29 weeks gestation. PLoS One. 2016;11(12):e0168285.
INTRODUÇÃO
Define-se parto pré-termo (PPT) espontâneo como aquele que ocorre entre as
22+0-36+6 semanas de gravidez e se inicia sem intervenção médica. Ocorre em
~7% das gestações, sendo uma das principais causas de morbilidade e morta-
lidade neonatais. As formas de apresentação clínica são:
■ Sintomas prodrómicos de PPT: contractilidade uterina frequente, mas irregu- lar,
associada ou não a sensação de peso contínuo no hipogastro, sensação contínua
de pressão vulvar, aumento da frequência urinária ou aumento do corrimento
vaginal. Todos os sintomas ocorrem na ausência de modificações cervicais;
■ Ameaça de parto pré-termo (APPT): contractilidade uterina regular ou muito
frequente (>10 contrações nas últimas 2 horas), na ausência de modificações
cervicais;
■ Trabalho de parto pré-termo: contractilidade uterina regular ou muito fre- quente
(ver definição anterior) com modificações cervicais (apagamento e/ ou
dilatação do colo).
ABORDAGEM CLÍNICA
Para além da história clínica e do exame vaginal devem ser realizados a estas
grávidas:
■ Pesquisa de leucócitos e nitritos na urina com tira-teste;
■ Colheita para urocultura;
■ Cardiotocografia (CTG) para avaliar contractilidade (se <25+0 semanas ape-
nas tocografia);
■ Ecografia para avaliação do comprimento cervical (se gestação com ≤34+0
semanas). Realizada com bexiga vazia, mínima pressão da sonda, corte longi-
tudinal, visualização de todo o canal cervical e máxima ampliação possível (ver
Figura 18.1). Devem ser realizadas 3 medições e utilizada a mais curta. Em co-
los encurvados é necessário dividir em segmentos retos e somar esses valores.
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TOCÓLISE
Indicada em grávidas em trabalho de PPT entre as 24+0 -34+6 semanas, como medida
temporária (48 horas de tratamento) para realizar ciclo de corticoste- roides, ou
para transferência hospitalar. Está contraindicada na presença de corioamnionite,
patologia materna grave (eclâmpsia, pré-eclâmpsia grave, insta- bilidade
hemodinâmica, etc.) ou patologia fetal grave (anomalias fetais graves,
insuficiência placentária, morte fetal, etc.). Não existe consenso quanto ao
tocolítico de primeira linha. No entanto, pelo perfil de segurança, recomenda-se
a utilização do atosiban como primeira opção. A tocólise de manutenção não
é recomendada.
abreviar o período expulsivo a ventosa não deve ser utilizada antes das 34+0
semanas. Deve ser realizada cesariana quando o feto está em apresentação
pélvica entre 24+0-33+6 semanas. Considerar o parto vaginal nas restantes si-
tuações.
68 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
BIBLIOGRAFIA
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Practice Bulletin No. 159. Obstet Gynecol. 2016;127(1):e29-e38.
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taneous preterm labor: identification of spontaneous preterm labor, diagnosis of preterm
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NATIONAL INSTITUTE OF CLINICAL EXCELLENCE . Preterm labour and birth. November 2015.
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Ultrasound Obstet Gynecol. 2010;35(1):54-64.
HIPERTENSÃO GESTACIONAL, PRÉ-ECLÂMPSIA E
SÍNDROME DE HELLP 19
INÊS M ARTINS , J OANA GOULãO B ARROS , D IOGO AYRES DE CAMPOS
INTRODUÇÃO
Define-se hipertensão arterial (HTA) na gravidez como a tensão arterial (TA) sis-
tólica ≥140 mmHg ou diastólica ≥90 mmHg, em duas medições separadas por,
pelo menos, 4 horas. A TA deve ser avaliada com um esfigmomanómetro manual,
nos dois braços, com a grávida sentada ou em decúbito lateral esquerdo, pernas
descruzadas, cotovelo apoiado, braçadeira colocada ao nível do coração, após um
período mínimo de 5 minutos de repouso. Se o perímetro do braço <35 cm usar
braçadeira de adulto, se 35-45 cm usar braçadeira grande e se perímetro
>45 cm usar braçadeira extragrande. A HTA na gravidez subdivide-se em:
■ HTA crónica (ver protocolo “35. Hipertensão arterial crónica”): HTA prévia à
gestação ou diagnosticada antes das 20 semanas ou que persiste para além
de 12 semanas após o parto. A maioria dos casos corresponde a HTA essencial
(primária), mas 10% dos casos são secundários a outra patologia,
nomeadamente renal e endocrinológica. A HTA crónica associa-se a risco
aumentado de pré-eclâmpsia (17-25%), descolamento prematuro da placenta
(1,5%, comparado com 0,6% na população geral), restrição de crescimento fetal
(10-20%) e parto pré-termo (PPT) (12-36%, mas na HTA grave 62-70%);
■ HTA gestacional: HTA detetada após as 20 semanas, em grávidas previa- mente
normotensas e sem critérios de pré-eclâmpsia. Está associada a risco
aumentado de pré-eclâmpsia;
■ Pré-eclâmpsia: HTA detetada após as 20 semanas (mais comum no 3.º tri-
mestre, mas pode também ocorrer no 2.º trimestre e no pós-parto imediato)
em grávidas sem HTA crónica, associada a proteinúria de novo (≥300 mg na
urina de 24 horas ou razão proteína/creatinina ≥0,3 mg/dl em urina ocasional
– valores positivos devem ser confirmados em urina de 24 horas) ou lesão
de órgão-alvo (ver "Lesão de órgão-alvo”, à frente neste capítulo);
■ Pré-eclâmpsia sobreposta em HTA crónica: grávidas com HTA crónica que
desenvolvem de novo lesão de órgão-alvo ou proteinúria (≥300 mg na urina
de 24 horas). A elevação isolada da TA ou o agravamento de proteinúria
preexistente não constituem critérios de diagnóstico. O quociente soluble fms-
like tyrosine kinase-1/placental growth factor (sFlt-1/PLGF) é útil perante
diagnósticos duvidosos;
■ Síndrome de HELLP: microangiopatia trombótica caracterizada pela conjuga-
ção de hemólise (esquizocitos no sangue periférico ou bilirrubina total ≥1,2
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Lesão de órgão-alvo
■Renal: creatinina (Cr) >1,1 mg/dl ou duplicação do seu valor habitual;
■Hepática: elevação das transaminases, epigastralgia ou dor no hipocôndrio
direito que não cede a terapêutica analgésica e não tem outra causa provável;
■Neurológica: cefaleia intensa e persistente que não cede à terapêutica analgé-
sica, escotomas persistentes, amaurose, alteração do estado de consciência
sem outra causa provável, trombose;
■Hematológicas: trombocitopenia <100 000/mm 3 , hemólise – elevação da
LDH e da bilirrubina total, diminuição da haptoglobina ou esquizocitos no
sangue periférico;
■Edema pulmonar.
O quociente sFlt-1/PLGF é útil perante a suspeita de pré-eclâmpsia, sobretudo
em casos duvidosos:
■ <38 – exclui pré-eclâmpsia.
Vigilância em ambulatório, reavaliação sFlt-1/PLGF apenas se surgir algum
sinal/sintoma novo.
■ 38-85 antes das 34 semanas e 38-110 após as 34 semanas – elevada pro-
babilidade de desenvolver pré-eclâmpsia nas 4 semanas seguintes.
Vigilância em ambulatório, reavaliação semanal: sFlt-1/PLGF, proteinúria, he-
mograma, transaminases, LDH e Cr.
■ >85 antes das 34 semanas ou >110 após as 34 semanas – provável pré-
-eclâmpsia.
Internamento em Medicina Materno-Fetal e corticosteroides para maturação
fetal.
ORIENTAÇÃO CLÍNICA
HTA gestacional
■ Consulta semanal com cardiotocografia (CTG) e proteinúria em tira-teste;
■ Avaliação analítica (proteinúria 24 horas, hemograma, transaminases, LDH e
Cr) de 2/2 semanas ou se houver agravamento tensional;
■ Ecografia adicional às 28 s e m a n a s (s e H T A n ã o c o n tro l a da o u s o b
te r a pê u ti c a ) e à s 36 semanas;
■ Terminar eletivamente a gravidez a partir das 37 semanas se rácio sFlt-1/
/PLGF elevado ou em padrão ascendente. Nas restantes situações terminar
eletivamente às 39 semanas.
Pré-eclâmpsia sem critérios de gravidade
■ ≥37 semanas: terminar a gravidez. Durante o trabalho de parto: TA de 1/1
horas, balanço hídrico, avaliação analítica (hemograma, transaminases, LDH e
Cr) de 12/12 horas;
■ <37 semanas: internamento no setor de Medicina Materno-Fetal. Anti-hiper-
tensores se necessário (ver “Terapêutica anti-hipertensiva”). Avaliação da TA
de 4/4 horas durante o dia, avaliação analítica (hemograma, transaminases,
LDH, Cr) bissemanal, ciclo de corticosteroides (ver protocolo “71. Corticoste-
roides para indução da maturidade fetal”), CTG diária após as 25+0 semanas,
ecografia semanal com biometria fetal quinzenal. A reavaliação da proteinúria,
Hipertensão Gestacional, Pré-Eclâmpsia e Síndrome de HELLP 71
quando o doseamento é >300 mg não é útil, uma vez que não é critério de gra-
vidade da doença, mas apenas de diagnóstico. Terminação da gravidez se
evolução para pré-eclâmpsia grave, CTG patológica ou critérios ecográficos
de restrição de crescimento fetal (RCF) com indicação para terminação da
gravidez (ver protocolo “29. Restrição de crescimento fetal”). Ponderar alta
com vigilância na consulta se grávida assintomática, TA <150/100 mmHg, sem
lesão de órgão-alvo, CTG e crescimento fetal normais. Recomendar vigilância
diária da TA, consulta semanal com CTG e avaliação analítica (hemograma,
transaminases, LDH e Cr), ecografia semanal com biometria quinzenal. Re-
correr à urgência se sintomas sugestivos de agravamento.
Pré-eclâmpsia grave
Define-se como TA sistólica ≥160 mmHg e/ou TA diastólica ≥110 mmHg per-
sistentes, ou qualquer uma das lesões neurológicas, renais ou hematológicas
descritas anteriormente, ou edema pulmonar, ou duplicação do valor das tran-
saminases no intervalo de 48 horas ou complicações hepáticas (ver “Compli-
cações hepáticas”, à frente neste capítulo).
Internamento no bloco de partos até estabilização clínica. TA de 1/1 hora;
balanço hídrico; cateterização venosa e soro fisiológico (SF) a 100 ml/hora;
avaliação analítica [hemograma, plaquetas, ionograma com magnésio, transa-
minases, LDH, Cr e provas de coagulação com tempo de tromboplastina parcial
ativada (aPTT), tempo de protrombina (TP) e fibrinogénio se trombocitopenia
<100 000/mm3 ou se duplicação do valor das transaminases] de 6/6 horas;
CTG contínua; ecografia para avaliação de crescimento fetal; ciclo de corti-
costeroides (ver protocolo “71. Corticosteroides para indução da maturidade
fetal”). Profilaxia das convulsões com sulfato de magnésio (ver protocolo “101.
Eclâmpsia”). Anti-hipertensores se necessário (ver “Terapêutica anti-hipertensi-
va”, à frente neste capítulo).
≥34 semanas: terminar a gravidez.
24-34 semanas: terminar a gravidez se instabilidade hemodinâmica materna, HTA
que não cede à terapêutica, eclâmpsia, síndrome de HELLP, complicações
hepáticas (ver “Terapêutica anti-hipertensiva”, à frente neste capítulo), sintomas
neurológicos apesar da terapêutica com sulfato de magnésio, edema pulmo-
nar, insuficiência renal ou oligúria [débito urinário ≤0,5 ml/kg/hora durante 4
horas que não responde à hidratação endovenosa (EV)], duplicação do valor
das transaminases em 12 horas; trombocitopenia <80 000/mm3 , alterações
da coagulação, CTG suspeita ou patológica, RCF (ver protocolo “29. Restrição
de crescimento fetal”). Se situação clínica estabilizar transferir para o setor de
Medicina Materno-Fetal com monitorização igual à da pré-eclâmpsia moderada.
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Síndrome de HELLP
Atuação clínica sobreponível à da pré-eclâmpsia grave. O apoio da Anestesiologia
e Imuno-hemoterapia são importantes para considerar suporte transfusional
(plaquetas, plasma fresco congelado, concentrado eritrocitário) em caso de
coagulopatia ou trombocitopenia <40 000/mm3 e a plasmaférese em situações
refratárias.
72 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Complicações hepáticas
Hematoma/rotura hepática
■ Suspeitar perante dor epigástrica intensa e referida ao ombro, náuseas/
/vómitos, anemia e trombocitopenia;
■ Diagnóstico imagiológico por ecografia e tomografia computorizada (TC);
■ Evitar palpar ou mobilizar a doente;
■ Solicitar apoio da Cirurgia Geral e Imuno-hemoterapia;
■ Terminar a gravidez;
■ Vigilância em Unidade de Cuidados Intensivos (UCI) com monitorização hemo-
dinâmica intensiva e ecografia seriada;
■ É frequente haver reabsorção do hematoma;
■ Laparotomia emergente em caso de rotura.
Enfarte hepático
■ Suspeitar perante dor no epigastro/hipocôndrio direito e elevação muito mar-
cada das transaminases (>1 000);
■ Diagnóstico imagiológico por ecografia e TC;
■ Terminar a gravidez;
■ Vigilância em UCI com monitorização hemodinâmica intensiva e ecografia
seriada;
■ Na maioria dos casos a resolução é espontânea.
TERAPÊUTICA ANTI-HIPERTENSIVA
A instituir quando TA sistólica ≥140 mmHg ou diastólica ≥90 mmHg, sendo o
objetivo manter a TA sistólica em valores próximos de 135 mmHg e TA diastólica
em valores próximos de 85 mmHg. Visa sobretudo evitar a hemorragia cerebral
materna, não revertendo a progressão da doença.
PÓS-PARTO
Nas situações de síndrome de HELLP, eclâmpsia, complicações hepáticas ou
situações de instabilidade materna, a puérpera deve ser vigiada em UCI nas
primeiras 48 horas ou até o quadro clínico estabilizar. Manter sulfato de
magnésio nas 24 horas iniciais de puerpério nos casos de pré-eclâmp- sia
grave e durante 48 horas nos casos de síndrome de HELLP e eclâmp- sia,
juntamente com monitorização analítica (ver protocolo “101. Eclâmpsia”).
Manter ainda vigilância da TA de 4/4 horas durante o dia e a terapêutica anti-
hipertensiva (o labetalol e a nifedipina são seguros durante a amamenta-
ção) com eventuais ajustes posológicos. No puerpério imediato deve ser dada
preferência à nifedipina de ação prolongada pela comodidade posológica.A
alta deve ser programada após estabilização analítica e controlo da TA, com
indicação para monitorização bissemanal da TA em ambulatório e reavaliação
na consulta de puerpério. Nesta consulta, a puérpera deve ser orientada para
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Emergent therapy for acute-onset, severe
hypertension during pregnancy and postpartum period. Committee Opinion No. 692.Obstet
Gynecol. 2017;129(4):e90-e95.
74 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
INTRODUÇÃO
Por placenta prévia entende-se a placenta que se sobrepõe ao orifício cervical
interno e por placenta de inserção baixa aquela que está implantada a <2 cm
deste orifício (Figura 20.1). Ocorrem em ~0,4% das gestações a termo e os
principais fatores de risco são: placenta prévia em gravidez anterior, cesariana
anterior, cirurgia uterina anterior envolvendo o endométrio e gestação múltipla.
O diagnóstico é realizado por ecografia transvaginal (após esvaziamento vesi-
cal), tendo relevância clínica sobretudo no 3.º trimestre, já que antes tem uma
incidência muito superior, devido à ausência de distensão do segmento inferior
do útero. Tanto a placenta prévia como a placenta de inserção baixa têm risco
aumentado de hemorragia anteparto, acretismo placentário (5-25%), hemorragia
intraparto e pós-parto. As placentas implantadas entre 2-5 cm do orifício cer-
vical interno no 3.º trimestre também têm riscos ligeiramente aumentados de
acretismo placentário e hemorragia periparto, pelo que este achado deve ser
referido na ecografia do 3.º trimestre. O acretismo placentário é particularmente
frequente nos casos de placenta anterior com cicatriz prévia de cesariana. A
placenta prévia e a placenta de inserção baixa podem não causar sintomatologia
e serem achados ocasionais na ecografia, ou podem manifestar-se por hemorra-
gia vaginal e mais raramente por dor hipogástrica ou contractilidade uterina. O
toque vaginal com permeabilização do colo está contraindicado nestas situações.
ABORDAGEM CLÍNICA
A abordagem clínica depende da idade gestacional e do quadro clínico. Em
todos os casos devem ser pesquisados ecograficamente sinais de acretismo
placentário. Quando o diagnóstico é efetuado no 2.º trimestre, a localização da
76 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
■ CTG normal (ou auscultação cardíaca fetal normal quando não é possível obter
CTG);
■ Idade gestacional <37+0 semanas.
Deve adaptar-se o aporte de líquidos, monitorização materno-fetal, dieta e mo-
bilização materna à evolução da situação clínica. Com pelo menos 12 horas
de estabilização clínica pode passar-se a vigilância dos sinais vitais e da perda
hemática vaginal para 1 vez/turno, CTG 1 vez/turno (ou auscultação cardíaca
fetal 1 vez/turno), repouso moderado no leito e dieta geral. Manter vigilância em
internamento até às 48 horas sem perdas hemáticas, após a qual poderáser
considerada alta, caso não haja alterações analíticas importantes, a grávida não
resida longe do hospital e tenha facilidade de transporte. Manter vigilância em
ambulatório até às 37 semanas, mas considerar internamento até ao partose
houver um segundo episódio de hemorragia. Agendar cesariana programada para
as 37 semanas.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF O BSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS . Abnormal placentation: Placenta
previa, vasa previa, and placenta accreta. Obstet Gynecol. 2015;126(3):654-668.
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RCOG Press, 2011.
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21 DESCOLAMENTO PREMATURO DA PLACENTA
INTRODUÇÃO
Define-se descolamento prematuro da placenta como a ocorrência antes do parto
de uma separação parcial ou completa entre a placenta e o leito uterino. Asso-
cia-se habitualmente a hemorragia materna para este espaço, a qual se pode
exteriorizar por via vaginal ou permanecer oculta (hematoma retroplacentário). Afeta
cerca de 0,5% das gestações e, na maioria dos casos, ocorre após a 37.ª semana.
Os principais fatores de risco são: antecedentes de descolamento da placenta,
traumatismo abdominal, tabagismo ou consumo de cocaína durante a gravidez,
doença hipertensiva da gravidez, descompressão uterina súbita (após rotura de
membranas em situações de hidrâmnios ou após o parto do primei-ro gémeo).
Pode manifestar-se por hemorragia vaginal, dor abdominal leve a moderada e
hipercontractilidade uterina. Raramente é assintomático, mas em 10-20% dos
casos não ocorre hemorragia vaginal. A deteção ecográfica de um hematoma
retroplacentário apoia fortemente o diagnóstico, mas a sua ausência não o exclui.
Pode causar anemia, coagulopatia de consumo, desequilíbrio hemo- dinâmico e
hipoxia fetal aguda ou crónica. Trata-se de uma situação irreversível,pelo que a
ocorrência de hemorragia vaginal abundante ou moderada persistente,bem como
a deteção de alterações cardiotocográficas ou ecográficas sugesti- vas de
hipoxia fetal devem condicionar a terminação imediata da gravidez. Na maioria
dos casos, no entanto, o descolamento placentário é insidioso, podendo manter-
se estável durante semanas e a quantidade de sangue exteriorizado não se
correlaciona com a extensão do descolamento.
ABORDAGEM CLÍNICA
Perante a suspeita de um descolamento da placenta, a grávida deve ser inter-
nada com indicação para repouso absoluto no leito e jejum até se clarificar a
evolução clínica. Outras medidas a tomar são:
■ Pedir hemograma, creatinina, tipagem, provas de coagulação;
■ Iniciar soro fisiológico (SF) com glicose a 5% em bomba perfusora a 300
ml/hora;
■ Monitorizar a frequência cardíaca materna (FCM), tensão arterial (TA) e satu-
ração de O 2 de 1/1 hora até à estabilização clínica;
■ Vigilância da perda hemática vaginal;
■ Cardiotocografia (CTG) contínua se idade gestacional ≥25+0 semanas. Auscul-
tação fetal 4/4 horas nas restantes situações;
■ Considerar ciclo de corticosteroides segundo protocolo “71. Corticosteroides
para indução da maturidade fetal”;
■ Considerar início de neuroproteção de acordo com protocolo “72. Neuropro-
teção fetal com sulfato de magnésio”;
Descolamento Prematuro da Placenta 79
Morte fetal
Perante uma morte fetal proceder imediatamente à terminação da gravidez,
idealmente tentando um parto vaginal, mas tendo em consideração o estado
clínico materno (ver protocolo “31. Morte fetal”).
BIBLIOGRAFIA
ROYAL COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNAECOLOGISTS. Antepartum haemorrhage. Green-top
guideline no. 63. London: RCOG Press, 2011.
TIKKANEN M. Placental abruption: epidemiology, risk factors and consequences. Acta Obstet
Gynecol Scand. 2011;90(2):140-149.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
22 GRAVIDEZ MÚLTIPLA – VIGILÂNCIA PRÉ-NATAL E
COMPLICAÇÕES
INTRODUÇÃO
A ecografia do 1.º trimestre é importante para a correta classificação da gravidez
múltipla em: bicoriónica (BC) com duas placentas, duas cavidades amnióticas
e fetos que podem ser dizigóticos ou monozigóticos, ter sexos concordantes ou
discordantes; monocoriónica (MC), podendo ser biamniótica (BA) ou monoam-
niótica (MA). Na gravidez MA os fetos são, por regra, monozigóticos e com sexo
fetal concordante. Nas gestações múltiplas de maior ordem são possíveis várias
combinações quanto à corionicidade e ao número de cavidades amnióticas.
A gravidez múltipla associa-se a maior risco de complicações: aborto (~2 vezes
nas BC, ~10 vezes nas MC), hiperemese gravídica (~2-3 vezes), diabetes gesta-
cional (DG) (~2 vezes), doença hipertensiva da gravidez (~3-4 vezes), colestase
gravídica (~2 vezes), crescimento fetal discordante (~20%), restrição de cresci-
mento fetal (1 feto afetado em ~60%, ambos afetados em ~2% dos BC e ~8%
dos MC), malformações congénitas (~2-5 vezes nas MC), parto pré-termo (PPT) (~5
vezes nas BC, ~10 vezes nas MC) e mortalidade perinatal (~5-7 vezes nasBC,
~10-14 vezes nas MC).
VIGILÂNCIA DA GRAVIDEZ
■ Consultas mensais até às 28 semanas, quinzenais entre as 28-32 semanas e
semanais com cardiotocografia (CTG) após as 34 semanas;
■ Aconselhar aportes calóricos diários e aumento ponderal de acordo com a Tabela
22.1:
Tabela 22.1 – APORTE CALÓRICO DIÁRIO E AUMENTO PONDERAL R ECOMENDADOS NAS GESTAçÕES
GEMELARES, DE ACORDO COM O IMC PRÉ-GESTACIONAL OU NO INÍCIO DA GRAVIDEZ
IMC
Categoria de peso Aporte calórico diário Aumento ponderal
(kg/m2)
Baixo peso <18,5 4 000 kcal Não definido
Peso normal 18,5-24,9 3 500 kcal 17-25 kg
Excesso de peso 25-29,9 3 250 kcal 14-23 kg
Obesidade ≥30 3 000 kcal 11-19 kg
IMC – índice de massa corporal
Rastreio pré-natal
O rastreio combinado do 1.º trimestre tem uma taxa de deteção para trissomia
(T) 21 de ~86% e o do 2.º trimestre de ~47%. O DNA fetal livre no sangue materno
pode ser realizado em gestações MC e BC, com um desempenho para T21 idêntico
ao das gestações simples. Estima-se uma taxa de deteção de98,8% para T21.
O desempenho para T18 e T13 é ainda questionável. A taxa de testes
inconclusivos, principalmente por baixa fração fetal individual, é ~3 vezes
superior à da gravidez única.
Diagnóstico pré-natal
Quando tecnicamente possível, a biópsia das vilosidades coriónicas (BVC) po-
derá ser realizada nos gémeos BC, pois em casos de aneuploidia permite a
realização mais precoce de feticídio seletivo, minimizando os riscos para o outro
feto. A amniocentese é uma alternativa após as 16 semanas, devendoser
protelada para as 20-22 semanas nos MC. A taxa de aborto é de 2-3%para
ambas as técnicas.
COMPLICAÇÕES ESPECÍFICAS
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
dos seguintes critérios: EPF <P10, crescimento fetal discordante (de acordo com
a definição anterior) ou índice de pulsatilidade (IP) da AU do feto mais pequeno
>p95. A orientação clínica das situações de RCF nas gestações BC é semelhante
à das gestações únicas (ver protocolo “29. Restrição de crescimento fetal”).
Nas gestações MC, a RCF ocorre em 10-15% dos casos e deve-se à partilha desigual
da placenta. Associa-se a maior risco de morte fetal do feto com RCF e a
complicações neurológicas de ambos. Considera-se RCF nas gestações MC quando
a estimativa de peso de um dos fetos é <p3 ou estão presentes ≥2dos
seguintes critérios: estimativa de um dos fetos <P10, perímetro abdominal (PA)
de um dos fetos <P10, crescimento fetal discordante (de acordo com a definição
anterior) ou IP da AU do feto mais pequeno >p95. Nos gémeos MC, a RCF é
classificada de acordo com o Doppler da AU do feto mais pequeno em:
■ Tipo 1: fluxo diastólico positivo, com prognóstico favorável, morte fetal em 2-
4% e sequelas neurológicas em ≤5%;
■ Tipo 2: fluxo diastólico persistentemente ausente ou invertido, com prog-
nóstico reservado, elevado risco de agravamento do estado do feto restrito,
verificando-se degradação progressiva dos parâmetros fluxométricos, com
morte fetal em ~30% e sequelas neurológicas em ≤15%;
■ Tipo 3: fluxo diastólico intermitentemente ausente ou invertido, com evolução
imprevisível, morte do feto restrito em 10-20%, até 20% dos fetos sem RCF
com sequelas neurológicas. A vigilância clínico-ecográfica nestas situações
está considerada na Tabela 22.3, devendo ser realizado ciclo de corticoste-
roides uma semana antes da data previsível do parto.
Sequência anemia-policitemia
Do inglês twin anemia-polycytemia sequence (TAPS), é específica das gestações
MC e resulta da transfusão crónica de pequenos volumes de sangue através
de anastomoses de pequeno calibre, permitindo uma compensação hemodinâ-
mica. Caracteriza-se pela presença de anemia num feto e policitemia no outro
[diferença de hemoglobina (Hb) pós-natal >8 g/dl], sem discrepâncias no volume
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Gémeo acárdico
Do inglês twin reversed arterial perfusion (TRAP) sequence, é específico das
gestações MC, ocorrendo em ~1% destes casos. Caracteriza-se pela presença
de um gémeo acárdico (recetor) perfundido retrogradamente pelo gémeo dador
através de anastomoses arterioarteriais. Cerca de 30% dos dadores morrem
por insuficiência cardíaca congestiva antes das 18 semanas. A terapêutica
consiste na fotocoagulação laser ou bipolar ou ablação por radiofrequência do
cordão umbilical do feto acárdico e que deve ser realizada preferencialmente
entre as 13-16 semanas.
Gravidez monoamniótica
Corresponde a ~1% das gestações gemelares e apresenta elevada morbilidade
(~40%) e mortalidade (~10%) perinatais, pois, para além das complicações da
gestação MC (o STFF é menos frequente), surge uma complicação específica:
o entrelaçamento dos cordões umbilicais com oclusão da circulação fetal, con-
dicionando complicações neurológicas (oclusão intermitente) ou morte fetal
(oclusão mantida).
Gravidez trigemelar
Pode apresentar-se sob a forma de várias combinações de corionicidade e
amnionicidade, o que condiciona o desfecho e os riscos maternos, fetais e
perinatais. Para rastreio de aneuploidias aconselha-se apenas a ecografia do
1.º trimestre. O PPT é a principal causa de morbimortalidade, mas não existe
evidência que suporte as atitudes preventivas recomendadas em gestações
simples (progesterona vaginal, pessário de Arabin ou ciclorrafia cervical). A
redução embrionária deve ser considerada se o casal manifestar esse desejo,
associando-se a uma melhoria dos desfechos obstétricos e perinatais (aborto
~11% na gestação trigemelar vs. ~5% após redução para gemelar; parto <28
semanas ~8% vs. ~3%; parto <32 semanas ~20% vs. ~10%; mortalidade pe- rinatal
92/1 000 vs. 26,6/1 000). Na gravidez tricoriónica está indicada a avaliação
ecográfica mensal, com medição do comprimento cervical a partir das 16
semanas. Se existir um componente MC, seguir o protocolo de vigilância das
gestações MC (ver "Vigilância da gravidez"). Está indicada a administração
profilática de um ciclo de corticosteroides às 28 semanas (exceto se existir
outra indicação para a sua administração mais precoce).
Gravidez Múltipla – Vigilância Pré-Natal e Complicações 85
PROGRAMAÇÃO DO PARTO
De acordo com o tipo de gravidez múltipla, a terminação da gravidez deve ser
programada nos seguintes momentos:
■ Gemelar BC: às 37-38 semanas;
■ Gemelar MC: às 36 semanas;
■ Gemelar MC pós-laser: cesariana às 35 semanas;
■ Gemelar MA: cesariana às 32-34 semanas;
■ Trigemelar: cesariana às 34-35 semanas.
Deve ser realizado ciclo de corticosteroides se for previsível que ocorra um
(PPT) a curto prazo (ver protocolo “71. Corticosteroides para indução da ma-
turidade fetal”).
BIBLIOGRAFIA
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higher-order multifetal pregnancies. ACOG Practice Bulletin No. 231. Obstet Gynecol.
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INSTITUTE OF M EDICINE AND NATIONAL RESEARCH COUNCIL. Weight gain during pregnancy: re-
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86 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
INTRODUÇÃO
Entende-se por rotura prematura de membranas (RPM) aquela que ocorre na
ausência de trabalho de parto. A incidência é de 8-10% de todas as gestações
e em ~3% a RPM ocorre antes das 37 semanas. O diagnóstico é baseado
na história clínica e na visualização ao espéculo de líquido amniótico (LA)
exteriorizando-se pelo orifício cervical externo, se necessário após manobras
de Valsalva ou mobilização fetal. Quando há dúvida no diagnóstico, pode recor-
rer-se ao teste de cristalização, avaliação do pH vaginal (nitrazina), ou deteção
de -microglobulina 1 placentária (AmniSure®) no líquido vaginal. Pode também
ser útil a avaliação ecográfica do LA.
ABORDAGEM CLÍNICA
A grávida deve ser informada dos riscos associados à RPM, de acordo com a
idade gestacional (parto pré-termo (PPT), corioamnionite, deformidades postu-
rais, hipoplasia pulmonar) e deve ser proposto internamento. Deve ser realizada
colheita para urocultura, exsudado vaginal para aeróbios, exsudado cervical para
Chlamydia trachomatis e Neisseria gonorrhoeae e exsudado vaginal/rectal para
Streptococcus do grupo B (caso não tenha sido realizado há menos de5
semanas). O toque vaginal só está indicado na presença de contractilidade uterina
regular e dolorosa, perante suspeita de prolapso do cordão ou quando está
indicada a indução do trabalho de parto.
(PO) toma única. A partir do 3.º dia: amoxicilina 500 mg PO 8/8 horas durante
5 dias. Se alérgica à penicilina: clindamicina 900 mg EV 8/8 horas 48 horas +
gentamicina (1 mg/kg) EV 8/8 horas 48 horas + azitromicina 1 g PO toma única,
seguindo-se clindamicina 300 mg PO 8/8 horas durante 5 dias;
■ Se houver oligoâmnios persistente durante ≥10 dias deve ser transmitido aos
pais o prognóstico muito desfavorável, informando da possibilidade de solicitar
uma interrupção médica da gravidez (IMG).
88 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
BIBLIOGRAFIA
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MACROSSOMIA FETAL 24
CATARINA POLICIANO, CLÁUDIA ARAÚJO
INTRODUÇÃO
Designa-se por “suspeita de macrossomia fetal” uma estimativa ecográfica
do peso fetal acima do percentil 90 (p90) para a idade gestacional. Define-se
recém-nascido (RN) macrossómico como aquele que apresenta um peso ao
nascer >4 000 g. Cerca de 8% dos RN têm um peso >4 000 g e ~1% tem um
peso >4 500 g, mas este número varia muito de acordo com as características
da população estudada. A ecografia tem uma margem de erro de ~15% na
estimativa de peso fetal (EPF), apresenta uma baixa sensibilidade na deteção
de RN macrossómicos, mas uma especificidade elevada, ~97% para o peso
>4 000 g e ~99% para o peso >4 500 g. O exame abdominal e a altura uterina
continuam a ser métodos úteis de rastreio, mas a suspeita de macrossomia
fetal deve ser sempre estabelecida por exame ecográfico. A macrossomia fetal
está associada a um aumento da incidência de trabalho de parto estacionário
e parto distócico (cerca de 2 vezes), lacerações perineais (cerca de 2-3 vezes)
e hemorragia pós-parto (cerca de 2 vezes). Verifica-se ainda uma maior morbi-
lidade neonatal em consequência do risco aumentado de distocia de ombros
(cerca de 15 vezes): fratura da clavícula (cerca de 8 vezes), paralisia do plexo
braquial (cerca de 20 vezes, sendo que a 80-90% resolve sem incapacidade
permanente) e asfixia perinatal. Os principais fatores de risco para macrossomia
fetal são: diabetes mellitus descompensada (incidência ~20%), antecedentes de
RN macrossómico (risco 5-10 vezes superior), obesidade materna (risco 2
vezes superior), ganho excessivo de peso durante a gravidez (≥12 kg – risco 2-
3 vezes superior).
BIBLIOGRAFIA
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POLIHIDRÂMNIOS 25
SARA VARGAS , S USANA SANTO
INTRODUÇÃO
Define-se polihidrâmnios como um volume de líquido amniótico (LA) aumentado e
tem uma incidência de 1-2%. É frequentemente um achado ecográfico ocasional
no 2.º ou 3.º trimestres, mas pode ser suspeitado perante uma altura uterina
acima do esperado. O diagnóstico é ecográfico e corresponde a um índice de
LA (ILA) ≥25 cm ou a um maior lago de LA ≥8 cm. É classificado como ligeiro
em ~80% dos casos (ILA 25-29 cm ou maior lago 8-12 cm), moderado em ~15% (ILA
30-34 cm ou maior lago 12-16 cm) ou grave em ~5% (ILA ≥35 cm ou maior lago >16
cm). O volume de LA traduz um balanço entre a sua produção e eli- minação e na
segunda metade da gravidez resulta essencialmente da produção de urina e da
deglutição fetal. Assim, as causas principais de polihidrâmnios (Quadro 25.1) são
as situações que condicionam aumento da produção de urina (circulação
hiperdinâmica, anomalia renal, diurese osmótica) ou a diminuição da
capacidade de deglutição (obstrução digestiva, doença neuromuscular). O
prognóstico depende da etiologia e da gravidade do polihidrâmnios. Em 50-
60% dos casos é idiopático (diagnóstico de exclusão), mas pode associar-se a
outras condições. Estão presentes malformações fetais em ~80% dos casos de
polihidrâmnios grave.
Nos casos mais graves a grávida pode apresentar como sintomas, dispneia,
desconforto abdominal ou contractilidade relacionada com a distensão uterina.
Associa-se a maior risco de rotura prematura de membranas (RPM), apresenta-
ção/situação fetal anómala, parto pré-termo (PPT), prolapso do cordão umbilical,
descolamento placentário, trabalho de parto prolongado, parto distócico, atonia
uterina pós-parto e morte perinatal.
(continuação)
Causas fetais
– Músculosqueléticas: acondroplasia, displasia tanatofórica, artrogripose, miastenia gravis
– Tumores fetais como teratoma sacrococcígeo
– Orofaciais: fenda palatina, micrognatia
■
Doenças neuromusculares
■
Endocrinopatias: diabetes insípida, tireotoxicose, pseudo-hipoaldosteronismo, síndrome de Bartter
■
Anemia
■
Macrossomia
■
Aneuploidia/síndrome genético
■
STFF
Causas placentárias
■
Corioangioma
CMV – citomegalovírus; SNC – sistema nervoso central; STFF – síndrome de transfusão feto-fetal.
ABORDAGEM CLÍNICA
Polihidrâmnios assintomático
A abordagem inicial tem como objetivo identificar a etiologia e a gravidade do
polihidrâmnios:
■ Anamnese e reavaliação analítica;
■ Exclusão de diabetes;
■ Pesquisa de anticorpos irregulares;
■ Completar rastreio de infeções: CMV, toxoplasmose, varicela, parvovírus B19,
sífilis;
■ Ecografia com Doppler multivasos;
■ Ecocardiograma fetal;
■ Estudo citogenético fetal se houver anomalias ecográficas, polihidrâmnios
grave ou restrição de crescimento fetal (RCF).
Algumas situações (diabetes, anemia) são passíveis de correção, com reversão
do polihidrâmnios. A grávida deve ser referenciada às consultas de Medicina Fetal
e de Genética se na ecografia houver malformações estruturais ou polihi-
drâmnios grave. Nos casos de polihidrâmnios ligeiro idiopático e assintomático
a atitude deve ser expectante com vigilância ecográfica mensal. Nas restantes
situações, a vigilância deve ser adaptada à etiologia e gravidade da situação
(ecografia cada 1-3 semanas). A programação do parto deve ser definida por
critérios obstétricos.
Polihidrâmnios sintomático
Amniorredução (1.4 escolha)
Deve ser realizada na Unidade de Ecografia com a grávida internada ou em obser-
vação. Realizar tocólise e ciclo de corticosteroides se houver ameaça de parto pré-
-termo (APPT). Inserção de uma agulha 20G sob controlo ecográfico, usando técni-
ca estéril. Aspiração ativa de 100-125 ml/minuto de LA até o ILA/maior lago de LA
Polihidrâmnios 95
se encontrarem dentro dos valores normais ou até um valor máximo de 2 500 ml.
Pode haver desconforto ou dor abdominal ligeiros que geralmente cessam rapi-
damente. O risco de complicações é muito baixo, mas inclui: trabalho de parto
pré-termo, descolamento placentário, RPM e corioamnionite. Deve realizar cardio-
tocografia (CTG) durante 2 horas após o procedimento. Estando assintomática,
a grávida poderá ter alta, com indicação para fazer contagem formal dos movi-
mentos fetais e avaliação diária da temperatura axilar. Deve dirigir-se à urgência
de Obstetrícia e Ginecologia se: contrações uterinas regulares, perda de LA,
hemorragia vaginal, temperatura >38,5 °C ou redução dos movimentos fetais.
A amniorredução está contraindicada nas grávidas seropositivas para o vírus
da imunodeficiência humana (VIH), hepatite B e C com carga viral (CV) elevada,
bem como na fase ativa do trabalho de parto. Ponderar terminar a gravidez a
partir das 35 semanas de gestação, se polihidrâmnios sintomático e recorrente.
Indometacina (como terapêutica de manutenção após amniorredução ou quando esta está con-
traindicada)
Até às 32 semanas de gestação na dose de 25 mg per os (PO) 6/6 horasnos
casos de recorrência de polihidrâmnios sintomático com necessidade de
amniorredução seriada ou se existe contraindicação para amniorredução. Deve
ser realizado ecocardiograma fetal 24-48 horas após o início da terapêutica e
depois semanalmente, bem como avaliação ecográfica semanal do LA. Contrain-
dicações: úlcera péptica, discrasia hemorrágica, doença renal crónica (DRC),
hipersensibilidade aos anti-inflamatórios não esteroides (AINE), idade gestacional
superior a 32 semanas.
BIBLIOGRAFIA
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
26 COLESTASE GRAVÍDICA
INTRODUÇÃO
A colestase gravídica na população portuguesa ocorre em cerca de 2% de todas
as gestações e caracteriza-se por prurido generalizado e elevação dos ácidos
biliares, frequentemente associados ao aumento das enzimas hepáticas. Tem uma
fisiopatologia ainda pouco esclarecida, estando envolvidos fatores genéticos e
hormonais. A sua importância clínica prende-se com o incómodo causado pelo
prurido materno e com o risco de morte fetal que ocorre em ~1,2% dos casos,
numa idade gestacional mediana de 38 semanas. A morte fetal parece ser
decorrente de um evento agudo de causa ainda não esclarecida, não estando
envolvido um processo hipoxico crónico, e ocorre sobretudo em grávidas com
valores elevados de ácidos biliares (>40 µmol/L). A incidência de colestase
gravídica é ~2%, sendo mais frequente em gestações múltiplas. Pode ocorrer no
2.º ou no 3.º trimestres (sendo mais frequente neste último) e resolve esponta-
neamente após a gravidez. Não existe evidência de complicações a longo-prazo,
mas ~50% dos casos recorrem em gestações subsequentes, aumentando para
~90% se houver também história familiar. O diagnóstico baseia-se na ocorrência
de prurido generalizado com predomínio nas palmas das mãos e plantas dos
pés, geralmente com agravamento noturno. No exame físico não se observa
eritema cutâneo, mas podem existir lesões de coceira. A suspeita clínica deve ser
confirmada pelos seguintes exames complementares:
■ Ácidos biliares preferencialmente em jejum: é o parâmetro mais sensível, sendo
geralmente >10 µmol/L; Formatada: Não Realc
■ Aspartato aminotransferase (AST), alanina aminotransferase (ALT), bilirru- bina
total: os valores de referência na gravidez são ~20% inferiores aos da população
geral e geralmente estão elevados nesta doença, não sendo no entanto um
critério necessário para o diagnóstico;
■ Tempo de protrombina (TP), tempo de tromboplastina parcial ativada (aPTT):
alterados em ~20% dos casos;
■ Ecografia abdominal superior (para exclusão de lesão hepática e de litíase biliar).
Em casos atípicos podem também ser úteis: antigénio de superfície do VHB
(Ag HBs), anti-VHA total, anti-VHC, serologia do vírus Epstein-Barr, serologia do
citomegalovírus (CMV) (para exclusão de causas virais), anticorpos antimúscu-
lo liso (SMA), anticorpos anti-LKM (microssomal do fígado e rim) e anticorpos
antimitocondriais (para exclusão de causas autoimunes).
ABORDAGEM CLÍNICA
A vigilância deve preferencialmente ser realizada em ambulatório, com reavalia-
ção semanal dos ácidos biliares, marcadores da função hepática e cardiotoco-
grafia (CTG). Para alívio sintomático do prurido prescrever:
■ Hidroxizina 25 mg per os (PO) 6/6 horas;
Colestase Gravídica 97
Internamento
Indicado se ácidos biliares >40 μmol/L ou se prurido refratário à terapêutica
anteriormente descrita:
■ Se prurido refratário à medicação anterior, associar rifampicina 150-300 mg
PO 12/12 horas (rifampicina caps. 300 mg). Contraindicações: obstrução biliar,
alcoolismo. Efeitos secundários: náuseas, vómitos, diarreia, flatulência, anorexia,
astenia, confusão, sonolência, cefaleias, ataxia, tonturas, distúrbios visuais,
alterações da função hepática e renal, síndrome febril, eritema, eo- sinofilia,
leucopenia transitória, trombocitopenia, hemólise;
■ Avaliação bissemanal das enzimas hepáticas;
■ CTG 1 vez/turno.
Terminação da gravidez
■ Às 38 semanas, se ácidos biliares <40 µmol/L;
■ Às 36 semanas, se ácidos biliares persistentemente >40 μmol/L;
■ Entre as 34-36 semanas, se prurido refratário à terapêutica, icterícia, antece-
dentes de morte fetal <36 semanas associada a colestase gravídica, ácidos
biliares persistentemente >100 μmol/L apesar da terapêutica ou agravamento
persistente das enzimas hepáticas.
A via de parto rege-se por critérios obstétricos.
Puerpério
Suspender a medicação específica da colestase gravídica, mantendo apenas
hidroxizina em SOS. A amamentação não está contraindicada. Em relação à
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
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ISOIMUNIZAÇÃO RH (D) – PREVENÇÃO E ABORDAGEM 27
ANDREIA F ONSECA , S USANA S ANTO
INTRODUÇÃO
Entende-se por isoimunização na gravidez a formação de anticorpos maternos
contra antigénios (Ag) de origem paterna expressos na membrana celular dos
eritrócitos fetais, podendo associar-se a doença hemolítica fetal e neonatal
(DHFN). O antigénio D do sistema Rhesus é o mais frequentemente envolvido
na DHFN moderada a grave (outros são os grupos Kell, Duffy, Kidd). A ausência do
gene que codifica o Ag D classifica um indivíduo como Rh (D) negativo, o que
ocorre em cerca de 15% das grávidas de origem europeia. Um número pequeno de
indivíduos classificados como D fraco apresentam variantes doAg D que podem
levar à produção de anticorpos anti-D; durante a gravidez devem ser considerados
como Rh (D) negativos. A sensibilização de mulheres Rh (D) negativas pode
ocorrer fora da gravidez através de transfusão de sangue ou hemoderivados,
partilha de agulhas, produtos contaminados com sangue e transplante de órgãos).
O Ag D é detetável no sangue fetal após as 7 semanas de gestação e a
sensibilização materna pode ocorrer com volumes pequenos (<0,3 ml). Após a
exposição, ocorre uma resposta lenta, predominantemente de imunoglobulina
(Ig) M, à qual se segue a produção de IgG capaz de atravessara placenta. Numa
nova exposição, a resposta IgG é geralmente rápida e exu- berante, mesmo para
quantidades pequenas de sangue fetal (0,05-0,1 ml). A administração pós-natal
sistemática de Ig anti-D a puérperas suscetíveis leva a uma redução da taxa de
isoimunização de 16% para 2%. Com a profilaxia sistemática às 28 semanas reduz-
se este número para cerca de 0,2%.
trada às 28 semanas).
Aborto e morte fetal
■ Aborto, interrupção médica da gravidez (IMG) ou gravidez ectópica (GE) ≥7
semanas;
■ Doença gestacional do trofoblasto;
■ Morte fetal no 2.º ou 3.º trimestres.
100 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
(1 g/kg de peso materno semanal) a partir das 10-12 semanas para protelar a
necessidade de cordocentese e de transfusão intrauterina até às 22-24 semanas.
Terminação da gravidez
■ Às 37-38 semanas nos casos com baixo risco de anemia;
■ Após as 35+0 semanas quando há suspeita de anemia moderada ou grave
(VPS-ACM ≥1,5 MoM ou hidrópsia fetal);
■ Após a última transfusão, a terminação da gravidez deve ser agendada tendo
em conta o tempo decorrido desde o último procedimento, o tempo expectável
para o feto apresentar anemia e a avaliação fetal (ecografia e CTG).
A via de parto é decidida por critérios obstétricos, exceto na suspeita de anemia
grave (CTG patológica ou hidrópsia fetal) em que está indicada a cesariana.
Informar a Neonatologia, a fim de agilizar o pedido de hemoderivados que possam
ser necessários. Após o parto, colher sangue do cordão umbilical para hemograma,
bilirrubina e teste de Coombs direto (tubo de coagulação).
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Management of alloimmunization during
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antibodies during pregnancy. Green-top Guideline No. 65. RCOG, 2014.
HIDRÓPSIA FETAL NÃO IMUNE 28
M ARIA PULIDO VALENTE, M ARIA DE CARVALHO AFONSO
INTRODUÇÃO
Define-se hidrópsia fetal como a acumulação de líquido em dois ou mais dos
seguintes compartimentos fetais: peritoneu (ascite), pleura (derrame pleural),
pericárdio (derrame pericárdico) e tecido celular subcutâneo (espessura cutânea
>5 mm). Associa-se frequentemente a placentomegalia (espessura ≥4 cm no 2.º
trimestre e ≥6 cm no 3.º trimestre) e a polihidrâmnios. Devido ao uso generali-
zado de imunoglobulina (Ig) anti-D na profilaxia de isoimunização Rh, ~90% dos
casos de hidrópsia fetal são de causa não imune. A incidência de hidrópsia
fetal não imune ronda os 0,06%. As grávidas estão geralmente assintomáticas, mas
podem referir aumento do volume abdominal ou diminuição dos movimentos fetais.
Muito raramente ocorre a síndrome de Ballantyne (mirror syndrome), de
etiopatogenia desconhecida, que é caracterizado pelo aparecimento de edema
materno generalizado, proteinúria e, ocasionalmente, pré-eclâmpsia. São vários
os mecanismos fisiopatológicos subjacentes à hidrópsia fetal: redução da pres-
são oncótica sanguínea (p. ex., anemia, doença hepática, nefropatia), aumento
da pressão venosa (p. ex., cardiopatias), aumento da permeabilidade capilar
(p. ex., infeção congénita) ou obstrução da drenagem linfática na cavidade
torácica e abdominal. As principais causas estão expostas no Quadro 28.1.
As cromossomopatias constituem mais de metade dos casos antes das 20 semanas.
Após as 24 semanas, a etiologia mais frequente são as cardiopatias congénitas. A
sobrevivência global é inferior a 50% e o prognóstico depende da etiologia
subjacente e da idade gestacional. O presente protocolo estabelece a abordagem
inicial desta situação, de forma a chegar a uma etiologia provável.A abordagem
subsequente de cada causa e o risco de recorrência ultrapassamo âmbito do
protocolo.
Trissomia 21
■
Outras
■
Hematológica (4-12%)
Anemia (causa fetal ou extrafetal), aplasia das células vermelhas
■
Hemoglobinopatias (alfa-talassemia)
■
Infeciosa (5-7%)
■
Parvovírus B19
■
CMV
■
Sífilis
■
Toxoplasmose
(continua)
104 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
(continuação)
Malformações
Cardiovasculares (17-35%) – estruturais ou do ritmo
■
Torácicas (6%)
■
Gastrointestinais (0,5-4%)
■
STFF (3-10%)
Síndromes genéticas (3-4%)
■
Rasopatias (síndrome de Noonan e espectro Noonan)
■
Síndrome de pterígios múltiplos
■
Sequência de deformidades por acinesia fetal
■
Síndrome nefrótica congénita
■
Síndrome de linfedema congénita
Doenças metabólicas (1-2%)
Doenças dos lisossomas (mucopolissacaridoses, doença de Gaucher,
■
doença de Niemann-Pick)
Défices congénitos da glicosilação: PMM2 (fosfomanomutase 2), etc.
■
Glicogenose tipo IV
■
Linfangioma
■
Tuberoma
■
Neuroblastoma
■
Placentares e do cordão
■
Corioangioma
■
Angiomixoma do cordão
■
Aneurisma da AU
■
Torção da veia umbilical
■
Nó verdadeiro do cordão
Causa mista (3-15%)
Desconhecida (15-25%)
CMV – citomegalovírus; STFF – síndrome de transfusão feto-fetal; AU – artéria umbilical.
ABORDAGEM CLÍNICA
A abordagem etiológica da hidrópsia fetal não imune deve ser multidisciplinar,
envolvendo a Obstetrícia e a Genética. O estudo deve ser feito por etapas,
procurando primeiro as causas mais frequentes e, só depois, as mais raras.É
importante averiguar a história pessoal e familiar de doenças crónicas, gené-
ticas, exposição a medicamentos, tóxicos e infeções.
Hidrópsia Fetal Não Imune 105
Avaliação materna
Avaliação fetal
Ecografia morfológica com avaliação da velocidade máxima do pico sistólico
(VMPS) na artéria cerebral média (ACM) e ecocardiograma fetal. A subsequente
abordagem rege-se pelo esquema da Figura 28.1.
Diagnóstico invasivo
■ Biópsia das vilosidades coriónicas (BVC), amniocentese ou cordocentese para
avaliação genética: pesquisa de aneuploidias (13, 18, 21, X e Y) por quan-
titative florescence polymerase chain reaction (QF-PCR), estudo do cariotipo
fetal (se aneuploidia presente no QF-PCR), análise array comparative genomic
hybridization (CGH) se QF-PCR normal;
■ Polymerase chain reaction (PCR) para fator Rh (D) fetal, painel next generation
sequencing (NGS) para rasopatias (síndrome de Noonan e espectro Noonan)
se análise array CGH normal e suspeita ecográfica, painel alargado de genes
(exoma clínico ou total) se houver história pessoal/familiar (decisão conjunta
com Genética);
■ Avaliação de infeção fetal (se análise materna compatível com imunidade ou
primoinfeção) – PCR para CMV, parvovírus B19 (se sinais de anemia fetal) e
toxoplasmose;
■ Avaliação metabólica fetal (se forte suspeita de doença metabólica) – pedir
estudo bioquímico e enzimático para doenças metabólicas.
Em caso de necessidade de punção de cavidades fetais, proceder à avaliação
citológica, exame bioquímico e bacteriológico do líquido. Em caso de cordocen-
tese, avaliar hemograma com plaquetas. Indicar ao laboratório para armazenar
material para eventuais estudos posteriores.
IDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
106 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
■
Provável INFEÇÃO FETAL, ■
Provável ANEMIA FETAL
sem anemia ■
Serologias do parvovírus
■
Serologias (CMV,Toxoplasma ■
Estudo das hemoglobinas
gondii e parvovírus B19) com eventual estudo
molecular (G-6-PD; G-6-PI;
Se não houver infeção mater-
def. piruvato-quinase)
na documentada, equacionar ■
Teste de Kleihauer-Betke/
doença metabólica ou cau-
/citometria de fluxo
sas raras de infeção.
MoM – múltiplos da mediana.
Figura 28.1 – Abordagem clínica na investigação etiológica da hidrópsia fetal não imune.
BIBLIOGRAFIA
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RESTRIÇÃO DE CRESCIMENTO FETAL 29
JOANA GOULãO BARROS , R UI M ARQUES DE C ARVALHO
INTRODUÇÃO
O termo restrição de crescimento fetal (RCF) refere-se às situações em que o
feto, devido a fatores genéticos ou ambientais, não atinge o seu potencial de
crescimento. A RCF deve ser suspeitada ecograficamente quando a estimativa
de peso fetal (EPF) ou perímetro abdominal (PA) são <p10. A etiologia da RCF é
variada e pode dividir-se em causas maternas, fetais e placentárias. As causas
maternas incluem as doenças crónicas com compromisso respiratório, vascular
ou hemodinâmico (doenças pulmonares, cardíacas, renais, endocrinológicas,
hematológicas), exposição a tóxicos, deficiências nutricionais e má absorção
intestinal. As causas fetais incluem as anomalias cromossómicas, doenças gené-
ticas ou congénitas (sobretudo cardiopatias) e as infeções fetais. A insuficiência
placentária refere-se às situações de défice crónico da função vilositária, que
pode dever-se a invasão trofoblástica deficitária, enfarte, inflamação ou fibrose.
A avaliação etiológica destas situações deve basear-se na história clínica, com
identificação dos fatores anteriormente descritos, e nas seguintes medidas:
■ Ecografia detalhada, incluindo reavaliação morfológica, avaliação do líquido
amniótico (LA), fluxometria fetal multivasos [artéria umbilical (AU), artéria
cerebral média (ACM), ducto venoso (DV) e índice cerebroplacentário (ICP)] e
fluxometria das artérias uterinas maternas. Ecocardiografia se houver suspeita
de cardiopatia fetal;
■ Reavaliação das serologias maternas para citomegalovírus (CMV), sífilis, to-
xoplasmose e rubéola;
■ Reavaliação do rastreio e diagnóstico pré-natal de aneuploidias;
■ Referenciação à consulta de Medicina Fetal se RCF confirmada.
A abordagem clínica subsequente depende da etiologia da RCF e rege-se de acordo
com protocolos específicos, podendo incluir a amniocentese com estudo de array
comparative genomic hybridization (CGH) e estudo de infeções fetais,se houver
suspeita de causa genética ou infeciosa.
descritas. Deve ser subdividida em precoce (<32 semanas) e tardia (≥32 semanas),
representando formas diferentes de apresentação e de progressãoda doença.
Estabelece-se o diagnóstico de RCF precoce quando a EPF ou PAsão <p3, ou
quando há um fluxo telediastólico ausente na AU. São também critérios de
diagnóstico uma EPF ou PA <p10, desde que associado a índice de pulsatilidade
(IP) da AU ou na artéria uterina >p95. Nas gestações com menosde 24 semanas,
considera-se RCF quando a EPF é <p10, independentemente
108 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Se fluxo telediastólico umbilical invertido ou IP do DV >p95 ou oligoâmnios (maior lago <2 cm)
■Propor internamento;
■Iniciar ciclo de corticosteroides para maturação fetal (ver protocolo “71. Cor-
ticosteroides para indução da maturidade fetal”);
■ Fluxometria multivasos 3 vezes/semana;
■ CTG 1 vez/turno;
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ARRITMIAS CARDÍACAS FETAIS 30
S USANA SANTO , M ÓNICA REBELO
INTRODUÇÃO
As arritmias cardíacas fetais complicam ~2% das gestações, podendo ser dete-
tadas por auscultação da frequência cardíaca fetal (FCF), cardiotocografia (CTG)
ou ecografia, sendo esta última geralmente usada para confirmar o diagnóstico.
O presente protocolo descreve as principais arritmias, indicando as que justificam
a realização de um ecocardiograma fetal para melhor caracterização do ritmo
cardíaco e para exclusão de doença cardíaca estrutural.
EXTRASSÍSTOLES
As extrassístoles raramente se associam a doença cardíaca estrutural e, na
maioria dos casos, não necessitam de intervenção, principalmente quando são
ocasionais [<3-5/minuto e linha de base entre 110-160 batimentos por minuto
(bpm)]. As extrassístoles supraventriculares são as mais frequentes e raramente
evoluem para taquiarritmia. Nestas situações está recomendada a diminuição
do consumo de cafeína e de outros estimulantes. Quando as extrassístoles são
mais frequentes justifica-se uma avaliação ecocardiográfica em 2-3 semanas.
Quando ocorre bloqueio da condução auriculoventricular dos batimentos ectópi-
cos, a frequência ventricular pode estar reduzida.
TAQUIARRITMIAS
Traduzem-se por uma linha de base >160 bpm e associam-se a malformações
cardíacas em 1-5% dos casos.
Taquicardia sinusal
Linha de base entre 160-200 bpm. Requer avaliação materna para excluir fe- bre,
tirotoxicose, infeção, administração de fármacos taquicardizantes. Se não for
identificada uma causa materna, deve realizar-se ecografia obstétrica para
excluir anemia fetal e malformações. Caso não se identifique um motivo para
a taquicardia e a linha de base persista >180 bpm, deve realizar-se um eco-
cardiograma fetal. Se a linha de base estiver entre 160-180 bpm, deve realizar
um ecocardiograma apenas se a taquicardia se mantiver em duas observações
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
distintas.
Taquicardia supraventricular
É a forma mais frequente de taquicardia, podendo ser intermitente ou persis-
tente, com uma linha de base geralmente entre 180-260 bpm. O mecanismo
mais frequente é o de reentrada auriculoventricular. A persistência de taquicardia
112 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Digoxina
■ Dose inicial: 1-2 mg per os (PO) de 12/12 horas nas primeiras 24 horas;
■ Dose de manutenção: 0,5-0,75 mg PO 1 vez/dia.
Deve avaliar-se digoxinemia diária nas primeiras 48 horas e posteriormente a cada
3 dias – os níveis pretendidos são de 1-2 ng/ml (2-3 ng/ml nos fetos com
hidrópsia). A terapêutica com digoxina deve ser iniciada em regime de
internamento, com monitorização da toxicidade materna – gastrointestinal, do
sistema nervoso central (SNC) e cardíaca (arritmias), esta última através de
eletrocardiograma (ECG) diário. Nos fetos com hidrópsia há geralmente maior
resistência à terapêutica com digoxina, comparativamente a outros fármacos.
Pode ser necessário considerar a administração intramuscular (IM) ou intrape-
ritoneal no caso de não haver resposta à terapêutica oral.
Sotalol
■ Dose inicial: 80 mg PO 8/8 horas;
■ Dose de manutenção: 160-480 mg/dia divididos em 8/8 horas (reajustada a
cada 72 horas com base na FCF).
Deve realizar-se ECG materno diário. A dose deve ser diminuída antes do parto
para reduzir os riscos de hipoglicemia neonatal.
Flecainida
100-300 mg/dia PO divididos em 8/8 horas. Os níveis séricos pretendidos são
de 0,2-1 mcg/ml. Pode determinar aumento dos níveis de digoxina se for utilizada
em simultâneo. Deve realizar-se ECG materno diário.
Flutter auricular
Mais raro que a taquicardia supraventricular, apresenta uma frequência auricular
entre 300-500 bpm e uma frequência ventricular de 150-200 bpm, devido a
um bloqueio da condução auriculoventricular de 2:1, 3:1 ou 4:1. O mecanismo
é geralmente de macrorreentrada auricular. Associa-se a alterações cromossó-
micas ou a doença estrutural cardíaca em ~30% dos casos. A hidrópsia fetal
é frequente. Deve iniciar-se terapêutica antiarrítmica preferencialmente com sotalol
(ver “Sotalol”).
Taquicardia ventricular
É uma situação muito rara, caracterizada por uma FCF >200 bpm. Pode resol-
ver espontaneamente ou necessitar de tratamento com propranolol 40 mg PO 6/6
horas ou 8/8 horas ou amiodarona [dose inicial 1 800-2 400 mg/dia PO
Arritmias Cardíacas Fetais 113
BRADIARRITMIAS
Traduzem-se por uma linha de base <100 bpm.
Bradicardia sinusal
A frequência auricular é igual à ventricular. Pode ser devida a uma disfunção do
nódulo sinusal, síndrome do QT longo ou malformações cardíacas congénitas.
Devem ser avaliados os anticorpos anti-Ro/SSA e anti-La/SSB maternos.
Síndrome do QT longo
É uma situação muito rara. Pode manifestar-se com bradicardia, mas mais fre-
quentemente apresenta-se com períodos alternados de bradiarritmia e taquiar-
ritmia. É importante averiguar a história familiar e orientar para a Cardiologia
Pediátrica.
BIBLIOGRAFIA
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Expert Consensus Panel. FIGO consensus guidelines on intrapartum fetal monitoring: Car-
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SOUTHALL DP, RICHARDS J, HARDWICK RA, et al. Prospective study of fetal heart rate and rhythm
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MORTE FETAL 31
S USANA REGO , RUI M ARQUES DE C ARVALHO , L UÍSA PINTO , D IOGO AYRES DE CAMPOS ,
CRISTINA FERREIRA
INTRODUÇÃO
Entende-se por morte fetal aquela que ocorre antes da expulsão ou extração
completa do útero, ocorrendo em ~0,2% das gestações. O diagnóstico estabe-
lece-se quando não são visualizados batimentos cardíacos fetais na ecografia
(confirmada por dois operadores, sendo pelo menos um deles especialista) ou
quando nasce um feto sem sinais de vida.
O presente protocolo diz respeito a todas as situações de morte fetal, ou seja,
às gestações cujo feto tem biometrias compatíveis com idade gestacional ≥10+0
semanas.
Os principais fatores de risco são: raça negra [odds ratio (OR) 2,0-2,2], idade
materna ≥35 anos (OR 1,8-3,3), nuliparidade (OR 1,2-3,0), obesidade (OR 2,1-
-2,8), hipertensão (OR 1,5-2,7), diabetes (OR 1,2-7,0), tabagismo (OR 1,7-3,0)
e gestação múltipla (OR 1,0-3,7). As principais causas de morte fetal são:
patologia fetal (restrição de crescimento, anomalias cromossómicas, malforma-
ções congénitas, hidrópsia), patologia obstétrica (doença hipertensiva, colestase
gestacional), infeção intrauterina, hemorragia feto-materna, descolamento pla-
centário, anomalias do cordão umbilical e hipoxia intraparto. Dependendo da
investigação realizada, não se encontra causa aparente em 25-60% dos casos, mas
o estudo genético, a autópsia e o exame anátomo-patológico da placenta
permitem um diagnóstico etiológico mais preciso.
A morte fetal é geralmente causa de grande sofrimento para a grávida e fami-
liares. Deve ser transmitida por um médico especialista, num local resguardado,
de forma empática, mas passando uma informação inequívoca e dando tempo
para que o(s) recetor(es) percorram a cadeia de reações consequentes à rece- ção
de más notícias. Se necessário, deve ser solicitado o apoio da Psicologia. Deve ser
proposto o internamento hospitalar e a terminação da gravidez logo que
possível, mas adaptando isto à vontade da grávida.
realizado na gravidez);
■ Hemograma.
Terminação da gravidez
■ Mifepristona 200 mg per os (PO) toma única, seguida de alta, levando 4
comprimidos (comps.) de misoprostol para casa;
116 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Terminação da gravidez
Até às 28+0 semanas, não havendo cicatriz uterina prévia, deve ser utilizado o
esquema terapêutico acima exposto em “Terminação da gravidez”. Caso exista
uma cicatriz uterina prévia ou após as 28+0 semanas deve ser seguido o proto- colo
“74. Indução do trabalho de parto e maturação cervical”.
Estudo genético
Deve ser solicitado quando há malformações fetais ou fenótipo sugestivo, bem
como nas situações em que não existe uma explicação clara para a morte.
Morte Fetal 117
Estudo microbiológico
Se houver suspeita de infeção, enviar fragmento da placenta em meio seco estéril
para estudo microbiológico.
Registo de memórias
Aos pais deve ser dada total autonomia para decidir se querem ver, tocar, tirar
fotografias e fazer a impressão digital dos pés do bebé. Para alguns pais estes
gestos são importantes e podem ajudar no processo do luto.
evidente para a morte fetal (descolamento major da placenta, RCF grave, etc.),
deve colocar essa causa no CO eletrónico, sem necessidade de aguardar por
qualquer outra informação. Se não existe uma causa de morte evidente, ou se
for importante esclarecer algum outro aspeto, deve recomendar-se à puérpera a
realização de uma autópsia clínica (que carece da autorização da puérperae
deve ser decidida num prazo máximo de 24 horas). O pedido de autópsia deve
ser enviado para Anatomia Patológica, juntamente com a autorização da
puérpera, até ao dia útil seguinte ao nascimento. Se há dúvida na causade
morte e a autópsia foi autorizada, o CO eletrónico só deve ser passado após
o resultado provisório da mesma (no próprio dia e até 2 dias úteis). Nestas
situações ou se a autópsia clínica não explicar a causa de morte, existem duas
opções: a) o médico assume uma causa provável de morte e regista-a no CO
eletrónico; b) o médico regista “causa indeterminada” e a situação passa a ficar
na dependência do Instituto de Medicina Legal, com necessidade de envio do
corpo para autópsia médico-legal. Esta última opção deve ser bem ponderada,
porque consome recursos, atrasa o funeral e causa desgaste para a família.
Quadro 31.1 – R ESUMO DOS PROCEDIMENTOS A REALIZAR PERANTE O NASCIMENTO DE UM FETO MORTO , DE
ACORDO COM A IDADE GESTACIONAL , NÃO HAVENDO SUSPEITA DE ATOS ILEGAIS
Gestação <22+0 semanas Gestação 22+0-24+6 semanas Gestação ≥25+0 semanas
■
Exame histológico do feto e da ■
Não é obrigatório realizar fune- ■
Exame histológico da placenta
placenta (enviar para o serviço ral, mas os pais pode m optar (enviar para o serviço de Ana-
de Anatomia Patológica) por o fazer tomia Patológica)
■
Não se e mite CO ne m guia de ■
Em contexto IMG: igual à ges- ■
RN enviado para casa mor-
transporte tação <22 +0 semanas tuária
■
Não é necessário fazer o regis- ■
Eventual autópsia do RN, de
to civil, nem realizar funeral acordo com a autorização
■
Passar certificado de incapaci- da puérpera, no caso de não
dade temporária (14-30 dias) haver uma causa de morte
evidente
■
É obrigatório e mitir uma C O/
/guia de transporte
■
É necessário registo civil e fu-
neral do RN
■
Informar a puérpera que terá
direito a licença de materni-
dade
IMG – interrupção médica da gravidez.
CUIDADOS PUERPERAIS
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Ponderar supressão láctea se gravidez >20 semanas (ver protocolo “93. Cui-
dados maternos de rotina no puerpério”). Referenciação para a consulta de
Medicina Materno-Fetal, 6 semanas após o parto.
120 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Management of stillbirth. Practice
Bulletin No. 102. March 2009 (Reaffirmed 2016).
CÓDIGO PENAL. Diário da República 63/1995.
ROYAL COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNAECOLOGISTS. Late intrauterine fetal death and
stillbirth. Green-top Guideline No. 55. RCOG Press, 2010.
INTERRUPÇÃO MÉDICA DA GRAVIDEZ 32
M ARIANA PIMENTA , I NÊS FRANCISCO P EREIRA
INTRODUÇÃO
Entende-se por interrupção médica da gravidez (IMG) a utilização de procedi-
mentos médicos que levam ao aborto ou parto de um feto previamente vivo, pelos
motivos definidos na lei:
a) Quando constitui o único meio de remover perigo de morte ou de grave e
irreversível lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da grávida,
pode ser praticada em qualquer idade gestacional;
b) Quando se mostra indicada para evitar perigo de morte ou de grave e dura-
doura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da grávida e
for realizada nas primeiras 12+6 semanas de gestação;
c) Quando se prevê que o nascituro virá a sofrer de grave doença ou malforma-
ção congénita e se realizar até às 24+6 semanas de gestação. No caso de
fetos inviáveis pode ser praticada em qualquer idade gestacional;
d) Caso a gravidez tenha resultado de crime contra a liberdade e autodetermi-
nação sexual – até às 16+6 semanas.
ABORDAGEM CLÍNICA
O método a aconselhar depende da idade gestacional, avaliada pelo comprimento
craniocaudal (CCC) ou outras biometrias ecográficas fetais. A IMG medicamen-
tosa deve ser geralmente preferida, por estar associada a menor risco materno.
Com este método ocorre retenção de restos placentários em cerca de 8% dos casos
e hemorragia abundante com necessidade de suporte transfusional em
<1% dos casos. O esvaziamento uterino cirúrgico por aspiração/curetagem
tem riscos acrescidos de perfuração uterina, laceração cervical, aderências
uterinas e acretismo placentário posterior. Contudo, está fortemente recomen-
dado quando ocorre hemorragia vaginal abundante, compromisso hemodinâmico
e patologia materna, coagulopatia, patologia cardíaca grave, hemoglobina (Hb)
<9 mg/dl, porfirias hereditárias, insuficiência suprarrenal, corticoterapia crónica,
presença de dispositivo intrauterino (DIU) não removível, gravidez heterotópica,
alergia à mifepristona ou ao misoprostol, insuficiência hepática, insuficiência
renal, diabetes com vasculopatia, doença inflamatória intestinal agudizada, ou
quando é expectável uma má adesão ao esquema terapêutico e de controlo. É
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
SITUAÇÕES PARTICULARES
Antecedentes de cesariana
A IMG medicamentosa pode ser usada até às 24 semanas. A taxa de rotura uterina
é <1% com uma cicatriz e 2,5% com duas cicatrizes uterinas. O misopros-tol está
contraindicado após as 24 semanas, devido ao risco de rotura uterina.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Medical management of first trimes-
ter abortion. Practice Bulletin no. 143. Obstet Gynecol. 2014;123(3):676-692.
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IV
Doenças Maternas
Coexistentes
OBESIDADE E EXCESSO DE PESO 33
ANDREIA FONSECA, CLÁUDIA ARAÚJO
INTRODUÇÃO
As definições e subcategorias da obesidade estão consideradas na Tabela 33.1.
Para calcular o índice de massa corporal (IMC) devem ser utilizados valores pré-
gestacionais. Se estes não forem fidedignos, utilizam-se os avaliados na primeira
consulta da gravidez. Na grávida com obesidade estão aumentados os riscos de
diabetes gestacional (DG) (~6 vezes), doença hipertensiva da gravidez (~3 vezes),
anomalias congénitas, sobretudo defeitos do tubo neural (~2 vezes), macrossomia
fetal (~2 vezes), distocia de ombros (~2,5 vezes), índice de Apgar
<7 no 1.º minuto (~31%), internamento em Unidade de Cuidados Intensivos
Neonatais (~38%), morte perinatal (~2 vezes), cesariana (~2-3 vezes), infeção pós-
operatória (~2 vezes), hemorragia pós-parto (~2 vezes), depressão pós-parto (~2
vezes) e cessação precoce da amamentação (~40%). No termo da gravidez está
aumentado (~2 vezes) o risco de morte fetal a partir das 39-40 semanas.O
excesso de peso aumenta o risco de DG (~3 vezes), depressão pós-parto (~2 vezes)
e cessação precoce da amamentação (~12%). Existe ainda uma dimi- nuição de
~20% na taxa de deteção de malformações fetais. Os descendentes têm maior
risco de desenvolver obesidade e doença metabólica.
ABORDAGEM CLÍNICA
Preconceção
Encorajar a perda de peso antes de engravidar e enviar para consulta de Nu-
trição, de forma a diminuir os riscos anteriormente descritos. Ponderar enviar
LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Gravidez
■ Solicitar consulta de Nutrição desde o início da gravidez se IMC ≥30;
128 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Parto
■ Contenção elástica dos membros inferiores a partir do momento em que
deixe de deambular;
■ Profilaxia de tromboembolismo venoso (TEV), de acordo com protocolo “39.
Tromboembolismo venoso – profilaxia”;
■ Monitorização interna da frequência cardíaca fetal (FCF) se a qualidade da
monitorização externa não for satisfatória;
■ O primeiro período do trabalho de parto é geralmente mais demorado;
■ Em caso de cesariana, mantém-se a dose de antibiótico profilático, todos
os passos da técnica cirúrgica e o método de encerramento da pele. Se for
necessário melhorar a exposição cirúrgica, elevar o avental adiposo, fixando-o
com adesivo ao tórax. No final, colocar uma compressa sob o avental para
reduzir a humidade no local da ferida operatória.
Puerpério
■ Profilaxia do TEV, de acordo com protocolo “39. Tromboembolismo venoso –
profilaxia”;
■ Promover a mobilização precoce;
■ Utilizar meias de contenção elástica até à deambulação completa;
■ Evitar a desidratação;
■ A contraceção hormonal progestativa pode ser utilizada durante a amamen-
tação. Se não amamentar, evitar contraceção estroprogestativa quando IMC
>35, pelo risco de TEV. O método contracetivo ideal é o dispositivo intrauterino
(DIU) de levonorgestrel, a inserir 4-6 semanas após o parto.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Immediate Postpartum long-acting re-
versible contraception. Committee Opinion No. 670. Obstet Gynecol. 2016;128(2):e32-e37.
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CIRURGIA BARIÁTRICA PRÉVIA 34
CATARINA POLICIANO, CLÁUDIA ARAÚJO
INTRODUÇÃO
A cirurgia bariátrica é usada no tratamento da obesidade grau III e da obesidade
grau II com duas ou mais comorbilidades associadas, perante o insucesso das
mudanças de estilo de vida e da terapêutica médica. Divide-se em:
■ Cirurgia restritiva (banda gástrica ajustável, sleeve gástrico): cujo mecanismo de
ação é a redução do volume gástrico, implicando deficiências nutricionais
ligeiras;
■ Cirurgia malabsortiva (bypass jejuno-íleo ou jejunocólico, derivação biliopan-
creática): cujo mecanismo de ação é a redução do comprimento do intestino
delgado funcional, gerando assinergia entre os alimentos e as secreções
biliopancreáticas, implicando frequentemente défice de proteínas e micronu-
trientes (ferro, cálcio, vitamina B 12, ácido fólico e vitamina D);
■ Cirurgia mista (bypass gástrico em Y de Roux): o procedimento mais utilizado
atualmente, combinando os mecanismos de ação restritivo e malabsortivo.
A cirurgia bariátrica é frequentemente eficaz na otimização do peso prévio à
gravidez, na melhoria de comorbilidades associadas, especialmente diabetes
e hipertensão arterial (HTA), e na diminuição do risco de macrossomia fetal.
Por outro lado, aumenta o risco de restrição de crescimento fetal (RCF) e de
recém-nascidos leves para a idade gestacional. Raramente, os défices nutri-
cionais causam doença (p. ex., anemia por défice de vitamina B12).
ABORDAGEM CLÍNICA
Preconceção
■ Recomendar contraceção eficaz nos 12-24 meses após a cirurgia, devido à rápida
perda ponderal que ocorre neste período, a qual aumenta o risco dos desfechos
neonatais adversos descritos anteriormente. Após colocação debanda gástrica,
a possibilidade de ajuste da banda e perda mais controlada de peso, leva a
que este intervalo possa ser individualizado. Após cirurgia malabsortiva,
prescrever contraceção por outra via que não a oral;
■ Solicitar consulta de Nutrição;
■ Avaliação analítica de deficiência de micronutrientes (hemograma, ferro, fer-
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Vigilância da gravidez
■ Deve ser incentivado acompanhamento por nutricionista e programa de ativi-
dade física se decorridos mais de 12 meses desde a cirurgia;
■ Avaliação analítica trimestral de deficiência de micronutrientes (hemograma,
ferro, ferritina, vitamina B 12, cálcio, ácido fólico e vitamina D);
■ Suplementação em função de défices específicos (ácido fólico 5 mg/dia,
ferro elementar 50-100 mg/dia, cálcio 800-1 200 mg de citrato de cálcio/
/dia, vitamina D 400 UI/dia, vitamina B 12 500-1 000 mcg/dia per os (PO) ou
1 000 mcg/semana intramuscular (IM). Está ainda recomendada a ingestão
de 60 g/dia de proteínas;
■ Se banda gástrica ajustável, a diminuição da constrição gástrica pode ser uma
opção para limitar défices nutricionais e aliviar náuseas e vómitos, a decidir em
conjunto com cirurgião bariátrico;
■ Não recomendar restrição do aporte calórico, mesmo que a grávida mantenha
um índice de massa corporal (IMC) elevado;
■ Ecografias adicionais às 28 e 36 semanas para rastreio da RCF;
■ Perante náuseas, vómitos ou dor abdominal persistentes, suspeitar de obs-
trução intestinal, fístulas, hemorragia gastrointestinal, hérnias, erosão ou mi-
gração de banda. Solicitar avaliação pelo cirurgião bariátrico;
■ Estas grávidas não devem realizar a prova de tolerância à glicose oral (PTGO)
pelo risco de síndrome de Dumping – cólicas abdominais, distensão abdomi-
nal, náuseas, vómitos, diarreia – resultante da ingestão de hidratos de carbono
de absorção rápida que são esvaziados para o intestino delgado, com desvio
de líquido do espaço intravascular para o lúmen intestinal. Secundariamente
pode ocorrer hiperinsulinemia, hipoglicemia, taquicardia, palpitações, ansie- dade
e diaforese. Como alternativas, promover avaliação de glicemia capilar em
jejum e 1 hora após as três principais refeições durante 1 semana ou determinar
valor de hemoglobina glicada (HbA1c).
BIBLIOGRAFIA
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Cirurgia Bariátrica Prévia 131
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
35 HIPERTENSÃO ARTERIAL CRÓNICA
INTRODUÇÃO
Define-se hipertensão arterial (HTA) na gravidez como tensão arterial (TA) sistó-
lica ≥140 mmHg ou diastólica ≥90 mmHg, em duas medições separadas por,
pelo menos, 4 horas. A TA deve ser avaliada com um esfigmomanómetro manual,
nos dois braços, com a grávida sentada ou em decúbito lateral esquerdo, pernas
descruzadas, cotovelo apoiado, braçadeira colocada ao nível do coração, após um
período mínimo de 5 minutos de repouso. Se o perímetro do braço <35 cm usar
braçadeira de adulto, se 35-45 cm usar braçadeira grande e se perímetro
>45 cm usar braçadeira extragrande. A HTA na gravidez subdivide-se em:
■ HTA crónica: HTA prévia à gestação ou diagnosticada antes das 20 semanas ou
que persiste para além de 12 semanas após o parto. A maioria dos casos
corresponde a HTA essencial (primária), mas 10% dos casos são secundários
a outra patologia, nomeadamente renal e endocrinológica. A HTA crónica asso-
cia-se a risco aumentado de pré-eclâmpsia (17-25%), descolamento prematuro
da placenta (1,5%, comparado com 0,6% na população geral), restrição de
crescimento fetal (10-20%) e parto pré-termo (PPT) (12-36%, mas na HTA
grave 62-70%);
■ HTA gestacional (ver protocolo “19. Hipertensão gestacional, pré-eclâmpsia e
síndrome de HELLP”): HTA detetada após as 20 semanas, em grávidas
previamente normotensas e sem critérios de pré-eclâmpsia. Está associada
a risco aumentado de pré-eclâmpsia;
■ Pré-eclâmpsia (ver protocolo “19. Hipertensão gestacional, pré-eclâmpsia e
síndrome de HELLP”): HTA detetada após as 20 semanas (mais comum no
3.º trimestre, mas pode também ocorrer no 2.º trimestre e no pós-parto ime-
diato) em grávidas sem HTA crónica, associada a proteinúria de novo (≥300 mg
na urina de 24 horas ou razão proteína/creatinina ≥0,3 mg/dl em urina
ocasional – valores positivos devem ser confirmados em urina de 24 horas)
ou lesão de órgão-alvo;
■ Pré-eclâmpsia sobreposta em HTA crónica (ver protocolo “19. Hipertensão
gestacional, pré-eclâmpsia e síndrome de HELLP”): grávidas com HTA crónica
que desenvolvem de novo lesão de órgão-alvo ou proteinúria (≥300 mg na urina
de 24 horas). A elevação isolada da TA ou o agravamento de proteinúria
preexistente não constituem critérios de diagnóstico. O quociente fms-like
tyrosine kinase receptor-1/placental growth factor (sFlt-1/PLGF) é útil perante
diagnósticos duvidosos;
■ Síndrome de HELLP (ver protocolo “19. Hipertensão gestacional, pré-eclâmp-
sia e síndrome de HELLP”): microangiopatia trombótica caracterizada pela
conjugação de hemólise (esquizocitos no sangue periférico ou bilirrubina total
≥1,2 mg/dl ou desidrogenase lática (LDH) >600 UI/l ou haptoglobina ≤25 mg/
/dl), elevação das transaminases (AST >70 UI/l ou duplicação do valor
Hipertensão Arterial Crónica 133
ORIENTAÇÃO CLÍNICA
Preconceção e gravidez
■ Incentivar prática desportiva moderada, se não existirem contraindicações;
■ Avaliar lesão de órgão-alvo (fundoscopia, proteinúria de 24 horas, creatinina
sérica, eletrocardiograma (ECG) e ecocardiograma no caso de haver alterações
no anterior). Em casos de difícil controlo, repetir avaliações no 3.º trimestre;
■ Caso não tenham realizado rastreio de pré-eclâmpsia, ácido acetilsalicílico
(AAS) 150 mg per os (PO) ao deitar, a iniciar entre as 11-15+6 semanas (até
às 36 semanas, até ao parto ou ao desenvolvimento de pré-eclâmpsia);
■ Instituir terapêutica anti-hipertensiva se TA sistólica ≥140 mmHg ou TA dias-
tólica ≥90 mmHg, com o objetivo de atingir valores de TA sistólica a rondar
os 135 mmHg e de TA diastólica a rondar os 85 mmHg. Os inibidores da
enzima de conversão da angiotensina (iECA) e os antagonistas dos recetores
da angiotensina II (ARA) estão contraindicados. Opções terapêuticas:
– Alfa-metildopa: 250-1 000 mg PO 2-3 vezes/dia, até um máximo de 3 g/dia.
Contraindicações: insuficiência hepática. Efeitos secundários: sonolência,
edema periférico, bradicardia;
– Nifedipina de ação prolongada: 30-60 mg PO 1-2 vezes/dia, até um máximo
de 120 mg/dia. Contraindicações: estenose aórtica grave, enfarte agudo do
miocárdio. Efeitos secundários: taquicardia, precordialgia, cefaleia, náusea;
– Metoprolol: 50-100 mg PO 1-2 vezes/dia, até um máximo de 200 mg/
/dia. Contraindicações: asma, doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC),
bloqueio auriculoventricular. Efeitos secundários: bradicardia, tonturas, náu-
sea, xerostomia;
■ Ecografias adicionais às 28 e 36 semanas;
■ Em grávidas com mau controlo tensional ou com lesão de órgão-alvo, consulta
semanal após as 32 semanas com avaliação da proteinúria em tira-teste e
cardiotocografia (CTG);
■ Propor terminação eletiva da gravidez às 39 semanas devido ao risco de
descolamento prematuro da placenta. A via de parto rege-se por critérios
obstétricos.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Puerpério
Vigilância da TA (4/4 horas durante o dia) e dos sinais/sintomas sugestivos
de pré-eclâmpsia nas primeiras 48 horas. Manter terapêutica anti-hipertensiva,
preferencialmente com nifedipina ou metoprolol, pela comodidade posológica
na altura da alta.
134 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Hypertension in pregnancy. Reportof
the American College of Obstetricians and Gynecologists’ Task Force on Hypertension in
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trics (FIGO) initiative on pre-eclampsia: A pragmatic guide for first-trimester screening and
prevention. Int J Gynecol Obstet. 2019;145(Suppl. 1):1-33.
SEELY EW, ECKER J. Chronic hypertension in pregnancy. Circulation. 2014;129(11):1254-
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STEPAN H, HERRAIZ I, SCHLEMBACH D, et al. Implementation of the sFlt-1/PlGF ratio for prediction
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TRANQUILLI AL, DEKKER G, M AGEE L, et al. The classification, diagnosis and management of the
hypertensive disorders of pregnancy: A revised statement from the ISSHP. Pregnancy
Hypertens. 2014;4(2):97-104.
ANEMIA 36
RITA M ENDES SILVA , L UÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
Os critérios laboratoriais de anemia na gravidez são diferentes dos utilizados para
a população geral (ver Tabela 36.1). A persistência de anemia durante a gravidez,
sobretudo quando a hemoglobina (Hb) é <8,5 g/dl, está associadaa desfechos
obstétricos adversos como restrição de crescimento fetal (RCF), parto pré-termo
(PPT), morbilidade materna e em casos mais graves, morte fetal. A anemia pode
ter múltiplas causas: perda hemática aguda ou crónica; déficede produção por
deficiências nutricionais de ferro (75-85% dos casos), vitamina B 12 ou ácido fólico;
défice de absorção gastrointestinal; doença crónica, infe- ção, depressão
medular, hipotiroidismo; aumento da destruição, por hemólise intrínseca
(hemoglobinopatias, deficiência de glicose 6-fosfato desidrogenase, eliptocitose,
esferocitose) ou adquirida (mediada por autoanticorpos, coagulação intravascular
disseminada, pré-eclâmpsia grave e síndrome de HELLP, púrpura trombótica
trombocitopénica, síndrome hemolítico-urémico, glomerulonefrites, prótese
valvulares mecânicas ou medicamentos).
ABORDAGEM CLÍNICA
A abordagem clínica inclui a anamnese: etnia, país de origem, alimentação (ve-
getarianismo), fármacos, antecedentes de doença renal, hepática, autoimune,
infecciosa, endocrinológica, história familiar de anemia, doenças da coagulação,
perdas sanguíneas, dádiva regular de sangue. O exame objetivo e a avaliação
laboratorial ajudam na obtenção de um diagnóstico etiológico. As situações mais
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
VGM <80 fL
Ferro oral
Indicado perante o diagnóstico de anemia ferropénica ou valores de ferritina
<15 ng/ml (independentemente do valor de Hb). Deve ser administrado dia-
riamente ou em dias alternados com pelo menos 1 hora de jejum podendo
ser administrado em jejum ou antes das refeições (Tabela 36.3), na dose de 40-
200 mg/dia de ferro elementar. Evitar toma simultânea com alumínio, mag- nésio,
cálcio, zinco, inibidores da bomba protões e antagonistas dos recetores de
histamina.
Efeitos secundários: obstipação, náuseas, vómitos, diarreia, fezes escuras. Na
presença de efeitos secundários optar por outra formulação.
É de prever um aumento dos reticulócitos ao fim de 8-10 dias e da Hb em
1 g/dl após 4 semanas. Uma vez normalizada a Hb, continuar mais 4-6 meses
até ferritina >30 ng/ml e saturação da transferrina >20%.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
138 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Ferro endovenoso
Está indicado quando, apesar da terapêutica com ferro oral, a Hb se mantém
<10 g/dl ou a ferritina se mantém <15 ng/ml, ou quando existe intolerância ao
ferro oral ou síndrome de má absorção. Antes de iniciar, solicitar hemograma com
reticulócitos, sideremia, saturação da transferrina, CTFF, ferritina, vitamina B 12 e
folatos.
Contraindicações: infeção bacteriana (o ferro atua como pró-oxidante podendo
exacerbar o quadro clínico), 1.º trimestre da gravidez ou se houver hipersensibili-
dade. O risco de hipersensibilidade é maior em doentes com alergias conhecidas,
quadros imunológicos ou inflamatórios, asma grave, eczema ou outras atopias.
A administração de ferro oral só deve ser reiniciada após reavaliação analítica,
a efetuar 6 semanas depois da administração de ferro endovenoso (EV).
■ Óxido férrico sacarosado (Venofer®)
– Cálculo do défice de ferro (mg): Peso pré-gravidez (kg) × (Hb 15 g/dl – Hb
atual) x 2,4 + 500 mg.
– Administração: 7 mg/kg com máximo de 300 mg em 3 horas 30 minutos,
2 vezes/semana. Diluição 100 mg/100 ml soro fisiológico (SF). Reavaliação
terapêutica ao fim de 1-2 semanas.
– Reações adversas: hipotensão, náuseas, lombalgia (0,5-1,5%).
■ Carboximaltose férrica (Ferinject ® )
– Cálculo do défice de ferro (mg): para Hb <10g/dl, se <70 kg administrar
1 500 mg (30 ml de Ferinject); se >70 kg administrar 2 000 mg (40 ml
de Ferinject).
– Administração: 20 mg/kg até máximo de 1 000 mg/semana em 15 minutos.
Diluição em SF <200 mg em 50 ml, 200-500 mg em 100 ml, 500-1 000 mg
em 250 ml. Reavaliação terapêutica 2-3 semanas após tratamento.
– Reações adversas: náuseas (3,3%).
Anemia 139
Transfusão
A considerar se Hb <7 g/dl sem resposta terapêutica ao ferro EV, quando existe
hemorragia abundante ou quando a anemia é sintomática.
ANEMIA NO PUERPÉRIO
Dosear Hb se ocorreu hemorragia >1 000 ml, anemia não controlada na gravidez
ou sintomas sugestivos de anemia:
■ Se Hb >9 g/dl e assintomática, iniciar ferro oral;
■ Se Hb 6-9 g/dl e sintomática ou com intolerância, falta de adesão ou de resposta
ao ferro oral, considerar ferro EV;
■ Se Hb <6 g/dl, ou Hb <7 g/dl e sintomática ou hemodinamicamente instável,
propor transfusão sanguínea. Após normalização da Hb, continuar terapêutica
com ferro oral pelo menos durante 6 semanas, para reposição das reservas.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Anemia in pregnancy. Practice Bul- letin
no. 95. Obstet Gynecol. 2008;112(1):201-207.
D IREçãO-GERAL DA S AÚDE . Norma de orientação clínica 30/2013 (revista em 2015). Abor-
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M ARKOVA V, NORGAARD A, JØRGENSEN KJ, et al. Treatment for women with postpartum iron
deficiency anaemia. Cochrane Database of Syst Rev. 2015;8:CD010861.
IDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
37 HEMOGLOBINOPATIAS
INTRODUÇÃO
As hemoglobinopatias são um grupo heterogéneo de doenças monogénicas que
incluem anomalias estruturais da hemoglobina (Hb) e défice da síntese de
determinadas cadeias da globina. O diagnóstico é realizado por eletroforese da
Hb (hemoglobinas anómalas) e deve ser solicitado às grávidas que apresentem
anemia normocítica ou anemia microcítica não ferropénica (ver protocolo “36.
Anemia”). Caso a eletroforese da Hb seja normal e a grávida seja proveniente do
sudeste asiático, deve ser proposto o estudo da -talassemia (Alfa-talassemia
estudo genético), que devido à sua raridade não está considerada no presen-
te protocolo. Quando a grávida tem o diagnóstico de hemoglobinopatia, para
avaliação do risco de transmissibilidade da doença ao feto, deve ser oferecida
a possibilidade de realização de eletroforese da Hb ao progenitor masculino, após
aconselhamento.
Gravidez
A vigilância deve ser efetuada por equipa multidisciplinar, incluindo hematologista
e imuno-hemoterapeuta. Vigilância mensal até às 24 semanas, 2/2 semanas
até às 34 semanas e depois semanal com ecografias adicionais às 28 e 36 semanas.
Na primeira consulta: descontinuar desferroxamina, alertar para a necessidade
de evicção de fatores desencadeantes de crises vaso-oclusivas como ambientes
frios, esforço físico exagerado, infeções, desidratação (ter em atenção o adequa-
do controlo de náuseas e vómitos) e stress. Nas análises do 1.º trimestre pedir
pesquisa de anticorpos irregulares antieritrocitários e, se negativa, repetir no
2.º trimestre, pelo risco aumentado de aloimunização. Oferecer a possibilidade
de diagnóstico pré-natal caso o progenitor masculino também seja portador
da doença. Estas grávidas não devem fazer suplementação com ferro oral. Se
houver necessidade de internamento por complicação médica ou obstétrica,
realizar profilaxia do tromboembolismo venoso (TEV) (ver protocolo “39. Trom-
boembolismo venoso – profilaxia”). Não se recomenda a transfusão ou exsan-
guineotransfusão profiláticas, pois estas apenas diminuem o número de crises
vaso-oclusivas, sem melhorar o desfecho da gravidez. Quando a transfusão está
indicada clinicamente, o objetivo é baixar a Hb S para valores <40% e manter
a Hb total >10 g/dl. Perante complicações como a anemia aguda e a síndrome
torácica aguda pode ser necessária a exsanguineotransfusão.
Crises vaso-oclusivas
Existe risco aumentado durante a gravidez, sobretudo no 3.º trimestre, parto e
pós-parto. A grávida deve ser internada e orientada em conjunto com a Hemato-
logia e a Imuno-hemoterapia, realizando hidratação com cristaloides (60 ml/kg/
/dia), oxigénio por máscara de forma a manter a saturação de O2 >95%, anal-
gesia com opioides per os (PO) ou endovenosa (EV), de acordo com intensidade
da sintomatologia e cardiotocografia (CTG) 3 vezes/dia.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Trabalho de parto
Deve ser administrado oxigénio por máscara de forma a manter a saturação de
O2 >95%, e realizada hidratação EV (2 l/dia).
β-TALASSEMIA
É uma doença autossómica recessiva causada por uma mutação no gene da be-
ta-globina, resultando em défice ou ausência de Hb A1(22). É mais prevalente
em mulheres provenientes da bacia mediterrânica. Os indivíduos heterozigóticos
para a mutação apresentam β-talassemia minor (traço talassémico) e a gravi-
dez não se associa a maior risco materno ou perinatal; as grávidas devem ser
vigiadas como as de baixo risco. As situações de homozigotia classificam-se
em β-talassemia major ou β-talassemia intermédia, consoante existe necessi-
dade persistente ou esporádica de transfusões sanguíneas. Embora na forma major
a gravidez seja um evento raro (a doença conduz geralmente à morte na infância
ou adolescência), associa-se a risco elevado de RCF, miocardiopatia e
endocrinopatia maternas por sobrecarga de ferro, eventos tromboembólicos e
complicações infeciosas (sobretudo quando há antecedentes de esplenecto- mia).
Os achados laboratoriais são: anemia microcítica hipocrómica, presença de
células em alvo no esfregaço de sangue periférico, eletroforese da Hb com
percentagem elevada de Hb A2 (>3,5%) e em ~50% dos casos elevação de Hb F.
Gravidez
Deve ser efetuada por equipa multidisciplinar, incluindo hematologista e imuno-
-hemoterapeuta. Vigilância mensal até às 28 semanas e depois 2/2 semanas
com ecografias adicionais às 28 e 36 semanas. Descontinuar desferroxamina,
sobretudo no 1.º trimestre. Evitar suplementação com ferro se não houver défice.
Oferecer diagnóstico pré-natal, caso o progenitor masculino seja portador da
doença. No 2.º e 3.º trimestres, ponderar retomar desferroxamina, sobretudo
em casos de risco de miocardiopatia por sobrecarga de ferro (a decidir com
hematologista).
Na -talassemia major, está recomendada avaliação cardíaca materna às 28
semanas. A decisão de iniciar transfusão depende do agravamento da ane-
mia ou da evidência de RCF. O objetivo é manter níveis de Hb ≥10 g/dl.
No 3.º trimestre, se grávida assintomática, sem necessidade de transfusões
prévias na gravidez e Hb ≥8 g/dl, não é necessário realizar transfusão. Se Hb
<8 g/dl, programar transfusão de duas unidades de concentrado de eritrócitos
às 37-38 semanas. Na grávida esplenectomizada, se plaquetas >600 ×109 /l,
Hemoglobinopatias 143
Trabalho de parto
Caso haja necessidade de suporte transfusional, e a grávida não esteja previa-
mente medicada, ponderar administração de desferroxamina 2 g EV a cada 24
horas durante o trabalho de parto (a decidir com Hematologia).
Trabalho de parto
Não existe contraindicação para analgesia locorregional.
Puerpério
Deve ser mantida hidratação endovenosa (EV) durante 24 horas ou até existir
adequada hidratação oral. Se o parto ocorrer por cesariana, prescrever profi-
laxia do TEV durante 6 semanas (ver protocolo “39. Tromboembolismo venoso
– profilaxia”). As hemoglobinopatias não contraindicam a amamentação. Caso
a puérpera pretenda amamentar, a hidroxiureia e os quelantes do ferro (exceto
desferroxamina) devem ser evitados.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Hemoglobinopathies in pregnancy.
Practice Bulletin No. 78. Obstet Gynecol. 2007;109(1):229-237.
BRITISH COMMITTEE FOR STANDARDS IN HAEMATOLOGY. Guidelines for the management of the
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
INTRODUÇÃO
Define-se trombocitopenia como uma contagem de plaquetas <150 000/ul.
A sua incidência no 3.º trimestre é de 6-11%. Em ~1% dos casos as plaque-
tas são <100 000/ul. Constituem causas de trombocitopenia específicas da
gravidez: trombocitopenia gestacional (ver secção seguinte), pré-eclâmpsia e
fígado gordo agudo da gravidez. Entre as causas não específicas da gravidez
destacam-se: púrpura trombocitopénica imune (PTI), síndrome de anticorpos
antifosfolípidos (SAAF), lúpus eritematoso sistémico (LES), infeções pelo vírus
da imunodeficiência humana (VIH), hepatite C e citomegalovírus (CMV), fármacos
(heparinas, antimicrobianos, anticonvulsivantes, analgésicos), trombocitopenia
congénita, coagulação intravascular disseminada, síndrome hemolítico-urémico,
púrpura trombocitopénica trombótica, sequestro esplénico, distúrbios medularese
défices nutricionais (folato e vitamina B 12).
Para o diagnóstico são importantes: a anamnese, incluindo antecedentes mé-
dicos, toma de fármacos e antecedentes familiares de doenças associadas
a trombocitopenia; o exame objetivo que deve incluir a avaliação da tensão
arterial (TA), pesquisa de petéquias, hemorragia cutâneo-mucosa e esplenome-
galia; avaliação analítica com hemograma, reticulócitos, tempo de protrombina
(TP), tempo de tromboplastina parcial ativada (aPTT), fibrinogénio, esfregaço de
sangue periférico (necessário contactar laboratório – 98087); doseamento da
alanina aminotransferase (ALT), aspartato aminotransferase (AST), desidro-
genase lática (LDH), bilirrubina total, creatinina, ácido úrico e análise sumária de
urina. Em casos selecionados podem ser úteis: anticorpos antifosfolípidos,
anticorpos anti-DNAds, anticorpos antinucleares (ANA), haptoglobina, função
tiroideia, serologias víricas, ecografia abdominal e biópsia medular. Não está
recomendado o doseamento dos anticorpos antiplaquetários nem da trombo-
poietina. No presente protocolo abordam-se em pormenor as duas causas mais
frequentes de trombocitopenia.
TROMBOCITOPENIA GESTACIONAL
É a causa mais frequente de trombocitopenia, afetando ~5% das gestações.
Embora a sua patogénese seja incerta, pensa-se estar relacionada com a he-
modiluição e com o aumento da destruição de plaquetas. Pode manifestar-se a
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
partir das 20 semanas, mas é mais frequente no 3.º trimestre. Trata-se de uma
trombocitopenia isolada, sendo por isso um diagnóstico de exclusão. Na maioria
dos casos, o doseamento de plaquetas é >80 000/ul e os valores normalizam
1-2 meses após o parto (repetir nesta altura para confirmar o diagnóstico). Não
está associada a risco de trombocitopenia neonatal. Geralmente não necessita de
terapêutica, mas se as plaquetas forem <80 000/ul deve ser consultada a
Hematologia.
146 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Gravidez
Está indicado tratamento se discrasia hemorrágica (equimoses, petéquias,
gengivorragias, hematúria, hemartrose), plaquetas <30 000/ul, ou plaquetas
<80 000/ul no final da gestação para permitir a realização de analgesia lo-
corregional no trabalho de parto. Contactar Hematologia para uma decisão
terapêutica conjunta:
■ Prednisolona: deve ser iniciada na dose de 20 mg per os (PO) 1 vez/dia de manhã
e posteriormente ajustada para 0,25-2 mg/kg/dia. A resposta inicial ocorre
geralmente em 2-14 dias e o pico de resposta ao final de 1-4 semanas. Deve
durar pelo menos 21 dias, sendo a dosagem posteriormente diminuída até se
manter uma contagem de plaquetas >50 000/ul;
■ Imunoglobulina (Ig): 1 g/kg endovenosa (EV), distribuídos por 2 ou 3 dias de
forma a não ultrapassar os 50 g/dia. Está indicada nos casos refratáriosaos
corticosteroides, quando os efeitos secundários dos corticosteroides são
intoleráveis ou quando é necessário um incremento plaquetário mais rápido.
A resposta ocorre geralmente em 1-3 dias, com um pico ao fim de 2-7 dias.
Pode ser repetida a cada 3-7 dias se necessário;
■ Esplenectomia: deve ser considerada apenas na ausência de resposta aos
corticosteroides e à Ig. Idealmente deverá ser agendada para o 2.º trimestre;
■ Imunossupressores (azatioprina, rituximab): a considerar em casos seleciona-
dos, de acordo com a Hematologia;
■ Transfusão de plaquetas: deve ser evitada, exceto em situações de hemorragia
grave ou se plaquetas <50 000/ul antes de uma cirurgia major.
Parto
É necessário minimizar as complicações hemorrágicas durante a analgesia lo-
corregional e o parto. A via de parto rege-se por critérios obstétricos. O número
de plaquetas considerado seguro para a analgesia locorregional é ≥80 000/ul.
Para valores inferiores é necessário considerar outras alternativas de analgesia
ou, se houver tempo, iniciar tratamento para aumentar a concentração de pla-
quetas (ver “Gravidez”). No trabalho de parto deve ser evitada a monitorização
interna da frequência cardíaca fetal (FCF) e, se possível, o parto instrumentado. Após
o parto, deve colher-se sangue umbilical para contagem de plaquetas. O número
mínimo de plaquetas considerado seguro para a realização de uma cesariana é
≥50 000/ul. Pode ser necessário realizar transfusão de plaquetas ou administrar
Ig EV (ver “Gravidez”).
Trombocitopenia 147
Puerpério
BIBLIOGRAFIA
ADAMS TM, ALLAF MB, VINTZILEOS AM. Maternal trombocytopenia in pregnancy: diagnosis
and management. Clin Lab Med. 2013;33(2):327-341.
AMERICAN COLLEGE OF O BSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS . Trombocytopenia in pregnancy.
Practice Bulletin no. 166. Obstet Gynecol. 2016;128(3):e43-e53.
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
39 TROMBOEMBOLISMO VENOSO – PROFILAXIA
CATARINA REIS DE CARVALHO, LUÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
O tromboembolismo venoso (TEV) é uma das principais causas de morbilidade
e mortalidade materna nos países industrializados. O risco tromboembólicona
gravidez e puerpério é 4-5 vezes superior ao da população geral. O TEV
ocorre em ~0,2% das gestações, com uma mortalidade associada de ~0,001%
(correspondendo a ~9% das mortes maternas). Das situações de TEV ~80%
correspondem a trombose venosa profunda (TVP) e as restantes a tromboem-
bolismo pulmonar (TEP). Cerca de 50% dos casos ocorrem durante a gravidez
e os outros 50% durante o puerpério. O risco de TEV pode ser reduzido com a
administração profilática de anticoagulantes.
Para além das indicações anteriores, deve ser realizada anticoagulação pro-
filática no puerpério durante 10 dias, se a soma dos fatores de risco for ≥3 (Tabela
39.2).
Tromboembolismo Venoso – Profilaxia 149
Anticoagulantes
Heparinas de baixo peso molecular
As heparinas de baixo peso molecular (HBPM) têm maior semivida do que a
heparina não fracionada (HNF), sendo os agentes de 1.ª linha na profilaxia do TEV
na gravidez. Não atravessam a barreira placentária, não são teratogénicas e não
são excretadas no leite materno. Não necessitam de monitorização labora- torial,
exceto em grávidas obesas, com insuficiência renal ou com deficiência de
antitrombina (nesses casos é necessário monitorizar mensalmente os níveis de
anti-Xa com o objetivo de atingir 0,6-1,0 U/ml, 4-6 horas após a administração).
As HBPM implicam também menor risco de hemorragia, trombocitopenia, reações
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Varfarina
Atravessa a placenta, sendo teratogénica sobretudo entre as 6-12 semanas (risco
~5%) e aumentando o risco de hemorragia fetal durante toda a gestação.A sua
utilização pode ser ponderada perante casos de risco particularmente elevado de
TEV, como a presença de próteses valvulares mecânicas. No puer- pério, a sua
utilização é segura para o recém-nascido (RN), mas implica maior risco materno
de hemorragia e hematomas.
há <24 horas. Se possível, passar HBPM para HNF às 36-37 semanas [ou antes,
se houver ameaça de parto pré-termo (APPT)]. A analgesia locorregional pode ser
efetuada 4 horas após a última administração de HNF, se o aPTTfor normal.
BIBLIOGRAFIA
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Guideline no. 19. ACOG, 2011.
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venoso em anestesia e cirurgia no doente adulto: Recomendações perioperatórias para
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THOMAS O, LYBECK E, STARNDBERG K, et al, Monitoring low molecular weight heparins at
therapeutic levels: Dose-responses of, and Correlations and differences between aPTT, anti-
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
INTRODUÇÃO
O tromboembolismo venoso (TEV) engloba a trombose venosa profunda (TVP), que
corresponde a ~80% dos casos, e o tromboembolismo pulmonar (TEP), que
corresponde a ~20%. O TEV constitui uma das principais causas de mortalidade
e morbilidade materna nos países de elevados recursos. O risco trombótico
está aumentado 4-5 vezes ao longo da gravidez e ~20 vezes no puerpério. São
conhecidos múltiplos fatores de risco para TEV, os quais devem ser avaliados
durante a gravidez e puerpério, com o objetivo de ponderar a necessidade de
tromboprofilaxia (ver protocolo “39. Tromboembolismo venoso – profilaxia”).
TROMBOEMBOLISMO PULMONAR
O TEP ocorre em ~0,02% das gestações, sendo mais frequente no puerpério do que
durante a gravidez. Entre 70-90% dos êmbolos pulmonares têm origem nas veias
íleo-femorais. O diagnóstico é frequentemente difícil, pois apenas ~5% das
doentes apresentam sintomatologia típica. A apresentação clínica compreende:
dispneia (~80%), dor torácica do tipo pleurítico (~70%), agitação psicomotora
(~60%), tosse (~50%), taquipneia (~90%), taquicardia (~40%), diaforese, febre
baixa, fervores, sibilos, síncope e colapso cardiovascular. Em ~30% dos casos
não existem sinais ou sintomas de TVP.
Perante a suspeita de TEP deve ser dada prioridade à avaliação da estabilidade
hemodinâmica. O score de Wells (Quadro 40.2) pode ser utilizado para cálculo
da probabilidade de TEP. A investigação realiza-se através dos seguintes exames:
■D-dímeros (se probabilidade baixa): se negativos excluem o diagnóstico. Va-
lores positivos têm um valor limitado, já que os níveis aumentam com a
idade gestacional e na presença de descolamento placentário, pré-eclâmpsia
e sépsis;
■ Gasimetria arterial: para identificar hipoxemia com ou sem hipocapnia;
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Thromboembolism in pregnancy. Practice
Bulletin No. 196. Obstet Gynecol. 2018;132(1):e1-e17.
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and the puerperium: acute management. Green-top Guideline no. 37b. London: RCOG Press,
2015.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
41 DIABETES PRÉVIA
M ÓNICA CENTENO , M ARIA I NÊS A LEXANDRE , ANA C OELHO G OMES
INTRODUÇÃO
Define-se diabetes prévia como a diabetes mellitus que estava presente e foi
diagnosticada antes da gravidez. Pode subdividir-se em:
■ Diabetes mellitus tipo 1 (DM1): caracteriza-se por um défice absoluto de
insulina, maioritariamente de causa autoimune. O diagnóstico é habitualmente
efetuado na infância ou final da adolescência e corresponde a 5-10% de todas
as formas de diabetes;
■ Diabetes mellitus tipo 2 (DM2): caracteriza-se por um aumento da resistência
periférica e consequente carência relativa de insulina, estando associada a
fatores hereditários, hábitos de vida sedentários e obesidade. O diagnóstico
é geralmente realizado na idade adulta.
Existem outras formas mais raras que incluem a diabetes monogénica, asso- ciada
a endocrinopatias, secundária a fármacos ou a doenças do pâncreas. As gestações
com diabetes prévia associam-se a riscos aumentados de malfor- mações fetais
(4-8 vezes, sobretudo quando existe mau controlo metabólico no 1.º trimestre),
morte fetal (1-3 vezes), parto pré-termo (PPT), macrossomia, hidrâmnios,
dificuldade respiratória do recém-nascido (RN) e alterações me- tabólicas
neonatais. Estas grávidas têm maior risco de infeção, hipoglicemia
(particularmente na DM1) e hemorragia pós-parto (por hiperdistensão uterina,
secundária a macrossomia fetal e polihidrâmnios).
ABORDAGEM CLÍNICA
Preconceção
■ Avaliar hemoglobina glicada (HbA1c), se >6,5%, reavaliar terapêutica antidia-
bética com Endocrinologia;
■ Rastreio de doença de órgãos-alvo: retinopatia (fundoscopia), nefropatia (crea-
tinina, proteinúria de 24 horas, clearance da creatinina), doença cardíaca (ECG
e ecocardiograma se houver alterações no ECG ou sintomatologia);
■ Desaconselhar gravidez se: cardiopatia isquémica, retinopatia proliferativa não
tratada, doença renal crónica (DRC) (clearance da creatinina <60 ml/hora),
síndrome nefrótica (proteinúria de 24 horas >3 g), hipertensão arterial (HTA)
não controlada, gastroenteropatia grave.
Vigilância na gravidez
Deve ocorrer em consulta multidisciplinar com Endocrinologia, Obstetrícia e
Nutrição. Os objetivos glicémicos estão expostos no Quadro 41.1.
Diabetes Prévia 157
Terapêutica farmacológica
■ A ser ajustada sempre que há dois ou mais valores elevados num período
de uma semana:
– DM1: insulinoterapia intensiva (insulina de ação lenta/intermédia associada
a insulina de ação rápida antes das refeições). Pode ser utilizada insulina
humana ou análogos (esquema a realizar por Endocrinologia);
– DM2: se previamente medicada com metformina e com adequado controlo
glicémico, manter a terapêutica pelo menos até avaliação em consulta
multidisciplinar.
Internamento
Deve ser considerado em casos de dificuldade no controlo metabólico, vómi-
tos/diarreia recorrentes, deterioração da função renal e outras complicações
da gravidez.
(continuação)
■
Após a dequitadura, manter as perfusões em curso até iniciar a alimentação oral. Só
faz perfusão de insulina se glice mia capilar >100 mg/dl
■
Logo que inicie alimentação oral, suspende perfusão de insulina e inicia administra-
Após o parto ção de insulina regular (ou análogo rápido) por via SC em função da glicemia capilar
medida antes das refeições (algoritmo de correção no pós-parto)
■
Se glicemia capilar >140 mg/dl em duas avaliações sucessivas, contactar Endocrino -
logia para introdução de insulina basal
Glicemia capilar (mg/dl): <140 141-200 201-250 251-300 301-350 351-400
Algoritmo de Insulina regular SC (UI): 0 3 5 8 10 12
correção no
pós-parto Se glicemia >400 mg/dl, ad ministrar 5 UI de insulina regular IM de 2/2 horas até a
glicemia <160 mg/dl
SF – soro fisiológico; IM – intramuscular; SC – subcutânea.
* Insulina Regular = Actrapid®, Humulin Regular®, Insuman Rapid®
Puerpério
Pode ser utilizada contraceção progestativa contínua.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN C OLLEGE OF O BSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS . Pregestational diabetes mellitus.
Guideline no. 60. Obstet Gynecol. 2005;105:675-685.
AMERICAN COLLEGE OF O BSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS . Ultrasound in pregnancy. Practice
Bulletin no. 175. Obstet Gynecol. 2016;128(6):e241-e256.
NATIONAL INSTITUTE OF CLINICAL EXCELLENCE . Diabetes in pregnancy: management from pre-
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SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, Diabetes e Metabolismo, Sociedade Portuguesa de
Diabetologia, Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal. Secçãode
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
INTRODUÇÃO
Define-se diabetes gestacional (DG) como a intolerância aos hidratos de carbono
diagnosticada pela primeira vez durante a gravidez. A DG aumenta o risco de
macrossomia fetal, distocia de ombros, pré-eclâmpsia e morte fetal, situações
que se minimizam com o adequado equilíbrio metabólico durante a gravidez.
O diagnóstico baseia-se nos critérios constantes na Tabela 42.1. Caso não seja
possível realizar prova de tolerância à glicose oral (PTGO), recomendar autovigi-
lância da glicemia capilar em ambulatório 4 vezes/dia (jejum e 1 hora após o
início das três principais refeições) durante 1 semana entre as 24-28 semanas.
Tabela 42.1 – VALORES DE GLICEMIA USADOS PARA ESTABELECER O DIAGNÓSTICO DE DIABETES GESTACIONAL
Normal Diabetes gestacional Diabetes prévia
Jejum <92 mg/dl 92-125 mg/dl ≥126 mg/dl
ABORDAGEM CLÍNICA
Vigilância na gravidez
Determinações da glicemia capilar em jejum e 1 hora após o início das três
principais refeições. Os objetivos glicémicos constam do Quadro 42.1.
Terapêutica farmacológica
Vigilância obstétrica
■ Periodicidade das consultas adaptada ao controlo metabólico e à existência de
complicações. Consulta semanal com cardiotocografia (CTG) a partir das 34
semanas, se terapêutica farmacológica ou doença vascular materna. Consulta
semanal com CTG a partir das 37 semanas em grávidas com bom controlo
metabólico e sem terapêutica farmacológica. Vigilância individualizada se
controlo metabólico difícil, ou complicações fetais [alterações do crescimento fetal
ou do líquido amniótico (LA)];
■ Se o diagnóstico foi no 1.º trimestre pedir ecocardiograma fetal às 20-24
semanas;
■ Ecografias adicionais às 28 semanas (se diagnóstico no 1.º trimestre) e às 36
semanas.
de glicemia
■
Se glice mia >200 mg/dl em duas determinações sucessivas, instituir esquema de
insulina de base
* Insulina Regular = Actrapid®, Humulin Regular®, Insuman Rapid®
(continuação)
Puerpério
■ Pode ser utilizada contraceção progestativa contínua;
■ No dia de alta marcar PTGO com 75 g de glicose para 6-8 semanas após o
parto, uns dias antes da consulta de revisão puerperal, e nesta última proce-
der à reclassificação do diagnóstico, de acordo com a Tabela 42.2.
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA CM, DORES J, RUAS L. Consenso de diabetes gestacional: Atualização 2017. RevPort
Diabetes. 2017;12(1):24-38.
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HOD M, KAPUR A, SACKS DA, et al. The International Federation of Gynecology and Obstetrics
(FIGO) initiative on gestational diabetes mellitus: A pragmatic guide for diagnosis, mana-
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INTERNATIONAL ASSOCIATION OF D IABETES AND P REGNANCY STUDY GROUPS CONSENSUS PANEL,
M ETZGER BE, GABBE SG, et al. International association of diabetes and pregnancy study groups
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Care. 2010;33(3):676-682.
43 CETOACIDOSE DIABÉTICA
M ÓNICA CENTENO , JOANA SOUSA , M ARIA I NÊS A LEXANDRE , ANA C OELHO G OMES
INTRODUÇÃO
A cetoacidose diabética afeta 5-10% das grávidas com diabetes pré-gestacio-
nal, podendo ter uma apresentação diferente e ocorrer com níveis glicémicos
inferiores, comparativamente à restante população diabética. Em consequência
da hiperglicemia grave, ocorre diurese osmótica, da qual resulta depleção mar-
cada do volume plasmático, diminuição da perfusão tecidular e cetoacidose
materna. Da diminuição da perfusão uteroplacentária e da acidose materna
podem resultar hipoxia e acidose fetais. Constitui uma urgência obstétrica, pois
quando não é identificada e tratada adequadamente, associa-se a morte fetal em
~30% dos casos.
Os sintomas e sinais mais frequentes são náuseas e vómitos, astenia, dor
abdominal, poliúria, polidipsia, hiperventilação, hálito cetónico, desidratação
mucocutânea, taquicardia, hipotensão e alteração do estado de consciência
(letargia, défices neurológicos focais, obnubilação).
As alterações laboratoriais incluem: hiperglicemia, acidose metabólica (pH <7,30
e défice de bases >12 mEq/l, HCO 3 >15 mEq/l) e alterações da função renal.
Pode ter vários fatores desencadeadores, sendo os principais: infeção (mais
frequentemente respiratória e urinária), má adesão à terapêutica antidiabética, to-
cólise com simpaticomiméticos e corticoterapia para indução da maturação fetal.
ABORDAGEM CLÍNICA
A abordagem terapêutica é semelhante à preconizada para a população não
grávida e inclui reposição da volemia, correção do desequilíbrio hidroeletrolítico
e da acidose, correção da glicemia e pesquisa e correção de fatores desen-
cadeadores. A cetoacidose diabética não constitui indicação para terminar a
gravidez. A cesariana emergente antes da estabilização da situação deve ser
evitada, pois aumenta a morbilidade materna e está associada a pior desfecho
fetal do que a recuperação in utero. A terminação da gravidez apenas deverá ser
considerada em situações de ausência de resposta à terapêutica e de rápida
deterioração do estado materno-fetal.
Cardiotocografia (CTG) contínua: é frequente ocorrer variabilidade reduzida e
a ausência de acelerações, por vezes também com desacelerações tardias. Estas
alterações geralmente revertem lentamente com a resolução da situação.
Monitorização materna: frequência cardíaca e respiratória, tensão arterial (TA),
eletrocardiograma (ECG) contínuo, oximetria, capnografia. Avaliações analíticas:
glicemia de hora a hora; eletrólitos, osmolaridade e gasimetria arterial cada 1-2
horas, até à estabilização da situação. Se instabilidade hemodinâmica ou pH
arterial <6,90, obter apoio da Medicina Intensiva.
Cetoacidose Diabética 165
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF O BSTETRICIAN AND GYNECOLOGISTS . Pregestational diabetes mellitus.
Practice Bulletin no. 201. Obstet Gynecol. 2018;132(6):e228-e248.
CARROL MA, YEOMANS ER. Diabetic ketoacidosis in pregnancy. Crit Care Med. 2005;33 (10
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HAGAY ZJ, WEISSMAN A, LURIE S, et al. Reversal of fetal distress following intensive treatment
of maternal diabetic ketoacidosis. Am J Perinatol. 1994;11(6):430-432.
SIBAI BM, Viteri OA. Diabetic ketoacidosis in pregnancy. Obstet Gynecol. 2014;123(1):167-
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
44 HIPO E HIPERTIROIDISMO
CATARINA REIS DE CARVALHO, M ÓNICA CENTENO, ANA COELHO GOMES, M ARIA INÊS ALEXANDRE
INTRODUÇÃO
Durante a gravidez a glândula tiroideia apresenta alterações fisiológicas, no-
meadamente um aumento de volume e um aumento de ~50% na produção
das hormonas tiroxina (T4) e tri-iodotironina (T3). A maioria destas alterações
é adaptativa, mas nalgumas mulheres ocorre disfunção tiroideia. O rastreio de
doença tiroideia apenas está indicado nas grávidas com fatores de risco: bócio,
antecedentes pessoais ou familiares de disfunção tiroideia, clínica sugestiva de
disfunção tiroideia, tiroidectomia prévia, anticorpos antitiroideus positivos,
diabetes tipo 1 ou outras doenças autoimunes, história de irradiação cervical,
infertilidade, aborto de repetição e utilização de fármacos como lítio ou amioda-
rona. Nestas grávidas, a hormona estimulante da tiroide (TSH) deve ser doseada
e se <0,1 mUI/l ou >2,5 mUI/l, a T4 livre e os anticorpos antitiroideus devem
também ser avaliados. A TSH diminui ligeiramente no 1.º trimestre e apresenta
um aumento progressivo ao longo da restante gravidez (ver Tabela 44.1 para
critérios de diagnóstico).
HIPOTIROIDISMO
A prevalência do hipotiroidismo clínico na gravidez é de 0,3-0,5% e do hipotiroi-
dismo subclínico de 2-3%. Em áreas sem carência de iodo, a tiroidite de Hashi-
moto, caracterizada pela presença de anticorpos antitiroideus (particularmente
antitiroperoxidase) é a principal causa de hipotiroidismo clínico. Os sintomas
são facilmente confundidos com os da gravidez normal: fadiga, obstipação,
intolerância ao frio, cãibras, ganho de peso, edemas, pele seca e queda de cabelo.
O bócio pode estar ou não presente.
O hipotiroidismo clínico não tratado está associado a risco aumentado de
complicações como: aborto espontâneo (~30%), anemia, insuficiência cardíaca,
pré-eclâmpsia, descolamento prematuro de placenta, baixo peso ao nascimento,
hemorragia pós-parto e alterações do desenvolvimento neurocognitivo. O hipoti-
roidismo fetal é raro (~0,0005%).
Hipo e Hipertiroidismo 167
Abordagem clínica
Se o diagnóstico de hipotiroidismo clínico foi anterior à gravidez, deve ser reali- zado
o ajuste pré-concecional da dose de levotiroxina, de modo a obter valores de TSH
≤2,5 mUI/l. É previsível a necessidade de um aumento de 20-50% da dose
prévia, entre as 4-6 semanas de gestação. Quando o hipotiroidismo clínico é
detetado durante a gravidez, deve iniciar-se levotiroxina em dose variável de
acordo com o valor da TSH, ajustando com aumentos progressivos de 25-50%
até serem atingidos os alvos terapêuticos: TSH ≤2,5 mUI/l (ou se anticor-pos
positivos: 1.º trimestre – TSH 0,1-2,5 mUI/l; 2.º e 3.º trimestres – TSH 0,3-
3,0 mUI/l). O tratamento do hipotiroidismo subclínico é mais controverso.
Recomenda-se a terapêutica com levotiroxina se TSH >2,5 mUI/l e anticorpos
antitiroideus positivos, ou se TSH >4 mUI/l independentemente da presença
de anticorpos antitiroideus.
A reavaliação laboratorial (TSH e T4 livre) deve ocorrer 4 semanas após o início
ou o ajuste da terapêutica, ou a cada 6-8 semanas perante estabilidade clíni-
ca. A restante vigilância da gravidez, incluindo indicação para monitorização
fetal anteparto, indução e tipo de parto, regem-se por critérios obstétricos. No
puerpério, deve ser retomada a dose pré-concecional. Caso a medicação se tenha
iniciado durante a gravidez, a decisão de a suspender depende do valor inicial de
TSH e do título dos anticorpos antitiroideus, sendo segura nos casosem que a
dose de levotiroxina é ≤50 mcg/dia. Está indicada a reavaliação da função
tiroideia 6 semanas após o parto. Não existe contraindicação para a
amamentação.
HIPERTIROIDISMO
A prevalência do hipertiroidismo clínico na gravidez é de 0,1-0,4% e a do hiper-
tiroidismo subclínico é de ~0,6%. O hipertiroidismo geralmente agrava no 1.º
trimestre, melhora no 2.º trimestre e, por vezes, recidiva após o parto. Os prin-
cipais sinais e sintomas associados são ansiedade, irritabilidade, palpitações,
taquicardia, insuficiência cardíaca de alto débito, intolerância ao calor, hipersu-
dorese, aumento do trânsito intestinal, aumento do apetite e perda de peso.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Abordagem e tratamento
O hipertiroidismo subclínico não requer tratamento. No hipertiroidismo clínico,
a normalização das hormonas tiroideias com fármacos antitiroideus deve ser
atingida o mais precocemente possível, de preferência nos 3 meses anteriores
à gravidez:
■ Propiltiouracilo: é o fármaco de primeira linha no 1.º trimestre, por se as- sociar
a menor passagem através da placenta. No período pré-concecional a
terapêutica das mulheres tratadas com tiamazol deve ser alterada para
propiltiouracilo. Este associa-se a hepatotoxicidade (0,1-0,2%) e a um risco
baixo de defeitos congénitos (2-3%). A dose inicial deve ser individualizada e
determinada por um endocrinologista;
■ Tiamazol: a evitar no 1.º trimestre por se associar a aplasia cutis congénita
(~0,03%) e a outros defeitos congénitos (2-4% e de maior gravidade do que
os associados ao propiltiouracilo). Caso a grávida tenha anteriormente tomado
propiltiouracilo, a dose inicial deve ser 20 vezes inferior. A dose inicial deve ser
individualizada e determinada por um endocrinologista. O alvo terapêutico é a
obtenção de níveis de T4 livre no limite superior da normalidade nas não
grávidas. Inicialmente a avaliação laboratorial (TSH e T4 livre) deve realizar-se
a cada 2-4 semanas e, após estabilidade clínica, a cada 4-6 semanas. Após o 1.º
trimestre a maioria das grávidas tem indicação para reduzir ou suspender a
medicação, como forma de evitar o hipotiroidismo fetal. A decisão de alterar a
terapêutica de propiltiouracilo para tiamazol após as 16 semanas, para re- duzir
a hepatotoxicidade, é controversa e deve ser individualizada. Ambos os
fármacos se associam, principalmente nos primeiros meses de terapêutica,
a efeitos adversos (3-5%): reações alérgicas, agranulocitose (~0,15%, indica- ção
para suspensão) e insuficiência hepática (<0,1%). Não há evidência de benefício
da monitorização hepática durante o tratamento;
■ Propranolol (10 mg per os (PO) 1-3 vezes/dia): pode ser utilizado por períodos
curtos, para alívio dos sintomas. Na gravidez tardia associa-se a hipoglicemia
neonatal ligeira e transitória, apneia e bradicardia.
A tiroidectomia total, apesar não estar recomendada na doença de Graves, pode
ser considerada no 2.º trimestre no caso de intolerância, incumprimento tera-
pêutico, ou se a função tiroideia não estiver controlada apesar de antitiroideus
em alta dose. O iodo radioativo está contraindicado na gravidez.
A restante vigilância da gravidez, incluindo indicação para monitorização fetal
anteparto, indução e tipo de parto, rege-se apenas por critérios obstétricos.
No parto, se houver uma doença de Graves com TRAb positivos no 3.º trimestre,
hipotiroidismo pós-iodo radioativo/cirurgia à tiroide por doença de Graves ou
história de doença tiroideia não especificada e sem acompanhamento regular,
devem ser pesquisados TRAb no sangue umbilical ou no do recém-nascido (RN).
No puerpério, caso tenha estado medicada no 3.º trimestre, deve manter a
mesma dose de antitiroideu.
Hipo e Hipertiroidismo 169
Nos restantes casos, deve reavaliar a função tiroideia 1-2 meses após o parto
em consulta de Endocrinologia. Não há contraindicação para a amamentação
se a dose de propiltiouracilo for <300 mg/dia e a de tiamazol <20 mg/dia.
BIBLIOGRAFIA
ALEXANDER EK, PEARCE EN, BRENT GA, et al. 2017 Guidelines of the American Thyroid Asso-
ciation for the Diagnosis and Management of Thyroid Disease During Pregnancy and the
Postpartum. Thyroid. 2017;27(3):315-389.
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GIRLING J. Thyroid disease in pregnancy. Hosp Med. 2000;61(12):834-840.
LAZARUS J. Thyroid function in pregnancy. Br Med Bull. 2011;97:137-148.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
45 DERMATOSES
SARA RODRIGUES PEREIRA , A NDREIA F ONSECA
INTRODUÇÃO
O presente protocolo descreve as principais dermatoses da gravidez. Para além
destas, existem também alterações cutâneas fisiológicas na gravidez, conse-
quentes a variações hormonais, metabólicas e imunológicas que geralmente não
necessitam de tratamento e revertem após o parto. Incluem-se nesta categoria:
hiperpigmentação (~90%) sobretudo no abdómen, face, axilas, região perimami- lar,
região inguinal, períneo e face interna das coxas; aumento de pigmentação dos
nevos que regride parcialmente nos 12 meses após o parto, mas se opadrão se
modificar deve ser avaliado por Dermatologia; prurido fisiológico do 3.º
trimestre (~20%) sobretudo no couro cabeludo, região umbilical, vulvar e perianal
– se incomodativo podem ser usados emolientes ou corticosteroides tópicos (ver
Quadro 45.1); estrias (~60%) que esbatem após a gravidez mas não desaparecem,
podendo beneficiar com tratamentos dermatológicos; aumento da lipodistrofia
(celulite); telangiectasias (~30%); eritema palmar (~65%); edema da face e das
extremidades; petéquias; crescimento de fibromas, leiomiomas,
dermatofibromas, neurofibromas; miliária, hiperidrose, acne e tubérculos de
Montgomery nas aréolas mamárias; hirsutismo (face, região suprapúbica, braços,
pernas e dorso) que regride até 6 meses após o parto.
PENFIGOIDE GESTACIONAL
O penfigoide gestacional, anteriormente herpes gestacional, ocorre em ~0,02%
das gestações e tem etiologia autoimune (anticorpos maternos contra os anti-
génios do complexo principal de histocompatibilidade classe II, antigénio leuco-
citário humano DR-3 ou DR-4 paternos, que têm reação cruzada com antigénios
da membrana basal de pele). Está associado a maior risco de prematuridade
(~20%) e restrição de crescimento fetal (RCF) (~34%), o qual é proporcional à
gravidade da dermatose. Até 10% dos recém-nascidos (RN) apresentam lesões
cutâneas, secundárias à passagem de anticorpos maternos, que resolvem em
dias ou semanas. Manifesta-se pelo aparecimento, geralmente entre as 21-
-28 semanas, de pápulas e placas urticariformes pruriginosas, em forma de alvo,
com formação subsequente de vesículas e bolhas tensas, com início na região
umbilical e que disseminam de forma centrífuga para as extremidades, podendo
afetar palmas e plantas (Figura 45.1). As mucosas estão tipicamente poupadas.
Numa fase inicial, pode ser indistinguível da erupção polimorfa da gravidez (EPG),
sendo necessária reavaliação posterior. Em ~75% dos casos ocorre agravamento
periparto.
Diagnóstico: a clínica geralmente é suficiente, mas em casos atípicos pode ser
feita determinação dos anticorpos anti-BP180 séricos (aumentados em ~92%
dos casos) ou mesmo a biópsia cutânea com imunofluorescência direta (gold
standard).
Dermatoses 171
Prurigo da gravidez
Ocorre em ~0,3% das gestações.
Caracteriza-se pelo aparecimento no 2.º e 3.º trimestres (sobretudo às 25-30
semanas) de pápulas discretas e nódulos escoriados no tronco e superfície
extensora dos membros, ocasionalmente no abdómen. As lesões regridem ge-
ralmente após o parto, mas podem persistir até 3 meses.
Diagnóstico: é apenas clínico. Pode ser confundido com escabiose. A histologia
não é específica e a imunofluorescência direta é negativa.
Tratamento: emolientes e anti-histamínicos. Se a sintomatologia for refratária deve
ser realizada corticoterapia tópica. Nos casos mais graves, pode ser con- siderada
fototerapia com luz ultravioleta B (UVB) de banda estreita.
meses após o parto. Não envolve a face, nem ocorrem comedões, excluindo-se
assim o diagnóstico de acne.
Diagnóstico: é geralmente apenas clínico, mas em casos duvidosos pode ser
confirmado por biópsia (histologia: perifoliculite, foliculite estéril).
Tratamento: emolientes, corticosteroides tópicos e peróxido de benzoílo (p.
ex.: Benzac 5® ). Em casos graves, pode ser considerada a fototerapia.
■
Cetirizina (classe B) – venda livre, 10 mg PO 1 vez/dia
■
Baixa potência – hidrocortisona creme 10 mg/ml, 30 ml, 2-3 aplicações/dia
■
Média potência – valerato de dexa metasona creme 1 mg/g 30 ml 2-3 aplica-
ções/dia
Alta potência – valerato de betametasona creme 1 mg/g 30 ml 1-2 aplicações/
Corticosteroides
■
/dia
tópicos ■
Muito alta potência – propionato de clobetasol cre me 0,5 mg/g 30 ml 1-2 apli-
cações/dia
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
(os dois últimos devem ser reservados para casos graves e pelo período mais
curto possível)
Prednisolona (5 ou 20 mg co mp.) – dose inicial 0,5-1 mg/kg PO 1 vez/dia de
Corticosteroides manhã. Dose de manutenção não deve exceder 10-15 mg/dia no 1.º trimestre
sistémicos (aumento ligeiro do risco de fenda labial e fenda palatina). Com terapêutica prolon -
gada em doses elevadas estão descritos RCF e insuficiência suprarrenal do RN
174 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
PARTO E PUERPÉRIO
A via do parto rege-se por critérios obstétricos. A amamentação e a contraceção
hormonal não estão contraindicadas. Existe um ligeiro risco de recorrência do
penfigoide gestacional em mulheres sob contraceção hormonal.
BIBLIOGRAFIA
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EPILEPSIA 46
ALEXANDRA M EIRA, CLÁUDIA ARAÚJO, ISABEL LOUçãO DE AMORIM
INTRODUÇÃO
A epilepsia afeta 0,3-0,6% das gestações, estando associada a um aumento ligeiro
da incidência de aborto espontâneo, parto pré-termo (PPT), doença hi- pertensiva,
hemorragia pós-parto e morte perinatal. A mortalidade materna em grávidas
epiléticas é de ~0,1% e as grávidas com crises tónico-clónicas gene- ralizadas
persistentes (estado de mal epilético) ou recorrentes têm um risco elevado de
hipoxia e morte fetal. A maioria das mulheres mantém a mesma frequência de
crises durante a gravidez, em 8-20% a frequência diminui e em 19-38% aumenta.
A suspensão ou redução voluntária dos fármacos antiepiléticos é parcialmente
responsável pelo aumento da frequência de crises. O risco de o recém-nascido
(RN) vir a desenvolver epilepsia está aumentado quando a mãe, ambos os pais ou
um irmão são afetados, nos casos das epilepsias genéticas, sendo que na maioria
das situações não é possível prever esse risco.
ABORDAGEM CLÍNICA
A utilização de fármacos antiepiléticos implica uma incidência global de malfor-
mações 2-4 vezes superior à da população geral (4-9% vs. 1-3%). As malforma- ções
mais frequentes são: fenda labial e palatina, malformações cardíacas, defei-tos do
tubo neural, anomalias esqueléticas e hipospádias. Caso seja necessário manter
ou iniciar fármacos antiepiléticos, preferir aqueles com menor risco de
teratogenicidade (três primeiros do Quadro 46.1), se possível em monoterapia, na
menor dose eficaz. Evitar os fármacos cujo risco ainda não foi cabalmente
avaliado: gabapentina e oxcarbazepina.
Topiramato
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Preconceção
Abordagem em colaboração com o serviço de Neurologia, de forma a prevenir
as crises epiléticas usando fármacos com menor teratogenicidade (ver Quadro
46.1). Idealmente, a gravidez deve ocorrer em contexto de doença estabilizada,
sem crises convulsivas há pelo menos 6 meses. É seguro suspender os fárma-
cos antiepiléticos após um período de 2 anos sem crises. Uma vez suspensos,
sugere-se um período adicional de 6 meses antes de engravidar. Recomenda-se
suplementação com ácido fólico 1 mg per os (PO) 1 vez/dia. Caso a mulher esteja
medicada com carbamazepina ou ácido valproico está recomendada uma dose de
4 mg PO 1 vez/dia.
Gravidez
■ A vigilância deve ser realizada nas consultas de Medicina Materno-Fetal e
Neurologia;
■ Informar a grávida para, dentro do possível, procurar reduzir os fatores desen-
cadeadores de crises (stress, privação de sono, vómitos, diarreia);
■ Os fármacos antiepiléticos em curso devem geralmente ser mantidos, pelo risco
de crises quando a medicação é alterada, com monitorização trimestral dos
níveis plasmáticos caso esteja sob ácido valproico ou carbamazepina, e
eventual ajuste da dose de forma a manter níveis terapêuticos. A monitori-
zação dos níveis plasmáticos deve também ser realizada na suspeita de não
adesão ou de toxicidade;
■ Manter a suplementação com ácido fólico durante toda a gravidez, na mesma
dose da preconceção (ver “Preconceção”);
■ Ecocardiograma fetal às 21-24 semanas.
Parto
A via de parto rege-se habitualmente por critérios obstétricos. Considerar cesaria-
na programada em mulheres com crises tónico-clónicas generalizadas recorrentes
no último trimestre ou com história de grande mal epilético associado ao stress.
Manter os fármacos antiepiléticos durante o trabalho de parto.
Puerpério
Recomendar cuidados em manter períodos de descanso. As doses eficazes de
fármacos antiepiléticos diminuem no puerpério. No caso de ajuste terapêutico
durante a gravidez, a dose prévia deve ser retomada gradualmente. A amamen-
tação não está contraindicada. Os fármacos antiepiléticos mais utilizados são
detetáveis no leite materno, mas em concentrações geralmente insuficientes para
causarem qualquer efeito no RN.
BIBLIOGRAFIA
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
47 ESCLEROSE MÚLTIPLA
INTRODUÇÃO
A esclerose múltipla é uma doença autoimune que causa inflamação, des-
mielinização e degeneração axonal do sistema nervoso central (SNC). É mais
frequente no sexo feminino e os sintomas iniciam-se em média aos 30 anos.
Em 85-90% dos casos apresenta-se na forma surto-remissão, com episódios
recorrentes de disfunção neurológica, graus variáveis de recuperação clínica e
aumento progressivo dos défices neurológicos. Os sintomas incluem: alterações
piramidais (diminuição da força muscular, incluindo paraparesia e paraplegia),
alterações da sensibilidade (parestesias, dormência, anestesia), alterações cere-
belosas (desequilíbrio, descoordenação motora, nistagmo, disartria), alterações
visuais (diminuição da acuidade, diplopia, escotomas), vertigem, fadiga, cefaleia
e disfunção cognitiva. O diagnóstico é baseado na história clínica e confirmado
por ressonância magnética (RM) e por punção lombar. Durante a gravidez, a
incidência de surtos geralmente diminui, sobretudo no 3.º trimestre, mas tende
a aumentar nos 3 meses pós-parto. A gravidez não tem um impacto significativo
na progressão da doença. Existe um ligeiro aumento na incidência de cesariana,
parto instrumentado e recém-nascidos (RN) leves para a idade gestacional.
ABORDAGEM CLÍNICA
A abordagem clínica deve ter em conta a terapêutica em curso, a duração da
doença e os défices neurológicos existentes, e é realizada em colaboraçãocom
a Neurologia. Os fármacos modificadores da doença visam aumentar os períodos
de remissão, melhorando o prognóstico neurológico a longo prazo (ver Tabela
47.1).
Medicação
Tabela 47.1 – PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DOS FÁRMACOS MODIFICADORES DA DOENçA
NA E SCLEROSE MÚLTIPLA
(continuação)
Preconceção
Os fármacos modificadores de doença só devem ser considerados em precon-
ceção e durante a gravidez quando existe doença muito ativa ou elevado risco
de recidiva com a suspensão. Assim, na maioria dos casos é aconselhado sus-
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
pender o fármaco modificador da doença. Quando isto não é possível devem ser
considerados os fármacos mais seguros e com adequado tempo de suspensão
preconceção (ver Tabela 47.1).
180 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Gravidez
Vigilância nas consultas de Medicina Materno-Fetal e Neurologia, com ajuste de
fármacos se necessário (ver Tabela 47.1). Vigilância obstétrica semelhante à
da gravidez de baixo risco, exceto se houver necessidade de utilizar fármacos com
menor perfil de segurança. Podem ser utilizados corticosteroides – me-
tilprednisolona ou prednisolona endovenosa (EV) – e imunoglobulina (Ig) para
tratamento de surtos durante a gravidez, em baixa dose e por períodos curtos.
Parto
A decisão da via de parto necessita de ter em conta a condição neurológica,
incluindo a força muscular e o grau de espasticidade. A analgesia epidural não
está contraindicada.
Puerpério
Nas mulheres com coordenação neurológica suficiente, não existe contraindi-
cação para a amamentação e esta não influencia a atividade da doença no pós-
parto. O acetato de glatirâmero, o interferão beta e os corticosteroides podem
ser utilizados durante o período de amamentação, sendo os restantes fármacos
desaconselhados ou contraindicados.
BIBLIOGRAFIA
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MIASTENIA GRAVIS 48
M ARIANA PIMENTA, CLÁUDIA ARAÚJO
INTRODUÇÃO
A miastenia gravis é uma doença autoimune rara, caracterizada por disfunção da
transmissão neuromuscular nos músculos esqueléticos, que se manifesta por
episódios de fraqueza e fadiga muscular. É mais frequente no sexo feminino e
entre os 20-40 anos. Existem duas formas da doença: a forma ocular, que atinge
os músculos oculares extrínsecos e palpebrais, e a forma generalizada que, para
além destes, atinge os músculos das extremidades, bulbares e respiratórios.
A miastenia gravis pode manifestar-se inicialmente pela forma ocular e depois
progredir para a forma generalizada. Fala-se em crise miasténica quando ocorre
insuficiência respiratória. Esta doença pode estar associada a outras doenças
autoimunes e a anomalias do timo (hiperplasia e timoma). O quadro clínico
pode incluir ptose, diplopia (sintomas iniciais em ~50% dos casos), disfagia,
disartria, défice de força muscular nas extremidades e dificuldade respiratória. As
manifestações são habitualmente intermitentes e agravam com o uso muscular
repetitivo. O diagnóstico é baseado na clínica e confirmado pelo doseamento de
autoanticorpos (anti-AChR – anti-acetylcholine receptor, e anti-MuSK – anti-muscle
specific kinase), estudos de eletrofisiologia e eletromiografia. A gravidez não afeta
o prognóstico da doença, mas durante a gestação ocorre exacerbação clínica
em ~40% dos casos, remissão em ~30% e estabilidade clínica nos restantes.
O comportamento da doença é frequentemente diferente em gestações suces-
sivas. As exacerbações tendem a ocorrer mais no 1.º trimestre e no puerpério.
Existe acréscimo de risco de rotura prematura de membranas (RPM) (sobretudo
com o uso de corticoterapia no 1.º trimestre), morbilidade e mortalidade ma-
ternas. O risco de morte materna é inversamente proporcional à duração da
doença (risco máximo no primeiro ano de doença).
ABORDAGEM CLÍNICA
Medicação
■ O metotrexato e o micofenolato de mofetil têm efeito teratogénico conhecido e
devem ser descontinuados por um período mínimo de 3 meses antes da
gravidez;
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Preconceção
A orientação deve ser realizada em conjunto com a Neurologia, planeando a
gravidez após estabilização da doença e otimização da terapêutica. A gravidez
deve ser desaconselhada no primeiro ano após o diagnóstico ou quando adoença
ainda não está controlada. É importante avaliar a função tiroideia e dosear os
anticorpos antitiroideus, para garantir uma função tiroideia normal antes da
gravidez. Havendo indicação para timectomia, esta deve ser realizada antes da
gravidez.
Gravidez
Avaliar a função tiroideia (se não foi avaliada no período pré-concecional) e
realizar um eletrocardiograma (ECG). Manter terapêutica em curso, exceto se
estiverem a ser usados fármacos teratogénicos (ver "Medicação"). A vacina
antipneumocócica deve ser aconselhada às grávidas que fazem imunossupres-
sores. As infeções devem ser prontamente tratadas. Agendar uma consulta de
Anestesiologia pré-parto.
Miastenia Gravis 183
Parto
Puerpério
No puerpério imediato existe maior risco de exacerbação da doença, pelo que
deve ser considerada a monitorização durante 24 horas numa Unidade de
Cuidados Intensivos (a decidir em conjunto com Neurologia e Anestesiologia),
particularmente se ocorreu uma cirurgia ou infeção. A amamentação deve ser
incentivada, se não houver fadiga muscular que a impossibilite, estando contrain-
dicada se a puérpera estiver a tomar ciclosporina, metotrexato ou micofenolato
de mofetil (ver "Medicação").
BIBLIOGRAFIA
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IDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
49 HEPATITE AUTOIMUNE
CLÁUDIA ARAÚJO
INTRODUÇÃO
A hepatite autoimune é uma doença inflamatória crónica, caracterizada pela
destruição progressiva do parênquima hepático, que pode evoluir para cirrose e
falência hepática. A incidência é de ~0,017%, ocorrendo sobretudo em mulheres
em idade reprodutiva. As manifestações clínicas mais frequentes são fadiga,
anorexia, náuseas e dor abdominal. O diagnóstico baseia-se nas seguintes altera-
ções laboratoriais: aumento das transaminases, hipergamaglobulinemia, presença de
anticorpos antinucleares (ANA), antimúsculo liso (SMA), antiantigénio solúvel do
fígado/fígado-pâncreas (anti-SLA/LP), e anticitoplasma de neutrófilos (ANCA).O
diagnóstico implica a exclusão de doenças hepáticas de etiologia genética, viral,
alcoólica e medicamentosa. Por vezes existe confirmação histológica da hepatite.
É frequente a presença concomitante de doenças autoimunes extra-
-hepáticas (tiroidite e síndrome de Sjögren). A resposta aos imunossupressores
também é útil na confirmação do diagnóstico. A doença hepática com cirrose está
associada a infertilidade, mas o tratamento imunossupressor tornou a gravidez
mais frequente. A gravidez está associada a maior risco de aborto espontâneo,
parto pré-termo (PPT) e recém-nascidos (RN) leves para a idade gestacional.
ABORDAGEM CLÍNICA
Preconceção
O aconselhamento deve ser realizado em conjunto com a Gastroenterologia.
Os fármacos imunossupressores são essenciais para controlar a sintomato-
logia e evitar a progressão da doença. Privilegiar os fármacos mais seguros
na gravidez e amamentação – ver categoria da Food and Drug Administration (FDA)
no Quadro 49.1. Desincentivar a gravidez até a doença estar em remis-são
(ausência de sintomas, níveis normais de transaminases e ausência de
hipergamaglobulinemia).
Gravidez
Parto
Na doença bem controlada e sem cirrose hepática, a via do parto depende apenas
de critérios obstétricos. Nas grávidas com cirrose hepática e varizes esofágicas é
mais seguro o parto por cesariana.
Puerpério
Manter terapêutica imunossupressora. A terapêutica com prednisolona e aza-
tioprina não contraindica a amamentação.
BIBLIOGRAFIA
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IDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
INTRODUÇÃO
O lúpus eritematoso sistémico e a síndrome de Sjögren correspondem a duas
situações de causa autoimune que podem associar-se a complicações específi- cas
durante a gravidez, pelo que a sua abordagem multidisciplinar é fundamentalpara
a obtenção de uma gravidez com sucesso.
Critérios clínicos
■ Lúpus cutâneo agudo ou subagudo;
■ Lúpus cutâneo crónico;
■ Úlceras orais e/ou nasofaríngeas na ausência de outras causas;
■ Alopecia na ausência de outras causas;
■ Artrite não erosiva de duas ou mais articulações periféricas;
■ Serosite (pleurite ou pericardite);
■ Proteinúria >0,5 g/24 horas ou presença de cilindros celulares no exame
microscópico de urina;
■ Alterações neurológicas: convulsões, psicose, neuropatia, mielite, estado con-
fusional agudo;
■ Anemia hemolítica;
■ Leucopenia (<4 000/mm3) ou linfopenia (<1 000/mm3 );
■ Trombocitopenia (<100 000/mm3) na ausência de medicação que o justifique.
Critérios imunológicos
■ Anticorpos antinuclear positivo;
■ Anticorpos anti-DNA double strand (anti-DNAds) positivo;
■ Anticorpos anti-Smith (anti-Sm, pequenas ribonucleoproteínas nucleares) po-
sitivo;
Lúpus Eritematoso Sistémico e Síndrome de Sjögren 187
Abordagem clínica
Os imunossupressores são essenciais para controlar a sintomatologia.
Preconceção
A gravidez deve ser desaconselhada se: hipertensão pulmonar grave (pressão
sistólica na artéria pulmonar >50 mmHg) ou sintomática; doença pulmonar
restritiva grave; insuficiência cardíaca grave; insuficiência renal crónica (creati-
nina (Cr) >2,8 mg/dl); acidente vascular cerebral nos 6 meses anteriores, flare
lúpico grave nos 6 meses anteriores. Idealmente, as mulheres com LES devem
ter a doença inativa durante pelo menos 3 meses antes de engravidarem. Na
avaliação pré-concecional, otimizar a terapêutica, prescrevendo fármacos que
possam ser continuados durante a gravidez. Os imunossupressores mais utili-
zados são os corticosteroides, tacrolimus, ciclosporina e azatioprina. A hidroxi-
cloroquina diminui a ocorrência de flares e melhora os desfechos obstétricos,
nomeadamente diminuindo o risco de bloqueio cardíaco congénito em grávidas
com anticorpos anti-SSA/SSB positivos. O micofenolato de mofetil deve ser sus-
penso 6 semanas antes da gestação e o metotrexato e ciclofosfamida devem
ser suspensos 3 meses antes.
Gravidez
■A vigilância deve ocorrer na consulta de Medicina Materno-Fetal, com apoio
de reumatologista/internista e, se necessário, de nefrologista;
■Consultas mensais até às 28 semanas, quinzenais até às 34 semanas e,
posteriormente, semanais. O esquema pode necessitar de ser ajustado pe-
rante o aparecimento de complicações maternas ou fetais;
■Ácido acetilsalicílico (AAS) 150 mg per os (PO) 1 vez/dia ao deitar, a iniciar
entre as 11-15+6 semanas (até às 36 semanas, ao parto ou ao desenvolvi- mento
de pré-eclâmpsia) se não tiver feito rastreio da pré-eclâmpsia;
■Ver medicação imunossupressora;
■Nas grávidas sob terapêutica crónica com corticosteroides ou heparina de
baixo peso molecular (HBPM) é recomendada a suplementação com cálcio
1 500 mg PO 1 vez/dia, vitamina D 100 UI PO 1 vez/dia e encorajado o exercício
físico regular;
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Situações particulares
Presença de anticorpos anti-Ro/SSA ou anti-La/SSB
Ocorre em ~33% dos pacientes com LES, conferindo um risco aumentado de
lúpus neonatal (3-5%), que pode incluir rash cutâneo, anemia, leucopenia, trom-
bocitopenia, disfunção hepática e bloqueio cardíaco congénito (~2%, 15-20% se
já tiver ocorrido em filho anterior) por miocardite e fibrose do nódulo auriculo-
ventricular e feixe de His. Se houver progressão para bloqueio auriculoventricular
completo (3.º grau), o risco de hidrópsia fetal é de 40-60% e a mortalidade
perinatal de 45-50%. Em ~80% dos casos há necessidade de colocar um pace-
maker pós-natal. Recomenda-se ecocardiograma fetal quinzenal entre as 18-27
semanas (auscultação nas semanas alternadas) e às 32 semanas medição
ecográfica do intervalo PR (normal: 90-50 ms). No caso de deteção de bloqueio
auriculoventricular de 1.º ou 2.º grau, iniciar dexametasona 4-6 mg PO 1 vez/
/dia, a qual diminui a progressão da doença. No caso de bloqueio de 3.º grau
ou hidrópsia fetal, programar cesariana se >34 semanas, contactando Neona-
tologia para eventual necessidade de colocação de pacemaker.
Nefrite lúpica
O diagnóstico diferencial entre nefrite lúpica e pré-eclâmpsia pode ser difícil
no contexto de LES. Os principais fatores discriminatórios estão expostos na
Tabela 50.1. A nefrite lúpica deve ser tratada com corticosteroides e um imu-
nossupressor como a azatioprina. Caso ocorra deterioração progressiva, pode
ser necessário terminar a gravidez.
Parto
Se a grávida estiver medicada com prednisolona em dose >7,5 mg/dia (ou cor-
ticosteroide equivalente) há >3 semanas, durante o trabalho de parto/cesariana
deve ser administrada hidrocortisona 100 mg endovenosa (EV) toma única +
50 mg EV 8/8 horas durante 24 horas para prevenir uma crise suprarrenal
aguda.
Puerpério
Pode ser usada contraceção progestativa oral com desogestrel, dispositivo
intrauterino (DIU) com levonorgestrel ou implante subcutâneo.
SÍNDROME DE SJÖGREN
A síndrome de Sjögren é uma doença autoimune rara que afeta primariamente as
glândulas lacrimais e salivares, com infiltração linfocítica extensa das mesmas.
Caracteriza-se por uma diminuição na produção de lágrimas e saliva (queratocon-
juntivite sicca ou síndrome sicca). Acompanha frequentemente outras doenças
autoimunes e a gravidez não parece afetar o curso da doença. Associa-se à
produção de vários anticorpos como o fator reumatoide, anticorpos antinucleares
(ANA), anticorpos anti-Ro/SSA e anti-La/SSB. Estes últimos são os mais espe-
cíficos desta síndrome, encontrando-se em ~80% dos doentes. O principal risco
durante a gravidez é a ocorrência de bloqueio cardíaco congénito condicionado
pela presença destes anticorpos (ver "Presença de anticorpos anti-Ro/SSA ou anti-
La/SSB"). O momento e a via do parto regem-se por critérios obstétricos.
BIBLIOGRAFIA
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51 SÍNDROME DE ANTICORPOS ANTIFOSFOLÍPIDOS
INTRODUÇÃO
O termo síndrome de anticorpos antifosfolípidos (SAAF) designa uma situação
autoimune adquirida que associa a presença de anticorpos antifosfolípidos (AAF)
com fenómenos tromboembólicos ou desfechos obstétricos adversos.
Pode ocorrer na ausência ou na presença de outra doença autoimune (p. ex.,
lúpus eritematoso sistémico (LES) ou síndrome de Sjögren). O SAAF associa-se
a doença trombótica em 5-12% dos casos, sobretudo no compartimento veno-
so (65-70%), sendo que as tromboses podem ocorrer em localização atípica (p.
ex., retina, mesentérica, subclávia); pré-eclâmpsia em 14-18%; trombocito- penia
autoimune em 40-50%, a qual requer diagnóstico diferencial com púrpura
trombocitopénica imune (PTI) e trombocitopenia induzida pela heparina; restrição
de crescimento fetal (RCF) em 15-30% e parto pré-termo (PPT) em ~33%. A pro-
babilidade de complicações é menor se a gravidez tiver início na ausência de
sintomas e se os níveis de AAF forem baixos, e aumenta se existir positividade
para mais do que um AAF.
Os AAF estão presentes em ~2% das mulheres saudáveis e a sua presençaisolada
tem um baixo valor preditivo para a ocorrência de desfechos obstétricos adversos.
Por outro lado, 5-20% das mulheres com aborto recorrente têm AAF (ver protocolo
“10. Aborto recorrente”). Devem ser pedidos AAF a todas as mulheres com história
de tromboembolismo, aborto recorrente, morte fetal, RCFe pré-eclâmpsia grave
com início <34 semanas. Não devem ser pedidos AAF a mulheres que têm apenas
trombocitopenia, amaurose fugaz, ou livedo reticular. O diagnóstico de SAAF
baseia-se na presença de, pelo menos, um critério clínico e um critério
laboratorial dos descritos seguidamente, sendo que os mesmos não podem distar
>5 anos entre si.
Critérios clínicos
■ ≥1 episódios de trombose arterial, venosa ou dos pequenos vasos, afetando
qualquer tecido ou órgão (confirmados por exames de imagem, Doppler ou
histopatologia) – SAAF trombótico;
■ ≥1 mortes fetais inexplicadas com ≥10 semanas de gestação, sem altera- ções
morfológicas (documentado por ecografia ou exame anátomo-patológico)
– SAAF obstétrico;
■ ≥1 partos prematuros de recém-nascidos (RN) morfologicamente normais com
≤34 semanas de gestação, por pré-eclâmpsia grave ou achados compatíveis
com insuficiência placentária – SAAF obstétrico;
■ ≥3 abortos consecutivos, espontâneos e não explicados com <10 semanas
de gestação (excluídas malformações uterinas, alterações hormonais ou ano-
malias cromossómicas) – SAAF obstétrico.
Síndrome de Anticorpos Antifosfolípidos 191
ABORDAGEM CLÍNICA
Gravidez
■ Logo que confirmada a viabilidade fetal, iniciar heparina de baixo peso mole-
cular (HBPM) (ver doses no protocolo “39. Tromboembolismo venoso – profi-
laxia”) e ácido acetilsalicílico (AAS) 150 mg per os (PO) 1 vez/dia ao deitar,
de acordo com a história clínica e os achados laboratoriais (Tabela 51.1.);
Puerpério
Tal como noutras doenças autoimunes, pode ocorrer uma exacerbação neste
período. Manter terapêutica de acordo com a Tabela 51.1. Pode ser usada
contraceção progestativa oral com desogestrel, dispositivo intrauterino (DIU)
com levonorgestrel ou implante subcutâneo.
BIBLIOGRAFIA
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INFEÇÕES DO TRATO URINÁRIO 52
RITA M ENDES SILVA , L UÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
As infeções do trato urinário (ITU) afetam ~10% das gestações e incluem a
bacteriúria assintomática, a cistite aguda e a pielonefrite aguda. Quando não
tratadas, a bacteriúria assintomática e a pielonefrite aguda associam-se a parto
pré-termo (PPT) em ~25% dos casos. Os agentes etiológicos na mulher grávi-
da são semelhantes aos encontrados na não grávida, sendo o mais frequen-
te a Escherichia coli (63-85%), seguida do Streptococcus do grupo B (7-30%),
Klebsiella pneumoniae (3%), Enterobacter (3%) e Proteus mirabilis (2%). Os perfis
de resistência antibiótica são também idênticos.
BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA
A incidência na gravidez é de 2-10%. Uma vez que não existem sintomas, o
diagnóstico baseia-se na presença de bacteriúria significativa na urocultura:
≥105 unidades formadoras de colónias (UFC)/ml numa amostra colhida por micção
ou ≥102 UFC/ml numa amostra colhida por cateterização vesical. No caso do
Streptococcus do grupo B, deve ser valorizada bacteriúria ≥104 UFC/ml. O
tratamento é baseado no teste de sensibilidade aos antibióticos (TSA)e na
segurança do fármaco na gravidez, devendo ter uma duração de 3-5 dias (Tabela
52.1). Associa-se a uma redução de 80% na evolução para pielonefrite. A
urocultura deve ser repetida 1 semana após o término do tratamento.
Tabela 52.1 – PRINCIPAIS ANTIBIÓTICOS USADOS PARA TRATAMENTO DAS I NFEçÕES DO T RATO URINÁRIO
NA G RAVIDEZ
Fármaco Posologia Notas
Fosfomicina 3 g PO, toma única –
Cefradina 500 mg PO 12/12 horas, 5 dias Ou outra cefalosporina de 1.ª ou
Cefuroxima 500 mg PO 12/12 horas, 5 dias 2.ª geração
Bacteriúria persistente
O diagnóstico estabelece-se quando na urocultura de controlo se documenta
bacteriúria (≥105 UFC/m) com a mesma estirpe. O tratamento deve ser efetuado
com o mesmo antibiótico durante 7 dias ou com outro antibiótico durante 3-5
dias, de acordo com o TSA. A urocultura deve ser repetida 1 semana após o
término do tratamento. Se a bacteriúria persistir após dois ciclos de antibiótico,
deve ser iniciada terapêutica profilática diária ao deitar, de acordo com TSA (p.
ex., amoxicilina 500 mg PO, cefradina 500 mg PO, nitrofurantoína 100 mg PO).
Repetir urocultura no 2.º e 3.º trimestres e, se bacteriúria persistir, efetuar
tratamento antibiótico dirigido durante 7 dias.
Bacteriúria recorrente
O diagnóstico baseia-se na identificação de outra estirpe bacteriana na uro-
cultura de controlo ou na presença de bacteriúria significativa após uma uro-
cultura negativa. Deve ser tratada como um primeiro episódio de bacteriúria, com
ajuste ao TSA. Se houver recorrência associada à atividade sexual, deve efetuar-
se terapêutica profilática pós-coital, com toma única adaptada ao TSA (ver
"Bacteriúria persistente").
CISTITE AGUDA
O diagnóstico é sobretudo clínico, ocorrendo urgência miccional, disúria, pola-
quiúria e sensação de peso hipogástrico. O exame sumário de urina e os exames
de tira-teste não são essenciais para o diagnóstico na presença de sintomas
típicos, mas podem ser úteis em quadros menos típicos. Nestas situações, a
ausência de leucocitúria deve sugerir um diagnóstico alternativo. A hematúria e
a nitritúria poderão não estar presentes, mas quando documentadas são muito
sugestivas de cistite aguda. Deve ser colhida urina para urocultura e iniciado
tratamento antibiótico empírico (ver Tabela 52.1). A urocultura permite confirmar
o diagnóstico e efetuar o ajuste da terapêutica ao TSA, no caso de não haver
melhoria sintomática.
Cistite persistente
Atuar como descrito em “Bacteriúria persistente”.
Cistite recorrente
Deve ser considerada a terapêutica profilática com base no TSA, em dose diária
ou pós-coital (se sintomatologia associada à atividade sexual). Nas situações
com maior risco de complicações (diabetes prévia, imunossupressão, antece-
dentes de cirurgia urológica, drepanocitose, etc.), a profilaxia deve ser iniciada
após o primeiro episódio.
Infeções do Trato Urinário 195
PIELONEFRITE AGUDA
Abordagem clínica
A pielonefrite aguda na gravidez está associada a um risco superior de compli-
cações (~20%): sépsis, PPT, insuficiência respiratória, insuficiência renal, coagu-
lação intravascular disseminada, anemia, pelo que está indicado o internamento
hospitalar. Também estão indicados:
■ Antibioterapia endovenosa (EV) empírica até 48 horas de apirexia e, depois,
regimes orais ajustados ao TSA (Tabela 52.2) até perfazer 14 dias de anti-
bioterapia;
■Alta ao fim de 24-48 horas de apirexia sob antibioterapia oral (Quadro 52.1);
Existe recorrência de pielonefrite em 6-8% dos casos, pelo que deve ser pro-
posta terapêutica profilática com base no TSA, em dose diária ou pós-coital (se
sintomatologia associada à atividade sexual) desde o primeiro episódio. Repetir
urocultura no 2.º e 3.º trimestres e, se bacteriúria persistir, efetuar tratamento
antibiótico dirigido de 7 dias.
196 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
BIBLIOGRAFIA
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CÓLICA RENAL 53
LAURA CRUZ , D IOGO AYRES DE CAMPOS
INTRODUÇÃO
Define-se cólica renal como a dor que ocorre quando existe obstrução do trato
urinário, geralmente por encravamento de cálculos na pelve renal ou no ureter.
Os cálculos possuem habitualmente cálcio na sua composição, estimando-seque
em 65-75% dos casos sejam constituídos por fosfato de cálcio.
A incidência durante a gravidez é semelhante à da mulher não grávida, rondando
os 0,5%. É mais frequente no 2.º e 3.º trimestres da gravidez e em multíparas.
A maioria das vezes existe história de litíase renal prévia.
O diagnóstico deve ser suspeitado quando ocorre uma dor forte, com exacer-
bações e períodos de remissão, num dos flancos, com irradiação para a fossa ilíaca
homolateral (89-100% dos casos). Pode ser acompanhada de hematúria
macroscópica (~25% dos casos), disúria e polaquiúria (ocasionais), náuseas e
vómitos (ocasionais).
ABORDAGEM CLÍNICA
Exames complementares de diagnóstico
■ Ecografia abdominal: é o exame de primeira linha e permite detetar dilatação
ureteral e/ou hidronefrose. Por vezes deteta também a presença de cálculos
na porção terminal do ureter (sensibilidade 34-95%);
■ Hemograma, ionograma, creatinina, proteína C reativa: sobretudo para excluir
outras hipóteses diagnósticas como apendicite, colecistite e pielonefrite;
■ Exame sumário de urina: hematúria microscópica em 75-95% dos casos,
piúria em ~40% dos casos;
■ Urocultura: para excluir infeção concomitante.
Terapêutica médica
Com a terapêutica médica consegue-se que o cálculo seja eliminado em 65-80%
dos casos, cessando a sintomatologia:
■ Soro polieletrolitico 1 000 ml endovenoso (EV) a 250 ml/h durante 4 horas;
■ Paracetamol 1 g EV em dose única;
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Terapêutica invasiva
Está indicada quando ocorrem: falha da terapêutica médica, sépsis, quadro
obstrutivo em rim único, uropatia obstrutiva bilateral. Nestas circunstâncias,
deve ser contactada a Urologia, sendo de considerar as seguintes alternativas:
■ Colocação de um cateter ureteral em duplo J (que necessita de ser mudado
a cada 4-8 semanas até ao parto);
■ Nefrostomia percutânea;
■ Remoção do cálculo por ureteroscopia;
■ A abordagem deve ser multidisciplinar, incluindo Urologia, Radiologia e Anes-
tesiologia. Pode ser considerada a analgesia epidural se a dor for refratária
aos analgésicos anteriormente referidos e não for possível uma terapêutica
invasiva.
BIBLIOGRAFIA
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therapeutic aspects. Literature review. Cent European J Urol. 2017;70(1):93-100.
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LESÃO RENAL AGUDA 54
LUÍSA PINTO, ESTELA NOGUEIRA
INTRODUÇÃO
O termo lesão renal aguda substitui na atualidade a designação “insuficiência
renal aguda”. Tem uma incidência na gravidez de ~0,6% em países de elevados
recursos. O diagnóstico assenta na elevação abrupta da creatinina sérica basal
(≥0,3 mg/dl) ou na redução do débito urinário (<0,5 ml/kg/hora em 6-12 ho- ras).
Pequenas variações da creatinina (Cr) (0,2-0,3 mg/dl) devem também ser
valorizadas e monitorizadas, pois podem corresponder a uma perda importante
da função renal. As causas mais frequentes de lesão renal aguda na gravidez estão
expostas no Quadro 54.1.
ABORDAGEM CLÍNICA
Perante a suspeita de lesão renal aguda a grávida deve ser internada, mantendo
monitorização da tensão arterial (TA) e da diurese 1 vez/turno.
Avaliação analítica: hemograma com pesquisa de esquizocitos, função renal (Cr,
ureia), sedimento urinário, proteinúria (amostra de urina com rácio proteínas/
/creatinina ou proteinúria de 24 horas), função hepática [aspartato aminotrans-
ferase (AST), alanina aminotransferase (ALT), GT, fosfatase alcalina, bilirrubina
total], desidrogenase lática (LDH), haptoglobina, estudo da coagulação e rácio
fms-like tyrosine kinase receptor-1/placental growth factor sFlt1/PLGF na suspeita
de pré-eclâmpsia. Perante quadro infecioso colher hemoculturas e urocultura.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Terapêutica
É dirigida à causa subjacente e implica frequentemente fluidoterapia para repo-
sição volémica e correção de alterações iónicas. Devem ser evitados fármacos
nefrotóxicos, nomeadamente aminoglicosídeos, vancomicina e anti-inflamatórios não
esteroides (AINE). No contexto de pré-eclâmpsia é necessário ponderar a
terminação da gravidez tendo em conta a idade gestacional, a gravidade e
evolução da lesão renal aguda e a gravidade da disfunção de outros órgãos.
O grau de proteinúria não constitui por si só uma indicação para terminar a
gravidez. A atitude expectante implica monitorização diária da função renal.
A administração de sulfato de magnésio para profilaxia de convulsões necessita
de ser ajustada à função renal (ver protocolo “101. Eclâmpsia”). Na púrpura
trombocitopénica trombótica e na síndrome hemolítico-urémico o tratamento
implica plasmaférese. Nos casos de síndrome hemolítico-urémico atípico está
indicada terapêutica com eculizumab.
BIBLIOGRAFIA
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DOENÇA RENAL CRÓNICA 55
LUÍSA PINTO, ESTELA NOGUEIRA
INTRODUÇÃO
A doença renal crónica (DRC), termo que substitui atualmente a designação
“insuficiência renal crónica”, atinge ~6% das mulheres em idade fértil. Define-se
pela presença de lesão renal estrutural (detetada por alteração analítica uriná-
ria, imagiológica ou histológica) ou funcional [detetada por redução de taxa de
filtração glomerular (TFG)], presente há pelo menos 3 meses. A abordagem deve
ser realizada em conjunto com a Nefrologia, podendo ser também necessária
a articulação com a equipa de hemodiálise ou de transplante renal. A DRC
subdivide-se nas categorias constantes no Quadro 55.1.
Gravidez
Dependendo do quadro clínico, as consultas devem ocorrer a cada 2-4 semanas
até ao 3.º trimestre e depois a cada 1-2 semanas.
■ Monitorização domiciliária diária da TA e ajuste terapêutico se necessário
(TA alvo <140/90 mmHg);
■ Ácido acetilsalicílico (AAS) 150 mg per os (PO) ao deitar, a iniciar às 12 semanas
(até às 36+0 semanas, até ao parto ou ao desenvolvimento de pré-eclâmpsia);
■ Análises sanguíneas adicionais (mensais): hemograma, ionograma, creatinina
(Cr), ureia (Ur) sedimento urinário, proteinúria (proteinúria de 24 horas inicial-
mente e depois rácio proteínas/creatinina urinário – P/Cr U), cálcio, fósforo,
bicarbonato, ferritina, saturação da transferrina, função hepática;
■ Exame bacteriológico de urina mensal: tratar bacteriúria assintomática e
cistite durante 7 dias e ponderar profilaxia antibiótica se: história de infe- ções
urinárias de repetição, um episódio de bacteriúria assintomática ou de cistite
na presente gestação, tendo em conta o teste de sensibilidade aos antibióticos
(TSA) das uroculturas prévias;
■ Se proteinúria >3 g/dia, profilaxia do tromboembolismo venoso (TEV) durante a
gravidez e primeiras 6 semanas pós-parto (ver protocolo “39. Tromboembo-
lismo venoso – profilaxia”);
■ Ecografias adicionais às 28 e 36 semanas;
■ Cardiotocografia (CTG) semanal a partir das 32 semanas.
Considerar a terminação da gravidez se agravamento da DRC, HTA não contro-
lada, pré-eclâmpsia grave ou sinais de hipoxia fetal. A via de parto rege-se por
critérios obstétricos.
Pós-parto
Evitar utilização de anti-inflamatórios não esteroides (AINE). Avaliação da TA 1
vez/turno, monitorizar a função renal, planear com a Nefrologia a abordagem
terapêutica pós-alta e marcar consulta de reavaliação. A amamentação não está
contraindicada, sendo segura sob terapêutica com ciclosporina, tacrolimus,
azatioprina, prednisolona, nifedipina e enalapril.
Doença Renal Crónica 203
Gravidez
As irregularidades menstruais frequentes e o facto de a subunidade beta livre
da gonadotrofina coriónica humana (-hCG) poder estar cronicamente elevada di-
ficultam o diagnóstico de gravidez. Assim, perante a suspeita, deve ser realizada
ecografia precoce para diagnóstico e datação. Outras medidas importantes são:
■Esquema intensivo de hemodiálise, passando idealmente a 6 sessões de 6
horas/semana (ureia alvo <75 mg/dl);
■Liberalização da dieta com ingestão proteica de 1,5 a 1,8 g/kg/dia;
■Ajuste da dose de ferro e epoetina [hemoglobina (Hb) alvo: 10-11 g/dl],
duplicar as doses de vitaminas hidrossolúveis (complexo B e ácido fólico);
■AAS 150 mg PO ao deitar, a iniciar às 12 semanas (até às 36+0 semanas,
até ao parto ou ao desenvolvimento de pré-eclâmpsia);
■O rastreio bioquímico de aneuploidias não é fiável nestas doentes;
■Análises sanguíneas adicionais: hemograma, ionograma, cálcio, fósforo, bi-
carbonato, função hepática inicialmente mensal e semanal após as 26 se-
manas. A maior parte destas doentes está anúrica ou tem diurese vestigial, pelo
que a proteinúria não é informativa. Correção de eventual hipocaliemia,
hipocalcemia, hipofosfatemia e alcalose metabólica;
■ Ajuste da terapêutica anti-hipertensiva (TA alvo <140/90 mmHg) e do peso
Pós-Parto
Pode fazer AINE exceto se mantiver diurese residual. Avaliação da TA 1 vez/turno,
monitorizar a função renal, planear com a Nefrologia a abordagem terapêutica
pós-alta e marcar consulta de reavaliação. Ajustar terapêutica anti-hipertensiva
e peso seco. A amamentação não está contraindicada, se os fármacos de uso
crónico forem adaptados.
Gravidez
Observação a cada 2-4 semanas até às 28 semanas e depois a cada 1-2 se- manas,
de acordo com situação clínica.
■ Monitorização domiciliária diária da TA e ajuste terapêutico se necessário
(TA alvo <140/90 mmHg);
■ AAS 150 mg PO ao deitar, a iniciar às 12 semanas (até às 36+0 semanas, até
ao parto ou ao desenvolvimento de pré-eclâmpsia);
■ As grávidas Rh- transplantadas com dador Rh+ desenvolvem anticorpos anti-D
em ~5% dos casos, pelo que se recomenda a profilaxia da isoimunização
Rh (D) (ver protocolo “27. Isoimunização Rh (D) – prevenção e abordagem”);
■ Análises sanguíneas adicionais: hemograma, Cr, Ur, ionograma, sedimento
urinário, função hepática, cálcio, fósforo, bicarbonato (a cada 2-4 semanas).
Proteinúria 24 horas inicial e depois P/Cr U (a cada 2-4 semanas). Vírus de
hepatite C (VHC), CMV (DNA CMV sérico) e herpes vírus (trimestrais). Níveis
séricos de tacrolimus e ciclosporina (pelo menos mensal);
■ Exame bacteriológico de urina (mensal): tratar bacteriúria assintomática e
cistite durante 7 dias e ponderar profilaxia antibiótica se: história de infeções
urinárias de repetição, um episódio de bacteriúria assintomática ou de cistite
na presente gestação, tendo em conta o TSA das uroculturas prévias;
■ Ecografias adicionais às 28 e 36 semanas;
Doença Renal Crónica 205
Pós-parto
Evitar fármacos nefrotóxicos (AINE), avaliação da TA 1 vez/turno e ajuste te-
rapêutico se necessário. Monitorizar a função renal, níveis de tacrolimus e
ciclosporina no pós-parto imediato. Planear com a Nefrologia a abordagem te-
rapêutica após a alta e agendar consulta de reavaliação. A amamentação não
está contraindicada e é segura sob terapêutica com prednisolona, ciclosporina,
tacrolimus e azatioprina.
BIBLIOGRAFIA
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56 SÍNDROME GRIPAL
M ARIA P ULIDO VALENTE , D IOGO AYRES DE C AMPOS , M ARIA JESUS M ORGADO
INTRODUÇÃO
A síndrome gripal é uma infeção aguda do aparelho respiratório causada pelo vírus
influenza. Para a maioria das pessoas saudáveis, a síndrome gripal é de
intensidade moderada e autolimitada. No entanto, as grávidas e as mulheres
nos primeiros 15 dias do puerpério constituem grupos de risco para doença
grave. A principal complicação da síndrome gripal na gravidez é a pneumonia
(viral ou bacteriana secundária), a qual é mais frequente no 2.º e 3.º trimestres.
Outras complicações mais raras são: parotidite, bronquite, sinusite, miocardite,
pericardite, miosite, rabdomiólise, eventos cardiovasculares (insuficiência cardía- ca,
enfarte agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral), insuficiência renal aguda,
encefalopatia e exacerbação de doenças crónicas. Existe ainda risco au- mentado
de parto pré-termo (PPT) (3 vezes) e de mortalidade perinatal (5 vezes).A síndrome
gripal caracteriza-se pelo início súbito de um dos seguintes sintomassistémicos:
febre, mal-estar, prostração, cefaleias, mialgias ou dor generalizada, juntamente
com um ou mais dos seguintes sintomas respiratórios: tosse, odino- fagia,
inflamação da mucosa nasal ou faríngea, dificuldade respiratória. Perante uma
forte suspeita clínica de síndrome gripal deve confirmar-se o diagnóstico através
de uma colheita de exsudado nasofaríngeo [introduz-se uma zaragatoa numa das
narinas cerca de 2,5 cm junto do septo nasal, rodando-a várias vezes antes de
retirar. A zaragatoa é colocada em recipiente próprio e enviada para o laboratório
– método reverse transcription polymerase chain reaction (RT-PCR)].O resultado
fica disponível em 24 horas, devendo a grávida/acompanhante contactar
telefonicamente o local onde foi colhido, para obter esta informação.
ABORDAGEM CLÍNICA
Às grávidas e puérperas (até 15 dias pós-parto) com síndrome gripal deve ser
prescrito tratamento antiviral, o qual pode ser realizado durante o aleitamento
materno. Este tratamento visa sobretudo diminuir o risco de evolução para
doença grave:
■ Oseltamivir 75 mg (Tamiflu®) per os (PO) 12/12 horas durante 5 dias, ingeri-
do com alimentos. Em doentes com insuficiência renal é necessário ajustar
a dose (depuração de creatinina 30-59 ml/minuto – 75 mg/dia; 10-29 ml/
/minuto – 30 mg/dia; ≤10 ml/minuto – não recomendado; hemodiálise –
30 mg 1 hora após a sessão, 3 tomas durante 1 semana).
O início da terapêutica deve ser o mais precoce possível, de preferência nas
primeiras 48 horas após o aparecimento dos sintomas. Em época de ativida-
de gripal, o início do tratamento antiviral não deve depender da confirmação
laboratorial. Os antecedentes de vacinação contra a gripe sazonal também não
são motivo para protelar a terapêutica. Caso o RT-PCR do exsudado venha ne-
gativo a doente deve suspender a terapêutica. Deve também ser recomendado
Síndrome Gripal 207
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Assessment and treatment of preg- nant
women with suspected or confirmed influenza. Committee opinion no. 753. Obstet Gynecol.
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
57 HEPATITES VÍRICAS
INÊS M ARTINS , L UÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
O presente protocolo aborda as infeções pelos vírus das hepatites A, B, C, D
e E na gravidez. A vigilância destas grávidas deve ser realizada na consulta de
Medicina Materno-Fetal, em colaboração com o serviço de Gastrenterologia.
HEPATITE A
A infeção pelo vírus da hepatite A (VHA) é endémica em África, na Ásia e na
América do Sul, mas pode ocorrer de forma esporádica ou epidémica noutros
locais. É a causa mais comum de hepatite viral aguda. As vias de transmissão são:
fecal-oral, através da ingestão de alimentos ou água contaminados e por contacto
interpessoal próximo. A transmissão vertical é muito rara. O período deincubação
é de 15-50 dias. Não são conhecidos efeitos da gravidez na infeção e existe
também pouca informação sobre a incidência e impacto da hepatite A na
gravidez. Sendo uma doença autolimitada, o tratamento consiste em medidas de
suporte, não apresentando especificidades na gravidez. Não estão descritos casos
de mortalidade materna ou fetal associados à hepatite A.
Diagnóstico: a presença de IgM anti-VHA estabelece o diagnóstico de hepatite
A aguda. Na fase de convalescença, estão presentes anticorpos IgM e IgG. A
presença de IgG anti-VHA na ausência de IgM significa que ocorreu vacinação ou
infeção prévia, traduzindo proteção contra a infeção.
Prevenção: os cuidados de higiene (mãos e alimentos) constituem a forma
mais eficaz de prevenção. A vacina (vírus inativado) pode ser administrada na
gravidez e deve ser recomendada antes de uma viagem para zona endémica.
Em ~70% dos casos existem níveis protetores de anticorpos 2 semanas após
a primeira dose. A segunda dose deve ser administrada após 6-12 meses. A
profilaxia pós-exposição (nas primeiras 2 semanas) é recomendada em grávidas
não vacinadas, com contacto próximo com doente infetado: se idade ≥41 anos,
deve ser realizada imunoglobulina (Ig) anti-VHA (0,02 ml/kg em dose única); se
idade <41 anos, deve ser realizada dose única da vacina.
Puerpério: a amamentação não está contraindicada, mas o recém-nascido (RN)
deve realizar profilaxia com Ig, já que existe excreção de RNA do VHA no leite
materno.
HEPATITE B
A infeção pelo vírus da hepatite B (VHB) constitui um importante problema de
saúde pública mundial, sobretudo em zonas endémicas (África, Oceânia, Ásia
Ocidental). A transmissão ocorre por via sexual, percutânea e vertical. Quando
a infeção ocorre no período perinatal, o risco de instalação de doença crónica
Hepatites Víricas 209
HEPATITE D
A infeção pelo vírus da hepatite D (VHD) é endémica na bacia do Mediterrâneo
e só ocorre em doentes infetados pelo VHB, já que o VHD requer o Ag HBs
para a sua replicação. Pode ocorrer um quadro agudo de coinfeção VHB/VHD
ou uma superinfeção em doentes com hepatite B crónica. A hepatite D engloba
um largo espetro de manifestações clínicas que vai desde o estado de portador
assintomático até à insuficiência hepática aguda, não estando descritas particu-
laridades durante a gravidez. A pesquisa do anticorpo anti-VHD está preconizada
perante uma exacerbação da hepatite B, com eventual doseamento da CV (RNA
VHD). A cotransmissão vertical VHB+VHD é muito rara, o que é explicado pela
relação inversa da CV do VHB e do VHD durante a gravidez. A prevenção da
infeção pelo VHD implica a vacinação contra o VHB. Não se preconizam medidas
adicionais de prevenção da transmissão vertical.
HEPATITE C
A infeção pelo vírus da hepatite C (VHC) é atualmente uma das principais
causas de doença hepática. As vias de transmissão são a parentérica, prin-
cipalmente a endovenosa (EV) (p. ex., drogas injetáveis), sendo mais raras a
vertical e a sexual. Os 6 meses iniciais de infeção correspondem a hepatite aguda,
assintomática em ~75% dos casos. Ocorre resolução espontânea em
~15% dos casos e progressão para hepatite crónica nos restantes, dos quais 15-
30% evoluem para cirrose. Durante a gravidez os níveis das transaminases
tendem a diminuir e pode ocorrer um aumento ligeiro da CV durante o 2.º e 3.º
trimestres, refletindo a imunossupressão fisiológica. Estão descritos casos de
resolução espontânea da infeção pelo VHC no período pós-parto, em relação com
a produção aumentada de células T específicas para o vírus. Nas grávidas com
hepatite C crónica existe um risco relativo de 1,5 vezes de restrição de cresci-
mento fetal (RCF) e o risco de colestase gravídica está 50 vezes aumentado. A
transmissão vertical (sobretudo periparto) ocorre em ~5% das grávidas com CV
Hepatites Víricas 211
HEPATITE E
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
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Hepatites Víricas 213
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
58 CITOMEGALOVÍRUS
TERESA LOUREIRO, LUÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
O citomegalovírus (CMV) é um herpes vírus que pode permanecer latente no
organismo após uma infeção primária. A transmissão ocorre por contacto di-
reto através da saliva, sémen, secreções vaginais, urina, fezes, sangue e leite
materno. A infeção primária é habitualmente assintomática, mas em ~10% dos
casos ocorre sintomatologia inespecífica do tipo gripal. Em Portugal estima-se que
~70% das mulheres em idade fértil possuam anticorpos contra o CMV e que a
incidência de infeção primária na gravidez seja de ~1% nas grávidas
seronegativas, sendo a das infeções não primárias desconhecida. Nas infeções
primárias a transmissão vertical é de 30-40%. A infeção neonatal por CMV ocorre
em 0,6-1% de todos os recém-nascidos (RN). Dos RN infetados ~90% são
assintomáticos e destes apenas ~13% apresentarão sequelas, na maioriauma
diminuição progressiva da acuidade auditiva. Os RN sintomáticos podem
apresentar doença grave incluindo petéquias, icterícia hipotonia, microcefalia,
convulsões, hepatomegalia, esplenomegalia e coriorretinite. Nestas situações
graves ~10% dos RN morrem e ~60% apresentam sequelas graves (atraso
psicomotor, défice neurológico, surdez, défice visual e atraso na linguagem).
O risco de sequelas é limitado a infeções que ocorrem no 1.º trimestre ou
no período periconcecional. No total, 15-20% das crianças infetadas (5-8% de
crianças nascidas de mães infetadas) desenvolvem sequelas. Não existe va-
cina disponível para o CMV. A prevenção passa por: lavagem cuidadosa das mãos,
utilização de máscaras quando em contacto com indivíduos de risco, evitar
partilhar bebidas e alimentos com indivíduos infetados. Estas medidas reduzem
em ~85% o risco de seroconversão durante a gravidez. O diagnóstico é baseado
na avaliação serológica da IgM e da IgG específicas (Tabela 58.1). A serologia
deve ser pedida a todas as grávidas, o mais precocemente possí- vel no 1.º
trimestre (ver protocolo “2. Vigilância pré-natal de rotina”), nas que tiveram
contacto durante o 1.º trimestre com um indivíduo infetado, ou quando ocorrem
achados ecográficos sugestivos (ver Quadro 58.1). A deteção de IgG numa grávida
previamente seronegativa (seroconversão) e a deteção de IgM associada a IgG com
baixa avidez são ambos critérios diagnósticos de infeção primária. A IgM+ isolada
não determina uma infeção primária recente, poispode persistir durante vários
meses ou até anos após a infeção primária esurge também em infeções não
primárias e em reações cruzadas com outros vírus, nomeadamente o Epstein-Barr.
A avidez da IgG é usada para definir o momento da infeção: um índice de avidez
alto é sugestivo de infeção há >3 meses, um índice de avidez baixo não permite
excluir uma infeção recente. O diagnóstico de infeção não primária é difícil e
incerto, pois o aumento da IgG não é específico desta situação.
Citomegalovírus 215
ABORDAGEM CLÍNICA
Gravidez
Grávidas com evidência serológica de infeção primária antes das 14 semanas
têm indicação para realizar profilaxia com valaciclovir [4 g per os (PO) 2 vezes/
/dia] até à realização da amniocentese. Durante este tratamento deve ser
efetuada monitorização da função renal semanalmente no primeiro mês e quin-
zenalmente posteriormente. O valaciclovir reduz em ~65% a transmissão vertical
após infeção primária. A amniocentese deve ser recomendada a partir das 18
semanas em grávidas com o diagnóstico de infeção primária (idealmente 8
semanas após a infeção materna primária, quando esta é localizável no tempo
e pelo menos 4 semanas após o início da terapêutica), ou perante achados
ecográficos suspeitos (Quadro 58.1).
Quadro 58.1 – PRINCIPAIS ACHADOS ECOGRÁFICOS SUGESTIVOS DE I NFEçÃO FETAL POR CMV
Anomalias cerebrais graves Anomalias cerebrais ligeiras Anomalias extracerebrais
■
Ventriculomegalia grave (≥15 mm) ■
Ventriculomegalia ligeira a ■
Intestino hiperecogénico (grau 3)
■
Hiperecogenicidade periventricu- moderada (10-15 mm) ■
Hepato megalia (lobo esquer-
lar ■
Sinequias intraventriculares do ≥40 mm)
■
Hidrocefalia ■
Calcificações intracerebrais ■
Esplenomegalia (maior diâme-
■
Microcefalia (<2 desvios-padrão) ■
Cistos subependimários tro ≥40 mm)
■
Hipoplasia do cerebelo/vérmis ■
Cistos do plexo coroideu ■
RCF
■
Agenesia do corpo caloso ■
Calcificações dos vasos ■
Oligoâmnios
■
Porencefalia lenticuloestriados nos gân- ■
Hidrâmnios
■
Lisencefalia glios da base ■
Ascite
■
Lesões císticas periventriculares ■
Derrame pleural
da substância branca ■
Edema subcutâneo
■
Aumento dos espaços pericere- ■
Hidrópsia
brais ■
Placentomegalia (≥40 mm)
■
Alteração da giração ■
Calcificações intra-hepáticas
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Parto
A via de parto rege-se por critérios obstétricos. Deve ser contactada a Neonato-
logia na altura do parto, para avaliar a presença de infeção neonatal. A placenta
deverá ser enviada para exame anátomo-patológico.
Puerpério
A amamentação não está contraindicada.
BIBLIOGRAFIA
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PARVOVÍRUS B19 59
SARA R ODRIGUES PEREIRA , M ÓNICA CENTENO
INTRODUÇÃO
O parvovírus B19 é o agente responsável pelo eritema infecioso ou “quinta
doença”, afeção frequente na infância e caracterizada por febre e artropatia
ocasional, seguidas de exantema reticular de predomínio facial (slapped cheek), mas
podendo também atingir o tronco e as extremidades. No adulto imuno-
competente a infeção é assintomática em ~25% dos casos e nos restantes
manifesta-se por sintomas inespecíficos do tipo gripal. Este vírus é transmitido
por via respiratória, a viremia inicia-se ~6 dias após a exposição e mantém-se
cerca de uma semana, desaparecendo quando surge a sintomatologia. Entre 30-
-60% dos adultos possuem anticorpos para o parvovírus B19. Quando a infeção
é adquirida na gravidez, o risco de complicações fetais é superior antes das
20 semanas. A infeção fetal ocorre em 25-33% dos casos. O parvovírus B19
é citotóxico para os precursores dos glóbulos vermelhos fetais pelo que ~10%
dos fetos infetados desenvolvem anemia e ~3% desenvolvem hidrópsia, a qual
se pode desenvolver rapidamente (em 2 semanas) ou ser de instalação mais
lenta (até 12 semanas). A mortalidade de fetos com hidrópsia não tratados é
de ~50% e de fetos submetidos a transfusão fetal de 15-25%. Não está reco-
mendado o rastreio serológico do parvovírus B19 na gravidez devido à baixa
incidência desta infeção. Não existe vacina disponível e a prevenção passa
por lavagem cuidadosa das mãos, utilização de máscaras e evitar a partilha de
bebidas e alimentos. Não existe benefício em remover grávidas seronegativas
de empregos com maior risco de contágio (p. ex., contacto com crianças).
A profilaxia após contacto, usando imunoglobulina (Ig) inespecífica só deve ser
considerada em grávidas imunocomprometidas.
As grávidas expostas a um indivíduo infetado ou com suspeita clínica de infe-
ção devem realizar, para diagnóstico, um doseamento serológico de anticorpos
IgG e IgM específicos (Tabela 59.1). Os anticorpos IgM positivam 10 dias após
a exposição e imediatamente antes do início da sintomatologia; apresentam
um pico aos 25-30 dias, desaparecendo 4-6 meses depois. Os anticorpos IgG
são detetados ~7 dias após o início da sintomatologia e geralmente persistem
durante anos. Não estão descritas infeções fetais se a grávida se encontra
imunizada no momento da exposição.
Serologias Interpretação
IgM-/IgG- Suscetibilidade (repetir em 3 semanas)
IgM+/IgG- Provável infeção recente (<7 dias)
IgM+/IgG++++ Provável infeção recente (7 dias a 4 meses)
IgM-/IgG+ Infeção prévia (imunidade) (≥4 meses)
218 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
ABORDAGEM CLÍNICA
Perante o diagnóstico de uma infeção aguda por parvovírus B19, a grávida deve
ser informada de que não há risco aumentado de malformações congénitas nem
existe terapêutica antiviral ou intervenções que evitem a infeção. Se a infeção
ocorrer antes das 20 semanas, existe um risco de morte fetal de ~11%. Se
ocorrer após as 20 semanas, o risco de morte fetal é de ~1%. As situações de
anemia ligeira/moderada são geralmente bem toleradas e resolvem espontanea-
mente após 4-6 semanas sem deixar sequelas. Nos casos sujeitos a transfusão
fetal, a probabilidade de alterações graves do neurodesenvolvimento é de ~11%.
Após as 22 semanas deve ser realizada ecografia semanal durante 10 semanas
após a exposição para avaliar: velocidade máxima do pico sistólico (VMPS) na
artéria cerebral média (ACM), derrame pleural, derrame pericárdico, ascite, edema
da parede abdominal, polihidrâmnios/oligoâmnios, cardiomegalia, hidrocefalia,
microcefalia, calcificações intracranianas e hepáticas.
A partir das 20-22 semanas a grávida deve realizar contagem formal diária dos
movimentos fetais e recorrer à urgência de Obstetrícia e Ginecologia se forem
inferiores a 10 em 12 horas.
A amniocentese com polymerase chain reaction (PCR) para parvovírus B19 deteta
o vírus no líquido amniótico (LA), sendo útil sobretudo em situações de hidró- psia
fetal em grávidas assintomáticas e sem história conhecida de exposição.
Anemia grave
Se VMPS-ACM ≥1,50 múltiplos da mediana (MoM) ou hidrópsia fetal, é provável
que exista uma anemia grave. Note-se que a anemia e a hidrópsia podem regre-
dir espontaneamente em 4-6 semanas (~30% de resolução para a hidrópsia).
Após as 34 semanas existe indicação para terminação da gravidez após ciclo
de corticosteroides. Entre as 18-33 semanas propor transfusão fetal (risco de
morte fetal de ~3%). Após a transfusão manter ecografias semanais até a si-
tuação reverter. Caso não ocorra reversão da anemia às 34 semanas deve ser
considerada a terminação da gravidez. Após a reversão da anemia, a vigilância da
gravidez e a conduta relativamente ao parto são semelhantes à de qualquer
gravidez de baixo risco.
BIBLIOGRAFIA
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SÍFILIS 60
M ARIA PULIDO VALENTE, LUÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
A sífilis é uma infeção sistémica causada pelo Treponema pallidum, uma espi-
roqueta gram-negativa. A transmissão ocorre maioritariamente por via sexual,
através do contacto com as lesões, mas também por via parentérica e vertical
(transplacentária ou intraparto). A gravidez não altera as manifestações da sífilis.
O período de incubação é em média de 3 semanas (10-90 dias), não havendo
evidência clínica ou serológica de infeção, mas podendo ocorrer transmissão
do organismo. Clinicamente a doença é subdividida em:
■ Sífilis primária: durante a qual ocorre disseminação linfática e hematogénica,
e que se caracteriza por lesão cancroide no local de inoculação (úlcera única
em ~60% dos casos, indolor, margens elevadas e duras, base granular não
exsudativa), linfadenopatias habitualmente bilaterais, indolores e sem sinais
inflamatórios. A lesão regride espontaneamente em 3-6 semanas e em ~25% dos
casos há resposta imunológica adequada e eliminação da infeção;
■ Sífilis secundária: ocorre 2-8 semanas após a infeção primária por dissemi- nação
hematogénica e caracteriza-se por sintomas sistémicos inespecíficos (febre,
mialgias, odinofagia, linfadenopatia generalizada) ou eritema maculo- papular das
palmas das mãos e plantas dos pés. Podem também ocorrer condilomas planos
(condiloma lata) na região anogenital ou axilar e lesões na boca, faringe ou
colo uterino que são altamente infeciosas. Resolve es- pontaneamente sem
tratamento em 3-4 meses;
■ Sífilis latente: surge quando a doença não é tratada nos estádios anteriores,
não havendo manifestações clínicas, mas persistindo as alterações serológi- cas.
Subdivide-se em sífilis latente precoce (<1 ano desde a infeção primária) e
sífilis latente tardia (>1 ano desde a infeção primária);
■ Sífilis terciária: surge em ~30% dos doentes, 15-30 anos após uma sífilis primária
não tratada; inclui lesões cardiovasculares e gomas (lesões granu- lomatosas
nodulares em qualquer órgão);
■ Neurossífilis: alterações neurológicas diversas que podem ocorrer em qual-
quer uma das fases anteriormente descritas mas são mais frequentes na doença
prolongada.
As principais complicações da sífilis que ocorre no início da gravidez são o aborto
e a morte fetal. No final da gravidez podem ocorrer: hidrópsia fetal, hepatomegalia,
anemia, trombocitopenia, parto pré-termo (PPT), morte perinatal e sífilis congénita.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
ABORDAGEM CLÍNICA
Preconceção
Numa mulher com história de sífilis que efetuou tratamento adequado, os testes
treponémicos permanecem positivos, pelo que se deve monitorizar a resposta
à terapêutica com testes não treponémicos. Se ocorreu uma diminuição de
4 vezes nos títulos do teste não treponémico (avaliações intervaladas de 6 meses),
pode presumir-se a cura e dispensar qualquer abordagem adicional durante a
gravidez.
Gravidez
A penicilina G benzatina é o único tratamento comprovadamente eficaz durante
a gravidez, prevenindo a infeção congénita em >98% dos casos. A taxa desucesso
é menor se o tratamento for realizado no 3.º trimestre, se o intervalo entre o
tratamento e o parto for <30 dias, se não existe declínio do título dos anticorpos
ou se existem anomalias ecográficas.
Sífilis 221
Neurossífilis
Penicilina cristalina aquosa 3-4 milhões de unidades (endovenosa (EV) 4/4
horas durante 10-14 dias.
Se o esquema terapêutico for interrompido, deverá ser recomeçado e realizado in-
tegralmente. As grávidas comprovadamente alérgicas à penicilina devem efetuar
dessensibilização no hospital de dia de Imunoalergologia, de modo a poderem
realizar o esquema referido, já que não existe nenhuma alternativa comprovada-
mente eficaz durante a gravidez. Aquando do tratamento, existe risco de desen-
volvimento da reação de Jarisch-Herxheimer, com febre aguda frequentemente
acompanhada de cefaleias e mialgias, que se pode associar a contractilidade
uterina e a desacelerações variáveis, por vezes tardias. As grávidas com >25
semanas deverão ser internadas em sala de observações para a administração
de penicilina, mantendo-se sob vigilância cardiotocográfica contínua durante um
período de pelo menos 2 horas após a sua administração. O tratamento da
reação de Jarisch-Herxheimer é sintomático (hidratação, antipiréticos, tocólise
em SOS) e o quadro resolve habitualmente em 24-48 horas. O(s) parceiro(s)
sexual(ais) deve(m) ser encaminhado(s) para a consulta de Dermatologia ou,
no caso de ser impossível, deve ser recomendado o tratamento imediato com
penicilina G benzatínica, 2,4 milhões de unidades IM em dose única.
Os testes não treponémicos permitem avaliar a resposta ao tratamento, devendo
ser realizados mensalmente até se tornarem negativos ou baixos e estáveis (≤1:4).
Deve ser utilizado o mesmo teste e preferencialmente no mesmo labo- ratório,
uma vez que os títulos não são sobreponíveis. Após o tratamento da sífilis
primária, os valores devem descer duas diluições até ao 3º-4º mês. Deve ser
assumida falência terapêutica se ocorrer subida ou persistência no título 4-6
meses após a terapêutica. Nestes casos, o tratamento deve ser repetido e
ponderada a punção lombar para pesquisa de infeção no líquido cefalorra-
quidiano. A sífilis congénita pode ser suspeitada na ecografia, cuja frequência
necessita de ser adaptada ao tempo de gestação e ao tipo de sífilis. Os acha-
dos mais frequentes são hepatomegalia, ascite, placentomegalia, hidrâmnios
e hidrópsia fetal. No entanto, a maioria dos fetos infetados não apresenta
IDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
alterações ecográficas.
Parto e puerpério
Se possível, o parto deve ser evitado em período de manifestações clínicas ou
<30 dias após a terapêutica, porque nestas circunstâncias aumenta o risco de
sífilis congénita. A via de parto rege-se por critérios obstétricos.
222 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
A amamentação não está contraindicada, se a mãe tiver sido tratada. Deve ser
efetuada reavaliação analítica aos 3, 6 e 12 meses após o parto, no médico
assistente. Na sífilis tardia reavaliar também aos 24 meses.
BIBLIOGRAFIA
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TOXOPLASMOSE 61
RITA M ENDES SILVA , L UÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
O Toxoplasma gondii é um parasita que tem como hospedeiro definitivo o gato, no
intestino do qual se reproduz, sendo os oocistos libertados através das fezes. Os
oocistos podem permanecer infeciosos no solo durante anos, contaminando os
animais que os ingerem e levando à formação de cistos no seu músculo estriado.
Os humanos podem ser infetados através da ingestão de oocistos presentes no
solo, vegetais, água, ou através da ingestão de cistos na carne malcozinhada
de animais infetados (p. ex., porco, vaca, coelho, cordeiro). A seroprevalência
nas mulheres em Portugal é de 13-33%, variando com o local de residência.
A incidência da infeção primária na gravidez é de ~0,05%, sendo raríssima a
infeção não primária nas mulheres imunocompetentes. As complicações obsté-
tricas incluem: aborto espontâneo [odds ratio (OR 6,63)], parto pré-termo (PPT)
(OR 3,49), restrição de crescimento fetal (RCF) (OR 4,49) e morte fetal (OR 3,49).
A probabilidade de transmissão vertical aumenta ao longo da gravidez (sem risco
no período pré-concecional, 10-25% no 1.º trimestre, 30-35% no 2.º trimestre, 60-
-80% no 3.º trimestre), mas a ocorrência de complicações fetais diminui (~60% no
1.º trimestre, ~25% no 2.º trimestre, ~15% no 3.º trimestre). Dos recém-nascidos
(RN) infetados, ~80% são assintomáticos. Os restantes podem exibir coriorretinite,
surdez, cegueira, défice cognitivo e atraso motor. A adoção de medidas preventivas
reduz a incidência da infeção e constitui a intervenção mais importante: lavar
as mãos antes de manusear alimentos; lavar cuidadosamente em água corrente
ou descascar todos os frutos e vegetais, incluindo saladas pré-preparadas (a
desinfeção com lixívia ou vinagre é pouco eficaz); cozinhar bem (>66 °C) a carne
e refeições pré-confecionadas, utilizando luvas no seu manuseio; evitar consumo
de fumados não cozinhados, congelar a carne antes da confeção (pelo menos 3
dias a -20 °C); usar luvas e lavar cuidadosamente as mãos após manuseio de terra;
manter os gatos dentro de casa, alimentando-os com comida cozinhadaou ração;
evitar manipular fezes de gatos. Embora geralmente assintomática, a infeção
materna pode cursar com febre, cefaleias, mialgias, faringite, hepatoes-
plenomegalia, eritema maculopapular não pruriginoso e linfadenopatia cervical. A
coriorretinite e a infeção cerebral são muito raras e ocorrem sobretudo quando há
imunodepressão ou em casos de reativação. O diagnóstico baseia-se na deteção
de anticorpos IgM e IgG contra o toxoplasma no sangue materno (Tabela 61.1).
ABORDAGEM CLÍNICA
Resultado Significado Abordagem
IgG-/IgM- Ausência de contacto prévio Rastreio trimestral, medidas preventivas
IgG-/IgM+ Infeção recente ou IgM falso positivo Repetição da serologia 3 semanas depois
(continua)
224 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
(continuação)
A IgM surge cerca de 1 semana após a infeção e persiste até 1-2 anos, com
pico às 8 semanas. A taxa de falsos positivos é de ~60% pelo que perante IgG-
/IgM+ se aconselha repetição serológica após 3 semanas em laboratório de
referência. Se o título de IgM é estável e a IgG persiste negativa, assumir falsa
positividade. A IgG surge cerca de 2 semanas após a infeção, os seustítulos
sobem rapidamente e permanecem positivos indefinidamente. Se coe- xistirem
com IgM+, determinar avidez em laboratório de referência. Se a avidez for forte,
a infeção terá ocorrido há >3-4 meses. Se a avidez for fraca, não se pode excluir
infeção recente. A repetição serológica após 3 semanas permite documentar a
subida (>3 diluições) ou a estabilidade da titulação, auxiliando no diagnóstico
de infeção recente ou passada.
ABORDAGEM CLÍNICA
Perante uma seroconversão (serologia inicial IgG- com IgM- ou + e ulterior com
IgG+) ou perante suspeita de infeção durante a gravidez (IgG+/IgM+ com avidez
fraca ou intermédia):
■ Iniciar espiramicina 1 g per os (PO) 8/8 horas. Efeitos secundários: náuseas,
vómitos, diarreia, eritema cutâneo. Este fármaco é eficaz sobretudo se numa
fase mais inicial (taquizoíto) prévia à formação de cistos, pelo que o seu início
deve ser imediato. Acumula-se na placenta, sendo utilizado com o intuito de
prevenir a infeção fetal, não tendo benefício materno direto conhecido. Se
alergia ou intolerância, azitromicina 500 mg PO a cada 48 horas;
■ Pesquisar sinais ecográficos de toxoplasmose congénita (calcificações intra-
cranianas, ventriculomegalia, hidrocefalia, hidrópsia fetal, microcefalia, placen-
tomegalia, hepatomegalia, esplenomegalia, ascite, RCF) – baixa sensibilidade
e especificidade;
■ Amniocentese pelo menos 6 semanas após a provável seroconversão e após as
20 semanas, para pesquisa de Toxoplasma gondii no líquido amniótico (LA)
por técnica de polymerase chain reaction [(PCR), especificidade ~100%,
sensibilidade ~90%].
Se PCR negativo
■ Manter profilaxia da infeção fetal com espiramicina (1 g 8/8 horas) até ao parto;
■ Ecografia mensal.
Se PCR positivo
■ Informar a grávida que o tratamento reduz a gravidade das complicações fe-
tais, mas não as evita. Na maior parte dos casos, a toxoplasmose congénita
Toxoplasmose 225
Parto
A decisão sobre a via de parto rege-se apenas por critérios obstétricos.
Para confirmação de infeção e eventual transmissão vertical, está recomendado:
■ Envio de uma porção de placenta (>100 g) para o Instituto Nacional de Saúde
Dr. Ricardo Jorge (INS-RJ), para pesquisa de antigénio por inoculação em
animais. Conservar entre 4-8 ºC, entregar no laboratório idealmente no dia
da colheita;
■ Envio de duas amostras de sangue do cordão umbilical para o INS-RJ (1 ml
em tubo seco e 1 ml em EDTA) para serologia IgG/IgM e PCR;
■ Envio de uma amostra de sangue materno (1 ml em tubo seco) para o INS-RJ,
para serologia IgG/IgM;
■ Envio da placenta restante para exame anátomo-patológico.
Puerpério
A amamentação não está contraindicada.
BIBLIOGRAFIA
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226 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
INTRODUÇÃO
O vírus varicela-zóster (VZ) é responsável pela varicela e pelo herpes zóster.
A varicela é a manifestação da infeção primária, após a qual o vírus pode
permanecer latente nos gânglios nervosos. O herpes zóster é uma forma re-
corrente da infeção, resultante da reativação viral, mas não tem implicações
materno-fetais importantes, pelo que não é abordado neste protocolo. A vari-
cela carateriza-se por um exantema maculo-papulo-vesicular pruriginoso, com
lesões em vários estádios de evolução, sendo o envolvimento habitualmente
progressivo: face, tronco e extremidades. Nos 4 dias que antecedem o exantema
podem existir febre, mialgias e mal-estar geral. A transmissão ocorre sobretudo
através de secreções respiratórias e por contacto direto com o fluido das lesões
vesiculares. O período de incubação é de 10-21 dias e o período de contágio
compreende os 2 dias que antecedem o exantema até ao momento em que
todas as lesões cutâneas ficam cobertas por crosta. Cerca de 95% das grávidas
já se encontram imunizadas (por infeção na infância ou por vacinação), pelo
que a incidência é apenas de ~0,1%. Quando ocorre em adultos, a varicela associa-
se a um maior risco de complicações, nomeadamente: pneumonia, encefalite,
hepatite, miocardite e insuficiência suprarrenal. A pneumonia é a complicação
mais frequente na gravidez, afetando 5-10% das doentes. É mais grave em fases
mais avançadas da gestação e manifesta-se habitualmente por tosse que
surge 2-6 dias após o exantema e que evolui para um quadro de dispneia, dor
torácica, hemoptises e cianose. Os fatores de risco para de- senvolvimento de
pneumonia são: tabagismo, >100 lesões cutâneas, infeção nos 2.º e 3.º
trimestres, antecedentes de doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC) e
imunossupressão. A radiografia (Rx) torácica evidencia geralmente um infiltrado
nodular/miliar peri-brônquico bilateral. A transmissão vertical ocorre em ~8% dos
casos, por via transplacentar ou após o nascimento através das partículas
respiratórias ou por contacto direto com as lesões cutâneas mater- nas. A infeção
perinatal pode ser assintomática, manifestar-se pela síndrome da varicela
congénita (SVC) ou por varicela neonatal. A SVC é caracterizada por: hipoplasia
congénita dos membros e dedos, deformações das extremidades associadas a
lesões cutâneas cicatriciais ao longo dos dermátomos, alterações neurológicas
(atrofia do córtex, hidrocefalia, microcefalia, convulsões, alterações do
neurodesenvolvimento), alterações oftalmológicas (cataratas, coriorretinite,
microftalmia, atrofia do nervo ótico), alterações viscerais (atrésia ou estenose
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
ABORDAGEM CLÍNICA
Preconceção
Todas as mulheres devem ser questionadas sobre antecedentes pessoais de
varicela. Caso desconheçam ou estejam incertas sobre se tiveram a doença, ou
caso afirmem que não a tiveram, deve ser doseada a IgG-VZ. Em mulheres não
imunizadas deve ser oferecida vacinação. Existem duas vacinas vivas atenuadas
(Varivax® e Varilrix®) e o esquema de vacinação inclui duas doses separadas
por um intervalo mínimo de 4-8 semanas. A contraceção deve ser mantida no
primeiro mês após a toma da última dose.
Gravidez
As mulheres seronegativas, as que desconhecem ou que estão incertas sobre
se tiveram a doença e as que afirmam que não a tiveram, devem ser acon-
selhadas a evitar a exposição a indivíduos com varicela ou com suspeita da
doença. A vacinação está contraindicada na gravidez, mas pode ser realizada
durante a amamentação.
Exposição à varicela
Considera-se exposição à varicela: varicela num dos membros do agregado
familiar, contacto próximo com indivíduo com varicela durante >5 minutos ou
permanência no mesmo quarto hospitalar de um doente infetado. Nestas situa-
ções, se não houver antecedentes pessoais de varicela, vacinação ou seropositi-
vidade, deve ser pedido o doseamento da IgG-VZ. Perante uma grávida exposta
à varicela e IgG-VZ negativa deve ser oferecido imunoglobulina (Ig) anti-VZ
(Varitect® ) 1 ml/kg (25 UI/kg) endovenosa (EV), administrada em perfusão, em
sala de observações, a 0,1 ml/kg/hora durante os primeiros 10 minutos, ritmo que
se for bem tolerado pode ser aumentado progressivamente até um máximo de 1
ml/kg. A administração deve ser feita o mais precocemente possível após a
exposição, idealmente nas primeiras 96 horas e no máximo até aos 10 dias. Esta
terapêutica reduz o risco de ocorrência e atenua a gravidade da infeção, caso
esta ocorra. Embora a sua eficácia seja menor, caso não exista IgG-VZ disponível,
pode ser administrada Ig inespecífica, 400 mg/kg EV, repartida de forma a não
ultrapassar os 50 g/dia. O período de incubação da doença após a Ig anti-VZ
aumenta cerca de 7 dias. A grávida deve ser aconselhada a evitar novo contacto
com a pessoa infetada até que todas as suas lesões cutâneas atinjam a fase de
crosta.
Varicela na gravidez
Implicações maternas
Deve ser avaliada a presença de fatores de risco para varicela complicada
[tabagismo, doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC), imunosupressão, cor-
ticoterapia] e de critérios clínicos de gravidade (sinais de doença sistémica
grave, sintomas neurológicos como fotofobia, convulsões ou tonturas, sintomas
respiratórios, dor torácica, lesões cutâneas hemorrágicas, grande densidade
Varicela 229
Implicações fetais
Até às 20+6 semanas a grávida deve ser referenciada à consulta de Medicina
Materno-Fetal para despiste de SVC. Solicitar ecografia com estudo detalhado
da anatomia fetal e neurossonografia, a realizar 5-7 semanas após a infeção
materna. Os achados ecográficos mais associados à SVC são: deformidadesdos
membros, microcefalia, hidrocefalia, calcificações dos tecidos moles e RCF.
Oferecer a possibilidade de amniocentese para pesquisa de DNA viral no líquido
amniótico (LA) a partir das 17 semanas, desde que já tenham decorrido 5 se-
manas após o início dos sintomas. A presença de DNA do vírus no LA confirma
ou exclui a infeção fetal, mas não é preditiva da gravidade da SVC. Assim:
■ Se DNA viral no LA negativo e sem alterações ecográficas: o risco de SVC é muito
baixo. Deve apenas repetir ecografia às 28 e às 32 semanas;
■ Se DNA viral no LA positivo e sem alterações ecográficas: risco moderado de
SVC. Deve repetir ecografia às 22-24, 28 e 32 semanas. Se não houver alterações
ecográficas nesta fase o risco de SVC é muito baixo;
■ Se DNA viral no LA positivo e alterações ecográficas sugestivas: risco elevado
de SVC. Ponderar ressonância magnética (RM) fetal e aconselhar de forma
individualizada.
Após as 21+0 semanas deve-se informar o casal do risco muito baixo de SVC e
desaconselhar a realização de amniocentese.
Varicela no periparto
Quando o início do exantema materno ocorre entre 6 dias antes e 2 dias após
o parto, o recém-nascido (RN) tem um risco de 17-30% de desenvolver varicela
neonatal, a qual tem uma mortalidade de ~30% nos RN que não receberam
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Pode ser realizada analgesia locorregional, se decorridos >5 dias após o início
do exantema e a punção for em zona sem lesões. Antes desse período deve
ser evitada, pelo possível risco de transmissão ao sistema nervoso central (SNC).
Após o parto, o RN deve ser isolado dos outros RN, mas não da mãe.Deve ser
administrada ao RN Ig anti-VZ imediatamente após o parto (ou nas48 horas
após o aparecimento de lesões cutâneas na puérpera).
A varicela não constitui uma contraindicação para a amamentação. Se houver
lesões cutâneas próximas do mamilo, evitar colocar o RN na mama afetada,
promovendo a extração do leite da mesma. O leite extraído pode ser oferecido
ao RN, se este tiver recebido Ig anti-VZ ou aciclovir.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Cytomegalovirus, parvovirus B19,
varicella zoster and toxoplasmosis in pregnancy. Practice Bulletin No. 151. Obstet Gynecol.
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RAFAEL TJ. VARICELLA. In V. Berghella (ed.), Maternal-fetal evidence based guidelines, 3 rd
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Guideline No. 13. 2015.
HERPES SIMPLEX 63
LAURA CRUZ, M ÓNICA CENTENO
INTRODUÇÃO
O vírus Herpes simplex (VHS) apresenta dois subtipos: VHS-1 e VHS-2. O VHS-1
está mais associado a infeção labial e o VHS-2 a infeção genital, mas ambos podem
estar envolvidos nos dois tipos de lesões. A infeção transmite-se por contacto
direto com indivíduos infetados, geralmente assintomáticos. O período de
incubação varia entre 2-12 dias para os dois subtipos. A infeção herpética pode
ser classificada em primária ou recorrente. Estabelece-se o diagnóstico de
infeção primária quando ocorre isolamento viral na ausência de anticorpos espe-
cíficos. A sintomatologia é mínima ou ausente em 90% dos casos. Podem existir
sintomas prodrómicos como prurido, ardor, dor ou parestesias, que antecedem
o aparecimento de úlceras dolorosas. O herpes genital pode ser acompanhado por
disúria, manifestações sistémicas (febre, letargia, cefaleias) e adenopatias
inguinais. Os anticorpos específicos surgem até 12 semanas após a infeção e
permanecem positivos indefinidamente. A infeção genital pelo VHS-1 raramente
recorre, enquanto a do VHS-2 recorre frequentemente. A infeção recorrente é
definida pelo isolamento de VHS-1 ou VHS-2 nas lesões cutâneas, na presença
de anticorpos para o mesmo vírus. Geralmente associa-se a sintomas ligeiros
e a um menor número de lesões, havendo uma eliminação viral baixa durante
3-5 dias. Na ausência de medidas preventivas, a transmissão vertical é de 25-50%
nas infeções genitais primárias, ~33% no primeiro episódio recorrente e 1-3%
nos restantes episódios recorrentes. Em >90% dos casos a transmis- são ocorre
durante a passagem do feto no canal de parto, por contacto direto com secreções
maternas infetadas. A transmissão vertical transcervical ascen- dente ou
transplacentária é muito rara. O herpes neonatal ocorre em ~0,01% dos
nascimentos e pode resultar em infeção disseminada (25%, com 30% de
mortalidade), doença do SNC (30%, com 4% de mortalidade), envolvimento da
pele, olhos ou boca (45%) e sequelas neurológicas em 20% dos sobreviventes.
O VHS é um vírus com baixo potencial teratogénico, estando descritos casos
raros de malformações cutâneas, oftalmológicas e neurológicas após infeção
no 1.º ou 2.º trimestres.
ABORDAGEM CLÍNICA
Perante a suspeita clínica é importante questionar o parceiro sexual sobre a exis-
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
■ Polymerase chain reaction (PCR) do DNA viral das lesões: não exige vesículas
íntegras e é mais sensível do que a cultura do líquido vesicular;
■ Serologia VHS-1 e VHS-2: deve ser realizada quando há suspeita de infeção
primária ou quando os testes virológicos são negativos.
não pretenda cesariana, deve realizar aciclovir 5 mg/kg EV 8/8 horas até ao
parto. Nestas situações evitar a amniotomia, a monitorização fetal interna e o
parto instrumentado.
Puerpério
A amamentação não está contraindicada, exceto na presença de lesões her-
péticas na mama. A puérpera e os familiares próximos com infeção herpética ativa
devem proteger as lesões e proceder à higiene cuidadosa das mãos antes de
manipular o recém-nascido (RN). O aciclovir e o valaciclovir são seguros na
amamentação.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS . Management of herpes in pregnancy.
Practice Bulletin no. 220. Obstet Gynecol. 2020;135(5):193-202.
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recurrence at delivery: a systematic review. Obstet Gynecol. 2003;102(6):1396-1403.
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at delivery: a randomized clinical trial. Obstet Gynecol. 2006;108(1):141-147.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
64 TUBERCULOSE
ANA DAGGE, M ÓNICA CENTENO
INTRODUÇÃO
Estima-se que a prevalência mundial de tuberculose (TB) na Europa seja de
~0,06%. É causada por inalação de bacilos do complexo Mycobacterium, sendo
o M. tuberculosis o mais comum. Após um episódio de TB ativa, >90% dos indi-
víduos mantêm os bacilos em estado inativo durante longos períodos de tempo
(TB latente), podendo ocorrer reativação, sobretudo no contexto de imunossu-
pressão. Os indivíduos com TB latente são assintomáticos e não contagiosos.
A gravidez não altera o curso da TB, não aumenta o risco de reativação, nem
altera a resposta ao tratamento. A TB ativa pode estar associada a infeção con-
génita por disseminação hematogénica, mas este evento é muito raro. Quando há
ausência ou atraso no tratamento da TB, existe maior risco de parto pré-termo
(PPT), restrição de crescimento fetal (RCF), pré-eclâmpsia e mortalidade perinatal.
A vacina do bacilo Calmette-Guérin (BCG) não deve ser administrada durante a
gravidez. Deve ser realizado rastreio de TB: em mulheres com fatores de risco
[infeção pelo vírus da imunodeficiência humana (VIH) ou outras situações de
imunossupressão – em preconceção ou no início da gravidez], perante sintomas
sugestivos, quando existiu um contacto próximo com indivíduo contagioso ou
quando ocorreu uma viagem recente para zona endémica. Os testes de rastreio
são seguros, específicos, e não são afetados pela gravidez. O teste da tuber-
culina (Mantoux) é positivo se a área de induração for ≥10 mm em indivíduo
VIH negativo ou ≥5 mm em indivíduo VIH positivo, imunodeprimido ou com
contacto próximo com indivíduo contagioso. O interferon-gamma release assay
(IGRA) deve ser realizado sempre que o teste da tuberculina for positivo ou 8-10
semanas após um teste da tuberculina negativo para exclusão do diagnóstico.
Um rastreio positivo, sem sintomatologia ou outros exames positivos, estabelece
o diagnóstico de TB latente. Quando acresce uma história de mal-estar, febre,
suores noturnos, anorexia, cansaço, tosse, perda de peso, ou uma radiografiade
tórax sugestiva, estabelece-se o diagnóstico de TB ativa. No entanto, os testes
de rastreio negativos não excluem totalmente a TB ativa, já que podem demorar
8-12 semanas a positivar.
TUBERCULOSE LATENTE
Tratamento
Está indicado se: grávida VIH positiva (risco de doença ativa de ~10%/ano), a
conversão do teste da tuberculina ocorreu há <2 anos (risco de doença ativa de
~5% no primeiro ano) ou ocorreu exposição recente a indivíduo contagioso (risco
de doença ativa ~0,5%/ano). As grávidas com TB latente sem indicação para
tratamento devem ser orientadas para a consulta de Pneumologia 3-6 me- ses
após o parto, para reavaliação da necessidade de terapêutica. As mulheres
Tuberculose 235
TUBERCULOSE ATIVA
O quadro clínico e a abordagem são semelhantes aos da mulher não grávida,
embora alguns dos sintomas possam ser confundidos com as alterações fisio-
lógicas da gravidez. A TB pulmonar é a mais frequente e geralmente manifes- ta-
se por: tosse pouco produtiva e persistente (o mais comum), hemoptise e
dispneia. Os sintomas associados às formas extrapulmonares estão expostosna
Tabela 64.1.
Abordagem clínica
A avaliação deve ser efetuada por uma equipa multidisciplinar, incluindo um
Infeciologista, e as grávidas encaminhadas para o Centro de Diagnóstico Pneu-
mológico (CDP) da área de residência, sendo a referenciação feita por contacto
telefónico direto. Deve ser realizada uma radiografia (Rx) ao tórax com proteção
abdominal. Nenhum padrão imagiológico é patognomónico, principalmente em
indivíduos VIH positivos, mas o padrão clássico inclui infiltrados pulmonares e
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Tratamento
A TB pulmonar é geralmente tratada em regime de ambulatório, mas a hospi-
talização pode ser necessária em casos de instabilidade clínica, insuficiência
hepática grave ou falta de apoio familiar/social. Na TB pulmonar com doente
bacilífera (exame micobacteriológico direto ou cultural positivo ou pesquisa de
ácido nucleicos do M. tuberculosis positiva em amostras respiratórias), esta deve
ser internada em quarto individual sob medidas de isolamento respiratório
(serviço de Doenças Infeciosas ou Pneumologia). O risco de transmissão de
TB é mínimo se forem cumpridas todas as medidas preventivas. O isolamento
respiratório deve ser suspenso, caso não se confirme o diagnóstico ou se houver
melhoria clínica após 15 dias de tratamento antibacilar e exame direto negativo.
Com exceção da estreptomicina (contraindicada por causar ototoxicidade no
feto), todos os outros fármacos de primeira linha são considerados seguros na
gravidez. A isoniazida tem risco de hepatotoxicidade e neurotoxicidade periférica
no periparto. A função hepática deve ser avaliada antes do início do tratamento
e depois mensalmente. Devem ser pesquisados sinais e sintomas de hepatite
(anorexia, náuseas, vómitos, urina escura, icterícia, parestesias persistentes das
mãos e pés, fadiga persistente, febre com três ou mais dias, dor no quadrante
superior direito do abdómen, hemorragia ou artralgias). Outros efeitos adversos
da isoniazida incluem: eritema cutâneo, distúrbios neuropsiquiátricos (depressão,
mania, perda de memória, psicose), neurite periférica e convulsões. Os principais
efeitos adversos da rifampicina são trombocitopenia, anemia hemolítica, febre e
eritema cutâneo. O tratamento deve incluir terapêutica combinada, deve ter uma
duração mínima de 6 meses e deve ser realizado com toma única em regime
de toma observada diretamente.
TB pulmonar
■ 2 meses: isoniazida 5 mg/kg (máx. 300 mg) PO 1 vez/dia + piridoxina 25
mg PO 1 vez/dia + etambutol 15 mg/kg PO 1 vez/dia + rifampicina 10 mg/
/kg (máx. 600 mg) PO 1 vez/dia + pirazinamida 25 mg/kg (máx. 1 500 mg)
PO 1 vez/dia;
■ Fase de manutenção de 4 meses: isoniazida + rifampicina (doses seme-
lhantes).
TB extrapulmonar
A fase de manutenção deve ser prolongada: SNC/disseminada/osteoarticular total
de 10 meses, ganglionar/pericárdica total de 4 meses. Na TB meníngeaou
pericárdica, deve ser adicionada corticoterapia:
■ TB pericárdica: prednisolona 60 mg PO 1 vez/dia, durante 4 semanas, com
desmame progressivo;
■ TB meníngea: prednisolona 20-40 mg PO 1 vez/dia ou dexametasona 12 mg
intramuscular (IM) 1 vez/dia durante 3 semanas, com desmame progressivo
durante 3 semanas.
Tuberculose 237
BIBLIOGRAFIA
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
65 PERTURBAÇÕES DO HUMOR E DA ANSIEDADE
LAURA CRUZ, M ÓNICA CENTENO, GABRIELA ANDRADE, BEATRIZ CÔRTE-REAL, LUÍS C ÂMARA PESTANA
INTRODUÇÃO
A gravidez constitui um período de maior vulnerabilidade para o aparecimento,
agravamento ou recidiva das perturbações do humor e de ansiedade. Os ante-
cedentes de perturbação psiquiátrica (seguimento em consulta e/ou terapêutica
psicofarmacológica), bem como a existência de fatores de risco associados,
devem ser investigados na consulta pré-concecional ou na primeira consulta
da gravidez. O presente protocolo incide sobre as perturbações de humor e de
ansiedade mais frequentes na gravidez.
PERTURBAÇÃO DEPRESSIVA
Cerca de 15% das mulheres reportam sintomas depressivos durante a gravidez.
Os principais fatores de risco são os antecedentes de ansiedade ou depres-
são, gravidez não planeada ou não desejada, caraterísticas da personalidade
(p. ex., perfecionismo ou propensão à culpabilidade), estrato socioeconómico
baixo, ausência de suporte social adequado e violência doméstica. Define-se epi-
sódio depressivo pela ocorrência de sintomas depressivos durante, pelo menos,
2 semanas. O quadro clínico é caracterizado pela presença de humor deprimido
e/ou perda de interesse/prazer pela maioria das atividades, manifestações estas
que se podem acompanhar de insónia ou hipersónia, alteração do apetite com
ou sem alteração do peso, inquietação ou lentificação psicomotora, irritabilidade,
baixa energia, dificuldade de concentração, sentimentos de culpa, desvalorização
pessoal e pensamentos relacionados com a morte/ideação suicida.
A escala de depressão pós-parto de Edimburgo (Figura 65.1) diz respeito à semana
anterior e pode ser utilizada para rastreio da depressão na gravidez eno pós-
parto. Uma pontuação >11 é muito sugestiva de depressão, mas não quantifica a
sua gravidade.
A perturbação depressiva durante a gravidez é preditora de depressão no pós-
-parto e está associada a baixa adesão aos cuidados pré-natais, aumento do
consumo de tabaco, álcool e outras substâncias psicoativas. Poderá ser respon-
sável pelo ligeiro aumento de risco de aborto espontâneo, parto pré-termo (PPT)
e parto instrumental. No pós-parto associa-se a dificuldade no estabelecimento
do vínculo materno e a risco acrescido de psicopatologia em idade pediátrica.
Perturbações do Humor e da Ansiedade 239
1. Tenho sido capaz de me rir e ver o lado 2. Tenho tido esperança no futuro.
divertido das coisas. ■
Tanta como sempre tive – 0
■
Tanto como dantes – 0 ■
Menos do que costumava ter – 1
■
Menos do que antes –1 ■
Muito menos do que costumava ter – 2
■
Muito menos do que antes – 2 ■
Quase nenhuma – 3
■
Nunca – 3
3. Tenho-me culpado sem necessidade 4. Tenho estado ansiosa ou preocupada sem motivo.
quando as coisas correm mal. ■
Não, nunca – 0
■
Sim, a maioria das vezes – 3 ■
Quase nunca – 1
■
Sim, algumas vezes – 2 ■
Sim, por vezes – 2
■
Raramente – 1 ■
Sim, muitas vezes – 3
■
Não, nunca – 0
5. Tenho-me sentido com medo ou muito 6. Tenho sentido que são coisas demais para mim.
assustada, sem motivo. ■
Sim, a maioria das vezes não consigo resolvê-las – 3
■
Sim, muitas vezes – 3 ■
Sim, por vezes não tenho conseguido resolvê-las
■
Sim, por vezes – 2 como antes – 2
■
Não, raramente – 1 ■
Não, a maioria das vezes resolvo-as facilmente – 1
■
Não, nunca – 0 ■
Não, resolvo-as tão bem como antes – 0
7. Tenho-me sentido tão infeliz que durmo mal. 8. Tenho-me sentido triste ou muito infeliz.
■
Sim, quase sempre – 3 ■
Sim, quase sempre – 3
■
Sim, por vezes – 2 ■
Sim, muitas vezes – 2
■
Raramente – 1 ■
Raramente – 1
■
Não, nunca – 0 ■
Não, nunca – 0
9. Tenho-me sentido tão infeliz que choro. 10. Tive ideias de fazer mal a mim mesma.
■
Sim, quase sempre – 3 Sim, muitas vezes – 3
■
■
Sim, muitas vezes – 2 Por vezes – 2
■
■
Só às vezes – 1 Muito raramente – 1
■
■
Não, nunca – 0 Nunca – 0
■
Tratamento
Preconceção ou primeira consulta
Havendo antecedentes de depressão, recomendam-se geralmente os fármacos
que foram previamente eficazes, desde que seguros na gravidez. A desconti-
nuação da terapêutica pode conduzir a recaídas, estando desaconselhada se
existir história de perturbação depressiva recorrente, com episódios graves ou
sintomatologia durante a atual gravidez. A interrupção do tratamento apenas
deverá ser considerada quando ocorre um período livre de sintomatologia de-
pressiva superior a 6-12 meses.
Eletroconvulsivoterapia
A eletroconvulsivoterapia (ECT) está indicada na depressão grave (particularmen-
te se existir ideação suicida, sintomas psicóticos ou catatónicos), sobretudo
quando é necessária uma resposta rápida e/ou há refratariedade a outras in-
tervenções. É geralmente bem tolerada, eficaz e segura em todos os trimestres
da gravidez. Estão descritos casos raros de hemorragia vaginal, aborto espon-
tâneo, descolamento da placenta, PPT, insuficiência placentária e bradicardia
transitória. Pode condicionar alterações transitórias da tensão arterial (TA) e o
aparecimento de contrações uterinas. Os efeitos secundários maternos mais
frequentes são alterações transitórias de memória, cefaleias e náuseas. O es-
quema terapêutico mais frequente são 2-3 sessões semanais, com um número
total médio de 6-12 sessões.
PERTURBAÇÕES DA ANSIEDADE
Incluem as fobias, a perturbação de pânico, a perturbação da ansiedade ge-
neralizada e a perturbação de stress pós-traumático. Como primeira linha, está
indicada a psicoterapia. A terapêutica com benzodiazepinas está indicada no
tratamento sintomático da ansiedade quando esta é grave e incapacitante, mas
apenas durante um período de tempo limitado. É desaconselhada no tratamento
a médio/longo prazo porque, apesar de aliviar os sintomas, não trata a pertur-
bação da ansiedade de base. Os ISRS (ver “Tratamento do episódio depressivo
grave”) são considerados os fármacos de primeira linha. A combinação de um
antidepressivo com uma benzodiazepina pode ser útil inicialmente numa ansieda-
de grave, com posterior descontinuação da benzodiazepina. Durante a gravidez,
as benzodiazepinas de eleição são as que têm uma semivida curta/intermédia
– clonazepam, oxazepam e lorazepam. Não devem ser utilizadas por mais de
2 semanas, dado o risco de dependência e de complicações neonatais. A sua
administração próxima do termo pode causar toxicidade e abstinência neonatal,
incluindo índice de Apgar baixo, apneia, hipotermia, hiperreflexia, hipertonia ou
hipotonia, irritabilidade, letargia, trémulo, vómitos e dificuldade na alimentação.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
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NEOPLASIA INTRAEPITELIAL CERVICAL 66
RITA ROSADO, ANA GOMES DA COSTA, ANABELA COLAçO
INTRODUÇÃO
A neoplasia intraepitelial cervical (CIN) ocorre em ~1% das gestações. O rastreio
na grávida é semelhante ao da mulher não grávida: realizar se última citologia há
>3 anos ou teste de papilomavírus humano (HPV) de alto risco há >5 anos. A
gravidez induz alterações no colo do útero que podem mimetizar situações de
displasia cervical, tornando a avaliação colposcópica mais complexa. As biópsias
do exocolo estão reservadas para situações de suspeita de doença de alto
grau ou de doença invasiva, e as biópsias do endocolo estão contraindicadas.
Os tratamentos destrutivos e excisionais também estão contraindicados por-
que comportam um risco hemorrágico de 5-14% e de aborto de ~33%. Mesmo
a CIN 3 tem uma taxa de regressão elevada (48-70%) e risco de progressão
para cancro invasivo durante a gravidez muito reduzido. Assim, perante o diag-
nóstico de CIN e após exclusão de doença invasiva, o tratamento é diferido
para depois do parto. Não se recomenda a vacinação contra o HPV durante
a gravidez. As vacinas quadrivalente e nonavalente podem ser administradas
durante a amamentação.
Atipia citológica minor: ASC-US (atypical squamous cells of undertermined significance) ou LSIL (low grade
squamous intraepithelial lesion)
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Encaminhar para colposcopia, que pode ser diferida para 12 semanas apóso
parto.
Adenocarcinoma in situ
Referenciação para colposcopia e orientação individualizada, de acordo com a
idade gestacional.
COLPOSCOPIA NA GRAVIDEZ
Se a junção escamocolunar for visível e a zona de transformação for do tipo 1
ou 2 com achados colposcópicos normais ou de grau 1, não deve ser realizada
biópsia e está indicada a realização de coteste 12 semanas após o parto. Se
a junção escamocolunar não for visível e a zona de transformação for do tipo 3
com achados colposcópicos de grau 2 ou com suspeita de microinvasão, devem
ser efetuadas biópsias em função dos achados. A curetagem endocervical está
contraindicada.
Neoplasia Intraepitelial Cervical 245
BIBLIOGRAFIA
INTRODUÇÃO
Vulvovaginites é o termo genérico que se utiliza para designar os distúrbios
causados pela inflamação da mucosa vulvovaginal ou por alteração da flora va-
ginal. Têm como causas mais frequentes as infeções consideradas no presente
protocolo, podendo também ocorrer inflamação de causa química ou alérgica. O
diagnóstico etiológico tem por base a anamnese e o exame ginecológico, poden-
do também ser úteis o exame a fresco ao microscópio e os testes laboratoriais.
VAGINOSE BACTERIANA
Resulta da proliferação de bactérias anaeróbias, sendo a mais frequente a Gard-
nerella vaginalis. Tem como fatores de risco: múltiplos parceiros ou mudança
recente de parceiro sexual, parceiro sexual do sexo feminino, irrigação vaginal
recente. Esta infeção aumenta o risco de aborto tardio, parto pré-termo (PPT)
e endometrite puerperal. O principal sintoma é o corrimento com cheiro fétido,
mas em mais de 50% dos casos é assintomática. Ao exame ginecológico ob- serva-
se leucorreia branca-acinzentada, espumosa, com cheiro fétido. No examea fresco
visualizam-se células vaginais com margens indistintas recobertas por bactérias
(clue cells) e ausência de polimorfonucleares. Quando colocado hidró- xido de
potássio a 10%, o corrimento apresenta um cheiro fétido característico (teste de
aminas positivo).
Tratamento
Se grávida sintomática, com antecedentes de PPT, com ameaça de PPT ou se
programada para interrupção da gravidez, utilizar um dos seguintes tratamentos:
■ Metronidazol 500 mg per os (PO) 2 vezes/dia ou 250 mg PO 3 vezes/dia,
durante 7 dias;
■ Clindamicina 300 mg PO 2 vezes/dia, durante 7 dias;
■ Cloreto de dequalínio comprimido (comp.) vaginal 10 mg per vagina (PV) 1
vez/dia, durante 6 dias.
Não está recomendado o tratamento do parceiro sexual.
VULVOVAGINITE FÚNGICA
É causada pelo crescimento exagerado de fungos geralmente da espécie Candida
sp. Tem como fatores de risco: diabetes mellitus, imunossupressão, antibiotera-
pia recente. Não está associada a desfechos obstétricos adversos. Os sintomas
principais são: prurido vulvar, ardor vulvar, disúria e dispareunia. No exame
ginecológico pode observar-se eritema vulvovaginal, fissuras ou escoriações,
associados a leucorreia branca espessa, sem cheiro, aderente às paredes da
Vulvovaginites 247
Tratamento
Quando sintomática deve realizar um dos seguintes tratamentos:
■ Clotrimazol comp. vaginal 500 mg PV ao deitar em dose única + creme vaginal
2 vezes/dia, durante 7 dias;
■ Econazol óvulo 150 mg PV 1 vez/dia ao deitar durante 3 dias + creme vaginal 2
vezes/dia, durante 7 dias;
■ Sertaconazol óvulo 300 mg PV ao deitar em dose única + creme vaginal 2
vezes/dia, durante 7 dias.
Não está recomendado tratar o parceiro sexual. Não está demonstrado na gravi-
dez o benefício da terapêutica de manutenção em casos de infeção recorrente. O
fluconazol 150 mg PO em dose única pode ser considerado no 2.º e 3.º trimestres,
quando não há melhoria sintomática com os tratamentos tópicos.
TRICOMONÍASE VAGINAL
É uma infeção sexualmente transmissível causada pelo protozoário Trichomonas
vaginalis. Tem como fatores de risco: novo parceiro sexual, outras infeções
sexualmente transmissíveis e está associada a associada a aumento de risco
de rutura prematura de membranas, PPT e restrição de crescimento fetal (RCF).
Tem como sintomas principais: prurido vulvar, ardor vulvar, disúria, polaquiúria,
dispareunia e corrimento com cheiro fétido, podendo também ser assintomática.
Ao exame ginecológico, observa-se corrimento amarelo-esverdeado, arejado,
com odor fétido, eritema vulvovaginal e do colo do útero (colpite em framboesa).
No exame a fresco visualizam-se protozoários flagelados e polimorfonucleares
abundantes. Quando colocado hidróxido de potássio a 10%, o corrimento apre-
senta um cheiro fétido característico (teste de aminas positivo).
Tratamento
Está indicado nas infeções sintomáticas e assintomáticas, usando um dos
seguintes:
■ Metronidazol 500 mg PO 2 vezes/dia, durante 7 dias;
■ Metronidazol 2 g PO toma única.
O parceiro sexual também deve ser tratado.
No caso de infeções vulvovaginais mistas, ou perante incerteza diagnóstica,
pode ser usado o tratamento com cloreto de dequalínio comp. vaginal 10 mg
PV 1 vez/dia, durante 6 dias.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
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MASSAS ANEXIAIS 68
N UNO SIMõES COSTA , I NÊS REIS
INTRODUÇÃO
A incidência de massas anexiais na gravidez é de ~0,1%. Estas são na grande
maioria benignas, de natureza funcional e com regressão espontânea. As lesões
malignas têm uma incidência de ~0,003% e correspondem a ~3% das massas
identificáveis, apresentando-se geralmente em estádios precoces. O diagnóstico
de massas anexiais na gravidez é geralmente incidental, no contexto de uma eco-
grafia obstétrica de rotina; mais raramente, apresentam sintomas inespecíficos
como dor abdominal, dor lombar, distensão abdominal, alterações do trânsito in-
testinal ou queixas urinárias. As massas anexiais podem ser ainda identificadas no
exame físico, como uma massa abdominopélvica ou um abaulamento dos fundos
de saco vaginais. Por vezes, o diagnóstico decorre de uma complicação
relacionada com a massa anexial (ver “Complicações”, à frente neste capítulo)
ou é um achado ocasional na cesariana. As principais causas e diagnósticos
diferenciais das massas anexiais estão consideradas no Quadro 68.1.
ABORDAGEM CLÍNICA
O diagnóstico definitivo é geralmente histológico, mas a imagiologia, a clínica
e o doseamento de marcadores tumorais permitem chegar muitas vezes a um
diagnóstico presuntivo com elevada precisão.
Ecografia
As lesões com <5 cm de diâmetro representam maioritariamente cistos fun-
cionais (folicular ou do corpo lúteo) e ~70% destas situações regridem até ao início
do 2.º trimestre. O corpo lúteo pode persistir em 13-17% das gestações.As lesões
sem características ecográficas de complexidade são geralmente benignas e
representam cistos funcionais, cistos serosos uniloculares, cista- denomas serosos
ou hidrossalpinge. As lesões com características ecográficas de complexidade
podem incluir lesões benignas: corpo lúteo, endometrioma, cisto tecaluteínico,
cistadenoma multilocular, leiomioma pediculado, teratoma quístico maduro ou
gravidez extrauterina. O teratoma quístico maduro é a lesão quística mais
frequente após as 16 semanas e é geralmente benigno (risco de diferenciação
em carcinoma invasivo <2%). As lesões malignas constituem
~10% das massas que persistem durante a gestação, correspondendo a tumores
epiteliais em ~50% e a tumores das células germinativas em ~33% dos casos.
Dos tumores epiteliais, ~50% correspondem a tumores borderline. Em ~20% dos
casos o estudo ecográfico não é conclusivo e pode ser complementado com
ressonância magnética (RM) sem contraste (o gadolínio está contraindicado na
gravidez). A tomografia computorizada (TC) sem contraste pode ser considerada
quando os anteriores não são conclusivos (a dose de radiação habitualmente
utilizada é considerada segura na gravidez).
Marcadores tumorais
O CA-125 está geralmente aumentado no início da gravidez e nas primeiras
semanas pós-parto. Entre as 15 semanas de gestação e o parto, os níveis são
geralmente normais, mas podem estar aumentados na pré-eclâmpsia. A
desidrogenase lática [(LDH), aumentada no disgerminoma] tem geralmente níveis
normais na gravidez, podendo estar aumentada na pré-eclâmpsia. As concentra-
ções de human epididymis protein 4 [(HE4), aumentadas no cancro do ovário] não
parecem ser influenciadas pela gravidez, pelo que o doseamento deste marcador
é útil neste contexto. Outros marcadores como a alfafetoproteína (AFP), a inibina
A, o antigénio carcinoembrionário (CEA) e a gonadotrofina coriónica humana (hCG)
estão elevados durante a gravidez, pelo que a sua interpretação é mais difícil.
Tratamento
A abordagem destas situações deve ter em conta o risco de progressão da doen-
ça, o risco de complicações (ver “Complicações”, à frente neste capítulo) e os
riscos da terapêutica para o feto. Como regra geral, perante uma grávida assin-
tomática e com achados ecográficos sugestivos de benignidade, deve repetir-se
a ecografia após 4 semanas e, não havendo crescimento da lesão, manter-se
uma atitude expectante com reavaliação no pós-parto. Constituem potenciais
indicações cirúrgicas na gravidez: suspeita de malignidade (por características
Massas Anexiais 251
Complicações
Dependem do tamanho da lesão e da idade gestacional e incluem: torção, rotura,
hemorragia, obstrução do canal de parto e apresentação fetal anómala, asso-
ciando-se as três primeiras mais frequentemente a um quadro abdominal agudo.
A torção está descrita em ~5% das gestações com massas anexiais, sendo a
incidência maior para massas de 6-8 cm (~22%); ocorre sobretudo durante o
1.º trimestre da gravidez, diminuindo o risco à medida que a gravidez progride.
BIBLIOGRAFIA
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
69 CIRURGIA NÃO OBSTÉTRICA
INTRODUÇÃO
As situações que mais frequentemente condicionam uma indicação cirúrgica na
gravidez são: apendicite aguda, doenças das vias biliares, obstrução intestinal,
patologia anexial, patologia mamária e traumatismos. O presente protocolo des-
creve os cuidados específicos a respeitar perante uma cirurgia não obstétrica
durante a gravidez.
CUIDADOS ESPECÍFICOS
Programação da cirurgia
Quando existe uma indicação cirúrgica urgente ou emergente, esta pode ser
realizada em qualquer altura da gravidez, sob o princípio de que os benefícios
do procedimento superam os riscos maternos e fetais. Quando a indicação
cirúrgica não é urgente ou emergente, mas não pode esperar pelo final da
gestação, deve agendar-se preferencialmente para depois do 1.º trimestre. Em-
bora não exista evidência consistente de um acréscimo do risco de aborto ou
do risco teratogénico dos agentes anestésicos e dos procedimentos cirúrgicos
realizados no 1.º trimestre, esta exposição deve por princípio ser minimizada.
Para os procedimentos que envolvem a cavidade abdominal, estes deverão
idealmente ser realizados entre as 14-20 semanas, dado que após este período
as dimensões do útero podem dificultar a cirurgia e tornam mais difícil realizar
o procedimento sem manipulação uterina.
Cuidados pré-operatórios
A decisão cirúrgica e o planeamento da mesma deve incluir uma discussão
multidisciplinar, envolvendo a equipa cirúrgica, Obstetrícia, Anestesiologia e Neo-
natologia. O consentimento informado escrito, para além dos riscos relacionados
com a cirurgia, deve incluir os riscos obstétricos e, nos fetos viáveis, a hipótese
da necessidade de realizar uma cesariana emergente.
Cuidados perioperatórios
■ Jejum pré-operatório de pelo menos 6 horas [8 horas se índice de massa
corporal (IMC) ≥30], exceto em procedimentos emergentes;
■ Profilaxia antibiótica de acordo com o procedimento cirúrgico;
■ Avaliação do risco tromboembólico e aplicação das medidas profiláticas (ver
protocolo “39. Tromboembolismo venoso – profilaxia”);
■ Após as 20 semanas posicionar a grávida preferencialmente em decúbito
lateral esquerdo, para minimizar a compressão aorto-cava;
Cirurgia Não Obstétrica 253
Laparoscopia
Os benefícios da laparoscopia na mulher grávida são os mesmos que na mulher
não grávida, podendo condicionar menor manipulação uterina. Não existe um
limite absoluto em termos de idade gestacional para a realização de uma lapa-
roscopia, mas o momento ideal é igualmente entre as 14-20 semanas, pelos
motivos enunciados anteriormente.
■ A entrada na cavidade abdominal deve ter em conta o volume do útero graví-
dico. A angulação caudal da agulha de Veress deve ser de 15° podendo ser
necessário modificar os pontos de entrada habituais (Figura 69.1) ou realizar
uma entrada aberta. O desvio lateral do útero pode ajudar a evitar lesões
durante os procedimentos de entrada na cavidade abdominal. Recomenda-se
descompressão gástrica prévia à insuflação e à colocação dos trocars;
■ A pressão intra-abdominal deve manter-se entre 8-12 mmHg, não ultrapas- sando
os 15 mmHg;
■ Está recomendada a monitorização contínua de CO2 (capnografia);
■ O posicionamento em Trendelenburg deve ter em conta a fase da gravidez, sendo
a inclinação menor quanto maior a idade gestacional.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
254 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Laparotomia
Deve ser reservada para situações de abdómen agudo com sinais francos de
irritação peritoneal ou com instabilidade hemodinâmica, instabilidade clínica,
lesões de grandes dimensões ou com elevado grau de suspeição de maligni-
dade. Pode ser considerada também sempre que o cirurgião não tenha grande
experiência em laparoscopia.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Nonobstetric surgery during pre- gnancy.
Committee Opinion no. 775. April 2019.
N EJDLOVA M, J OHNSON T. Anaesthesia for non-obstetric procedures during pregnancy sterility. Cont
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ABDÓMEN AGUDO 70
CATARINA POLICIANO, JOAQUIM NUNES
INTRODUÇÃO
O abdómen agudo manifesta-se por um quadro de dor abdominal moderada/
/intensa persistente, de aparecimento mais ou menos súbito, geralmente com
menos de 24 horas de evolução, podendo acompanhar-se de outros sintomas como
náuseas, vómitos e hemorragia vaginal. Trata-se de uma situação urgente,que
exige diagnóstico etiológico rápido, e frequentemente implica uma interven- ção
cirúrgica. Os sinais de irritação peritoneal (defesa, dor à descompressão, rigidez)
podem surgir mais tardiamente nas grávidas, devido à interposição do útero
gravídico e à laxidão dos tecidos da parede abdominal. A avaliação etiológica é
semelhante à da mulher não grávida, não devendo os exames complementares de
diagnóstico e as intervenções terapêuticas ser adiadas,pois tal atitude aumenta
a morbilidade e mortalidade materna e neonatal. Al- gumas causas não
ginecológicas de abdómen agudo são mais frequentes na gravidez, devido às
alterações fisiológicas acompanhantes (obstrução intestinal, pancreatite aguda,
colecistite aguda).
Causas ginecológicas
Rotura de cisto anexial hemorrágico: manifesta-se geralmente por dor aguda
unilateral num dos quadrantes inferiores do abdómen, que pode ser desenca-
deada pelo esforço. Na ecografia pélvica visualiza-se massa anexial com ou sem
hemoperitoneu. A necessidade de intervenção cirúrgica depende da estabilidade
hemodinâmica e da intensidade da dor após analgesia.
Torsão anexial: manifesta-se geralmente por dor aguda num dos quadrantes
inferiores do abdómen. Na ecografia visualiza-se uma massa anexial com au-
sência de vascularização. No entanto, o quadro clínico e a ecografia podem ser
inespecíficos. Perante a suspeita clínica, a cirurgia não deve ser adiada pelo risco
de necrose anexial.
Torsão ou degenerescência de mioma: manifesta-se geralmente por dor pélvi-
ca aguda num dos quadrantes inferiores do abdómen. A suspeita é sobretudo
ecográfica. Só tem indicação cirúrgica se a dor pélvica não ceder à terapêutica
analgésica.
Síndrome de hiperestimulação ovárica: complicação de técnica de procriação
medicamente assistida.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Causas obstétricas
Gravidez ectópica (GE) rota: ver protocolo “11. Gravidez ectópica”.
Descolamento prematuro de placenta: ver protocolo “21. Descolamento pre-
maturo da placenta”.
Rotura uterina: ver protocolo “84. Hipoxia fetal e tocólise aguda”.
256 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
ABORDAGEM CLÍNICA
Anamnese: o diagnóstico assenta fortemente na caracterização da dor – locali-
zação (ver Quadro 70.1), irradiação, início, duração, tipo, fatores de alívio e de
agravamento, sintomas acompanhantes.
Exame abdominal: pesquisar dor superficial, dor à exploração profunda e de-
fesa à palpação dos diferentes quadrantes abdominais. Deve ser pesquisada
especificamente a dor no ponto de McBurney e o sinal de Murphy, bem como
a dor à descompressão abdominal.
Exame vaginal: avaliação das características cervicais e da presença de dor à
exploração dos fundos de saco vaginais.
Avaliação laboratorial: hemograma, ionograma, função hepática (transaminases,
bilirrubina), amílase pancreática, exame sumário de urina.
Ecografia pélvica
CTG: se gestação >25 semanas.
Analgesia adequada: diversos estudos demonstram uma acuidade diagnóstica
semelhante quando se institui uma analgesia adequada.
Caso as causas obstétricas e ginecológicas de abdómen agudo tenham sido
excluídas, a grávida deve ser observada pela Cirurgia Geral. Em caso de dúvida
diagnóstica, os exames subsidiários subsequentes dependem das hipóteses
consideradas mais prováveis. A ressonância magnética (RM) é preferível à to-
mografia axial computadorizada, evitando radiação ionizante e tendo geralmente
uma acuidade diagnóstica equivalente. Se a avaliação clínica e os exames
complementares de diagnóstico não permitirem identificar a etiologia e a doente
Abdómen Agudo 257
Quadro 70.1 – PRINCIPAIS E TIOLOGIAS DO A BDÓMEN AGUDO, DE ACORDO COM A LOCALIZAçÃO DA DOR
Quadrante superior direito Epigastro Quadrante superior esquerdo
■
Colecistite Gastrite
■ ■
Gastrite
■
Cólica biliar Úlcera péptica
■ ■
Úlcera péptica
■
Colangite Pancreatite
■ ■
Pancreatite
■
Hepatite Colecistite
■ ■
Esplenomegalia
■
Abcesso hepático Trombose/isquemia mesen-
■ ■
Rotura esplénica
■
Pancreatite térica ■
Oclusão intestinal
■
Úlcera péptica Oclusão intestinal
■ ■
Diverticulite do ângulo es-
■
Apendicite na gravidez tardia Enfarte agudo do miocárdio
■
plénico
■
Oclusão intestinal Pericardite
■ ■
Pneumonia
■
Doença inflamatória intes- ■
Enfarte agudo do miocárdio
Periumbilical
tinal ■
Pericardite
■
Pneumonia Apendicite (inicial)
■
Enterocolite
■
Quadrante inferior esquerdo
Quadrante inferior direito Trombose/isquemia mesen-
■ ■
Diverticulite
■
Apendicite térica ■
Apendicite
■
Doença inflamatória intes- Oclusão intestinal
■ ■
Oclusão intestinal
tinal Doença inflamatória intes-
■ ■
Colite isquémica
■
Diverticulite de Meckel ou tinal ■
Hérnia encarcerada
cecal Rotura da aorta abdominal
■ ■
GE
■
Adenite mesentérica Aneurisma
■ ■
Salpingite
■
Oclusão intestinal Hérnia encarcerada
■ ■
Torção anexial
■
Hérnia encarcerada ■
Rotura de cisto anexial
Hipogastro
■
GE ■
Nefrolitíase
Salpingite Apendicite
■
■ ■
Pielonefrite
Enterocolite
■
■
Torção anexial
■
Rotura de cisto anexial Diverticulite
■
■
Nefrolitíase Oclusão intestinal
■
■
Pielonefrite Doença inflamatória intes-
■
tinal
Hérnia
■
GE
■
Salpingite
■
Torção anexial
■
BIBLIOGRAFIA
BIRNBAUM A, SCHECHTER C, TUFARO V, et al. Efficacy of patient-controlled analgesia for pa-
tients with acute abdominal pain in the emergency department: a randomized trial. Acad
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
INTRODUÇÃO
Nas situações clínicas em que é previsível que ocorra um parto pré-termo (PPT)
a curto prazo, a administração materna de corticosteroides com capacidade de
atravessar a placenta reduz a incidência de morte neonatal, de síndrome de
membrana hialina, enterocolite necrotizante e hemorragia intraventricular nos
recém-nascidos (RN). No entanto, os benefícios deixam de ser claros após as
35+0 semanas de gestação. O ciclo de corticosteroides consiste num dos seguintes
esquemas terapêuticos alternativos:
■ Betametasona acetato/fosfato: duas doses de 12 mg intramuscular (IM) com
24 horas de intervalo;
■ Dexametasona: quatro doses de 6 mg IM com 12 horas de intervalo.
INDICAÇÕES
Gestações entre as 24+0 e as 34+6 semanas, em que existe uma elevada proba-
bilidade de que o parto ocorra nos 7 dias seguintes. Incluem-se nestas situa-
ções o trabalho de PPT, a rotura prematura de membranas (RPM), a hemorragia
vaginal moderada/abundante, pré-eclâmpsia, etc. A eficácia máxima observa-se nas
24 horas após a administração da última dose de corticosteroides. No entanto,
existe benefício mesmo quando o parto ocorre antes de completado o ciclo,
pelo que é vantajoso efetuar pelo menos uma administração (exceto quando o
parto está iminente). Constituem contraindicações para a utilização de
corticosteroides a infeção materna grave e a corioamnionite clínica (ver
“Situações particulares”).
Situações particulares
■ As grávidas medicadas cronicamente com corticosteroides devem também
realizar ciclo de corticosteroides para maturação fetal, dado que só a betame-
tasona e a dexametasona atravessam adequadamente a barreira placentária;
■ Nas situações urgentes e emergentes (p. ex., hemorragia vaginal abundante,
síndrome de HELLP, etc.) não deve ser protelado o parto com o objetivo de
aguardar o efeito dos corticosteroides;
■ Na gravidez múltipla, apesar de os níveis circulantes dos corticosteroides serem
IDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
CICLO DE RESGATE
A administração de múltiplos ciclos de corticosteroides a intervalos regulares
não é recomendada, por se associar a maior morbilidade fetal e infantil. Está
recomendada uma repetição única do ciclo de corticosteroides (ciclo de resgate)
nos casos em que:
■ Há um novo evento que faça prever que o parto vá ocorrer nos 7 dias se-
guintes;
■ Gestação com <34+0 semanas;
■ Ciclo inicial terminado pelo menos 14 dias antes.
BIBLIOGRAFIA
BROWNFOOT FC, GAGLIARDI DI, BAIN E, et al. Different corticosteroids and regimens for ac-
celerating fetal lung maturation for women at risk of preterm birth. Cochrane Database Syst
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NEUROPROTEÇÃO FETAL COM SULFATO DE MAGNÉSIO 72
DIOGO AYRES DE CAMPOS, L UÍSA P INTO
INTRODUÇÃO
A prematuridade é um importante fator de risco para a ocorrência de paralisia
cerebral, tendo esta uma incidência 80 vezes superior em crianças nascidas entre
as 24-28 semanas de gestação. Apesar do seu mecanismo de ação não ser
ainda totalmente compreendido, a administração materna de sulfato de magnésio
(MgSO 4) até às 32 semanas de gestação diminui significativamentea incidência
e a gravidade de paralisia cerebral na infância.
INDICAÇÕES
A administração de MgSO 4 para neuroproteção fetal está indicada em gestações
entre as 24+0-31+6 semanas quando ocorre:
■ Trabalho de parto pré-termo (PPT) em que seja previsível que o parto ocorra
nas 12 horas seguintes (contractilidade uterina regular na fase ativa do pri-
meiro período do trabalho de parto ou contractilidade uterina muito intensa
e frequente na fase latente do trabalho de parto);
■ Qualquer indicação para terminação eletiva da gravidez.
Contraindicações: Miastenia gravis, insuficiência cardíaca e defeitos de con-
dução cardíaca.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Magnesium sulfate before anti- cipated
preterm birth for neuroprotection. Committee Opinion no. 455. Obstet Gynecol.
2010;115(3):669-671.
ROYAL COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNAECOLOGISTS. Magnesium sulphate to prevent cere- bral
palsy following preterm birth. Scientific impact paper No. 29, August 2011.
ROUSE DJ, HIRTZ DG, THOM E, et al. A randomized, controlled trial of magnesium sulfate for
the prevention of cerebral palsy. N Engl J Med. 2008;359(9):895-905.
VERSÃO CEFÁLICA EXTERNA 73
M ARIA DE CARVALHO AFONSO, DIOGO AYRES DE CAMPOS, LUÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
A versão cefálica externa (VCE) permite reduzir a incidência de apresentações
não cefálicas a termo e diminuir a taxa de cesarianas por este motivo. A taxa de
sucesso da VCE ronda os 50% (60% nas multíparas, 40% nas nulíparas). Após
uma VCE com sucesso, 97% dos fetos mantêm-se em apresentação cefálica até
ao parto. O desconforto que a VCE provoca é muito variável, mas deve infor-
mar-se sempre a grávida que a manobra será imediatamente suspensa se não
estiver a tolerar a dor. As complicações da VCE são muito raras e geralmente
limitadas a desacelerações transitórias da frequência cardíaca fetal (FCF). Em
0,45% das VCE ocorre descolamento da placenta ou bradicardia fetal susten- tada,
que levam à necessidade de realizar rapidamente uma cesariana. A VCE deve ser
oferecida a todas as mulheres com gravidez única e feto em situação transversa
ou em apresentação pélvica, a partir das 36 semanas, desde que não
apresentem nenhuma das seguintes contraindicações:
■ Outra indicação para parto por cesariana (placenta prévia, duas cesarianas
anteriores, etc.);
■ Risco elevado de descolamento de placenta (hemorragia vaginal ativa, ante-
cedentes de descolamento de placenta);
■ Rotura prematura de membranas (RPM) e dilatação cervical (risco de prolapso
do cordão);
■ Malformações major da cavidade uterina;
■ Restrição de crescimento fetal (RCF) com alterações fluxométricas que con-
traindiquem um parto vaginal;
■ Cardiotocografia (CTG) suspeita ou patológica;
■ Cabeça fetal deflectida com ângulo superior a 90°;
■ Duas ou mais circulares cervicais apertadas.
A cesariana anterior, o trabalho de parto em início sem dilatação cervical, o
oligoâmnio isolado e a evidência ecográfica de uma circular cervical não cons-
tituem contraindicações para a VCE.
PROCEDIMENTO
Aconselhar a grávida a ingerir apenas líquidos claros (água, chá, sumos sem polpa,
com ou sem açúcar) nas 8 horas anteriores e ficar em jejum nas 2 horas anteriores.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Previamente à VCE
■ A grávida deve esvaziar a bexiga;
■ CTG com critérios de normalidade (mínimo de 20 minutos);
266 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Manobras de VCE
Posicionar a grávida em decúbito dorsal, ligeiramente inclinada para a esquer-
da. Tentar primeiro a cambalhota fetal anterógrada. Com uma mão eleva-se a
pelve fetal acima da bacia materna, puxando-a para um dos flancos. Com a
outra mão dirige-se o polo cefálico na direção da bacia materna. Na segunda e
terceira tentativas pode tentar-se a cambalhota fetal retrógrada. As tentativas
não devem ultrapassar 2 minutos de duração e devem ser intervaladas por,
pelo menos, 1 minuto de repouso. Durante os intervalos deve avaliar-se a FCF.
Suspender a manobra se: dor intolerável referida pela grávida, desaceleração da
FCF (<90 bpm durante >1 minuto). Abandonar a VCE: ao segundo episódio de
dor intolerável referida pela grávida, se desaceleração prolongada da FCF (<90
bpm durante >3 minutos) ou após três tentativas sem sucesso.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN C OLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS . External cephalic version. Practice
Bulletin no. 161. Obstet Gynecol. 2016;127(2):e54-e61.
I MPEY LWM, M URPHY DJ, GRIFFITHS M, PENNA LK ON BEHALF OF THE ROYAL COLLEGE OF OBSTE -
TRICIANS AND GYNAECOLOGISTS. External cephalic version and reducing the incidence of term
breech presentation. BJOG. 2017;124:e178-e192.
INDUÇÃO DO TRABALHO DE PARTO E
MATURAÇÃO CERVICAL 74
M ARIA DE C ARVALHO AFONSO , S USANA SANTO
INTRODUÇÃO
Entende-se por indução do trabalho de parto o desencadeamento artificial de
contrações uterinas rítmicas, que condicionam dilatação e apagamento do colo
uterino, e o consequente início do trabalho de parto. A maturação cervical é um
processo lento que envolve modificações na estrutura interna do colo, tornando-o
apto a dilatar. Na altura em que se estabelece uma indicação para indução do
trabalho de parto, a maturação cervical pode já ter ocorrido espontaneamente
ou pode ser necessário desencadeá-la previamente.
A avaliação do índice de Bishop modificado (Tabela 74.1) é essencial para de-
terminar a necessidade de maturação cervical antes de se realizar uma indução
do trabalho de parto. Assim, na presença de um índice de Bishop desfavorável
(<6) é necessária a maturação cervical (que sempre que possível será reali-
zada em ambulatório), para assegurar o maior sucesso da posterior indução
do trabalho de parto. Perante um índice de Bishop favorável (≥6) a maturação
cervical prévia é desnecessária.
vaginal posterior;
■Decúbito lateral durante 30 minutos após a aplicação. Sem restrições poste-
riores de deambulação, mesmo após rotura de membranas, se o colo estiver
fechado ou a apresentação apoiada;
■Sem restrições de dieta;
■CTG 1 vez/turno durante 1 hora. CTG contínua a partir do momento em que
ocorra dor ou contractilidade uterina rítmica;
■Paracetamol 1 g endovenoso (EV) em SOS de 8/8 horas, tramadol 100 mg EV
em SOS de 6/6 horas, ondansetron 4 mg EV bólus lento em SOS de8/8
horas;
■Transferir para o bloco de partos se fase ativa do trabalho de parto (≥4 cm
de dilatação com ≥80% de apagamento), necessidade de realizar analgesia
adicional, ou necessidade de monitorização materno-fetal mais apertada
(p. ex., CTG suspeita, hemorragia vaginal relevante);
■Retirar insert de dinoprostona se: taquissistolia com alterações da CTG (ver
“Complicações”, à frente neste capítulo), fase ativa do trabalho de parto, CTG
patológica, ou ao final de 24 horas;
■Na reavaliação (após exteriorização espontânea ou deliberada): indução do tra-
balho de parto se índice de Bishop ≥6 e já tiverem passado 30 minutos após
a remoção. Ponderar novo ciclo de maturação cervical se índice de Bishop <6.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Induction of labor. Practice Bulletin
No. 107. Obstet Gynecol. 2009;114:386-397. Reaffirmed 2016.
D IREçãO-GERAL DA S AÚDE . Orientação n.º 002/2015 de 19/01/2015. Indução do trabalho
de parto, 2015.
NATIONAL I NSTITUTE FOR C LINICAL E XCELLENCE . Induction of labour. 2008.
SPONG CY, B ERGHELLA V, W ENSTROM KD, et al. Preventing the first cesarean delivery: summary
of a joint Eunice Kennedy Shriver National Institute of Child Health and Human Develop-
ment, Society for Maternal-Fetal Medicine, and American College of Obstetricians and
Gynecologists Workshop. Obstet Gynecol. 2012;120(5):1181-1193.
THOMPSON MR, TOWERS CV, HOWARD BC, et al. The use of prostaglandin E1 in peripartum
patients with asthma. Am J Obstet Gynecol. 2015;212(3):392.e1-3.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
75 CUIDADOS DE ROTINA DURANTE O
TRABALHO DE PARTO
INTRODUÇÃO
O presente protocolo define os cuidados de rotina a serem prestados durante
o trabalho de parto, podendo ser necessárias medidas diferentes ou adicionais em
situações de risco ou de inadequada evolução do mesmo. Define-se fase latente
do 1.º período como o intervalo que decorre entre o início do trabalho departo e
os 4 cm de dilatação (exclusive). Nestas situações não se preconiza o
internamento por rotina, exceto quando este for considerado a melhor forma de
gerir a situação clínica por motivos de dor, ansiedade, dificuldade de acesso ao
hospital ou vigilância materno-fetal. Define-se fase ativa do 1.º período como o
intervalo que decorre entre a dilatação cervical ≥4 cm, com apagamento ≥80%
e a dilatação completa. Define-se fase latente do 2.º período como o intervalo
entre o momento em que é detetada dilatação cervical completa até ao momento
em que se iniciam os esforços expulsivos maternos. Define-se fase ativa do 2.º
período como o intervalo entre o início dos esforços expulsivos maternos e o
nascimento total do feto. Quando na equipa médica ou de enfermagem existirem
elementos que necessitem de prática na assistência ao parto eutócico, haverá
uma articulação entre os profissionais de saúde de forma a assegurarem uma
distribuição equitativa (começando sempre pelo elemento mais novo), para que
estes elementos possam realizar os exames vaginais durante o trabalho departo
e a assistência à fase ativa do 2.º período.
NA ALTURA DO INTERNAMENTO
Cuidados de enfermagem
■ Avaliação da temperatura auricular;
■ Avaliação da tensão arterial (TA) com medidor automático, no braço direito, com
a grávida sentada, pernas descruzadas, cotovelo apoiado, braçadeira colocada
ao nível do coração, após um período mínimo de 5 minutos sentada. Se o
perímetro do braço <35 cm usar braçadeira de adulto, se 35-45 cmusar
braçadeira grande e se perímetro >45 cm usar braçadeira extragrande.
■ Avaliação da proteinúria se TA sistólica ≥140 ou TA diastólica ≥90 mmHg (exceto
se houver rotura de membranas).
Cuidados médicos
■ Pedido de hemograma, estudo da coagulação com fibrinogénio e tipagem:
se houver antecedentes de hemorragia pós-parto major, coagulopatia heredi-
tária ou adquirida, útero miomatoso, cesariana anterior, multíparas com ≥5
partos, gestações múltiplas, polihidrâmnios, suspeita de macrossomia fetal,
suspeita de corioamnionite, hemoglobina (Hb) <10g/dl ou trombocitopenianas
análises do 3.º trimestre, terapêutica anticoagulante e/ou antiagregante,
Cuidados de Rotina Durante o Trabalho de Parto 273
■ Não proceder a amniotomia artificial por rotina nas mulheres com início de
trabalho de parto espontâneo.
Nas parturientes submetidas a analgesia do neuroeixo alteram-se os seguintes
cuidados:
■ Administração de soro polieletrolítico com 5% glicose 1 000 ml EV ao ritmo
de 125 ml/hora;
■ Avaliação do pulso radial e TA com medidor automático 10 minutos após cada
administração do bólus e nas situações de “analgesia epidural controlada
pelo doente”, nos 10 minutos que se seguem ao bólus horário que a grávida
pode realizar;
■ Avaliação da temperatura auricular de 2/2 horas;
■ Avaliação de 4/4 horas da capacidade de micção espontânea vs. a neces-
sidade de algaliação;
■ Mantém-se o encorajamento da mobilização, mas o primeiro levante após cada
bólus deve ser acompanhado pelo enfermeiro da sala.
BIBLIOGRAFIA
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Resuscitation. 2015;95:249-263.
GUPTA JK, HOFMEYR GJ, SHEHMAR M. Position in the second stage of labour for women without
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INTERNATIONAL FEDERATION OF GYNECOLOGY AND OBSTETRICS, INTERNATIONAL CONFEDERATION OF M IDWIVES,
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December 2014.
PRACTICE GUIDELINES FOR OBSTE TRICAL A NESTHESIA: A R EPORT BY THE A MERICAN SOCIETY OF A NES-
THESIOLOGISTS TASK FORCE ON O BSTETRICAL A NESTHESIA . Anesthesiology. 1999;90:600-611.
SLEUTEL M, GOLDEN SS. Fasting in labor: relic or requirement. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs.
1999;28(5):507-512.
ANEXO 1
Critérios para pedir avaliação de anestesiologia na admissão ao bloco de partos (se
não previamente realizada na consulta)
■Doença cardiovascular (hipertensão mal controlada, cardiopatia relevante,
arritmias não corrigidas);
■Doença pulmonar (hipertensão pulmonar, insuficiência respiratória);
■Doença renal (insuficiência renal, transplante);
■Doença neurológica (central ou periférica);
■Doença endocrinológica (diabetes com mau controlo glicémico, disfunção
tiroideia não controlada, feocromocitoma);
■ Doença hematológica (Hg <9 g/dl, plaquetas <100×10 /l, coagulopatias);
9
ANEXO 2
Critérios para chamada de neonatologia ao bloco de partos
Chamada emergente
■ RN que ao final do primeiro minuto de vida exibe hipotonia, apneia, bradicar-
dia, palidez ou cianose;
■ Distocia de ombros;
■ Prolapso de cordão;
■ Paragem cardiorrespiratória materna.
INTRODUÇÃO
A tentativa de parto vaginal após cesariana (PVAC) é considerada uma opção
segura em casos selecionados, desde que estejam assegurados os cuidados
necessários à segurança do procedimento. A probabilidade de sucesso varia entre
49-87%, dependendo de fatores individuais. Os dois melhores fatores preditores
de sucesso são o parto vaginal anterior (sobretudo um PVAC ante- rior) e o início
espontâneo do trabalho de parto. Outros fatores associados ao sucesso incluem:
cesariana anterior por uma indicação não recorrente, apenas uma cesariana
segmentar transversa, idade materna <35 anos, índice de Bishop
>6, índice de massa corporal (IMC) <30 kg/m2 e estimativa de peso fetal (EPF)
<4 000 g. A principal complicação da tentativa de PVAC é a rotura uterina
(ver protocolo “84. Hipoxia fetal e tocólise aguda”), a qual pode condicionar
hemorragia materna, descolamento da placenta e hipoxia fetal aguda. A rotura
uterina é uma situação imprevisível que ocorre em ~0,47% das tentativas de PVAC
e ~0,03% das cesarianas programadas em grávidas com uma cesariana anterior.
Quando há necessidade de induzir o trabalho de parto em grávidascom uma
cesariana anterior, a rotura uterina ocorre em ~1,1% dos induzidos com
ocitocina, ~2% dos induzidos com dinoprostona e ~6% dos induzidos com
misoprostol. Perante uma rotura uterina, o risco de complicações perinatais
graves é de ~0,2%.
ABORDAGEM CLÍNICA
Proposta de tentativa de PVAC
A tentativa de PVAC deve ser proposta a todas as grávidas que não tenham
contraindicação para parto vaginal e que cumprem todos os seguintes critérios:
■ Uma cesariana segmentar transversa anterior;
■ Inexistência de outras cicatrizes uterinas envolvendo o miométrio e com
entrada na cavidade endometrial;
■ Inexistência de rotura uterina prévia.
A tentativa de PVAC não deve ser oferecida às grávidas com 2 cesarianas seg-
mentares anteriores. Caso a grávida com 2 cesarianas segmentares anteriores
solicite a tentativa de PVAC pode ser aceite perante condições muito favoráveis
(decisão individualizada a ser tomada por um médico especialista).
■ Caso seja necessário proceder a uma maturação cervical ou indução do tra- balho
de parto devem ser realizadas em regime de internamento hospitalar;
■ Caso seja necessária maturação cervical (índice de Bishop <6): preferir a
colocação de um balão de Foley (ver protocolo “74. Indução do trabalho de
parto e maturação cervical”). Deve ser realizada cardiotocografia (CTG) na
primeira hora após o procedimento e depois se ocorrerem contrações rítmicas
ou dor abdominal de qualquer tipo. A dinoprostona deve ser reservada para
grávidas com rotura prematura de membranas (RPM) e deve ser realizado
internamento no bloco de partos com CTG contínua, vigilância da tensão
arterial (TA) e da frequência cardíaca materna (FCM) de 15/15 minutos. O
misoprostol está contraindicado nestas grávidas;
■ Para a indução do trabalho de parto (índice de Bishop ≥6): deve ser realizado
internamento no bloco de partos, CTG contínua, vigilância da TA e da FCM de
15/15 minutos. Iniciar perfusão com ocitocina a 6 ml/hora (1 mUI/minuto)
(ver protocolo “80. Ocitocina na indução e aceleração do trabalho de parto”).
Trabalho de parto
■ Manter CTG contínua, vigilância da TA e da FCM de 15/15 minutos;
■ Manter especial atenção às alterações cardiotocográficas, incluindo a perda
de sinal e a frequência das contrações uterinas (ver protocolo “83. Cardio-
tocografia – interpretação”) e aos critérios de trabalho de parto estacionário
(ver protocolo “82. Trabalho de parto estacionário”).
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Vaginal birth after cesarean delivery.
Practice Bulletin no. 184. 2017.
D IREçãO-GERAL DA S AÚDE . Orientação n.º 003/2015. Parto vaginal após cesariana.
GUISE JM, EDEN K, EMEIS C, et al. Vaginal birth after cesarean: new insights. Evidence
Report/Technology Assessment. 2010;191:1-397.
ROYAL COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNAECOLOGISTS. Birth after previous caesarean birth.
Green-top Guideline no. 45. 2015.
IDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
77 STREPTOCOCCUS DO GRUPO B – PREVENÇÃO DA
INFEÇÃO NEONATAL
INTRODUÇÃO
O Streptococcus do grupo B (Strep B) ou Streptococcus agalactiae é a prin- cipal
causa de infeção neonatal grave (sépsis, pneumonia, meningite). Cer- ca de
10-30% das grávidas estão colonizadas (vagina ou reto) por Strep B.O rastreio
sistemático na gravidez e a profilaxia antibiótica intraparto reduzem em ~80% o
risco de transmissão vertical, bem como a morbilidade e morta- lidade
associadas. Está preconizada a colheita de exsudado vaginal e rectal para
pesquisa de Strep B às 35-37 semanas (rastreio do Strep B) a todas as
grávidas em que existe a possibilidade de um parto vaginal (ver protocolo “2.
Vigilância pré-natal de rotina”). O presente protocolo diz respeito à profi- laxia
antibiótica intraparto.
Considerações adicionais
■ Em grávidas com rastreio do Strep B+ e RPM após as 34+0 semanas, a indução
do trabalho de parto deve ser imediata (ver protocolo “23. Rotura prematura
de membranas”);
■ Havendo febre intraparto ou suspeita clínica de corioamnionite, a antibioterapia
instituída é terapêutica e não profilática (ver protocolo “81. Febre intraparto
e corioamnionite”);
■ Em grávidas com rastreio do Strep B+, os seguintes procedimentos não es-
tão contraindicados: descolamento das membranas, indução do trabalho de
parto, colocação de balão de Foley, monitorização cardiotocográfica interna. A
amniotomia artificial também não está contraindicada, devendo idealmente ser
realizada >2 horas após o início da antibioterapia profilática;
■ A desinfeção vaginal intraparto não reduz o risco de infeção neonatal por
Strep B.
BIBLIOGRAFIA
A MERICAN C OLLEGE OF OBSTE TRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Prevention of early-onset group
B streptococcal disease in newborns. Committee Opinion no. 485. Obstet Gynecol.
2011;117(4):1019-1027.
HUGHES RG, BROCKLEHURST P, STEER PJ, et al. for the Royal College of Obstetricians and
Gynaecologists. Prevention of early-onset neonatal group B streptococcal disease. Green-top
guideline No. 36. BJOG. 2017;124:e280-e305.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
78 ENDOCARDITE BACTERIANA – PROFILAXIA PERIPARTO
INTRODUÇÃO
A endocardite bacteriana é uma complicação rara, mas que pode implicar graves
riscos de saúde, particularmente quando existe uma doença cardíaca subjacente.
Na população geral, a profilaxia da endocardite bacteriana é atualmente ape- nas
recomendada para procedimentos com elevado risco de bacteriemia e em doentes
de muito elevado risco, nomeadamente aqueles que foram submetidosa cirurgia
corretiva com material prostético. A indicação para profilaxia periparto da
endocardite em grávidas com doença cardíaca, que foi prática generalizada
durante muitos anos, não é atualmente recomendada.
ABORDAGEM CLÍNICA
Por se estimar que o número de microrganismos em circulação após o parto
vaginal e após a cesariana seja muito escasso, e face à ausência de evidên-
cia de que estes eventos se associem a maior risco de endocardite infeciosa,
não está atualmente recomendada a profilaxia da endocardite bacteriana no
periparto, qualquer que seja a doença cardíaca subjacente ou o procedimento
cardíaco a que a grávida tenha sido sujeita.
BIBLIOGRAFIA
2015 EUROPEAN SOCIETY OF CARDIOLOGY GUIDELINES FOR THE MANAGEMENT OF INFECTIVE ENDO-
CARDITIS: EUR HEART J. 2015;36:3075-3128.
AMERICAN COLLEGE OF CARDIOLOGY/AMERICAN HEART ASSOCIATION. Guideline update on valvular
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NATIONAL INSTITUTE OF CLINICAL EXCELLENCE. Prophylaxis against infective endocarditis. An-
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EUROPEAN SOCIETY OF CARDIOLOGY. Guidelines on the management of cardiovascular diseases
during pregnancy. Eur Heart J. 2011;32:3147-3197.
VIRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA – PREVENÇÃO
DA TRANSMISSÃO VERTICAL PERIPARTO 79
CATARINA REIS DE CARVALHO, LUÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
A transmissão vertical do vírus da imunodeficiência humana (VIH) é a principal
causa da síndrome da imunodeficiência adquirida (SIDA) na criança, sendo a
utilização de terapêutica antirretroviral combinada (TARVc) durante a gravidez e a
carga viral (CV) os fatores de risco mais importantes. A redução da transmissão
vertical é conseguida através de medidas instituídas anteparto, periparto e ao
recém-nascido (RN). O presente protocolo aborda as medidas de prevenção pe-
riparto. Não existem ensaios clínicos que fundamentem o benefício da profilaxia
da transmissão vertical na infeção pelo VIH2, baseando-se as recomendações
na experiência clínica e nas estratégias de prevenção para o VIH1.
ABORDAGEM CLÍNICA
Grávida sob TARVc e com CV <50 cópias/ml no 3.º trimestre
■ Deve ser proposta a tentativa de parto vaginal;
■ A maturação cervical (mecânica ou farmacológica) e a indução do trabalho
de parto não estão contraindicadas;
■ No caso de rotura prematura de membranas (RPM) no termo, a indução do
trabalho de parto deve ser imediata;
■ Manter o esquema de TARVc durante o trabalho de parto;
■ Não há benefício na administração adicional de zidovudina (AZT) endovenosa
(EV) durante o trabalho de parto;
■ A amniotomia não se associa a maior risco de transmissão vertical, podendo
ser realizada segundo indicação obstétrica. A duração da rotura de membranas
também não se associa a aumento do risco;
■ Se possível, deve evitar-se a monitorização fetal interna e o parto instru-
mentado.
Grávida sob TARVc e com CV >50 e <1 000 cópias/ml no 3.º trimestre
■ Manter o esquema de TARVc até ao parto;
■ Deve fazer profilaxia periparto com AZT;
■ A via de parto deve ser individualizada.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
■ Iniciar a profilaxia periparto com AZT EV (ver “Profilaxia periparto com zido-
vudina”, à frente neste capítulo) 3 horas antes da cirurgia;
■ A profilaxia antibiótica na cesariana é igual à da restante população.
Grávida com indicação para cesariana programada devido à seropositividade VIH, mas
que se apresenta em trabalho de parto ou com rotura prematura de mem- branas
no termo
A atitude deve ser individualizada, já que se desconhece se a cesariana reduz
ou não o risco de transmissão vertical:
■ Se estiver em fase ativa do trabalho de parto, prevendo-se que este seja rápido,
permitir o parto vaginal e iniciar AZT EV, evitando amniotomia, moni- torização
interna da frequência cardíaca fetal (FCF) e parto instrumentado;
■ Na ausência de trabalho de parto ou na fase latente de trabalho de parto: realizar
cesariana, iniciar AZT EV, se possível 1 hora antes da mesma.
Cuidados no parto
Não há evidência de que a laqueação tardia do cordão umbilical aumente o
risco de transmissão vertical. A higiene do RN deve seguir as normais gerais
(ver protocolo “75. Cuidados de rotina durante o trabalho de parto”).
Puerpério
A amamentação deve ser desaconselhada a todas a mulheres seropositivas para
o VIH, prescrevendo-se supressão láctea (ver protocolo “93. Cuidados maternos
de rotina no puerpério”).
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Scheduled cesarean delivery and the
prevention of vertical transmission of HIV infection. Committee Opinion no. 234. May 2000,
reaffirmed 2017.
BRITISH HIV ASSOCIATION GUIDELINES FOR THE MANAGEMENT OF HIV INFECTION IN PREGNANT WO -MEN ,
2018.
D IREçãO-GERAL DA S AÚDE . Recomendações portuguesas para o tratamento da infeção VIH1
e VIH2, 2015.
EUROPEAN AIDS CLINICAL SOCIETY. Guidelines Version 11.0. October 2021. http://www.eac-
society.org/media/final2021eacsguidelinesv11.0_oct2021.pdf
RECOMMENDATIONS FOR THE USE OF ANTIRETROVIRAL DRUGS IN PREGNANT WOMEN WITH HIV INFECTION
AND INTERVENTIONS TO REDUCE PERINATAL HIV TRANSMISSION IN THE U NITED STATES , October 2017.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
80 OCITOCINA NA INDUÇÃO E ACELERAÇÃO DO TRABALHO
DE PARTO
INTRODUÇÃO
A utilização de ocitocina para a indução do trabalho de parto implica um índice
de Bishop favorável (ver protocolo “74. Indução do trabalho de parto e matura-
ção cervical”). Por aceleração do trabalho de parto entende-se a utilização de
ocitocina endovenosa (EV) para aumentar a frequência e intensidade das contra-
ções uterinas durante o trabalho de parto, quer este seja de início espontâneo,
quer tenha sido induzido. Em ambas as situações, a utilização de ocitocina
deve ser cuidadosa, pois acarreta riscos acrescidos de hipoxia fetal devida a
hipercontractilidade uterina e de rotura uterina (sobretudo em grávidas previa-
mente submetidas a cirurgia uterina envolvendo a profundidade do miométrio).
A ocitocina só deve ser iniciada 30 minutos após a remoção do insert vaginal
de dinoprostona ou 4 horas após a última aplicação de misoprostol vaginal.
Pode ser iniciada imediatamente após a retirada do balão de Foley.
ESQUEMA TERAPÊUTICO
Devem ser diluídos 5 UI de ocitocina (1 ampola) em 500 ml de soro fisiológico
(SF) (cada ml de solução contém 10 mUI de ocitocina), a perfundir em cateter
periférico de 18 ou 20G.
(continuação)
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Induction of labour. Practice bulletin
no. 107. August 2009
HAYES EJ, WEINSTEIN L. Improving patient safety and uniformity of care by a standardized
regimen for the use of oxytocin. Am J Obstet Gynecol. 2008;198(6):622.e1-7.
ROYAL COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNAECOLOGISTS. Birth after previous caesarean. Green-
-top Guideline No. 45. October 2015.
FEBRE INTRAPARTO E CORIOAMNIONITE 81
LAURA CRUZ, DIOGO AYRES DE CAMPOS, LUÍSA PINTO
INTRODUÇÃO
Considera-se febre intraparto quando a temperatura timpânica da parturiente
é ≥38,5 °C. As causas mais frequentes são a analgesia locorregional e a
corioamnionite. Entre outras causas contam-se as infeções extrauterinas (pneu-
monia, pielonefrite, apendicite, infeção viral, etc.), a desidratação e a reação a
fármacos como o misoprostol.
CORIOAMNIONITE
Define-se corioamnionite como uma infeção do LA, membranas, placenta e de-
cídua. Tem geralmente origem polimicrobiana e é causada por migração de
microrganismos originários da flora vaginal ou entérica. Raramente, ocorre após
procedimentos invasivos como a amniocentese ou a biópsia das vilosidades co-
riónicas (BVC), ou por via hematogénica, secundária a infeção materna sistémica.
Constituem fatores de risco para corioamnionite: rotura prolongada de mem-
branas, trabalho de parto prolongado, múltiplos exames vaginais, monitorização fetal
interna, colonização por Streptococcus do grupo B e infeção genital prévia. A
corioamnionite está associada a aumento do risco de distocia dinâmica, parto por
cesariana (2-3 vezes), atonia uterina (2-3 vezes), endometrite puerperal (2-4 vezes)
e, mais raramente, abcesso pélvico (3-4 vezes) e tromboflebite pélvica séptica
(2-3 vezes). O recém-nascido (RN) apresenta risco acrescido de índicede Apgar
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
[>100 batimentos por minuto (bpm)] e taquicardia fetal (linha de base >160
bpm), associada a pelo menos um dos seguintes critérios:
■ Dor moderada/intensa à palpação uterina;
■ Corrimento vaginal purulento ou LA com cheiro fétido;
■ Leucocitose (>15 000 leucócitos) e elevação da proteína C reativa (estas análises
devem ser solicitadas quando a febre materna é persistente, está associada aos
sintomas ou aos fatores de risco anteriormente descritos).
Abordagem clínica
Perante o diagnóstico de corioamnionite antes do início do trabalho de par-
to, existe uma indicação formal para terminação da gravidez, sendo a via de
parto regida por critérios obstétricos (a corioamnionite não justifica, por si só,
a realização de uma cesariana). Recomenda-se ainda as seguintes medidas:
■ Paracetamol 1 g 8/8 horas em bólus EV lento;
■ Arrefecimento da temperatura do quarto;
■ Reforço de hidratação EV;
■ Ampicilina 2 g EV 6/6 horas e gentamicina 1,5 mg/kg EV 8/8 horas ou 4,5
mg/kg EV 24/24 horas até melhoria clínica e 48 horas de apirexia (se alérgica
à penicilina: clindamicina 900 mg EV 8/8 horas ou vancomicina 1 gEV 12/12
horas);
■ Nas cesarianas adicionar: clindamicina 900 mg EV 8/8 horas ou metronidazol
500 mg EV 12/12 horas;
■ Hemoculturas se a grávida estiver imunodeprimida ou se não houver resposta
rápida à antibioterapia;
■ Durante o trabalho de parto pode ser necessário corrigir uma distocia dinâ-
mica (ver protocolo “82. Trabalho de parto estacionário”);
■ Após o parto, deve colher-se sangue para gasimetria (ver protocolo “89.
Gasimetria umbilical”).
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Intrapartum management of in-
traamniotic infection. Committee opinion No. 712. Obstet Gynecol. 2017;130(2):e95-e101.
ARENDT KW, SEGAL BS. The association between epidural labor analgesia and maternal fever.
Clin Perinatol. 2013;40(3):385-398.
CHAPMAN E, REVEIZ L, ILLANES E, et al. Antibiotic regimens for management of intra-amniotic
infection. Cochrane Database Syst Rev. 2014;(12):CD010976.
ROUSE DJ, LANDON M, LEVENO KJ, et al. The Maternal-Fetal Medicine Units cesarean registry:
Chorioamnionitis at term and its duration relationship to outcomes. Am J Obstet Gynecol.
2004;191(1):211-216.
TRABALHO DE PARTO ESTACIONÁRIO 82
DIOGO A YRES DE C AMPOS
INTRODUÇÃO
Define-se trabalho de parto estacionário como aquele em que as contrações
uterinas não condicionam as expectáveis alterações cervicais e/ou a descida da
apresentação fetal. As causas do trabalho de parto estacionário são classica-
mente divididas em mecânicas e dinâmicas. No entanto, as causas mecânicas
condicionam frequentemente também alterações da dinâmica uterina, pelo que
se trata de uma divisão artificial e clinicamente pouco útil. É mais útil identificar
causas inultrapassáveis (que condicionam a necessidade de realização de uma
cesariana) entre as quais se contam: situação transversa, apresentação de face
com mento posterior, apresentação de fronte persistente, suspeita de incom-
patibilidade feto-pélvica, tumefações pélvicas e vulvovaginais que impedem a
progressão da apresentação. Existem também causas potencialmente ultrapas-
sáveis, que podem beneficiar com a aceleração ocitócica do trabalho de parto,
entre as quais se contam as variedades posteriores persistentes e a hipotonia
uterina. Por vezes não se encontra nenhuma causa para o trabalho de parto
estacionário e, nestas situações, deve geralmente ser tentada a aceleração do
trabalho de parto. O trabalho de parto estacionário está associado a maior risco
de corioamnionite, infeção neonatal e, em casos extremos, de fístula obstétrica
(vesicovaginal), os quais são proporcionais à duração do trabalho de parto. Em
muitos hospitais, o trabalho de parto estacionário é o principal motivo de ce-
sariana e de parto vaginal instrumentado, os quais condicionam também riscos
aumentados de complicações de saúde para a puérpera e recém-nascido (RN).
ORIENTAÇÃO CLÍNICA
Os critérios para estabelecer o diagnóstico de trabalho de parto estacionário
variam conforme a fase do trabalho de parto em que ocorrem e constam do
Quadro 82.1. Perante o diagnóstico de trabalho de parto estacionário deve ser
procurada uma causa. Caso se identifique uma causa inultrapassável deve ser
proposta uma cesariana. Nas restantes situações está indicada a aceleração
do trabalho de parto (ver protocolo “80. Ocitocina na indução e aceleração
do trabalho de parto”), exceto se já existe contractilidade uterina adequada. A
aceleração do trabalho de parto visa estabelecer a contractilidade uterina ade-
quada, ou seja, uma frequência de 3-4 contrações a cada 10 minutos. A partir
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS, Society for Maternal-Fetal Medicine.
Safe prevention of the primary cesarean delivery. Am J Obstet Gynecol. 2014;210(3):179-
-193.
NATIONAL INSTITUTE FOR CLINICAL EXCELLENCE . Intrapartum care for healthy women and ba-
bies. 2014.
CARDIOTOCOGRAFIA – INTERPRETAÇÃO 83
CATARINA REIS DE CARVALHO , DIOGO AYRES DE C AMPOS
INTRODUÇÃO
A cardiotocografia (CTG) avalia indiretamente o estado de oxigenação fetal atra-
vés do estudo da frequência cardíaca fetal (FCF) e da contractilidade uterina.
Os mecanismos fisiológicos subjacentes à interpretação da CTG são iguais no
anteparto e no intraparto. Vários fatores, incluindo a idade gestacional,a
patologia fetal e a medicação administrada à grávida podem afetar a FCF,
pelo que a análise da CTG necessita sempre de ser integrada com a restante
informação clínica.
INTERPRETAÇÃO
A análise da CTG começa com a avaliação das características básicas, seguida
da classificação.
Variabilidade
Descreve as oscilações da FCF, definindo-se como a largura de banda média
em segmentos de 1 minuto.
Variabilidade normal: largura de banda de 5-25 bpm.
Variabilidade reduzida: largura de banda <5 bpm durante >50 minutos em seg-
mentos de linha de base ou durante >3 minutos em segmentos correspondentes
a desacelerações. Pode ocorrer devido a hipoxia do sistema nervoso central (SNC),
com consequente redução da atividade simpática e parassimpática, mas também
se pode associar a lesão cerebral prévia, infeção, administração de depressores
do SNC ou de bloqueadores parassimpáticos. Durante o sono profundo, a
variabilidade situa-se geralmente no limiar inferior da normalidade, mas
raramente é <5 bpm ou dura >50 minutos. Existe alguma subjetividade na
avaliação visual deste parâmetro.
Variabilidade aumentada (padrão saltatório): largura de banda >25 bpm durante
>30 minutos. Pode coincidir com desacelerações recorrentes e estar associa-
da a hipoxia de rápida evolução. A fisiopatologia é ainda mal conhecida, mas
pensa-se ser causada por instabilidade do sistema autónomo.
Acelerações
Subidas abruptas da FCF (do início ao pico em <30 segundos) acima da linha
de base, com >15 bpm de amplitude e duração >15 segundos mas <10 minu-
tos. A maioria coincide com movimentos fetais e são sinal de uma adequada
resposta neurológica fetal e da ausência de hipoxia. Antes das 32 semanas,
a amplitude e duração das acelerações pode ser menor (10 bpm de amplitude
e 10 segundos de duração). Após as 32-34 semanas, com o estabelecimento
dos estados comportamentais (ver “Estados comportamentais fetais”, à frente
neste capítulo), as acelerações raramente ocorrem durante períodos de sono
profundo, os quais podem durar até 50 minutos. A ausência de acelerações
no intraparto, estando as restantes características normais, não traduz hipoxia
fetal. As acelerações coincidentes com contrações uterinas, especialmente no
segundo estádio do trabalho de parto, sugerem um registo inadvertido da fre-
quência cardíaca materna (FCM), uma vez que a FCF geralmente desacelera com
as contrações e os esforços expulsivos maternos, enquanto a FCM aumenta.
Desacelerações
Descidas da FCF abaixo da linha de base, com >15 bpm de amplitude e dura-
ção >15 segundos.
Desacelerações precoces: pouco profundas, de curta duração, com variabilidade
normal na desaceleração e coincidentes com as contrações. Pensa-se serem
causadas por compressão da cabeça fetal e não traduzem hipoxia.
Desacelerações variáveis (em forma de V): exibem uma diminuição rápida da
FCF (início até nadir em <30 segundos), boa variabilidade na desaceleração,
retorno rápido à linha de base, sendo ainda variáveis no tamanho, forma e relação
com as contrações uterinas. Constituem a maioria das desacelerações durante o
trabalho de parto e traduzem uma resposta barorrecetora ao aumen- to da tensão
arterial, em consequência de compressão transitória do cordão umbilical.
Raramente estão associadas a graus importantes de hipoxia fetal.
Cardiotocografia – Interpretação 297
Padrão sinusoidal
Padrão suave e ondulante, semelhante a uma onda sinusoidal, com amplitude
de 5-15 bpm e frequência de 3-5 ciclos/minuto. Deve ser valorizado se tiver
duração >30 minutos e não apresentar acelerações. A base fisiopatológica deste
padrão é mal compreendida, mas sabe-se que se associa a anemia fetal grave,
estando também descrito em situações de hipoxia fetal aguda, infeção,
malformações cardíacas, hidrocefalia e gastrosquisis.
Padrão pseudossinusoidal
Semelhante ao sinusoidal, mas com forma em “dentes de serra”, sendo a
ondulação menos suave e arredondada. A duração raramente é >30 minutos e
é antecedido e sucedido por um padrão normal. Encontra-se associado à ad-
ministração de analgésicos, a períodos de sucção e outros movimentos bucais
do feto. O padrão pseudossinusoidal pode ser difícil de distinguir do sinusoidal,
sendo o caráter temporário do primeiro o fator mais discriminante.
Contrações uterinas
Traduzem-se por um aumento gradual da atividade uterina, seguido de uma di-
minuição aproximadamente simétrica, em forma de sino, com 45-120 segundos
de duração. As contrações podem comprimir os vasos que correm na espes-
sura do miométrio e diminuir transitoriamente a perfusão placentária, podendo
298 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Classificação da CTG
Requer a avaliação prévia das características básicas da CTG (ver “Avaliação das
características básicas da CTG”). Os traçados são classificados em normais,
suspeitos e patológicos, de acordo com os critérios apresentados na Tabela
83.1. Tendo em conta a dinâmica dos sinais da CTG durante o trabalho de parto,
a reavaliação dos traçados deve realizar-se pelo menos a cada 30 minutos.
BIBLIOGRAFIA
AYRES- DE -C AMPOS D, SPONG CY, C HANDRAHARAN E; FIGO I NTRAPARTUM F ETAL MONITORING EXPERT
CONSENSUS PANEL. FIGO consensos guidelines on intrapartum fetal monitoring: Cardiotoco-
graphy. Int J Gynaecol Obstet. 2015;131(1):13-24.
HIPOXIA FETAL E TOCÓLISE AGUDA 84
DIOGO AYRES DE C AMPOS , C ATARINA REIS DE C ARVALHO
INTRODUÇÃO
Entende-se por hipoxia fetal a diminuição da concentração de oxigénio nos tecidos
fetais, sendo um diagnóstico primordialmente cardiotocográfico. Está associada a
elevado risco de morte perinatal ou de sequelas neurológicas permanentes. Pode
ocorrer ao longo de dias ou semanas (hipoxia crónica), ao longo de horas
(hipoxia subaguda) ou em poucos minutos (hipoxia aguda). Na hipoxia crónica,
desaparecem as acelerações e a variabilidade é reduzida, podendo ocorrer
desacelerações tardias se existirem contrações. A hipoxia subaguda manifesta-
se por desacelerações repetitivas que evoluem para desa- celerações tardias com
baixa variabilidade. A hipoxia aguda manifesta-se por uma desaceleração
prolongada com baixa variabilidade.
HIPOXIA CRÓNICA
Esta situação cursa geralmente com alterações ecográficas como: oligoâmnios,
restrição de crescimento fetal (RCF) e alterações fluxométricas. O feto não tem
a capacidade de suportar o stress adicional causado pelas contrações uterinas do
trabalho de parto, sendo necessário considerar o parto por cesariana.
Causas reversíveis
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Causas irreversíveis
■ Prolapso do cordão umbilical: detetável por exame vaginal (ver protocolo “100.
Prolapso do cordão umbilical”);
■ Descolamento major da placenta: pode manifestar-se por hemorragia vaginal,
mas por vezes esta ocorre apenas após elevação da apresentação ou após
o parto. É frequente ocorrer dor abdominal aguda contínua, mas esta pode estar
mascarada pela analgesia locorregional. A taquissistolia é frequente em
pequenos descolamentos, mas no descolamento major a contractilidadeé
irregular e ineficiente, predispondo a atonia uterina pós-parto. Perante a
suspeita, o parto deve ser imediato, com monitorização dos sinais vitais,
saturação de oxigénio e eletrocardiograma (ECG) maternos. Cateterizar veia
periférica com cateter de 16G e colher sangue para hemograma, tipagem e
estudo da coagulação;
Hipoxia Fetal e Tocólise Aguda 301
■ Rotura uterina: causa hipoxia fetal em cerca de 30% dos casos, por desco-
lamento concomitante da placenta e por hemorragia materna. Manifesta-se
geralmente por dor abdominal contínua ou à palpação dos quadrantes infe-
riores do abdómen, mas pode estar mascarada pela analgesia locorregional.
Ocorre hemorragia vaginal em cerca de 10% dos casos. A subida da apre-
sentação é muito sugestiva do diagnóstico, mas é um achado infrequente.
A contractilidade geralmente desaparece. Perante a suspeita deve proceder-se
a cesariana emergente. Cateterizar veia periférica com cateter 16G e colher
sangue para hemograma, tipagem e estudo da coagulação. Na cirurgia, pro-
ceder a reparação cirúrgica em dupla camada, com poliglactina-910 (Vicryl®
1) ou poliglecaprone 25 (Monocryl® 1). Quando a reparação não é possível
ou quando a puérpera está hemodinamicamente instável, considerar a histe-
rectomia periparto;
■ Hemorragia fetal: pode ocorrer por hemorragia feto-materna ou rotura de vasa
previa. A morbilidade associada depende da idade gestacional e do volume
da hemorragia, mas é frequente ocorrer hipoxia quando excede 20 ml/kg. Na
CTG ocorre frequentemente um padrão sinusoidal, por vezes com taquicardia
na fase aguda da hemorragia e com desacelerações tardias ou prolongadas
em fases mais avançadas:
– Hemorragia feto-materna: pode ocorrer após traumatismo abdominal, des-
colamento placentário, versão cefálica externa (VCE) e corangioma, mas na
maioria dos casos não tem causa identificável. O diagnóstico é retrospetivo,
com a documentação de anemia no recém-nascido (RN) e positividade do
teste de Kleihauer-Betke;
– Rotura de vasa previa: ocorre geralmente hemorragia vaginal na altura da
rotura de membranas. Quando não existe diagnóstico pré-natal de vasa
previa a mortalidade fetal ronda os 60%;
■ Complicações respiratórias e cardiovasculares maternas [asma aguda, cho- que
hemorrágico, paragem cardiorrespiratória, tromboembolismo, embolia do líquido
amniótico (LA), etc.]: variam quanto à gravidade, reversibilidade e ritmo de
reversão, o qual pode ou não ser compatível com uma atitude expectante face
à hipoxia fetal. O tratamento destas situações sai fora do âmbito do presente
protocolo.
BIBLIOGRAFIA
AYRES- DE -C AMPOS D, A RULKUMARAN S; FIGO INTRAPARTUM F ETAL M ONITORING EXPERT C ONSENSUS
PANEL. FIGO consensus guidelines on intrapartum fetal monitoring: Physiology of fetal
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AYRES- DE -C AMPOS D, SPONG CY, C HANDRAHARAN E; FIGO I NTRAPARTUM F ETAL MONITORING EXPERT
CONSENSUS PANEL. FIGO consensus guidelines on intrapartum fetal monitoring: Cardiotoco-
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CHANDRAHARAN E, Arulkumaran S. Acute tocolysis. Curr Opin Obstet Gynecol. 2005;17(2):151-
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labor: a review. Obstet Gynecol Surv. 2008;63(6):383-388.
PARTO INSTRUMENTADO 85
M ARIA PULIDO VALENTE, M ARIA DE CARVALHO AFONSO
INTRODUÇÃO
O parto instrumentado tem por objetivo abreviar o 2.º período do trabalho de
parto e inclui o parto auxiliado por ventosa e por fórceps. As principais indi-
cações para a realização de um parto instrumentado são: estado fetal não
tranquilizador, 2.º período do trabalho de parto com fase ativa estacionária (pa-
ragem na descida da apresentação), 2.º período do trabalho de parto com fase
ativa prolongada, contraindicação para esforços expulsivos maternos e exaustão
materna. As contraindicações para a realização de um parto instrumentado
são: suspeita de incompatibilidade feto-pélvica, doença desmineralizante fetal e
suspeita de coagulopatia fetal. Para a realização de um parto instrumentado é
ainda necessário que estejam asseguradas as seguintes condições de seguran- ça:
apresentação cefálica, conhecimento da posição/variedade da apresentação,
apresentação encravada, dilatação cervical completa, membranas rotas, bexiga
vazia, canal de parto parecendo compatível com feto e capacidade para realizar
uma cesariana emergente. Antes de se instrumentar um parto é necessário:
realizar um exame vaginal para confirmar as condições de segurança, colocar
a parturiente em posição de litotomia, proceder a desinfeção vulvar e perineal,
assegurar o esvaziamento vesical e garantir uma analgesia adequada. Deve ser
solicitado um consentimento informado oral.
VENTOSA
A ventosa só deve ser aplicada em apresentações cefálicas de vértice e em
fetos com ≥34 semanas. Excecionalmente, poderá ser considerada quando a
dilatação cervical é de 8-9 cm.
Técnica de aplicação
■ Colocar a campânula da ventosa sobre o ponto de flexão (na linha média,
~3 cm à frente da fontanela posterior);
■ Aplicar ligeira pressão de vácuo (0,2 kg/m2 ) para fixar a campânula;
■ Confirmar a inexistência de tecidos maternos interpostos entre a apresenta-
ção e a campânula;
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
FÓRCEPS
O fórceps de Simpson é utilizado em apresentações cefálicas de vértice com
variedades anteriores ou posteriores. O fórceps de Kielland é utilizado em
apresentações cefálicas de vértice com variedades transversas ou posteriores que
necessitem de rotação. O fórceps de Simpson pode ainda ser utilizado em
apresentações de face com mento anterior (ver “Fórceps de Simpson em apre-
sentações de face com o mento anterior”, à frente neste capítulo). O fórceps
de Piper é utilizado na retenção de cabeça última, estando fora do âmbito
deste protocolo. O fórceps pode ser utilizado em fetos com idade gestacional
<34 semanas.
Técnica de aplicação
Fórceps de Simpson em variedades anteriores ou posteriores
■ Testar a articulação do fórceps antes da aplicação;
■ Lubrificar a parte exterior das colheres;
■ Inserir uma colher com suavidade e sem forçar, guiada por dois dedos da
mão contralateral;
■ A primeira colher a introduzir é sempre a posterior (Quadro 85.1);
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Operative vaginal delivery. Practice
Bulletin No. 154. Obstet Gynecol. 2015;126(5):356-365. Reaffirmed 2018.
GRAçA LM. Fórceps. In LM Graça, Medicina Materno-Fetal, 5.ª ed. Lisboa: Lidel, 2017.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
GRAçA LM. Ventosa obstétrica. In LM Graça, Medicina Materno-Fetal, 5.ª ed. Lisboa: Lidel,
2017.
86 PARTO PÉLVICO VAGINAL E RETENÇÃO DE
CABEÇA ÚLTIMA
INTRODUÇÃO
A possibilidade de um parto pélvico vaginal deve ser colocada às grávidas com
feto em apresentação pélvica, após as 35 semanas de gravidez ou quando em
trabalho de parto, desde que estejam reunidas as seguintes condições de
segurança: estimativa de peso fetal (EPF) entre 2 000-3 500 g, modo nádegas,
ausência de procidência do cordão umbilical, canal de parto parecendo adequa-
do, sem hiperextensão da cabeça fetal e sem outra indicação para cesariana.
Embora o risco absoluto de morbilidade neonatal grave associada ao parto pélvico
vaginal seja de 0,002%, comparativamente com 0,0005% na cesariana
programada, vários estudos indicam riscos semelhantes quando se selecionam
os casos a submeter a tentativa de parto vaginal. Nestas situações, a indução
do trabalho de parto não está contraindicada.
2. º período
Devem estar presentes dois obstetras, pelo menos um dos quais experiente
em parto pélvico vaginal, e um anestesiologista para a eventual necessidade
de relaxamento uterino. Assegurar que a bexiga materna está vazia, que há
uma veia canalizada e que na sala existe um fórceps de Piper e uma com-
pressa grande. A fase latente do 2.º período pode durar até 90 minutos e a
fase ativa até 60 minutos, devendo a cesariana ser considerada quando se
ultrapassam estes limites temporais. A parturiente só deve ser estimulada a
realizar esforços expulsivos se a apresentação se encontrar no estádio +3 ou
abaixo. Preconiza-se a menor manipulação fetal possível, permitindo sempre
que possível o parto pélvico espontâneo. A pelve fetal não deve ser tracionada,
pelo risco de extensão dos membros superiores e da cabeça. O parto pélvico
assistido, utilizando as manobras descritas em “Exteriorização da pelve e dos
membros inferiores”, “Exteriorização dos ombros” e “Exteriorização da cabeça”, está
indicado apenas quando o feto apresenta diminuição do tónus corporal,
Parto Pélvico Vaginal e Retenção de Cabeça Última 307
Exteriorização da cabeça
Com os esforços expulsivos maternos e a pressão suprapúbica, geralmente ocorre
a exteriorização espontânea da cabeça. Quando tal não acontece, deve ser usada
a manobra de Mauriceau-Smellie-Veit (Figura 86.4). O ajudante mantéma pressão
suprapúbica e o executante coloca o corpo do feto sobre o seu ante- braço, com
o dedo médio e indicador da mão no lábio superior, para promover a flexão da
cabeça. Os dedos indicador e anelar da mão contralateral colocam-se sobre os
ombros fetais e o dedo médio sobre a nuca, este último também para promover
a flexão da cabeça. Tracionam-se os ombros para baixo, até se ob- servar a nuca
fetal, e depois o corpo é elevado lentamente e rodado à volta da sínfise púbica
materna, na direção do abdómen materno. Devem evitar-se trações bruscas e força
excessiva, bem como a hiperextensão exagerada da coluna.
Situações de exceção
Quando não é possível extrair a cabeça fetal com a manobra anteriormente referi-
da, existem alguns procedimentos que necessitam de ser decididos rapidamente:
■ Em fetos prematuros, o corpo pode exteriorizar-se sem ter havido dilatação total
do colo, o que pode ser a causa da retenção da cabeça. Nestas si- tuações
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
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KOTASKA A, M ENTICOGLOU S, GAGNON R. Vaginal delivery of breech presentation. J Obstet
Gynaecol Can. 2009;31(6):557-566.
INTRODUÇÃO
Os partos de gestações múltiplas têm maior risco de complicações, nomeada-
mente: apresentação fetal anómala, prolapso do cordão umbilical, descolamento
da placenta, hipoxia fetal e hemorragia pós-parto. Numa gravidez gemelar em que
ambos os fetos estão em apresentação cefálica, o parto pode ocorrer por via
vaginal em qualquer idade gestacional e com qualquer estimativa de peso fetal
(EPF) (desde que o segundo não seja ≥20% maior do que o primeiro). Constituem
indicações para cesariana: gémeos siameses, gravidez gemelar monoamniótica
viável, primeiro feto em apresentação pélvica ou transverso, segundo feto pélvico
com hiperextensão da cabeça, segundo feto com estimativa de peso superior
ao primeiro em pelo menos 500 g ou 20% do peso, segundo gémeo pélvico
ou transverso com estimativa de peso <1 500 g, gravidez viável com ≥3 fetos.
A maturação cervical e a indução do trabalho de parto não estão contraindica-
das. Antecedentes de uma cesariana não constituem indicação absoluta para nova
cesariana. A decisão da via de parto na gravidez múltipla deve, sempreque
possível, ser definida durante a consulta pré-natal.
ABORDAGEM CLÍNICA
Na admissão ao trabalho de parto devem ser solicitados: hemograma, estudo
da coagulação com fibrinogénio e tipagem. Deve também ser realizada uma
ecografia para identificar as apresentações fetais, estimar pesos fetais e líqui- do
amniótico (LA) (caso não exista uma avaliação recente). Deve ser realizada
cardiotocografia (CTG) com monitorização interna do primeiro feto logo que
seja possível (se não houver contraindicações). Incentivar a opção materna por
analgesia epidural, para facilitar eventuais manobras obstétricas. A aceleração
do trabalho de parto com ocitocina e a amniotomia não estão contraindicadas.
Período expulsivo
Devem estar presentes na sala um obstetra com experiência em parto gemelar
e pelo menos um enfermeiro especialista. Anestesiologista e neonatologista
devem estar avisados e rapidamente disponíveis no local. O parto do primeiro feto
faz-se segundo os cuidados habituais. Junto da sala deve estar um ecógrafo para
avaliação do segundo feto, após o nascimento do primeiro.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
externas para uma situação longitudinal, mas a versão cefálica externa (VCE)
de fetos pélvicos está contraindicada, por se associar a maior risco de hipoxia
fetal. Assegurar CTG externa com boa qualidade de sinal. Realizar exame vaginal
para avaliar a descida da apresentação, integridade da bolsa amniótica e excluir
prolapso/procidência do cordão.
Se CTG normal: iniciar perfusão de ocitocina (ver protocolo “74. Indução do
trabalho de parto e maturação cervical”). Realizar amniotomia da segunda bolsa
logo que esteja estabelecida contractilidade regular e a apresentação esteja
bem-adaptada ao colo e proceder a um parto cefálico ou pélvico de rotina. Não
existe consenso sobre o tempo máximo de latência entre o nascimento dos
dois fetos, mas parece ser seguro aguardar 30-60 minutos. Longos intervalos
de latência associam-se a “retrocesso da dilatação”, dificultando ou mesmo
impedindo as manobras obstétricas descritas em “Versão podálica interna” e
“Grande extração pélvica”.
Se CTG suspeita/patológica, procidência/prolapso do cordão, apresentação
pélvica modo joelhos/pés ou latência >60 minutos, ponderar as alternativas
na apresentação cefálica: versão podálica interna e grande extração pélvica (ver
“Versão podálica interna” abaixo e “Grande extração pélvica”, à frente neste
capítulo), parto instrumental (incluindo ventosa de aplicação alta) ou cesariana
emergente. A escolha depende das alterações da CTG, das condições locais
para um parto vaginal e da experiência do operador. Na apresentação pélvica
as alternativas são: grande extração pélvica (ver “Grande extração pélvica”, à
frente neste capítulo) ou cesariana emergente.
BIBLIOGRAFIA
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CESARIANA 88
S USANA SANTO , D IOGO AYRES DE CAMPOS
INTRODUÇÃO
O presente protocolo descreve os principais cuidados pré-operatórios, intraope-
ratórios e pós-operatórios imediatos a adotar na realização de uma cesariana.
Análises pré-operatórias
Perante história prévia de hemorragia pós-parto major, multípara com >4 partos,
cesariana iterativa, gravidez múltipla, útero miomatoso, anemia [Hb <9 g/dlou
hematócito (Hct) <30%], IMC >35, para além das análises de rotina na gravidez,
pedir previamente à cirurgia: hemograma, estudo da coagulação com fibrinogénio
e tipagem.
PREPARAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
TÉCNICA CIRÚRGICA
■Abertura da parede abdominal: incisão de Pfannenstiel na pele (exceto se
cicatriz mediana anterior). Abertura com bisturi do tecido celular subcutâneo
na linha média, em bisel direcionado ao retalho superior. Abertura da apo-
nevrose dos retos abdominais com bisturi, 2 cm para cada lado da linha
média. Extensão digital lateral da abertura do tecido celular subcutâneo e da
aponevrose. Separação digital da aponevrose dos retos abdominais. Quando
a abertura da aponevrose é efetuada ao nível dos músculos piramidais pode
ser necessária a disseção com tesoura na linha média. Exploração digital e
abertura do espaço entre os retos abdominais. Abertura digital do peritoneu
parietal na parte superior. Colocação opcional de valva suprapúbica;
■Abertura do útero: incisão mediana transversal com bisturi no segmento in-
ferior (cerca de 2 cm acima da reflexão da bexiga), envolvendo o peritoneu e
as fibras superficiais do miométrio subjacente. Havendo aderências da bexiga
ao útero poder ser necessário abrir primeiro o peritoneu uterino e rebater a
bexiga antes de abrir o miométrio. Abertura das restantes fibras musculares e
membranas fetais na linha média com pinça de Kelly. Extensão digital lateral
da abertura do miométrio, podendo ser necessário completar com tesoura;
■Extração fetal: se necessário ajudada com ventosa ou fórceps;
■Profilaxia da hemorragia pós-parto (logo a seguir à extração fetal): ocitocina
10 UI em bólus EV lento (ao longo de 1-2 minutos) seguido de ocitocina 5
UI em 500 ml de SF em bomba perfusora a 500 ml/hora (a realizar pelo
enfermeiro de Anestesia);
■Laqueação e corte do cordão umbilical: aos 1-2 minutos, exceto se houver
necessidade de reanimação neonatal;
■Extração da placenta: por massagem transabdominal e tração do cordão,
sem dequitadura artificial. Revisão uterina interna manual;
■ Encerramento uterino: exteriorização opcional do corpo uterino da cavida-
BIBLIOGRAFIA
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GASIMETRIA UMBILICAL 89
CATARINA REIS DE CARVALHO , DIOGO AYRES DE C AMPOS
INTRODUÇÃO
A informação proporcionada pela gasimetria umbilical é um elemento essencial
para o estabelecimento ou exclusão do diagnóstico de hipoxia fetal intraparto.
Esta informação pode ter importantes implicações médico-legais e é um auxi- liar
precioso na interpretação dos métodos de monitorização fetal intraparto.
Recomenda-se a realização de gasimetria umbilical nas seguintes situações:
■ Intervenções obstétricas por “estado fetal não tranquilizador” (cesariana, parto
instrumentado);
■ Recém-nascidos (RN) com índice de Apgar <4 ao primeiro minuto ou <7 ao
quinto minuto;
■ Diagnóstico antenatal de restrição de crescimento fetal (RCF);
■ Distocia de ombros, parto pélvico vaginal, parto gemelar vaginal;
■ Suspeita de corioamnionite.
METODOLOGIA DE COLHEITA
■ Colher sangue do cordão umbilical o mais precocemente possível após o
nascimento (intervalo máximo de 10 minutos);
■ Não é necessária a clampagem prévia do cordão para realizar a colheita;
■ Retirar cerca de 2 ml de sangue arterial para uma seringa previamente hepa-
rinizada e cerca de 2 ml de sangue venoso para outra seringa previamente
heparinizada. Assegurar que há contacto do sangue com a heparina localizada
no êmbolo. Expulsar o ar residual das seringas e proteger as agulhas;
■ Caso, subsequentemente, ocorra hemorragia do local de colheita, aplicar pres-
são leve e sustentada até parar;
■ Análise laboratorial num intervalo máximo de 30 minutos após a colheita
(transporte efetuado por assistente operacional).
BIBLIOGRAFIA
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LACERAÇÕES PERINEAIS 90
SARA RODRIGUES PEREIRA , S USANA S ANTO
INTRODUÇÃO
As lacerações perineais que ocorrem durante o parto classificam-se de acor-
do com o Quadro 90.1. As de grau III e IV são clinicamente mais relevantes,
têm uma incidência de ~0,5% e podem associar-se a incontinência para fezes
e gases, fístula retovaginal, dor perineal e disfunção sexual. São fatores derisco
para laceração perineal: nuliparidade, etnia asiática, parto instrumental,
variedades posteriores, antecedentes de laceração perineal e macrossomia.
A avaliação sistemática da integridade do esfíncter anal faz parte dos cuidados
de rotina após o parto (ver protocolo “75. Cuidados de rotina durante o trabalho
de parto”). Perante suspeita de laceração do esfíncter anal, deve ser realizada
observação na presença de um médico especialista, com iluminação adequada,
após limpeza e desinfeção, sob analgesia apropriada, a fim de classificar otipo
de laceração. O vértice da laceração deve ser identificado e verificada a
integridade dos esfíncteres anais. O esfíncter anal interno (músculo liso) tem
coloração rosa claro; o esfíncter anal externo (músculo estriado) é vermelho
escuro e geralmente encontra-se em contração tónica, pelo que os topos estão
retraídos, podendo ser mais difícil a sua identificação.
ABORDAGEM CLÍNICA
Laceração de grau I
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Laceração de grau II
Realizar sutura contínua da mucosa vaginal com poliglatina 910 (Vicryl rapid®)
2/0, iniciando-se 1 cm atrás do vértice e terminando a nível da fúrcula. Suturar
os planos musculares preferencialmente com sutura contínua com poliglactina
(Vicryl rapid®) 0 ou 2/0, evitando tração excessiva. Encerrar a pele com sutura
intradérmica ou pontos separados usando poliglactina (Vicryl rapid®) 2/0. Se a
laceração estiver na proximidade ou envolver o meato uretral, deve algaliar-se
durante 24 horas, a fim de evitar retenção urinária aguda devida ao edema.
Figura 90.1 – Sutura do esfíncter anal externo com sobreposição dos topos.
(Fonte: ver final do capítulo)
Lacerações Perineais 323
Laceração de grau IV
Sutura contínua da submucosa com poliglatina 910 (Vicryl®) 3/0 ou 4/0 (Figura
90.2). Uma vez completado este passo, proceder como especificado anterior-
mente na reparação de lacerações de grau III.
BIBLIOGRAFIA
AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. Prevention and management
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ROYAL COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS. The management of third and fourth-
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
INTRODUÇÃO
O exame anátomo-patológico da placenta fornece frequentemente informações
importantes sobre a ocorrência de patologia materna e fetal, podendo confirmar
um diagnóstico clínico já equacionado ou revelar uma etiologia previamente
desconhecida. Pode ainda fornecer informações importantes em situações de
litígio médico-legal ou de doenças com implicações em gestações futuras.
INDICAÇÕES
Condições maternas
■ Aborto após as 20 semanas;
■ Febre materna ou suspeita de corioamnionite;
■ Doença hipertensiva [hipertensão arterial (HTA) crónica, hipertensão gestacio-
nal, pré-eclâmpsia ou eclâmpsia];
■ Diabetes mellitus pré-gestacional ou gestacional;
■ Coagulopatia materna;
■ Antecedentes recentes de utilização de substâncias de abuso;
■ Isoimunização Rh;
■ Suspeita de descolamento prematuro da placenta;
■ Hemorragia importante do 3.º trimestre;
■ Suspeita de acretismo placentário;
■ Rotura de membranas com duração >24 horas.
BIBLIOGRAFIA
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© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
92 ACRETISMO PLACENTÁRIO
INTRODUÇÃO
Entende-se por acretismo placentário o espectro de alterações de aderência da
placenta à parede uterina que cursam com invasão vilositária anómala. Con-
soante o grau de invasão classifica-se em: placenta acreta ou aderente (~79% dos
casos) em que as vilosidades coriónicas se encontram ancoradas na super- fície do
miométrio; placenta increta (~14% dos casos) em que as vilosidades coriónicas
invadem o miométrio; placenta percreta (~7% dos casos) em que as vilosidades
coriónicas atingem a serosa uterina, por vezes invadindo órgãos pélvicos
adjacentes (mais frequentemente a bexiga). Quanto à extensão lateral classifica-
se em focal ou extensa. Nesta última situação o grau de aderência é
frequentemente heterogéneo. As principais complicações são a hemorragia pós-
parto, a lesão de órgãos adjacentes, o tromboembolismo venoso (TEV) e a infeção
cirúrgica. A incidência é ~0,05% dos partos e os principais fatores de risco são:
cesariana anterior (incidência proporcional ao número de cesarianas), placenta
prévia, lesão prévia do endométrio (esvaziamento uterino, miomectomia, cirurgia
histeroscópica, dequitadura manual) e endometrite. A abordagem por uma equipa
multidisciplinar experiente (equipa da placenta acreta, constituí- da por
obstetras, anestesiologistas, ginecologistas com experiência cirúrgica,
urologistas, radiologistas de intervenção e imuno-hemoterapeutas) reduz sig-
nificativamente a morbilidade materna. O diagnóstico pré-natal é sobretudo
ecográfico, podendo ser complementado por ressonância magnética nuclear
quando existem dúvidas sobre a extensão do acretismo ou quando há suspeita
de invasão de órgãos adjacentes. Em todas as grávidas com cesariana anterior
ou com placenta prévia, na ecografia das 20-23 semanas deve ser realizada
uma avaliação detalhada dos sinais de acretismo. O diagnóstico pré-natal per-
mite o planeamento do parto pela equipa da placenta acreta, com redução da
morbilidade materna e neonatal.
ABORDAGEM CLÍNICA
Diagnóstico pré-natal de placenta increta/percreta, extensa ou no segmento inferior
Estas situações devem ser orientadas pela equipa da placenta acreta. Programar
cirurgia para as 36 semanas. Propor cesariana seguida de histerectomia total
periparto. Em mulheres com desejo de preservar a fertilidade, pode ser equa-
cionada a possibilidade de realizarem cesariana com placenta deixada in situ
(ver “Cuidados pós-operatórios quando a placenta é deixada in situ”, à frente
neste capítulo). A grávida deve ser internada 2-3 dias antes da data programada
do parto, para realizar os seguintes cuidados pré-operatórios:
■ Correção de eventual anemia;
■ Avaliação por anestesiologista;
Acretismo Placentário 327
Cuidados intraoperatórios
■ Meias de compressão intermitente. Caso não seja possível: meias de con-
tenção elástica (mantidas até à deambulação pós-parto);
■ Antibioterapia profilática (segundo protocolo “88. Cesariana”). Repetição da
dose se a cirurgia durar >3 horas ou se perda hemática estimada for
>1 500 ml;
■ Ponderar cistoscopia e colocação de stents ureterais;
■ Algaliação e considerar a instilação de 100 ml de soro fisiológico (SF) com
azul de metileno na bexiga;
■ Ácido tranexâmico 1 g endovenoso (EV) lento, imediatamente antes do início da
cirurgia;
■ Incisão cutânea de acordo com zona de implantação da placenta (incisão me-
diana infraumbilical, se a implantação anterior da placenta for acima do seg-
mento inferior do útero; nos restantes casos incisão de Pfannenstiel alargada);
■ Ecografia perioperatória para localizar a zona de inserção placentária e incisão
uterina acima desta;
■ Após extração fetal, secção do cordão umbilical junto da inserção placentária;
■ Não administrar uterotónicos após a extração fetal;
■ Não fazer qualquer tentativa de extração e deixar a placenta in situ;
■ Encerramento da histerotomia com hemóstase cuidadosa;
■ Se tiver sido decidido avançar para histerectomia periparto, pode ser neces-
sário dissecar previamente a zona de neovascularização entre o útero e a be-
xiga, bem como realizar uma cistectomia parcial se houver invasão da bexiga.
BIBLIOGRAFIA
INTRODUÇÃO
Os primeiros dias de puerpério em mulheres sem fatores de risco estão associa-
dos a uma incidência muito reduzida de complicações maternas, considerando-se
que a vigilância deste período não carece de avaliação médica de rotina até
à altura da alta. Existe, no entanto, a necessidade de prestação de cuidados
específicos de enfermagem e da resolução de complicações minor, que são
relativamente frequentes e que estão considerados neste protocolo. Os cuidados
de rotina alteram-se por ordem médica sempre que ocorrerem complicações.
Cuidados gerais
■ Alimentação: dieta geral a partir das 2 horas após o parto;
■ Mobilização: até à realização do primeiro levante deve ser estimulada a mobili-
zação dos membros inferiores. Primeiro levante logo que a puérpera o desejar,
na presença de um enfermeiro. Deve ser encorajado nas primeiras 6 horas;
■ Cuidados perineais (a cargo da puérpera, a primeira vez com o apoio de um
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
enfermeiro): 2 vez/dia e sempre que necessário, com água tépida e gel de ba-
nho com pH neutro. Manter a região seca e mudar frequentemente de penso;
■ Banho: encorajar o banho de chuveiro após o primeiro levante. A primeira
vez deverá ser sob supervisão de um enfermeiro ou assistente operacional;
■ Outros: incentivar a utilização de um soutien apropriado para amamentação. Se
a puérpera entender que uma cinta abdominal lhe proporciona mais conforto,
realçar que deve ser de faixa.
334 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Medicação
■ Cólicas uterinas durante ou após a mamada: paracetamol 1 g per os (PO)
em SOS de 8/8 horas;
■ Se tiver episiorrafia/laceração perineal: paracetamol 1 g PO de 8/8 horas,
alternando com ibuprofeno 400 mg PO de 8/8 horas em SOS; gelo local durante
10-15 minutos 4-6 aplicações/dia.
Cuidados gerais
■ Alimentação: dieta líquida a partir das 2 horas pós-parto se anestesia lo-
corregional, 6 horas pós-parto se anestesia geral. Se bem tolerada, passa2
horas depois a dieta ligeira (chá, bolachas, canja com frango, maçã cozida).
Aconselhar mascar pastilha elástica com moderação entre as 6 e as 24 horas
pós-parto, até restabelecer trânsito intestinal. Dieta geral após as 24 horas;
■ Mobilização: até à realização do primeiro levante deve ser estimulada a mobi-
lização dos membros inferiores. Encorajar o primeiro levante para uma cadeira
a partir das 6 horas, na presença de um enfermeiro. Se tolerar bem, levantes
mais frequentes com deambulação progressiva pelo quarto e, posteriormente,
poderá deslocar-se ao quarto de banho;
■ Algália: retirar logo que tolere o levante para a cadeira, salvo indicação mé- dica
em contrário;
■ Cateter epidural: retirar às 24 horas pós-parto, salvo indicação médica em
contrário;
■ Cateter venoso: retirar às 24 horas pós-parto, salvo indicação médica em
contrário;
■ Penso cirúrgico: levantar ao segundo dia pós-operatório ou antes se estiver
repassado. Ao segundo dia, se a cicatrização estiver a decorrer normalmen-
te, independentemente do tipo de sutura da pele realizada, fica sem penso
cirúrgico. Havendo complicações da cicatrização, solicitar avaliação médica;
Cuidados Maternos de Rotina no Puerpério 335
Medicação
■ Soro polietrolítico com glicose a 5% 1 000 ml a correr em 24 horas;
■ Com cateter epidural (primeiras 24 horas): morfina 1 mg de 12/12 horas +
3 ml de soro fisiológico (SF) (3 administrações), paracetamol 1 g endovenoso
(EV) 8/8 horas, cetorolac 10 mg EV 8/8 horas;
■ Sem cateter epidural (primeiras 24 horas): tramadol 100 mg EV de 12/12
horas, paracetamol 1 g EV de 8/8 horas, cetorolac 10 mg EV de 8/8 horas;
droperidol 0,625 mg EV de 8/8 horas; ondansetron 1 mg EV em SOS de
6/6 horas;
■ Após retirar cateter epidural (após primeiras 24 horas): paracetamol 1 g PO
de 8/8 horas, ibuprofeno 400 mg PO de 8/8 horas;
■ Obstipação sintomática/distensão abdominal: lactulose 2 saquetas PO/diaem
SOS, 30 minutos antes do pequeno-almoço e jantar; simeticone 42 mg PO 2
comprimidos (comps.) mastigáveis 2 vez/dia em SOS, após almoço e jantar;
■ Sem eliminação intestinal às 48 horas: 2 microclisteres de citrato de sódio
+ laurilsulfoacetato de sódio 450 mg/5 ml + 45 mg/5 ml.
AMAMENTAÇÃO
Amamentação o mais precocemente possível em horário livre, não existindo um
intervalo fixo entre mamadas. O número diário de mamadas pode variar entre
oito e 12. Não dar aos RN nenhum outro alimento (incluindo líquidos) além do
leite materno, salvo indicação médica em contrário. A mãe deve lavar as mãos
antes de cada mamada. A higiene mamária deve ser feita apenas durante o banho
diário. Observar pelo menos uma mamada 1 vez/turno, validando os sinais de
boa pega, que se caracterizam por: o queixo do bebé fica encostado à mama da
mãe; visualiza-se mais aréola acima da boca do bebé do que por baixo; o lábio
inferior do bebé encontra-se encostado à mama e revirado para fora; ouve-se o
bebé deglutir de forma rítmica. Aconselhamento para a mãe se sentar de forma
confortável e bem apoiada, colocação do bebé com a cabeça alinhada com o resto
do corpo, a barriga do bebé fica a tocar na barriga da mãe. Aconselhar a
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Ingurgitamento mamário
Aplicação local de calor (compressas mornas) 2-3 minutos antes de iniciar a
amamentação. Caso se verifique tensão mamária após o bebé mamar e este ter
ficado satisfeito, drenar manualmente o leite (exemplificar técnica à puérpera). Para
acalmar dor mamária, aplicar compressas frias entre mamadas.
Hemorroidas
Encorajar a autorredução de hemorroidas internas, gelo local durante 10-15 mi-
nutos até ao máximo de 6 aplicações/dia. Se obstipação: lactulose 2 saquetas/
/dia 30 minutos antes do pequeno-almoço e jantar. Tópico anti-hemorroidário:
2 aplicações locais/dia e após as dejeções.
PROPOSTA DE ALTA
■ Entre as 24-48 horas após parto vaginal (a alta deve ser proposta a partir das
24 horas se a puérpera se encontrar clinicamente bem, se estiver confortável
com o apoio ao RN em casa e se o RN tiver alta);
■ Às 48-72 horas após parto por cesariana (a alta deve ser proposta a partir
das 48 horas se a puérpera se encontrar clinicamente bem, se já tiver tido
trânsito intestinal, se a cicatriz operatória estiver bem, se estiver confortável
com o apoio ao RN em casa e se o RN tiver alta). A puérpera deve recorrer ao
Centro de Saúde ou ao médico que vigiou gravidez no 8.º dia pós-cesariana,
10.º dia se índice de massa corporal (IMC) >30 ou diabetes, retirando nessa
altura agrafos ou pontos não absorvíveis, se os houver;
■ Transmitir à puérpera os sinais de alarme e o contacto telefónico do setor
do puerpério (constam do folheto informativo).
BIBLIOGRAFIA
CUNNINGHAM G, LEVENO K, BLOOM S, et al. The Puerperium. In Williams Obstetrics, 24th edition
(pp. 652-665). McGraw Hill, 2015.
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2012.
POLÍTICA DE A LEITAMENTO M ATERNO HSM-CHLN – Recertificação Hospital Amigo dos Bebés
da UNICEF/OMS.
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94 COMPLICAÇÕES DA AMAMENTAÇÃO
INTRODUÇÃO
As complicações da amamentação resultam frequentemente em ansiedade e mal-
estar materno, podendo condicionar uma experiência negativa ou mesmo a
suspensão precoce do aleitamento. No entanto, a maioria destas situaçõesé
facilmente ultrapassada com cuidados simples de implementar, sem neces- sidade
de interromper a amamentação. A mastite e o abcesso mamário são considerados
complicações graves, sendo abordados em protocolo específico.
HIPOGALACTIA
Constitui uma causa frequente de suspensão precoce da amamentação. A puér-
pera geralmente levanta a suspeita e o recém-nascido (RN) pode exibir hipoglice-
mia, baixo débito urinário, trânsito intestinal reduzido e má progressão ponderal.
Deve-se a uma produção insuficiente ou à dificuldade na extração do leite A
etiologia é habitualmente identificada pela história clínica e pela observação da
amamentação. A produção insuficiente de leite pode ser consequência de um
esvaziamento mamário incompleto ou pouco frequente, de um desenvolvimento
mamário insuficiente (constitucional, cirúrgico, por irradiação mamária prévia,
hiperandrogenismo, prolactinoma), atraso na lactogénese (p. ex., obesidade,
resistência à insulina, síndrome do ovário poliquístico, restos placentários, sín-
drome de Sheehan) ou iatrogénica [p. ex., inibidores seletivos de recaptação da
serotonina (ISRS), bromocriptina, descongestionantes, estrogénios]. A dificuldade na
extração de leite pode ser devida a uma separação precoce mãe-bebé, utiliza- ção
de leite artificial, técnica de amamentação incorreta ou mamada infrequente (p.
ex., RN com sonolência, anomalias neurológicas, malformações orofaciais,
prematuridade, freio lingual curto). A abordagem destas situações assenta no
ensino de uma técnica correta de amamentação e, quando não existe alternativa,
na suplementação com leite artificial. A expressão manual após cada mamada
e a utilização de bombas extratoras geralmente aumenta a produção de leite. Não
está recomendada a utilização de métodos farmacológicos na tentativa de
aumentar a produção de leite materno.
DOR MAMILAR
A sensibilidade mamilar durante a amamentação é um fenómeno normal, so-
bretudo nos primeiros dias e no primeiro minuto de cada mamada. Tende a
atenuar depois do quarto dia e a desaparecer por volta do sétimo dia. Em caso de
desconforto muito intenso, a puérpera pode tomar paracetamol 1 g per os (PO)
antes da amamentação. Deve ser distinguida da dor mamilar persistente durante
a mamada. Esta deve-se geralmente a lesões traumáticas (fissuras), doenças
dermatológicas, vasoconstrição mamilar ou infeção local. É importante
Complicações da Amamentação 339
Fissuras mamilares
Geralmente causam dor mamilar intensa que se prolonga para além da primeira
semana. Podem ocorrer por uma técnica de amamentação incorreta ou quando os
RN apresentam anomalias orofaciais (p. ex., freio lingual curto, fenda pa- latina).
É importante promover uma técnica correta de amamentação e evitaro uso de
cremes hidratantes e produtos de lavagem irritativos. O tratamento consiste na
aplicação tópica de agentes cicatrizantes (p. ex., Mitosyl® , Halibut®,Bariéderm®),
compressas mornas ou leite materno. A lanolina, apesar de segura e amplamente
utilizada, não tem uma eficácia claramente demonstrada. Se existirem soluções
de continuidade na pele recomenda-se a profilaxia infeciosa tópica com
bacitracina ou mupirocina. A medicação residual visível deve ser removida antes
de cada mamada, com reaplicação posterior. A amamentação deve iniciar-se pelo
lado não afetado. Como analgésico pode ser utilizado o paracetamol ou o
ibuprofeno. Em RN com freio lingual curto está recomendadaa realização de
frenotomia.
Dermatite areolar
Manifesta-se geralmente por eritema e descamação, tendo como causas prin-
cipais o eczema e a psoríase. O eczema pode dever-se a irritação ou alergia a
agentes tópicos (p. ex., produtos de higiene, lanolina, antifúngicos, antibióticos).
Recomenda-se evicção das substâncias causais e a aplicação de corticosteroides
tópicos (hidrocortisona pomada, Pandermil®) após cada mamada. O tratamento
é semelhante nos casos de psoríase.
Infeções mamilares
Se existirem sinais de infeção bacteriana deve ser colhido exsudado para exame
bacteriológico e iniciada antibioterapia empírica. A infeção bacteriana secundária
a lesões de dermatite (impetigo) deve ser suspeitada quando se observam pús-
tulas ou crostas aderentes à pele. Nas mulheres com lesões de herpes simplex ou
herpes zóster recomenda-se a suspensão da amamentação para diminuir o
risco de transmissão para o lactente e a terapêutica antiviral (herpes simplex –
valaciclovir 500 mg PO 12/12 horas durante 5 dias, herpes zóster – valaciclovir
1 g PO 8/8 horas durante 8 dias). Se as lesões forem unilaterais é segura a extração
artificial do leite, rejeitando-se o leite da mama afetada. O diagnósticoé clínico e
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Vasoconstrição mamilar
Ocorre sobretudo em mulheres com fenómeno de Raynaud, sensibilidade anormal
ao frio ou traumatismo mamilar. Manifesta-se por dor, sensação de queimadura
e parestesias com a exposição ao frio ou durante a amamentação. À obser-
vação pode constatar-se a tríade clássica de alterações da coloração: palidez,
seguida de cianose e depois eritema. A puérpera permanece assintomática e
com mamilos de aparência normal entre episódios. As mulheres afetadas devem
amamentar em locais aquecidos. Está recomendada a evicção de substâncias
vasoconstritoras (p. ex., nicotina, cafeína) e o aquecimento do mamilo aquando
do início dos sintomas. A nifedipina pode também aliviar as queixas.
MASTALGIA
Ingurgitamento mamário
O ingurgitamento mamário primário ocorre com o início da produção abundante
de leite entre o terceiro e o quinto dia pós-parto e deve-se sobretudo a edema
intersticial. O ingurgitamento mamário secundário ocorre quando há um dese-
quilíbrio entre a produção e a extração de leite, com acumulação de leite em
excesso (ver também “Hipergalactia”, à frente neste capítulo). Ambos podem ser
acompanhados de tensão e dor mamárias. Para além da promoção da técnica e
frequência recomendadas de amamentação, deve realizar-se extração manual do
leite no final da mamada. A utilização prolongada de bombas de extração está
desaconselhada por aumentar a produção de leite, agravando o ingurgitamento.
Normalmente, a situação resolve espontaneamente ao fim de alguns dias. Se
houver envolvimento areolar, recomenda-se a expressão manual de pequenas
quantidades de leite antes da mamada, de modo a amolecer a aréola e facilitar
a pega. Para alívio da dor, a puérpera pode tomar paracetamol ou ibuprofeno.
Pode ainda aplicar compressas frias no intervalo das mamadas para reduzir o
edema e desconforto. Antes da mamada, pode aplicar compressas mornas ou
tomar duche quente.
Obstrução ductal
A obstrução ductal causa distensão local de uma mama, identificando-se um
nódulo geralmente eritematoso, doloroso e mal delimitado. O diagnóstico dife-
rencial com processos infeciosos faz-se sobretudo pela ausência de manifes-
tações sistémicas. Pode acompanhar-se de obstrução dos poros mamilares,
observando-se neste caso pontos brancos nos mamilos. O tratamento consiste
na desobstrução do ducto afetado e drenagem da área a montante. Pode ten- tar-
se que isto ocorra com mamadas frequentes, precedidas da aplicação de
compressas mornas ou da toma de duche quente, variando o posicionamento
do RN e assegurando a drenagem completa da mama afetada. Pode também
ser realizada expressão manual ou com bomba extratora após a mamada. A
Complicações da Amamentação 341
Galactocelo
Os galactocelos são cistos de retenção láctea em ductos obstruídos. Podem
apresentar-se como massas de dimensões variáveis durante a gravidez, ama-
mentação ou após o desmame. São geralmente indolores, exceto quando estão
infetados. Inicialmente contêm leite fluido, mas com o tempo este torna-se mais
espesso. O diagnóstico é ecográfico e deve ser diferenciado de outras massas
mamárias (p. ex., adenomas, fibroadenomas, papilomas, lipomas, abcessos,
doença fibroquística e neoplasias malignas). A aspiração ou a excisão cirúrgica
só estão recomendadas se o galactocelo for incomodativo, não sendo necessária
a interrupção da amamentação.
GALACTORRAGIA
Nos primeiros dias é frequente ocorrer um corrimento mamilar ligeiramente en-
sanguentado, sobretudo no primeiro filho. Pensa-se ser causado por um aumento
da vascularização aquando do início da produção de leite. A situação resolve
espontaneamente em poucos dias. Quando a galactorragia se mantém durante
mais do que uma semana está indicada a exclusão de outras causas como
fissuras mamilares, colonização por Serratia marcescens e mastite. A cultura do leite
deve ser considerada nas duas últimas situações. Se a hemorragia persis- tir sem
diagnóstico etiológico, deve suspeitar-se de um papiloma intraductal,
solicitando-se ecografia mamária e consulta de Mastologia.
HIPERGALACTIA
Algumas mulheres produzem leite em quantidade superior às necessidades do
lactente. A instalação é habitualmente precoce, com resolução espontânea ao
longo das primeiras semanas. Pode manifestar-se por ingurgitamento mamário
(ver “Ingurgitamento mamário”) ou por sintomas no RN como engasgamento,
tosse ou irritabilidade durante a mamada. A mãe deve ser inquirida acerca do
consumo de substâncias que aumentam a produção de leite (p. ex., antagonis- tas
da dopamina, ou a planta medicinal “feno-grego”). A abordagem assentaem
adotar uma posição de maior controlo do fluxo de leite durante a mamada (RN
mais verticalizado com a mãe mais inclinada para trás), reduzir o fluxo
pressionando a mama com a mão e interromper a mamada quando necessário para
o bebé eructar. Pode também ser considerada a amamentação intercalada apenas
de um lado, reduzindo a produção de leite na mama contralateral apli- cando
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
BIBLIOGRAFIA
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FEBRE PUERPERAL 95
M ARINA GATO, M ÓNICA CENTENO
INTRODUÇÃO
Define-se febre puerperal como uma temperatura auricular >38 °C em pelo menos
duas medições consecutivas intervaladas de 6 horas, excluindo-se as primeiras 24
horas do pós-parto. A causa mais frequente é a endometrite puerperal (ver
“Endometrite puerperal” abaixo). Outras causas frequentes são a infeção de
ferida perineal, a infeção da ferida operatória, a mastite puerperal e as
infeções do trato urinário (ver protocolos “96. Mastite e ab- cesso mamário”,
“97. Complicações da ferida perineal”, “98. Complicações da cicatriz de
cesariana” e “52. Infeções do trato urinário”). As causas não infeciosas são o
ingurgitamento mamário (que raramente causa temperatura
>39 °C e dura geralmente menos de 24 horas) e a febre induzida por fár- macos.
Causas mais raras são o abcesso pélvico e a tromboflebite pélvica séptica (ver
“Tromboflebite pélvica séptica”, à frente neste capítulo).
Abordagem clínica
Inicia-se pela anamnese e exame objetivo, pesquisando sinais e sintomas su-
gestivos de um possível foco infecioso. Realizar também os seguintes exames:
■ Hemograma e proteína C reativa;
■ Exame sumário de urina e urocultura;
■ Hemoculturas se houver sinais de doença sistémica grave ou de sépsis
(frequência respiratória >22 cpm, tensão arterial (TA) sistólica <100 mmHg
e alteração do estado de consciência). As hemoculturas devem ser obtidas antes
do início de antibioterapia, mas isto não deve atrasar o início da terapêutica;
■ A ecografia, tomografia computorizada (TC) ou ressonância magnética (RM)
são importantes sobretudo no diagnóstico de causa raras como o abcesso pélvico
e tromboflebite pélvica séptica (ver “Tromboflebite pélvica séptica”, à frente
neste capítulo).
ENDOMETRITE PUERPERAL
Define-se como uma infeção do endométrio e da porção superficial do mio- métrio
e em ~85% dos casos manifesta-se na primeira semana pós-parto. É
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Tratamento
Clindamicina 900 mg endovenosa (EV) 8/8 horas + gentamicina 4,5 mg/kg
1 vez/dia (se insuficiência renal: clindamicina 900 mg EV 8/8 horas + cefuro-
xima 750 mg EV 8/8 horas).
É de esperar uma resposta terapêutica nas primeiras 48 horas do tratamento. A
antibioterapia EV deve ser mantida até 24-48 horas após apirexia. A instituição
de antibioterapia oral após a terapêutica EV é desnecessária. Em cerca de 20%
dos casos há resistência ao antibiótico (mais frequente nas infeções por
Enterococcus ou por Streptococcus do grupo B). Deve adicionar-se ampicilina
2 g EV 6/6 horas. Os níveis circulantes de gentamicina podem também ser
subterapêuticos – dosear e, se necessário, ajustar a dose. A ecografia pélvica é
útil para excluir a retenção de produtos da conceção na cavidade uterina. Caso
existam, realizar esvaziamento uterino por aspiração. É necessário também
considerar outras causas de febre puerperal (ver protocolos “96. Mastite e abcesso
mamário”, “97. Complicações da ferida perineal”, “98. Complicações da cicatriz
de cesariana” e “52. Infeções do trato urinário” e “Tromboflebite pélvica
séptica”).
BIBLIOGRAFIA
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endometritis and wound infection. Infect Dis Obstet Gynecol. 2000;8(2):77-82.
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Febre Puerperal 345
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WORLD HEALTH ORGANISATION. WHO recommendations for prevention and treatment of ma-
ternal peripartum infections, 2015.
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96 MASTITE E ABCESSO MAMÁRIO
INTRODUÇÃO
A mastite, com ou sem abcesso mamário concomitante, ocorre em cerca de 2%
das mulheres que amamentam, sendo mais frequente nas primeiras 6 semanas
após o parto. Os principais microrganismos implicados são o Staphylococcus
aureus, incluindo espécies resistentes à meticilina (MRSA), o Streptococcus e
o Staphylococcus epidermidis.
MASTITE
O diagnóstico é clínico, baseado na deteção de sinais inflamatórios locais (dor,
rubor), frequentemente associados a febre e por vezes a mialgias. Em casos
ligeiros, os analgésicos anti-inflamatórios (ibuprofeno 400 mg per os (PO) 8/8
horas) podem ser suficientes. Deve ser incentivado o esvaziamento mamário
frequente através da amamentação ou com bombas de extração de leite. Se
os sintomas não melhorarem em 12-24 horas ou forem muito incomodativos,
iniciar antibioterapia com um dos seguintes esquemas:
■ Amoxicilina + ácido clavulânico 875/125 mg PO 12/12 horas;
■ Flucloxacilina 500 mg PO 6/6 horas;
■ Cefradina 500 mg PO 12/12 horas;
■ Cefuroxima 500 mg PO 12/12 horas.
A duração da antibioterapia deve ser de 10-14 dias, mas pode ser suspensa aos 5-
7 dias se ocorrer uma resposta rápida com remissão completa dos sintomas.Se
houver alergia aos -lactâmicos: claritromicina 500 mg PO 8/8 horas. Na presença
de fatores de risco para infeção por MRSA (antibioterapia no mês anterior,
imunossupressão, infeção prévia por MRSA, contacto com doente com infeção por
MRSA): claritromicina 500 mg PO 8/8 horas ou sulfametoxazol + trimetoprim
800/160 mg PO 12/12 horas.
As culturas de leite materno não são obrigatórias, mas são úteis nos casos de
infeção grave, ausência de resposta a antibioterapia empírica nas primeiras 48
horas, mastite recorrente e mastite adquirida em meio hospitalar. A mastite
recorrente é pouco frequente e normalmente resulta de tratamento antibiótico
inadequado/incompleto ou de dificuldades na amamentação com drenagem
incompleta. Deve ainda ser considerada a possibilidade de abcesso, infeção por
microrganismos incomuns (p. ex., tuberculose) ou carcinoma inflamatório da
mama. Nesta situação, ou perante resposta incompleta à antibioterapia, as
puérperas devem ser encaminhadas para a consulta de Mastologia.
Mastite e Abcesso Mamário 347
ABCESSO MAMÁRIO
BIBLIOGRAFIA
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COMPLICAÇÕES DA FERIDA PERINEAL 97
RITA R OSADO, M ARIA DO CÉU SANTO
INTRODUÇÃO
As complicações mais frequentes da ferida perineal são o hematoma (vulvar
ou vaginal), a infeção e a deiscência. O hematoma afeta ~0,1% dos partos vaginais
e a infeção ocorre em ~1% destes. A taxa de deiscência varia emfunção do
grau da laceração perineal, rondando 0,2% nas lacerações de grauI e na
episiotomia, e atingindo ~4,6% na laceração de grau IV. Os hematomasque
ocorrem acima do músculo elevador do ânus podem ter ponto de partida vaginal,
mas devem ser incluídos na entidade “hematomas abdomino-pélvicos”e estão
fora do âmbito do presente protocolo.
Abordagem clínica
■ Avaliação da extensão do hematoma, se necessário com recurso a ecografia
transperineal;
■ Avaliação dos sinais vitais e da dimensão do hematoma hora/hora durante
4 horas e depois de 4/4 horas durante 24 horas;
■ Colocação de acesso venoso periférico e administração de cristaloides 3 l/
/dia;
■ Hemograma e provas da coagulação;
■ Algaliação, caso o hematoma comprima a uretra;
■ Se hematoma <5 cm, sem compromisso uretral, assintomático e não aumen-
tando de tamanho: atitude expectante, gelo local durante 10-15 minutos 4-6
aplicações/dia, compressão do hematoma se possível, repouso moderado;
■ Se hematoma >5 cm, sintomático ou a aumentar de tamanho: abertura, dre-
nagem e desbridamento cirúrgico, desinfeção da loca e sutura por planos
incluindo a pele. A realizar no bloco operatório sob anestesia. Antibioterapia
profilática 1-2 horas antes do procedimento: amoxicilina + ácido clavulânico
1 000 + 200 mg endovenoso (EV) dose única (se alérgica à penicilina: clin-
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INFEÇÃO
O diagnóstico baseia-se nos achados locais de eritema, edema, calor, dor à
exploração, sinais de flutuação (abcesso) e drenagem espontânea de material
purulento. Podem coexistir sintomas sistémicos, leucocitose, aumento da proteí-
na C reativa e algum grau de deiscência da sutura perineal (ver “Deiscência”,
à frente neste capítulo). Deve efetuar-se avaliação cuidadosa da extensão e
profundidade, incluindo toque rectal para detetar eventuais lesões esfincterianas
e hematomas associados.
Abordagem clínica
Em todas as situações de infeção da ferida operatória deve ser colhido exsudado
local para exame cultural, tendo em vista um eventual ajuste terapêutico, de
acordo com o teste de sensibilidade aos antibióticos (TSA).
Infeção superficial limitada, sem abcesso, sem imunossupressão, sem mal-estar geral ou evidênciade
sépsis
■ Amoxicilina + ácido clavulânico 875 + 125 mg per os (PO) 12/12 horas, durante
7 dias (se alérgica à penicilina: clindamicina 300 mg PO 8/8 horas), ibuprofeno
400 mg PO de 8/8 horas, durante 3 dias;
■ Autodesinfeção perineal diária com iodopovidona 3 vezes/dia;
■ Vigilância em ambulatório com reavaliação ao segundo e ao sétimo dia.
DEISCÊNCIA
O diagnóstico baseia-se na observação do afastamento dos bordos da ferida
perineal. Deve efetuar-se avaliação cuidadosa da extensão e profundidade, bem
como da existência de infeção concomitante.
Abordagem clínica
Sem sinais de infeção
Desinfeção da ferida. Se a deiscência for de pequenas dimensões e sem con-
sequências funcionais, deixar encerrar por segunda intenção. Se tiver grandes
dimensões ou impacto funcional/estético negativo, ressuturar no bloco opera-
tório, sob anestesia.
BIBLIOGRAFIA
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98 COMPLICAÇÕES DA CICATRIZ DE CESARIANA
INTRODUÇÃO
Das mulheres submetidas a cesariana, 2-15% apresentam complicações da ferida
operatória, sendo as mais frequentes: seroma (coleção líquida no tecido celular
subcutâneo), hematoma (coleção de sangue no tecido celular subcutâ- neo,
subaponevrótica ou intra-abdominal), infeção com ou sem abcesso (no tecido
celular subcutâneo, subaponevrótica ou intra-abdominal) e a deiscência
superficial ou profunda. As complicações intra-abdominais não são abordadas
no presente protocolo.
SEROMA
O diagnóstico baseia-se na observação de uma tumefação próxima da cicatriz
da cesariana, geralmente mole, incolor, sem sinais inflamatórios, podendo estar
associada a dor e a drenagem espontânea de material sero-hemático.
Abordagem clínica
■ Se seroma de pequenas dimensões, assintomático, que não aumenta de
tamanho, adotar atitude expectante;
■ Se seroma volumoso, sintomático ou que aumenta de tamanho, proceder
a drenagem percutânea com agulha 20G, em condições de assepsia, sob
anestesia local, seguida de penso compressivo.
HEMATOMA
O diagnóstico baseia-se na observação de uma tumefação próxima da cicatriz
da cesariana, geralmente dura e dolorosa à exploração, de cor violácea, sem
sinais inflamatórios, podendo estar associada a dor e a drenagem espontânea
de material sero-hemático.
Abordagem clínica
■ Avaliação da localização e extensão do hematoma, se necessário com recurso
a ecografia;
■ Se <5 cm de diâmetro, assintomático, que não aumenta de tamanho, adotar
atitude expectante;
■ Se >5 cm de diâmetro, sintomático ou que aumenta de tamanho: abertura,
Abordagem clínica
Em todas as situações de infeção da ferida operatória, deve ser colhido exsu- dado
local para exame cultural, tendo em vista um eventual ajuste terapêutico, de
acordo com o teste de sensibilidade aos antibióticos (TSA).
Infeção superficial limitada, sem abcesso, sem imunossupressão, sem mal-estar geral ou evidência
de sépsis
■ Cefuroxima 500 mg per os (PO) 12/12 horas, durante 7 dias (se alérgica à
penicilina: clindamicina 300 mg PO 8/8 horas);
■ Vigilância em ambulatório com reavaliação ao segundo e ao sétimo dia.
e água oxigenada;
■ Ressuturar quando a ferida estiver sem exsudado;
+ ácido clavulânico 875+125 mg PO 8/8 horas até completar 10 dias (se alérgica
à penicilina: clindamicina 300 mg PO 8/8 horas). Reavaliação ao segundo e ao
sétimo dia;
■ Se não houver melhoria clínica, ajuste antibiótico de acordo com TSA.
DEISCÊNCIA
O diagnóstico baseia-se na observação do afastamento dos bordos da ferida
operatória. Deve efetuar-se uma avaliação cuidadosa da extensão e profundidade
da deiscência, bem como da existência de infeção concomitante.
Abordagem clínica
Sem sinais de infeção
Desinfeção da ferida. Se a deiscência for de pequenas dimensões colocar fitas
adesivas cirúrgicas (Steri-Strips®). Se tiver grandes dimensões, ressutura no bloco
operatório sob anestesia.
BIBLIOGRAFIA
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DEFEITO DA CICATRIZ DE CESARIANA 99
M ARIA PULIDO VALENTE, SARA VARGAS, JOANA GOULãO BARROS, ANA LUÍSA RIBEIRINHO
INTRODUÇÃO
O defeito da cicatriz de cesariana, também designado por nicho uterino ou istmo-
celo, define-se como um recesso ou indentação no bordo interno da cicatriz de
cesariana com pelo menos 2 mm de profundidade, avaliado após a gravidez. Os
fatores de risco são: histerotomia baixa na cesariana, antecedentes de múltiplas
cesarianas, diabetes gestacional (DG), índice de massa corporal (IMC) elevado e
defeitos na cicatrização associados a doenças crónicas. O diagnóstico baseia-se
na ecografia transvaginal, podendo ser complementado com histerossonografia
a realizar na primeira fase do ciclo menstrual. Pode ser classificado em simples,
simples com uma única ramificação, ou complexo (mais de uma ramificação).
Na ecografia devem registar-se também: dimensões (comprimento, profundidade
e largura) do defeito da cicatriz e das suas ramificações; espessura de mio- métrio
residual (EMR); espessura de miométrio adjacente; distância do defeito à prega
vesicouterina; distância entre o defeito e o orifício interno do colo. A
histeroscopia e a ressonância magnética (RM) podem ser úteis em situações
particulares. A prevalência nas mulheres submetidas a uma cesariana varia em
função da técnica utilizada e dos critérios de diagnóstico (ecografia transvaginal
24-70%; histerossonografia 56-84%), sendo superior em mulheres sintomáticas.
É frequentemente assintomático, sendo um achado incidental na ecografia, mas
pode estar associado aos seguintes sintomas: hemorragia pós-menstrual, dor
pélvica (dismenorreia, dor pélvica crónica, dispareunia) e infertilidade secundária. Na
gravidez, confere um risco acrescido de implantação na cicatriz de cesariana,
deiscência/rotura uterina, placenta prévia e acretismo placentário.
ABORDAGEM CLÍNICA
O tratamento está indicado em mulheres sintomáticas, devendo também ser
recomendado em mulheres assintomáticas com desejo reprodutivo e com EMR
<3 mm, pelo risco de rotura uterina durante uma futura gravidez. O tratamento
a propor depende do desejo reprodutivo e das características do defeito da ci-
catriz de cesariana. Quando se considera um tratamento cirúrgico, as mulheres
devem ser referenciadas à consulta de Ginecologia Cirúrgica.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
Cuidados pós-cirúrgicos
Recomenda-se reavaliação ecográfica complementada por histerossonografia 3-6
meses após a cirurgia. As mulheres devem evitar engravidar nos 3-6 meses
subsequentes.
BIBLIOGRAFIA
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Emergências Obstétricas
VII
PROLAPSO DO CORDÃO UMBILICAL 100
M ARIA P ULIDO VALENTE , D IOGO AYRES DE C AMPOS
INTRODUÇÃO
Define-se prolapso do cordão umbilical como a presença de uma ansa do cordão
umbilical abaixo da apresentação fetal, após rotura de membranas. Habitual-
mente a ansa do cordão umbilical ultrapassa o colo do útero e localiza-se na
vagina, podendo alcançar ou mesmo ultrapassar o introito vaginal. Trata-se de
uma emergência obstétrica em que existe grande risco de hipoxia fetal devido
à compressão do cordão umbilical pela apresentação fetal e devido ao vasos-
pasmo causado por manipulação do cordão ou exposição do mesmo ao frio.
A incidência é de ~0,1% de todos os partos. Os principais fatores de risco são:
apresentação fetal anómala, apresentação fetal não encravada, parto pré-termo
(PPT), gravidez múltipla, multiparidade, polihidrâmnios, cordão umbilical longo,
placenta baixamente inserida, amniotomia, rotação manual da cabeça fetal,
versão cefálica externa (VCE), versão podálica interna e aplicação de ventosa ou
fórceps. Associa-se habitualmente às seguintes alterações cardiotocográficas:
desaceleração prolongada com baixa variabilidade (compressão sustentada do
cordão umbilical) ou desacelerações repetitivas (compressões transitórias do
cordão umbilical). O diagnóstico é clínico, através da visualização ou palpação
do cordão umbilical abaixo da apresentação fetal.
ABORDAGEM CLÍNICA
■ Avaliar pulsatilidade do cordão umbilical (estão descritos alguns casos de
sobrevivência do recém-nascido (RN) sem sequelas mesmo em situações de
ausência de pulsatilidade umbilical, quando o prolapso ocorreu poucos minutos
antes);
■ Pedir ajuda, convocando com carácter emergente pelo menos dois enfermeiros
BIBLIOGRAFIA
AYRES- DE -C AMPOS D. Umbilical cord prolapse. In Obstetric emergencies – a practical guide
(pp. 15-16, 22). Springer, 2017.
ROYAL C OLLEGE OF O BSTETRICIANS AND GYNAECOLOGISTS . Umbilical cord prolapse. Green-top
guideline no. 50. RCOG Press, 2014.
ECLÂMPSIA 101
INÊS M ARTINS , J OANA GOULãO B ARROS , D IOGO AYRES DE CAMPOS
INTRODUÇÃO
A eclâmpsia caracteriza-se por convulsões tónico-clónicas generalizadas numa
grávida que geralmente apresenta um quadro típico de pré-eclâmpsia e na
ausência de outra doença neurológica que as justifique. O quadro começa
geralmente por um tremor dos músculos faciais, seguido de uma crise tónica
generalizada de 15-20 segundos e de uma fase tónico-clónica que demora
cerca de 60 segundos. A duração total da crise habitualmente não ultrapassa
os 90 segundos. Posteriormente, há uma inspiração profunda e um estado de
coma, normalmente superficial, de duração variável, com recuperação lenta da
consciência. Raramente, as convulsões sucedem-se com frequência (estado
eclâmptico). No presente protocolo define-se a resposta imediata da equipa de
saúde perante uma crise eclâmptica. A abordagem posterior está considerada
no protocolo “19. Hipertensão gestacional, pré-eclâmpsia e síndrome de HELLP”.
ABORDAGEM CLÍNICA
Durante a convulsão
■ Pedir ajuda (chamar com carácter emergente o obstetra mais graduado, dois
enfermeiros especialistas, anestesiologista);
■ Remover objetos à volta da doente que possam causar lesões;
■ Pedir a “caixa de eclâmpsia”;
■ Aguardar que a convulsão passe (geralmente dura 60-90 segundos).
BIBLIOGRAFIA
AYRES- DE -C AMPOS D. Eclampsia. In Obstetric Emergencies – a practical guide (pp. 53-62).
Springer, 2017.
D ULEY L, GÜLMEZOGLU AM, HENDERSON-SMART DJ, et al. Magnesium sulphate and other anticon-
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DISTOCIA DE OMBROS 102
M ARIA DE CARVALHO AFONSO , D IOGO AYRES DE C AMPOS
INTRODUÇÃO
Define-se distocia de ombros como a dificuldade em libertar os ombros fetais com
a habitual tração axial inferior da cabeça. Ocorre geralmente por retenção do
ombro anterior acima da sínfise púbica materna. Em situações graves, am- bos os
ombros ficam retidos acima do estreito superior da bacia. Por vezes a mandíbula
deprime o períneo (sinal da tartaruga). A incidência ronda 0,6% dos partos
vaginais. Os principais fatores de risco são: distocia de ombros prévia,
macrossomia fetal e os seus fatores de risco (diabetes, obesidade, aumento
ponderal excessivo na gravidez), gravidez pós-termo, trabalho de parto prolonga-
do, aceleração do trabalho de parto e parto instrumentado. Na presença destes
fatores de risco, deve ser considerada a presença de uma equipa experiente
no momento do parto. No entanto, a maioria das distocias de ombros ocorrem em
parturientes sem fatores de risco, pelo que é considerada uma situação
geralmente imprevisível. A compressão dos vasos cervicais pelos tecidos ma-
ternos causa grande risco de hipoxia fetal, devendo idealmente a situação ser
resolvida em 5 minutos.
ABORDAGEM CLÍNICA
Pedir ajuda, convocando com carácter emergente (caso não estejam já presen-
tes) dois enfermeiros especialistas, um obstetra experiente, um neonatalogista
e um anestesiologista. Suspender os esforços expulsivos maternos, evitar a
pressão fúndica e a rotação da cabeça fetal, bem como a fratura propositada
da clavícula, que estão associadas a uma elevada incidência de lesões neu-
rológicas. Evitar também as trações bruscas e intermitentes sobre a cabeça fetal.
Esta tração deverá ser contínua, progressiva e de intensidade limitada (<100
newtons). Em princípio, não se deve demorar mais do que 1 minuto em cada
manobra.
Manobras externas
Com as manobras externas resolvem-se a grande maioria das situações dedistocia
de ombros.
Hiperflexão das coxas sobre o abdómen (manobra de McRoberts) (Figura 102.1):
LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
efetuada por dois ajudantes, cada um segurando uma perna, e forçando a flexão
das coxas maternas até ao abdómen, enquanto se tenta novamente a tração axial
inferior da cabeça. Esta manobra aumenta o diâmetro ântero-posterior da bacia
materna.
Pressão suprapúbica: a ser conjugada com a manobra anterior (Figura 102.1).
É efetuada de forma firme e contínua por um dos ajudantes. A pressão deverá ser
364 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Manobras internas
Devem ser realizadas pelo obstetra mais experiente disponível. Pode ser ne-
cessária a execução ou extensão da episiotomia ou o relaxamento uterino
anestésico para facilitar o acesso à cavidade. A ordem pela qual estas ma- nobras
são efetuadas depende da facilidade de acesso às estruturas fetaise da
experiência do executante. Durante estas manobras deve ser mantida a posição
de McRoberts.
Rotação do ombro anterior (manobra de Rubin II) (Figura 102.2): roda-se len-
ta e progressivamente o ombro anterior na direção do tórax fetal, ao mesmo
tempo que um ajudante faz pressão suprapúbica no mesmo sentido. Quando
o diâmetro biacromial estiver numa situação oblíqua (60-90°), exerce-se tração
axial inferior na cabeça.
Extração do braço posterior (Figura 102.4): insere-se uma mão na vagina se-
guindo o antebraço posterior até se chegar ao cotovelo, flete-se o antebraço sobre
o braço, apanha-se o punho e traciona-se o mesmo junto do tórax de forma
a extrair a mão, o antebraço e o braço. Uma vez extraído todo o membro
posterior, este é usado como alavanca para rodar o ombro posterior na direção
do tórax fetal, extraindo-se assim o ombro anterior.
Manobras de exceção
Os casos de insucesso após as manobras anteriormente descritas represen-tam
as formas mais graves de distocia de ombros. O tempo decorrido desdeo
diagnóstico de distocia é essencial para definir o prognóstico fetal e decidir as
manobras seguintes.
Manobra de Zavanelli (Figura 102.5): consiste na reintrodução lenta da cabeça
fetal na pelve materna seguida de parto por cesariana. Deve ser efetuada no bloco
operatório, sob anestesia geral com agentes halogenados. Após a indução
anestésica, roda-se a cabeça fetal para occipito-anterior, flete-se a mesma e
aplica-se pressão contínua com uma ou duas mãos para reintroduzir lenta e
progressivamente a cabeça na pelve materna. Havendo sucesso na manobra é
realizada uma cesariana emergente.
© LIDEL–EDIÇÕES TÉCNICAS
366 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Sinfisiotomia: pode ser realizada sob anestesia local, regional ou geral. Deve
ser precedida de profilaxia antibiótica, cateterização da bexiga, tricotomia púbica
e desinfeção da pele. Dois assistentes seguram nas pernas da grávida depois
de as retirar das perneiras para evitar um afastamento brusco dos dois topos. Com
uma mão na vagina, afasta-se a uretra, enquanto com a outra mão se faz uma
incisão vertical entre o 1/3 superior e os 2/3 inferiores da sínfise. Fletindo o cabo
do bisturi para cima, abrem-se os 2/3 inferiores. Reintroduz-se o bisturi com a
lâmina virada para cima, e fletindo-se o cabo para baixo abre-se o 1/3 superior.
É geralmente possível separar a sínfise 2-3 cm, permitindo libertar os ombros
fetais (Figura 102.6).
BIBLIOGRAFIA
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INTRODUÇÃO
Define-se hemorragia pós-parto precoce como qualquer perda sanguínea genital
profusa ou persistente, que ocorre nas primeiras 24 horas após o parto, e tem
uma incidência de 1-5%. Define-se hemorragia pós-parto major quando a perda
sanguínea estimada visualmente é >1 000 ml (Figura 103.1) ou quando está
associada a compromisso hemodinâmico. Entre as complicações associadas
contam-se a coagulação intravascular disseminada, a insuficiência renal, a fa-
lência hepática e a síndrome de dificuldade respiratória. As causas principais
são a atonia uterina (70-80%), as lesões do trato genital (15-20%), a retenção
parcial ou total da placenta e o acretismo placentário. Outras causas mais raras
são a rotura uterina, a coagulopatia materna e a inversão uterina.
ABORDAGEM CLÍNICA
A primeira atitude perante uma hemorragia pós-parto precoce é pedir ajuda,
chamando o obstetra mais experiente, um anestesiologista e dois enfermeiros
especialistas. O tratamento da hemorragia pós-parto envolve dois componen-
tes principais, que devem ser realizados em paralelo: o suporte à ventilação e
circulação (geralmente a cargo do anestesiologista) e o tratamento da causa
subjacente (geralmente a cargo do obstetra).
rotomia.
Atonia uterina
Correção da atonia uterina após parto vaginal (por ordem até situação estabilizar)
370 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Correção da atonia uterina após cesariana (por ordem até situação estabilizar)
1. Exteriorização do útero, massagem uterina direta, seguida de compressão
sustentada.
2. Considerar medidas referidas nos pontos 2 e 4-6 da “Correção da atonia uterina
após parto vaginal”.
3. Suturas compressivas com poliglactina 910 (Vicryl® 1) (Figura 103.4): 2-4
pontos de B-Lynch, 2-4 pontos de Hayman (se não houver cicatriz de cesa-
riana), ou pontos de Alcides-Pereira.
BIBLIOGRAFIA
AYRES- DE -C AMPOS D. POST- PARTUM HEMORRHAGE . In Obstetric emergencies – a practical guide
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Hemorragia Pós-Parto Precoce 373
INTRODUÇÃO
Define-se como uma procidência do fundo uterino para o interior da cavidade
uterina que ocorre após o parto. A incidência ronda 0,01% dos partos e a sua
patogénese não se encontra totalmente esclarecida, parecendo associar-se à
aplicação de tração exagerada no cordão umbilical e à utilização de pressão
fúndica. Classifica-se como aguda (83,4%) se ocorre nas primeiras 24 horas
pós-parto; sub-aguda (13,9%) se ocorre entre as 24 horas e as 4 semanas;
crónica (2,6%) se surge após as 4 semanas. Subdivide-se também em: grau
1 – fundo uterino não ultrapassa o colo; grau 2 – fundo uterino na vagina; grau
3 – fundo uterino ao nível ou para além do introito vaginal (90% dos casos são
graus 2 e 3); grau 4 – inversão uterina e vaginal (Figura 104.1). Diagnostica-
-se por palpação bimanual e nos graus 3 e 4 observa-se a protusão de uma
massa arredondada ao nível ou que ultrapassa o introito vaginal. Associa-se a
hemorragia pós-parto (95%), choque hipovolémico (40-60%), dor pélvica (7-10%)
e retenção urinária.
Grau 1 Grau 2
ABORDAGEM CLÍNICA
Devido ao elevado risco hemorrágico, trata-se de uma emergência obstétrica,
sendo necessário pedir ajuda, assegurando a presença de um obstetra expe-
riente, um anestesiologista e pelo menos dois enfermeiros especialistas. O
Inversão Uterina 375
ou instabilidade hemodinâmica.
Técnica de Huntington: tração progressiva dos ligamentos redondos com pinças
de Allis (Figura 104.3).
376 Protocolos de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal
Figura 104.3 – Técnica de Huntington para reposição uterina por via abdominal.
Técnica de Haultain (em caso de falha da técnica de Huntington): histerotomia
posterior mediana com cerca de 5-6 cm atingindo o anel cervical, seguida de
tração progressiva sobre os ligamentos redondos com pinças de Allis ou repo- sição
digital do fundo uterino através do orifício da histerotomia (Figura 104.4).
Perante o insucesso destas técnicas está indicada a realização de histerectomia.
Complicações: encontram-se descritas complicações infeciosas (endometrite
puerperal) e hemorrágicas, bem como rotura uterina durante a tentativa de
reposição.
Figura 104.4 – Técnica de Haultain para reposição uterina por via abdominal.
BIBLIOGRAFIA
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PARAGEM CARDIORRESPIRATÓRIA 105
CATARINA REIS DE C ARVALHO , D IOGO AYRES DE CAMPOS
INTRODUÇÃO
A paragem cardiorrespiratória manifesta-se por perda de consciência e cianose
central. A ausência de movimentos respiratórios e de pulso carotídeo confirmam
o diagnóstico. Ocorre em ~0,003% das gestações. O eletrocardiograma (ECG) pode
demonstrar assistolia, fibrilhação ventricular, taquicardia ventricular ou outro
tipo de atividade elétrica sem pulso. Está associada a elevada mortali- dade
materna e fetal, bem como a importantes sequelas. A antecipação desta
complicação, o reconhecimento precoce e o início de manobras de reanimação
têm um impacto profundo no prognóstico. Independentemente da causa da
paragem, a abordagem inicial é semelhante e envolve o suporte à oxigenação/
/circulação materna e a cesariana emergente in situ quando não ocorre reversão
nos primeiros 4 minutos. A cesariana é importante para a sobrevivência fetal
e melhora também o prognóstico materno, devido à redução da compressão aorto-
cava.
ABORDAGEM CLÍNICA
Situações periparagem
Antecipar uma possível paragem cardiorrespiratória perante dispneia súbita ou
taquipneia associada a cianose central. Nestas situações colocar a grávida em
posição lateral de segurança (Figura 105.1), iniciar monitorização contínua da
frequência cardíaca materna (FCM) e ECG. Avaliar saturação de O 2 e tensão
arterial (TA) a cada 5 minutos. Iniciar cardiotocografia (CTG) se gestação ≥25+0
semanas. Trazer o carro de emergência e colocar um plano duro por baixo da
grávida. Cateterizar uma veia periférica com cateter largo (14 ou 16G), adminis-
trar O 2 por máscara 8 l/minuto. Se a situação se mantiver estabilizada, inves-
tigar possíveis causas (ver “Causas mais frequentes”, à frente neste capítulo).
ÇÕES TÉCNICAS
fonte de oxigénio, afastar toda a equipa). Se não ocorrer reversão para ritmo
normal após o primeiro choque, realizar segundo choque, logo que a equipa
esteja novamente estável. Se não houver reversão após o 2.º choque admi-
nistrar adrenalina e amiodarona (ver “Circulação”) antes de novo choque.
BIBLIOGRAFIA
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