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JUSTIÇA SOCIAL E FORMAÇÃO DOCENTE: UM DIÁLOGO NECESSÁRIO

Franciele Santos de Lima*

APPLE, Michael; AU, Wayne; GANDIN, Luís Armando. Educação Crítica: análise
internacional. Tradução de Vinícius Ferreira. Revisão Técnica de Luís Armando Gandin.
Porto Alegre: Artmed, 2011.

Os autores do livro – Educação Crítica: análise internacional, professor Dr. Michael


Aplle da Universidade de Wisconsin – Madison, professor Dr. Wayne Au da Universidade de
Washington e o professor Dr. Luis Armando Gandin da Universidade Federal do Rio Grande
do SUL (UFRGS) selecionaram textos de diferentes pesquisadores da área de educação,
entre eles destaca-se o artigo Educando os professores para a educação crítica do Dr.
Kenneth Zeichner, professor da Universidade de Wisconsin – Madison e Dr. Ryan Flessner,
da Universidade Butler, que será alvo desta resenha crítica.
O trabalho desenvolvido pelos pesquisadores, dividido em 04 tópicos, analisa 03
programas de formação de professores voltados à justiça social, no Canadá, Estados
Unidos e Brasil destacando as práticas relacionadas à educação crítica.
Inicialmente os autores discutem as diferentes concepções de justiça social e no
tópico 01, apontam um conjunto de metas e práticas necessárias aos professores
formadores de professores e aos próprios professores em formação como ser
socioculturalmente consciente, ter visão afirmativa dos estudantes de origem diversa, ser
agente de mudança, conhecer e usar a vida dos estudantes e da comunidade no ensino.
No tópico 02 - As práticas dos programas de formação de professores voltados a
justiça social, os autores destacam duas estratégias adotadas por diferentes escolas de
formação docente, o recrutamento de professores de cor e adequações curriculares e de
ensino. Na primeira entende-se por professores de cor não apenas negros, mas amarelos,
pardos, etc. Indivíduos historicamente desprivilegiados do acesso à academia, contudo
preocupa ao afirmar que este recrutamento seria direcionado à áreas urbanas e rurais
altamente necessitadas, para onde é difícil atrair “profissionais qualificados”. Dá-se a
entender que esses seriam menos qualificados? Na segunda incluem a exigência de
disciplinas, ou parte delas, que enfoquem as questões de justiça social, além de sugerir um
contato mais direto com exemplos e modelos de conceitos e práticas que defendem os
professores formadores de professores sobre o tema, se for o caso designar pessoas da

*
Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó –
Unochapecó. Aluna Especial do Programa de Pós-Graduação em Educação pela Unochapecó.
comunidade local para ensinar os futuros professores sobre a comunidade, estreitando os
laços da teoria, prática e vivência, fugindo assim da banalização do slogan da justiça social.
O cerne do texto está no tópico 03 – Programas que exemplificam a formação de
professores para a justiça social, onde os autores citam a Urban Diversity Teacher
Education Initiative da York University do Canadá, o Center X Teacher Education Program
da Universidade da Califórnia (LA) dos Estados Unidos e o Pedagogia da Terra, do
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra do Brasil.
O programa canadense criado a partir de um estimulo governamental cria uma
agenda inovadora, exigindo que a metade dos estudantes de cada grupo seja de origem
culturalmente ou racialmente diversa, no currículo examina-se as influências ideológicas e
políticas que moldam as práticas escolares, demonstrando que o currículo não é neutro.
Estabelece-se o trabalho em duplas de professores de diferentes raças e culturas, e cada
futuro professor precisa desenvolver um serviço comunitário de no mínimo 06 horas por
mês, conhecendo a comunidade e adequando o uso de pedagogias relevantes, além de
refletir sobre sua própria identidade (pessoal e profissional) e quais as suas principais
influências, e por fim participar da comunidade de aprendizes que liga professores,
estudantes e membros das comunidades através dos projetos desenvolvidos por ambas as
partes.
Nos Estados Unidos o programa selecionado tem uma origem diferente, após a
rebelião provocada pelo julgamento de Rodney King (taxista negro, que dirigia em alta
velocidade e foi espancado por policiais brancos que foram absolvidos do crime contra ele),
com o objetivo de examinar a desigualdade social e os resultados das injustiças nas escolas
públicas, a Universidade da Califórnia, Los Angeles cria um curso de 02 anos para formação
de professores, no primeiro ano tem-se aulas teóricas e no segundo ano os estudantes vão
para a prática nas escolas urbanas de áreas pobres, no final do curso o estudante recebe
um certificado estadual e de mestrado.
No segundo ano do programa, os professores “residentes”, em duplas, ingressam
nas escolas públicas urbanas e montam um projeto comunitário e posteriormente um
portfólio de informações que serão compartilhadas com os demais professores e
comunidade local. Munidos destas experiências os professores são convidados a reflexão
de questões complexas como opressão e privilégio, entre outras e tudo isso é avaliado sob
uma ótica participativa e reflexiva. Mesmo após encerrar o programa os professores mantem
o vínculo através de grupos de investigação e da revista on-line criada pelo Center X, onde
estimula-se a liderança e participação por parte dos graduados.
No Brasil a Pedagogia da Terra, destaca-se por ser uma iniciativa de um movimento
nacional – O Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) - não de uma
instituição de ensino, que busca criar meios para garantir a formação de professores
preocupados com a justiça social. O programa é desenvolvido em 02 linhas: Tempo-Escola,
onde os estudantes aprendem e familiarizam-se com o currículo projetado pelo MST e a
Tempo-Comunidade, onde os estudantes desenvolvem um projeto de pesquisa-ação nas
escolas. Ainda destacam-se os 03 princípios que guiam os professores em formação: a
preparação técnica-profissional, política e cultural, por isso os programa busca estudantes
de áreas não privilegiadas, para que além de desenvolver uma consciência social mais justa
tornem-se ativistas comunitários, contribuindo com as mudanças esperadas no futuro.
Todos os programas apresentados foram destacados por se aproximarem das
comunidades desfavorecidas e por buscar estratégias efetivas para garantir a justiça social.
No tópico 04 - Fortalecendo o impacto da formação de professores para a justiça social, são
pontuadas algumas questões prioritárias como: formação profissional contínua e séria,
criação de comunidades parceiras na formação (incluem professores, estudantes, pessoas
da comunidade, etc), foco nas atividades práticas das escolas e por fim modelar as
atividades práticas desenvolvidas nas escolas para a justiça social.
Nas conclusões percebe-se uma preocupação com a desconexão entre o ensino das
universidades com as complexidades das escolas e comunidades, sugerindo-se práticas de
mediação entre estas. A falta e valorização da categoria de pesquisa “formação de
professores” também é ponto crucial para se entender o atual panorama da educação
“acrítica” que temos. Por fim, sugere-se então que os formadores de professores
exemplifiquem e modelem as disposições e práticas que eles esperam de seus alunos,
ensinando através da vivência, não apenas do discurso.
Após estas importantes reflexões sobre o discurso e a prática da educação crítica, da
formação de professores para a justiça social percebemos o quanto ainda temos que
avançar social e culturalmente, incluindo mais frequentemente estas questões no currículo
seja das universidades como das escolas. Os autores foram muito felizes ao comparar 03
modelos de diferentes países, o que denota que o problema e a solução da formação de
professores para a justiça social esta nas mãos de todos, cabe agora arregaçar as mangas
e buscar o resultado almejado dos discursos escutados.

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