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A DUPLA FACE DA

PROPORCIONALIDADE
Professor Luiz Carlos dos Santos
Gonçalves
LUIZ CARLOS DOS SANTOS GONÇALVES
Mestre e Doutor em Direito do Estado – PUC-SP
Procurador Regional da República
Ex-Procurador Regional Eleitoral de São Paulo
LUIZ CARLOS DOS SANTOS GONÇALVES
Autor dos livros:

Mandados Expressos de Criminalização e a Proteção dos


Direitos Fundamentais na Constituição Brasileira de 1988,
2007

Ações Eleitorais contra o registro, diploma e mandato,


2021

Investigação e Processo dos crimes eleitorais e conexos


2022
Constituição Brasileira de 1988
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:

XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos


direitos e liberdades fundamentais;
Constituição Brasileira de 1988
Artigo 5º

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível,


sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça


ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e
drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos,
por eles respondendo os mandantes, os executores e os que,
podendo evitá-los, se omitirem;
Constituição Brasileira de 1988
Artigo 5º

XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos


armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o
Estado Democrático;
Constituição Brasileira de 1988
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros
que visem à melhoria de sua condição social:

(…)

X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção


dolosa;
Constituição Brasileira de 1988
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras
gerações.
(…)
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções
penais e administrativas, independentemente da obrigação de
reparar os danos causados.
Lei Fundamental alemã
Artigo 26
[Garantia da paz]

(1) Os atos suscetíveis de perturbar a coexistência pacífica entre


os povos e praticados com essa intenção, em especial os que
tenham por objetivo preparar uma guerra de agressão, são
anticonstitucionais. Estes atos estão sujeitos às penas da lei.
CONSTITUIÇÃO ESPANHOLA DE 1978
Artículo 45
1. Todos tienen el derecho a disfrutar de un medio ambiente adecuado
para el desarrollo de la persona, así como el deber de conservarlo.
2. Los poderes públicos velarán por la utilización racional de todos los
recursos naturales, con el fin de proteger y mejorar la calidad de la
vida y defender y restaurar el medio ambiente, apoyándose en la
indispensable solidaridad colectiva.
3. Para quienes violen lo dispuesto en el apartado anterior, en los
términos que la ley fije se establecerán sanciones penales o, en su
caso, administrativas, así como la obligación de reparar el daño
causado.”
CONSTITUIÇÃO ESPANHOLA DE 1978
Artículo 46
Los poderes públicos garantizarán la conservación y promoverán el
enriquecimiento del patrimonio histórico, cultural y artístico de los
pueblos de España y de los bienes que lo integran, cualquiera que
sea su régimen jurídico y su titularidad. La ley penal sancionará los
atentados contra este patrimonio.
CONSTITUIÇÃO ESPANHOLA DE 1978
Artículo 55
1. Los derechos reconocidos en los artículos 17, 18, apartados 2 y 3, artículos 19, 20,
apartados 1, a) y d), y 5, artículos 21, 28, apartado 2, y artículo 37, apartado 2, podrán
ser suspendidos cuando se acuerde la declaración del estado de excepción o de sitio en
los términos previstos en la Constitución. Se exceptúa de lo establecido anteriormente el
apartado 3 del artículo 17 para el supuesto de declaración de estado de excepción.
2. Una ley orgánica podrá determinar la forma y los casos en los que, de forma individual y
con la necesaria intervención judicial y el adecuado control parlamentario, los derechos
reconocidos en los artículos 17, apartado 2, y 18, apartados 2 y 3, pueden ser
suspendidos para personas determinadas, en relación con las investigaciones
correspondientes a la actuación de bandas armadas o elementos terroristas.
La utilización injustificada o abusiva de las facultades reconocidas en dicha ley orgánica
producirá responsabilidad penal, como violación de los derechos y libertades reconocidos
por las leyes.
MANDADOS DE CRIMINALIZAÇÃO
São ordens constitucionais (ou convencionais)
que obrigam o Poder Legislativo a definir crimes
em determinadas matérias. Podem ser expressos
– como os relativos à tortura, na Constituição de
1988 – ou implícitos, como o relativo à vida.
EFEITOS DOS MANDADOS DE CRIMINALIZAÇÃO
➢Eles retiram do legislador ordinário a decisão de criminalizar
ou não determinados comportamentos.
➢O legislador não pode opor suas preferências politico-
ideológicas para descumprir tais ordens, embora estes
aspectos vão influenciar as normas que fizerem.
➢Impedem a descriminalização de tipos já existentes
relacionados a tais matérias
➢Estabelecem, em certos casos, o modo como o tipo penal
deverá ser construído. Por exemplo: a Constituição exige, para
o racism, a pena de reclusão.
NATUREZA DOS MANDADOS DE CRIMINALIZAÇÃO
São normas de garantia de direitos fundamentais!

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…]
NATUREZA DOS MANDADOS DE CRIMINALIZAÇÃO
São normas de garantia de direitos fundamentais, em face de
ofensas que podem vir de particulares. Eles se inserem na
compreensão da “eficácia horizontal dos direitos
fundamentais”(Dritwirkung”). A autonomia privada é limitada pelos
direitos fundamentais, que obrigam tanto o Poder Público quanto
os particulares
NATUREZA DOS MANDADOS DE CRIMINALIZAÇÃO
São normas constitucionais de eficácia limitada, demandando a
“interposition legislatoris”.
BUNDESVERFASSUNGSGERICHT
Caso Lüth, 1955 – reconheceu a eficácia dos direitos
fundamentais nas relações privadas.
BUNDESVERFASSUNGSGERICHT
O caso “Aborto I” - 1975
Lei Alemã de reforma penal, de 1974 descriminalizava o aborto
realizado nas 12 primeiras semanas da gestação (“a regra do
prazo”)
BUNDESVERFASSUNGSGERICHT
O caso “Aborto I” - 1975
Lei Alemã de reforma penal, de 1974 descriminalizava o aborto
realizado nas 12 primeiras semanas da gestação (“a regra do
prazo”).

A Corte Constitucional entendeu que esta lei erea


inconstitucional, por ofensa ao dever de proteção dos direitos
fundamentais, que decorre de sua eficácia perante particulares.
BUNDESVERFASSUNGSGERICHT
O caso “Aborto I” - 1975
“2. O dever do Estado de proteger a vida que está se desenvolvendo existe
mesmo contra a genitora […]

“... Em casos excepcionais, se a proteção ordenada pela Constituição não


pode ser alcançada de nenhuma outra forma, o legislador está obrigado a
estabelecer medidas de caráter penal para assegurar a vida que se
desenvolve”.
Código Penal Alemão
Artigo 218a Impunidade pela interrupção da gravidez

1). Os fatos do § 218 não são puníveis se:


1. a gestante solicitar a interrupção da gravidez e comprovar ao médico, por
meio de atestado nos termos do artigo 219, parágrafo 2, frase 2, que
recebeu orientação pelo menos três dias antes do procedimento,
2. a interrupção da gravidez é realizada por um médico;
3. não mais de doze semanas se passaram desde a concepção.
Código Penal Alemão
Artigo 218a Impunidade pela interrupção da gravidez
2. O aborto realizado por um médico com o consentimento da gestante não
é ilícito se, tendo em conta as condições de vida atuais e futuras da
gestante, a interrupção da gravidez for indicada, de acordo com o
conhecimento médico, para evitar a colocação da vida da gestante em risco
ou se houver risco de grave comprometimento de sua saúde física ou
mental, desde que o perigo não possa ser evitado por nenhuma outra forma
que seja razoável para ela.
Código Penal Alemão
Artigo 218a Impunidade pela interrupção da gravidez
§ 3º No caso de aborto praticado por médico com consentimento da
gestante, considerar-se-ão também preenchidos os requisitos do § 2º se,
segundo o conhecimento médico, um ato ilícito previsto nos arts. do Código
Penal tenha sido cometido em seu detrimento e há razões imperiosas para
acreditar que a gravidez decorreu deste fato, desde que não tenham
transcorrido mais de doze semanas desde a concepção.
Código Penal Alemão
Seção 219 Aconselhamento para mulheres grávidas em situação de emergência ou
conflito
(1) O aconselhamento serve para proteger a vida não nascida. Tem que ser pautado por
esforços para encorajar a mulher a continuar a gravidez e abrir perspectivas de vida com
o filho; deve ajudá-la a tomar uma decisão responsável e consciente. A mulher deve estar
ciente de que o nascituro tem direito à vida em todas as fases da gravidez e, portanto, de
acordo com o ordenamento jurídico, o aborto só pode ser considerado em situações
excepcionais se o ônus de prosseguir com a gravidez é tão difícil e extraordinário que
ultrapassa o limite razoável do sacrifício. O aconselhamento destina-se a ajudar com
conselhos e ajudar a superar a situação de conflito existente em relação à gravidez e a
solucionar uma emergência. A Lei de Conflito de Gravidez regula os detalhes.
Código Penal Alemão
Seção 219 Aconselhamento para mulheres grávidas em situação de emergência ou
conflito
(2) De acordo com a Lei de Conflitos de Gravidez, o aconselhamento deve ser fornecido por
um centro de aconselhamento de conflitos de gravidez reconhecido. Após o término da
sessão de aconselhamento, o centro de aconselhamento deve entregar à gestante um
atestado informando a data da última sessão de aconselhamento e o nome da gestante
de acordo com a Lei de Conflitos na Gravidez. O médico que realiza a interrupção da
gravidez está excluído do cargo de conselheiro.
StGB - Strafgesetzbuch
§ 218a Straflosigkeit des Schwangerschaftsabbruchs
(1) Der Tatbestand des § 218 ist nicht verwirklicht, wenn1.die Schwangere den Schwangerschaftsabbruch verlangt und dem Arzt
durch eine Bescheinigung nach § 219 Abs. 2 Satz 2 nachgewiesen hat, daß sie sich mindestens drei Tage vor dem Eingriff hat
beraten lassen,
2.der Schwangerschaftsabbruch von einem Arzt vorgenommen wird und
3.seit der Empfängnis nicht mehr als zwölf Wochen vergangen sind.
(2) Der mit Einwilligung der Schwangeren von einem Arzt vorgenommene Schwangerschaftsabbruch ist nicht rechtswidrig, wenn der
Abbruch der Schwangerschaft unter Berücksichtigung der gegenwärtigen und zukünftigen Lebensverhältnisse der Schwangeren
nach ärztlicher Erkenntnis angezeigt ist, um eine Gefahr für das Leben oder die Gefahr einer schwerwiegenden Beeinträchtigung des
körperlichen oder seelischen Gesundheitszustandes der Schwangeren abzuwenden, und die Gefahr nicht auf eine andere für sie
zumutbare Weise abgewendet werden kann.
(3) Die Voraussetzungen des Absatzes 2 gelten bei einem Schwangerschaftsabbruch, der mit Einwilligung der Schwangeren von
einem Arzt vorgenommen wird, auch als erfüllt, wenn nach ärztlicher Erkenntnis an der Schwangeren eine rechtswidrige Tat nach
den §§ 176 bis 178 des Strafgesetzbuches begangen worden ist, dringende Gründe für die Annahme sprechen, daß die
Schwangerschaft auf der Tat beruht, und seit der Empfängnis nicht mehr als zwölf Wochen vergangen sind.
(4) Die Schwangere ist nicht nach § 218 strafbar, wenn der Schwangerschaftsabbruch nach Beratung (§ 219) von einem Arzt
vorgenommen worden ist und seit der Empfängnis nicht mehr als zweiundzwanzig Wochen verstrichen sind. Das Gericht kann von
Strafe nach § 218 absehen, wenn die Schwangere sich zur Zeit des Eingriffs in besonderer Bedrängnis befunden hat.
StGB - Strafgesetzbuch
§ 219 Beratung der Schwangeren in einer Not- und Konfliktlage
(1) Die Beratung dient dem Schutz des ungeborenen Lebens. Sie hat sich von dem Bemühen leiten zu
lassen, die Frau zur Fortsetzung der Schwangerschaft zu ermutigen und ihr Perspektiven für ein Leben
mit dem Kind zu eröffnen; sie soll ihr helfen, eine verantwortliche und gewissenhafte Entscheidung zu
treffen. Dabei muß der Frau bewußt sein, daß das Ungeborene in jedem Stadium der Schwangerschaft
auch ihr gegenüber ein eigenes Recht auf Leben hat und daß deshalb nach der Rechtsordnung ein
Schwangerschaftsabbruch nur in Ausnahmesituationen in Betracht kommen kann, wenn der Frau
durch das Austragen des Kindes eine Belastung erwächst, die so schwer und außergewöhnlich ist, daß
sie die zumutbare Opfergrenze übersteigt. Die Beratung soll durch Rat und Hilfe dazu beitragen, die in
Zusammenhang mit der Schwangerschaft bestehende Konfliktlage zu bewältigen und einer Notlage
abzuhelfen. Das Nähere regelt das Schwangerschaftskonfliktgesetz.
(2) Die Beratung hat nach dem Schwangerschaftskonfliktgesetz durch eine anerkannte
Schwangerschaftskonfliktberatungsstelle zu erfolgen. Die Beratungsstelle hat der Schwangeren nach
Abschluß der Beratung hierüber eine mit dem Datum des letzten Beratungsgesprächs und dem Namen
der Schwangeren versehene Bescheinigung nach Maßgabe des Schwangerschaftskonfliktgesetzes
auszustellen. Der Arzt, der den Abbruch der Schwangerschaft vornimmt, ist als Berater
ausgeschlossen.
A proteção insuficiente de direitos fundamentais
(“untermassverbot”) ofende a proporcionalidade da mesma
maneira que o abuso (“übermassverbot”)
ELEMENTOS DA “NOVA” PROPORCIONALIDADE
➢ Necessidade
➢ Adequação
➢ Justa medida (prop. em sentido estrito)
➢ Proibição do excesso (übermassverbot)
➢ Proibição da proteção insuficiente (untermassverbot)
ELEMENTOS DA “NOVA” PROPORCIONALIDADE
➢ Necessidade
➢ Adequação
➢ Justa medida (prop. em sentido estrito)
➢ Proibição do excesso (übermassverbot)
➢ Proibição da proteção insuficiente (untermassverbot)
E SE O LEGISLADOR DESCUMPRIR A OBRIGAÇÃO DE LEGISLAR?
Constituição Brasileira de 1988
Art. 5º
LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma
regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania
e à cidadania;
E SE O LEGISLADOR DESCUMPRIR A OBRIGAÇÃO DE LEGISLAR?
Constituição Brasileira de 1988
Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação
declaratória de constitucionalidade:
(...)§ 2º Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para
tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder
competente para a adoção das providências necessárias e, em se
tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.
E SE O LEGISLADOR DESCUMPRIR A OBRIGAÇÃO DE LEGISLAR?
Constituição Brasileira de 1988
Art. 102
§ 1º A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente
desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na
forma da lei.
A presença de mandados de criminalização na Constituição
impede que se considere que ela adotou o “princípio” do Direito
Penal Mínimo.
Mais apropriado é falar em “Direito Penal Proporcional”
Obrigado/a
Professor Luiz Carlos dos Santos
Gonçalves
Contato com o professor:
“A Cachaça Eleitoral”
www.acachacaeleitoral.com

Instagram:
@professorluizcarlosgoncalves

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