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PMERJ - Polícia Militar do Rio de Janeiro

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PMERJ - Polícia Militar do Rio de Janeiro


Soldado

Autores

NOÇÕES DE DIREITO PENAL • Renato Philippini e Rodrigo Gonçalves

Edição: Novembro/2022

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SUMÁRIO

NOÇÕES DE DIREITO PENAL...........................................................................................5


PRINCÍPIOS DE DIREITO PENAL.......................................................................................................... 5

LEI PENAL.............................................................................................................................................. 9

TEORIA DO CRIME............................................................................................................................... 20

DOS CRIMES CONTRA A PESSOA..................................................................................................... 31

DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO............................................................................................ 61

DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL................................................................................. 86

DOS CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA............................................................................................... 94

DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA..................................................................106


A dignidade da pessoa humana só é assegurada quan-
do é observado outro princípio basilar: o devido proces-
so legal, que se encontra no inciso LIV, art. 5º, da CF:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção


NOÇÕES DE DIREITO de qualquer natureza, garantindo-se aos brasilei-
ros e aos estrangeiros residentes no País a inviola-
PENAL bilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade,
à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus
bens sem o devido processo legal;
PRINCÍPIOS DE DIREITO PENAL
De forma simples, a consolidação do devido pro-
O estudo da teoria da norma penal inicia-se pelo cesso legal dá-se quando é assegurado a todos o direi-
exame dos princípios penais. O conhecimento dos to a um processo que segue todas as etapas previstas
princípios é essencial para se entender a lógica do em lei e que observa todas as garantias constitucio-
funcionamento do Direito Penal. Ao estudá-los, é nais previstas. Dizer que foi observado o princípio do
importante ter em mente sua função limitadora, ou devido processo legal na esfera penal significa afirmar
seja, servem como garantia do cidadão perante o que houve sucesso na aplicação de todos os princípios
processuais penais e processuais penais.
poder punitivo do Estado, e é por tal razão, dada a sua
É importante saber que os princípios da dignidade
importância, que os princípios penais encontram-se
da pessoa humana e do devido processo legal não têm
previstos na Constituição (também chamados de prin-
aplicabilidade somente ao Direito Penal, mas alcan-
cípios constitucionais do Direito Penal) e em tratados
çam o Direito como um todo. No entanto, produzem
de direitos humanos, como, por exemplo, na Conven-
reflexos importantíssimos na área Penal e servem de
ção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San
base para todos os demais princípios e normas.
José da Costa Rica).
Os princípios não são somente um conjunto de Princípio da Legalidade
valores, diretrizes ou instruções de cunho ético ou
programático. Os princípios são normas de aplica- Previsto no inciso XXIX, art. 5º, da Constituição,
ção prática: têm caráter imperativo (cogente). Estão com redação semelhante à do art. 1º, do CP, o princípio
em posição de superioridade às regras, orientando a da legalidade é a mais importante garantia do cidadão
interpretação destas ou impedindo a sua aplicação frente ao poder punitivo do Estado, sendo o mais rele-
quando estiverem em contradição aos princípios. vante princípio penal.
Dentre os princípios aplicáveis ao Direito Penal, Compare o princípio conforme exposto na Consti-
dois merecem destaque, por deles se extraírem todos tuição (art. 5º) e no Código Penal (art. 1º):
os demais: o princípio da dignidade da pessoa
humana e o princípio do devido processo legal. Art. 5º (CF, de 1988) Todos são iguais perante a
O princípio da dignidade da pessoa humana lei, sem distinção de qualquer natureza, garantin-
é tido como um “superprincípio”, ou seja, nele se do-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
baseiam todas as escolhas políticas no Direito: em no País a inviolabilidade do direito à vida, à liber-
outras palavras, é um valor que orienta todo o sistema dade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
jurídico e prevalece no momento da interpretação de termos seguintes:
[...]
todos os demais princípios e normas (nenhum princí-
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina,
pio ou regra de qualquer área do Direito, inclusive na nem pena sem prévia cominação legal;
esfera Penal, pode ser contrário a ele). Esse princípio
maior se encontra no inciso III, art. 1º, da CF, inseri- Art. 1º (CP) Não há crime sem lei anterior que o
do como fundamento do Estado Democrático de defina. Não há pena sem prévia cominação legal.
Direito:
Ou seja, por força deste princípio, não há crime
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada (nem contravenção) sem prévia determinação
pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

legal, assim como não há pena sem prévia comina-


do Distrito Federal, constitui-se em Estado Demo- ção (imposição, prescrição) feita em lei.
crático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
III - a dignidade da pessoa humana Importante!
A dignidade humana, na área penal, desdobra-se Não confunda o princípio da legalidade, previsto
em dois aspectos: no inciso II, art. 5º da CF, segundo o qual “nin-
guém será obrigado a fazer ou deixar de fazer
z O respeito à dignidade da pessoa humana quando alguma coisa senão em virtude de lei” (legalida-
esta se torna acusada em um processo-crime; de em sentido amplo), com o princípio da legali-
z O respeito à dignidade do ofendido, que teve seu dade criminal que, conforme vimos, se encontra
bem jurídico perdido ou danificado. no inciso XXXIX, art. 5º, da CF, e art. 1º, do CP,
segundo o qual não há crime sem lei (legalidade
em sentido estrito). 5
O princípio da legalidade tem quatro funções fundamentais:

z Proibir a retroatividade da lei penal (nullum crimen nulla poena sine lege praevia);
z Proibir a criação de crimes e penas pelo costume (nullum crimen nulla poena sine lege scripta);
z Proibir o emprego da analogia para criar crimes, fundamentar ou agravar penas (nullum crimen nulla
poena sine lege stricta);
z Proibir incriminações vagas e indeterminadas (nullum crimen nulla poena sine lege certa).

O princípio da legalidade criminal apresenta, atualmente, várias esferas de garantia. Dentre estas, as mais
relevantes são os princípios da reserva legal e da anterioridade.

Princípio da Reserva Legal

Ainda de acordo com o inciso XXXIX, art. 5º, da CF, e o art. 1º, do CP, em matéria penal, apenas lei em sentido
estrito (aprovada pelo Parlamento, seguindo o procedimento legislativo previsto na CF) pode criar crimes e
sanções (penas e medidas de segurança). Assim, apenas leis ordinárias e leis complementares (leis em sentido
estrito) podem prever crimes e cominar penas: Emendas constitucionais, Medidas Provisórias, Leis Delegadas,
Decretos Legislativos e Resoluções não podem ser usadas.

Princípio da Anterioridade

Previsto também no inciso XXXIX, art. 5º, da CF, e art. 1º, do CP, o princípio da anterioridade determina que,
antes da prática do crime, deve haver prévia definição em lei (estabelecendo, ainda, a pena cabível). Quem pra-
tica a conduta criminosa deve saber de antemão que o ato se trata de conduta criminosa e sua consequência. Em
outras palavras, a lei penal nova deve entrar em vigor antes do fato criminoso e se aplica apenas para os fatos
ocorridos após sua vigência.

Princípio da Aplicação da Lei Mais Favorável (Retroatividade da Lei Penal Benéfica ou, ainda, Irretroatividade da Lei
Penal)

A regra geral impõe que as leis têm sua validade voltada para o futuro, ou seja, são irretroativas. Por que tal
regra? Porque, em caso contrário, haveria enorme insegurança jurídica, correndo-se o risco de a sociedade (desti-
natária da norma) ser surpreendida a todo instante. O inciso XL, art. 5º, da CF, e o art. 2º, do CP, apresentam uma
exceção válida somente no Direito Penal. Observe como o princípio vem disposto na Constituição Federal e no
Código Penal:

CF CP

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de Art. 2º Ninguém pode ser punido por fato que lei poste-
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos rior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do di- a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
reito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à pro- Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo fa-
priedade, nos termos seguintes: vorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que
[...] decididos por sentença condenatória transitada em julgado
XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu

Trata-se do “princípio-exceção” da retroatividade da lei penal mais benéfica: a norma penal mais benéfica ao
agente do crime retroage, sendo aplicável a casos em curso ou já definitivamente sentenciados. Trata-se de assun-
to pertinente ao tema “Lei penal no tempo”, que será visto mais adiante.
Os princípios que até agora vimos são os mais relevantes (portanto, os mais cobrados) no que diz respeito à
aplicação da lei penal. Podemos resumi-los da seguinte forma:

PRINCÍPIO PREVISÃO LEGAL SIGNIFICADO

Dignidade da pessoa O Direito Penal deve garantir a dignidade humana, limi-


Inciso III, art. 1º, CF
humana tando os excessos do Estado (“superprincípio”)

A aplicação da lei penal só pode se dar seguindo to-


Devido processo
Inciso LIV, art. 5º, CF das as etapas previstas em lei e observando todas as
legal
garantias constitucionais previstas

Não há crime (nem contravenção) sem prévia deter-


Legalidade penal Inciso XXXIX, art. 5º, CF, e art. 1º, CP minação legal, assim como não há pena sem prévia
cominação em lei

Apenas lei em sentido estrito pode criar crimes e co-


Reserva legal Inciso XXXIX, art. 5º, CF e art. 1º, CP
minar penas
6
PRINCÍPIO PREVISÃO LEGAL SIGNIFICADO

A lei penal nova deve entrar em vigor antes do fato


Anterioridade Inciso XXXIX, art. 5º, CF e art. 1º, CP criminoso e se aplica apenas para os fatos ocorridos
após sua vigência

É um princípio-exceção. A regra geral é que as leis


Retroatividade da lei
Inciso XL, art. 5º, CF e art. 2º, CP tenham validade voltada para o futuro. Só a lei penal
penal benéfica
favorável ao agente retroage

Além dos princípios vistos, existem outros que dizem respeito à aplicação da pena (como o da individualização
da pena e da humanidade) ou à teoria do crime (como o da intervenção mínima e o da taxatividade, por exemplo).

Taxatividade ou da Determinação

Diz respeito à técnica de elaboração da lei penal, que deve ser suficientemente clara e precisa na formulação
do conteúdo do tipo legal e no estabelecimento da sanção para que exista real segurança jurídica.
Tal assertiva constitui postulado indeclinável do Estado de direito material: democrático e social.
O princípio da taxatividade é uma consequência do princípio da legalidade: de nada adianta estabelecer a
conduta delituosa em lei se a definição do crime é vaga, confusa, ampla demais ou, ainda, dá margem a mais de
uma interpretação, o que gera insegurança e fere a legalidade.

Princípio da Exclusiva Proteção dos Bens Jurídicos

Conforme vimos anteriormente, a função do Direito Penal é proteger bens jurídicos. De acordo com tal prin-
cípio, dentro do Estado Democrático de Direito, a interferência do Direito Penal na liberdade dos cidadãos só é
legítima para proteger os bens jurídicos.

Princípio da Intervenção Mínima ou da Subsidiariedade ou do Direito Penal Mínimo

O Direito Penal deve tutelar apenas os bens jurídicos mais relevantes, intervindo apenas o mínimo necessário
nos conflitos sociais e na liberdade dos indivíduos. Em outras palavras, a força punitiva do Estado deve ser utili-
zada apenas como último recurso (ultima ratio).

Princípio da Pessoalidade ou da Personalidade ou da Responsabilidade Pessoal ou da Intranscendência da Pena

Encontra-se previsto no inciso XLV, art. 5º, CF:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à proprie-
dade, nos termos seguintes:
[...]
XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do
perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor
do patrimônio transferido;

Tal princípio define que a pena de um agente condenado não pode ser transferida para outra pessoa, ou seja,
apenas o indivíduo sentenciado pode ser responsabilizado pela conduta criminosa praticada. Não importa o tipo
da pena (privativa de liberdade ou multa): apenas o autor da infração penal pode ser apenado, esta é a regra.
No entanto, o próprio inciso XLV traz uma exceção: nas hipóteses previstas nos incisos I e II e no § 1º, do art. 91,
do Código Penal (que estabelece como efeitos da condenação o dever de indenizar o dano causado e o perdimento de
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

determinados bens), mesmo com o falecimento do condenado a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdi-
mento de bens alcançam os sucessores até o limite do valor do patrimônio transferido.

Importante!
Vimos acima a questão da responsabilidade pessoal: mas e as pessoas jurídicas, respondem na esfera penal?
Sim, atualmente, somente em relação aos crimes ambientais. A responsabilidade penal da pessoa jurídica é pre-
vista na Lei Ambiental, Lei nº 9.605, de 1998, em seu art. 3º. A CF prevê a possibilidade da responsabilização
criminal da pessoa jurídica em duas hipóteses: nos crimes ambientais e nos crimes econômicos (§ 3º, arts. 173 e
225, CF) mas apenas o primeiro encontra-se regulamentado e, portanto, pode ser aplicado.

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Princípio da Individualização da Pena Princípio da Humanidade da Pena ou da Limitação
das Penas
Garante que o Direto Penal seja aplicado em cada
caso concreto, tendo em vista particularidades como a Em um Estado de Direito democrático, veda-se
personalidade do agente e o grau de lesão ao bem jurídi- a criação, a aplicação ou a execução de pena, bem
co (impede, pois, a generalização da aplicação da pena). como de qualquer outra medida que atentar contra
Tal princípio está expresso no inciso XLVI, art. 5º, CF: a dignidade humana. Apresenta-se como uma dire-
triz garantidora de ordem material e restritiva da lei
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção penal, verdadeira salvaguarda da dignidade pessoal,
de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e relaciona-se de forma estreita com os princípios da
e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilida- culpabilidade e da igualdade.
de do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segu- Está previsto no inciso XLVII, art. 5º, da CF, que
rança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] proíbe as seguintes penas:
XLVI - a lei regulará a individualização da pena [...].
z De morte, salvo em caso de guerra declarada;
A pena deve ser individualizada em três planos: z De caráter perpétuo;
legislativo, judicial e executório. Isto é, o princípio da z De trabalhos forçados;
individualização da pena dá-se em três momentos na z De banimento;
esfera penal: z Cruéis.

z Cominação: a primeira fase de individualização Um Estado que mata, que tortura, que humilha o
da pena inicia-se com a seleção feita pelo legisla- cidadão não só perde qualquer legitimidade, senão
dor, quando escolhe para fazer parte do pequeno que contradiz sua razão de ser, colocando-se ao
âmbito de abrangência do Direito Penal aquelas nível dos mesmos delinquentes (FERRAJOLI, 2014).
condutas, positivas ou negativas, que atacam nos-
sos bens mais importantes. Uma vez feita essa Princípio da Adequação Social
seleção, o legislador valora as condutas, apre-
sentando penas de acordo com a importância Uma conduta não será tida como típica se for
do bem a ser tutelado; socialmente adequada ou reconhecida, isto é, se esti-
z Aplicação: tendo o julgador chegado à conclusão ver de acordo da ordem social da vida historicamente
de que o fato praticado é típico, ilícito e culpável, condicionada.
dirá qual a infração praticada e começará, agora, Outro aspecto é o de conformidade ao Direito, que
a individualizar a pena a ele correspondente, prevê uma concordância com determinações jurídi-
observando as determinações contidas no art. 59, cas de comportamentos já estabelecidos.
do Código Penal (método trifásico); O princípio da adequação social possui dupla fun-
ção, acompanhe:
z Execução Penal: a execução não pode igual para
Uma delas é a de restringir o âmbito de abrangên-
todos os presos, justamente porque as pessoas não
cia do tipo penal, limitando a sua interpretação, e dele
são iguais, mas sumamente diferentes, e tampou-
excluindo as condutas consideradas socialmente ade-
co a execução pode ser homogênea durante todo
quadas e aceitas pela sociedade.
período de seu cumprimento. Individualizar a
A segunda função é dirigida ao legislador em duas
pena, na execução, consiste em dar a cada preso
vertentes.
as oportunidades para lograr a sua reinserção
A primeira delas o orienta quando da seleção das
social, posto que é pessoa, ser distinto.
condutas que deseja proibir ou impor, com a finalida-
de de proteger os bens considerados mais importantes.
Princípio da Proporcionalidade da Pena ou da Se a conduta que está na mira do legislador for
Razoabilidade ou da Proibição de Excesso considerada socialmente adequada, não poderá ele
reprimi-la valendo-se do Direito Penal. A segunda ver-
Deve existir sempre uma medida de justo equilí- tente destina-se a fazer com que o legislador repense
brio entre a gravidade do fato praticado e a sanção os tipos penais e retire do ordenamento jurídico a pro-
imposta: a pena deve ser proporcionada ou adequada teção sobre aqueles bens cujas condutas já se adapta-
à magnitude da lesão ao bem jurídico representada ram perfeitamente à evolução da sociedade.
pelo delito e a medida de segurança à periculosidade Exemplo clássico é o adultério, que deixou de ser
criminal do agente. crime no Brasil em 2005. Por outro lado, são exemplos
A observância deste princípio impede que o Direi- de condutas formalmente típicas (previstas em tipo
to Penal intervenha de forma desnecessária ou exces- legal) mas materialmente atípicas (por serem social-
siva na esfera individual, gerando danos mais graves mente adequadas/aceitas): a tatuagem e o furo para a
do que os necessários para a proteção social. colocação de um brinco ou de um piercing.
Esse princípio tem duplo destinatário:
Princípio da Insignificância
z O Poder Legislativo: que tem de estabelecer penas
proporcionadas, em abstrato, à gravidade do Relacionado aos chamados crimes de bagatela,
delito; também conhecidos como delitos de lesão míni-
z Juiz: as penas que os juízes impõem ao autor do ma. Este é um dos princípios penais que, nos últimos
delito têm de ser proporcionais à sua concreta anos, vem sendo cada vez mais discutido na doutri-
gravidade. na e tratado pela jurisprudência. De forma simples,
consiste no princípio que afirma que o Direito Penal
8 não deve se preocupar com condutas incapazes de
ofender de forma relevante os bens jurídicos pro- Importante!
tegidos pelo tipo penal.
A insignificância tem natureza jurídica de causa Para o STF e o STJ, o fato de ser reincidente não
de exclusão da tipicidade material, isto é, como con- impede a aplicação do princípio da insignificância.
sequência, devem ser tidas como atípicas as ações ou Nesse sentido, em abril, a Segunda Turma do STF,
omissões que afetam muito infimamente a um bem no julgamento do Habeas Corpus 181389, mante-
jurídico-penal. ve, por unanimidade, decisão do ministro Gilmar
A irrelevante lesão do bem jurídico protegido não Mendes que absolveu réu reincidente condenado
justifica a imposição de uma pena, devendo-se excluir
a um ano e nove meses de reclusão pela tentativa
a tipicidade em caso de danos de pouca importância.
de furto de R$ 4,15 em moedas e de uma garrafa
Tal princípio é utilizado, por exemplo, em casos de
de Coca-Cola, duas de cerveja e uma de cachaça
pequenos furtos simples.
(produtos que totalizam R$ 29,15).
O princípio da insignificância traz consigo uma
série de discussões relevantes. A primeira delas diz Princípio da Lesividade ou da Ofensividade do
respeitos aos requisitos para sua aplicação. Evento
De acordo com o entendimento consolidado do
Supremo Tribunal Federal (STF), sua aplicação não A lei penal tem o dever de prevenir os mais altos
é irrestrita e o princípio da bagatela somente pode custos individuais representados pelos efeitos lesivos
ser aplicado se presentes as seguintes condições das ações reprováveis e somente eles podem justificar
objetivas, ligadas, portanto, ao fato (requisitos o custo das penas e das proibições.
objetivos): O princípio axiológico da separação entre direito
e moral veta, por sua vez, a proibição de condutas
meramente imorais ou de estados de ânimo perverti-
REQUISITOS OBJETIVOS DO PRINCÍPIO DA dos, hostis, ou, inclusive, perigosos.
INSIGNIFICÂNCIA (STF)

M Mínima ofensividade da conduta Princípio da Razoabilidade

A Ausência de periculosidade social Segundo a doutrina, o razoável sobrepõe o que é


legal. E isso faz com que a lei seja interpretada e apli-
Reduzidíssimo grau de reprovabilidade do cada em harmonia com a realidade, de modo social e
R
comportamento juridicamente razoável, buscando aquilo que é justo.
I Inexpressividade da lesão jurídica provocada
Princípio do Ne Bis In Idem
Além destes (apresentados como forma de facilitar
De acordo com o princípio do ne bis in idem (não
o aprendizado pela sigla M.A.R.I., que pode ser troca- repetir sobre o mesmo), nenhum indivíduo pode ser
da por R.I.A.M. desde que se altere a ordem), o Supe- punido duas vezes pelo mesmo fato. Tem aplicabili-
rior Tribunal de Justiça (STJ) acrescenta mais dois dade no âmbito do direito penal material (ninguém
requisitos, de ordem subjetiva (relacionada, portan- pode sofrer duas penas em face do mesmo crime) e do
to, aos sujeitos): direito processual penal (ninguém pode ser processa-
do e julgado duas vezes pelo mesmo fato).
z Não ser o réu criminoso habitual ou militar;
z Condições da vítima: condição econômica, o valor
sentimental do bem, as circunstâncias e o resulta-
do do crime, de modo que se determina, no âmbito
LEI PENAL
subjetivo, a existência ou não de lesão.
Vamos, agora, responder a três perguntas sobre a
lei penal:
Ou seja, constituem exceção à aplicação do prin-
cípio: o fato de ser o crime praticado por militar z Quando ela se aplica?
(tendo em vista o alto grau de reprovabilidade da con- z Onde ela se aplica?
duta e da quebra da hierarquia e da disciplina a qual z Em face de quem ela se aplica (ou não se aplica)?
tal classe encontra-se sujeita) ou por criminoso habi-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

tual (aquele que pratica crimes como meio de vida). Ou seja, o nosso estudo da eficácia da lei penal se
O STJ possui súmulas específicas a respeito do dará sob três aspectos:
princípio da insignificância que tratam de sua incom-
patibilidade com certos tipos de crime, como, por z Ao tempo (a lei penal não tem eficácia permanen-
exemplo, as Súmulas 589, 599 e 606, que afirmam, res- te; entra em vigor em determinado momento e não
pectivamente, não ser aplicável a insignificância: é eterna);
z Ao espaço (não vige em tudo o mundo; não é
universal);
z Nos crimes ou contravenções praticados contra a
z Às funções exercidas por certas e determinadas
mulher no âmbito das relações domésticas; pessoas (muito embora o ordenamento jurídico
z Nos crimes contra a Administração Pública; afirme que todos são iguais perante a lei, existem
z Nos delitos de transmissão clandestina de sinal de determinadas funções que concedem prerrogati-
internet via radiofrequência. vas a determinadas pessoas frente à aplicação da
lei penal, como, por exemplo, os parlamentares,
conforme veremos mais adiante). 9
Assim sendo, nossos próximos passos serão estu- z Retroatividade
dar a eficácia da lei penal no tempo e no espaço. Nas
próximas páginas, conheceremos os princípios que Observe o art. 2º, do Código Penal:
regem a aplicação da lei penal nestas duas dimen- Art. 2º Ninguém pode ser punido por fato que
sões: quanto ao lugar (espaço), veremos que se aplica lei posterior deixa de considerar crime, cessan-
o princípio da ubiquidade, e, em relação ao tempo, o do em virtude dela a execução e os efeitos penais da
princípio da atividade. sentença condenatória.
Um mnemônico que resume os dois princípios que Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer
iremos estudar é: L. U. T. A. (Lugar, Ubiquidade, Tem- modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos
po, Atividade). anteriores, ainda que decididos por sentença
condenatória transitada em julgado.
A LEI PENAL NO TEMPO
O art. 2º refere-se apenas à retroatividade, uma vez
Eficácia da Lei Penal no Tempo que está analisando a aplicação da lei penal tomando por
base a data do fato delituoso. Assim, temos duas situações:
Uma lei penal ingressa no ordenamento jurídico
quando o seu processo legislativo é completo e perfei- z Ou se aplica a regra do tempus regit actum, se for
to, e assim passa a vigorar até que, então, outra norma, mais benéfico;
de igual natureza, a revogue. Em outras palavras, a lei z Ou se aplica a lei posterior (aquela que entra em
penal nasce (é sancionada, promulgada e publicada), vigor após outra) se esta for mais benigna (retroa-
tem seu tempo de vida (vigência) e morre (é revogada). tividade). A lei posterior mais benéfica é chamada
A revogação de uma lei pode ser expressa (quan- também de lex mitior.
do lei posterior textualmente afirma que a lei ante-
rior não mais produz efeitos) ou tácita (quando não Deste modo, em casos de edição de lei nova que seja
há revogação expressa, mas a nova lei é incompatível mais benéfica ao acusado, esta deverá retroagir, de modo
com a anterior ou regula totalmente a matéria que que alcance os fatos praticados antes da sua vigência.
constava na lei mais antiga). Observe as duas situações no fluxograma a seguir:
Podemos falar ainda em revogação parcial ou
global. A revogação parcial dá-se quando parte dos RETROATIVIDADE BENÉFICA
dispositivos deixam de ser aplicáveis. Já a revogação
global ocorre quando a lei regula a matéria em sua
Nova lei em
totalidade ou a lei penal passa a não ser mais aplicável Fato Sentença
vigor
de modo algum.

z Regra Geral LEI “A”


LEI “B”
Se esta for mais bené-
Se esta for mais favo-
A regra geral é que a lei regula todas as situações fica, adota-se a regra
rável, usa-se Retroati-
da Atividade
ocorridas entre a sua entrada em vigor e sua revoga- (tempus regit actum)
vidade Benéfica
ção (tempus regit actum). Esse fenômeno jurídico é
chamado de atividade.
Cabe salientar ainda que a regra geral decorre dos Vejamos um exemplo para melhor fixar o expos-
princípios da legalidade e da anterioridade, ou seja, a to anteriormente: imagine que um indivíduo pratica
lei penal somente será aplicada quando já era vigen- um fato delituoso em 10 de fevereiro de 2021. Naquela
te antes do cometimento do crime, e ainda é vigente data, encontra-se em vigor a Lei “A”, que prevê a pena
quando ocorrer o julgamento do fato. É o que define o mínima de 4 anos de reclusão para o crime. No entan-
art. 1º, do Código Penal: to, em 10 de março do mesmo ano, entra em vigor a
Lei “B”, que comina a pena mínima de 2 anos de reclu-
Art. 1º Não há crime sem lei anterior que o defina. são para o mesmo delito.
Não há pena sem prévia cominação legal. Qual delas deve o juiz utilizar ao proferir a senten-
ça? Neste caso, o magistrado deve aplicar a Lei “B”,
Se, excepcionalmente, a lei regula situações fora por ser mais favorável ao réu (a Lei “B”, embora não
de seu período de vigência, teremos o fenômeno da estivesse em vigor na data do fato, volta no tempo,
extratividade. retroagindo para beneficiar o agente).
Observe que, no exemplo dado, a lei posterior
z Extratividade da lei penal (Lei “B” é mais favorável ao agente). No entanto, a
lei posterior pode entrar em conflito com a anterior
A extratividade dá-se de duas formas: quando a de maneiras diferentes, gerando situações diversas.
lei regula situações ocorridas antes de sua vigên- Para solucionar cada uma delas, o CP aponta algumas
cia (passado), neste caso, chamamos a extratividade regras que são aplicadas conjuntamente com os prin-
de retroatividade; e quando, por outro lado, a lei se cípios constitucionais que vimos anteriormente. São
aplica mesmo depois de cessada sua vigência (futu- quatro diferentes situações:
ro), teremos a ultratividade.
Importante: a regra é a atividade da lei penal, ou z Abolitio criminis ou Novatio Legis ou Lei
seja, sua aplicação se dá somente durante seu período supressiva de incriminações
de vigência. Como exceção, temos a extratividade da
lei penal mais benéfica, ou seja, sua aplicação é para A abolitio criminis é uma lei nova que revoga a
regular situações passadas (retroatividade) ou futu- norma incriminadora e torna o fato antes criminoso,
10 ras (ultratividade) um fato atípico. Esse instituto encontra previsão no
art. 2º, do CP, nos termos: “ninguém pode ser punido outros. De acordo com o inciso XL, art. 5º, CF, e
por fato que lei posterior deixa de considerar crime”. caput do art. 2º, CP, retroage para favorecer o
A abolitio criminis alcança os fatos praticados com agente, aplicando-se aos fatos anteriores “ain-
ou sem julgamento final, podendo ocorrer: curso do da que decididos por sentença condenatória
processo, no curso da execução da pena e após cum- transitada em julgado”. A lei mais benéfica
prida a pena. Na hipótese de ocorrer no curso do pro- recebe o nome de lex mitor;
cesso ou na execução da pena, estes deverão cessar, „ Novatio legis in pejus: ocorre quando a lei
tendo em vista que o fato deixou de ser considerado posterior, sem criar novo tipo incriminador, de
criminoso. Já no caso de ocorrer após o cumprimento qualquer modo agrava a situação do agente (in
da pena, os efeitos que da pena decorram deverão ser pejus). Por exemplo, aumenta a pena, ou impõe
cessados (não caracterizará reincidência e maus ante- uma forma de execução mais severa (hipoteti-
cedentes, por exemplo). camente instituindo o mesmo rigor inicial da
Cabe destacar, ainda, que somente os efeitos penais reclusão ao cumprimento dos crimes apenados
da sentença condenatória serão atingidos, ou seja, não com detenção).
cessam os efeitos civis e administrativos (quanto aos
efeitos, veremos mais adiante quando tratarmos de Nesta hipótese, a lei melhor (lex mitior) passa a ser
efeitos da condenação.) a lei anterior. A lei mais severa recebe o nome de lex
gravior (lei mais grave). Tem como consequências: em
„ Consequências da abolitio criminis: por for- relação à lei nova, aplica-se os princípios da irretroa-
ça da retroatividade (inciso XL, art. 5º, CF, e tividade da lei mais severa. Quanto à lei antiga, mais
caput do art. 2º, CP), aplica-se a lei nova. Ocorre benéfica, aplica-se a ultratividade;
a extinção da punibilidade (é, pois, causa extin-
tiva da punibilidade, conforme o inciso III, art. „ Novatio legis incriminadora: dá-se quando
107, CP). Os agentes que estiverem sendo pro- a lei nova cria um tipo incriminador, conside-
cessados terão seus processos extintos, já os rando infração uma conduta considerada irre-
que ainda não tiverem sido denunciados terão levante pela lei anterior. Por exemplo, a Lei nº
seus inquéritos trancados. 10.224, de 2001, introduziu no Código Penal o
art. 216-A, e criou o tipo de assédio sexual no
Dica ordenamento jurídico brasileiro. Tem como
consequências: a nova lei gravosa é irretroati-
Para que haja a abolitio criminis, é necessário va (art. 1º, CP).
que ocorra a revogação total do tipo formal e a
supressão material do fato criminoso. A condu- z Ultratividade
ta típica não pode mais existir no ordenamento
jurídico. Veja que o texto do Código Penal não menciona a
Atenção: Não confunda abolitio criminis com o ultratividade, ou seja, a possibilidade de o juiz apli-
princípio da continuidade normativa-típica. Nes- car uma lei já revogada. No entanto, essa aplicação
te, após a revogação do tipo penal, ocorre um pode ocorrer na sentença, se esta for mais benéfica e
deslocamento do crime para outro dispositivo. vigente à época do fato criminoso.
Como exemplo do princípio da continuidade nor- Veja o seguinte exemplo: em 10 de fevereiro de
mativa-típica, podemos citar o antigo crime do 2021, encontra-se em vigor a Lei “A”, que prevê a pena
art. 214, do CP (crime de atentado violento ao mínima de 2 anos de reclusão para determinado cri-
pudor), que teve sua conduta realocada para o me; em 10 de março do mesmo ano, entra em vigor a
Lei “B”, que comina a pena mínima de 4 anos de reclu-
art. 213, do CP (crime de estupro). Neste caso,
são para o mesmo delito. Em 10 de agosto, ao senten-
não ocorreu a descriminalização da conduta,
ciar, o juiz deve utilizar a Lei “A”, já revogada, pois,
apenas um deslocamento do tipo penal.
por se tratar de lei mais benéfica, torna-se ultrativa.
Observe tal fenômeno no fluxograma a seguir:
Existe também a possibilidade de que a descrimi-
nalização de uma conduta penal seja de modo transi-
tório, é a chamada abolitio criminis temporalis.
Esta hipótese teve destaque com a Lei nº 10.826,
de 2003 (Estatuto do Desarmamento), que autorizou
a extinção da punibilidade para os crimes de posse e
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

porte ilegal de arma de fogo, para aqueles que rea-


lizassem a entrega voluntária das armas dentro dos
10/02/2021 Prática do fato 10/03/2021 Sentença 10/08
prazos estabelecidos na lei. É o que dispõe o art. 32, do
Lei “A” Lei “B” Aplica-se a lei “A” por
Estatuto: “Os possuidores e proprietários de arma de
Pena: 2 anos Pena: 4 anos ser mais benéfica
fogo poderão entregá-la […] e, presumindo-se de boa-fé,
serão indenizados […], ficando extinta a punibilidade
De quem é a competência para aplicar a lei poste-
de eventual posse irregular da referida arma.”
rior favorável? Antes de o juiz proferir a sentença, não
„ Novatio legis in mellius: é a lei nova (nova- há dificuldade: cabe ao juiz de 1º grau sua aplicação;
tio legis) que, sem excluir a incriminação, ou em grau de recurso, a competência é do Tribunal; e se
seja, sem constituir abolitio criminis, é mais já transitada em julgado a sentença, a competência é
favorável ao agente (in mellius). Por exem- do juiz da execução penal, de acordo com o inciso I,
plo, quando comina pena mais branda, inclui art. 66, da Lei de Execução Penal (LEP). Este é o posi-
atenuantes, permite a obtenção de benefícios cionamento majoritário da doutrina e jurisprudência
como a sursis e o livramento condicional, entre (Súmula n° 611, do STF). 11
Todas as situações que vimos acima podem ser Posto isso, rege o art. 3º, do Código Penal, que, mes-
resolvidas pela seguinte regra: a Lei só retroage para mo cessadas as circunstâncias que a determinaram
beneficiar o sujeito. No entanto, como saber qual das (lei excepcional) ou decorrido o período de sua dura-
leis em conflito é a mais favorável ao agente? Para ção (lei temporária), é possível aplicá-las aos fatos pra-
avaliar a mais benéfica, o juiz deve sempre apreciar ticados durante sua vigência.
o caso concreto sob a eficácia de cada uma das leis em Desta forma, são leis ultrativas, isso porque regu-
conflito, comparando o resultado: o que mais favore- lam atos praticados durante sua vigência, mesmo
cer o agente deve prevalecer. após sua revogação.
Ultratividade: as leis de vigência temporária
Lei Intermediária
(excepcionais e temporárias) são ultrativas, no sen-
tido de continuarem a ser aplicadas aos fatos pratica-
O que acontece se houver uma lei intermediária,
dos durante a sua vigência mesmo depois de sua auto
ou seja, que entrou em vigor depois da data do fato
revogação.
e foi revogada antes da sentença? Neste caso, deve
ser aplicada em favor do réu a mais favorável delas,
mesmo que for a intermediária (também chamada de Normas Penais em Branco e Direito Intertemporal
intermédia) e não a última.
Este assunto é interessante, pois diz respeito à alte-
Combinação de Leis ração do complemento da norma penal em branco.
Primeiro vamos entender o que é norma penal
O que acontece se houverem várias leis sucessivas em branco e ver algumas particularidades a ela rela-
e cada uma delas tem uma parte, um aspecto, mais cionadas para depois vermos sua relação com o fator
favorável ao sujeito? É possível combinar várias leis, “tempo”.
criando uma “terceira lei” para beneficiar o agente? Norma penal em branco ou cega pode ser defini-
Segundo a maior parte da doutrina, não, por violar o da como uma lei penal incriminadora que possui um
princípio da legalidade. elemento indeterminado no que diz respeito à des-
O STF firmou entendimento pela impossibilidade crição da conduta. Lembre-se de que a norma penal
da combinação de leis, devendo ser avaliados os bene- incriminadora estabelece uma conduta (uma ação ou
fícios e prejuízos de forma separada, e, assim, aplica- omissão) em seu preceito primário e uma sanção
da na íntegra a lei escolhida como mais benéfica. penal em seu preceito secundário. Quando um tipo
O STJ também se posicionou de modo semelhante penal traz seu preceito primário incompleto, preci-
por meio da Súmula n° 501, que dispõe:
sando ser complementado por outra norma, estamos
diante de uma norma penal em branco ou cega.
Súmula n° 501 (STJ) É cabível a aplicação retroati-
va da Lei n° 11.343, de 2006, desde que o resultado
Veremos dois exemplos de norma penal em bran-
da incidência das suas disposições, na íntegra, seja co, o primeiro constante no art. 237, do Código Penal,
mais favorável ao réu do que o advindo da aplica- e o outro no art. 33, da Lei de Drogas:
ção da Lei n° 6.368, de 1976, sendo vedada a com-
binação de leis. Conhecimento prévio de impedimento

Posto isso, podemos observar que ambas as posi- Art. 237 Contrair casamento, conhecendo a exis-
ções, tanto do STJ quanto do STF, vedam a combinação tência de impedimento que lhe cause a nulidade
de leis. absoluta:
Pena - detenção, de três meses a um ano.
Leis Temporárias e Excepcionais
Aqui, o dispositivo penal não esclarece o que é
A regra da retroatividade benéfica não se aplica
“impedimento que lhe cause nulidade absoluta”. O
no caso das chamadas leis intermitentes (leis tem-
complemento, neste caso, deve ser buscado em fonte
porárias e leis excepcionais). Veja o art. 3º, CP:
legislativa de igual hierarquia (Lei): o branco do art.
237, CP, é complementado pelas hipóteses de impedi-
Art. 3º A lei excepcional ou temporária, embora
decorrido o período de sua duração ou cessadas as mento tratadas pelo Código Civil, em seu art. 1.521.
circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao Este caso é o que se chama de norma penal em bran-
fato praticado durante sua vigência. co em sentido lato ou imprópria ou homogênea:
a complementação do preceito primário faz-se com
z Lei Excepcional: é aquela feita para vigorar em auxílio de uma lei.
épocas especiais, como guerra, calamidade etc. É Norma penal em branco é um assunto dos mais
aprovada para vigorar enquanto perdurar o perío- cobrados em concursos. É importante guardar não
do excepcional. São facilmente identificáveis por só suas relações com o direito temporal, mas também
expressões como “esta lei terá vigência enquanto suas classificações. Assim, vamos incluir mais três em
durar o estado de calamidade pública”; nosso vocabulário jurídico-penal:
z Lei Temporária: é aquela feita para vigorar por
determinado tempo, estabelecido previamente na z Norma Penal em Branco em Sentido Lato Homo-
própria lei. Assim, a lei traz em seu texto a data de vitelina: o complemento encontra-se no mesmo
cessação de sua vigência (termo final). Um exem- diploma legal da norma incompleta (exemplo:
plo de lei temporária é a Lei nº 12.663, de 2012, vários tipos do Código Penal tratam de crimes
denominada Lei Geral da Copa, que criou tipos cometidos por funcionário público; o conceito de
penais que duraram até o dia 31 de dezembro de funcionário público é encontrado no art. 327, do
12 2014. próprio CP);
z Norma Penal em Branco em Sentido Lato Hete- substância da norma complementar, como ficaria a
rovitelina: o complemento está em diploma legal situação do agente?
diferente do da norma incompleta (exemplo: o art. Neste caso, acontecerá a retroatividade benéfica,
237, CP, fala em impedimento que cause a nulidade descriminalizando o comportamento, por força da
absoluta do casamento; o complemento encontra- abolitio criminis. Veja que o fato passa a ser atípico
-se no Código Civil — CC); não pela revogação da Lei que considerava o fato típi-
z Quando o complemento é dado por uma norma co, mas sim por conta de seu complemento.
constante da CF, temos a chamada norma penal Tal foi o que ocorreu no caso do art. 237, do CP. O
em branco de fundo constitucional (exemplo: o Código Civil de 1916, em seu inciso VII, art. 183, previa
art. 246, do CP, que fala em “idade escolar”; tal con- que um dos impedimentos absolutamente dirimentes
ceito encontra-se no inciso I, art. 208, CF). era o casamento do cônjuge adúltero com o corréu
condenado por tal crime. No entanto, o Código Civil de
Agora, veja o caso da Lei n° 11.343, de 2006 (Lei de 2002 não trouxe tal impedimento, ocorrendo, pois, abo-
Drogas): litio criminis, que retroagiu em favor de eventuais réus.
A retroação benéfica, por outro lado, não ocor-
Art. 33 Importar, exportar, remeter, preparar, pro- re quando se tratar de complementos que tenham
duzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, ofe- caráter excepcional ou temporário, como foi o caso,
recer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, por exemplo, da Lei nº 1.521, de 1951, a Lei de Crimes
guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo
Contra a Economia Popular: o comerciante que fosse
ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem
flagrado vendendo produto com preço acima do que
autorização ou em desacordo com determinação
legal ou regulamentar: constasse em tabela oficial respondia pelo ato, ainda
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e que o congelamento, com a respetiva revogação da
pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e qui- tabela, se encerrasse antes da conclusão do inquérito
nhentos) dias-multa. policial ou do processo penal.

No caso do art. 33, da Lei de 11.346, de 2006, o dis- Do Tempo do Crime


positivo não define o que são “drogas”, nem o que seja
“sem autorização legal ou em desacordo com determi- Como vimos anteriormente, logo em seus primei-
nação legal ou regulamentar”. A definição de quais ros artigos, o Código Penal se preocupa em tratar da
substâncias são ilícitas é encontrada em Portaria da aplicação da lei penal no tempo. Mas qual a importân-
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) cia de se conhecer o tempo do crime?
que, por ser fonte legislativa hierarquicamente infe- Determinar o tempo do crime é essencial, em
rior, é denominada norma penal em branco em sen- primeiro lugar, para saber qual lei será aplicada
tido estrito ou própria ou heterogênea. no caso concreto. Da mesma forma, é imprescindí-
Por outro lado, temos a chamada norma penal em vel para verificar a imputabilidade do agente (que
branco ao revés, invertida, inversa ou ao avesso pode ser menor de 18 no momento da conduta), fixar
quando o complemento necessário se refere à sanção as circunstâncias do tipo penal, verificar a prescri-
(preceito secundário). Um exemplo de norma penal ção, dentre outros aspectos.
em branco ao revés é o tipo do crime de genocídio, Existem três teorias que podem ser consideradas
previsto na Lei nº 2.889, de 1956, que apresenta um para se determinar o tempo do crime:
branco em relação à pena, sendo necessário recorrer
a outras leis para completar tal branco. Pode aconte-
TEORIA DA Considera-se praticado o crime no
cer de o próprio complemento da norma incompleta
ATIVIDADE momento da conduta
necessitar de outro complemento, ou seja, é preciso
uma dupla complementação. Neste acaso, temos o TEORIA DO Considera-se praticado o crime no
que se usa chamar de normal penal em branco ao RESULTADO momento do resultado
quadrado.
Ainda em relação às normas penais em branco, TEORIA MIS- Considera-se praticado o crime
vale a pena lembrar que é importante saber diferen- TA OU DA tanto no momento da conduta
ciá-las dos tipos penais abertos. O tipo penal aber- UBIQUIDADE quanto no momento do resultado
to, assim como na norma em branco, é uma norma
incompleta que necessita de complementação. A O Direito Penal brasileiro adotou, em relação
diferença, no entanto, é que no tipo penal aberto a ao tempo do crime, a teoria da Atividade, por isso,
complementação é feita por meio de um juízo de valo-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

considera-se praticado o crime no momento da


ração realizado pelo juiz, isto é, o complemento vem conduta (ação ou omissão), ainda que outro seja o
da valoração feita pelo magistrado e não de uma outra momento do resultado (art. 4º, CP).
norma.
Agora que já vimos o conceito de norma penal em Art. 4º Considera-se praticado o crime no momen-
branco e suas particularidades, vamos fazer uma rela- to da ação ou omissão, ainda que outro seja o
ção dela com a questão do direito no tempo. momento do resultado.
Vamos voltar ao exemplo do art. 33, da Lei nº
11.343, de 2006 (tráfico ilícito de drogas). O que ocor- Ilustrando: imagine que determinada pessoa, nas-
reria, por exemplo, se houvesse a retirada de certa cida em 20 de março de 2000, tenha entrado em dis-
substância psicoativa da portaria da ANVISA, que cussão com seu nefasto e realizado disparos de arma
define as drogas para efeito da Lei nº 11.343? de fogo contra ele no dia 19 de março de 2018, vin-
Imagine um sujeito que é pego vendendo a dro- do a vítima a ser hospitalizada e falecer no dia 21 de
ga “X”, que consta na Portaria, e passa a responder março de 2018 em razão dos ferimentos. Neste caso,
pelo crime de tráfico de drogas. Com a retirada da tendo em vista que o CP adota a teoria da atividade, 13
o tempo do crime será determinado no instante da mediante duas ou mais condutas, sendo que, pelas
ação (momento dos tiros) e não no momento do resul- condições de tempo, lugar, modo de execução, são
tado. Tendo isso em vista, como o agente era, à época tidos uns como continuação dos outros.
da ação, menor de 18 anos, ainda que a vítima mor- Por exemplo, um empregado de uma loja de fer-
ra depois do atirador ter completado a maioridade ramentas, visando subtrair um kit de ferramentas do
penal, ele não poderá responder criminalmente pelo estabelecimento, resolve furtar uma ferramenta por
ato, e sim responderá pela prática de ato infracional. dia, até ter em suas mãos o kit completo. Sessenta dias
Veja o esquema a seguir, como exemplo: depois, o sujeito vai conseguir completar o conjunto e
vai ter cometido 60 furtos.
Considera-se Não fosse a regra benéfica do art. 71, do CP, a pena
praticado o mínima neste caso somaria 120 anos de reclusão.
crime no tempo
da conduta Reconhecendo-se a ocorrência de crime continuado,
(TEORIA DA ocorrerá a chamada exasperação: no nosso exemplo
ATIVIDADE, Art.
4º) específico, será aplicada ao agente a pena de um só
dos furtos aumentadas de 1/6 até 2/3. No entanto, não
nos interessa, neste momento, ingressar no tema do
Conduta Resultado crime continuado, basta-nos apenas a noção do fenô-
meno para que possamos discutir a questão do tempo
Prática do fato Vítima Maioridade do Morte da vítima do crime quando de sua ocorrência.
(ação) Hospitalizada autor Assim sendo, temos que a mesma regra aplicável
21/03/2018
19/03/2018 20/03/2018
ao crime permanente (Súmula n° 711, do STF) deve
ser aplicada ao crime continuado, com uma ressalva
quanto às condutas praticadas pelos menores de 18
Importante! anos, por força do art. 228, da CF, que determina sua
inimputabilidade: na hipótese de um sujeito cometer
A teoria adotada pelo CP, em relação ao tempo quatro furtos, possuindo 17 anos quando do come-
do crime, é a teoria da atividade. Leva-se em con- timento dos dois primeiros, e já 18, no momento da
ta, pois, o momento da conduta (ação ou omis- prática dos dois últimos, somente estes dois é que ser-
são), pouco importando o instante do resultado. virão para constituir o crime continuado.

Tempo do Crime e Conflito Aparente de Normas


É na data da conduta, portanto, que:
O conflito aparente de normas (ou concurso apa-
z Se verifica a imputabilidade penal: no nosso rente de normas) se estabelece quando duas ou mais
exemplo, o fato de ser o autor, maior ou menor de normas aparentemente são aplicáveis ao mesmo fato.
18 anos; Por exemplo: um sujeito resolve importar, via cor-
z Se fixam as circunstâncias do crime: qualifica- reio, uma determinada substância entorpecente. Num
doras, causas de aumento ou diminuição de pena, primeiro momento, pode parecer que se aplique ao
agravantes ou atenuantes (como, por exemplo, ser caso o previsto no art. 334, do Código Penal, que trata
a vítima criança ou maior de 60 anos, que contam
do crime de contrabando. Ocorre que o mesmo fato
como agravantes; ou ser o autor menor de 21 anos,
está previsto no art. 33, da Lei de Drogas. Assim, as
o que vai servir como atenuante).
duas normas parecem ser aplicáveis ao mesmo fato.
No entanto o conflito é apenas aparente, uma vez
Tempo do Crime nas Infrações Permanentes e
que a própria lei apresenta mecanismos para sua
Continuadas
solução: no caso do nosso exemplo, aplica-se o art. 33,
da Lei de Drogas (tráfico ilícito de drogas), por se tra-
Nestes casos, será aplicada regra especial, que
tar de lei especial (o tráfico internacional de drogas
consta na Súmula n° 711 do STF.
distingue-se do contrabando porque refere-se, espe-
cificamente, a um determinado tipo de mercadoria
Súmula n° 711 (STF) A lei penal mais grave apli-
proibida, a droga. O mesmo ocorre com o tráfico de
ca-se ao crime continuado ou ao crime perma-
nente, se a sua vigência é anterior à cessação armas, previsto no Estatuto do Desarmamento).
da continuidade ou da permanência. Note, o conflito é apenas aparente, pois somente
uma delas acaba regulamentando o fato, afastan-
Crime permanente é aquele cuja consumação do as demais.
se prolonga no tempo pela vontade do sujeito ativo, Para que ocorra o conflito aparente de normas,
como ocorre no caso de um sequestro. Neste caso, é devem estar presentes dois pressupostos:
considerado tempo do crime todo o período em que
se desenrolar a atividade criminosa. Assim sendo, se z Unidade de fato, ou seja, a existência de uma única
um sequestrador, menor de 18 anos quando do início infração penal (por exemplo: uma morte);
da prática do crime, atinge a maioridade ainda com o z Pluralidade de normas identificando o mesmo fato
delito em curso, é considerado imputável para os fins como delituoso, isto é, duas ou mais normas pre-
penais. tensamente regulando o mesmo fato criminoso.
Por sua vez, crime continuado é uma ficção jurí-
dica criada para beneficiar o réu, prevista no art. 71, A solução dá-se pela aplicação de alguns princí-
do CP, e será estudado mais adiante. Por enquanto, pios que vamos ver a seguir (chamados de princípios
basta saber que o crime continuado ocorre quando o que solucionam o conflito aparente de normas).
14 agente pratica dois ou mais crimes da mesma espécie,
Os princípios que solucionam o conflito aparen- z Sob a influência do estado puerperal;
te de normas são quatro, veja-os a seguir: z O próprio filho;
z Durante o parto ou logo após.
z Especialidade;
z Subsidiariedade; Assim, estando presentes os especializantes, o
z Consunção (ou absorção); tipo genérico é preterido pelo especial, a fim de
z Alternatividade (este último não é unânime entre que se evite a dupla punição (bis in idem). Em outras
os autores, conforme veremos ao estudá-lo). palavras, no conflito aparente entre norma geral e
norma especial, afasta-se a geral e aplica-se a especial.
Antes de verificar se há leis concorrentes, deve-se Note que no exemplo apresentado, ambos os dis-
analisar se não é o caso da ocorrência de sucessão tem- positivos se encontram dispostos na mesma lei (CP).
poral de leis. Ou seja, a primeira “peneira” a ser feita Pode ocorrer, no entanto, de estarem contidos em leis
é verificar se não se trata de conflito de leis no tempo, distintas, como nos exemplos a seguir. Observe, res-
que são solucionados pelo princípio de que lei posterior pectivamente os tipos penais do homicídio culposo,
revoga lei anterior (lex posterior derogat priori). previsto no Código Penal, e o homicídio culposo na
Por exemplo, a Lei “A” regra determinada situa- direção de veículo automotor, que consta do Código
ção; Lei “B”, posterior, revogando a lei mais antiga, de Trânsito Brasileiro (CTB):
passa a viger tratando do mesmo conteúdo; neste caso
não há conflito aparente de normas, mas sim aplica- Código Penal
ção das regras relativas à lei penal no tempo vistas
anteriormente. Art. 121 Matar alguém:
Uma corrente minoritária de autores inclui a [...]
sucessão temporal de leis como um princípio de solu- Homicídio culposo
ção do conflito aparente de normas (como é o caso do § 3º Se o homicídio é culposo (Vide Lei nº 4.611, de
Prof. Guilherme Nucci, que o apresenta como “critério 1965)
Pena – detenção, de um a três anos.
da sucessividade”).
Vamos, agora, analisar detalhadamente cada um
Código de Trânsito Brasileiro (CTB)
deles.
Art. 302 Praticar homicídio culposo na direção de
Princípio da Especialidade veículo automotor.

Lei especial que afasta a aplicação de lei geral (lex Pode ocorrer, também, que a relação entre norma
specialis derogat generali), como, a propósito, encon- geral e especial ocorra “dentro” de determinados cri-
tra-se previsto no art. 12, do Código Penal: mes que apresentem um tipo simples e formas típicas
qualificadas ou privilegiadas. Assim, o tipo funda-
Art. 12 As regras gerais deste Código aplicam-se mental é excluído pelo qualificado ou privilegiado,
aos fatos incriminados por lei especial, se esta não que deriva daquele. Nesses termos, o furto simples
dispuser de modo diverso (caput, art. 155) é excluído pelo privilegiado (§ 2º, art.
155); o estelionato simples (caput, art. 171) é excluído
Uma norma penal incriminadora (que descreve pelo qualificado (§ 3º, art. 171) etc.
crimes e comina penas) é especial em relação à outra
quando: Princípio da Subsidiariedade (Tipo de Reserva)

z Possui em sua definição legal todos os elementos Uma norma é considerada subsidiária em relação
típicos que constam na geral; à outra quando a conduta nela prevista (de menor
z Apresenta mais alguns elementos (de natureza gravidade) integra o tipo da principal (que descreve o
objetiva ou subjetiva), chamados de especializan- fato de forma mais abrangente). Neste caso, a lei prin-
tes, que a tornam mais ou menos severa do que a cipal afasta a aplicação de lei secundária (lex primaria
geral. derogat subsidiariae), justamente porque esta última
cabe dentro dela.
Vamos exemplificar. O tipo penal do homicídio Ou seja, a figura típica subsidiária (chamada pelo
simples, descrito a seguir, é lei geral: grande penalista brasileiro Nelson Hungria de “solda-
do de reserva”) é parte da principal, estando nela con-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Homicídio simples tida. Observe que não se trata de ser especial, mas sim
mais ampla. Veja os exemplos a seguir:
Art. 121 Matar alguém.
z O crime de ameaça (art. 147, CP) é subsidiário
Compare com o tipo penal do infanticídio, outro (cabe) no delito de constrangimento ilegal median-
dos crimes contra a vida: te ameaça (art. 146). Este, por sua vez, é subsidiá-
rio ao crime de extorsão (art. 158. CP);
Infanticídio z O crime de disparo de arma de fogo (art. 15, da Lei
nº 10.826, de 2003), encaixa-se no crime de homi-
Art. 123 Matar, sob a influência do estado puerpe- cídio cometido com disparo de arma de fogo (art.
ral, o próprio filho, durante o parto ou logo após. 121, CP).

O infanticídio (crime específico) é lei especial em Veja que há um só fato. No exemplo da morte cau-
relação ao homicídio (crime genérico), uma vez que sada por disparo de arma de fogo, o fato (disparo que
contém mais elementos: acaba matando) é maior do que a norma subsidiária 15
(mero disparo), só podendo, portanto, se encaixar na Os fatos menos amplos e menos graves servem como
norma principal (mais ampla). preparação ou execução ou mero exaurimento.
A subsidiariedade apresenta-se nas seguintes Ou seja, ocorre a consunção ou absorção, quando:
formas:
z Um fato definido por uma norma incriminadora é
z Expressa ou explícita: ocorre quando a própria meio necessário ou fase normal de preparação ou
norma indica expressamente em seu texto seu execução de outro crime;
caráter subsidiário, ou seja, afirma que só será z Quando constitui conduta anterior ou posterior do
aplicada se não for o caso da aplicação de outra, de agente, cometida com a mesma finalidade prática
maior gravidade. Esta é mais simples de ser iden- relativa ao crime que absorve.
tificada, sendo reconhecida por expressões tais
como “se o fato não constituir crime mais grave”. A consunção tem várias aplicações: a tentativa
é absorvida pela consumação; a participação, pela
Um exemplo é o delito de perigo para a vida ou coautoria; e o porte de arma é absorvido no homicídio
saúde de outrem: o art. 132, do CP, descreve em seu quando a arma é adquirida e portada com a finalida-
preceito secundário a pena de detenção, de três meses de de matar a vítima.
a um ano, “se o fato não constitui crime mais grave”. É utilizada, também, no crime progressivo (aque-
Ou seja, a lei explicitamente indica que o art. 132 só le no qual o agente possui um só desígnio, mas, para
é aplicável se o fato não constituir crime mais grave, alcançar o resultado mais grave, passa pelo menos
como a tentativa de homicídio, o perigo de contágio de grave). Em outras palavras, é quando o agente des-
moléstia grave e o abandono de incapaz, entre outros. de o início quer alcançar o resultado mais grave, e o
São outros exemplos de subsidiariedade expressa no § busca, por meio de atos sucessivos e crescentes, como
3º, art. 129, e nos arts. 238, 239 e 307, todos do CP, e os por exemplo no caso do homicida que deseja matar a
arts. 21, 29 e 46, da Lei de Contravenções Penais (LCP). vítima cortando as partes do corpo, embora cometa
várias ações, sua intenção é matar a vítima e, assim,
z Tácita ou implícita: neste caso, a norma nada fala. reponde por um único crime de homicídio qualificado.
No entanto, o fato incriminado na norma subsidiá- Outra aplicação da consunção se dá na progres-
ria serve como elemento componente ou agravan- são criminosa, ou seja, quando o agente possui um
te especial da norma principal, como, por exemplo, dolo inicial e, no mesmo contexto fático, resolve subs-
no caso do estupro (norma principal) que contém tituir o desígnio, como, por exemplo, quando o sujeito,
o constrangimento ilegal (norma subsidiária), e do desejando causar lesões à vítima, corta seus dedos. No
furto qualificado pelo arrombamento, que contém entanto, no mesmo momento, muda de ideia e resolve
o dano (o constrangimento ilegal é subsidiário de matar o ofendido com um tiro na cabeça. Neste caso, o
todos os crimes que têm como meio de execução a agente responde pelo homicídio, ficando as lesões cor-
violência física ou a grave ameaça; o dano, por sua porais absorvidas (se não fossem no mesmo contexto
vez funciona como circunstância qualificadora do fático, como por exemplo no caso do agente que mata
furto). Outro exemplo é a omissão de socorro (art. a vítima um mês após causar-lhe lesões, haveria, por
135, CP) que serve como qualificadora do homicí- outro lado, concurso de crimes, respondendo o agente
dio culposo (§ 4º, art. 121, CP). pelos dois delitos).
Duas outras aplicações do princípio se dão nos
Na prática, o princípio da subsidiariedade acaba chamados ante factum impunível e no post factum
por gerar os mesmos resultados do princípio da espe- impunível. No primeiro caso, podemos citar, como
cialidade. No entanto, trata-se de institutos diferentes. exemplo, o agente que toca o corpo da vítima e, na
A distinção pode ser feita de duas maneiras: mesma linha de desdobramento, pratica a conjun-
ção carnal: responde pelo estupro, ficando os toques
z Na especialidade: há relação entre o fato descrito absorvidos. Já no caso do fato posterior não punível, o
pela norma genérica e o estabelecido pela especial exemplo clássico é o do sujeito que furta determinada
(relação de gênero e espécie). Na subsidiariedade coisa e em seguida a destrói: vai responder somente
não existe essa relação; pelo furto.
z Na subsidiariedade: quando se afasta a incidên- Em relação ao princípio da consunção, duas ques-
cia da norma primária a pena do tipo subsidiário tões são recorrentes em concursos:
pode ser aplicada, como um “soldado de reserva” e
aplicar-se pelo residuum. z A primeira diz respeito ao porte ilegal de arma
de fogo, disparo de arma de fogo e homicídio
Para fixar o entendimento, vamos ilustrar o princí- doloso: se tudo ocorreu no mesmo contexto fático
pio da subsidiariedade: (mesmo desdobramento, ou seja, o agente só por-
tou irregularmente a arma e a disparou pois tinha
z Lei principal (é o todo). a intenção de matar alguém), o homicídio absorve
Ex.: Extorsão mediante sequestro (art. 159). os anteriores;
z A segunda é relacionada aos crimes de falsida-
z Lei subsidiária (é parte). de e estelionato: neste caso, basta observar o que
Ex.: Sequestro e cárcere privado (art. 148). dispõe a Súmula n° 17, do STJ: quando o sujeito fal-
sifica documento para aplicar um golpe, o estelio-
Princípio da Consunção ou Absorção nato (crime-fim) absorve o falso (crime-meio).

Trata-se do princípio segundo o qual o fato previs- E lembre-se: em qualquer situação, para que haja
to por uma lei está, igualmente, contido em outra de consunção é imprescindível que os fatos de deem den-
16 maior amplitude, aplicando-se somente esta última. tro do mesmo contexto.
A figura utilizada para fazer referência ao princí- Como regra, o Brasil adota o princípio da territo-
pio da consunção é da de um peixão, que engole um rialidade temperada e 4 outros princípios como exce-
peixinho que engole o girino: isto é, o homicídio absor- ção. Vejamos tais princípios:
ve as lesões graves, que absorvem as lesões leves, que,
por sua vez, absorvem as vias de fato. z Real, de proteção ou da defesa: inciso I, § 3º, art.
7º, do CP (exceção: extraterritorialidade). A lei
Princípio da Alternatividade penal leva em conta a nacionalidade do bem jurí-
dico lesado pelo delito, sem se importar com local
O último dos princípios é o da alternatividade e de sua prática ou da nacionalidade do sujeito ativo;
é aplicado quando há a prática, no mesmo contexto z Justiça penal universal ou princípio universal
fático, dos crimes de conteúdo múltiplo, variado ou ou da universalidade da justiça cosmopolita,
plurinuclear, que são os crimes que descrevem várias ou da jurisdição mundial ou da repressão uni-
condutas no mesmo artigo, ou seja, contêm vários versal ou da universalidade do direito de punir:
verbos como núcleos do tipo. Um exemplo desse tipo alínea “a”, inciso II, art. 7º (exceção: extraterrito-
de crime encontra-se no caput do art. 33, da Lei de rialidade). Cada Estado tem o poder de punir qual-
Drogas: quer crime, independentemente da nacionalidade
do autor ou da vítima ou, ainda, do local da sua
Art. 33 Importar, exportar, remeter, preparar, pro- prática. Basta que o criminoso esteja dentro do ter-
duzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, ofe- ritório do país;
recer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, z Nacionalidade ativa ou princípio da perso-
guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo nalidade: alínea “b”, inciso II, art. 7º (exceção:
ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem
extraterritorialidade). Segundo o princípio da
autorização ou em desacordo com determinação
nacionalidade, a lei penal do Estado se aplica a
legal ou regulamentar.
seus cidadãos onde quer que se encontrem. O Bra-
sil adota a nacionalidade ativa, que impõe a apli-
Note que são dezessete núcleos diferentes: pelo
cação da lei nacional ao cidadão que comete crime
princípio da alternatividade, se o agente pratica mais
no estrangeiro não importando a nacionalidade da
de uma conduta (núcleo diferente), no mesmo con-
vítima;
texto fático, só responderá por um único crime (por
z Representação ou pavilhão ou bandeira: alí-
exemplo, se o sujeito oferece e ministra).
nea “c”, inciso II, art. 7º (exceção: extraterritoria-
lidade). Ficam sujeitos à lei do Brasil os delitos
A LEI PENAL NO ESPAÇO
cometidos em aeronaves e embarcações privadas,
quando ocorridos no estrangeiro e não forem jul-
Ao estudar, nos arts. 5º a 8º, do CP, a aplicação da
gados por eles.
lei penal no espaço, vamos tratar do lugar de inci-
dência da legislação penal brasileira, ou seja, onde ela
é aplicada. Não veremos, portanto, neste momento, Território Nacional
regras de competência, que se encontram nos arts. 70
e seguintes, do Código de Processo Penal (CPP). O texto do art. 5º fala em território. O território que
nos interessa é o território jurídico, ou seja, o espaço
Territorialidade em que o Estado exerce sua soberania, portanto, o
território nacional. Ele é composto pelas seguintes
O princípio adotado para tratar do âmbito da apli- partes:
cação da lei penal brasileira é o princípio da Terri-
torialidade, que se encontra disposto no art. 5º, do CP: z O solo;
z O subsolo;
Art. 5º Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de z O espaço aéreo correspondente;
convenções, tratados e regras de direito internacio- z Os cursos d’água internos (rios, lagos, mares
nal, ao crime cometido no território nacional. interiores);
z O mar territorial, assim entendido como a faixa
O princípio da territorialidade significa que a lei de mar exterior que compreende as 12 milhas
penal de um país só é aplicável no território do Estado marítimas medidas a partir da linha do baixa-mar
que a editou, sem se preocupar com a nacionalidade do litoral continental e insular brasileiro, de acor-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

do sujeito ativo (autor) ou passivo (vítima). do com as referências contidas nas cartas náuticas
O princípio da territorialidade pode se dar de duas brasileiras (art. 1º, da Lei nº 8.617, de 1993).
formas:
Em relação aos rios internacionais que constituem
z De forma absoluta (princípio da territorialidade limites entre dois países, normalmente existe tratado
absoluta), quando somente a lei penal do país é sobre o tema que ou determina que a divisa se encon-
aplicável aos crimes cometidos em seu território tra na linha mediana do leito do rio ou que a divisa
nacional; acompanhe a linha de maior profundidade da cor-
z De forma temperada, relativizada ou mitigada rente. Se o rio não for divisa, mas sucessivo, como o
(princípio da territorialidade temperada) quan- Amazonas, é indiviso, e cada Estado exerce soberania
do a lei penal nacional é aplicada via de regra ao sobre ele.
crime cometido no território nacional, mas, excep- No caso dos lagos, salvo acordo em contrário, o
cionalmente, por força de tratados e convenções limite é fixado pela linha da meia distância entre as
internacionais, a lei estrangeira é aplicável a deli- margens do lago ou lagoa, que separa dois ou mais
tos praticados em território nacional. Estados. 17
Por se relacionarem aos assuntos que estamos Dica
vendo, vale a pena estudar as hipóteses de não inci-
dência da lei a fatos cometidos no Brasil: As bancas examinadoras gostam muito de con-
fundir as teorias adotadas quanto ao tempo e
z As imunidades diplomáticas; lugar do crime. Como vimos anteriormente, o CP
z As imunidades parlamentares; adota a teoria da atividade para definir o tempo
z A inviolabilidade do advogado. do crime, e a teoria da ubiquidade para definir
o local do crime. Deste modo, para facilitar seu
Esses assuntos são tratados em Direito Constitucio- estudo, formamos o mnemônico LUTA:
nal, Direito Processual Penal e no estudo do Estatuto Lugar
da Ordem dos Advogados do Brasil. Ubiquidade
Tempo
Território por Extensão Atividade

Art. 5º […] Vamos exemplificar: na divisa Brasil-Paraguai, um


§ 1º Para os efeitos penais, consideram-se como cidadão brasileiro, que se encontra em Foz do Igua-
extensão do território nacional as embarcações e çu, atira em uma pessoa, que se encontra no Paraguai,
aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a ser- vindo esta a falecer. Ou ainda, um indivíduo envia
viço do governo brasileiro onde quer que se encon- uma carta-bomba do Chile para o Brasil, que ao ser
trem, bem como as aeronaves e as embarcações aberta em São Paulo, mata a vítima. Quem vai punir
brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, os autores?
que se achem, respectivamente, no espaço aéreo Para solucionar tais situações, existem três teorias:
correspondente ou em alto-mar. a Extraterritorialidade Condicionada, a Incondiciona-
da e a Pena cumprida no estrangeiro.
De acordo com o § 1º, do art. 5º, do Código Penal,
para fins penais, são consideradas território por Extraterritorialidade
extensão:
Extraterritorialidade é a aplicação da lei brasilei-
z As embarcações e aeronaves brasileiras, de ra aos crimes cometidos fora do Brasil. Sua sistema-
natureza pública ou a serviço do governo brasilei- tização se encontra nos arts. 7º e 8º, do CP. Vejamos
ro onde quer que se encontrem; neste momento a disposição na íntegra do art. 7º:
z As aeronaves e as embarcações brasileiras, mer-
cantes ou de propriedade privada, que se achem, Art. 7º Ficam sujeitos à lei brasileira, embora
respectivamente, no espaço aéreo corresponden- cometidos no estrangeiro:
I - os crimes:
te ou em alto-mar.
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da
República;
As embaixadas são consideradas território do país b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do
em que estejam localizadas, ou seja, as embaixadas Distrito Federal, de Estado, de Território, de Muni-
de outros países que estejam sediadas no Brasil são cípio, de empresa pública, sociedade de economia
consideradas território brasileiro — salvo a incidên- mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder
cia de convenção, tratado ou regra de direito interna- Público;
cional (crimes praticados por agentes diplomáticos c) contra a administração pública, por quem está a
estrangeiros nestes locais, por exemplo, não se sujei- seu serviço;
tam à aplicação da lei penal brasileira). Deste modo, d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou
as embaixadas do Brasil que se situam em território domiciliado no Brasil;
II - os crimes:
estrangeiro não são consideradas território brasileiro
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obri-
por extensão.
gou a reprimir;
b) praticados por brasileiro;
Lugar do Crime c) praticados em aeronaves ou embarcações bra-
sileiras, mercantes ou de propriedade privada,
O CP trata do lugar do crime no art. 6º: quando em território estrangeiro e aí não sejam
julgados.
Art. 6º Considera-se praticado o crime no lugar § 1º Nos casos do inciso I, o agente é punido segun-
em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou do a lei brasileira, ainda que absolvido ou condena-
em parte, bem como onde se produziu ou deve- do no estrangeiro.
ria produzir-se o resultado. § 2º Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasi-
leira depende do concurso das seguintes condições:
Conforme já vimos antes, não se trata de fixar nor- a) entrar o agente no território nacional;
mas de competência (medida de jurisdição), uma vez b) ser o fato punível também no país em que foi
praticado;
que tais normas são cuidadas pelos arts. 70 e seguin-
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a
tes do CPP. O disposto no art. 6º, do CP, destina-se aos
lei brasileira autoriza a extradição;
chamados crimes à distância, isto é, aqueles delitos d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou
em que a ação ou a omissão ocorre em um país e o não ter aí cumprido a pena;
resultado, em outro. Em relação ao local do crime, o e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro
CP adota o Princípio da Ubiquidade. ou, por outro motivo, não estar extinta a punibili-
18 dade, segundo a lei mais favorável.
§ 3º A lei brasileira aplica-se também ao crime Pena Cumprida no Estrangeiro
cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do
Brasil, se, reunidas as condições previstas no pará- Art. 8º A pena cumprida no estrangeiro atenua a
grafo anterior: pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando
a) não foi pedida ou foi negada a extradição; diversas, ou nela é computada, quando idênticas.
b) houve requisição do Ministro da Justiça.
Quando se fala em extraterritorialidade condicio-
Tal fenômeno se justifica por dois motivos: nada, uma vez tendo sido cumprida a pena no estran-
geiro, desaparece o interesse do Brasil em punir o
z Para proteger certos bens jurídicos (como, por delinquente.
exemplo, o patrimônio público); Por outro lado, nos casos de extraterritorialidade
z Para impedir que certos delitos fiquem sem res- incondicionada, se o sujeito ativo entra em território
posta da lei penal. Não se aplica a extraterrito- brasileiro, estará sujeito à punição, independente-
rialidade a todas as infrações penais (crimes e mente de já ter sido condenado ou absolvido no exte-
contravenções): de acordo com o art. 2º, da Lei rior. Nesta hipótese, se aplicaria a fórmula do art. 8º,
de Contravenções Penais, não se aplica a lei CP. No entanto, tal dispositivo é inconstitucional, por
brasileira às contravenções ocorridas fora do ir contra a garantia constitucional de que ninguém
território nacional. Ou seja, não há extraterrito- pode ser punido duas vezes pelo mesmo fato, constan-
rialidade de contravenção. te da Convenção Americana dos Direitos Humanos,
em vigor no Brasil.
Dica Eficácia da Sentença Penal Estrangeira
O art. 7º, do Código Penal, aponta somente os
crimes e não as infrações penais, logo, não se Art. 9º A sentença estrangeira, quando a aplicação
da lei brasileira produz na espécie as mesmas con-
aplica às contravenções penais.
sequências, pode ser homologada no Brasil para:
I - obrigar o condenado à reparação do dano, a res-
A aplicação da lei brasileira no estrangeiro pode tituições e a outros efeitos civis;
se dar sem que seja necessária qualquer condi- II - sujeitá-lo a medida de segurança.
ção, recebendo o nome de extraterritorialidade Parágrafo único - A homologação depende:
incondicionada: a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da
parte interessada;
z Hipóteses do inciso I, art. 7, do CP: b) para os outros efeitos, da existência de tratado
de extradição com o país de cuja autoridade judi-
Art. 7º Ficam sujeitos à lei brasileira, embora ciária emanou a sentença, ou, na falta de tratado,
cometidos no estrangeiro de requisição do Ministro da Justiça.
I - os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da O art. 9º, do CP, trata dos efeitos da sentença penal
República; estrangeira. De acordo com o disposto, somente pode
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, ser homologada para produzir os seguintes efeitos:
do Distrito Federal, de Estado, de Território, de
Município, de empresa pública, sociedade de eco- z Obrigar o condenado à reparação do dano (inciso
nomia mista, autarquia ou fundação instituída pelo I, art. 9º, CP);
Poder Público; z Sujeitar o condenado à medida de segurança (inci-
c) contra a administração pública, por quem so II, art. 9º, CP).
está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou A homologação é feita por meio de sentença pelo
domiciliado no Brasil; STJ (alínea “i”, inciso I, art. 105, da CF). No caso do inci-
so I, art. 9º, CP, depende de pedido da parte interessa-
Nestes casos, aplica-se a lei penal brasileira ainda da; já na hipótese do inciso II, art. 9º, CP, depende da
existência de tratado de extradição com o país respec-
que o crime tenha sido julgado no estrangeiro e
tivo ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro
independentemente de o agente entrar no Brasil.
da Justiça.
Se preenchidas certas condições indicadas na lei,
teremos a extraterritorialidade condicionada:
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Prazo Penal

z Hipóteses do inciso II, art. 7, do CP: Art. 10 O dia do começo inclui-se no cômputo do
prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo
„ Alíneas “a” e “b”, inciso II, art. 7º + requisitos calendário comum.
do § 2º, art. 7º;
Antes de finalizar a chamada teoria da norma e
„ Alínea “c”, inciso II, art. 7º, do CP + requisitos do
ingressar na teoria do crime, falta falar brevemente
§ 2º, art. 7º, + alínea “c”, inciso II, art. 7º, in fine
sobre o prazo penal, estabelecido no art. 10, CP.
(não ter sido julgado no estrangeiro); O prazo penal e o prazo processual são contados de
„ § 3º, art. 7º, do CP + requisitos do § 2º, art. maneiras diferentes:
7º+ requisitos do § 3º (não ter sido pedida ou
ter sido negada a extradição) + requisição do z Prazo penal (regra art. 10, CP): inclui-se o primei-
Ministro da Justiça. ro dia, despreza-se o último;
z Prazo processual penal (regra § 1º, art. 798, CPP):
despreza-se o primeiro dia, conta-se o último; 19
z Frações de penas: não são computadas as horas Conceito Analítico de Crime
nas penas privativas de liberdade e restritivas de
direitos, nem os centavos na pena pecuniária. Do ponto de vista analítico, diferentes doutrinado-
res enxergam o crime de formas diferentes. Existem
várias correntes, mas as principais são duas:
Importante!
Para fins de prescrição e decadência, os prazos z A que entende que o crime é Fato Típico + Antijurí-
são contados de acordo com a regra do art. 10, CP. dico (concepção bipartida), sendo a culpabilidade
pressuposto de aplicação da pena (entre eles René
Ariel Dotti, Fernando Capez, Damásio de Jesus,
Julio Fabrini Mirabete, Cleber Masson);
z A que concebe o crime como um Fato Típico+
TEORIA DO CRIME Antijurídico + Culpável (concepção tripartida
ou tripartite) e que é majoritária tanto no Brasil
Nomenclatura quanto no exterior. Entre seus adeptos estão tanto
aqueles que adotam a teoria da conduta finalista
A doutrina brasileira utiliza o termo infração de (como Heleno Fragoso, Eugenio Raúl Zaffaroni,
forma genérica, para englobar os crimes ou delitos e
Luiz Regis Prado, Rogério Greco, entre outros) ou
as contravenções.
causalista (Nélson Hungria, Frederico Marques,
O Código Penal não utiliza em seu texto a expres-
são “delito”, optando por utilizar as expressões infra- Aníbal Bruno e Magalhães Noronha).
ção, crime e contravenção, sendo que estas duas
últimas estão incluídas na primeira. Diferença entre Crime e Contravenção
No Código de Processo Penal há certa confusão:
algumas vezes usa-se o termo infração, de forma Antes de prosseguir com o estudo do crime, é inte-
genérica, incluindo os crimes (ou delitos) e as contra- ressante fazer a distinção entre crime e contravenção
venções (veja, por exemplo, os arts. 70, 72, 74, 76, 77 penal (também chamada de crime anão, delito Lilipu-
etc.). Em outras situações, emprega a expressão deli- tiano, crime vagabundo ou delitti nani).
tos como sinônimo de Infração (por exemplo, confor- Existem países que utilizam a classificação tripar-
me consta nos arts. 301 e 302, CPP). tida de infrações penais: delitos, crimes e contraven-
Para os fins do nosso estudo temos, então que ções. O Brasil adota, como já vimos, a classificação
Infração Penal pode significar crime (ou delito) e
bipartida, que divide as infrações entre crimes (ou
contravenção penal.
delitos) e contravenções.
As diferenças entre crime e contravenção serão
vistas mais adiante. Não existe um dado único que faça a distinção
entre os dois tipos de infração penal. Tanto os crimes
Conceito de Crime quanto as contravenções configuram comportamen-
tos que violam mandamentos legais que possuem
O conceito de crime não é natural e sim algo arti- como sanção a aplicação de uma pena. A grande dis-
ficial, criado pelo legislador tendo em vista os interes- tinção é a maior ou menor gravidade com que a lei vê
ses da sociedade. Mas o que é crime? tais condutas.
Podemos responder essa pergunta de três formas No entanto, existem outros elementos que ajudam
diferentes, olhando para o crime sob diferentes aspec- na distinção.
tos: material, formal e analítico. Em relação às penas: os crimes são punidos com
Veremos o conceito de crime de acordo com cada
penas privativas de liberdade (reclusão ou detenção),
um desses pontos de vista:
restritivas de direitos e multa; já as contravenções são
punidas com prisão simples e/ou multa.
z Aspecto material: é o juízo, a visão que a socie-
dade tem sobre o que pode e deve ser proibido Com relação ao elemento subjetivo: no crime é o
por meio da aplicação de sanção penal. Sob esse dolo ou a culpa; na contravenção é a voluntariedade.
aspecto, o conceito material de crime consiste Por último, é possível a tentativa nos crimes,
na conduta que ofende um bem juridicamen- enquanto ela é incabível nas contravenções.
te tutelado (bem juridicamente considerado
essencial para a existência da própria sociedade e Sujeitos do Crime
manutenção da paz social);
z Aspecto formal: é a concepção sob a ótica do direi- Antes de analisarmos os elementos do crime, é
to. Assim, o conceito formal de crime constitui importante fixar alguns conceitos sobre os sujeitos do
uma conduta proibida por lei, que se realizada, crime.
resulta na aplicação de uma pena. Considera-se
Sujeito ativo é quem pratica o fato descrito na nor-
crime, dessa forma, o que o legislador apontar
ma penal incriminadora. O crime é uma ação huma-
como tal;
z Por fim, o conceito que interessa aos nossos estu- na, sendo que apenas o ser humano pode delinquir.
dos: sob o aspecto analítico, procura-se apontar, Animais e entes inanimados não possuem capacidade
estabelecer os elementos estruturais do crime. penal (conjunto de condições necessárias para que
Vejamos: um sujeito possa ser titular de direitos e obrigações
na esfera penal).
20
Importante! Classificação dos Crimes

A Constituição Federal prevê no § 5º, art. 173, e § Qualificação é o nome que se dá ao fato ou a infra-
3º, art. 225, que a legislação ordinária estabeleça ção, seja pela doutrina ou pela lei. Assim, temos:
a punição da pessoa jurídica nos atos cometidos
z É o nome que a lei dá (nomen juris). Por exemplo,
contra a economia popular, a ordem econômi-
“ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem”
ca e financeira e o meio ambiente. Atualmente
é chamada pelo art. 129, CP, de “lesão corporal”;
apenas a Lei nº 9.605, de 1998, Lei de Proteção z São os nomes dados pela doutrina aos fatos crimi-
Ambiental, prevê essa responsabilidade. Ou seja, nosos. Por exemplo: crime de mera conduta, crime
a pessoa jurídica responde por crime ambientais. permanente, crime próprio etc.);
De acordo com o entendimento jurisprudencial, z É o nome dado à modalidade a que o fato pertence:
é possível a responsabilização penal da pessoa crime ou contravenção. Por exemplo, “homicídio” é
jurídica por delitos ambientais independente- crime, enquanto o “jogo do bicho” é contravenção.
mente da responsabilização penal da pessoa físi-
A classificação doutrinária dos crimes serve para
ca. Não é adotada a teoria da dupla imputação.
facilitar o estudo e o entendimento dos tipos penais
incriminadores. No entanto, existem muitos nomes,
Existem várias nomenclaturas em lei para se refe- ficando difícil fazer uma classificação definitiva, uma
rir ao sujeito ativo: vez que os estudiosos do Direito Penal, ao sistematiza-
rem a matéria, acabam por criar novas nomenclaturas.
z “Agente” (por exemplo, no inciso II, art. 14; art. 15; As principais são:
incisos I e II, art. 18; art. 19; § 3º, art. 20; parágra-
fo único, art. 21; caput e parágrafo único, art. 23; z Crimes Comuns e Especiais: são os definidos no
Direito Penal Comum; os especiais são os descri-
caput e parágrafo único, art. 26, todos do CP);
tos no Direito Penal Especial;
z “Indiciado”, na fase do inquérito;
z Crimes Comuns (quanto ao agente) e Próprios:
z “Acusado”, “denunciado”, “réu”, durante a fase
crime comum é aquele que pode ser praticado por
processual;
qualquer pessoa (furto, homicídio etc.). Crime pró-
z “Sentenciado”, “preso”, “condenado”, “detento” ou
prio é o que só pode ser cometido por um agente
“recluso”, para aqueles que já foram condenados. com qualidades especiais (uma condição jurídica,
como ser funcionário público; de parentesco, como
Usa-se, ainda, sob o ponto de vista biopsíquico, as mãe, filho; profissional, como médico; ou natural,
expressões “criminoso” ou “delinquente”. como no caso da gestante.
Por outro lado, sujeito passivo é entendido como
o titular do bem jurídico protegido, cuja ofensa funda- Dentro do contexto dos crimes próprios há uma
menta o crime. Existem duas espécies: categoria chamada crimes de mão própria ou de
atuação pessoal, que são os que só podem ser cometi-
z Sujeito passivo formal, constante, geral ou gené- dos pelo agente em pessoa, de forma direta, como, por
rico: é o Estado; exemplo, no caso de falso testemunho (a testemunha
z Sujeito passivo material, eventual, particular ou não pode mentir por meio de outro sujeito). O crime de
acidental: o titular do interesse protegido penal- mão própria admite participação, mas não coautoria;
mente (pode ser o ser humano, pessoa jurídica, a
coletividade ou o Estado). z Crimes de Dano e de Perigo: crime de dano é o
que apenas se consuma quando ocorre a efetiva
É importante salientar que pessoa incapaz pode lesão ao bem jurídico (como no homicídio, nas
ser sujeito passivo do crime (recém-nascido, menor lesões corporais). Crime de perigo é o que se consu-
em idade escolar, portador de deficiência mental etc.). ma com a mera possibilidade do dano (como, por
É possível ser sujeito passivo mesmo antes de nascer, exemplo, na rixa, art. 137, CP, e no incêndio, art.
pois o feto tem direito à vida, bem jurídico protegido 250, CP).
pela punição do aborto (arts. 124, 125 e 126, CP). Pes-
soa morta e animais não podem ser sujeitos passivo, Os crimes de perigo, por sua vez, subdividem-se em:
pois não são titulares de direitos (podem ser objetos
„ Crime de perigo presumido (ou abstrato) e
materiais; a titularidade é de outros: família, coletivi-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

crime de perigo concreto: no presumido ou


dade etc.). Aproveitando que mencionamos objeto do
abstrato o perigo é presumido pela lei. Basta a
crime, guarde:
ação ou omissão (exemplo, art. 135, CP; art. 306,
z Objeto jurídico consiste no bem ou interesse tute- CTB, e arts. 14 ao 16, do Estatuto do Desarma-
mento). Já o concreto depende de prova efetiva
lado pela norma penal (como vida, patrimônio,
de perigo (exemplo, no crime de exposição ou
honra etc.);
abandono de recém-nascido, art. 134, CP);
z Objeto material é a pessoa ou coisa sobre a qual
„ Crime de perigo individual e crime de perigo
recai a conduta criminosa (por exemplo a coisa
comum (coletivo). Perigo individual é o que
móvel, no furto).
coloca em risco de dano o bem jurídico de uma
só pessoa ou de grupo determinado de pessoas
(por exemplo, perigo de contágio venéreo, art.
130, CP). Já no perigo comum ou coletivo o risco
atinge um número indeterminado de pessoas
(como no delito de incêndio, art. 250, CP). 21
z Crimes Comissivos e Omissivos: crime comissivo veremos a seguir, é imprescindível a presença do
é aquele que implica em uma ação, um fazer do dolo ou da culpa a fim de que se configure uma
sujeito; já o crime omissivo, caracteriza-se por um conduta penalmente relevante.
não-fazer. Concebida nos anos 1930 por Hans Welzel, um
alemão jurista e filósofo do direito, foi adotada no
Dividem-se nas seguintes modalidades:
Brasil por doutrinadores como Damásio E. De Jesus,
„ Omissivos próprios ou puros: são os descri- Júlio Fabrinni Mirabete e Miguel Reale Júnior, dentre
tos por uma conduta negativa (conduta de não outros penalistas.
fazer). É uma conduta tipificada que descreve Para a teoria finalista, também chamada de “teo-
um comportamento negativo no núcleo do tipo ria final”, “finalismo penal”, “teoria finalista da ação”
penal. Não é possível a tentativa. Exemplos ou, ainda, “teoria da ação finalista”, o crime é fato
de crimes omissivos próprios: comete crimes típico (seus elementos são: conduta, dolosa ou cul-
omissivos puros aqueles que não prestam assis- posa; resultado naturalístico; relação de causalidade
tência à pessoa ferida (omissão de socorro), ou nexo causal; e tipicidade), ilícito (antijurídico) e
comete crime também o funcionário que dei- culpável (imputabilidade; exigibilidade de conduta
xa de responsabilizar seu subordinado quando diversa e potencial consciência da ilicitude).
este cometeu alguma infração no exercício do Fator importante a ser lembrado quando se fala nes-
cargo (condescendência criminosa); ta teoria é que o dolo e a culpa integram o fato típico.
„ Omissivos impróprios ou Comissivos por Assim, segundo a teoria finalista, o conceito analí-
omissão: são os delitos de ação, praticado de tico de crime é composto pelos seguintes elementos:
forma excepcional por omissão (nos casos em
que o agente tem o dever jurídico de impedir o
z Fato Típico
resultado e não o faz — § 2º, art. 13 CP).

Art. 13 […] „ Conduta;


§ 2º A omissão é penalmente relevante quando o „ Resultado;
omitente devia e podia agir para evitar o resultado. „ Nexo causal;
O dever de agir incumbe a quem: „ Tipicidade.
a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou
vigilância; z Antijurídico (ou ilícito)
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de
impedir o resultado;
c) com seu comportamento anterior, criou o risco „ Contrariedade ao ordenamento jurídico.
da ocorrência do resultado;
z Culpabilidade: Juízo de reprobabilidade formado
„ Omissivos por comissão: trata-se de uma pela:
prática rara na doutrina brasileira. Os crimes
omissivos por comissão são aqueles em que um „ Imputabilidade;
indivíduo age com o fim de impedir que alguém „ Exigibilidade de conduta diversa;
pratique um ato que salvaria o bem jurídico, ou „ Potencial consciência da ilicitude.
seja, causa dolosamente a omissão de terceiro.
Estudaremos agora os elementos do crime, de for-
ma separada, assim como suas causas de exclusão.
z Crimes Instantâneos, Permanentes e Instantâ-
neos de Efeitos Permanentes
FATO TÍPICO
„ Crime instantâneo é aquele que se consuma
Não importa a posição adotada, bipartite (Crime =
imediatamente, em momento determinado,
Fato Típico + Antijurídico) ou tripartite (Crime = Fato
sem prolongamento (Ex.: Furto);
Típico + Antijurídico + Culpável) o primeiro elemento
„ Crime permanente é aquele no qual a con-
sumação prolonga-se no tempo (Ex.: Extorsão (requisito, característica) do conceito analítico de cri-
mediante sequestro); me é o fato típico.
„ Crime instantâneo de efeitos permanentes O fato típico possui 4 elementos:
é aquele em que a consumação também ocor-
re em momento determinado, mas os efeitos z Conduta dolosa ou culposa;
da consumação têm efeitos duradouros (Ex.: z Nexo de causalidade (exceto nos crimes de mera
Homicídio, aborto). conduta e nos formais);
z Resultado (salvo nos crimes de mera conduta);
Existe uma série de outras classificações, como z Tipicidade.
crime continuado e delito putativo, por exemplo, que
serão vistas ao tratar de outros temas mais à frente. Dos 4 elementos do fato típico, 2 deles, a conduta
e a tipicidade, são obrigatórios. Em alguns casos, não
Sistemas Penais são necessários o nexo de causalidade e o resultado.
No caso dos crimes materiais (como já vimos, que
O conceito analítico de crime, que é o que nos inte-
é aquele que descreve uma conduta + um resultado
ressa no presente estudo, apresenta várias concepções
diferentes sobre sua estrutura, elementos e maneira naturalístico e, para que o crime ocorra, é preciso que
como esses elementos interagem entre si. aconteça o resultado descrito na norma), são neces-
Dentre essas diferentes teorias, o Código Penal sários os 4 elementos para que se configure o crime,
22 adotou a teoria finalista, de modo que, conforme como, por exemplo, no caso do homicídio:
Veremos, agora de forma separada, o dolo e a cul-
CONDUTA pa, que são os elementos subjetivos da conduta.
Uma facada NEXO CAUSAL
(por exemplo) Relação RESULTADO
de causa e Sendo crime
TIPICIDADE Importante!
efeito entre a material, Adequação
facada (ação) requer o Não existe crime sem dolo ou culpa (princípio da
entre o fato
e o resultado resultado, no praticado e a responsabilidade subjetiva).
(morte) caso a morte previsão legal: Os crimes, em geral, são dolosos e, excepcional-
Art. 121, CP mente, culposos (apenas quando a lei, de forma
(Matar alguém)
expressa, determinar).

No entanto, em alguns casos, vão bastar apenas a


conduta e a tipicidade. Isso ocorre nos crimes formais Dolo
(que dispensam a ocorrência do resultado, que é mero
exaurimento; ou ainda, nem o preveem, fazendo com Podemos definir dolo como sendo a vontade de
que seja desnecessário verificar o nexo causal), como produzir o resultado típico.
no exemplo a seguir: No dolo direito (ou imediato ou determinado)
existe a intenção do agente de ofender o bem jurídi-
co. Exemplo: querendo a morte da vítima, o atirador
CONDUTA desfere um tiro fatal.
NEXO CAUSAL Já no dolo indireto ou eventual, o sujeito assume
Exigir que
se assine RESULTADO o risco de produzir o resultado.
Não é
um contrato necessário TIPICIDADE A diferença relevante está entre o dolo direito e o
Não é
favorável ao necessário Adequação eventual. Mas existem outras classificações de dolo,
autor, sob sem muita utilidade. Dentre essas, cabe mencionar o
entre o fato
ameaça
praticado e a dolo alternativo, que pode aparecer em algum enun-
previsão legal: ciado de questão.
Art. 158, CP
(Extorsão)
Dolo alternativo configura-se quando o agente
age com indiferença, buscando um resultado ou outro
(não se trata de uma forma independente de dolo).
Conduta Exemplo de dolo alternativo é o do agente que encon-
tra uma carteira em um banco de praça e a leva para
A conduta é toda ação ou omissão humana, cons- casa, pouco se importando se alguém a esqueceu ali
ciente e voluntária, dirigida a determinada finalidade. ou é de alguém que se encontra brincado com o filho
A conduta pode se realizar: no parque que fica dentro da praça. Neste caso, pode
ter praticado o crime de furto (art. 155, CP) ou de apro-
z Por uma ação (um fazer, um comportamento priação de coisa achada (inciso II, art. 169, CP).
positivo); São elementos do dolo:
z Por uma omissão (um não fazer, uma abstenção).
z Consciência da conduta e do resultado;
Existem várias teorias que tratam da definição z Consciência da relação causal objetiva entre a
da conduta criminosa; é essencial conhecer a Teoria conduta e o resultado;
Finalista da Conduta, elaborada por Hans Welzel e z Vontade de realizar a conduta e de produzir o
sobre a qual já mencionamos. Para a teoria finalista, resultado.
adotada pelo CP, como vimos, a conduta precisa ser
ou dolosa ou culposa, ou seja, dolo e culpa, integram Culpa
o Fato Típico (estão dentro da conduta, que é um de
seus elementos). A culpa, por sua vez, não exige a intenção do agen-
Mas o que são dolo e culpa? te de agredir a norma, mas ele acaba agindo de forma
Ainda dentro do estudo da conduta, vamos estabe- descuidada para com o bem jurídico.
lecer os conceitos de dolo e de culpa, essenciais para No crime culposo, o resultado ilícito não é deseja-
do, mas é previsível e poderia ter sido evitado. Deste
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

o entendimento do próprio conceito de crime. Vamos,


em primeiro lugar, ao Código Penal verificar o que modo, o agente não deseja o resultado, nem assume
está disposto sobre o dolo e a culpa. o risco de produzi-lo, mas não age com a responsabi-
lidade necessária ao caso. Tal descuido se concretiza
Art. 18 Diz-se o crime: por meio da imprudência, negligência ou imperícia
Crime doloso (espécies de culpa, conforme o inciso II, art. 18, CP):
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou
assumiu o risco de produzi-lo; z Imprudência: é a forma ativa (positiva) de culpa,
Crime culposo em que o agente executa um comportamento sem
II - culposo, quando o agente deu causa ao cautela (de forma precipitada ou com insensatez).
resultado por imprudência, negligência ou Ex.: O sujeito que dirige em alta velocidade dentro
imperícia. da cidade, onde há pedestres por todos os lados;
Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, z Negligência: é a forma passiva (negativa) de cul-
ninguém pode ser punido por fato previsto como pa, em que o agente deixa de agir, fica inerte, por
crime, senão quando o pratica dolosamente. descuido ou desatenção, quando era necessário 23
agir de modo contrário. Ex.: Não acionar o freio de Nexo de Causalidade ou Nexo Causal ou Relação de
mão ao estacionar o veículo em uma ladeira; Causalidade
z Imperícia: consiste na imprudência no campo
técnico, pressupondo a falta de cautela relativa ao Trata-se do elo que une a causa ao resultado e
exercício de uma arte, um ofício ou uma profissão. encontra-se expressamente previsto no art. 13, CP:
Ex.: Caso do médico que deixa de tomar os cuida-
Relação de causalidade
dos necessários quanto à assepsia antes de uma
cirurgia, o que acaba por causar uma infecção que Art. 13 O resultado, de que depende a existência do
provoca a morte do paciente. crime, somente é imputável a quem lhe deu causa.
Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o
Sempre nas questões que envolvem o dolo even- resultado não teria ocorrido.
tual e culpa consciente, se fizermos uma leitura
De forma simples, o resultado naturalístico deve
rápida, podemos ficar com dúvida. Portanto, vamos
ter sido causado pela conduta praticada pelo agente (o
fazer a segunda leitura da questão e identificar as
agente só responde se sua conduta tiver influenciado
palavras que diferenciam o dolo eventual da culpa no resultado).
consciente. Ao tratar do nexo de causalidade, o CP adotou, na
2ª parte, caput do art. 13, a chamada teoria da equiva-
DOLO EVENTUAL CULPA CONSCIENTE lência dos antecedentes causais (também conhecida
por conditio sine qua non), que considera causa a ação
Prevê o resultado Prevê o resultado ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorri-
Assume o risco do Acredita poder evitar o do. Por esta teoria, todos os antecedentes se equivalem,
resultado resultado ou seja, todas as causas tem o mesmo valor.
Para saber se uma conduta é causa do resultado
“Dane-se” “Danou-se” basta, mentalmente, excluí-la da série causal. Se, com
sua exclusão, o resultado deixar de ocorrer do modo
que ocorreu, é considerada causa (esse processo é cha-
Crime Preterdoloso ou Preterintencional mado de Processo Hipotético de Eliminação Thyrén).
Esta teoria, se mal interpretada, pode levar a
Trata-se de uma espécie de crime qualificado pelo excessos (regressus ad infinitum), como no caso de um
resultado. Neste caso, o agente quer causar um deter- homicídio com arma de fogo, em o comerciante que
minado resultado (possui dolo quanto a este resulta- vendeu a arma e, antes dele, o dono da fábrica que
do), mas acaba causando outro resultado, de forma produziu o armamento também teriam dado causa ao
culposa. resultado! Como solucionar tal situação injusta? Neste
caso, temos que verificar se tanto o comerciante quan-
to o industrial agiram com dolo ou culpa: caso nega-
Dica
tivo, não serão responsabilizados (não há fato típico).
Crime preterdoloso: dolo no antecedente (con- Tema importantíssimo ao tratar de nexo causal diz
duta) — culpa no consequente (resultado). respeito às concausas e seus efeitos.
Concausas são as causas concomitantes que se unem
Ocorre, por exemplo, na lesão corporal seguida para gerar o resultado. Na prática, não há distinção
de morte, quando o agente quer lesionar (dolo) mas entre causas e concausas. As causas podem ser pree-
xistentes, concomitantes e supervenientes, absoluta ou
acaba matando (por culpa). Neste caso, a conduta sub-
relativamente independentes da conduta do sujeito.
sequente (morte) vai servir como um evento qualifica-
A questão aqui é que temos duas possíveis causas
dor (vai responder pelo crime na forma mais grave). para um único resultado, e é necessário determinar
de que forma o agente deverá ser responsabilizado,
Resultado tendo em vista sua contribuição para o resultado final
do crime. Ou seja, a responsabilização irá variar de
O segundo elemento do fato típico é o resultado, acordo com a relevância da concausa (se ela contri-
que é a consequência provocada pela conduta do buiu ou não para o resultado produzido).
agente. O resultado pode ser dividido em jurídico ou Primeiramente, veremos a hipótese das causas
naturalístico. absolutamente independentes da conduta do sujei-
O resultado jurídico (normativo) é a lesão ou peri- to. Trataremos por meio de exemplos, pois é a forma
go de lesão provocada no bem jurídico tutelado (prin- mais fácil de se entender:
cípio da lesividade).
O resultado naturalístico nada mais é do que a z 1º caso (causa preexistente): imagine a situação
modificação do mundo exterior causada pela conduta em que o genro envenena a sogra no café da manhã.
O veneno “A” leva tempo para agir. Na hora do almo-
(aplicação da teoria naturalística).
ço, a nora envenena (veneno “B”) o suco da sogra,
No entanto, nem todo crime tem resultado (natu-
que logo após, cai morta. A necropsia conclui que o
ralístico), como no caso dos crimes de mera conduta veneno “A”, exclusivamente, foi a causa mortis.
(conforme já vimos, que são aqueles em que a lei des- Neste caso a conduta da nora não causou o resul-
creve apenas uma conduta e não um resultado, con- tado, a morte foi causada por causa preexistente
sumando-se no momento da prática da conduta, como (envenenamento pelo genro). A nora só vai res-
no caso do delito de invasão de domicílio). ponder pelos atos já praticados, ou seja, tentativa
de homicídio; o genro, por sua vez, responde por
24 homicídio consumado;
z 2º caso (causa concomitante): nesta hipótese, a Preexistente;
Absolutamente Rompem o nexo
nora envenena o suco da sogra, uma mulher idosa. independente
Concomitante;
causal
No momento em que tomava o suco envenenado, Superveniente
um indivíduo invade a casa para cometer um rou-
bo; assustada, a idosa morre de colapso cardíaco, CAUSAS
exclusivamente. Neste caso, há quebra do nexo cau- Preexistente; Não rompem o
Concomitante nexo causal
sal e a nora só responde pelos atos já praticados;
Relativamente
z 3º caso (causa superveniente): neste exemplo, independentes
a nora envenena o suco da sogra, que o toma, faz Rompem o nexo
causal quando,
todos os afazeres normais e, mais tarde ao sair de Superveniente
por si só, causar
casa, é atropelada e morre, exclusivamente por cau- o resultado
sa do acidente (o veneno não teve tempo de agir).
Aqui também não há relação de causalidade, res- Tipicidade
pondendo a nora pelos atos já praticados (homicídio
tentado).
A tipicidade nada mais é do que a convergência, a
cominação do fato no mundo com o tipo abstrato pre-
Os três casos apresentados mostram causas abso-
visto na lei. Por exemplo, o fato de eliminar a vida de
lutamente independentes da conduta do sujeito: hou-
alguém encontra adequação ao previsto no art. 121,
ve quebra no nexo causal e o agente só responde
CP, “matar alguém”.
pelos atos já praticados.
As excludentes de tipicidade dividem-se em legais
Agora veremos as três hipóteses de causas relati-
(quando expressamente previstas em lei) e suprale-
vamente independentes da conduta do sujeito:
gais (implicitamente previstas em lei). Podemos men-
cionar como exemplos:
z 1º caso (causa preexistente): numa briga entre
vizinhos, o vizinho “A” dá um golpe de estilete no
z De excludentes legais, o crime impossível (art. 17,
braço do vizinho “B”, com a intenção de matá-lo. A
CP);
vítima era hemofílica, o que fez com que perdesse
z O impedimento de suicídio (§ 3º, art. 146);
grande quantidade de sangue, vindo a falecer. Nes-
te caso, existe uma relação de causalidade entre a z Retratação no crime de falso testemunho (§ 2º, art.
conduta (“estiletada”) e o resultado (morte), sen- 342).
do a causa da morte a hemofilia (condição). Nesta
hipótese, a conduta e a causa não são absoluta- Veja que elas não estão agrupadas em um único
mente independentes, mantendo-se o nexo cau- artigo.
sal: portanto o vizinho que desferiu o golpe vai Por sua vez, como causas supralegais, podemos
responder pelo resultado; citar o princípio da insignificância, já visto ante-
z 2º caso (causa concomitante): um assaltante entra riormente, e também a chamada adequação social
numa casa e atira no morador que, no momento, (comportamentos que são aceitos normalmente pela
estava infartando, sendo que a lesão causada pelo sociedade e deixa de ser entendida como lesiva a
projétil contribuiu para que ocorresse o evento algum bem jurídico).
morte. Neste caso, há relação de dependência cau-
sa-conduta, não havendo quebra do nexo causal; Crime Impossível
assim sendo, o agente responde pelo resultado;
z 3º caso (causa superveniente): uma pessoa Art. 17 Não se pune a tentativa quando, por inefi-
baleada no peito é socorrida por uma ambulância cácia absoluta do meio ou por absoluta improprie-
que, no percurso até o hospital, sofre um aciden- dade do objeto, é impossível consumar-se o crime.
te, fazendo com que a vítima venha a falecer de
traumatismo craniano. Neste caso há nexo cau- O crime impossível, disposto no art. 17, do CP, pode
sal, no entanto o § 1º, art. 13, do CP, apresenta uma se dar de três formas:
exceção — quando, por si só, a causa produziu o
resultado — excluindo a imputação, fazendo com z Inidoneidade absoluta do meio: meio escolhi-
que o agente só responda pelos atos já pratica- do não tem qualquer possibilidade razoável de
dos (superveniência de causa relativamente lesar o bem jurídico (matar alguém com “poder da
independente). mente”);
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

z Impropriedade absoluta do objeto: o objeto


material não reveste o bem jurídico protegido pela
Importante! norma penal, como tentar matar alguém já morto
ou abortar não estando a mulher grávida;
Se as causas forem relativamente independen-
z Obra do agente provocador: flagrante prepara-
tes (preexistentes ou concomitantes) o agente
do, ou seja, quando o Estado instiga o crime para
responde pelo resultado. Por exceção da lei (§ que o sujeito caia em uma “armadilha”, tendo
1º, art. 13, CP) no caso da superveniência de tomado providências para que o bem jurídico não
causa relativamente independente, o agente só sofra risco.
responde pelos atos já praticados.
Art. 13 […] Súmula n° 145 (STF) Não há crime, quando a pre-
§ 1º A superveniência de causa relativamente paração do flagrante pela polícia torna impossível
independente exclui a imputação quando, por a sua consumação.
si só, produziu o resultado; os fatos anteriores,
entretanto, imputam-se a quem os praticou. 25
Neste caso, o crime se torna impossível, pois se trata de um flagrante preparado (o policial induz a prática do
crime e, em sequência, adota providências para impedir a sua consumação).

Desistência Voluntária, Arrependimento Eficaz e Arrependimento Posterior

A desistência voluntária e o arrependimento eficaz encontram-se previstos no art. 15, do CP.

Art. 15 O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se
produza, só responde pelos atos já praticados.

A desistência voluntária é uma forma de tentativa inacabada e se configura quando o sujeito inicia o proces-
so executório, mas desiste voluntariamente de nele prosseguir, evitando a consumação. Neste caso, tem-se
uma conduta negativa, ou seja, o agente tem a possibilidade de prosseguir com a execução, mas, por vontade
própria, desiste e evita que o crime se consume.
Podemos citar o caso em que o sujeito ingressa na casa da vítima e, voluntariamente, desiste da subtração que
pretendia efetuar. Veja que, no caso do exemplo, se o sujeito desiste do furto pelo risco de ser surpreendido em fla-
grante diante do funcionamento do sistema de alarme, não se fala em desistência, mas sim em tentativa punível.
Já o arrependimento eficaz é uma forma de tentativa acabada e se dá após esgotado o processo executó-
rio imaginado, mas o sujeito resolve voluntariamente atuar para evitar, com sucesso, a consumação.
Nos dois casos, conforme art. 15, do CP, a consequência é que o sujeito deve responder apenas pelos resultados
já produzidos.
Esses dois institutos são incompatíveis com os crimes culposos, pela sua própria natureza, salvo na culpa
imprópria.

ANTES DE ESGOTAR DEPOIS DE ESGOTAR


CONSEQUÊNCIA JURÍDICA
A EXECUÇÃO A EXECUÇÃO

Responde pela tentativa: pena do


MOTIVOS ALHEIOS À Tentativa imperfeita Tentativa perfeita ou
crime consumado reduzida de 1/3
VONTADE DO AGENTE ou inacabada acabada ou crime falho
(um terço) a 2/3 (dois terços)

MODIFICAÇÃO DA
Desistência Voluntária Arrependimento eficaz Só responde pelos atos já praticados
VONTADE DO AGENTE

Já o arrependimento posterior é uma causa obrigatória de diminuição de pena para os crimes praticados
sem violência ou grave ameaça dolosa à pessoa, nos quais o prejuízo é reparado por ato voluntário do infrator até
o momento do recebimento da denúncia ou queixa.
O art. 16, do CP, estabelece redução de um a dois terços, e prevalece que a redução será tanto maior quando
mais célere a reparação.

Art. 16 Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa,
até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.

Casos Excepcionais de Arrependimento Posterior no Código Penal

A reparação do dano no crime de estelionato por meio de cheque, até o recebimento da denúncia, tem efeito
diverso.
No peculato culposo (§ 2º, art. 312, do CP), a reparação do dano até a sentença definitiva extingue a punibilida-
de e, se posterior, ainda reduz a pena em metade (§ 3º, art. 312, do CP).

Crime Consumado e Crime Tentado

Para estudarmos os crimes consumados e os crimes tentados, é importante conhecermos a iter criminis.
Segundo Cleber Masson, iter criminis é o caminho do crime, corresponde às etapas percorridas pelo agente
para a prática de um fato previsto em lei como infração penal.
Considerando que já estudamos crime doloso, podemos concluir que iter criminis é um instituto exclusivo dos
crimes dolosos.
Os crimes possuem as seguintes fases:

z Cogitação ou fase interna: é a fase mental de preparação do crime: idealização, deliberação e resolução. Não
há conduta penalmente relevante;
z Atos preparatórios: o crime começa a se projetar no mundo exterior. O agente adquire arma de fogo. Em
regra, não são puníveis, salvo nos crimes-obstáculo;
z Atos de execução: o agente começa a realizar o núcleo do tipo penal, de forma idônea e inequívoca. Nessa
fase, pode haver punição pela tentativa;
z Consumação: crime consumado é quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal. Fim do
26 iter criminis;
z Exaurimento: não influi na tipicidade, mas pode z Vermelha ou cruenta: o objeto de crime é atingi-
influenciar na dosimetria da pena, ser reconhecido do pela conduta. Considerando o iter criminis per-
como qualificadora ou configurar crime autônomo. corrido, o quantum de redução da tentativa deve se
aproximar do mínimo (1/3);
Crime-Obstáculo z Perfeita ou acabada: o agente esgota todos os
meios de execução à sua disposição e, mesmo
Classifica-se de crime-obstáculo quando os atos assim, a consumação não sobrevém por circuns-
preparatórios são punidos como crime autônomo, por tância alheias a sua vontade;
exemplo, associação criminosa, art. 288, do CP. z Crime falho: agente dispara tiros na vítima, mas é
socorrida e sobrevive;
Atos Preparatórios e Atos de Execução z Imperfeita ou inacabada: o agente, por fatores
alheios a sua vontade, não esgota os meios de
z Teoria subjetiva: importa a exteriorização da execução ao seu alcance, dentro daquilo que con-
vontade criminosa pelo agente e não distingue sidera suficiente, em seu projeto criminoso, para
atos preparatórios de atos executórios; alcançar resultado;
z Teoria objetiva-formal (majoritária): a execu- z Tentativa propriamente dita: agente, no segundo
ção inicia-se quando o agente começa a praticar o disparo, é interrompido pela chegada de policiais
núcleo contido no tipo penal. Antes disso, os atos e o crime não se consuma por circunstância alheia
são preparatórios; à sua vontade.
z Teoria objetiva-material: são atos executórios
aqueles em que se inicia a prática do núcleo do São crimes que admitem tentativa:
tipo, bem como os atos imediatamente anteriores,
com base na visão de terceira pessoa alheia à con- z Crimes dolosos;
duta criminosa (Rogério Cunha Sanches); z Crime plurissubsistentes (formais e de mera conduta);
z Teoria objetiva-individual: são atos executórios z Omissivos impróprios;
aqueles em que se inicia a prática do núcleo do z Crimes de perigo concreto;
tipo, bem como os atos imediatamente anteriores,
z Crimes permanentes.
com base no plano concreto do agente;
z Teoria da hostilidade ao bem jurídico: a execu-
Crimes que não admitem tentativa:
ção inicia-se quando o agente ataca o bem jurídico.

E se persistir a dúvida quanto a ser o ato preparató- z Crimes culposos, exceto a culpa imprópria;
rio ou de execução? Deve-se considerar, neste caso, o ato z Contravenções penais;
preparatório, por ser mais benéfico ao agente. Para cada z Crimes habituais;
classificação do crime, há o momento da consumação. z Crimes omissivos próprios;
Vejamos a consumação de crime entre Roubo X z Crimes unissubjetivos;
Latrocínio: z Crimes preterdolosos;
z Crimes de resultado;
z Roubo: z Crimes de empreendimento (atendado);
z Crimes impossíveis;
Súmula n° 582 (STJ) Consuma-se o crime de roubo z Crimes de perigo comum;
com a inversão da posse do bem mediante emprego z Crimes subordinados a uma condição objetiva de
de violência ou grave ameaça, ainda que breve tem-
punibilidade;
po e em seguida à perseguição imediata ao agente
z Crimes-obstáculo.
e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível
a posse mansa e pacífica ou desvigiada.
Pena da Tentativa
z Latrocínio:
Salvo disposição em contrário, pune-se a tentati-
Súmula n° 610 (STF) Há crime de latrocínio, quan- va com a pena correspondente ao crime consuma-
do o homicídio se consuma, ainda que não realize a do, diminuída de 1/3 a 2/3.
agente a subtração de bens da vítima. A tentativa é uma causa de diminuição de pena.
A redução deve basear-se no iter criminis percor-
Há tentativa de latrocínio quando o sujeito age
rido pelo agente.
com dolo de subtrair e dolo de matar, mas o resulta-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

do morte não ocorre por circunstâncias alheias à sua A definição do crime tentado (inciso II, art. 14, do
vontade. O fator determinante para a consumação do CP) é uma norma de extensão ou de ampliação, uma
latrocínio é a ocorrência do resultado morte, sendo vez que, o tipo penal deve ser conjugado com o inciso
dispensada a efetiva inversão da posse. II, art. 14, do CP.
O crime é consumado quando nele se reúnem
Art. 14 Diz-se o crime: [...]
todos os elementos da sua definição legal. A tentativa
II - tentado, quando, iniciada a execução, não se
ocorre quando, iniciada a execução, não se consuma
consuma por circunstâncias alheias à vontade do
por circunstância alheias à vontade do agente.
agente.
Tentativa
O inciso II, art. 14, do CP, dispõe que a tentativa é
z Branca ou incruenta (improfícua): o objeto do o início de execução de um crime que somente não
crime não é atingido pela conduta. O iter criminis se consuma por circunstâncias alheias à vontade do
percorrido, o quantum de redução deve se aproxi- agente.
mar da fração máxima (2/3); O ato de tentativa é um ato de execução. 27
Exige-se que o sujeito tenha praticado atos execu- Vamos exemplificar:
tórios, daí não sobrevindo a consumação por forças
estranhas ao seu propósito, o que acarreta em tipici- z “A” subtrai o celular de “B” e foi condenado a pena
dade não finalizada, sem conclusão. de 2 anos;
A tentativa tem três elementos em sua estrutura: z “A” tentou subtrair o celular de “B” e foi condenado
a pena de 1 ano e 4 meses.
z Início da execução do crime;
z Ausência de consumação por circunstâncias alheia No exemplo 1, o crime foi consumado, por isso, foi
à vontade do agente; aplicada a pena de 2 anos (lembrando que a pena pre-
z Dolo de consumação. vista para furto é de um a quatro anos, e multa).
No exemplo 2, o crime foi tentado, motivo pelo
Não esqueça que o dolo da tentativa é igual ao dolo qual a pena de 2 anos foi diminuída de 2/3, resultando
da consumação: o sujeito quer o resultado. em 1 ano e 4 meses.
Exemplo: “A” quer subtrair o celular de “B”. Na A tentativa constitui-se em causa obrigatória de
consumação, “A” consegue subtrair. Na tentativa, diminuição da pena.
quando “A” consegue colocar a mão no celular, é sur- Incide na terceira fase de aplicação da pena priva-
preendido por “C” que, à distância, percebeu a ação de tiva de liberdade, e sempre a reduz.
“A”. Neste momento, “A” deixa o celular e foge do local. A liberdade do magistrado repousa unicamente no
A vontade de “A” era: subtrair o celular. quantum da diminuição, balizando-se entre os limites
O inciso II, art. 14, do CP, não tem autonomia, pois a legais, de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços). Deve reduzi-
-la, podendo somente escolher o montante da diminui-
tentativa não existe por si só, isoladamente.
ção. E, para navegar entre tais parâmetros, o critério
Sua aplicação exige a realização de um tipo incri-
decisivo é a maior ou menor proximidade da consuma-
minador, previsto na Parte Especial do CP ou pela
ção, ou seja, a distância percorrida do iter criminis.
legislação penal especial.
Excepcionalmente, entretanto, é aceita a teoria
O CP e a legislação extravagante não preveem,
subjetiva, voluntarística ou monista, consagrada pela
para cada crime, a figura da tentativa, nada obstante
expressão “salvo disposição em contrário”.
a maioria deles seja com ela compatível. Essas teorias têm a tese de que a pena para os cri-
Isso explica o motivo pelo qual não encontramos mes consumados são as mesmas para os crimes tenta-
a descrição do crime, pois há uma pena prevista em dos. Essas teorias são aplicadas em alguns casos.
caso de consumação e outra pena para a hipótese de Há casos restritos em que o crime consumado e o
tentativa. crime tentado comportam igual punição: são os deli-
A tentativa de furto é a combinação de “subtrair, tos de atentado ou de empreendimento. Por exemplo:
para si ou para outrem, coisa alheia móvel” com a exe-
cução iniciada, mas que “não se consuma por circuns- z Evasão mediante violência contra a pessoa (art.
tâncias alheias à vontade do agente”. 352, do CP), em que o preso ou indivíduo submetido
Furto tentado é: caput do art. 155, c/c o inciso II, à medida de segurança detentiva, usando de vio-
art. 14, ambos do CP. lência contra a pessoa, recebe igual punição quan-
do se evade ou tenta evadir-se do estabelecimento
em que se encontra privado de sua liberdade;
Importante! z Lei nº 4.737, de 1965 — Código Eleitoral, art. 309,
A lei penal (CP ou lei extravagante) não prevê a no qual se sujeita à igual pena o eleitor que vota
ou tenta votar mais de uma vez, ou em lugar de
tentativa para cada crime, mas define o delito e
outrem.
prevê a pena para o caso de consumação.
Nas hipóteses de crime tentado, caso a lei não
Crimes Punidos apenas na Forma Tentada
preveja a pena, deverá ser considerada a pena
correspondente ao crime consumado, diminuída
A regra vigente no sistema penal brasileiro é a
de um a dois terços, nos moldes do parágrafo
punição dos crimes nas modalidades consumada e
único, do art. 14, do CP. tentada.
Mas em algumas situações não se admite a tentati-
E a pena para o caso de crime tentado? va, seja pela natureza da infração penal, seja em obe-
A punibilidade da tentativa é disciplinada pelo diência a determinado mandamento legal, razão pela
parágrafo único, art. 14, do CP. O CP acolheu como qual apenas é possível a imposição de sanção penal
regra a teoria objetiva, realística ou dualista. para a forma consumada do delito ou da contraven-
ção penal.
Art. 14 [...] É o que se verifica, a título ilustrativo, nos crimes
Parágrafo único. Salvo disposição em contrário, culposos (salvo na culpa imprópria) e nos crimes
pune-se a tentativa com a pena correspondente ao unissubsistentes.
crime consumado, diminuída de um a dois terços. Relembrando:

Teoria objetiva, realística ou dualista significa que, z Culpa: o agente não quer, nem assume o risco de
ao se determinar a pena da tentativa, ela deve corres- produzir o resultado;
ponder à pena do crime consumado, diminuída de 1/3 z Culpa imprópria: decorre do erro de tipo evitável
(um terço) a 2/3 (dois terços). nas descriminantes putativas ou do excesso nas
Como o desvalor do resultado é menor quando causas de justificação. O agente quer o resultado
comparado ao do crime consumado, o agente deve em razão de a sua vontade se encontrar viciada
suportar uma punição mais branda. por um erro que, com mais cuidado, poderia ser
28 evitado;
z Crime unissubsistente: é realizado por ato único, não provocou por sua vontade, nem podia de outro
não sendo admitido o fracionamento da conduta, modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifí-
como, por exemplo, no desacato (art. 331, do CP) cio, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
praticado verbalmente. § 1º Não pode alegar estado de necessidade quem
tinha o dever legal de enfrentar o perigo.
Entretanto, em hipóteses raríssimas somente é § 2º Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do
direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de
cabível a punição de determinados delitos na forma
um a dois terços.
tentada, pois nesse sentido orientou-se a previsão
legislativa quando da elaboração do tipo penal.
Conforme expressa o art. 24, CP, o estado de neces-
Exemplos disso encontram-se nos arts. 9º e 11, da
sidade é a situação de perigo atual, que não foi provo-
Lei n° 7.170, de 1983 — Crimes contra a Segurança
cada voluntariamente pelo agente, na qual ele viola o
Nacional.
bem de outrem, para não sacrificar direito seu ou de
terceiros, sacrifício que não poderia razoavelmente
Art. 9º Tentar submeter o território nacional, ou
parte dele, ao domínio ou à soberania de outro país. ser exigido.
Pena: reclusão, de 4 a 20 anos. Para que se configure:
Parágrafo único. Se do fato resulta lesão corporal
grave, a pena aumenta-se até um terço; se resulta z O perigo deve ser atual;
morte aumenta-se até a metade. z Deve haver ameaça a direito próprio ou alheio,
Art. 10 Aliciar indivíduos de outro país para inva- cujo sacrifício não era razoável de se exigir;
são do território nacional. z A situação não deve ter sido provocada pela von-
Pena: reclusão, de 3 a 10 anos. tade do agente;
Parágrafo único. Ocorrendo a invasão, a pena z A situação deve ser inevitável de outro modo;
aumenta-se até o dobro. z É necessário que o agente saiba que se encontra
Art. 11 Tentar desmembrar parte do território em estado de necessidade (requisito subjetivo);
nacional para constituir país independente. z Não deve haver o dever legal do agente de enfren-
Pena: reclusão, de 4 a 12 anos. tar o perigo (§ 1º, art. 24, CP).

ANTIJURIDICIDADE (ILICITUDE) O exemplo clássico é o de dois tripulantes de um


navio que, após o naufrágio, dividem um único salva-
A antijuridicidade, segundo requisito do crime, -vidas. Percebendo que vai afundar, um deles mata o
consiste na contradição entre fato e o ordenamento outro com a finalidade de ficar com o salva-vidas para
jurídico, resultando na lesão ao bem jurídico tutelado. si só, salvando-se.
O fato típico, até prova em contrário, é um fato que,
ajustando-se a um tipo penal, é antijurídico, a não ser Legítima Defesa
que haja uma causa que o torne lícito.
Art. 25 Entende-se em legítima defesa quem, usan-
Exclusão de Ilicitude do moderadamente dos meios necessários,
repele injusta agressão, atual ou iminente, a
A antijuridicidade pode ser afastada por certas direito seu ou de outrem.
causas, chamadas de “causas de exclusão da antijuri- Parágrafo único. Observados os requisitos previs-
dicidade” ou “exclusão da ilicitude”. Na incidência de tos no caput deste artigo, considera-se também em
uma delas, o fato permanece típico, mas não há cri- legítima defesa o agente de segurança pública que
me: excluindo-se a ilicitude, e sendo ela um requisito repele agressão ou risco de agressão a vítima man-
do crime, fica excluído o próprio crime. Como conse- tida refém durante a prática de crimes.
quência, o sujeito deve ser absolvido.
O art. 23, do CP, apresenta as causas de exclusão Constitui outra causa excludente de ilicitude, des-
da antijuridicidade: ta vez prevista no art. 25, CP. Encontra-se em legítima
defesa aquele que, utilizando os meios necessários
Art. 23 Não há crime quando o agente pratica o fato: com moderação, repele injusta agressão, atual ou imi-
I - em estado de necessidade; nente, a direito seu ou de terceiros.
II - em legítima defesa; Para que se configure, é necessário haver:
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no
exercício regular de direito. z Agressão injusta atual ou iminente, ou seja, pre-
sente ou prestes a acontecer;
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

z Preservação de qualquer bem jurídico, próprio ou


Dica
alheio (legítima defesa própria ou de terceiros);
Para facilitar seu estudo, memorize as causas z Repulsa utilizando os meios necessários, de forma
de exclusão de ilicitude com o mnemônico Bru- moderada.
ce “LEEE”:
� Legítima defesa; Estrito Cumprimento do Dever Legal
� Estado de necessidade; Encontra-se na primeira parte, inciso III, art. 23,
� Estrito cumprimento de dever legal; CP. Se o agente atua rigorosamente dentro do imposto
� Exercício regular de direito. por norma legal, o comportamento não pode ser anti-
jurídico. É o caso do oficial de justiça que, cumprindo
Estado de Necessidade determinação legal, realiza a apreensão de determi-
nado bem de um cidadão.
Art. 24 Considera-se em estado de necessidade
quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que 29
Exercício Regular de Direito z Quanto ao fato (supralegais):

Está disposto na segunda parte, inciso III, art. 23, „ Inexigibilidade de conduta diversa;
CP. Da mesma forma que a anterior, não pode ser ilíci- „ Estado de necessidade exculpante;
ta a conduta daquele que age estritamente exercendo „ Excesso exculpante;
direito seu. „ Excesso acidental.
Causas Supralegais de Exclusão da Antijuridicidade
Doença Mental
Existem condutas consideradas justas pela cons-
ciência social que não se encontram previstas nas Doença mental pode ser conceituada como o qua-
causas de exclusão da antijuridicidade elencadas no dro de alterações e doenças psíquicas que retiram
art. 23, CP. Nesse sentido, a doutrina aponta que o con- do indivíduo a faculdade de controlar e comandar a
própria vontade. Importante esclarecer que a depen-
sentimento do ofendido (fora das hipóteses em que o
dência patológica, como a dependência de drogas,
dissenso da vítima constitui requisito da figura típi-
configura doença mental quando retira a capacidade
ca) pode vir a excluir a ilicitude, caso se praticado em
de entender ou querer.
situação justificante, como é o caso do indivíduo que
tatua o corpo de outras pessoas, praticando conduta
Desenvolvimento Mental Incompleto
típica de lesões corporais, que, no entanto, são lícitas
se presente o consentimento do ofendido.
Por desenvolvimento mental incompleto se
Excesso Punível entende as limitações na capacidade de compreensão
da ilicitude do fato ou a incapacidade de se autodeter-
Ao reagir à agressão injusta que está sofrendo, ou minar de acordo com o entendimento (precário) uma
que está em vias de sofrer, em relação ao meio usado o vez que o sujeito ainda não atingiu maturidade (seja
agente pode encontrar-se em três situações diferentes: física ou mental). São causas:

z Usa-se de um meio moderado e dentro do neces- z A menoridade: os menores de 18 anos, em razão de


sário para repelir à agressão. Haverá necessaria- não sofrerem sanção penal pela prática de ilícito
mente o reconhecimento da legítima defesa; penal, em decorrência da ausência de culpabilida-
z De maneira consciente, emprega um meio desne- de, estão sujeitos ao procedimento medidas sócio
cessário ou usa imoderadamente o meio necessá- educativos prevista no ECA;
rio. A legítima defesa fica afastada se for excluído z Características pessoais do agente, como a falta de
um dos seus requisitos essenciais; convivência social (surdo que ainda não aprendeu
z Após a reação justa (meio e moderação), por impre- a se comunicar).
vidência ou conscientemente continua desneces-
sariamente na ação. Estará agindo com excesso o Desenvolvimento Mental Retardado
agente que intensifica demasiada e desnecessaria-
mente a reação inicialmente justificada. O excesso Configura aqui o indivíduo que tem uma capacida-
poderá ser doloso ou culposo. O agente responderá de que não corresponde às experiências para aquele
pela conduta constitutiva do excesso. momento de vida, o que significa que a plena poten-
cialidade jamais será atingida. Os inimputáveis aqui
CULPABILIDADE E SUAS EXCLUDENTES tratados não possuem condições de entender o crime
que cometeram.
Como acabamos de ver, ao menor de 18 anos se
As excludentes de culpabilidade podem ser divi-
aplicam regras próprias. Ao completar 18 anos, a lei
didas, para fins de estudo, em dois grupos: as que se
presume que todos os indivíduos são imputáveis.
relacionam com o agente e as que dizem respeito ao
Porém, tal presunção é relativa, ou seja, é passível de
fato:
aferição. Assim, existem três possíveis critérios para a
verificação da inimputabilidade:
z Quanto ao agente do fato:
z Sistema psicológico: o que interessa é somente o
„ Existência de doença mental ou desenvolvi- momento da ação ou omissão delituosa, se ele tinha
mento mental incompleto ou retardado (caput, ou não condições de avaliar o caráter criminoso do
art. 26, CP); fato e de orientar-se de acordo com esse entendi-
„ Existência de embriaguez decorrente de vício mento, ou seja, o momento da prática do crime. A
(caput, art. 26, CP); emoção não exclui a imputabilidade. A pessoa que
„ Menoridade (art. 27, CP). comete crime com integral alternação de seu estado
físico-psíquico responde pelos seus atos;
z Quanto ao fato (legais): z Sistema biológico: interessa saber se o agente é
portador de alguma doença mental ou desenvolvi-
„ Coação moral irresistível (art. 22, CP); mento mental incompleto ou retardo, caso positi-
„ Obediência hierárquica (art. 22, CP); vo, é considerado inimputável;
„ Embriaguez decorrente de caso fortuito ou for- z Sistema biopsicológico: exige-se que a causa
ça maior (§ 1º, art. 28, CP); geradora esteja prevista em lei e que, além disso,
„ Erro de proibição escusável (art. 21, CP); atue efetivamente no momento da ação delituo-
„ Descriminantes putativas. sa, retirando do agente a capacidade de entendi-
mento e vontade. Desta forma, será inimputável
30 aquele que, em razão de uma causa prevista em lei
(doença mental, incompleto ou retardado), atue no A embriaguez admite qualquer meio probatório. É
momento da pratica da infração penal sem capaci- adotado o critério psicológico.
dade de entender o caráter criminoso do fato. Já na embriaguez acidental fortuita, decorrente
de caso fortuito ou de força maior, que ocorre, por
Somente há inimputabilidade se os três requisitos exemplo, quando o agente não conhece o caráter
estiverem presentes, sendo exceção aos menores de alcoólico da bebida ou o agente é forçado a ingerir a
18 anos, regidos pelo sistema biológico.
bebida, adota-se o critério psicológico. Porém, não
basta estar embriagado fortuitamente.
Questões Importantes sobre Inimputabilidade
Deve-se analisar se ao momento da ação ou omis-
A inimputabilidade do acusado é fornecida pelo são o agente era totalmente incapaz de entender o
exame pericial feito pelo médico legal, exame que é caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo
denominado “incidente de insanidade mental”, em com esse entendimento.
que se suspende o processo até o resulto final. Há A embriaguez pode ser completa (§ 1º, art. 28, CP),
prazo de 10 dias para provar a existência da causa quando o agente é inteiramente incapaz de entender
excludente da culpabilidade (Lei nº 11.719, de junho o caráter ilícito do fato, e pode ser embriaguez incom-
de 2008). pleta (§ 2º, art. 28, CP), quando o agente não possuía a
Os requisitos biopsicológicos da inimputabilidade plena capacidade de entender o caráter ilícito, ou seja,
são: não era inteiramente incapaz (possui um mínimo de
capacidade e determinação.
z Somente há inimputabilidade se os três requisitos
Posto isso, teremos duas possibilidades:
estiverem presentes, sendo exceção aos menores
de 18 anos, regidos pelo sistema biológico;
z Causal: existencial de doença mental ou de desen- z Embriaguez completa = isenção de pena;
volvimento incompleto ou retardado, causas pre- z Embriaguez incompleta = redução de pena de 1/3
vistas em lei; a 2/3.
z Cronológico: atuação ao tempo da ação ou omis-
são delituosa; A embriaguez patológica deve ser tratada como
z Consequencial: perda total da capacidade de doença mental, regida pelo art. 26, CP.
entender ou da capacidade de querer. Já na embriaguez preordenada, o agente embria-
ga-se para encorajar-se a praticar o crime. Será punido
Dispõe o Código Penal: pelo crime doloso cometido e terá a pena aumentada.
Aplicação da agravante genérica, alínea “l”, inciso II,
Art. 26 É isento de pena o agente que, por doença men-
art. 61 do CP.
tal ou desenvolvimento mental incompleto ou retarda-
do, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento.
Redução de pena DOS CRIMES CONTRA A PESSOA
Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um
a dois terços, se o agente, em virtude de perturba-
ção de saúde mental ou por desenvolvimento men- CRIMES CONTRA A VIDA
tal incompleto ou retardado não era inteiramente
capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de Trataremos, neste tópico, dos crimes contra a vida,
determinar-se de acordo com esse entendimento. que estão incorporados nos arts. 121 ao 128, do Códi-
Menores de dezoito anos go Penal. Eles tutelam o bem jurídico mais relevante
Art. 27 Os menores de 18 (dezoito) anos são penal- que temos: a vida, nas suas modalidades intrauterina
mente inimputáveis, ficando sujeitos às normas
ou extrauterina. Os crimes contra a vida poderão ser
estabelecidas na legislação especial.
Emoção e paixão dolosos ou culposos, sendo que os primeiros poderão
ter conduta comissiva ou omissiva.
No caso de embriaguez acidental completa, temos:
Homicídio
Art. 28 Não excluem a imputabilidade penal:
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

I - a emoção ou a paixão; O crime de homicídio consiste na supressão da


Embriaguez vida extrauterina praticada por outrem. Tem como
II - a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ação a seguinte conduta: matar alguém.
ou substância de efeitos análogos.
A respeito do crime de homicídio, podemos levan-
§ 1º É isento de pena o agente que, por embria-
guez completa, proveniente de caso fortuito ou tar os seguintes pontos:
força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão,
inteiramente incapaz de entender o caráter ilí- z Núcleo do tipo: matar;
cito do fato ou de determinar-se de acordo com z Sujeito ativo e sujeito passivo: qualquer pessoa;
esse entendimento. z Objeto material: o alguém previsto na conduta,
§ 2º A pena pode ser reduzida de um a dois terços,
necessariamente, deve ser a pessoa humana;
se o agente, por embriaguez, proveniente de caso
fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo
z Consumação: o homicídio é consumado com a
da ação ou da omissão, a plena capacidade de morte da vítima.
entender o caráter ilícito do fato ou de deter-
minar-se de acordo com esse entendimento. 31
É um crime classificado de diversas modalidades. Atenção: a segunda parte do inciso I, art. 1º, da
As principais classificações são: Lei nº 8.072, de 1990, com redação dada por meio da
Lei nº 13.964, de 2019, trata de hipóteses de homicídio
z Crime comum: pode ser praticado por qualquer qualificado.
pessoa, sem que necessite de quaisquer condições
especiais; z Homicídio Privilegiado
z Crime material: para sua consumação, é exigida a
ocorrência do resultado morte; Art. 121 [...]
z Crime de forma livre: pode ser praticado com § 1º Se o agente comete o crime impelido por moti-
qualquer modo de execução (a tiros, facadas, pau- vo de relevante valor social ou moral, ou sob o
ladas, por meio de veneno, entre outros); domínio de violenta emoção, logo em seguida
z Crime instantâneo de efeitos permanentes: a a injusta provocação da vítima, o juiz pode
conduta delituosa não se prolonga no tempo e, reduzir a pena de um sexto a um terço.
após a consumação, os efeitos são irreversíveis;
z Crime plurissubsistente: pode ser praticado por Segundo Nucci, privilégios são circunstâncias
meio de um ou mais atos de execução; legais específicas, vinculadas ao tipo penal incrimi-
z Crime unissubjetivo: pode ser praticado por um nador, provocadoras da diminuição da faixa de apli-
ou mais agentes.
cação da pena, em patamares prévia e abstratamente
estabelecidos pelo legislador, alterando o mínimo e o
É importante que você saiba as classificações aqui
máximo previstos para o crime.
descritas, já que elas são bastante cobradas em provas.
Para fins do nosso estudo, vamos entender o homi-
O crime de homicídio é dividido em:
cídio privilegiado como uma modalidade mais branda
do crime de homicídio.
z Homicídio Doloso:
O homicídio privilegiado está previsto no parágra-
„ Homicídio simples (caput, do art. 121, do CP); fo 1º, art. 121, e se configura quando o agente comete
„ Homicídio privilegiado (§ 1º, art. 121, do CP); o crime amparado por uma das seguintes situações:
„ Homicídio qualificado (§ 2º, art. 121, do CP).
„ Relevante valor social: é aquele crime que
z Homicídio Culposo (§ 3º, art. 121, do CP). atende aos interesses da coletividade, ou seja,
a sociedade o entende como possível e com-
Veremos a seguir cada um deles. preensível. Ex.: Indivíduo acaba com a vida de
malfeitor em prol da sociedade;
z Homicídio Simples „ Relevante valor moral: referente ao valor
moral individual, leva-se em conta os interes-
O homicídio simples está previsto no caput, do art. 121: ses do agente. Temos como exemplos ações
movidas por compaixão, beneficiação, amparo.
Art. 121 Matar alguém: Ex.: Eutanásia;
Pena - reclusão, de seis a vinte anos. „ Sob o domínio de violenta emoção, logo
em seguida à injusta provocação da vítima:
Tanto o sujeito ativo quanto o sujeito passivo do como o próprio nome diz, a ação tem que ter
homicídio simples podem ser qualquer pessoa. A con- acontecido logo após o ato, e o agente estando
duta é praticada mediante dolo (vontade consciente sob condições de grandes emoções. O agente
do sujeito). O crime se consumará quando ocorrer a deve estar completamente dominado pela situ-
efetiva morte da vítima. Admite-se a forma tentada.
ação. Ex.: O marido chega em casa e pega sua
Este crime é bastante difícil de ser configurado, já
companheira em flagrante com outro homem;
que, dificilmente, ocorre sem que alguma qualificadora
dominado pela raiva, sem pensar e sem contro-
(que veremos a seguir) seja aplicada. Podemos entender,
le, acaba matando o indivíduo.
então, que o homicídio simples é residual, ou seja, será
simples quando não for qualificado.
Sobre o homicídio simples, a informação mais
importante é que, em regra, ele não é crime hedion- Importante!
do. Entretanto, se for praticado em atividade típica de No caso descrito no último item, é importante
grupo de extermínio, ainda que cometido por um só sabermos que:
agente, será crime hediondo.
� O agente deve estar sob o domínio de violenta
O homicídio simples só será crime hediondo quando
praticado em atividade típica de grupo de extermínio,
emoção;
ainda que cometido por um só agente, conforme a pri- � A ação deve ocorrer logo em seguida, ou seja,
meira parte do inciso I, art. 1º, da Lei nº 8.072, de 1990. imediatamente após à injusta provocação;
� Trata-se de repelir injusta provocação e não
Art. 1º São considerados hediondos os seguintes injusta agressão, vez que, se considerarmos
crimes, todos tipificados no Decreto-Lei nº 2.848, de uma injusta agressão, estaríamos frente a uma
7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados excludente de ilicitude (legítima defesa);
ou tentados:
� A injusta provocação deve ser da vítima e não
I - homicídio (art. 121), quando praticado em ativida-
de típica de grupo de extermínio, ainda que cometido de terceiros.
por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § Atenção: as bancas examinadoras costumam
32 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII e VIII); [...] alterar o termo domínio por influência!
Quando reconhecido o privilégio, no crime de Agora, vamos esclarecer cada um dos incisos do
homicídio, quais as consequências? O juiz pode redu- parágrafo 2º, art. 121, do CP:
zir a pena do agente de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço). Se o homicídio é cometido:
Atente-se ao patamar de redução da pena.
Sobre o homicídio privilegiado, algumas conside- Art. 121 [...]
§ 2º [...]
rações são muito importantes para a sua prova:
I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou
por outro motivo torpe;
„ A jurisprudência firmou entendimento que o
homicídio privilegiado, ainda que qualificado, Trata-se de uma qualificadora de ordem subjetiva.
não é considerado crime hediondo. Para que O homicídio praticado mediante paga ou promessa
seja considerado um crime hediondo, é neces- de recompensa é conhecido doutrinariamente como
sário que a qualificadora seja de ordem objeti- homicídio mercenário. Tal qualificadora se refere
va (estudaremos a seguir); à motivação do agente, sendo que a consumação do
„ Não se comunica para coautores ou partícipes. delito ocorre com a morte da vítima e o pagamento da
recompensa é mero exaurimento do delito.
Exemplo: o crime de homicídio é cometido por O homicídio mercenário fica configurado quan-
dois agentes (Vicente e Gabriel). Gabriel o pratica sob o do o agente pratica o crime motivado por alguma
domínio de violenta emoção, logo em seguida à injus- recompensa (segundo a doutrina, deve ser de nature-
ta provocação; Vicente, não. Nesta hipótese, Gabriel za econômica), que pode ser anterior (na modalida-
responderá por homicídio privilegiado e Vicente, por de paga) ou posterior (na modalidade promessa de
homicídio. recompensa).
A 6ª Turma do STJ entende que a comunicabilida-
z Homicídio Qualificado de da qualificadora “mediante paga ou promessa de
recompensa” não é automática, tratando-se de qualifi-
No homicídio qualificado, o agente estará subme- cadora de natureza pessoal, que não irá se comunicar
tido a uma pena maior, mais grave. As qualificado- automaticamente ao mandante do crime, responden-
ras são fatores que tornam a conduta praticada pelo do este na modalidade qualificada, se torpe for o moti-
agente, de alguma forma, mais reprovável por parte vo que o levou a pagar pela morte da vítima.1
da sociedade. Importante: a comunicabilidade da qualificadora
O Código Penal, no parágrafo 2º, art. 121, estabele- ao mandante do crime não é automática e dependerá
ce as seguintes qualificadoras: da apuração da motivação de cada um dos agentes.
Assim, por exemplo, se Alessandro, que tem a
Art. 121 [...] intenção de matar um desafeto, chamado Antoniel,
§ 2º [...] pagar R$ 1.000,00 a Fabrício para que este mate Anto-
I - mediante paga ou promessa de recompensa, niel, a qualificadora será aplicada a Fabrício; já para
ou por outro motivo torpe; Alessandro, o mandante, o homicídio não será, neces-
II - por motivo fútil; sariamente, qualificado.
III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfi- Motivo torpe refere-se a algo repugnante, nojen-
xia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou to, abjeto. Ex.: Matar o pai para ficar com sua herança.
de que possa resultar perigo comum; O STJ2 entende que o ciúme, por si só, sem outras cir-
IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissi- cunstâncias, não caracteriza o motivo torpe.
mulação ou outro recurso que dificulte ou torne
impossível a defesa do ofendido; II - por motivo fútil;
V - para assegurar a execução, a ocultação, a
impunidade ou vantagem de outro crime: Motivo fútil refere-se a um motivo pequeno, despro-
Pena - reclusão, de doze a trinta anos. porcional, banal. Há desproporcionalidade entre a con-
Feminicídio (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) duta praticada e a motivação. Ex.: Homicídio motivado
VI - contra a mulher por razões da condição de por dívida de uma carteira de cigarro no valor de R$ 5,00.
sexo feminino: (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) Trata-se de uma qualificadora de natureza subjetiva.
VII - contra autoridade ou agente descrito nos
arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integran- III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfi-
tes do sistema prisional e da Força Nacional de xia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de
Segurança Pública, no exercício da função ou em que possa resultar perigo comum;
decorrência dela, ou contra seu cônjuge, com-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

panheiro ou parente consanguíneo até terceiro Temos, aqui, uma qualificadora de natureza obje-
grau, em razão dessa condição: (Incluído pela Lei tiva, relacionada aos meios empregados pelo agente
nº 13.142, de 2015) para praticar o crime, que podem estar relacionados a
VIII - com emprego de arma de fogo de uso res- meios insidiosos (emprego de veneno), cruéis (asfixia,
trito ou proibido: tortura) ou que possam resultar em perigo comum
Pena - reclusão, de doze a trinta anos. (fogo, explosivo).
Em relação ao emprego de veneno, segundo a
Atenção: a segunda parte do inciso I, art. 1º, da Lei doutrina majoritária, tal qualificadora só irá se con-
nº 8.092, de 1990, com redação dada por meio da Lei figurar se ficar comprovado que a vítima ingeriu o
nº 13.964, de 2019, diz que será hediondo o homicídio veneno sem saber que o fazia. Caso a vítima saiba que
qualificado em todas as hipóteses dos incisos I, II, III, está ingerindo veneno, outra qualificadora poderá ser
IV, V, VI, VII e VIII, do parágrafo 2º, art. 121, do CP. aplicada, a de meio cruel.
1 STJ. 6ª Turma. AgInt no REsp 1681816/GO, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 03/05/2018.
2 HC 123.918/MG e AgRg no AREsp 569047/PR. 33
Importante: no direito penal, o agente é puni- II - menosprezo ou discriminação à condição de
do, em regra, pelo crime que queria praticar. Assim, mulher.
caso o agente queira torturar, mas se exceda e acabe
matando a vítima, irá responder por tortura qualifi- O feminicídio ficará configurado com a morte da
cada pelo resultado morte. Se o agente queria matar e mulher devido à violência de gênero e não quando
usa a tortura como meio para atingir a sua finalidade, ocorrer a morte da mulher em qualquer situação.
irá responder por homicídio qualificado pela tortura.

IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimu- Importante!


lação ou outro recurso que dificulte ou torne impos-
sível a defesa do ofendido; Informativo n° 625 STJ3 Não caracteriza bis in
idem o reconhecimento das qualificadoras de
As qualificadoras mencionadas no inciso IV também motivo torpe e de feminicídio no crime de homi-
estão relacionadas aos meios empregados pelo agente.
cídio praticado contra mulher em situação de vio-
Trata-se de uma qualificadora de natureza objetiva.
Quando o agente comete um homicídio, pratican- lência doméstica e familiar.
do-o de forma que a defesa da vítima seja dificultada Isso ocorre porque o feminicídio é uma qualifi-
ou se torne impossível, ele responderá na modalidade cadora de natureza objetiva, enquanto o motivo
qualificada. torpe é uma qualificadora de natureza subjetiva.
Sendo assim, é possível o reconhecimento da
V - para assegurar a execução, a ocultação, a impu-
nidade ou a vantagem de outro crime;
qualificadora de motivo torpe e do feminicídio ao
mesmo tempo, quando o homicídio for praticado
Nesta forma qualificada, o agente pratica o homi- contra mulher em situação de violência domésti-
cídio para, de alguma forma, garantir uma vantagem ca e familiar.
relacionada a um outro crime. Trata-se de uma quali-
ficadora de natureza subjetiva. A doutrina chama esta
qualificadora de conexão instrumental, que pode ser Ademais, é importante ressaltar que a pena do
teleológica ou consequencial. feminicídio será aumentada de 1/3 até a metade em
Conexão instrumental teleológica assegura a exe- casos de ser cometido nas hipóteses do parágrafo 7º,
cução futura de um outro crime (homicídio + crime: do art. 121. Veja:
garantir a execução de outro crime).
Conexão instrumental consequencial assegura a Art. 121 [...]
ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime, § 7º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um
praticado anteriormente (crime + homicídio: assegu- terço) até a metade se o crime for praticado:
rar a ocultação, impunidade ou vantagem). I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses pos-
Segundo a doutrina majoritária, o crime anterior
teriores ao parto;
ou posterior pode ter sido praticado por uma outra
II - contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos, com
pessoa, não existindo a obrigatoriedade de que seja o
deficiência ou com doenças degenerativas que acar-
próprio autor do homicídio.
retem condição limitante ou de vulnerabilidade física
Atente-se, pois as bancas examinadoras costu-
ou mental; (Redação dada pela Lei nº 14.344, de 2022)
mam confundir o candidato ao afirmar que nesta
III - na presença física ou virtual de descenden-
qualificadora o agente pratica o homicídio para, de
te ou de ascendente da vítima;
alguma forma, garantir uma vantagem relacionada a
IV - em descumprimento das medidas protetivas
uma contravenção penal. A qualificadora é relacio-
de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput
nada a outro crime e não a contravenção penal. O
do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006.
Direito Penal não admite analogia in malam partem.

VI - contra a mulher por razões da condição de sexo Grave bem as hipóteses de aumento de pena, pois
feminino. são cobradas recorrentemente em provas de concurso
público.
Fique atento, pois este dispositivo tem grande incidên- É importante ressaltar que o inciso II foi modifica-
cia em provas de concursos públicos. Estamos falando do do pela Lei nº 14.344, de 2022 (Lei Henry Borel), para
feminicídio, uma qualificadora de ordem objetiva. revogar a causa de aumento de pena de pessoa menor
Você acertará todos os itens correspondentes quando
de 14 anos, evitando o bis in idem com a qualificadora
entender que nem toda morte de mulher será considera-
de pessoa menor de 14 anos.
da feminicídio, mas, sim, a morte de mulher praticada
em razão da sua condição de sexo feminino.
Art. 121 [...]
O Código Penal estabelece que se deve considerar
§ 2º [...]
razões de condição de sexo feminino quando a mor-
te da mulher envolver violência doméstica ou fami- VII - contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142
liar ou menosprezo ou discriminação à condição de e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema
mulher. Veja: prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no
exercício da função ou em decorrência dela, ou contra
Art. 121 [...] seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo
§ 2º A Considera-se que há razões de condição de até terceiro grau, em razão dessa condição.
sexo feminino quando o crime envolve:
I - violência doméstica e familiar;

34 3 HC 433.898-RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, por unanimidade, julgado em 24/04/2018, DJe 11/05/2018.
O homicídio será qualificado quando praticado I - 1/3 (um terço) até a metade se a vítima é pes-
contra os seguintes agentes ou autoridades: soa com deficiência ou com doença que implique o
aumento de sua vulnerabilidade;
„ Integrantes das Forças Armadas (Marinha, II - 2/3 (dois terços) se o autor é ascendente,
Exército ou Aeronáutica); padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, compa-
„ Integrantes dos órgãos de segurança pública: nheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da
vítima ou por qualquer outro título tiver autorida-
Polícia Federal; Polícia Rodoviária Federal;
de sobre ela.
Polícia Ferroviária Federal; Polícias Civis; Poli-
ciais Militares; Corpo de Bombeiros Militares;
A Lei Henry Borel inclui, ainda, o parágrafo 2º-B
Polícias Penais federal, estadual e municipal,
ao homicídio, prevendo causas de aumento de pena
Guardas Municipais, Agentes de segurança viá-
nos casos de homicídio contra menor de 14 anos. Vale
ria, Força Nacional de Segurança Pública.
mencionar que o inciso I somente tem aplicação se o
agente conhece a condição da vítima.
Mais uma vez, você deve ficar atento e levar para a
sua prova que não é a morte de qualquer dos agentes
z Homicídio Culposo
ou autoridades citados que irá qualificar o homicídio,
mas, sim, se a morte deles for praticada no exercício
Art. 121 [...]
da função (enquanto eles trabalham) ou em razão da § 3º Se o homicídio é culposo:
função (devido ao cargo que eles ocupam ou função Pena - detenção, de um a três anos.
que eles exercem).
A qualificadora também será aplicada se o homi- O homicídio culposo é aquele em que o agente não
cídio for praticado contra o cônjuge, companheiro ou quer como o resultado a morte, nem assume o risco de
parente consanguíneo até o 3º grau dos agentes ou realizá-lo, mas acaba causando a morte de alguém por
autoridades que vimos, também motivado pela fun- imprudência, negligência ou imperícia.
ção que os agentes ou autoridades exercem. A imprudência fica configurada quando o agente
é afoito, praticando conduta não recomendada pela
Dica vida em sociedade. Exemplo: João realiza ultrapassa-
gem em local proibido e atinge ciclistas que trafegam
É possível que o homicídio seja privilegiado e
na rodovia.
qualificado ao mesmo tempo? A negligência, por sua vez, fica configurada quan-
Sim, é possível, porém, é necessário que a qua- do o agente é omisso ou relapso. Ele não faz algo que
lificadora seja de natureza objetiva, ou seja, rela- a vida em sociedade recomenda.
cionada aos meios empregados pelo agente Além disso, imperícia é a falta de aptidão técnica
para executar o crime. para o desempenho de determinada atividade.
Segundo a doutrina majoritária, o homicídio Nos exemplos a seguir, que a doutrina apresen-
privilegiado qualificado não será considerado ta com mais frequência, poderemos ver a diferença
hediondo, porque o privilégio afasta a hediondez. entre a negligência e a imperícia:

VIII - com emprego de arma de fogo de uso restrito „ Exemplo: Adolfo é médico cirurgião. Certo dia,
ou proibido; ao fazer uma cirurgia renal, ele deixa um bistu-
ri dentro do paciente, que vem a óbito.
Trata-se de uma qualificadora de natureza objeti-
va e deve ser interpretada de acordo com o Estatuto Neste caso, Adolfo irá responder por homicídio cul-
do Desarmamento e demais normas complementares. poso por negligência. Observe que ele é médico cirur-
gião, logo, tem perícia para a realização de cirurgias,
IX - contra menor de 14 (quatorze) anos: (Inclu- mas foi omisso ao esquecer o equipamento dentro do
ído pela Lei nº 14.344, de 2022) paciente.
Pena - reclusão, de doze a trinta anos.
„ Exemplo: Teobaldo é médico clínico geral em
Recentemente, a Lei nº 14.344, de 24 de maio de período de residência. Ele vai fazer uma cirurgia
2022 (Lei Henry Borel), modificou o parágrafo 2º, do renal, erra no procedimento e a vítima morre.
art. 121, do Código Penal, e passou a estabelecer que
é homicídio qualificado o assassinato de pessoa Teobaldo irá responder por homicídio culposo por
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

menor de 14 anos (pena de reclusão de 12 a 30 anos). imperícia, já que faltava, a ele, aptidão necessária
Vale mencionar que, o art. 32, da Lei Henry Borel, alte- para realizar perícias.
rou também a Lei nº 8.072, de 1990, de modo que o No caso do homicídio culposo, é possível a aplica-
homicídio praticado contra menores de 14 anos pas- ção do instituto do perdão judicial, previsto no pará-
sou a ser considerado hediondo. grafo 5º, art. 121, do CP:
Importante: a nova qualificadora do homicídio
abrange todo o homicídio de criança, mas não todos Art. 121 [...]
de adolescente, uma vez que se limitou à idade de 14 § 5º Na hipótese de homicídio culposo, o juiz pode-
anos. Dessa forma a majorante prevista no parágrafo rá deixar de aplicar a pena, se as conseqüências da
4º (contra pessoa menor de 14 anos), art. 121, não se infração atingirem o próprio agente de forma tão
aplica mais, uma vez que incide a qualificadora. grave que a sanção penal se torne desnecessária.

Art. 121 […] Você pode entender a aplicação do perdão judi-


§ 2º-B A pena do homicídio contra menor de 14 cial ao seguinte caso: pai que, por imprudência, pro-
(quatorze) anos é aumentada de: voca um acidente de trânsito e mata o próprio filho. 35
Neste caso, as consequências da infração penal (homi- sim, a conduta daquele que induz, instiga ou auxilia a
cídio) atingem o pai de forma tão grave (a morte de prática de um suicídio ou da automutilação.
seu filho) que é desnecessária a aplicação de sanção
penal, podendo o juiz deixar de aplicar a pena. Art. 122 Induzir ou instigar alguém a suicidar-se
O instituto do perdão judicial se aplica apenas aos ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio
casos de homicídio culposo. material para que o faça:
Falaremos agora das causas de aumento de pena Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.
aplicadas ao homicídio.
Inicialmente, devemos entender o que significa
z Homicídio Majorado cada um dos verbos que configuram o tipo penal:

As causas de aumento de pena estão previstas nos z Induzir: criar uma ideia que não existe. A vítima
parágrafos 4º, 6º e 7º, do art. 121. Veja: nunca pensou em se suicidar e o agente a induz,
fazendo com que tenha esta ideia;
Art. 121 [...] z Instigar: reforçar uma ideia que já existe. A víti-
§ 4º No homicídio culposo, a pena é aumentada ma pensa ou já pensou em se suicidar e o agente a
de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobser- apoia a realizar o ato;
vância de regra técnica de profissão, arte ou z Auxiliar: o agente presta auxílio material à víti-
ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato
ma. Por exemplo, emprestando uma arma, uma
socorro à vítima, não procura diminuir as con-
corda, entre outras formas de auxílio.
seqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão
em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é
aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é prati- É importante destacar que a consumação do crime
cado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou do art. 122 se dá com o mero induzimento, instigação
maior de 60 (sessenta) anos. ou auxílio ao suicídio ou à automutilação, ou seja, tra-
ta-se de um crime formal. O crime não depende da
As causas de aumento de pena aplicáveis ao ocorrência do resultado morte, mas ocorrendo, acar-
homicídio culposo merecem atenção especial. Nes- retará o reconhecimento de qualificadoras.
tes casos, a pena é aumentada de 1/3 nas seguintes Com o advento da Lei nº 13.968, de 2019, na hipó-
circunstâncias: tese de a automutilação ou de a tentativa de suicídio
resultar lesão corporal de natureza grave ou gravíssi-
„ Inobservância de regra técnica de profissão, ma, nos termos dos parágrafos 1º e 2º, art. 129, do CP,
arte ou ofício; a pena cominada é de reclusão, de 1 a 3 anos.
„ Se o agente deixa de prestar imediato socorro à
vítima, não procura diminuir as consequências de Art. 122 [...]
seu ato. Nas hipóteses em que a vítima tiver morte § 1º Se da automutilação ou da tentativa de suicídio
instantânea, tal circunstância, por si só, não pode resulta lesão corporal de natureza grave ou gravís-
afastar a causa de aumento da pena, exceto quan- sima, nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 129 deste
do o óbito seja evidente a qualquer pessoa4; Código:
„ Se o agente foge para evitar a prisão em flagrante. Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
§ 2º Se o suicídio se consuma ou se da automu-
Já no homicídio doloso, a pena é aumentada de tilação resulta morte:
1/3 quando: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

„ Crime praticado contra pessoa menor de 14 Essa redação (parágrafo 1º, art. 122, do CP) citada
anos ou maior de 60 anos. põe fim à discussão sobre a possibilidade de tentativa
para o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio.
§ 6º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até Hoje, a lei diz que o crime de induzimento, insti-
a metade se o crime for praticado por milícia gação ou auxílio ao suicídio e, agora, à automutilação,
privada, sob o pretexto de prestação de serviço de admite tentativa. Porém, em caso de consumação do
segurança, ou por grupo de extermínio. suicídio ou de a automutilação resultar morte, a pena
prevista é de reclusão, de 2 a 6 anos.
Nos casos do parágrafo 6º, a causa de aumento de
pena é aplicável tanto ao homicídio simples, quanto z Forma Qualificada
ao homicídio qualificado.
Já quanto ao feminicídio, conforme já vimos, o Com a redação da Lei nº 13.968, de 2019, a pena para
aumento será de 1/3 até metade, quando praticado o crime de induzimento, instigação e auxílio ao suicídio
nas circunstâncias do parágrafo 7º, art. 121. e de automutilação é duplicada em dois casos. Veja:

Induzimento, Instigação ou Auxílio a Suicídio ou à Art. 122 [...]


Automutilação § 3º A pena é duplicada:
I - se o crime é praticado por motivo egoístico,
No Direito Penal Brasileiro, não se pune a autole- torpe ou fútil;
são, ou seja, uma pessoa não será punida penalmente II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por
caso provoque mal somente a si própria. qualquer causa, a capacidade de resistência.
O tipo penal que iremos estudar não pune o suicí-
dio, que consiste na eliminação da própria vida, mas,
36 4 STJ. 5ª Turma. HC 269038-RS, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 2/12/2014 (Info 554).
Nestes casos, a vítima deve possuir uma capacida- O infanticídio é classificado pela doutrina como
de mínima de resistência. Caso a vítima seja menor, crime bipróprio, já que ele exige qualidades especiais
com capacidade de discernimento, o crime praticado tanto do sujeito ativo quanto do sujeito passivo.
será o de homicídio ou lesão corporal, conforme vere- É necessário que o sujeito ativo — quem pratica a
mos no parágrafo 6º, do art. 122. conduta — seja a própria mãe e que o sujeito passivo —
quem é ameaçado pela conduta criminosa — seja o pró-
z Aumento de Pena prio filho, para que este tipo penal fique configurado.
São outros requisitos que devem estar presentes
Art. 122 [...] para configuração do crime de infanticídio:
§ 4º A pena é aumentada até o dobro se a conduta é
realizada por meio da rede de computadores, de z Que a mãe esteja sob a influência do estado puer-
rede social ou transmitida em tempo real. peral: o estado puerperal é uma alteração emocional
§ 5º Aumenta-se a pena em metade se o agente é líder pela qual passam algumas mães durante o período
ou coordenador de grupo ou de rede virtual.
correspondente ao parto. Não existe prazo defini-
do em lei, na doutrina ou na jurisprudência, sobre
Não é caso de crime de induzimento, instigação ou
quanto tempo dura o estado puerperal;
auxílio ao suicídio e à automutilação quando a víti-
z Que a conduta seja praticada durante ou logo
ma não tem algum discernimento para a prática do
após o parto: o Código Penal adota, para o crime
suicídio e da autolesão. Caso a conduta seja pratica-
de infanticídio, critério fisiológico, também deno-
da contra alguém sem qualquer discernimento, por
minado biopsicológico ou fisiopsicológico, afastan-
exemplo, uma criança de 10 anos de idade, não esta-
do-se do sistema psicológico, que exigia o motivo
remos diante do crime de induzir, instigar ou auxiliar
de honra. O simples estado puerperal é apto ao
a prática de suicídio, mas, sim, diante do crime de
reconhecimento do infanticídio.
homicídio.
Estado puerperal é o conjunto das perturbações psí-
Art. 122 [...]
§ 7º Se o crime de que trata o § 2º deste artigo é quicas e fisiológicas sofridas pela mulher em razão do
cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou fenômeno do parto. Diversos fatores como, por exemplo,
contra quem não tem o necessário discernimento sofrimento, a perda de sangue, a angústia, a inquietação
para a prática do ato, ou que, por qualquer outra ou outros podem levar a parturiente a sofrer um colapso
causa, não pode oferecer resistência, responde o do senso moral, uma liberação de impulsos maldosos,
agente pelo crime de homicídio, nos termos do art. chegando, por isso, a matar o próprio filho.
121 deste Código. A influência do estado puerperal normalmente
acontece em qualquer parto, havendo, inclusive, jul-
Neste sentido, o Código Penal trata, com a inclusão gados dispensando a prova pericial para comprová-lo.
da redação dada por meio da Lei nº 13.968, de 2019, O infanticídio deve ocorrer durante o parto ou logo
da hipótese da automutilação ou da tentativa de sui- após, ou seja, logo em seguida ao parto, sem intervalo.
cídio resultar lesão corporal de natureza gravíssima. Antes do início do parto, a morte do feto será aborto, e
Se for cometido contra menor de 14 anos ou contra se não ocorrer logo após o parto, será homicídio.
quem, por enfermidade ou deficiência mental, não A expressão “logo após o parto” compreende todo
tem o necessário discernimento para a prática do ato, o período em que permanecer a influência do esta-
ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer do puerperal. Sobrevindo a fase da bonança, em que
resistência, responde o agente pelo crime lesão corpo- predomina o instinto materno, cessa a influência do
ral gravíssima. estado puerperal. Se, não permanecendo o estado
puerperal, a mãe matar o filho, não estaremos diante
Art. 122 [...] do crime de infanticídio, mas de homicídio.
§ 6º Se o crime de que trata o § 1º deste artigo resul- O delito só admite o dolo, que pode ser direto ou
ta em lesão corporal de natureza gravíssima e eventual.
é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos Se houver a hipótese de a conduta de a mãe, em
ou contra quem, por enfermidade ou deficiência
estado puerperal, logo após o parto, culposamente
mental, não tem o necessário discernimento
matar o filho, estaremos diante de homicídio culposo.
para a prática do ato, ou que, por qualquer outra
causa, não pode oferecer resistência, responde o Há certos casos em que a mulher, após o parto,
vê-se acometida da chamada psicose puerperal, que é
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

agente pelo crime descrito no § 2º do art. 129


deste Código. uma doença mental que lhe tira totalmente o poder de
autodeterminação. Nesta hipótese, a mãe é considera-
Por fim, se o crime de suicídio se consuma, ou se da absolutamente inimputável, conforme o caput, do
da automutilação resulta morte e a vítima é menor de art. 26, do CP.
14 anos, ou contra quem não tem o necessário discer- Se, em outra hipótese, a mãe, além da influência
nimento para a prática do ato, ou que, por qualquer do estado puerperal, tiver outra causa de semi-im-
outra causa, não pode oferecer resistência, responde putabilidade, consistente em perturbação da saúde
o agente pelo crime de homicídio. mental, que não lhe retire a inteira capacidade de
entendimento ou autodeterminação, deverá ser apli-
Infanticídio cada a regra do parágrafo único, art. 26, do CP, ou seja,
a pena do infanticídio poderá ser reduzida de um a
Art. 123 Matar, sob a influência do estado puerpe- dois terços, ou poderá ser substituída por medida de
ral, o próprio filho, durante o parto ou logo após: segurança.
Pena - detenção, de dois a seis anos. 37
Veja as hipóteses de aborto:
HOMICÍDIO

A parturiente mata o filho z Autoaborto


Homicídio, art. 121, do
sem estar influenciada
CP Art. 124 Provocar aborto em si mesma ou consen-
pelo estado puerperal
tir que outrem lho provoque:
Pena - detenção, de um a três anos.
INFANTICÍDIO

A parturiente mata o filho O autoaborto é o praticado pela própria gestan-


Infanticídio, art. 123, do
sob a influência do esta- te, ou seja, o sujeito ativo do delito é a gestante. Ela
CP
do puerperal executa diretamente a conduta criminosa. Trata-se de
crime de mão própria ou de atuação pessoal, pois só
A parturiente mata o Infanticídio, art. 123, pode ser cometido pela gestante em pessoa. O sujeito
filho influenciada pelo combinado com o pará- ativo é a própria gestante e a vítima é o feto.
estado puerperal e por grafo único, do art. 26, Terceiros podem atuar como partícipes, mas não
apresentar alguma ou- do CP como coautores.
tra causa que lhe tire a Redução da pena de um Neste caso temos um crime de mão própria, ou seja,
plenitude do poder de a dois terços, ou medida somente pode ser praticado pela gestante, não admi-
autodeterminação de segurança
tindo a coautoria, somente admite-se a participação.
Infanticídio, art. 123,
A parturiente mata o filho combinado com o caput
por estar acometida de do art. 26, do CP Importante!
doença mental, psicose Absolvição sumária, O crime de aborto praticado por terceiro com
puerperal causa excludente da
o consentimento da gestante é uma exceção a
culpabilidade
teoria monista adotada pelo Direito Penal. Tra-
ta-se da adoção da Teoria Pluralista, em que a
O infanticídio admite tentativa. cada agente será atribuído um tipo penal.
Aborto
z Aborto Praticado sem Consentimento da
O crime de aborto, no Brasil, está no rol dos cri- Gestante
mes contra a vida. É tutelado o nascituro desde a
concepção. Art. 125 Provocar aborto, sem o consentimento
O Código Penal não define o aborto. Cabe à juris- da gestante:
prudência e à doutrina defini-lo. De acordo com ter- Pena - reclusão, de três a dez anos.
mos relacionados à medicina, aborto é a expulsão do
produto da concepção. O art. 125, do CP, comina pena de reclusão de 3 a
O aborto consiste na interrupção da gravidez com 10 anos ao aborto provocado sem o consentimento
a morte do produto da concepção. Dessa definição da gestante. O não consentimento da gestante é o ele-
sobressaem os seguintes elementos necessários à mento essencial à configuração do delito e pode ser
constituição do delito: expresso ou presumido.

z Estado fisiológico da gravidez; „ Expresso, também conhecido como real, ocor-


re quando a gestante se opõe ao aborto, mas é
z Emprego de meios dirigidos à provocação do aborto;
vencida pela violência física, grave ameaça e
z Morte do produto da concepção;
fraude, ou seja, como exemplos, temos, respec-
z Dolo.
tivamente: chute na barriga, ameaça de matar
a gestante se ela não abortar e colocar substân-
O aborto é crime de forma livre, admitindo uma
cia abortiva na alimentação da gestante, sem
infinidade de meios executórios.
consentimento da vítima, que é a mãe;
Os meios abortivos mais citados são: „ Presumido é quando a gestante está incapaz
de consentir nas formas previstas no parágrafo
z Processos químicos: introdução de certas subs- único, art. 126, do CP: a gestante não é maior
tâncias químicas no organismo, como o fósforo, de catorze anos ou é alienada mental (doen-
chumbo, álcool, ácido etc.; te mental) ou débil mental (desenvolvimento
z Processos físico-mecânicos: curetagem, jogos mental retardado).
esportivos, quedas voluntárias etc.;
z Processos físico-térmicos: bolsas de água quente Observe que neste delito do art. 125 o sujeito ativo
e bolsas de gelo; é o terceiro, aquele que realiza o aborto. As vítimas,
z Processos psíquicos: susto, sugestão, induzimen- sujeitos passivos, são a gestante e o feto.
to de terror etc.
z Aborto Consentido e Aborto Consensual
O crime de aborto admite tentativa, na hipótese
em que se emprega meios abortivos, mas não sobre- Já no art. 126, do CP, o crime de aborto é praticado
vém a morte do feto por circunstâncias alheias à von- por terceiro, mas com o consentimento da gestante.
tade do agente. Aqui, temos na condição de sujeito ativo o terceiro e
38 a gestante, e a vítima, sujeito passivo, é apenas o feto.
Art. 126 Provocar aborto com o consentimento Art. 128 Não se pune o aborto praticado por
da gestante: médico:
Pena - reclusão, de um a quatro anos. Aborto necessário
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo ante- I - Se não há outro meio de salvar a vida da
rior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou gestante;
é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência. II - Se a gravidez resulta de estupro e o aborto é
precedido de consentimento da gestante ou,
O aborto consentido ocorre quando a gestante per- quando incapaz, de seu representante legal.
mite que outrem o provoque. É essencial ao crime o
concurso dos dois elementos: Exclui-se a antijuridicidade, uma vez que a norma
penal permite expressamente o abortamento, estabe-
lecendo a licitude do fato.
„ Consentimento da gestante;
A doutrina divide o aborto legal da seguinte forma:
„ Execução do aborto por terceiro.
aborto necessário ou terapêutico ou profilático;
aborto sentimental ou humanitário ou ético.
Observe-se, porém, desde logo, que o aborto con-
sentido é crime bilateral, exigindo a presença de duas „ Aborto Necessário ou Terapêutico ou
pessoas: a gestante e o terceiro executor. Profilático
O terceiro responde pelo art. 126, do CP (aborto
consensual), enquanto a gestante, pela 2ª parte, do art. Aborto necessário é o praticado por médico, se não
124, do CP (aborto consentido). há outro meio de salvar a vida da gestante, conforme
O aborto consentido é crime de mão própria ou de o inciso I, art. 128, do CP, desde que presentes três
atuação pessoal, podendo ser cometido apenas pela requisitos:
gestante. Mas, evidentemente, admite a presença do Perigo real à vida da gestante;
partícipe, consistente na conduta acessória do tercei- Não haver outro meio de salvar-lhe a vida;
ro que se limita a induzir, instigar ou auxiliar a ges- Execução por médico.
tante a consentir na realização do aborto.
O aborto necessário exige perigo à vida, e não à
z Aborto Qualificado saúde, da gestante.
Quando chamado de terapêutico, tem efeito curati-
Art. 127 As penas cominadas nos dois artigos ante- vo, e quando profilático, preventivo.
riores são aumentadas de um terço, se, em conse- ADPF 54 (feto anencéfalo): de acordo com o
qüência do aborto ou dos meios empregados para entendimento do STF, é possível a gestante se sub-
provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natu- meter à antecipação terapêutica de parto em caso de
reza grave; e são duplicadas, se, por qualquer des- anencefalia, desde que diagnosticado por profissional
sas causas, lhe sobrevém a morte. habilitado. O ministro Gilmar Mendes entende que
não se deve punir o aborto praticado por médico, com
O art. 127, do CP, estabelece duas hipóteses de consentimento da gestante, se o feto é anencéfalo.5
aborto qualificado:
„ Aborto Sentimental ou Humanitário ou Ético
„ Aborto qualificado pela morte = penas duplicadas;
„ Aborto qualificado pela lesão corporal de natu- Aborto sentimental é aquele praticado para inter-
reza grave = aumento de 1/3. romper a gravidez resultante do estupro.
Os requisitos necessários para a exclusão da ilici-
As lesões graves são aquelas tipificadas nos pará- tude do aborto humanitário são:
grafos 1º e 2º, art. 129, do CP. Gravidez resultante de estupro;
Prévio consentimento da gestante ou, quando
incapaz, de seu representante legal;
Dica
Execução por médico (se praticado por outras pes-
Os dois resultados qualificativos do delito, isto é, soas, respondem pelo crime).
a morte e a lesão grave, devem ser imputados ao A prova do estupro pode ser feita por todos os
agente, a título de culpa. Estamos diante de hipó- meios admissíveis em direito.
tese de crime preterdoloso: o agente age com Para a prática do aborto humanitário, não é neces-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

sário processo (ação penal), autorização judicial nem


dolo em relação ao aborto e culpa em relação
sentença condenatória.
ao resultado.
Ação penal é pública incondicionada.
Agora, se o agente atua com dolo em relação à
morte ou lesão grave, responde por aborto em LESÕES CORPORAIS
concurso formal com o crime de homicídio ou
crime de lesão corporal. Podemos entender lesão corporal como qualquer
alteração ou ofensa provocada na integridade corpo-
z Aborto Legal ral ou na saúde de uma pessoa.
A lesão corporal é comum, material, instantânea e
O art. 128, do CP, estabelece duas modalidades em de forma livre; portanto, pode ser praticada por qual-
que o aborto não constitui delito, desde que praticado quer pessoa, exige a ocorrência do resultado para fins
por médico. Veja: de consumação, a conduta não se prolonga no tempo
5 ADPF 54. Acórdão disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=3707334. Acesso em: 9 fev. 2022. 39
e pode ser praticada de qualquer maneira (pedradas, IV - deformidade permanente;
pauladas, tiros, socos, chutes, arranhões etc.). V - aborto:
As lesões corporais estão previstas no art. 129, Pena - reclusão, de dois a oito anos.
do Código Penal, e podem ser divididas da seguinte
forma: A lesão corporal gravíssima configurar-se-á se
resultar:
z Lesão corporal simples;
z Lesão corporal grave; z Incapacidade permanente para o trabalho;
z Lesão corporal gravíssima; z Enfermidade incurável;
z Lesão corporal seguida de morte; z Perda ou inutilização do membro, sentido ou função;
z Lesão corporal culposa; z Deformidade permanente;
z Lesão corporal privilegiada. z Aborto.

As lesões corporais graves, gravíssimas e seguidas Atente-se à seguinte tabela, elaborada para evitar
de morte compõem o grupo lesões corporais qualifica- confusões quanto às lesões grave e gravíssima:
das, segundo a doutrina penalista.
O crime de lesão corporal é classificado como delito
não transeunte, que é aquele que deixa vestígios, sendo LESÃO GRAVE LESÃO GRAVÍSSIMA
necessária a realização de exame de corpo de delito. Debilidade permanente Perda ou inutilização
de membro, sentido ou do membro sentido ou
Lesão Corporal Leve (Simples) função função

Art. 129 Ofender a integridade corporal ou a saúde Incapacidade para ocu-


Incapacidade permanen-
de outrem: pações habituais, mais
te para o trabalho
Pena - detenção, de três meses a um ano. de 30 dias

A lesão leve, também chamada de simples, previs- Aceleração de parto


Aborto
ta no caput, do art. 129, é residual, ou seja, teremos Perigo de vida
configurada tal modalidade de lesão, caso não se con-
figure nenhuma das outras. Exemplo: órgãos duplos, Exemplo: devido às le-
A lesão corporal qualificada está prevista nos pará- rins — a perda de um sões sofridas, a vítima
grafos 1º, 2º e 3º, do art. 129. deles caracteriza debili- perde completamente
dade da função excretora a visão (embora ainda
Lesão Corporal Grave —, perda de um ou mais esteja fisicamente pre-
dentes — caracteriza sente, o órgão ou mem-
Art. 129 [...] debilidade da função bro é completamente
§ 1º Se resulta: mastigatória inutilizável)
I - incapacidade para as ocupações habituais,
por mais de trinta dias;
O Código Penal não divide as lesões em graves ou
II - perigo de vida;
gravíssimas. Para o Código Penal Brasileiro (CPB),
III - debilidade permanente de membro, sentido
ou função;
todas elas são graves. Esta divisão é uma construção
IV - aceleração de parto: doutrinária.
Pena - reclusão, de um a cinco anos.
Lesão Corporal Seguida de Morte
A lesão corporal grave irá se configurar se resultar:
Art. 129 [...]
z Incapacidade para as ocupações habituais por mais § 3º Se resulta morte e as circunstâncias eviden-
ciam que o agente não quis o resultado, nem assu-
de 30 dias. É necessário que a incapacidade dure
miu o risco de produzi-lo:
mais de 30 dias, ou seja, a partir do 31º dia, caso
Pena - reclusão, de quatro a doze anos.
contrário, a lesão corporal não será grave. A incapa-
cidade está relacionada a qualquer ocupação habi-
A lesão corporal seguida de morte dar-se-á quando
tual, como estudo, treinos, rotinas domésticas, e não
ficar configurado que o agente não queria o resultado
somente ao trabalho;
morte (dolo direto no resultado morte) ou assumiu o
z Perigo de vida;
z Debilidade permanente de membro, sentido ou risco de produzi-lo (dolo eventual no resultado morte).
função (atenção, pois trata-se de debilidade e Se o agente quer matar, ele responderá pelo
não perda ou inutilização de membro, sentido ou homicídio. Porém, caso o agente queira apenas cau-
função); sar lesões corporais, mas, por algum motivo, acabe
z Aceleração do parto. se excedendo, provocando a morte da vítima, ele irá
responder por lesão corporal seguida de morte, desde
Lesão Corporal Gravíssima que fique evidenciado que ele não quis nem assumiu
o risco de produzir o resultado morte.
Art. 129 [...] O crime de lesão corporal seguida de morte é um
§ 2º Se resulta: crime preterdoloso, ou seja, é um crime qualificado
I - Incapacidade permanente para o trabalho; pelo resultado, em que temos dolo na conduta inicial
II - enfermidade incurável; e culpa no resultado produzido.
III perda ou inutilização do membro, sentido ou
40 função;
Lesão Corporal Culposa É importante mencionar que, caso a vítima seja
mulher, teremos a aplicação da Lei Maria da Penha
Art. 129 [...] e, mesmo que seja caso de lesão corporal leve, a ação
§ 6º Se a lesão é culposa: penal será pública incondicionada.
Pena - detenção, de dois meses a um ano. Agora, veremos as hipóteses majoradas do crime
de lesões corporais. Há diversas causas de aumento
A lesão corporal culposa é aquela em que o agente de pena para este crime, portanto, leia-as com bastan-
não quer causar lesão corporal na vítima, mas a pro- te atenção.
duz por ter sido imprudente, negligente ou imperito. Nos casos de lesão corporal culposa, a pena será
É importante compreender que não há gradações aumentada de 1/3 (um terço) se:
na lesão corporal culposa, ou seja, ela não se divide
em leve, grave ou gravíssima, mas tão somente será z o crime resulta de inobservância de regra técnica
lesão corporal culposa. de profissão, arte ou ofício;
No caso de lesão corporal culposa, é aplicável o z o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima;
instituto do perdão judicial, podendo o juiz deixar de z o autor não procura diminuir as consequências do
aplicar a pena se as consequências da infração penal seu ato;
atingirem o agente de forma que a aplicação de san- z o agente foge para evitar prisão em flagrante.
ção penal se torne desnecessária.
Aplica-se o perdão judicial ao crime de lesão cor- Nos casos de lesão corporal dolosa, a pena será
poral culposa. aumentada de 1/3 (um terço) se:

Lesão Corporal Privilegiada z A vítima é menor de 14 ou maior de 60 anos;


z For hipótese de lesão corporal grave, gravíssima
Os motivos que levam o agente a praticar a lesão ou seguida de morte, praticada em quaisquer dos
corporal privilegiada são os mesmos do homicídio casos de violência doméstica vistos;
privilegiado. z Se a vítima, enquadrada em um dos casos de vio-
lência doméstica vistos, for pessoa portadora de
Art. 129 [...] deficiência.
§ 4º Se o agente comete o crime impelido por motivo
de relevante valor social ou moral ou sob o domínio A pena será aumentada de 1/3 (um terço) até a
de violenta emoção, logo em seguida a injusta pro- metade:
vocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um
sexto a um terço. z Se a lesão corporal for praticada por milícia priva-
da, sob o pretexto de prestação de serviço de segu-
Se o agente comete o crime impelido por motivo rança, ou por grupo de extermínio.
de relevante valor social ou moral ou sob o domínio
de violenta emoção, logo em seguida à injusta provo- A pena será aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3
cação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de 1/6 (um (dois terços):
sexto) a 1/3 (um terço).
É aplicável o instituto da substituição de pena nos z Se a lesão for praticada contra autoridade ou agen-
casos de lesão corporal. te das forças armadas (Marinha, Exército ou Aero-
Não sendo graves as lesões, nos casos de lesão pri- náutica), das forças de segurança pública (Polícia
vilegiada ou nos casos de lesão recíproca (duas pesso- Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Fer-
as se lesionam entre si), o juiz poderá ainda substituir roviária Federal, Policiais Civis, Polícias Militares
a pena de detenção pela de multa. ou Corpo de Bombeiros Militares), integrantes do
sistema prisional (agentes penitenciários) e da For-
Art. 129 [...] ça Nacional de Segurança Pública, no exercício da
§ 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, des- função ou em razão dela, ou contra seu cônjuge,
cendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com companheiro ou parente consanguíneo até o ter-
quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, pre- ceiro grau, em razão dessa condição.
valecendo-se o agente das relações domésticas, de
coabitação ou de hospitalidade: PERICLITAÇÃO DA VIDA E DA SAÚDE
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

A periclitação da vida e da saúde é considerada


O Código Penal traz disposições específicas para os como crime de perigo, sendo criada, pelo autor do fato,
casos de lesão corporal praticada no âmbito de violência uma situação de perigo, na qual a vítima é exposta.
doméstica. Neste caso, a pena do agente será mais grave, Crimes de perigo são aqueles que não exigem a
estando ele submetido a auto de prisão em flagrante, e efetiva ocorrência de dano, apesar de poder aconte-
não somente a mero termo circunstanciado (salvo nos cer, para que se configurem.
casos de lesão grave, gravíssima ou seguida de morte). Os crimes de perigo são divididos em:
Considera-se lesão corporal no âmbito de violência
doméstica, se praticada contra as seguintes pessoas ou z Crimes de perigo concreto: é exigida uma com-
nos seguintes casos: provação de que realmente aconteceu um risco
de perigo ou lesão ao bem jurídico protegido pela
z Ascendente; norma penal;
z Descendente; z Crimes de perigo abstrato: não se exige nenhu-
z Cônjuge ou companheiro; ma comprovação, já que o perigo é presumido. Ex.:
z Quem conviva ou tenha convivido. Um indivíduo dirigir após ter ingerido álcool. 41
Analisaremos os seguintes crimes: Perigo de Contágio de Moléstia Grave

z perigo de contágio venéreo; Art. 131 Praticar, com o fim de transmitir a


z perigo de contágio de moléstia grave; outrem moléstia grave de que está contaminado,
z abandono de incapaz; ato capaz de produzir o contágio:
z exposição ou abandono de recém-nascido e omis- Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
são de socorro.
Este crime se configura quando o agente prati-
Perigo de Contágio Venéreo car, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave
de que está contaminado, ato capaz de transmitir o
Art. 130 Expor alguém, por meio de relações contágio.
sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio É necessário que o sujeito passivo, que pode ser
de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber qualquer pessoa, não seja contaminado pela moléstia
que está contaminado: grave que o sujeito ativo pretende transmitir.
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa. A moléstia grave, neste caso, não precisa, necessa-
§ 1º Se é intenção do agente transmitir a moléstia: riamente, ser transmitida por meio de relação sexual,
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. podendo ser transmitida por qualquer outro meio.
§ 2º Somente se procede mediante representação. Temos como exemplo o agente que, de qualquer
forma ou por qualquer meio, intencionalmente (exi-
Este crime fica configurado quando o agente expõe ge-se o dolo específico de transmitir a doença) trans-
alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato mite à vítima a tuberculose (moléstia grave).
libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que Trata-se de norma penal em branco, complemen-
sabe ou deve saber que está contaminado. tada por meio dos atos praticados por órgãos adminis-
A forma qualificada deste crime ocorre se o agente trativos da área de saúde.
tem a intenção de transmitir a moléstia venérea. Mais uma vez, reiteramos: exige-se, para a configu-
Este crime somente procede mediante represen- ração deste tipo penal, o dolo específico, que consiste
na intenção do agente de transmitir a moléstia grave.
tação, ou seja, trata-se de crime promovido mediante
A doutrina não admite, para este crime, o dolo even-
ação penal pública condicionada.
tual, quando o agente não quer diretamente transmi-
Moléstia venérea, segundo a doutrina, refere-se ao
tir a doença, mas assume o risco de transmiti-la.
nome genérico dado a qualquer doença que possa ser
Trata-se de crime formal, que se consuma com a
transmitida por meio de relação sexual, como sífilis.
prática do ato destinado a transmitir a moléstia grave,
O crime consuma-se com a prática do ato sexual,
não se exigindo, para fins de consumação, a efetiva
capaz de transmitir a moléstia venérea. Caso a vítima seja
transmissão da moléstia.
contaminada, tal fato será mero exaurimento do crime. Ao contrário do crime de Perigo de Contágio
O crime é de conduta vinculada, exigindo a conjunção Venéreo, procede-se mediante ação penal pública
carnal, o coito anal, o sexo oral ou qualquer outro ato de incondicionada.
libidinagem que sirva para a satisfação da libido. Antes de passarmos para a análise de outros tipos
Caso a contaminação provenha de outra ação físi- penais, é importante que façamos uma distinção entre
ca, como o aperto de mão ou a ingestão de alimen- os dois tipos penais que acabamos de ver:
tos, inexistirá o crime de perigo de contágio venéreo,
podendo subsistir o delito de lesão corporal, dolosa ou
culposa, ou os crimes dos arts. 131 e 132, do CP. PERIGO DE CONTÁGIO PERIGO DE CONTÁGIO
VENÉREO DE MOLÉSTIA GRAVE

A transmissão deve se
Importante! dar por meio de relação
A transmissão dá-se por
qualquer meio
É importante mencionar, pela própria nature- sexual
za do tipo penal, que não se exige, para a sua Transmite-se moléstia Transmite-se moléstia
configuração simples, dolo específico do agen- venérea grave
te em transmitir a doença venérea (caso ocor-
ra esta hipótese, o crime será qualificado), É norma penal em branco É norma penal em branco
bastando que ele tenha a intenção de ter a rela-
Não se exige dolo
ção sexual, sabendo ou devendo saber que está Exige-se dolo específico
específico
contaminado.
Ação penal pública Ação penal pública
condicionada incondicionada
Como o fato se relaciona a uma ou mais pessoas
determinadas, estamos diante de um delito de perigo Perigo para a Vida ou Saúde de Outrem
individual, o qual deve ser averiguado diante do caso
concreto. Isso porque da simples relação sexual do O art. 132, do CP, trata do crime de perigo para a
agente com a vítima não decorre presunção absolu- vida ou saúde de outrem:
ta da existência desse perigo. A presunção é relativa,
admitindo prova em contrário, como no caso de a víti- Art. 132 Expor a vida ou a saúde de outrem a peri-
ma já ser portadora de doença venérea. go direto e iminente:
Pena - detenção, de três meses a um ano, se o fato
42 não constitui crime mais grave.
Parágrafo único. A pena é aumentada de um sexto a Veja características do crime de abandono de
um terço se a exposição da vida ou da saúde de outrem incapaz:
a perigo decorre do transporte de pessoas para a pres-
tação de serviços em estabelecimentos de qualquer z É crime próprio, já que se exige uma condição
natureza, em desacordo com as normas legais. especial do agente: ser pessoa que tem o cuidado,
guarda, vigilância ou autoridade sobre a vítima;
A conduta nuclear é expor, ou seja, colocar em peri- z É crime formal, que não exige que ocorra qualquer
go a vida, a integridade física ou a saúde de alguém. O coisa com o abandonado (vítima) para fins de con-
perigo é concreto, direto, iminente e anormal. sumação do crime.

z Perigo concreto diz que a mera prática do comporta- Aumento de pena


mento ilícito não é suficiente para a caracterização do Art. 133 [...]
crime, sendo imprescindível que, em face da conduta § 3º As penas cominadas neste artigo aumentam-se
do agente, a vítima tenha a sua vida, a sua integridade de um terço:
corporal ou a sua saúde exposta a risco de lesão; I - se o abandono ocorre em lugar ermo;
z Perigo direto visa a pessoa ou pessoas determinadas; II - se o agente é ascendente ou descendente,
z Perigo iminente está prestes a ocorrer. Se a possi- cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima.
bilidade de ocorrência do perigo é futura ou pre- III - se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos.
sumida, não estará caracterizada a infração penal
do art. 132, do CP; Exposição ou Abandono de Recém-Nascido
z Perigo anormal não decorre da atividade de pro-
fissionais que trabalham com o risco, como o poli- Art. 134 Expor ou abandonar recém-nascido, para
cial e o bombeiro. Portanto, se o patrão não toma ocultar desonra própria:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
providências para a segurança e proteção dos ope-
§ 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza
rários que trabalham na fábrica de explosivos, e
grave:
dessa inação resulta uma situação concreta de Pena - detenção, de um a três anos.
perigo, estará configurado o crime do art. 132, do § 2º Se resulta a morte:
CP, na sua modalidade omissiva. Pena - detenção, de dois a seis anos.

Abandono de Incapaz O crime de exposição ou abandono de recém-nas-


cido configura-se quando o agente expõe ou abando-
Art. 133 Abandonar pessoa que está sob seu cui- na recém-nascido, para ocultar desonra própria.
dado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qual- Este crime será praticado na modalidade qualifica-
quer motivo, incapaz de defender-se dos riscos da se do fato resultar:
resultantes do abandono:
Pena - detenção, de seis meses a três anos.
z Lesão corporal de natureza grave;
§ 1º Se do abandono resulta lesão corporal de
z Morte.
natureza grave:
Pena - reclusão, de um a cinco anos.
§ 2º Se resulta a morte: Este crime exige dolo específico, ou seja, um espe-
Pena - reclusão, de quatro a doze anos. cial fim de agir, que consiste na prática da conduta
para ocultar desonra própria.
O crime de abandono de incapaz configura-se Segundo a doutrina majoritária, é exigido que o
quando o agente abandona pessoa que está sob seu recém-nascido fique exposto à situação concreta de
cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qual- perigo para que o crime se consume.
quer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resul- Ainda conforme doutrina majoritária, trata-se de
tantes do abandono. crime próprio, que somente poderá ser praticado pelo
São formas qualificadas do crime de abandono de pai ou pela mãe que buscam ocultar desonra própria.
incapaz: Ex.: Mãe que expõe ou abandona o filho recém-nasci-
do em uma lata de lixo para ocultar uma infidelidade.
z se do abandono resulta lesão corporal de natureza O crime será promovido mediante ação penal
grave; pública incondicionada.
z se do abandono resulta a morte.
Omissão de Socorro
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

O termo ‘‘incapaz” refere-se a qualquer pessoa


Art. 135 Deixar de prestar assistência, quando
que não tenha condições de se proteger sozinha, poden-
possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança aban-
do ficar exposta, em razão do abandono, à situação de
donada ou extraviada, ou à pessoa inválida
perigo. ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente
Tenha como exemplo o pai que deixa o filho de ape- perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da
nas dois anos de idade sozinho em casa. Esta criança autoridade pública:
não tem capacidade de se defender sozinha, configuran- Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
do, assim, o tipo penal de abandono de incapaz. Parágrafo único. A pena é aumentada de metade,
Para que o crime de abandono de incapaz seja qua- se da omissão resulta lesão corporal de natureza
lificado, é necessário que o resultado seja lesão corporal grave, e triplicada, se resulta a morte.
grave ou morte. Caso resulte apenas lesão corporal de
natureza leve — bastante explorado pelas bancas — o Não se aplica este tipo penal ao agente que cau-
crime será configurado em sua modalidade simples. sou o perigo. Assim, se um indivíduo, com a intenção
de causar lesões corporais, arremessa uma pedra na 43
vítima e foge, não poderá ele ser responsabilizado por Maus-Tratos
omissão de socorro por não ter prestado socorro à
vítima ou por não ter comunicado o fato à autoridade. Art. 136 Expor a perigo a vida ou a saúde de pes-
Fique atento às seguintes informações sobre a soa sob sua autoridade, guarda ou vigilância,
omissão de socorro: para fim de educação, ensino, tratamento ou
custódia, quer privando-a de alimentação ou cui-
z não admite tentativa (é crime omissivo próprio); dados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho
z não admite a modalidade culposa. excessivo ou inadequado, quer abusando de meios
de correção ou disciplina:
Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa.
Dica § 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza
Fique atento às causas de aumento de pena do grave:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
crime de omissão de socorro.
§ 2º Se resulta a morte:
Pena - reclusão, de quatro a doze anos.
O crime de omissão de socorro apresenta causas § 3º Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é pra-
de aumento de pena. A pena será aumentada até o ticado contra pessoa menor de 14 (catorze) anos.
dobro se da negativa de atendimento resultar lesão
corporal grave. A pena será aumentada até o triplo O crime de maus-tratos consuma-se com a efetiva
se da negativa de atendimento resultar morte. exposição da vítima ao perigo, que deverá ser demons-
trada no caso concreto. Não há, portanto, necessidade de
Condicionamento de Atendimento Médico-Hospitalar resultado material com dano efetivo à vítima.
Emergencial É crime permanente, na modalidade privação de
cuidados ou alimentos e sujeição a trabalho excessi-
Art. 135-A Exigir cheque-caução, nota promissória ou vo ou inadequado, hipótese em que a consumação se
qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio prolonga no tempo, já que há contínua e incessante
de formulários administrativos, como condição para o
agressão ao bem jurídico.
atendimento médico-hospitalar emergencial:
Também é crime instantâneo, na modalidade
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.
abuso de meios de correção ou disciplina, já que a
Parágrafo único. A pena é aumentada até o dobro se
da negativa de atendimento resulta lesão corporal de consumação se dá em momento determinado, sem
natureza grave, e até o triplo se resulta a morte. continuidade no tempo. No entanto, entendemos que
se o pai, com o fim de aplicar castigo ao filho, trancá-lo
Em 2012, foi inserido no Código Penal um novo por tempo excessivamente prolongado, haverá crime
tipo penal, chamado de condicionamento de atendi- permanente.
mento médico-hospitalar emergencial, que se con- A tentativa somente será possível nas formas
figura quando o agente exigir cheque-caução, nota comissivas, como no caso do agente que amarra a
promissória ou qualquer garantia, bem como o pre- vítima e apanha um porrete, a fim de agredi-la, sendo
enchimento prévio de formulários administrativos, nesse exato momento surpreendido. As modalidades
como condição para o atendimento médico-hospitalar omissivas não aceitarão a forma tentada.
emergencial. O crime é qualificado se resulta:
Suponha que um indivíduo ingresse em um hos-
pital necessitando de atendimento médico emergen- z lesão corporal de natureza grave;
cial. O funcionário do hospital exige que ele deixe um z morte.
cheque-caução para que o atendimento médico seja
realizado. Pronto, a situação configurou-se como tipo Porém, aumenta-se a pena de um terço se o cri-
penal de condicionamento de atendimento médico- me é praticado contra pessoa menor de 14 anos.
-hospitalar emergencial.
É necessário que o atendimento médico seja emer- Dica
gencial. Assim, este crime não irá se configurar caso
o atendimento médico seja algo rotineiro, como uma
O examinador pode tentar confundir o crime de
simples consulta, por exemplo. maus-tratos com tortura.
Trata-se de crime próprio, pois somente poderá ser Dentre as diferenças, podemos ressaltar que o
praticado por representantes ou funcionários hospita- delito de maus tratos é de perigo, enquanto o de
lares (sócios, administradores, atendentes, seguranças) tortura é de dano.
ou profissionais da área da saúde (médicos, enfermei- Deve-se atentar também ao elemento subjetivo
ros) incumbidos do atendimento emergencial. do autor. Se o fato é praticado para fim de edu-
O sujeito ativo deve ser a pessoa com poderes para cação, ensino, tratamento ou custódia, o crime
exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer será o de maus-tratos, já se o fato é cometido
garantia, bem como o preenchimento prévio de for- apenas para submeter a vítima a intenso sofri-
mulários administrativos, como condição para o aten- mento físico ou mental, estará caracterizado o
dimento médico-hospitalar emergencial. crime de tortura.
Para esse crime, a pena cominada é detenção, de
três meses a um ano, e multa. RIXA
A pena é aumentada até:
Art. 137 Participar de rixa, salvo para separar
z o dobro, se da negativa de atendimento resultar os contendores:
lesão corporal de natureza grave; Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou
44 z o triplo, se resultar a morte. multa.
Parágrafo único. Se ocorre morte ou lesão corporal A honra é classificada em:
de natureza grave, aplica-se, pelo fato da partici-
pação na rixa, a pena de detenção, de seis meses a
dois anos. Conceito que o indivíduo
possui perante seus pares
O crime ocorrerá quando o agente participar de em relação aos seus atribu-
HONRA OBJETIVA tos morais, éticos, físicos
rixa, salvo para separar os contendores. A rixa é uma
(HONRA EXTERNA) e intelectuais. Refere-se ao
briga generalizada, na qual não é possível identificar
apreço e respeito da pessoa
precisamente os atos que cada um dos agentes come-
no grupo social. É a reputa-
teu, bem como não é possível identificar aquele que ção social da pessoa
deu causa ao início das agressões.
O Secretário de Estado de Justiça e Segurança Conceito que o indivíduo
Pública de Minas Gerais, Rogério Greco, explica: possui de sua própria digni-
dade e decoro; trata-se do
HONRA SUBJETIVA
[...] a finalidade da criação do delito de rixa foi evi- autoconceito dos atributos
(HONRA INTERNA)
tar a impunidade que reinaria em muitas situações, morais, éticos, físicos e inte-
onde não se pudesse apontar, com precisão, o autor lectuais. Refere-se ao nosso
inicial das agressões, bem como aqueles que agi- amor-próprio e autoestima
ram em legítima defesa. Por isso, pune-se a simples
HONRA ESPECIAL OU Referente a determinado
participação na rixa, de modo que todos aqueles
PROFISSIONAL grupo social ou profissional
que dela tomaram parte serão responsabilizados
por esse delito.6
z honra objetiva é aquilo que as pessoas (grupo
Aquele que participa da rixa apenas com a finali- social) pensam sobre o indivíduo;
dade de separar os contendores não irá responder por z honra subjetiva é aquilo que o indivíduo pensa
este tipo penal. sobre si mesmo.
O crime de rixa não admite a forma culposa.
Sobre este crime, é importante ficar atento quanto Calúnia
aos posicionamentos da doutrina dominante:
Art. 138 Caluniar alguém, imputando-lhe falsa-
z não admite tentativa; mente fato definido como crime:
z consuma-se quando se inicia a rixa ou, caso já ini- Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
ciada, quando o agente entra na rixa;
z pode ser praticado à distância, não se exigindo A calúnia, que atua sobre a honra objetiva, está
que necessariamente ocorra contato físico. Ex.: prevista no art. 138, do Código Penal, e se configura
Rixa em que os agentes jogam pedras, garrafas ou quando o agente caluniar alguém, imputando-lhe fal-
mesas uns nos outros. samente fato definido como crime.
Exige-se que o fato imputado falsamente seja
A rixa será qualificada, de acordo com o parágrafo definido com um crime, não podendo ser uma mera
único, do art. 137, quando, devido à rixa, ocorrer lesão contravenção penal. O crime pode ter acontecido ou
corporal de natureza grave ou a morte. não, para fins de consumação deste tipo penal. Ex.:
Segundo a doutrina majoritária, salvo no caso de Joãozinho diz que Pedrinho praticou um roubo à
ser possível identificar corretamente o autor da lesão padaria da esquina de onde moram, sabendo ser isso
grave ou da morte, todos os agentes que participaram falso. Portanto, Joãozinho praticou o crime de calúnia.
da rixa responderão pela modalidade qualificada, O crime de calúnia consuma-se quando o fato che-
exceto, também, se tiverem ingressado na rixa após a ga ao conhecimento de um terceiro, distinto do autor
ocorrência da lesão grave ou da morte. e da vítima, já que o crime tutela a honra objetiva.
Observe que o objeto jurídico protegido é a honra
CRIMES CONTRA A HONRA
objetiva, que consiste na reputação que a pessoa pos-
sui na sociedade.
Os crimes contra a honra estão entre aqueles que
Tal crime não admite a modalidade culposa e,
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

mais são cobrados em provas de concurso público,


segundo doutrina majoritária, pode ser praticado,
então vamos aprendê-los passo a passo.
Eles estão previstos entre os arts. 138 e 145, do além do dolo direto, por dolo eventual.
Código Penal, e dividem-se em 3 crimes diferentes: Não é exigido que o crime seja praticado na modali-
dade verbal, podendo ser praticado por outros meios,
z calúnia; como, por exemplo, na modalidade escrita.
z difamação; Em regra, a calúnia é crime unissubsistente, que
z injúria. se perfaz com a prática de um único ato, não sendo
possível o fracionamento do seu iter criminis; entre-
Antes de analisarmos cada um dos tipos penais, é tanto, caberá tentativa quando for possível promover
importante compreender que se protege a honra da este fracionamento, a exemplo de calúnia praticada
pessoa, na sua modalidade objetiva e subjetiva. por meio de uma carta.

6 GRECO, R. Curso de Direito Penal — Parte Especial V, II. Niterói: Editora Impetus, 2019, p. 392. 45
Em se tratando de intenção de brincar por parte do Excepcionalmente, é proibida a prova da verdade,
agente, não há que se falar no crime de calúnia, pois em três hipóteses previstas no parágrafo 3º, art. 138.
o ato não tem o propósito de ofender, sendo assim, Nessas três hipóteses do parágrafo 3º, art. 138,
não incide no crime de calúnia — por falta de dolo do CP, ainda que verdadeira a imputação, o crime de
— aquele que age com intenção de brincar (animus calúnia não será excluído.
jocandi).7 Observa-se a possibilidade de a calúnia incidir
sobre o fato verdadeiro nessas três hipóteses em que
Art. 138 [...] a lei proíbe a exceção da verdade.
§ 1º Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a A primeira ocorre quando o fato imputado cons-
imputação, a propala ou divulga. tituir delito de ação privada e o ofendido não houver
§ 2º É punível a calúnia contra os mortos. sido condenado por sentença transitada em julgado. A
vedação é justificada pelo princípio da disponibilida-
Pune-se a calúnia praticada contra os mortos (nes- de da ação penal privada, que pode ou não ser ajuiza-
da, consoante à exclusiva vontade do ofendido ou de
te caso, o sujeito passivo será família do morto):
seu representante legal.
A segunda hipótese, inciso II, do parágrafo 3º, do
z Segundo parte da doutrina, é possível que a calú-
art. 138, dita que não se admite a exceção da verdade
nia seja praticada contra pessoa jurídica, se o
quando a ofensa for irrogada contra o presidente da
fato falsamente imputado for referente a crime República ou chefe de governo estrangeiro. Justifica-se
ambiental; a proibição pela alta relevância política desempenha-
z Equipara-se à calúnia, incorrendo nas mesmas da pelo presidente da República, que não pode ficar à
penas, a conduta daquele que, sabendo falsa a mercê de qualquer acusação. No tocante ao chefe de
imputação, a propala (espalha) ou divulga. governo estrangeiro, expressão que abrange o primei-
ro-ministro e o presidente, a proibição encontra suas
A calúnia admite, como regra, a exceção da verda- raízes na política de diplomacia que deve reinar nas
de, que nada mais se trata de prova da verdade, que é relações internacionais.
a possibilidade que tem o agente de demonstrar que A terceira hipótese, inciso III, parágrafo 2º, do art.
o fato que ele imputou realmente aconteceu. Porém, 138, de proibição da vedação, dá-se quando o ofendi-
em algumas hipóteses não será admitida a exceção da do tiver sido absolvido por sentença transitada em
verdade. julgado do fato criminoso que lhe é imputado, respei-
tando a coisa julgada.
Art. 138 [...]
§ 3º Admite-se a prova da verdade, salvo: Difamação
I - se, constituindo o fato imputado crime de ação
privada, o ofendido não foi condenado por sentença Art. 139 Difamar alguém, imputando-lhe fato
irrecorrível; ofensivo à sua reputação:
II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
indicadas no nº I do art. 141;
III - se do crime imputado, embora de ação pública, A difamação se configura quando o agente difa-
o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível. mar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua repu-
tação. O crime de difamação tutela a honra objetiva. O
Como regra, admite exceção da verdade, ou seja, fato imputado pode ser falso ou verdadeiro, basta que
seja ofensivo.
admite que o réu prove que a vítima realmente prati-
Ex.: Suponha que Lili diga para um grupo de vizi-
cou o crime que lhe foi imputado.
nhos que Márcia, também vizinha, é garota de progra-
No entanto, nos casos de crime imputado, embora
ma e atende aos clientes no período noturno em sua
de ação pública, em que o ofendido tenha sido absol-
residência. A conduta praticada por Lili configura o
vido por sentença irrecorrível, há uma presunção de crime de difamação.
que a imputação é falsa, respondendo o agente por Observe que o fato imputado não constitui um cri-
ela. me, podendo, inclusive, constituir uma contravenção
Mas se o réu conseguir provar que o fato que impu- penal. Entretanto, caso constitua crime, será calúnia.
tou à vítima é verdadeiro, ele será absolvido. A difamação, assim como a calúnia, também se
consuma quando o fato chega ao conhecimento de um
terceiro, distinto do autor e da vítima, já que também
Importante! protege a honra objetiva. Trata-se de crime formal e
irá se configurar ainda que a conduta não desonre
Os crimes contra a honra dos Chefes dos Três
objetivamente a vítima.
Poderes (Presidente da República, Presidente Não há difamação praticada na modalidade cul-
do Senado Federal, Presidente da Câmara dos posa. É possível a tentativa da difamação, quando for
Deputados e Presidente do Supremo Tribunal possível fracionar o iter criminis, a exemplo da difa-
Federal), com exceção da injúria, em caso de mação cometida por meio de carta.
motivação política, configurarão delito contra a A pessoa jurídica pode ser o sujeito passivo do cri-
Segurança Nacional. me de difamação.
Na difamação, a exceção da verdade não pode ser
aplicada, salvo se o ofendido é funcionário público e a
ofensa é relativa ao exercício da função.
46 7 (APn 887/DF, j. 03/10/2018)
z Exceção da Verdade Art. 140 [...]
§ 2º Se a injúria consiste em violência ou vias de
Art. 139 [...] fato, que, por sua natureza ou pelo meio emprega-
Parágrafo único. A exceção da verdade somente se do, se considerem aviltantes:
admite se o ofendido é funcionário público e a ofen- Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa,
sa é relativa ao exercício de suas funções. além da pena correspondente à violência.

Injúria No caso da injúria real, a ação penal do crime


deverá observar aquela prevista para a modalidade
Art. 140 Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignida- da lesão corporal praticada.
de ou o decoro: É possível que a injúria seja racial, quando consis-
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. tir na utilização de elementos referentes à raça, cor,
etnia, religião, origem ou à condição de pessoa idosa
A injúria, que tutela a honra subjetiva do agente, ou portadora de deficiência.
configura-se quando o agente injuriar alguém, ofen-
dendo-lhe a dignidade ou o decoro. Art. 140 [...]
Na injúria, o agente ofende a dignidade e o deco- § 3º Se a injúria consiste na utilização de elemen-
ro da vítima, emitindo ofensa depreciativa, mas sem tos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem
imputar a ele fato definido como crime ou ofensivo ou a condição de pessoa idosa ou portadora de
a sua reputação. Exemplo: Fernando xinga Leandro, deficiência: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de
chamando-o de burro e idiota (fato genérico, indeter- 2003)
minado, vago). A conduta de Fernando configura o Pena - reclusão de um a três anos e multa.
crime de injúria.
Na injúria, há lesão à honra subjetiva da vítima, ou Você deve levar em consideração para sua prova
seja, afeta o sentimento da pessoa em relação aos seus os elementos que podem caracterizar a injúria racial,
próprios atributos morais (dignidade), físicos e inte- já que esse assunto tem grande incidência em provas.
lectuais (decoro). Não é necessário que o fato chegue Sendo assim, caso o agente ofenda a vítima, fazendo
ao conhecimento de um terceiro. uso de um dos elementos mencionados, a exemplo do
A injúria também é crime formal, consumando-se agente que chama a vítima de macaco (utilize como
com a prática da conduta, independentemente de a exemplo o caso do ex-goleiro do Santos Futebol Clube,
vítima sentir lesada ou não a sua honra subjetiva. o Aranha, que foi chamado de macaco), irá cometer o
A injúria só pode ser praticada dolosamente, não crime de injúria racial.
sendo admitida a modalidade culposa. É admitida a
tentativa de injúria, quando o iter criminis puder ser
fracionado. Importante!
Lembre-se de que a injúria, assim como os demais Fique atento para não confundir a injúria racial
crimes contra a honra, pode ser praticada por outros com o crime de racismo.
meios e não somente de forma verbal. Na injúria racial, o animus do agente é ofender a
A injúria não admite exceção da verdade.
honra subjetiva do indivíduo;
Sendo assim, é importante levar em consideração
No racismo, o animus é segregar; busca agredir
o seguinte:
a coletividade.
O STJ e STF entenderam que a injúria racial é cri-
EXCEÇÃO DA VERDADE me imprescritível. Nos termos do relator, Minis-
tro Edson Fachin, “assim, o crime de injúria racial,
Calúnia É admitida como regra
porquanto espécie do gênero racismo, é impres-
Difamação É admitida excepcionalmente critível.” 8
Injúria Não é admitida
Nos termos do parágrafo 2º, art. 138, do CP, é puní-
Na injúria, o juiz pode deixar de aplicar a pena nos vel a calúnia contra os mortos. Observe que não há a
seguintes casos: mesma previsão para difamação e injúria.
Nos casos de difamação e injúria, o sujeito passivo
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Art. 140 [...] não é o morto, mas seu familiar.


§ 1º O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I - quando o ofendido, de forma reprovável, provo- Disposições Comuns
cou diretamente a injúria;
II - no caso de retorsão imediata, que consista em Vejamos as causas de aumento de pena aplicáveis
outra injúria. aos crimes contra a honra em geral (calúnia, difama-
ção e injúria).
A injúria real configura-se quando a injúria con-
siste em violência ou vias de fato, que, por sua nature- Art. 141 As penas cominadas neste Capítulo
za ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes. aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes
Assim, caso o agente desfira um tapa no rosto da víti- é cometido:
ma, com a intenção de ofendê-la (humilhá-la), irá pra- I - contra o Presidente da República, ou contra chefe
ticar uma injúria real. de governo estrangeiro;

8 HABEAS CORPUS 154.248. 47


II - contra funcionário público, em razão de suas A injúria não admite retratação. O querelado que,
funções; antes da sentença (segundo doutrina majoritária: sen-
III - na presença de várias pessoas, ou por meio que tença de 1º grau), retrata-se cabalmente da calúnia ou
facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da difamação, fica isento de pena.
da injúria. Caso o querelado tenha praticado a calúnia ou
IV - contra criança, adolescente, pessoa maior difamação fazendo uso de meios de comunicação,
de 60 (sessenta) anos ou pessoa com deficiência, a retratação ocorrerá, caso assim deseje o ofendido,
exceto na hipótese prevista no § 3º do art. 140 deste
pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa.
Código. (Redação dada pela Lei nº 14.344, de 2022)
Suponha que o agente tenha praticado o crime de
calúnia ou difamação pelo Facebook. Neste caso, a
Atenção especial ao inciso IV, alterado pela Lei
retratação dar-se-á também pelo Facebook, se assim
nº 14.344, de 2022 (Lei Henry Borel), que aumenta
desejar a vítima.
as penas nos crimes contra a honra. Veja como era a
Caso alguém faça uso de referências, alusões ou
redação anterior e como ficou a nova redação após as
frases, sendo possível inferir calúnia, difamação ou
modificações:
injúria, aquele que se julgar ofendido poderá pedir
explicações em juízo. Caso seja recusado o pedido de
ANTES DA LEI Nº DEPOIS DA LEI Nº explicações ou, a critério da autoridade judicial, não
14.344, DE 2022 14.344, DE 2022 tenha sido dado de maneira satisfatória, responderá
pela ofensa.
Art. 141 Por fim, sobre a ação penal nos crimes contra a
Art. 141 [...] IV - contra criança, honra, é importante que você saiba:
[...] IV - contra pessoa adolescente, pessoa
maior de 60 (sessenta) maior de 60 (sessenta)
anos ou portadora de de- anos ou pessoa com defi- AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A HONRA
ficiência, exceto no caso ciência, exceto na hipóte-
de injúria se prevista no § 3º do art. Regra Exceções
140 deste Código Ação será pública condi-
cionada nos casos de:
Assim, com a modificação, os crimes contra a hon- � Injúria real
ra de crianças e adolescentes passam a ser majorados Ação será privada, � Injúria racial
em um terço, exceto no caso de injuria racial (que já procedendo-se mediante � Se os crimes contra a
é mais grave). queixa honra foram praticados
Veja as hipóteses de exclusão dos crimes contra contra funcionário pú-
a honra: blico, em razão de suas
funções
Art. 142 Não constituem injúria ou difamação
punível: Súmula 714 (STF) É concorrente a legitimidade do
I - a ofensa irrogada em juízo, na discussão da cau- ofendido, mediante queixa e do Ministério Público,
sa, pela parte ou por seu procurador; condicionada à representação do ofendido, para a
II - a opinião desfavorável da crítica literária, artís- ação penal por crime contra a honra de servidor
tica ou científica, salvo quando inequívoca a inten- público em razão do exercício de suas funções.
ção de injuriar ou difamar;
III - o conceito desfavorável emitido por funcioná- Logo, atente-se a esta informação: nos casos de cri-
rio público, em apreciação ou informação que pres- mes contra a honra de funcionário público em razão
te no cumprimento de dever do ofício. de suas funções, a ação penal será privada ou con-
Parágrafo único. Nos casos dos ns. I e III, respon-
dicionada à representação do ofendido. A doutrina
de pela injúria ou pela difamação quem lhe dá
dominante também entende desta forma.
publicidade.
A ação será pública e condicionada à requisição do
Ministro da Justiça, caso a conduta que configura cri-
Para encerrarmos o assunto referente aos crimes
me contra a honra seja praticada contra o Presidente
contra a honra, trataremos da retratação e da ação
da República ou contra chefe de governo estrangeiro.
penal. Segundo o Código Penal, a retratação, quando
admitida, constitui excludente de punibilidade.
CRIMES CONTRA A LIBERDADE PESSOAL E CRIMES
CONTRA A LIBERDADE INDIVIDUAL
Art. 143 O querelado que, antes da sentença, se
retrata cabalmente da calúnia ou da difamação,
fica isento de pena. O caput, do art. 5º, da Constituição Federal, asse-
Parágrafo único. Nos casos em que o querelado gura a todos o direito à liberdade. A partir dessa afir-
tenha praticado a calúnia ou a difamação utilizan- mação, extrai-se que qualquer espécie de violação à
do-se de meios de comunicação, a retratação dar- liberdade do ser humano reclama punição.
-se-á, se assim desejar o ofendido, pelos mesmos O objeto jurídico é a liberdade do ser humano para
meios em que se praticou a ofensa. agir dentro dos limites legais.
Já o objeto material é a pessoa sobre a qual recai a
Retratação refere-se à possibilidade que tem o conduta criminosa.
agente de retirar aquilo que disse, ou seja, de mani- Estudaremos, então, os crimes contra a liberdade
festar que se equivocou em suas declarações, mani- individual.
festando-se contrariamente ao que disse inicialmente.
48
Constrangimento Ilegal O constrangimento ilegal admite tentativa, já que é
crime plurissubsistente; é crime comum, que pode ser
Art. 146 Constranger alguém, mediante violência praticado por qualquer pessoa.
ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, Além das penas previstas para o constrangimen-
por qualquer outro meio, a capacidade de resistên- to ilegal, o agente irá responder pelas penas corres-
cia, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que pondentes à violência; assim, caso o agente pratique
ela não manda: o crime por meio de violência, provocando lesões cor-
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa. porais na vítima, ele responderá por constrangimen-
to ilegal em concurso material com o crime de lesão
Trata-se de crime comum que não admite a modali- corporal.
dade culposa. É a imposição ilegal à vítima de um com-
portamento certo e determinado, comissivo ou omissivo. Art. 146 [...]
Consuma-se o crime de constrangimento ilegal no § 1º As penas aplicam-se cumulativamente e em
instante em que a vítima faz ou deixa de fazer algo, dobro, quando, para a execução do crime, se
em decorrência da violência ou grave ameaça utiliza- reúnem mais de três pessoas, ou há emprego de
da pelo agente. Admite tentativa. armas.
Ação penal: pública incondicionada. § 2º Além das penas cominadas, aplicam-se as cor-
respondentes à violência.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois, tra-
ta-se de crime comum.
A pena será aplicada cumulativamente, nos termos
Se o sujeito ativo for funcionário público, e o fato for
do § 1º, art. 146, quando, para a execução do crime:
cometido no exercício de suas funções, responderá por
abuso de autoridade, na forma da Lei nº 13.869, de 2019.
z Reúnem-se mais de 3 (três pessoas) — deve
O sujeito passivo pode ser qualquer pessoa, desde
haver no mínimo 4 pessoas;
que dotada de capacidade de autodeterminação.
z Há emprego de arma — segundo a doutrina
A Lei nº 10.741, de 2003, Estatuto do Idoso, em seu
dominante, pode ser qualquer arma e não neces-
art. 107, pune com reclusão, de 2 a 5 anos, aquele que
sariamente arma de fogo.
coage, de qualquer modo, o idoso a doar, contratar,
testar ou outorgar procuração.
Não serão enquadrados como constrangimento
A Lei nº 7.170, de 1983, Crimes contra a Segurança
ilegal:
Nacional, no art. 28, sujeita à pena de reclusão, de 4 a 12
anos, a conduta de atentar contra a liberdade pessoal do Art. 146 [...]
Presidente da República, do Senado Federal, da Câmara § 3º Não se compreendem na disposição deste
dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal. artigo:
A Lei nº 8.078, de 1990, Código de Defesa do Con- I - a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consen-
sumidor, no art. 71, prevê a pena de detenção, de 3 timento do paciente ou de seu representante legal,
a 1 ano, e multa, para quem utilizar, na cobrança de se justificada por iminente perigo de vida;
dívidas, ameaça, coação, constrangimento físico ou II - a coação exercida para impedir suicídio.
moral, afirmações falsas, incorretas ou enganosas, ou
de qualquer outro procedimento que exponha o con- Ameaça
sumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira
com seu trabalho, descanso ou lazer. Art. 147 Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou
Configurar-se-á como constrangimento ilegal gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-
quando o agente constranger alguém, mediante -lhe mal injusto e grave:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver
Parágrafo único - Somente se procede mediante
reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de
representação
resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer
o que ela não manda.
O crime de ameaça, previsto no art. 147, do Códi-
Exemplo: Jorge e Luís são vizinhos. Jorge é um
go Penal, configurar-se-á quando o agente ameaçar
valentão que se sente dono do bairro. Certo dia, Luís
alguém, por palavra, escrito, gesto, ou qualquer outro
passava pela rua, quando Jorge o aborda. Este, portan- meio simbólico, de lhe causar mal injusto e grave.
do uma arma de fogo, saca a arma e a aponta para Luís O bem jurídico tutelado pela lei penal é a liberdade
e diz que, sob pena de levar um tiro na cara, é para ele da pessoa humana, notadamente no tocante à paz de
dar meia volta e passar por outro lugar, já que não o
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

espírito, ao sossego, à tranquilidade e ao sentimento de


quer mais passando por sua rua. Luís, temendo por segurança. É a pessoa contra a qual se dirige a ameaça.
sua vida, dá meia volta e retorna. Consuma-se quando a vítima toma conhecimento do
A conduta de Jorge enquadra-se no constrangi- conteúdo da ameaça, pouco importando sua efetiva inti-
mento ilegal. Ele, fazendo uso de grave ameaça, cons- midação e a real intenção do autor em fazer valer sua
trangeu Luís para que ele deixasse de fazer algo que a promessa.
lei lhe permite (liberdade de locomoção). O crime é formal, de consumação antecipada ou de
A doutrina entende corretamente que o crime resultado cortado. Basta o agente querer intimidar e a
de constrangimento ilegal é subsidiário; o agente sua ameaça ter capacidade para fazê-lo.
por ele irá responder caso não seja enquadrado em A tentativa é admissível nas hipóteses de amea-
uma outra conduta um tanto mais grave. Assim, caso ça escrita, simbólica ou por gestos, e incompatível nos
o agente constranja a vítima, por meio de violência, casos de ameaça verbal.
para que ela deixe de fazer alguma coisa, com o fim Não se reclama nenhuma finalidade específica, e não
de obter para si vantagem econômica, não irá cometer se admite a modalidade culposa. A ação penal é pública
constrangimento ilegal, mas, sim, o crime de extorsão. condicionada à representação. 49
É possível verificar que o crime de ameaça é de ação Vale mencionar que, sendo crime habitual, não
livre, podendo ser praticado de qualquer forma pelo admite tentativa.
agente: verbalmente, por escrita, gestualmente, entre O delito do art. 147-A é um crime de forma livre,
outras formas. isto é, a perseguição pode se dar por qualquer meio.
Assim, caso um indivíduo olhe para um desafeto e Assim, o perseguidor (também chamado de stalker)
faça o gesto de uma arma com a mão e aponte para este, pode seguir a vítima pessoalmente, a pé ou de carro,
o crime de ameaça poderá se configurar. ou esperar sua passagem por lugares que frequente;
É muito importante compreender que a ameaça está pode, também, importuná-la por meio de telefone ou
relacionada a um mal “injusto” e “grave”, contrário ao por aplicativos de mensagens ou, ainda, usar outros
direito. Caso o agente ameace, por exemplo, entrar na meios, como vigilância por câmeras, uso de drones etc.
justiça para cobrar uma dívida (mal justo), ele não irá Em outras palavras, os atos persecutórios podem
cometer o crime de ameaça previsto no art. 147, do CPB. ser diretos ou indiretos, presenciais ou virtuais. São
Trata-se de crime comum, que pode ser praticado exemplos de meios para praticar a perseguição seguir
por qualquer pessoa. a vítima todos os dias no trajeto até o trabalho; ligar
Em regra, não cabe tentativa, já que se trata de crime constantemente e desligar; rastrear a vítima por meio
unissubsistente, que se consuma com a prática de um
de GPS; enviar presentes ou animais mortos; enviar
único ato; porém, a doutrina majoritária admite a ten-
mensagens por aplicativos de mensagens, sms, e-mail
tativa se a ameaça for praticada na modalidade escrita
ou cartas, entre outras formas. Quando realizada por
— por meio de uma carta, por exemplo.
intermédio da internet, a perseguição é chamada de
A doutrina admite a ameaça condicionada, que ocor-
cyberstalking.
rerá quando o agente colocar uma condição para a prá-
Através dos meios utilizados o perseguidor acaba
tica do mal injusto e grave.
por:
z Exemplo — Mévio diz a Tício: “se você não fizer
pelo menos um gol na final do campeonato, eu z ameaçar a integridade física da vítima;
irei te matar.” z ameaçar a sua integridade psicológica;
z restringir-lhe a capacidade de locomoção;
O crime de ameaça se procede mediante ação z de qualquer forma, invadir ou perturbar sua esfe-
penal pública condicionada à representação. ra de liberdade ou privacidade.

Perseguição Veja que o crime de perseguição somente existe na


modalidade dolosa; no entanto, não há qualquer obje-
Art. 147-A Perseguir alguém, reiteradamente e por tivo específico por parte do perseguidor, podendo agir
qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física motivado por ciúme, inveja, raiva, vingança, fixação,
ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de admiração, sentimento não correspondido ou outra
locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou razão qualquer.
perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. Quanto às causas de aumento de pena, vejamos o
Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e que dispõe o parágrafo 1º:
multa.
Art. 147-A [...]
O crime de perseguição é também conhecido por § 1º A pena é aumentada de metade se o crime é
crime de stalking (stalking vem do verbo inglês to cometido:
stalk, que dá a ideia de perseguir incessantemente; I - contra criança, adolescente ou idoso;
é uma palavra usada no mundo da caça, para fazer II - contra mulher por razões da condição de sexo femi-
referência ao predador que persegue a presa de forma nino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código;
contínua). Alguns autores chamam o crime, ainda, de III - mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas
perseguição ameaçadora ou de assédio por intrusão. ou com o emprego de arma.
Basicamente o delito consiste em uma forma de
violência em que o sujeito ativo invade a vida privada O parágrafo 1º, do art. 147-A, apresenta formas
da vítima, por meio da prática reiterada de atos que majoradas do crime de perseguição, hipóteses em que
acabam por restringir a liberdade do ofendido ou que a pena é aumentada da metade.
atacam sua privacidade. O inciso I prevê três causas de aumento, tendo
O verbo núcleo do tipo é perseguir, que tem o sen- em vista a idade da vítima: se for criança (menor de
tido de importunar. 12 anos); adolescente (entre 12 anos e dezoito anos
incompletos) ou idosa (idade igual ou superior a 60
anos).
Importante! A majorante que consta no inciso II, por sua vez,
O crime do art. 147-A somente se configura se segue a mesma fórmula prevista no feminicídio (§
a perseguição for praticada reiteradamente, isto 2º-A, art. 121, do CP), isto é, aumenta-se a pena quan-
é, de forma insistente, habitual (deve ser pratica- do o crime de perseguição é cometido contra mulher
da pelo menos duas vezes). Uma única situação por razões da condição de sexo feminino. Lembre-se,
não configura este tipo penal, como, por exem- considera-se que o crime é cometido por razões da
plo, uma pessoa que, após uma discussão, per- condição de sexo feminino em duas hipóteses:
segue a outra de carro.
z no âmbito de violência doméstica e familiar;
z quando o crime é cometido com menosprezo ou
50 discriminação à condição de mulher.
Por fim, a última majorante não diz respeito à víti- humilhação, manipulação, isolamento, vigilância
ma, como nas anteriores, mas ao concurso de pessoas constante, perseguição contumaz, insulto, chanta-
e ao emprego de armas. Em relação à primeira, veja gem, violação de sua intimidade, ridicularização,
que o dispositivo fala em 2 ou mais pessoas e não 2 exploração e limitação do direito de ir e vir ou qual-
ou mais agentes (ou autor pode contar com a ajuda de quer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psi-
menores, por exemplo). Já em relação à majorante de cológica e à autodeterminação;
emprego de armas, o entendimento é que podem ser
armas de fogo ou armas brancas (faca, por exemplo). Voltando ao CP, a pena prevista é de 6 meses a 2
anos, e multa, e o tipo é expressamente subsidiário,
Art. 147-A [...] ou seja, só terá incidência caso não configure crime
§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem preju- mais grave.
ízo das correspondentes à violência. O novo tipo penal pode ser praticado por qualquer
pessoa, homem ou mulher, sempre tendo a mulher
Quanto ao concurso de crimes, o parágrafo 2º dis- como sujeito passivo.
põe que, no caso de o perseguidor utilizar-se de vio- O núcleo do tipo é causar (gerar, originar, provo-
lência para provocar uma intimidação mais intensa car) dano emocional. O dano emocional, por sua vez,
da vítima, a ele devem ser aplicadas também as penas nos termos da lei, pode ser aquele que:
relativas à violência.
z Prejudique e perturbe o pleno desenvolvimen-
Dica to da mulher, como, por exemplo, o marido ou
companheiro que não permite que a mulher exer-
No caso do parágrafo 2º, seria a hipótese ça livremente sua atividade profissional;
da aplicação do chamado concurso formal z Vise a degradar ou a controlar as ações, com-
impróprio (previsto na parte final, do caput, portamentos, crenças e decisões, como, por
do art. 70, do CP), situação em que o sujeito exemplo, quando se controla a forma como a
ativo, movido por desígnios autônomos (quer mulher se porta socialmente, a forma como se ves-
perseguir e usar a violência), mediante uma te, entre outras escolhas.
só conduta, provoca dois ou mais resultados,
devendo as penas serem somadas. Nos termos do art. 147-B, o dano emocional pode
ser causado por vários meios:
Art. 147-A [...]
§ 3º Somente se procede mediante representação z ameaça;
z constrangimento;
De acordo com o parágrafo 3º, do art. 147-A, a ação z humilhação;
penal no crime de perseguição é pública condiciona- z manipulação;
da à representação, ou seja, a vítima ou seu represen-
z isolamento;
tante devem, dentro do prazo decadencial, manifestar
z chantagem;
seu interesse em ver seguir o processo.
z ridicularização;
z limitação do direito de ir e vir.
Violência Psicológica Contra a Mulher
Por fim o artigo, em sua parte final, apresenta
Outra importante inclusão realizada pela Lei nº
a expressão mediante qualquer outro meio que
14.188, de 2021, foi a tipificação do crime de violência
causa prejuízo à sua saúde psicológica e autode-
psicológica contra a mulher. Veja:
terminação. Trata-se de uma expressão mais aber-
ta colocada pelo legislador (chamada de cláusula de
Art. 147-B Causar dano emocional à mulher que a
prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento ou interpretação analógica) que indica que o crime pode
que vise a degradar ou a controlar suas ações, compor- ocorrer de outras formas que não as elencadas na lei,
tamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, cons- mas que acabem por gerar prejuízo à saúde psicológi-
trangimento, humilhação, manipulação, isolamento, ca e autodeterminação da vítima (como, por exemplo,
chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e quando o agente controla o uso das redes sociais e do
vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua telefone pela vítima).
saúde psicológica e autodeterminação: A consumação do crime do art. 147-B, do CP, dá-se
Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e mul- com a causação do dano, isto é, do prejuízo à saúde
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

ta, se a conduta não constitui crime mais grave. psicológica e autodeterminação da mulher.
Importante: nem sempre haverá a incidência da
Importante: a violência psicológica é uma das for- Lei nº 11.340, de 2006 (Lei Maria da Penha) sobre o
mas de violência contra a mulher prevista no inciso II, art. 147-B, do CP, uma vez que o crime não exige vio-
art. 7º, da Lei Maria da Penha: lência doméstica ou familiar contra a mulher (a vio-
lência psicológica pode ser praticada, por exemplo, no
Art. 7º São formas de violência doméstica e fami- âmbito profissional).
liar contra a mulher, entre outras:
[...]
II - a violência psicológica, entendida como qualquer
z Violência Psicológica como Motivo de Afasta-
conduta que lhe cause dano emocional e diminui- mento do Agressor
ção da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe
o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou É importante também destacar as alterações da
controlar suas ações, comportamentos, crenças Lei Maria da Penha no que concerne à violência psi-
e decisões, mediante ameaça, constrangimento, cológica contra a mulher. Veja: 51
Art. 12-C Verificada a existência de risco atual ou Importante: qualquer pessoa pode ser o sujeito
iminente à vida ou à integridade física ou psicoló- ativo. Se, todavia, tratar-se de funcionário público
gica da mulher em situação de violência doméstica no exercício das suas funções, estará caracterizado o
e familiar, ou de seus dependentes, o agressor será crime de abuso de autoridade. Nos termos do inciso
imediatamente afastado do lar, domicílio ou local IV, art. 12, da Lei nº 13.869, de 2019 (Lei de Abuso de
de convivência com a ofendida: autoridade), comete crime de abuso autoridade aque-
[...] le que:

A Lei nº 14.188, de 2021, alterou a o art. 12-C, da Lei Art. 12 [...]


Maria da Penha, para incluir a violência psicológica IV - prolonga a execução de pena privativa de liber-
como fundamento para o afastamento do agressor do dade, de prisão temporária, de prisão preventiva,
lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida. de medida de segurança ou de internação, dei-
xando, sem motivo justo e excepcionalíssimo, de
Sequestro e Cárcere Privado executar o alvará de soltura imediatamente após
recebido ou de promover a soltura do preso quando
Art. 148 Privar alguém de sua liberdade, mediante esgotado o prazo judicial ou legal.
seqüestro ou cárcere privado:
Pena - reclusão, de um a três anos. Qualquer pessoa pode ser sujeito passivo. Se a víti-
§ 1º A pena é de reclusão, de dois a cinco anos: ma for ascendente, descendente, cônjuge ou compa-
I - se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou nheiro do agente, ou pessoa com idade superior a 60
companheiro do agente ou maior de 60 (sessenta) anos; anos ou inferior a 18 anos, incide a figura qualificada
II - se o crime é praticado mediante internação da (incisos I e IV, § 1º, art. 148, do CP). Se a vítima for o
vítima em casa de saúde ou hospital; Presidente da República, do Senado Federal, da Câma-
III - se a privação da liberdade dura mais de quinze ra dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal,
dias. estará caracterizado crime contra a Segurança Nacio-
IV - se o crime é praticado contra menor de 18 nal (art. 28, da Lei nº 7.170, de 1983).
(dezoito) anos; O elemento subjetivo é o dolo, sem qualquer fina-
V - se o crime é praticado com fins libidinosos. lidade específica. Não se admite a modalidade culpo-
§ 2º Se resulta à vítima, em razão de maus-tratos sa. Se o propósito do agente for obter, para si ou para
ou da natureza da detenção, grave sofrimento físico outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço
ou moral do resgate, o crime será de extorsão mediante seques-
Pena - reclusão, de dois a oito anos. tro (art. 159, do CP). Se o delito for cometido com fins
libidinosos, incidirá a figura qualificada definida pelo
Antes de iniciarmos o estudo deste crime, é impor- inciso V, § 1º, art. 158, do CP.
tante entender a diferença entre o sequestro e o cár- O consentimento da vítima, se válido, exclui o crime.
cere privado. Este crime apresenta formas que o qualificam,
No sequestro, ocorre restrição de liberdade da veja quais são elas a seguir. Será qualificado o crime
vítima, mas ela não fica necessariamente mantida em de sequestro e cárcere privado (incisos I ao V, § 1º, art.
recinto fechado. Já no cárcere privado, necessaria- 158, do CP):
mente a vítima terá sua liberdade restringida, sendo
mantida em recinto fechado. z Se a Vítima é Ascendente, Descendente, Cônjuge
A consumação do crime se dá com a privação da ou Companheiro do Agente ou Maior de 60 Anos
liberdade da vítima por tempo juridicamente relevan-
te. Trata-se de crime permanente, ou seja, sua consu- A maior gravidade da conduta repousa no fato
mação se prolonga no tempo, fazendo com que seja de ter sido o crime praticado no âmbito das relações
possível a prisão em flagrante do indivíduo a qual- familiares, no seio da união estável, ou ainda contra
quer momento enquanto a privação da liberdade da pessoa idosa, mais frágil em razão da avançada ida-
vítima estiver ocorrendo. de, e, consequentemente, com menor possibilidade de
Importante: quando falamos em cárcere priva- defesa.
do, estamos pensando em confinamento, clausura; já
quando falamos em sequestro, estamos consideran- z Se o Crime é Praticado Mediante Internação da
do limites espaciais mais amplos. Ambos consistem na Vítima em Casa de Saúde ou Hospital
privação da liberdade da vítima, sem o seu consenti-
mento, por tempo juridicamente relevante. Podem ser Crime conhecido como internação fraudulenta;
cometidos mediante detenção ou retenção. pode ser praticado por médico ou por qualquer outra
A tentativa é possível tanto no sequestro como no pessoa.
cárcere privado.
O objeto jurídico é a liberdade de locomoção, con- z Se a Privação da Liberdade Dura Mais de 15
sistente no direito de ir, vir e permanecer, de toda e Dias (Inciso III)
qualquer pessoa humana.
Tão relevante é esse direito que a Constituição Quanto mais longa a supressão da liberdade, maio-
Federal (CF), de 1988, prevê o habeas corpus como res são as possibilidades de a vítima sofrer danos físi-
garantia para zelar pelo seu respeito sempre que cos e psíquicos.
alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violên- Trata-se de crime a prazo. O período legalmente
cia ou coação em sua liberdade de locomoção, por ile- exigido deve ser computado em conformidade com
galidade ou abuso de poder. a regra traçada pelo art. 10, do CP, compreendendo o
O objeto material é a pessoa humana que suporta intervalo entre a consumação do delito e a libertação
52 a conduta criminosa. do ofendido.
z Se o Crime é Praticado Contra Menor de 18 Anos Incorrerá nas mesmas penas aquele que cerceia o
uso de qualquer meio de transporte por parte do tra-
Aplica-se às hipóteses em que a vítima é criança balhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho, e
ou adolescente e, nesse último caso, impede a utiliza- aquele que mantém vigilância ostensiva no local de
ção da agravante genérica prevista na alínea “h”, do trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pes-
inciso II, art. 61, do CP. Não se confunde com o crime soais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local.
tipificado no art. 230, da Lei nº 8.069, de 1990, Estatu-
to da Criança e do Adolescente, que apresenta crime Art. 149 [...]
menos rigoroso. § 1º Nas mesmas penas incorre quem: (Incluído pela
Lei nº 10.803, de 11.12.2003)
z Se o Crime é Praticado com Fins Libidinosos I - cerceia o uso de qualquer meio de transporte por
parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de
Esse inciso foi acrescido pela Lei nº 11.106, de trabalho; (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)
2005, para suprir a lacuna surgida em razão da revo- II - mantém vigilância ostensiva no local de trabalho
gação do crime de rapto, que cuidava somente da pri- ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do
vação da liberdade de mulher honesta. Atualmente, trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.
a qualificadora consiste na privação da liberdade de (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)
§ 2º A pena é aumentada de metade, se o crime é
uma pessoa, homem ou mulher, com fins sexuais. Tra-
cometido: (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)
ta-se de crime formal, de resultado cortado ou de con-
I - contra criança ou adolescente; (Incluído pela Lei nº
sumação antecipada — consuma-se com a privação
10.803, de 11.12.2003)
da liberdade, desde que o sujeito deseje praticar atos
II - por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, reli-
libidinosos com a vítima, pouco importando se alcan- gião ou origem.
ça ou não o fim almejado. Se se envolver sexualmen-
te com a vítima, responderá, em concurso material,
Observe o exemplo: Silvio, fazendeiro conhecido
pelo delito em apreço e pelo respectivo crime contra a
no interior de Goiás, coloca como jornada de trabalho
liberdade sexual, tal como o estupro.
para os funcionários de sua fazenda a carga horária de
O parágrafo 2º qualifica o crime se resultar à
15 horas diárias, pagando a eles um valor muito pequeno
vítima, em razão de maus-tratos ou da natureza da
como contraprestação. Silvio se recusa a fornecer trans-
detenção, grave sofrimento físico ou moral. Esta-
porte para os trabalhadores irem embora, já que, segundo
mos diante de crime qualificado pelo resultado. Os
ele, eles o devem valores referentes à moradia fornecida
maus-tratos consistem na conduta agressiva do agen-
pela fazenda, não dispondo eles de outra maneira de ir
te que ofende a moral, o corpo ou a saúde da vítima,
para casa senão pelo transporte da fazenda. Silvio está
sem produzir lesão corporal. Se ocorrer lesão corporal
cometendo o tipo penal que estamos estudando.
ou morte, haverá concurso material entre o sequestro
ou cárcere privado, na forma simples, e o crime de O crime de redução à condição análoga à de escra-
lesão corporal ou homicídio. vo não admite a modalidade culposa, podendo ser
Por fim, saiba que este crime é comum, poden- praticado apenas dolosamente.
do ser praticado por qualquer pessoa, e permanente É também crime permanente, portanto, sua con-
(muito importante que você fique atento à Súmula duta se prolonga no tempo.
n° 711, do STF — “A lei penal mais grave aplica-se ao Vejamos as causas de aumento de pena:
crime continuado ou ao crime permanente se a sua
vigência é anterior à cessação da continuidade ou da z contra criança ou adolescente;
permanência”). z por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, reli-
Exemplo: se um agente pratica crime de seques- gião ou origem.
tro ou cárcere privado, mantendo um indivíduo como
vítima sob seu domínio e restringindo a sua liberdade, Tráfico de Pessoas
incorrerá em crime permanente. À luz da literalidade
da Súmula 711, do STF, enquanto estiver ocorrendo Irá praticar o crime de tráfico de pessoas o agente
o referido crime disposto no art. 148, do CP, se nova que:
lei penal mais gravosa entrar em vigência, esta será
aplicada quando cessar a prática criminosa, ou seja, Art. 149-A Agenciar, aliciar, recrutar, transpor-
quando a vítima estiver em liberdade. tar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa,
mediante grave ameaça, violência, coação, fraude
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Redução à Condição Análoga à de Escravo ou abuso, com a finalidade de:


I - remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo;
Art. 149 Reduzir alguém a condição análoga à de II - submetê-la a trabalho em condições análogas à
escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados de escravo;
ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condi- III - submetê-la a qualquer tipo de servidão;
ções degradantes de trabalho, quer restringindo, IV - adoção ilegal; ou
por qualquer meio, sua locomoção em razão de V - exploração sexual.
dívida contraída com o empregador ou preposto:
Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além O tipo penal de tráfico de pessoas é misto alterna-
da pena correspondente à violência. tivo, podendo ser praticado mediante a execução de
qualquer um dos seus 8 verbos.
A doutrina classifica-o como crime de ação múltipla. Importante levar em consideração que, para com-
O tipo penal apresenta duas hipóteses equipara- preender este tipo penal, é importante conhecer os
das, respondendo o agente com as mesmas penas do verbos, os meios empregados para a prática do crime
tipo penal principal. e as finalidades. Acompanhe a tabela a seguir: 53
§ 1º Se o crime é cometido durante a noite, ou em
MEIOS lugar ermo, ou com o emprego de violência ou de
VERBOS FINALIDADES
EMPREGADOS arma, ou por duas ou mais pessoas:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da
Remover órgãos,
pena correspondente à violência.
tecidos ou partes
do corpo
O agente que entrar ou permanecer, clandestina ou
Agenciar Submeter a tra-
astuciosamente, ou contra vontade expressa ou tácita de
Aliciar balhos em condi-
Grave ameaça quem de direito, em casa alheia ou em suas dependên-
Recrutar ções análogas à
Violência cias, irá cometer o crime de violação de domicílio.
Transportar de escravo
Coação O crime de violação de domicílio é crime de mera
Transferir Submeter a
Fraude conduta, já que a lei descreve a conduta, mas não o
Comprar qualquer tipo de
Abuso resultado naturalístico; é, também, crime comum, que
Alojar servidão
Acolher Adotar pode ser praticado por qualquer pessoa.
ilegalmente Tutela-se, nesse crime, a tranquilidade doméstica,
Explorar abrangente da intimidade, da segurança e da vida pri-
sexualmente vada proporcionadas pelo domicílio.
A incriminação da violação de domicílio não pro-
tege a posse ou a propriedade.
Vamos exemplificar: o agente, aqui no Brasil, reali- Não configura o delito em análise o ingresso em casa
za recrutamento de mulheres; por meio de fraude, faz abandonada ou desabitada, podendo restar caracteri-
propaganda de que o objetivo é selecionar modelos zado o crime de esbulho possessório, previsto no inciso
para uma determinada marca de produtos de beleza II, § 1º, art. 161, do CP (crime contra o patrimônio).
e que o trabalho será na Europa. Porém, as vítimas
recrutadas seguem para a Europa e são submetidas à
exploração sexual. Importante!
Veja que esse crime é comum, podendo ser pratica-
do por qualquer pessoa. Não se exige, também, nenhu- Casa desabitada não se confunde com casa na
ma condição especial do sujeito passivo do crime. ausência de seus moradores, pois, nesse caso, é
Quando há algumas circunstâncias específicas do possível o crime de violação de domicílio, uma vez
agente ou da vítima e essas condições se encaixam nas que subsiste a proteção da tranquilidade doméstica.
hipóteses da lei, a pena do crime de tráfico de pessoas
será aumentada de 1/3 (um terço) até a metade. Veja:
Quanto ao objetivo material, é o domicílio invadi-
do, que suporta a entrada ou permanência de alguém,
Art. 149-A [...]
clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade
§ 1º A pena é aumentada de um terço até a metade se:
expressa ou tácita de quem de direito.
I - o crime for cometido por funcionário público no
Verifica-se que é necessário que a conduta seja
exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las;
II - o crime for cometido contra criança, adolescen-
praticada clandestina ou astuciosamente, ou contra
te ou pessoa idosa ou com deficiência; a vontade expressa ou tácita de quem de direito. Se
III - o agente se prevalecer de relações de paren- presente o consentimento do morador, explícito ou
tesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, implícito, o fato é atípico.
de dependência econômica, de autoridade ou de Entrar ou permanecer clandestinamente em casa
superioridade hierárquica inerente ao exercício de alheia ou em suas dependências significa fazê-lo de
emprego, cargo ou função; ou forma oculta, sem se deixar notar pela vítima. Por sua
IV - a vítima do tráfico de pessoas for retirada do vez, entrar ou permanecer astuciosamente consiste
território nacional. em conduta fraudulenta, maliciosa.
Entrar ou permanecer em casa alheia ou em suas
Para encerrarmos o estudo dos crimes contra a dependências contra a vontade expressa ou tácita de
liberdade pessoal, é importante mencionar que o quem de direito enseja a entrada ou permanência
crime de tráfico de pessoas apresenta causa de dimi- francas. Nesses casos, o dissentimento de quem de
nuição de pena, desde que o agente preencha os 2 direito pode ser expresso ou tácito.
Sobre o sujeito ativo, o crime é comum, poden-
requisitos, que são cumulativos. A pena é reduzida de
do ser praticado por qualquer pessoa, inclusive pelo
1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o agente:
proprietário do bem, quando entra ou permanece na
residência ocupada pelo inquilino contra sua vontade
z for primário;
expressa ou tácita.
z não integrar organização criminosa.
Atenção: se a violação de domicílio for praticada
por agente público, resta configurado o crime da Lei
CRIMES CONTRA A INVIOLABILIDADE DO de Abuso de autoridade, Lei nº 13.869, de 2019, em seu
DOMICÍLIO art. 22. Veja sua literalidade:

Violação de Domicílio Art. 22 Invadir ou adentrar, clandestina ou astu-


ciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante,
Art. 150 Entrar ou permanecer, clandestina ou imóvel alheio ou suas dependências, ou nele per-
astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou manecer nas mesmas condições, sem determinação
tácita de quem de direito, em casa alheia ou em judicial ou fora das condições estabelecidas em lei:
suas dependências: Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e
54 Pena - detenção, de um a três meses, ou multa. multa.
Em que pese a possibilidade de configuração do A expressão “casa” não compreende:
crime de abuso de autoridade, este não será conside-
rado quando a violação ao domicílio se der por fun- § 5º Não se compreendem na expressão “casa”:
dadas suspeitas de ocorrência de crime no interior da I - hospedaria, estalagem ou qualquer outra habita-
residência.9 ção coletiva, enquanto aberta, salvo a restrição do
O Código Penal não protege a propriedade nem a n.º II do parágrafo anterior;
posse indireta do locador. II - taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.
O locatário, possuidor direto do imóvel, não é ofen-
dido em sua posse, e sim em sua tranquilidade domés- Para encerrarmos o assunto violação de domicílio,
tica. A serviçal que permite o ingresso do amante em por fim, veremos os casos em que, mesmo com a vio-
seu quarto pratica o crime em concurso com ele. lação, o fato não constituirá crime.
O divorciado pode cometer o crime ao entrar ou
permanecer na residência do seu ex-cônjuge contra § 3º Não constitui crime a entrada ou permanência
sua vontade. em casa alheia ou em suas dependências:
Não há crime quando uma mulher, na ausência I - durante o dia, com observância das formalidades
do seu marido, permite a entrada do amante em sua legais, para efetuar prisão ou outra diligência;
residência. II - a qualquer hora do dia ou da noite, quando
Veja, o sujeito passivo é o titular do direito à tran- algum crime está sendo ali praticado ou na iminên-
cia de o ser.
quilidade doméstica. É o “quem de direito”, o sujeito
que tem o poder de admitir ou excluir alguém da sua
casa, pouco importando se é ou não o proprietário. Em concurso de crimes: a caracterização do delito
Pode ser: reclama que tenha o agente, como finalidade própria,
ingressado ou permanecido em casa alheia, e nada
mais do que isso.
z uma pessoa a quem os demais habitantes da casa
estão subordinados (regime de subordinação); Quando assim atua como meio de execução de
z diversas pessoas, habitantes da mesma residência, outro crime mais grave, a violação de domicílio fica
em relação isonômica (regime de igualdade). absorvida (princípio da consunção).
Subsiste o crime de violação de domicílio quando
há dúvida acerca do verdadeiro propósito do agente
O elemento subjetivo desse crime é o dolo, abran-
e quando caracteriza desistência voluntária, pois o
gente do elemento normativo “contra a vontade
agente só responde pelos atos praticados.
expressa ou tácita de quem de direito”.
Ação penal: pública incondicionada.
O crime é incompatível com o dolo eventual.
Há atipicidade, por ausência de dolo, nas condutas
de entrar em casa alheia para esconder-se da polícia CRIMES CONTRA A INVIOLABILIDADE DE
ou quando o sujeito supõe ingressar em local diverso CORRESPONDÊNCIA
do proibido (erro de tipo). Não se admite a modalida-
de culposa. Violação de Correspondência
Crime de mera conduta ou de simples atividade.
Consuma-se quando o sujeito ingressa completa- Observe:
mente na casa da vítima, ou então quando, ciente de
que deve sair do local, não o faz por tempo juridica- Art. 151 Devassar indevidamente o conteúdo de
mente relevante. É imprescindível a entrada concreta correspondência fechada, dirigida a outrem:
em casa alheia. Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Cabe tentativa? É possível na conduta “entrar”
(crime comissivo), e incabível no núcleo “permane- A lei penal, por objeto jurídico, tutela a liberdade
cer” (crime omissivo próprio ou puro). de comunicação do pensamento, concretizada pelo
Este crime apresenta forma qualificada: sigilo da correspondência.
É a correspondência, objeto material, por exemplo
z durante a noite; carta, bilhete, telegrama etc., violada pela conduta
z em lugar ermo; criminosa. A correspondência pode ser particular ou
z com o emprego de violência ou de arma; oficial, pouco importando que esteja ou não redigida
z por 2 ou mais pessoas. em português. Exige-se, porém, que se trate de idio-
ma conhecido, pois, na hipótese de ser veiculada por
Os patamares mínimo e máximo da pena do crime códigos incompreensíveis e indecifráveis, haverá cri-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

serão alterados (de 1 a 3 meses para 6 meses a 2 anos), me impossível por absoluta impropriedade do objeto
se for praticado em uma das hipóteses previstas. (art. 17, do CP).
Observe o que o Código Penal diz sobre a expres- A lei penal protege a correspondência fechada,
são “casa”: pois somente esta contém em seu interior um segre-
do. É preciso que seja a correspondência endereçada
Art. 150 [...] a destinatário específico.
§ 4º A expressão “casa” compreende: Não há crime de violação de correspondência:
I - qualquer compartimento habitado;
II - aposento ocupado de habitação coletiva; z Conduta do sujeito que lê uma carta cujo envelope
III - compartimento não aberto ao público, onde está aberto;
alguém exerce profissão ou atividade. z Correspondências cujos envelopes possuem a
expressão “este envelope pode ser aberto pela
Empresa de Correios e Telégrafos”;
9 STF — RE 603.616/RO. 55
z Aquele que abre uma carta que encontrou e estava A ação penal é pública condicionada à
perdida há décadas em lugar público; representação.
z Alguém abre uma carta remetida ao povo, aos elei- Tratando-se de crime de dupla subjetividade pas-
tores em geral, aos amantes do futebol etc.; siva (remetente e destinatário), o direito de represen-
z Os pais que abrirem cartas estranhas endereçadas tação pode ser exercido tanto pelo remetente como
aos filhos menores; pelo destinatário da correspondência. Se um deles
z Ao diretor do estabelecimento prisional é assegu- quiser representar, e o outro não, prevalece a vontade
rado o direito de acessar o conteúdo de correspon- daquele que deseja autorizar a instauração da perse-
dências suspeitas remetidas aos presos (inciso XV, cução penal.
parágrafo único, art. 41, da Lei de Execução Penal);
z Quando um dos cônjuges abre correspondências Sonegação ou Destruição de Correspondência
encaminhadas ao outro cônjuge, não há crime, em
face do exercício regular de direito. Acompanhe:

Devassar significa acessar o conteúdo da corres- Art. 151 [...]


pondência, não necessariamente exigindo a divul- § 1º Na mesma pena incorre:
gação deste conteúdo. O sigilo da correspondência I - quem se apossa indevidamente de correspondên-
é inviolável, por expressa disposição constitucional cia alheia, embora não fechada e, no todo ou em
(inciso XII, art. 5º). A devassa pode ser efetuada por parte, a sonega ou destrói;
qualquer meio; embora seja o método mais comum,
não é obrigatória que seja a abertura da correspon- É necessário que a correspondência seja endereça-
dência — o sujeito pode conhecer o conteúdo de uma da a destinatário específico.
carta apalpando o objeto que está em seu interior, por O crime previsto no § 1º, art. 40, da Lei nº 6.538,
exemplo, dinheiro, cartão bancário, objetos de valor. de 1978, é crime autônomo em relação ao caput deste
Assim, também pode praticar o delito o agente que artigo. As penas alternativas cominadas em abstrato
se inteirar do seu conteúdo sem abri-la. são as mesmas do delito de violação de correspondên-
Para caracterização do crime, não basta ao agen- cia, mas o legislador utilizou outro núcleo e inseriu
te devassar o conteúdo de correspondência fechada novas elementares.
dirigida a outrem. É preciso que o faça indevidamen- O objeto jurídico é a inviolabilidade da correspon-
te, sem ter o direito de tomar conhecimento do seu dência, no sentido de ser preservada pelo seu titular
conteúdo. até quando reputar conveniente.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois se Tem como objetivo material a correspondência
trata de crime comum. alheia, mas agora retirada da esfera de disponibilida-
Incidirá uma agravante genérica se o crime for de do seu titular.
cometido por pessoa prevalecendo-se do cargo ou em Pode, no entanto, estar aberta ou fechada, uma vez
abuso da função. que a conduta consiste em apossar-se da correspon-
É imprescindível que o sujeito pratique o fato em dência para sonegá-la ou destruí-la, indevidamente, e
decorrência do cargo ou função específica por ele não para tomar conhecimento ilegítimo do seu conte-
desempenhada, relativa ao serviço postal. údo. A modalidade desse crime é o dolo, abrangente
Detalhe: para ser sujeito passivo, observamos que da ilegitimidade da conduta de apossar-se de corres-
há duas vítimas o remetente e o destinatário. pondência alheia, com a exigência da finalidade espe-
Exclui-se o crime se qualquer um deles autorizar cífica de sonegá-la ou destruí-la.
o conhecimento do conteúdo da correspondência por É possível a tentativa.
terceira pessoa. Enquanto não chega ao destinatário, Causa de aumento da pena:
pertence unicamente ao remetente.
Vejamos alguns pontos importantes: Art. 151 [...]
§ 2º As penas aumentam-se de metade, se há dano
z A impossibilidade de localização do destinatário para outrem.
não afasta o crime;
z O falecimento do remetente não exclui o delito; O dano pode ser econômico ou moral, e o prejudi-
z Se a correspondência ainda não foi enviada, e sobre- cado pode ser o remetente, o destinatário ou mesmo
veio sua morte, seus herdeiros têm o direito de um terceiro.
conhecer seu conteúdo, pois ela agora lhes pertence; Por tratar-se de crime de dupla subjetividade passi-
z Se o destinatário falece antes de receber a corres- va, o direito de representação pode ser exercido tanto
pondência, seus sucessores poderão conhecer seu pelo remetente como pelo destinatário da correspon-
conteúdo, que provavelmente a eles interessa. dência. Se um deles quiser representar, e o outro não,
prevalece a vontade daquele que deseja autorizar a
O crime de violação de correspondência é dolo- instauração da persecução penal.
so, abrange a ilegitimidade da conduta de devassar a
correspondência alheia. Não se admite a modalidade Violação de Comunicação Telegráfica, Radioelétrica
culposa. ou Telefônica
Se a finalidade do agente for praticar espionagem
contrária à Segurança Nacional, serão aplicáveis o Art. 151 [...]
caput, do art. 13 e o art. 14, da Lei nº 7.170, de 1983, § 1º [...]
conforme o caso. II - quem indevidamente divulga, transmite a
O crime de violação de correspondência consuma- outrem ou utiliza abusivamente comunicação tele-
-se com o conhecimento do conteúdo da correspon- gráfica ou radioelétrica dirigida a terceiro, ou con-
56 dência. É possível a tentativa. versação telefônica entre outras pessoas;
III - quem impede a comunicação ou a conversação O objeto material é a comunicação telegráfica ou
referidas no número anterior; radioelétrica dirigida a terceiro, ou a conversação
IV - quem instala ou utiliza estação ou aparelho telefônica entre pessoas, indevidamente divulgada,
radioelétrico, sem observância de disposição legal. transmitida a outrem ou utilizada abusivamente.
O crime é de modalidade dolosa. Quanto à utiliza-
A primeira parte, do inciso II, § 1º, art. 151, do CP, ção de comunicação telegráfica ou radioelétrica, exi-
está em vigor unicamente nas hipóteses em que a vio- ge-se que o sujeito cometa o fato abusivamente, isto
lação é efetuada por pessoas comuns. é, com a consciência de abusar quanto ao uso indevi-
Aplica-se o § 1º, art. 56, da Lei nº 4.117, de 1962 — do da mensagem.
Código Brasileiro de Telecomunicações — nas hipóte- Sobre a consumação, observa-se que, no tipo pre-
ses em que a violação é praticada por funcionário do visto no inciso II, ocorre com a divulgação, transmis-
governo encarregado da transmissão da mensagem. são ou utilização abusiva. A divulgação necessita do
A parte final, do inciso II, § 1º, art. 151, do CP, foi conhecimento do conteúdo da comunicação por um
derrogada pela Lei nº 9.296, de 1996, que regulamenta número indeterminado de pessoas.
a parte final do inciso XII, art. 5º, da CF, de 1988. A ação penal, na hipótese do inciso I, é pública
A Lei nº 9.296, de 1996 — Interceptação Telefônica incondicionada. Nas hipóteses dos incisos II e III, é
— criou um tipo penal específico para a violação do pública condicionada à representação. Já para o pre-
sigilo telefônico no art. 10, veja: visto no inciso IV, é pública incondicionada.

Art. 10 Constitui crime realizar interceptação de Art. 151 [...]


comunicações telefônicas, de informática ou tele- § 2º As penas aumentam-se de metade, se há dano
mática, promover escuta ambiental ou quebrar para outrem.
segredo da Justiça, sem autorização judicial ou
com objetivos não autorizados em lei. As penas, em todas as hipóteses, aumentam-se de
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. metade, se há dano para outrem, que pode ser econô-
mico ou moral, e pertinente a qualquer pessoa.
O dispositivo continua aplicável ao terceiro que
não interveio na interceptação telefônica criminosa, § 3º Se o agente comete o crime, com abuso de fun-
mas divulgou-a a outras pessoas. ção em serviço postal, telegráfico, radioelétrico ou
Esse inciso II, § 1º, art. 151, do CP, tem como núcleo telefônico:
Pena - detenção, de um a três anos.
divulgar, transmitir e utilizar, tipo misto alternati-
vo. A prática de mais de uma conduta visando igual
Aplicável às hipóteses não revogadas pela Lei nº
objeto material caracteriza crime único.
4.117, de 1962 — Código Brasileiro de Telecomunica-
Divulgar é tornar algo público, dando conheci-
ções — e pela Lei nº 6.538, de 1978 — Serviços Postais.
mento do seu conteúdo a outras pessoas.
A incidência da figura qualificada só será cabível
Transmitir significa enviar de um local para outro.
quando o sujeito ativo desempenhar alguma função em
Utilizar é fazer uso de algo.
serviço postal, telegráfico, radioelétrico ou telefônico, e
dela abusar.
Exige-se a relação de causalidade entre a função
Importante! exercida abusivamente pelo agente e o delito praticado.
Na hipótese de um terceiro concorrer de qual- Quanto à qualificadora, a ação penal é pública
quer modo para a interceptação telefônica ilegal, incondicionada.
será partícipe do crime definido pelo art. 10, da
Lei nº 9.296, de 1996. Se tiver ciência de uma Correspondência Comercial
gravação oriunda de violação telefônica indevi-
Art. 152 Abusar da condição de sócio ou emprega-
da, e divulgá-la, a ele será imputado o crime defi-
do de estabelecimento comercial ou industrial para,
nido pelo inciso I, § 1º, art. 151, do CP. no todo ou em parte, desviar, sonegar, subtrair ou
suprimir correspondência, ou revelar a estranho
seu conteúdo:
A modalidade do crime prevista no inciso III, § 3º, Pena - detenção, de três meses a dois anos.
art. 151, do CP, está em vigor. Parágrafo único. Somente se procede mediante
A figura do inciso III é impedir, obstruir, a comu-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

representação.
nicação ou conversação telegráfica, radioelétrica
ou telefônica. Pune-se o indivíduo que, sem amparo O objeto jurídico desse crime é a inviolabilidade
legal, não deixa ser realizada a comunicação ou con- de correspondência. A lei penal tutela a liberdade de
versação alheia. comunicação do pensamento transmitida por meio de
O inciso IV, § 1º, art. 151, do CP, foi substituído pelo correspondência comercial.
art. 70, da Lei nº 4.117, de 1962 — Código Brasileiro de O objeto material é a correspondência comercial
Telecomunicações. que suporta a conduta criminosa. No conceito de cor-
A finalidade da lei é vedar a uma pessoa, sem auto- respondência comercial, encaixa-se toda e qualquer
rização legal, a instalação ou utilização de aparelho carta, bilhete ou telegrama inerente à atividade mer-
clandestino de telecomunicações. cantil. Deve se relacionar às atividades exercidas pelo
Nesse crime, tem-se por objeto jurídico o sigilo da estabelecimento comercial ou industrial.
comunicação transmitida pelo telégrafo, pelo rádio e O núcleo do tipo é abusar, que significa utilizar de
pelo telefone. forma excessiva ou inadequada.
57
Os sócios ou empregados, no exercício de suas Pressupõe-se dois elementos:
atividades, geralmente têm acesso a informações
contidas em correspondências endereçadas ao esta- z Negativo: ausência de notoriedade;
belecimento comercial ou industrial. z Positivo: vontade determinante de sua custódia
A conduta de abusar concretiza-se mediante o ato ou preservação.
de, no todo ou em parte, desviar, sonegar, subtrair ou
suprimir correspondência, ou revelar a estranho seu Nos crimes contra a inviolabilidade de corres-
conteúdo. Pode ser exteriorizada por ação, por exemplo, pondência, o legislador busca coibir o conhecimen-
abrir uma carta, ou por omissão, por exemplo, deixar to do conteúdo de uma missiva sem autorização
uma correspondência ser destruída pela chuva. para tanto; tutela-se unicamente a inviolabilidade de
Desviar é afastar a correspondência do seu real correspondência.
destino. Já nos crimes contra a inviolabilidade dos segre-
Sonegar é esconder, no sentido de obstar a che- dos, protege-se um segredo nela contido, capaz de
gada da correspondência ao correto estabelecimento ser divulgado ou revelado e com isso, causar danos a
comercial ou industrial. outrem. Além disso, o bem jurídico resguardado pela
Subtrair é apoderar-se da correspondência comer- lei penal é a inviolabilidade dos segredos.
cial, retirando do seu devido lugar ou impedindo seu
envio ao destino original. Divulgação de Segredo
Suprimir é destruir para que a correspondência
não seja entregue em seu destino, ou para que seja Art. 153 Divulgar alguém, sem justa causa, conteú-
retirada do estabelecimento comercial ou industrial do de documento particular ou de correspondência
para o qual foi encaminhada. confidencial, de que é destinatário ou detentor, e
Revelar é permitir o acesso ao conteúdo da cor- cuja divulgação possa produzir dano a outrem:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa, de
respondência do estabelecimento comercial ou indus-
trezentos mil réis a dois contos de réis.
trial a quem seja alheio aos seus quadros ou não tenha
§ 1º Somente se procede mediante representação.
o direito de conhecer o que nela se contém.
Sobre o sujeito ativo, somente pode ser o sócio ou
O objeto jurídico é a inviolabilidade da intimidade
empregado do estabelecimento comercial ou indus-
ou da vida privada. Veda-se a divulgação de segredos
trial, por ser crime próprio.
cujo conhecimento por terceiros pode trazer prejuízos
Já o sujeito passivo é o estabelecimento comercial
ao seu titular.
ou industrial titular da correspondência violada.
O objeto material é o conteúdo secreto de docu-
Esse crime é praticado na modalidade dolosa. Exi-
mento particular ou de correspondência confidencial.
ge-se também um especial fim de agir, representa- Vejamos que o núcleo do tipo é divulgar, vulgari-
do pela intenção de abusar da condição de sócio ou zar, tornar público ou conhecido um fato ou informa-
empregado. É necessário ter o agente, ao tempo da ção. Não basta a comunicação a uma só pessoa ou a
conduta, a consciência de que abusa da sua peculiar um número reduzido e limitado, exige-se propagação,
condição em relação à vítima. difusão, possibilitando o conhecimento do fato a um
Não se admite a modalidade culposa. número indeterminado de pessoas.
O crime é formal, de consumação antecipada ou de A conduta de divulgar pode ser praticada por
resultado cortado. Consuma-se quando o agente desvia, variados meios — crime de forma livre. Veda-se que
sonega, subtrai ou suprime a correspondência comer- uma pessoa, destinatária de um documento particular
cial, ou então quando revela a terceiro seu conteúdo. ou de uma correspondência confidencial, possa divul-
É possível a tentativa. gá-la a terceiros, provocando danos a alguém.
A ação penal é pública condicionada à representação. Esse tipo penal não se aplica ao documento públi-
co, por ausência de previsão legal. A revelação do seu
CRIMES CONTRA A INVIOLABILIDADE DOS conteúdo pode, contudo, caracterizar o crime de vio-
SEGREDOS lação de sigilo funcional, previsto no art. 325, do CP.
O elemento do tipo está contido na expressão sem
Observamos que o inciso X, art. 5º, da CF, de 1988, é justa causa. Não é qualquer divulgação de conteúdo de
responsável por assegurar a inviolabilidade de dois direi- documento particular ou de correspondência confiden-
tos fundamentais do ser humano: honra e vida privada. cial que caracteriza o delito de divulgação de segredo — a
Reserva-se a toda pessoa o direito de manter segre- divulgação deve ser realizada sem justa causa.
do acerca de fatos de sua vida privada. Nessa seara, a A justa causa conduz à exclusão da tipicidade do fato.
norma constitucional resguarda os segredos pessoais. Há justa causa, entre outras, nas seguintes hipóteses:
De fato, um segredo inerente a alguém, quando
divulgado ou revelado sem justa causa, tem o condão z Comunicação à autoridade policial, ao Ministério
de acarretar sérios danos às pessoas em geral. Público ou ao Poder Judiciário de infração penal;
Veja, os arts. 153 e 154, do Código Penal, resguar- z Consentimento do interessado;
dam o conhecimento público de segredos cuja revela- z Para servir de prova da existência de uma infração
ção possa produzir danos a alguém. penal ou de sua autoria;
Não ingressa na proteção penal, consequentemen- z Dever de testemunhar em juízo;
te, a punição pela revelação ou divulgação de fatos z Defesa de interesse legítimo.
secretos incapazes de proporcionar consequências
jurídicas ao seu titular. Também não há crime quando alguém entrega à
Secreto é o fato da vida privada que se tem interes- autoridade policial, ao Ministério Público ou à autori-
se em ocultar. dade judiciária uma missiva recebida de outrem, con-
58 tendo a confissão de um delito pelo verdadeiro autor.
Trata-se de um crime próprio, pois o sujeito ativo Violação do Segredo Profissional
do crime somente pode ser o destinatário ou detentor
do documento particular ou correspondência de con- Acompanhe o que dispõe o art. 154:
teúdo confidencial.
Sujeito passivo é aquele a quem a divulgação do Art. 154 Revelar alguém, sem justa causa, segredo,
segredo possa produzir dano, remetente, destinatário de que tem ciência em razão de função, ministério,
ou qualquer outra pessoa. ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir
dano a outrem:
Esse crime é praticado na modalidade dolosa, não
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa
se admite a forma culposa, consuma-se no instante
de um conto a dez contos de réis.
em que o segredo é divulgado para um número inde- Parágrafo único. Somente se procede mediante
terminado de pessoas e é possível a tentativa. representação.

Art. 153 [...] O objeto jurídico é a inviolabilidade da intimidade


§ 1º-A Divulgar, sem justa causa, informações sigi- e da vida privada das pessoas, relativamente ao segre-
losas ou reservadas, assim definidas em lei, conti- do profissional. O dever de guardá-lo, contudo, não é
das ou não nos sistemas de informações ou banco absoluto.
de dados da Administração Pública: Já o objeto material é o assunto transmitido ao pro-
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. fissional em caráter sigiloso.
O núcleo do tipo é revelar, no sentido de delatar
A qualificadora, denominada de divulgação de ou denunciar.
sigilo funcional de sistemas de informações, foi ins- O crime é de forma livre, comportando qualquer
tituída pela Lei nº 9.983, de 2000, com o fim de tutelar meio de execução.
as informações sigilosas ou reservadas de interesse Por ser crime próprio, somente pode ser cometido
da Administração Pública, notadamente as relativas à por quem teve conhecimento do segredo em razão de
Previdência Social. sua função, ministério, ofício ou profissão.
É necessário que a informação sigilosa ou reserva- Qualquer pessoa está suscetível a ser sujeito pas-
da tenha conteúdo material. Logo, não há crime quan- sivo prejudicado pela revelação do segredo, seja seu
do se tratar de informação meramente verbal, ainda titular ou até mesmo um terceiro.
que sigilosa ou reservada. Esse crime é praticado na modalidade dolosa,
abrangente da ciência da ilegitimidade da conduta
e da possibilidade de causar dano a outrem. Não se
Importante! admite a modalidade culposa, e não se exige nenhu-
ma finalidade específica.
Informações são os dados sobre alguém ou algo. Consuma-se no instante em que o confidente
Sigilosa é a informação confidencial, secreta. necessário revela a terceira pessoa o segredo de que
Reservada é a informação merecedora de cuida- tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou
dos especiais em relação às pessoas que dela profissão. Basta que seja contado o conteúdo do segre-
possam ter ciência. do a uma única pessoa, desde que esta conduta possa
causar dano a alguém, patrimonial ou moral. Prescin-
de-se da produção do resultado naturalístico. O cri-
Trata-se de crime comum: pode ser praticado por me é formal, de resultado cortado ou de consumação
qualquer pessoa. Se o sujeito ativo for funcionário antecipada.
público, a ele será imputado o crime de violação de É admissível a tentativa na revelação do segredo
sigilo funcional, conforme art. 325, do CP. por escrito, tal como na carta que se extravia (delito
O sujeito passivo é o Estado, porém, nada impede plurissubsistente).
a existência de um particular como sujeito passivo, É pública condicionada à representação, a teor do
desde que possa ser prejudicado pela divulgação das parágrafo único, art. 154, do CP.
informações sigilosas ou reservadas.
Invasão de Dispositivo Informático
§ 2º Quando resultar prejuízo para a Administra-
ção Pública, a ação penal será incondicionada. Art. 154-A Invadir dispositivo informático alheio,
conectado ou não à rede de computadores, median-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

No caput, a ação penal é pública condicionada à te violação indevida de mecanismo de segurança e


representação. com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou
informações sem autorização expressa ou tácita do
Não se aplica a regra prevista no § 2º, art. 153, do
titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades
CP, pois o tipo fundamental fala somente em dano a
para obter vantagem ilícita:
outrem, excluindo, portanto, a eficácia penal da con- Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e
duta criminosa em relação à Administração Pública. multa.
Na figura qualificada, em regra, é pública condicio-
nada à representação. Em primeiro lugar, a Lei nº 14.155, de 2021, modifi-
Nesse caso, somente o particular é ofendido pela cou o caput, do art. 154-A, que dispõe sobre o crime de
conduta criminosa. No entanto, se do fato resultar invasão (ou violação) de dispositivo informático.
prejuízo para a Administração Pública, a ação penal Vale lembrar que o crime do art. 154-A foi inserido
será pública incondicionada. no Código Penal, em 2012, pela Lei nº 12.737, de 2012
(denominada Lei Carolina Dieckmann, em alusão ao
caso de divulgação de imagens envolvendo a atriz). 59
Veja, no quadro a seguir, a comparação entre a z Forma Equiparada
redação original do caput, do art. 154-A com a redação
atual, trazida pela Lei nº 14.155, de 2021: O parágrafo 1º, do art. 154-A, apresenta uma forma
equiparada ao caput (o agente responde pelas mes-
mas penas) com a seguinte redação:
REDAÇÃO ORIGINAL REDAÇÃO ATUAL
§ 1º Na mesma pena incorre quem produz, oferece,
Art. 154-A Invadir dispo-
distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa
sitivo informático alheio, Art. 154-A Invadir dispo- de computador com o intuito de permitir a prática
conectado ou não à rede sitivo informático de uso da conduta definida no caput.
de computadores, me- alheio, conectado ou não
diante violação indevida à rede de computadores, O parágrafo 1º, que pune o agente que comercia-
de mecanismo de segu- com o fim de obter, adul- liza hardware ou software que permita a prática do
rança e com o fim de ob- terar ou destruir dados ou delito previsto no caput, não sofreu modificação pela
ter, adulterar ou destruir informações sem autori- Lei nº 14.155, de 2021.
dados ou informações zação expressa ou tácita
sem autorização expres- do usuário do dispositivo z Forma Majorada
sa ou tácita do titular do ou de instalar vulnerabi-
dispositivo ou instalar vul- lidades para obter vanta- As causas de aumento de pena previstas no pará-
nerabilidades para obter gem ilícita: grafo 2º, art. 154-A, também sofreram alteração pela
vantagem ilícita: Pena - reclusão, de 1 Lei nº 14.155, de 2021. Confira, no quadro a seguir, as
Pena - detenção, de 3 (um) a 4 (quatro) anos, e alterações feitas:
(três) meses a 1 (um) multa
ano, e multa REDAÇÃO ORIGINAL REDAÇÃO ATUAL

Art. 154-A [...]


Tanto na redação original quanto na nova, o verbo Art. 154-A [...]
§ 2º Aumenta-se a pena
núcleo é invadir, que dá a ideia de ingressar, penetrar § 2º Aumenta-se a pena
de 1/3 (um terço) a 2/3
sem autorização. de um sexto a um terço
(dois terços) se da in-
Observe que a primeira alteração que se nota é se da invasão resulta
vasão resulta prejuízo
que, na redação original, a invasão deveria dar-se em prejuízo econômico
econômico
dispositivo alheio; agora, basta que o dispositivo seja
de uso alheio, isto é, configura também crime, por
exemplo, o fato de o proprietário de um computador Com a modificação promovida pela Lei nº 14.155,
invadir o dispositivo que está sendo usado por outra de 2021, o aumento de pena que era de 1/6 a 1/3, pas-
pessoa a quem ele emprestou. sou a ser de 1/3 a 2/3, nos casos em que a invasão
A segunda alteração que se nota é que a reda- resulta em prejuízo econômico.
ção original exigia que a invasão ocorresse median- Importante: a forma majorada prevista no pará-
te violação indevida de mecanismo de segurança grafo 2º é crime material, pois exige que se produza o
(quebrando uma senha, por exemplo); desse modo, resultado naturalístico (ocorrência de prejuízo econô-
se alguém tivesse acesso aos dados constantes em um mico) para que se consume.
computador que foi esquecido ligado, não cometeria o
z Forma Qualificada
delito do art. 154-A. No entanto, tal expressão foi reti-
rada e na redação atual, não se exige a violação de A forma qualificada da invasão de dispositivo
qualquer mecanismo de segurança. informático, prevista no parágrafo 3º, do art. 154-A,
A terceira alteração diz respeito à finalidade que se aplica no caso de a invasão resultar a obtenção
específica (elemento subjetivo especial do tipo) da de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas,
invasão; com a modificação feita no art. 154-A, a inva- segredos comerciais ou industriais, informações sigi-
são deve ocorrer com uma das seguintes finalidades: losas, ou o controle remoto não autorizado do dispo-
sitivo invadido, passou a ter pena maior. Veja como
z Obter, adulterar ou destruir dados ou informações era e como ficou o preceito secundário do dispositivo:
sem autorização expressa ou tácita do usuário do
dispositivo;
z Instalar vulnerabilidades para obter vantagem REDAÇÃO ORIGINAL REDAÇÃO ATUAL
ilícita.
Art. 154-A [...] Art. 154-A [...]
§ 3º Se da invasão resul- § 3º Se da invasão
Vale lembrar que o crime do art. 154-A é formal, ou tar a obtenção de con- resultar a obtenção
seja, não é necessária, como resultado, a obtenção das teúdo de comunicações de conteúdo de
finalidades que constam no caput (obtenção, adultera- eletrônicas privadas, comunicações eletrônicas
ção ou destruição de dados/informações; ou a obten- segredos comerciais ou privadas, segredos
ção de vantagem ilícita), consumando-se o delito, pois, industriais, informações comerciais ou industriais,
com a invasão do dispositivo. sigilosas, assim definidas informações sigilosas,
A quarta alteração se deu em relação à pena da em lei, ou o controle re- assim definidas em lei,
forma simples do crime, que passou de detenção de moto não autorizado do ou o controle remoto não
3 meses a 1 ano e multa, para reclusão de 1 a 4 anos dispositivo invadido: autorizado do dispositivo
e multa. Pena - reclusão, de 6 (seis) invadido:
meses a 2 (dois) anos, e Pena - reclusão, de 2
multa, se a conduta não (dois) a 5 (cinco) anos, e
constitui crime mais grave multa
60
A pena passou a ser reclusão de 2 a 5 anos mais
multa. Veja que, na redação antiga, o delito previsto DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO
no parágrafo 3º consistia em crime subsidiário (note
a expressão “se a conduta não constitui crime mais FURTO
grave”); com o aumento da pena, essa expressão
desapareceu. Art. 155 Subtrair, para si ou para outrem, coisa
alheia móvel:
z Outras Formas Majoradas Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Os parágrafos 4º e 5º do art. 154-A não sofreram O primeiro crime contra o patrimônio é o furto.
modificação por parte da Lei nº 14.155, de 2021, man- Em síntese, o crime de furto é definido por ser a sub-
tendo, portanto, sua redação original: tração de coisa alheia móvel para si ou para outrem.
Há o furto (art. 155, do CP) e o furto de coisa comum
Art. 154-A [...] (art. 156).
§ 4º Na hipótese do § 3º, aumenta-se a pena de um a Sobre o bem jurídico, não há consenso na doutri-
dois terços se houver divulgação, comercialização na, vejamos:
ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos
dados ou informações obtidos. z Somente a propriedade (Hungria);
§ 5º Aumenta-se a pena de um terço à metade se o z A propriedade e a posse (Nucci; Greco; Masson);
crime for praticado contra: z A propriedade, a posse e a detenção (Mirabete;
I - Presidente da República, governadores e prefeitos Delmanto; Bitencourt).
II - Presidente do Supremo Tribunal Federal
III - Presidente da Câmara dos Deputados, do Sena- Subtrair significa retirar a coisa da posse da vítima,
do Federal, de Assembleia Legislativa de Estado, passando-a ao poder do agente. Pode ocorrer por apo-
da Câmara Legislativa do Distrito Federal ou de deramento direto, quando o agente apreende a coisa
Câmara Municipal; ou manualmente, ou por apoderamento indireto, na hipó-
IV - dirigente máximo da administração direta e tese de o agente utilizar-se de terceiros ou de animal.
indireta federal, estadual, municipal ou do Distrito
Federal. z Coisa: refere-se a tudo aquilo que possui existên-
cia de natureza corpórea;
Os parágrafos 4º e 5º cuidam, respectivamente, da z Coisa alheia: significa pertencente a outrem.
majorante que se aplica à forma equiparada (do § 1º),
no caso de divulgação, comercialização ou transmis- A coisa sem dono não é objeto de furto.
são dos dados ou informações para terceiros (ainda Não configura o crime de furto (art. 155, do CP) a
que gratuita); e da causa de aumento em razão da subtração de coisa própria, mesmo que em poder de
vítima ser ocupante de um dos cargos elencados nos terceiro, embora possa caracterizar o delito descrito
incisos do § 5º. no art. 346, do CP, ou o crime de furto de coisa comum
(art. 156, do CP).
z Ação Penal Não há furto de coisa abandonada, pois não inte-
gra o patrimônio de ninguém.
Art. 154-B Nos crimes definidos no art. 154-A, Se houver o apoderamento de coisa perdida, pode-
somente se procede mediante representação, -se configurar o crime do inciso II, § único, art. 169,
salvo se o crime é cometido contra a adminis- do CP.
tração pública direta ou indireta de qualquer Sobre o valor afetivo, para alguns autores (como
dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal ou Damásio e Rogério Greco), coisa de valor afetivo ou
Municípios ou contra empresas concessionárias sentimental também pode ser objeto material de furto.
de serviços públicos. Segundo Hungria, “a coisa subtraída deve represen-
tar para o dono, se não um valor reduzível a dinheiro,
No crime de invasão de dispositivo informático, pelo menos uma utilidade (valor de uso), seja qual for,
em regra, a ação é pública condicionada à represen- de modo que possa ser considerada como integrante
tação do ofendido ou de quem tiver qualidade para do seu patrimônio”.
representá-lo. Em sentido contrário, uma parcela da doutrina
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Isso é justificado pela disponibilidade do interesse (Nucci, por exemplo) sustenta que deve haver subtra-
atacado pelo delito, vinculado precipuamente à esfera ção de coisa com valor patrimonial.
de intimidade da vítima. Em regra, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa,
Reserva-se ao ofendido ou ao seu representante exceto o proprietário.
a oportunidade (ou conveniência) para autorizar ou Sujeito passivo à vítima do furto: o proprietário, o
não o início da persecução penal. possuidor ou detentor da coisa legítima.
Excepcionalmente, a ação penal será pública
incondicionada, nas hipóteses em que o delito envol- Furto Simples
ver a Administração Pública, pois nesses casos há
ofensa a valores de natureza indisponível. O art. 155 do CP define o furto simples.
Configura-se quando o agente subtrai, para si ou
para outrem, coisa alheia móvel.

61
Para entendê-lo, dividiremos em duas partes: Portanto, vimos que não se pode restringir o patri-
mônio às coisas de valor econômico.
z Subtrair (verbo) — consiste no ato de se apossar de Além disso, o sujeito ativo do crime de furto pode ser
propriedade de outra pessoa, seja para si ou para qualquer pessoa, pois, trata-se de crime comum ou geral.
outra pessoa. Por exemplo, o agente subtrai para Há, ainda, exceções. Vejamos:
si uma bicicleta que estava estacionada próximo
à lanchonete; z Furto qualificado pelo abuso de confiança, previs-
z Coisa alheia móvel — necessário que o objeto to no inciso II, § 4º, art. 155, por ser crime próprio,
material do crime de furto seja coisa móvel e que o agente é aquela pessoa que a vítima confia, por
pertença a outra pessoa; caso seja coisa imóvel, ou exemplo, o furto praticado por um empregado;
que pertença ao próprio autor, não configurará z Quanto ao proprietário, caso subtraia a própria coi-
furto. Por exemplo, o agente que, aproveitando a sa que se encontra em poder de terceiro, não res-
distração da vítima, subtraia o aparelho celular. ponderá por furto, mas sim pelo crime de exercício
arbitrário das próprias razões (arts. 345 ou 346, do
Não há emprego de violência nem grave ameaça CP, conforme a pretensão seja legítima ou ilegítima);
à pessoa, distinguindo-se, nesse aspecto, do delito de z Quando a coisa pertencer a mais de uma pessoa,
roubo. o condômino que a subtrair responderá pelo deli-
to de furto de coisa comum (art. 156, do CP). Por
O furto tem as seguintes características: exemplo, um dos condôminos furta cadeiras da
área de uso comum do condomínio;
z É crime comum, que pode ser praticado por qual- z O funcionário público, que subtrai bem público,
quer pessoa; responderá por peculato-furto (§ 1º, art. 312, do
z É crime material, que exige a ocorrência do resul- CP), desde que a função pública tenha facilitado a
tado naturalístico para fins de consumação, ou subtração, pois, se em nada facilitou, o delito será
seja, o crime só ocorre quando o sujeito ativo sub- de furto (art. 155, do CP);
trai a coisa móvel;
z O furto só se pratica dolosamente; „ Funcionário público que subtrai bem particu-
lar que se encontra sob a guarda ou custódia da
z Não admite a modalidade culposa;
Administração Pública, desde que a função tenha
z É crime plurissubsistente, ou seja, a conduta do
facilitado a subtração, responderá por peculato-
agente para praticar o furto é fracionada em
-furto. Por exemplo: policial rodoviário que sub-
diversos atos que somados consumam o delito;
trai veículo que estava apreendido no pátio do
portanto, admite a tentativa quando o agente, por
posto de fiscalização da Polícia Rodoviária;
motivos alheios a sua vontade, pratica alguns atos
„ Funcionário público que subtrai bem particu-
e não ocorre a consumação do delito. Por exemplo,
lar que não estava sob a guarda ou custódia da
o agente, com animus de furtar objetos eletrôni-
Administração Pública ou estava, mas a função
cos de uma casa, pula o muro para ingressar no
em nada facilitou a subtração, responderá por
interior da residência, mas o proprietário da casa
furto. Por exemplo: policial rodoviário que sub-
acorda e acende a luz, momento em que o agente
trai um bem que se encontrava no porta-malas
deixa de praticar os demais atos.
de um veículo que ele foi vistoriar, mas que não
estava apreendido, cometerá o crime de furto.
A lei tutela a propriedade e a posse. A simples
detenção não configura o crime de furto. O sujeito passivo é o titular do bem jurídico lesado
Sobre a consumação deste crime, é importan- ou exposto a perigo de lesão.
te conhecer o posicionamento adotado pelas cortes O titular do bem jurídico, apesar de divergên-
superiores (STF e STJ). cias na doutrina, prevalece sendo o proprietário e
Os tribunais superiores adotam a teoria da apprehen- possuidor.
sio, também chamada de amotio, que considera con- O detentor é arrolado no processo como testemu-
sumado o crime de furto (e isso vale para o crime de nha, e não como vítima.
roubo) quando o agente se apossa da coisa alheia móvel, Vejamos os pontos mais questionados sobre o
mesmo que por um breve período de tempo, não sen- crime de furto:
do necessário que a coisa saia da área de vigilância da
vítima. z Coisas ilícitas: podem ser objeto de furto, por exem-
Um questionamento oportuno é verificar se o bem plo, responde por furto quem subtrai mercadoria
subtraído deve ter valor econômico, ou seja, se o obje- contrabandeada e, neste caso, a vítima responderá
to material pode ser negociável. pelo crime de contrabando. Por outro lado, as coi-
sas ilícitas não podem ser objeto de furto se cons-
Vejamos os bens que integram o patrimônio: tituírem elemento de outro crime, por exemplo, a
subtração de droga é crime do art. 33, da Lei nº
z Os bens corpóreos, com existência material, por 11.343, de 2006; a subtração de arma de fogo é cri-
exemplo, um veículo, e incorpóreos, com existên- me do art. 16, da Lei nº 10.826, de 2003;
cia abstrata, por exemplo, um direito autoral, de z Algumas partes naturais do corpo humano: podem
valor econômico; ser objeto de furto se passíveis de figurarem numa
z Os bens de valor afetivo ou sentimental, por exem- relação jurídica, por exemplo, subtração do cabelo
plo, cartas e fotografias; com o fim de obter lucro. Portanto, a subtração de
z Os bens úteis à pessoa, embora destituídos de valor um rim ou outro órgão vital não é furto, e sim lesão
62 econômico ou sentimental. corporal grave, ou homicídio consumado ou tentado;
z Cadáver: não pode ser objeto de furto, pois consti- I - com destruição ou rompimento de obstáculo à
tui delito do art. 211, do CP, destruição, subtração subtração da coisa;
ou ocultação de cadáver. Porém, se o cadáver tem II - com abuso de confiança, ou mediante fraude,
valor econômico, por exemplo, sendo pertencente escalada ou destreza;
à Faculdade de Medicina, haverá furto. Se houver III - com emprego de chave falsa;
furto de algum objeto que foi sepultado junto ao IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
cadáver, por exemplo, arcada dentária de ouro, o
crime será furto, e a vítima será o herdeiro do de É importante ressaltar também as recentes altera-
cujus; ções legais. Atenção especial para o disposto no § 4º-B
z Energia elétrica: discutia se constituía ou não coisa e § 4º-C, do art. 155, que foram incluídos pela Lei nº
móvel. O legislador penal tipificou o furto de ener- 14.155 de 2021. Vejamos:
gia elétrica no § 3º, art. 155, do CP, equiparando-se
à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra Art. 155 [...]
que tenha valor econômico, por exemplo, ener- § 4º-A A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez)
gia radioativa, energia cinética, energia atômica, anos e multa, se houver emprego de explosivo ou de
energia genética etc. Porém, a energia deve ser artefato análogo que cause perigo comum.
suscetível de apossamento, ou seja, que possa ser § 4º-B A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito)
separada da coisa que a produz. anos, e multa, se o furto mediante fraude é cometi-
do por meio de dispositivo eletrônico ou informáti-
co, conectado ou não à rede de computadores, com
Art. 155 [...]
ou sem a violação de mecanismo de segurança ou a
§ 3º Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou
utilização de programa malicioso, ou por qualquer
qualquer outra que tenha valor econômico.
outro meio fraudulento análogo.
§ 4º-C A pena prevista no § 4º-B deste artigo, consi-
z Alteração no sistema de medição de energia elétri- derada a relevância do resultado gravoso:
ca: de acordo com o entendimento do STJ, a alte- I – aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços),
ração no sistema de medição de energia elétrica, se o crime é praticado mediante a utilização de ser-
mediante fraude, para que o resultado calculado vidor mantido fora do território nacional;
no sistema seja menor do que o consumo real, II – aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o cri-
configura o crime de estelionato, e não o crime de me é praticado contra idoso ou vulnerável.
furto; § 5º A pena é de reclusão de três a oito anos, se a
z Instalação clandestina de TV a cabo: há duas subtração for de veículo automotor que venha a ser
correntes: transportado para outro Estado ou para o exterior.
§ 6º A pena é de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos
„ Primeira: trata-se de fato atípico, pois não há se a subtração for de semovente domesticável de
propriamente a subtração de energia e, sim, produção, ainda que abatido ou dividido em partes
o aproveitamento de um serviço. A energia se no local da subtração.
consome ou se reduz com o uso e isso não ocor- § 7º A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez)
re com a TV a cabo, cuja utilização não gera anos e multa, se a subtração for de substâncias
qualquer custo adicional para a operadora. É explosivas ou de acessórios que, conjunta ou iso-
um mero ilícito civil. Observe que o art. 35, da ladamente, possibilitem sua fabricação, montagem
Lei nº 8.977, de 1995, dispõe que é “ilícito penal ou emprego.
a interceptação ou a recepção não autorizada
dos sinais de TV a Cabo”, entretanto, não lhe z Com destruição ou rompimento de obstáculo à
cominou qualquer pena, sendo vedada a sua subtração da coisa:
imposição pela via da analogia;
„ Segunda: dominante no STJ, considera que há Destruir é desfazer, demolir, por exemplo, o agen-
crime de furto. Argumenta-se que o sinal de te destrói algo para subtrair a coisa, a exemplo daque-
televisão se propaga por meio de ondas, o que le que arromba o portão de uma casa para entrar e
na definição técnica se enquadra como energia subtrair uma televisão.
radiante, que é uma forma de energia associa- Romper é abrir brecha, arrombar, arrebentar, ser-
da à radiação eletromagnética. rar, forçar, rasgar etc. Por exemplo, o agente abre a
porta da casa com um pé de cabra para entrar e sub-
Furto Qualificado trair uma televisão.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Nos dois casos, o delito deixa vestígios, sendo


O furto qualificado é aquele no qual as suas penas imprescindível o exame de corpo delito.
são modificadas nos patamares mínimos e máximo, Em ambos há uma danificação, que é total no ver-
aumentando consideravelmente. bo “destruir”, sendo parcial no verbo “romper”.
Trata-se de qualificado por ter pena própria e não O delito de dano é absorvido pelo furto qualificado,
mera causa de aumento de pena. Podemos exemplifi- por força do princípio da subsidiariedade implícita.
car com o caso de o agente furtar objetos eletrônicos A destruição e o rompimento devem ser praticados
de uma casa utilizado chave falsa para abrir o portão contra obstáculo, e não sobre a própria coisa furtada, por
e a porta da casa. exemplo, o agente rompe a porta do veículo para subtraí-lo.
Obstáculo é aquilo que protege a coisa para difi-
O furto será qualificado nas seguintes hipóteses: cultar a sua subtração, por exemplo, matar o cão de
guarda da residência, destruir as telhas para adentrar
Art. 155 [...] na residência, ou mesmo cortar os fios do alarme do
§ 4º A pena é de reclusão de dois a oito anos, e mul- automóvel ou da cerca eletrificada.
ta, se o crime é cometido: 63
A mera remoção de obstáculo, quando destituída Detalhe, se o comparsa é menor de dezoito anos, o
da danificação, não qualifica o furto, por exemplo, agente responderá por furto qualificado em concurso
desparafusar o farol do automóvel e desatar o nó da material com o delito de corrupção de menores, pre-
corda que prende a canoa. visto no art. 244-B do ECA, desde que haja prova da
efetiva corrupção do menor.
z Com abuso de confiança, ou mediante fraude, Sobre a presença no local do crime, basta a simples
escalada ou destreza: participação, independentemente da presença na fase
da execução.
No abuso de confiança, o agente se vale da confian- A absolvição do coautor nem sempre exclui a qua-
ça que o dono da coisa tem nele para poder subtrair, lificadora. De fato, havendo prova da pluralidade de
como, por exemplo, quando o agente é amigo do dono agentes, a qualificadora deve ser reconhecida.
da casa, que deixa sua carteira sobre a mesa e vai ao No delito de roubo, o concurso de pessoas gera
banheiro despreocupado, momento em que o agente, aumento de pena de um terço até metade. No furto,
aproveitando desta confiança, subtrai a carteira. a pena dobra.
O uso de fraude fica configurado quando o agente Há doutrina que sustenta a violação do princípio
usa de artifício para enganar a vítima, para subtrair da proporcionalidade da pena, porque o roubo é mais
a coisa, a exemplo do agente que se passa por funcio- grave, de modo que o furto qualificado pelo concurso
nário de empresa de telefonia para conseguir entrar de pessoas deveria sofrer apenas o aumento de um
numa casa e subtrair um aparelho celular que nela terço até metade.
estava. O STJ editou a Súmula 442: “É inadmissível aplicar
no furto qualificado pelo concurso de agentes a majo-
Dica rante do roubo”.

Não confunda o furto mediante fraude com o z Furto Qualificado pelo Emprego de Explosivo
estelionato.
No furto mediante fraude, o agente usa a fraude O § 4º-A, art. 155, do CP, foi introduzido por meio
sobre a vítima para subtrair a coisa. da Lei nº 13.654, de 2018, e dispõe que: “A pena é de
No estelionato, o agente emprega a fraude para reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se hou-
ludibriar a vítima e fazer com que ela mesma ver emprego de explosivo ou de artefato análogo que
entregue a coisa. cause perigo comum”.
É o único furto que é crime hediondo (inciso IX,
No furto qualificado pela escalada, segundo o STJ, a art. 1º, da Lei n° 8.072, de 1990, com redação dada pelo
entrada em um local se dá por um meio anormal, que inciso IX, art. 1º, da Lei).
exige do agente esforço físico incomum. Para a dou- O meio utilizado, explosivo ou artefato análogo,
trina majoritária, não é relevante se ocorre por cima torna o fato mais grave, justificando-se o rigor da
ou por baixo, desde que o agente não pratique nenhu- reprimenda penal, em razão da provocação de perigo
ma forma de destruição ou rompimento de obstáculo, coletivo.
quando aplicaremos outra qualificadora ao fato. Meio explosivo é o que causa estrondo, por exem-
No furto qualificado pela destreza, o agente faz uso plos, dinamite, pólvora.
de alguma habilidade especial. Segundo a doutrina, o Importante destacar que o tipo penal, ao contrário
exemplo clássico é o batedor de carteira. do art. 251, do CP, não se refere à substância explosiva,
Não há a qualificadora quando a vítima percebe a mas, sim, a meio explosivo. O meio explosivo utiliza-
subtração. Em tal situação, o agente responde por ten- do para explodir caixas eletrônicos de agências ban-
tativa de furto simples, ou furto simples consumado, cárias para subtrair o dinheiro é um típico exemplo
caso consiga arrebatar o objeto. do § 4º-A, art. 155, do CP. Já no crime do art. 251, do CP,
podemos trazer a hipótese de o agente que lança um
z Com emprego de chave falsa: artefato explosivo num ponto de ônibus e que expõe
as pessoas a risco.
No emprego de chave falsa, para subtrair a coisa, o O meio ou artefato explosivo, a que se refere a qua-
agente faz uso de chave distinta da chave original ou obje- lificadora em análise, abrange qualquer explosão, seja
to capaz de abrir um cadeado ou fechadura, por exemplo, ela oriunda de substância explosiva ou não explosiva,
gazuas, pedaço de arame, micha, clips etc. Anote-se que a mas o assunto certamente enseja polêmica.
chave falsa pode ou não ter formato de chave. Sobre o artefato explosivo, trata-se de qualquer
A jurisprudência não é unânime no caso de se a objeto confeccionado por trabalho mecânico ou à mão,
ligação direta do veículo caracteriza ou não chave por exemplo, as denominadas “bombas caseiras”.
falsa. Para a incidência da qualificadora, é preciso
A abertura com a chave verdadeira, obtida ilicita- que seja um explosivo ou artefato que cause perigo
mente pelo agente, não caracteriza chave falsa. comum, ou seja, que coloque em risco um número
A cópia da chave verdadeira, quando obtida licita- indeterminado de pessoas ou de patrimônios.
mente, não é chave falsa. Se, no entanto, for tirada clan- O agente que se utiliza de um explosivo com poten-
destinamente, incide a qualificadora do crime de furto. cial para causar perigo comum que, entretanto, mes-
mo diante da explosão, não se concretiza, responderá,
z Mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas: em caso de destruição ou rompimento de obstáculo,
pelo furto qualificado do inciso I, § 4º, art. 155, do CP, e
O reconhecimento da qualificadora depende de não pela qualificadora em análise, prevista no § 4º-A.
pelo menos duas pessoas. O explosivo geralmente é utilizado em furtos de
Computam-se os inimputáveis (menores e doentes caixas eletrônicos de bancos, sendo que, diante do
64 mentais) e os desconhecidos. advento desta nova qualificadora, encerra-se o antigo
debate travado acerca da adequação típica, que dividia Com efeito, presentes uma das qualificadoras do
as opiniões entre o furto qualificado pela destruição ou § 4º, exclui-se a incidência da qualificadora em apre-
rompimento de obstáculo (inciso I, § 4º, art. 155, do CP) ço, pois sua pena é mais branda, podendo funcio-
e a explosão com intuito de obter vantagem pecuniária nar, nesse caso, como circunstância judicial do art.
(§ 2º, art. 251, do CP). O enquadramento do § 4º-A, art. 59, do CP, servindo de parâmetro apenas para dosa-
155, do CP, absorve delitos de explosão e de dano, pois gem da pena-base. Entretanto, existe outra corrente
já funciona como causa de aumento de pena, aplican- mais favorável ao réu que, com base no princípio da
do-se o princípio da subsidiariedade tácita. especialidade, afasta a qualificadora do § 4º quando
se tratar de semovente domesticável de produção,
z Furto de veículo automotor que venha a ser trans- impondo-se, nesse caso, a qualificadora específica do
portado para outro Estado ou para o exterior: § 6º, considerando-a novatio legis in melius.
O objeto material é o animal domesticável de pro-
A pena será de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos dução, ainda que abatido ou dividido em partes no
se a subtração for de veículo automotor que venha a local da subtração.
ser transportado para outro Estado ou para o exterior. Trata-se de um tipo penal aberto, porquanto a defi-
Não basta, porém, para a incidência da qualifica- nição desse elemento normativo é complementada
dora, o furto de veículo automotor, pois ainda se exige pelo juiz.
o efetivo transporte para outro Estado ou exterior. Para a incidência da qualificadora, é necessário
Veículo automotor engloba, por exemplo, carros, que o agente subtraia o animal por inteiro ou na sua
motos, lanchas, aviões etc. essência. O tipo penal refere-se à subtração de semo-
Não é necessário que o transporte para outro Esta- vente e, não, de partes dele, de modo que, quando o
do ou exterior seja realizado pelo próprio agente. animal já estava abatido ou dividido em partes, a inci-
Basta que o agente saiba da intenção de eventual dência da qualificadora estará condicionada à subtra-
receptador transportar o veículo para outro Estado ou ção do todo ou das partes substanciais. Na hipótese
exterior. de o agente deixar no local apenas as patas do boi e
Quem realiza o transporte após a consumação do subtrair o restante, persiste a qualificadora. Não teria
furto responde pelo crime de receptação. Por conse- cabimento, por exemplo, qualificar o delito pelo fur-
quência, o agente que é contratado para realizar o to de uma picanha extraída de um animal já abatido.
transporte responde pelo furto, se o contrato for ante- Também não incide a qualificadora quando o próprio
rior à subtração, e por receptação, se só foi contratado agente abate o animal, subtraindo-lhe apenas uma de
após a consumação. suas partes.
Consuma-se o transporte quando o veículo trans- Observa-se que, ao tempo da conduta, é necessário
põe os limites das fronteiras do Estado ou do país, com que o animal ainda pertença ao produtor, posto que o
intuito de ali permanecer. intuito da lei foi protegê-lo.
A mera condução do veículo para outro Estado ou A subtração, por exemplo, de um porco que se
exterior, com o intuito de retornar ao local de origem, encontra no açougue não qualifica o delito.
é insuficiente para a caracterização da qualificadora. Não há que se falar, também, no delito em estudo
Admite-se a tentativa quando o agente realiza a quando se subtrai o leite da vaca ou outro bem pro-
subtração e é preso em flagrante, próximo à trans- duzido pelo animal, porquanto o tipo penal se refe-
posição da fronteira, antes de obter a posse pacífica. re à subtração do semovente e, não, dos bens que ele
Sabemos que a jurisprudência considera o furto con- produz.
sumado como o simples apossamento do bem, inde- Nessas hipóteses, o furto será simples.
pendentemente da posse pacífica. Porém, a tentativa
tornou-se impossível, pois, com o início da remoção do z A subtração for de substâncias explosivas ou de
bem, o furto já se consuma nas modalidades anterio- acessórios que, conjunta ou isoladamente, possi-
res, ainda que o agente seja preso próximo à fronteira. bilitem sua fabricação, montagem ou emprego:

z Furto de semovente domesticável (animais, O objeto material consiste em substâncias explosi-


como: bovinos, suínos, equinos) de produção, vas ou acessórios que possibilitem a fabricação, mon-
ainda que abatido ou dividido em partes no local tagem ou emprego de substância explosiva.
de subtração: O que é substância explosiva? Substância explosi-
va é a que causa estrondo, dissolvendo-se com a arre-
A pena será de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, bentação, por exemplo, pólvora ou dinamite.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

se a subtração for de semovente domesticável (ani- Quanto aos acessórios, são os elementos que, em
mais, como: bovinos, suínos, equinos) de produção, conjunto ou isoladamente, são capazes de se transfor-
ainda que abatido ou dividido em partes no local de mar quimicamente numa substância explosiva; aqui
subtração. podemos exemplificar com o estopim, a espoleta e o
O bem jurídico primário é o patrimônio do produ- cordel detonante. São estes acessórios que possibili-
tor e, o secundário é a saúde pública. Isso porque o tam a fabricação, montagem ou emprego da substân-
animal poderá ser comercializado pelo criminoso sem cia explosiva.
que haja fiscalização do poder público, principalmen- A fabricação é a produção ou confecção.
te sanitária. Pode-se incluir o sistema tributário na Montagem é a junção dos componentes.
condição de patrimônio lesado. Emprego é a utilização.
Na prática, dificilmente esta qualificadora será O tipo penal não se refere aos maquinários e
aplicada, pois este tipo de delito geralmente é prati- outros objetos que também são utilizados para fabri-
cado por mais de uma pessoa e, diante disso, incidirá car, montar ou utilizar os explosivos, mas tão somen-
a qualificadora do inciso IV, § 4º, art. 155, do CP, que é te aos acessórios que compõem a própria substância
mais grave. explosiva. 65
É bom lembrar que configura crime, nos termos do São características do furto privilegiado:
inciso III, do § único, art. 16, da Lei nº 10.846, de 2003,
Estatuto do Desarmamento, possuir, deter, fabricar z Réu primário;
ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem z Coisa furtada de pequeno valor — Segundo a juris-
autorização ou em desacordo com determinação legal prudência, até 1 (um) salário mínimo.
ou regulamentar.
Esse delito será absorvido pelo crime do§ 7º, art. No caso do furto privilegiado, o juiz poderá ado-
155, do CP, pois já funciona como qualificadora. tar uma das seguintes medidas:
A pena será de reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez)
anos, se a subtração for de substâncias explosivas ou z Substituir a pena de reclusão pela de detenção;
de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibi- z Diminuir a pena de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois
litem sua fabricação, montagem ou emprego. terços);
z Aplicar somente a pena de multa.
Furto Majorado
Segundo o STJ, é possível o reconhecer privilé-
O furto será majorado quando a ele for aplicada a gio para o furto simples ou para o furto qualificado;
causa de aumento de pena prevista no § 1º, art. 155, entretanto, neste caso, as qualificadoras têm que ser
do CP. de natureza objetiva (emprego de chave falsa, por
exemplo).
Art. 155 [...]
§ 1º A pena aumenta-se de um terço, se o crime é Súmula n° 511 (STJ) É possível o reconhecimen-
praticado durante o repouso noturno. to do privilégio previsto no § 2º do art. 155 o CP
nos casos de crime de furto qualificado, se estive-
Sobre o repouso noturno, considere que, segundo rem presentes a primariedade do agente, o peque-
o STJ (jurisprudência atual), a causa de aumento de no valor da coisa e a qualificadora for de ordem
pena se aplica ao furto simples e ao furto qualificado. objetiva.
O furto majorado ocorre, por exemplo, quando o
agente, aproveitando-se do repouso noturno, entra O termo “pequeno valor da coisa” é entendido,
numa casa para furtar os eletroportáteis. pela jurisprudência, como o valor que não excede ao
Há discussão sobre a necessidade de a casa estar valor do salário mínimo. É necessário o auto de ava-
habitada e os moradores repousando, para que incida liação. É claro que o referencial do salário mínimo
o aumento de um terço. não é tão rígido, admitindo-se o privilégio quando a
Duas teorias tratam da discussão: coisa excede modicamente esse valor.
Considera-se “ordem subjetiva” a hipótese de furto
z Teoria subjetiva: a razão de ser do aumento da qualificado por abuso de confiança. Deve-se identifi-
pena é a maior proteção à tranquilidade dos que car a confiança da vítima para com o agente. Por isso,
repousam, bem como à incolumidade da vítima, não se trata de furto privilegiado.
que se encontra dormindo e desprotegida. Nes- A regra é que as qualificadoras do crime de fur-
te caso, restringe o aumento da pena ao furto to são objetivas, por exemplo, emprego de chave
cometido em casa habitada com os moradores falsa. Nesta regra, há compatibilidade com o furto
repousando; qualificado.
z Teoria objetiva: o fundamento do aumento da pena
é a proteção do patrimônio, que, nesse período, Furto de Uso
encontra-se vulnerável à subtração. A finalidade
da lei visa proteger primordialmente o patrimô- Esta conduta não exige a intenção de se apoderar,
nio, e depois, a tranquilidade. para si ou para outra pessoa, da coisa alheia móvel
que foi subtraída.
As duas teorias são aceitas, mas devemos com- O furto de uso é fato atípico, tal instituto não se
preender que incide o aumento de um terço não só aplica ao crime de roubo.
em furtos de residência, mas também em bancos, joa- Por exemplo, se o agente subtrai a coisa com a
lherias, casas comerciais, bem como de automóveis intenção de usar e devolver depois, não cometerá o
estacionados na rua, de gado (abigeato). crime de furto.
Aplica-se a regra do repouso noturno mesmo que o Na hipótese de o indivíduo subtrair uma bicicleta,
local seja área comercial ou local desabitado. devolvendo-a após dar uma volta no quarteirão, não
se configura crime de furto.
Furto Privilegiado O reconhecimento do furto de uso necessita da
presença de dois requisitos:
Art. 155 [...]
§ 2º Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor z Uso momentâneo de coisa infungível, ou seja, o
a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de uso duradouro constitui crime de furto. Tratando-
reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois -se de coisa fungível, como o dinheiro, nem o uso
terços, ou aplicar somente a pena de multa. momentâneo seguido da pronta restituição exclui
o delito;
Está previsto no § 2º, art. 155, do CP. Ocorre, por z Restituição imediata e integral da coisa. Nesta
exemplo, no caso de agente primário que subtraiu hipótese, o ladrão, para beneficiar-se do furto de
uma pequena bolsa vazia de uma loja, cujo valor é uso, deve deixar a coisa no mesmo lugar de onde a
66 inferior ao salário mínimo. subtraiu ou nas proximidades.
Furto de Coisa Comum ROUBO E EXTORSÃO

Art. 156 Subtrair o condômino, co-herdeiro ou Roubo


sócio, para si ou para outrem, a quem legitimamen-
te a detém, a coisa comum: O roubo é a subtração de, por exemplo, um reló-
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. gio alheio, para si ou para outrem, mediante violência
§ 1º Somente se procede mediante representação. contra pessoa.
§ 2º Não é punível a subtração de coisa comum O roubo pode ser simples, majorado ou qualifica-
fungível, cujo valor não excede a quota a que tem do. Veremos sobre esses assuntos mais adiante!
direito o agente. O roubo é delito pluriofensivo, isto é, ofende mais
de um bem jurídico.
Acabamos de dizer que é necessário que a coisa A incriminação do roubo visa a tutela do patri-
seja alheia no crime de furto. Entretanto, agora esta- mônio, integridade fisiopsíquica, a saúde e a
mos diante de um crime específico, o furto de coisa tranquilidade.
comum. Na forma qualificada como latrocínio, tutela-se
O furto de coisa comum irá se configurar quando também a vida.
o agente for condômino, coerdeiro ou sócio, e sub- Sobre o sujeito ativo, trata-se de crime comum,
trair, para si ou para outrem, a quem legitimamente a podendo ser praticado por qualquer pessoa.
detém, coisa comum. Nada obsta que um dos criminosos execute a vio-
Temos aqui um crime próprio, que somente pode- lência para que o seu comparsa subtraia a coisa. Nesta
rá ser praticado pelo condômino, coerdeiro ou sócio. hipótese, ambos serão coautores de roubo.
É crime de ação penal pública condicionada à E, quanto ao sujeito passivo, pode ser tanto a pes-
representação. soa que sofre a violência física, moral e imprópria,
O Código Penal é expresso ao fixar que, se a coisa quanto aquela que sofre a lesão patrimonial.
comum for fungível (substituível por outra da mesma O agente que, no mesmo contexto, aborda diversas
espécie, a exemplo do dinheiro), não será punível a vítimas, subtraindo bens de todas elas, por exemplo,
sua subtração caso o valor não exceda a quota a que um assalto no interior do ônibus, responde por tanto
tem direito o agente. roubos quanto forem as vítimas, em concurso formal
Suponha que Alessandro, Fabrício e Diego de delitos.
sejam sócios. A sociedade é avaliada no valor de R$ No crime de roubo, a conduta do agente recai
150.000,00 (cento e cinquenta mil reais). As partes na sobre a pessoa e coisa alheia móvel.
sociedade são iguais. O objeto material é duplo: pessoa e coisa.
Assim, caso Alessandro subtraia R$ 50.000,00 (cin- O roubo, previsto no art. 157, do CP, é dividido
quenta mil), não cometerá crime, já que o valor sub- em 3 (três) espécies:
traído não é superior à sua quota.
z Roubo próprio: antes ou durante a subtração da
coisa móvel, o agente emprega violência ou grave
Dica
ameaça;
O furto de coisa comum não é tão cobrado em z Roubo impróprio: o agente subtrai a coisa móvel,
provas de concursos públicos. Porém, quando em seguida, a fim de assegurar a impunidade do
cobrado, tentam misturar suas características crime ou a detenção da coisa para si ou para ter-
com as características do furto tradicional. ceiro, emprega violência contra pessoa ou grave
ameaça;
z Furto: coisa alheia, crime comum e ação penal z Roubo com violência imprópria: o agente subtrai
coisa móvel alheia, depois de havê-la, por qualquer
incondicionada;
meio, reduzido à impossibilidade de resistência.
z Furto de coisa comum: coisa comum, crime pró-
Exemplo 1: Tício, fazendo uso de arma de fogo para
prio e ação penal condicionada.
intimidar a vítima, anuncia um assalto e subtrai a
mochila de Mévio — temos aqui o roubo próprio.
Outras Hipóteses
Exemplo 2: Tício subtrai uma garrafa de vinho
caro em um supermercado. Ao sair, verifica que
Não há furto na hipótese de o credor subtrair bens o segurança está vindo em sua direção. Neste
do devedor para ressarcir-se, pois se trata de um cri- momento, Tício, para poder fugir com a garrafa de
me específico, previsto no art. 345, do CP, exercício vinho, desfere um soco no rosto do segurança, que
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

arbitrário das próprias razões. Vejamos: “A” deve uma cai — temos aqui o roubo impróprio.
quantia em dinheiro para “B”. “B”, cansado de cobrar o Exemplo 3: Tício conhece Mévia em uma festa.
valor da dívida, subtrai a bicicleta de “A” para quitá-la. Os dois vão para a casa dela. Ele coloca sonífero
O furto famélico é aquele em que o agente bus- na bebida dela, que entra em sono profundo, em
ca saciar a fome, não é estado de necessidade, salvo seguida, o agente subtrai todos o dinheiro existen-
se a subtração for o único meio de se alimentar. Por te na carteira de Mévia — temos aqui o roubo com
exemplo, a mãe, diante da necessidade de alimentar o violência imprópria.
filho, subtrai uma maçã de uma barraca de feira para
alimentá-lo. Roubo Simples
O furto em estado de precisão, aquele em que o
agente está desempregado e subtrai alimentos, ele- Art. 157 Subtrair coisa móvel alheia, para si ou
trodomésticos etc. constitui crime. Por exemplo, o pai, para outrem, mediante grave ameaça ou violência
estando desempregado e sem condições de manter o a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio,
sustento da família, subtrai alimentos e eletroportá- reduzido à impossibilidade de resistência:
teis de um hipermercado para suprir o sustento do lar. Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. 67
Irá praticar o crime de roubo o agente que subtrair VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou
coisa móvel alheia, para si ou para outrem, median- de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possi-
te grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de bilitem sua fabricação, montagem ou emprego.
havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilida- VII - se a violência ou grave ameaça é exercida com
de de resistência. emprego de arma branca;
Também irá praticar o crime de roubo o agente
que, logo depois de subtraída a coisa, emprega violên- Vejamos cada uma das majorantes:
cia contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar
a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si A primeira majorante, concurso de
ou para terceiro. duas ou mais pessoas, justifica-se pela
Vamos falar das características do crime de maior organização do delito, aumen-
roubo: tando a possibilidade de consumação
PRIMEIRA à medida em que diminui a chance de
z É crime comum, já que pode ser praticado por MAJORANTE defesa da vítima
qualquer pessoa; Os menores de 18 anos, os doentes
z É crime complexo, já que atinge mais de um bem mentais e os desconhecidos, partici-
pantes da conduta criminosa, também
jurídico penalmente relevante (há mais de um cri-
são computados
me configurando o tipo penal do crime de roubo):
furto (+) ameaça ou violência; A segunda causa de aumento ocorre
z Não admite a modalidade culposa; quando a vítima está em serviço de
z É crime material, que exige a ocorrência do resul- transporte de valores e o agente conhe-
tado para fins de consumação; ce tal circunstância
SEGUNDA
z Para consumação, adota-se, assim como no furto, a Objetiva-se tutelar a segurança do
MAJORANTE
teoria da apprehensio, ou amotio. transporte
“Valores” abrange dinheiro, joias pre-
Há duas definições em que devemos ter atenção: ciosas e qualquer outro bem passível
arrebatamento de inopino e trombada. de ser convertido em pecúnia
No arrebatamento, que é o ato de arrancar com
A terceira majorante consiste na sub-
violência a coisa que está em poder da vítima ou no
tração de veículo automotor que venha
corpo dela, temos por exemplo o ato de puxar o colar
a ser transportado para outro Estado
do pescoço da vítima.
ou Exterior
A doutrina se divide. Alguns defendem a tese de A expressão “veículo automotor” abran-
que a arrebatamento caracteriza violência contra coi- ge, do mesmo modo que estudamos no
sa, constituindo o delito de furto. Por outro lado, há crime de furto: aeronaves, automóveis,
quem defenda que se trata de violência contra pessoa, TERCEIRA motocicletas, lanchas
configurando crime de roubo, teoria mais aceita. MAJORANTE Para a incidência do aumento da pena,
A trombada contra a vítima tem suas divergências é necessário que o veículo seja efetiva-
na jurisprudência. mente transportado para outro Estado
Há quem afirma que se trata de furto, exceto quan- ou Exterior. Isso porque o transporte
do reduzir a vítima à impossibilidade de resistência, diminui a possibilidade de recuperação
quando então configurará roubo. do bem, facilitando ainda a adulteração
Outra parte defende que sempre se enquadrará na e negociação do veículo, envolvendo,
hipótese de roubo, visto que o ato tem violência física. muitas vezes, terceiros de boa-fé
Aqui, no caso de trombada, a maioria entende que
se trata de furto. A quarta majorante ocorre quando o
QUARTA agente mantém a vítima em seu poder,
MAJORANTE restringindo a sua liberdade. Viola-se a
Roubo Majorado
liberdade pessoal de locomoção
O roubo majorado ocorre, por exemplo, quando o A quinta majorante acontece se a sub-
agente, sabendo que a vítima está prestando serviço tração for de substâncias explosivas
QUINTA
de transporte de valores, subtrai, mediante violência, ou de acessórios que, conjunta ou iso-
MAJORANTE
os malotes que a vítima portava. ladamente, possibilitem sua fabrica-
Vejamos as causas de aumento de pena aplicáveis ção, montagem ou emprego
ao crime de roubo.

Art. 157 [...]


z Substância explosiva é a que causa estrondo, dis-
§ 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até solvendo-se com a arrebentação, por exemplo, pól-
metade: vora ou dinamite;
I – (revogado); z Quanto aos acessórios, são os elementos que, em
II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; conjunto ou isoladamente, são capazes de se trans-
III - se a vítima está em serviço de transporte de formar quimicamente numa substância explosiva;
valores e o agente conhece tal circunstância. aqui podemos exemplificar o estopim, a espoleta e
IV - se a subtração for de veículo automotor que o cordel detonante. São estes acessórios que pos-
venha a ser transportado para outro Estado ou sibilitam a fabricação, montagem ou emprego da
para o exterior; substância explosiva;
V - se o agente mantém a vítima em seu poder, res- z Fabricação é a produção ou confecção;
68 tringindo sua liberdade. z Montagem é a junção dos componentes;
z Emprego é a utilização.
É aquela cujo porte é restrito a
determinadas pessoas. Neste
A última causa de aumento de pena é a violên-
ARMA DE FOGO DE caso, a pena é dobrada, nos ter-
cia ou grave ameaça exercida com emprego de arma
USO RESTRITO mos do § 2º-B, art. 157, do CP,
branca. Arma branca é a que não é arma de fogo.
introduzido pela Lei nº 13.964,
Abrange as armas impróprias, que são os instru- de 2019
mentos que servem para ataque ou defesa, embora
não seja esta a sua finalidade, como a tesoura, faca de É aquela cujo porte é vedado.
cozinha, pedaço de pau, caco de vidro etc., bem como A pena também é dobrada,
ARMA DE FOGO DE
as armas próprias que não sejam de fogo, que são os nos termos do § 2º-B, art. 157,
USO PROIBIDO
instrumentos cuja finalidade específica é o ataque do CP, introduzido pela Lei nº
ou defesa, como o punhal, a espada, o soco inglês e 13.964, de 2019
outros.
Mas, há correntes que consideram arma branca as Justifica-se a majorante em razão da maior poten-
armas próprias, ou seja, o instrumento que tem a fina- cialidade lesiva do fato, que cria risco de morte à
lidade específica de ataque ou defesa. vítima.
A majoração da pena consiste no uso efetivo ou O porte velado, oculto, não majora a pena do rou-
exibição ostensiva da arma branca. bo, porque a lei exige o emprego da arma, consisten-
Atente-se: te no uso efetivo ou porte ostensivo. Assim, só incide
Em relação à causa de aumento de pena referente a majorante quando a violência ou grave ameaça é
ao concurso de duas ou mais pessoas, entende o STJ, exercida com emprego de arma de fogo.
em se tratando de hipótese de associação criminosa, Observe que o roubo majorado absorve o delito de
que os agentes respondem pelo roubo com aumento arma de fogo, previsto na legislação especial, que já
de pena e pelo crime de associação criminosa, em con- funciona como causa de aumento de pena.
curso material. Quanto à arma de brinquedo, não funciona como
O roubo praticado com restrição da liberdade causa de aumento de pena, pois não se trata de arma
é aquele em que o agente mantém a vítima em seu de fogo, mas é suficiente para servir de meio de execu-
poder, restringindo a sua liberdade. Por exemplo, ção de um roubo simples.
imagine que Tiago, portando uma faca, anuncie um Quanto à arma descarregada, também não majora
assalto para subtrair o veículo de Diego. O autor sub- a pena do roubo, falta-lhe potencialidade ofensiva e,
trai o veículo, coloca a vítima no porta-malas e o leva portanto, não se trata de arma, respondendo o agente
por 10 quilômetros, liberando-o em seguida. por roubo simples.
No exemplo apresentado, será aplicada a causa de Já a arma não apreendida, compete ao agente
aumento de pena a Tiago, já que ele restringiu a liber- exibi-la em juízo para que seja periciada, sob pena
dade de Diego, vítima do roubo. de incidência da majorante diante da presunção de
potencialidade ofensiva.
Art. 157 [...] Se a violência ou ameaça é exercida com emprego
§ 2º-A A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços): de arma de fogo — causa de aumento de pena acres-
I – se a violência ou ameaça é exercida com empre- cida pela Lei n° 13.654, de 2018, devemos observar o
go de arma de fogo; seguinte:
II – se há destruição ou rompimento de obstáculo
mediante o emprego de explosivo ou de artefato
z Quem praticou o crime de roubo com arma branca
análogo que cause perigo comum.
antes da Lei nº 13.654, de 2018 não terá incidência
de majorante;
Se a violência ou grave ameaça é exercida com
z Quem praticou o crime de roubo com arma branca
emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido,
depois da Lei nº 13.654, de 2018 e antes do pacote
aplica-se em dobro a pena.
anticrime não terá incidência de majorante;
Pena prevista: reclusão de quatro a dez anos, e
z Quem praticou o crime de roubo com arma bran-
multa. Aplica-se a pena e multiplica por dois.
ca depois do pacote anticrime terá a incidência da
majorante de 1/3 a 1/2;
Art. 157 [...]
z Quem praticou o crime de roubo com arma de fogo
§ 2º-B Se a violência ou grave ameaça é exercida
de uso permitido antes da Lei nº 13.654, de 2018
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

com emprego de arma de fogo de uso restrito ou


proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no
terá a incidência da majorante de 1/3 a 1/2;
caput deste artigo. z Quem praticou o crime de roubo com arma de fogo
de uso permitido depois da Lei nº 13.654, de 2018
Aqui estamos diante de três majorantes do roubo terá a incidência da majorante de 2/3;
com emprego de arma de fogo. z Quem praticou o crime de roubo com arma de fogo
São elas: de uso restrito ou proibido antes da Lei nº 13.654,
de 2018 terá a incidência da majorante de 1/3 a 1/2;
z Quem praticou o crime de roubo com arma de fogo
É aquela cujo porte é passível de uso restrito ou proibido depois da Lei nº 13.654,
de obtenção. Neste caso, a
de 2018 e antes do pacote anticrime terá a incidên-
ARMA DE FOGO DE pena é aumentada de 2/3 (dois
cia da majorante de 2/3;
USO PERMITIDO terços), por força do inciso I,
z Quem praticou o crime de roubo com arma de fogo
§ 2º-A, art. 157, do CP, introdu-
de uso restrito ou proibido depois do pacote anti-
zido pela Lei nº 13.654, de 2018
crime terá pena em dobro. 69
Vamos estudar agora o roubo majorado pela des-
SUBTRAÇÃO MORTE LATROCÍNIO
truição ou rompimento de obstáculo com emprego de
explosivo. Consumada Tentada Latrocínio tentado
Observa-se que a qualificadora do § 4-A, do crime
de furto, tem incidência ainda que não haja destruição Tentada Tentada
ou rompimento de obstáculo, bastando o emprego de Consumada Consumada Latrocínio consumado
explosivo ou de artefato que cause perigo comum, ao
passo que, no roubo, a majorante em análise depen- Tentada Consumada
de, além do explosivo ou artefato que cause perigo
comum, que haja ainda destruição ou rompimento de
obstáculo.
Importante!
Roubo Qualificado Caso o agente mate o seu comparsa, após a
prática do roubo, para ficar com a vantagem do
Art. 157 [...] crime somente para si, não há que se falar, neste
§ 3º Se da violência resulta: caso, em crime de latrocínio.
I – lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7
(sete) a 18 (dezoito) anos, e multa;
II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 A palavra latrocínio não se encontra no atual Códi-
(trinta) anos, e multa. go Penal. Trata-se de uma expressão tradicional.
O latrocínio pode ser próprio ou impróprio:
O roubo será qualificado pelo resultado em duas O latrocínio próprio ocorre quando a morte ocor-
hipóteses: re antes ou durante a subtração da coisa; por exemplo,
o agente mata o empregado de um estabelecimento
z Lesão corporal grave; comercial, subtraindo em seguida o dinheiro do caixa.
z Morte — latrocínio. No latrocínio impróprio, o agente primeiro se
apodera da coisa, sem qualquer violência, matando
A doutrina majoritária entende que a lesão cor- a vítima logo em seguida com o intuito de assegurar
poral grave e a morte não precisam ser praticadas a subtração ou a impunidade. Por exemplo, o agen-
intencionalmente pelo agente, ou seja, é possível que te, logo após subtrair um bem, mata o policial que o
o roubo seja qualificado pelo resultado, mesmo se o surpreende.
resultado tiver sido provocado pelo agente culposa- O sujeito passivo é tanto a pessoa que sofre a lesão
mente, quando ele faz uso de violência. patrimonial quanto aquela que é morta, podendo esta
Iniciaremos o estudo do roubo qualificado pela última ser até mesmo um policial ou terceiro.
lesão corporal. Observe que estamos diante de crime pluriofensi-
Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena vo, que ofende mais de um bem jurídico, quais sejam:
é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e multa. o patrimônio e a vida.
Entende-se por lesão grave, nesta qualificadora, Não há necessidade de que morra a vítima do
tanto os resultados previstos no § 1º, art. 129, do CP patrimônio, sendo suficiente, para a caracterização do
(lesão corporal grave), quanto os previstos no § 2º, art. delito, a morte de qualquer outra pessoa.
129, do CP (lesão corporal gravíssima). Na hipótese de pluralidade de sujeitos passivos
Se houver lesão leve, o roubo é simples. com unidade de subtração patrimonial, haverá um só
Trata-se de crime qualificado pelo resultado. delito de latrocínio. Por exemplo, o agente mata três
A lesão grave pode ocorrer a título de dolo ou culpa, empregados e em seguida subtrai bens do patrão.
sendo que, nessa última hipótese, o delito será preter- O latrocínio é delito qualificado pelo resultado,
doloso. Em ambos os casos, o delito de lesão corporal tendo em vista a duplicidade de eventos. A morte
é absorvido, porque já funciona como qualificadora. pode ocorrer a título de dolo ou culpa. Somente na
Observe que se houver lesão grave consumada e hipótese de o latrocínio ser na modalidade culposa é
subtração patrimonial tentada, para alguns autores que o delito será preterdoloso.
haverá o crime da primeira parte do § 3º, art. 157, con- A morte deve decorrer da violência física. Se decor-
sumado; outros, porém, sustentam que o delito seria rer de grave ameaça ou violência imprópria, exclui-se
tentado. o delito de latrocínio, respondendo o agente por rou-
O roubo qualificado pelo resultado morte, o latro- bo em concurso com homicídio.
cínio, é um crime qualificado pelo resultado morte. Por fim, para encerrarmos o crime de roubo, sobre
Por incrível que pareça, não se trata de crime con- o latrocínio, fique atento ao seguinte: o latrocínio é o
tra vida, mas sim de crime contra o patrimônio. roubo qualificado pelo resultado da violência empre-
O latrocínio constitui crime hediondo. gada pelo agente, resultando-se uma morte.
Para compreendermos o momento de consumação Logo, se a morte resultar de outro elemento que
do latrocínio, é necessário que você conheça a Súmula não seja a violência empregada, não há que se falar
n° 610 do STF. em latrocínio.
O emprego de arma de brinquedo não caracteriza
Súmula n° 610 (STF) Há crime de latrocínio, quan- a aplicação da causa de aumento de pena, entretanto,
do o homicídio se consuma, ainda que não realize o pode contribuir para a configuração do crime de rou-
agente a subtração de bens da vítima. bo, já que pode caracterizar a grave ameaça.

70
Extorsão Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa física ou
jurídica, inclusive a que sofre constrangimento sem
Art. 158 Constranger alguém, mediante violência ou lesão patrimonial.
grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou O núcleo do tipo é o verbo constranger, que signi-
para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, fica coagir, forçar, obrigar alguém a fazer, deixar de
tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa: fazer ou tolerar que se faça alguma coisa que a lei não
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
lhe impõe.
O delito é punido a título de dolo. O agente visa
O crime de extorsão previsto no art. 158, do CP,
conseguir da vítima uma ação ou omissão, com o fim
configurar-se-á quando o agente constranger alguém,
de obter, para si ou para outrem, indevida vantagem
mediante violência ou grave ameaça, com o intuito de
econômica.
obter para si ou para outrem indevida vantagem eco-
nômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer A finalidade específica é a intenção de obter uma
alguma coisa. vantagem indevida e econômica.
Por exemplo, o agente chantageia uma mulher e o A vantagem econômica pode consistir em bem
marido, ameaçando de morte o seu filho, objetivando móvel ou imóvel, diferentemente do roubo, cuja van-
a obtenção de vantagem econômica. tagem restringe-se ao bem móvel.
Neste crime, observe que não se fala em coisa A vantagem, além de econômica, deve ainda ser
móvel, mas sim em indevida vantagem econômica. indevida, contrária ao direito.
Logo, para a configuração da extorsão, é possível que
a vantagem econômica seja coisa imóvel. z Extorsão qualificada:

Características da Extorsão: Art. 158 [...]


§ 1º Se o crime é cometido por duas ou mais pes-
z É crime comum, que pode ser praticado por qual- soas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena
quer pessoa; de um terço até metade.
z É crime complexo, já que tutela tanto o patrimônio
quanto a liberdade individual; Dispõe o § 1º, art. 158, do CP, que se o crime é come-
z Não admite a modalidade culposa (só pode ser pra- tido por duas ou mais pessoas, ou com o emprego de
ticado dolosamente); arma, aumenta-se a pena de 1/3 até a metade.
z É crime formal, que se consuma com o constran- Por exemplo, dois agentes chantageiam uma
gimento, mediante violência ou grave ameaça, mulher, ameaçando de morte a sua mãe, objetivando
independentemente de o agente conseguir ou não a obtenção de vantagem econômica.
obter a indevida vantagem econômica. Trata-se de causa de aumento de pena em quan-
tidade fixa, que, em face da posição topográfica, é
Súmula n° 96 (STJ) O crime de extorsão consuma-se inaplicável à extorsão do § 2º, art. 158.
independentemente da obtenção da vantagem indevida. São duas as majorantes da pena, vejamos:
É importante não confundir o crime de extorsão
„ Concurso de duas ou mais pessoas;
com o crime de roubo, que acabamos de estudar:
„ Emprego de arma. Observe que há emprego
de qualquer arma, própria ou imprópria, não
z Roubo: o agente emprega a violência ou grave
necessita ser arma de fogo.
ameaça, visando à subtração; a participação da
„ Extorsão qualificada pelo resultado:
vítima é dispensável;
z Extorsão: o agente emprega a violência ou grave
Art. 158 [...]
ameaça para determinar um comportamento da
§ 2º Aplica-se à extorsão praticada mediante vio-
vítima e obter indevida vantagem econômica; a
lência o disposto no § 3º do artigo anterior
participação da vítima é indispensável, sem ela,
o autor não consegue obter a indevida vantagem
Veja que o § 2º, art. 158, do CP, dispõe que será aplica-
econômica.
do a extorsão praticada mediante violência ao disposto
no § 3° do artigo anterior, ou seja, do crime de roubo.
No delito de extorsão, há a presença dos seguin-
tes elementos: Assim, a extorsão qualificada pelo resultado ocor-
re quando, em razão da violência, resulta em lesão
z O constrangimento para obter da vítima uma ação, corporal de natureza grave ou morte.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

omissão ou tolerância; Na hipótese de lesão grave, a pena é de reclusão de


z Emprego de violência ou grave ameaça; 7 a 18 anos, além de multa; no caso de morte, reclusão
z Finalidade de obter, para si ou para outrem, inde- de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa.
vida vantagem econômica. Observe que a lesão grave ou a morte deve decor-
rer de violência física, podendo ocorrer a título de
Tutela-se a propriedade, a posse, a integridade dolo ou culpa, afastando-se a qualificadora quando
física e fisiopsíquica, bem como a liberdade pessoal. resultar de grave ameaça.
Trata-se de delito pluriofensivo, porque ofende mais
de um bem jurídico. „ Extorsão qualificada pelo sequestro —
Sobre o sujeito ativo, trata-se de crime comum, sequestro relâmpago
podendo ser praticado por qualquer pessoa. Obser-
ve que o funcionário público também pode cometer Art. 158 [...]
extorsão. A doutrina ilustra a hipótese de o escrivão de § 3º Se o crime é cometido mediante a restrição da
polícia que exige dinheiro de uma pessoa para influen- liberdade da vítima, e essa condição é necessária
ciar o delegado de polícia a realizar o indiciamento. para a obtenção da vantagem econômica, a pena 71
é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da z Extorsão Hedionda
multa; se resulta lesão corporal grave ou morte,
aplicam-se as penas previstas no art. 159, § § 2° e O delito de extorsão só é crime hediondo na situa-
3°, respectivamente. ção do 3º, art. 158, do CP.
Esta hipótese foi introduzida pela Lei n° 13.964, de
Por exemplo, a vítima é conduzida, no seu próprio 2019.
veículo, sendo coagida a percorrer caixas eletrônicos Assim, dispõe o inciso III, art. 1º, da Lei nº 8.072,
para a retirada de dinheiro, revelando ao meliante o de 1990, que é crime hediondo a extorsão qualificada
código secreto de seu cartão bancário magnético.
pela restrição da liberdade da vítima, ocorrência de
O bem jurídico protegido é o patrimônio e a liber-
lesão corporal ou morte.
dade pessoal de movimento, isto é, o direito de ir, vir e
A Lei nº 13.964, de 2019, em vez de manter como
ficar no local livremente escolhido, assemelhando-se,
hediondo o § 2º, art. 158, do CP, e acrescentar o § 3º,
destarte, à extorsão mediante sequestro.
art. 158, do CP, em sua nova redação, só fez menção ao
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Trata-se
§ 3º, do art. 158.
de crime comum.
É ainda crime permanente, viabilizando-se, en- Por exemplo, o agente restringe a liberdade da víti-
quanto não cessar o estado de permanência, a partici- ma, com o emprego de violência à sua pessoa como
pação, a legítima defesa e a prisão em flagrante. forma de obter indevida vantagem econômica.
O sujeito passivo pode ser qualquer pessoa física
ou jurídica. Extorsão Mediante Sequestro
Admite-se a presença de mais de um sujeito passi-
vo. Por exemplo, o extorsionário realiza o sequestro Art. 159 Sequestrar pessoa com o fim de obter, para
relâmpago do dirigente de uma pessoa jurídica, obri- si ou para outrem, qualquer vantagem, como condi-
gando-o a assinar cheques da empresa. ção ou preço do resgate:
Para sua tipificação, exige-se a presença dos ele- Pena - reclusão, de oito a quinze anos..
mentos da extorsão fundamental: constrangimento,
por meio de violência ou grave ameaça, para se obter A extorsão mediante sequestro prevista no art.
da vítima uma ação ou omissão, com o fim de obter, 159, do Código Penal, configurar-se-á quando o agente
para si ou para outrem, indevida vantagem econômica. sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para
Observe que, se a vantagem for absolutamente outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço
impossível de se obter, não há extorsão, respondendo de resgate.
o agente apenas pelo delito de sequestro. Por exem- Neste crime, temos a restrição da liberdade da víti-
plo, sequestro relâmpago para obrigar menor impú- ma (mediante sequestro ou cárcere privado), só que
bere a assinar nota promissória. o agente possui uma finalidade específica (exige-se
Não se esqueça: além do constrangimento, por dolo específico): obter qualquer vantagem (segundo a
meio de violência ou grave ameaça, exige-se ainda a doutrina, deve ser vantagem indevida e de natureza
restrição da liberdade, isto é, um sequestro “relâmpa- patrimonial), como condição ou preço de resgate.
go”, rápido
No roubo, a violência pode ser anterior, concomi- Características da extorsão mediante sequestro:
tante ou posterior à obtenção da vantagem, ao passo
que, na extorsão, o legislador é omisso quanto à vio- z É crime comum — qualquer pessoa pode cometê-lo;
lência posterior, de modo que esta deve ser anterior z É crime complexo (junção de 2 (dois) crimes —
ou concomitante à obtenção da vantagem. extorsão mais sequestro ou cárcere privado;
Para que o sequestro relâmpago fique configura- z É crime permanente, já que sua conduta se protrai
do, o Código Penal exige a restrição da liberdade da (prolonga) — atenção à aplicação da Súmula 711 do
vítima e que essa condição seja necessária para a STF;
obtenção da vantagem econômica.
z É crime formal, que se consuma com a restrição da
Ex.: “A”, criminoso conhecido na cidade, aborda
liberdade, desde que motivada pela obtenção de
“B”, apontando uma arma de fogo para ela, ameaçan-
condição ou preço de resgate.
do-a. Com a intenção de obter indevida vantagem eco-
z Não admite a modalidade culposa;
nômica, “A” a conduz, forçadamente, em um veículo
z Admite tentativa.
de origem duvidosa, ao banco, constrangendo a víti-
ma, que saca R$ 1.000,00 para o autor.
No exemplo dado, ficou configurado o crime de É importante mencionar que o agente deve seques-
extorsão mediante restrição da liberdade. Analise os trar “pessoa”. Caso seja um animal (parece bobo, mas
elementos: já foi cobrado em prova), não haverá o crime de extor-
são mediante sequestro.
z Emprego de grave ameaça; É importante mencionar um entendimento defen-
z Constrangimento à vítima; dido pela doutrina majoritária: no resultado “morte”,
z Objetivo de obter indevida vantagem econômica; não é necessário que a pessoa morta seja a vítima do
z Restrição da liberdade, que foi condição necessá- sequestro, podendo ser qualquer pessoa que mor-
ria para obtenção da vantagem. ra em decorrência da extorsão mediante sequestro.
Assim, por exemplo, se um empregado for ao local
Se, no caso de sequestro relâmpago, ocorrer o resul- combinado com os sequestradores, a pedido de seus
tado morte ou o resultado lesão corporal de natureza patrões, entregar o resgate e for morto pelos autores,
grave, o agente será punido com as mesmas penas apli- a qualificadora será aplicada da mesma forma (obser-
cadas ao crime de extorsão mediante sequestro qualifi- ve que o empregado não é vítima do crime — não foi
72 cada (24 a 30 anos; 16 a 24 anos, respectivamente). sequestrado e nem pagou o resgate).
A pessoa jurídica pode ser vítima de extorsão mediante sequestro, segundo entendimento doutrinário domi-
nante, quando dela for exigida a vantagem correspondente ao resgate.
A extorsão mediante sequestro traz em suas disposições a possibilidade de aplicação do instituto da delação
premiada.
A delação será aplicada no caso de o crime ser cometido em concurso de pessoas, ao concorrente que denun-
ciar à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado.
Neste caso, o concorrente que denunciou terá a pena reduzida de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços).

z Extorsão Mediante Sequestro Qualificada

Art. 159 [...]


§ 1º Se o sequestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o sequestrado é menor de 18 (dezoito) ou maior de 60
(sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha.
Pena - reclusão, de doze a vinte anos.

Há quatro qualificadoras:

„ Se o sequestrado é menor de 18 anos;


„ Se o sequestro dura mais de 24 horas;
„ Se o sequestrado é maior de 60 anos;
„ Se o crime é cometido por quadrilha ou bando.

A primeira qualificadora justifica-se pela maior fragilidade emocional do sequestrado menor de 18 anos, cuja
personalidade se encontra, ainda, em formação.
A segunda qualificadora, o sequestro que dura mais de 24 horas, é um crime a prazo, porque o seu reconheci-
mento depende de um lapso de tempo. Quanto mais duradouro o sequestro, maior o sofrimento da vítima e dos
familiares, daí a razão da qualificadora. Contam-se as horas, minuto a minuto, a partir do início da privação da
liberdade.
A terceira qualificadora foi introduzida pelo Estatuto do Idoso. Ocorre quando o sequestrado é maior de 60
anos. Se no início do sequestro era menor de sessenta, ao atingir esta idade incide a causa de aumento, caso ainda
esteja em poder dos sequestradores. Há tese que afirma que a lei diz maior de 60 anos, motivo pelo qual não se
aplica qualificadora.
A quarta qualificadora, crime cometido por quadrilha ou bando, justifica-se pela maior organização dos
sequestradores, aumentando as chances de êxito no delito. Quadrilha ou bando é a associação estável ou perma-
nente entre três ou mais pessoas, com o intuito de cometer uma série indeterminada de delitos.

z Extorsão mediante sequestro qualificada pelo resultado

Art. 159 [...]


§ 2º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de dezesseis a vinte e quatro anos.
§ 3º Se resulta a morte:
Pena - reclusão, de vinte e quatro a trinta anos.

A extorsão mediante sequestro é qualificada se do fato resulta:

„ Lesão corporal de natureza grave;


„ Morte.

Vejamos uma hipótese: o agente priva a vítima da liberdade, colocando-a sob vigilância em um cativeiro. Em
seguida, visando obter vantagem, exige de familiares da vítima o preço do resgate, mas devido a um impasse com
os familiares, o agente mata a vítima.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

O § 2º, art. 159, do CP, dispõe que, se do fato resulta lesão corporal de natureza grave, a pena cominada é de
reclusão, de 16 a 24 anos.
E o § 3º, art. 159, do CP, dispõe que, se resulta morte, a pena será reclusão de 24 a 30 anos.
A lesão grave e a morte podem ser dolosas ou culposas.
Os delitos de homicídio e lesão corporal, sejam eles dolosos ou culposos, são absorvidos, porque já funcionam
como qualificadoras.
A extorsão mediante sequestro seguida de morte é o crime mais grave do CP, tendo como pena mínima 24 anos
de reclusão.
Não há necessidade de que a morte seja provocada por violência física ou grave ameaça. O suicídio do seques-
trado, por exemplo, é suficiente para o reconhecimento da qualificadora, porque em tal situação é evidente a
culpa dos sequestradores.

73
A EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO SERÁ QUALIFICADA NOS SEGUINTES CASOS:
Se o sequestrado é Se o crime é cometido por
Se o sequestro durar Se do fato resultar
menor de 18 (dezoi- bando ou quadrilha (agora Se do fato resultar
mais de 24 (vinte e qua- lesão corporal de
to) anos ou maior de é associação criminosa — a morte
tro) horas natureza grave
60 (sessenta) anos responde pelos 2 crimes)
Reclusão de 12 a 20 Reclusão de 12 a 20 Reclusão de 16 a Reclusão de 24 a
Reclusão de 12 a 20 anos
anos anos 24 anos 30 anos

Causa de Redução de Pena

Art. 159 [...]


§ 4º Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do
sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.

Para que incida a redução da pena, a delação deve ter sido feita à autoridade, devendo essa expressão ser
tomada em sentido amplo para abranger qualquer agente encarregado do combate à criminalidade, por exemplo,
juiz, autoridade policial etc.
Quanto maior a contribuição, maior a redução da pena.
Trata-se de causa obrigatória de redução de pena.
O art. 13 da Lei nº 9.807, de 1999 dispõe sobre a extinção da punibilidade pelo perdão judicial ao acusado que,
sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que
dessa colaboração tenha resultado cumulativamente a identificação dos demais agentes, a localização da vítima
com sua integridade física preservada e a recuperação total ou parcial do produto do crime.
Presente apenas um desses requisitos, a pena ainda poderá ser reduzida de 1/3 a 2/3, independentemente da
primariedade do réu, por força do art. 14, da Lei nº 9.807, de 1999.

Extorsão Indireta

Art. 160 Exigir ou receber, como garantia de dívida, abusando da situação de alguém, documento que pode dar
causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

A extorsão indireta constitui forma mais branda de extorsão, que se configurará quando o agente exigir ou
receber, como garantia de dívida, abusando da situação de alguém, documento que pode dar causa a procedimento
criminal contra a vítima ou contra terceiro.
Como dito, é uma forma mais branda de extorsão, já que tem como pena a reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos,
enquanto a extorsão, em sua modalidade simples, tem como pena a reclusão de 4 (quatro) a 10 (anos).
É um crime que exige dolo específico, já que o agente pratica os verbos descritos no tipo penal (exigir ou rece-
ber) como garantia de dívida.
É necessário que o agente abuse da condição de alguém, assim, por exemplo, suponha que um agiota, apro-
veitando-se da condição de desespero pela qual se passa aquele que solicita um empréstimo, já que o filho deste
se encontra internado em estado grave e ele precisa do dinheiro para pagar o tratamento, exija documento que
possa dar causa a procedimento criminal — pronto, teremos configurada a extorsão indireta, já que o agiota abu-
sou da condição da vítima.
No verbo exigir, este crime é formal, consumando-se com a exigência do documento.
Já no verbo receber, é crime material, consumando-se com o efetivo recebimento do documento.
É admitida a tentativa, já que pode ter seu iter criminis fracionado.
É crime comum, já que não se exige qualquer condição especial do sujeito.

USURPAÇÃO

Alteração de Limites

Art. 161 Suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para apropriar-
-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia:
Pena - detenção, de um a seis meses, e multa.

O objetivo da lei é resguardar a posse e a propriedade dos bens imóveis.


Esse tipo penal possui duas condutas típicas alternativas:

z Supressão, ou seja, a total retirada do marco divisório;


z Deslocamento do marco divisório, afastando-o do local correto, de modo a aumentar a área do agente.

É necessário que o agente tenha intenção de apropriar-se, no todo ou em parte, da propriedade alheia, por meio da
supressão ou deslocamento do marco divisório.
Temos, por exemplo, a hipótese que não configura crime, o fato de um agricultor retirar a cerca que divide as
74 terras com outro proprietário apenas para reformá-la.
Trata-se de crime próprio, somente podendo ser Nesse caso, o fato é atípico. Não obstante, o § 1º, art.
praticado pelo vizinho do imóvel, quer na zona urba- 1.210, do Código Civil, permite que o dono retome a
na, quer na rural. posse, desde que o faça imediatamente, por meio do
Sendo assim, o sujeito passivo desse tipo penal só chamado desforço imediato.
pode ser o vizinho, dono ou possuidor do imóvel. Se, em outra hipótese, logo após a invasão pacífica,
Consuma-se no exato instante em que o agente o invasor empregar violência para se manter na posse
suprime ou desloca o marco divisório, ainda que a quando o legítimo proprietário tentava retomá-la pelo
vítima posteriormente perceba o ocorrido e retome a desforço imediato, haverá a configuração do delito.
parte de que foi tolhida. O crime só existe se a invasão se dá com o fim espe-
É possível a tentativa, quando o agente é flagrado cífico de esbulho possessório, ou seja, a retirada forçada
iniciando supressão ou deslocamento e é impedido de do legítimo possuidor, desde que o agente queira excluir
prosseguir. Se já o fez por completo, conforme já men- a posse da vítima para passar a exercê-la ele próprio.
cionado, o crime está consumado, ainda que a vítima O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, exceto o
retome posteriormente a parte a que faz jus. dono.
Trata-se de crime comum.
O dono que invade imóvel alugado não incorre no
Usurpação de Águas
tipo penal em análise, que exige expressamente que o
bem seja alheio.
Art. 161 [...]
Dependendo da hipótese, poderá incorrer em cri-
§ 1º Na mesma pena incorre quem:
me de violação de domicílio (art. 150) ou retirada de
I - desvia ou represa, em proveito próprio ou de
coisa própria do poder de terceiro (art. 346, do CP).
outrem, águas alheias;
Já o sujeito passivo é o dono ou possuidor do imó-
vel invadido.
Neste delito, a lei resguarda as águas públicas Consuma-se no momento da invasão.
ou particulares que passem por determinado local, É possível tentativa quando a invasão não se aper-
evitando que o dono do terreno sofra prejuízo caso feiçoe em razão da oposição apresentada pelo dono,
alguém queira desviar o seu curso ou represá-las, sem possuidor ou por terceiro.
autorização para tanto. Observe que, se o agente comete o esbulho com
Exige-se que sejam águas correntes, cujo curso seja emprego de violência, responde também pelas lesões
desviado ou represado pelo agente, alterando, portan- corporais causadas, ainda que leves, nos termos do § 2º,
to, seu fluxo pela propriedade. art. 161, do CP, e as penas serão somadas.

Dica Art. 161 [...]


§ 2º Se o agente usa de violência, incorre também
Não configura crime de usurpação de águas, na pena a esta cominada.
mas crime de furto, quando se trata de água reti- § 3º Se a propriedade é particular, e não há emprego
rada de água represada pelo dono para criação de violência, somente se procede mediante queixa.
de peixes.
A ação penal será, em regra, pública incondicio-
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois, tra- nada, porém, caso não ocorra o emprego de violên-
ta-se de crime comum. cia, a ação penal passa a ser privada e só se procede
O sujeito passivo, por sua vez, é a pessoa que pode mediante queixa.
sofrer dano em decorrência do desvio ou represamento.
Consuma-se o crime no instante em que o agente Supressão ou Alteração de Marca em Animais
efetua o desvio ou represamento, ainda que não obte-
nha a vantagem em proveito próprio ou alheio a que o Art. 162 Suprimir ou alterar, indevidamente, em
gado ou rebanho alheio, marca ou sinal indicativo
texto legal se refere. A tentativa é possível.
de propriedade:
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa.
Esbulho Possessório
Este crime tutela a propriedade e a posse dos ani-
Art. 161 [...] mais semoventes.
§ 1º Na mesma pena incorre quem: [...]
Para a prática deste crime é necessário que não
II - invade, com violência a pessoa ou grave amea-
tenha havido prévio furto ou apropriação indébita
ça, ou mediante concurso de mais de duas pessoas,
dos animais, pois, nesses casos, o agente só será puni-
terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

do pela conduta anterior, sendo a supressão ou altera-


possessório.
ção da marca impunível.
A conduta típica consiste em apagar ou modificar
Veja que o crime de esbulho possessório tem por
o sinal indicativo de propriedade em gado ou rebanho
objeto jurídico o patrimônio, no tocante à propriedade
alheios.
e, especialmente, à posse legítima de um imóvel, bem
como a integridade física e a liberdade individual da Quando a lei se refere a gado, está protegendo a
pessoa humana atingida pela conduta criminosa. propriedade de animais de grande porte, como bois
Pressupõe-se, neste crime, a invasão de proprieda- ou cavalos, e quando se refere a rebanho, o faz em
de imóvel alheia, edificada ou não, desde que o fato se relação a animais de porte menor, como porcos, ove-
dê mediante emprego de violência ou grave ameaça lhas, cabras etc.
a pessoa, bem como mediante concurso de duas ou Marcas são feitas por ferro em brasa ou elementos
mais pessoas. químicos no couro do animal.
É possível que o agente invada a propriedade Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive
alheia sozinho ou em concurso com apenas mais uma quem possui animal que pertence a terceiro.
pessoa e sem emprego de violência ou grave ameaça. O sujeito passivo é dono do animal. 75
Consuma-se com a simples supressão ou alteração Caso o crime de dano seja praticado com violên-
da marca ou sinal, ainda que se dê apenas em relação cia à pessoa (forma qualificada vista anteriormente),
a um animal. o agente responderá pelo crime de dano em concurso
É possível a tentativa quando o agente não conse- com a pena correspondente à violência.
gue concretizar a remarcação iniciada, pela repentina Das hipóteses vistas, com exceção da qualificado-
chegada de alguém ao local, ou até mesmo quando ra por motivo egoístico ou com prejuízo para a víti-
concretiza a remarcação, porém a faz de tal forma ma (ação penal privada), a ação penal será pública
que continua sendo possível identificar a marca do incondicionada.
verdadeiro dono.
Introdução ou Abandono de Animais em Propriedade
DANO Alheia

Art. 163 Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa Art. 164 Introduzir ou deixar animais em proprie-
alheia: dade alheia, sem consentimento de quem de direito,
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. desde que o fato resulte prejuízo:
Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, ou
O crime de dano previsto no art. 163, do CP, poderá multa.
ser praticado mediante a execução das seguintes con-
dutas: destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia. Dispõe o art. 164, do CP, que é crime a conduta de
Verbos do crime de dano (observe o que a doutrina introduzir ou deixar animais em propriedade alheia,
estabelece sobre cada um dos verbos): sem consentimento de quem de direito, desde que do
fato resulte prejuízo: pena — detenção, de 15 dias a 6
z Destruir – dano total da coisa alheia; meses, ou multa.
z Inutilizar – dano parcial, mas que torna a coisa
Tutela-se a propriedade e a posse do imóvel contra
alheia sem utilidade;
o dano causado por animais.
z Deteriorar – dano parcial da coisa alheia, que fica
O objetivo primordial da lei é a proteção da pro-
estragada, por exemplo.
priedade rural, onde o delito é comumente cometido.
Todavia, estende-se também a tutelar a propriedade
Tutela-se a propriedade e a posse.
urbana, tendo em vista que a lei não restringiu a exis-
Trata-se de crime doloso.
tência do delito à propriedade rural.
O tipo penal fala em coisa alheia, sem exigir que
Trata-se de crime comum, pois pode ser cometido
seja móvel. Portanto, caso o agente destrua, por exem-
plo, uma casa, praticará o crime de dano. por qualquer pessoa.
Características do crime de dano: Sujeitos passivos são o proprietário e o possuidor,
titulares do patrimônio ofendido.
z Crime comum — pode ser praticado por qualquer Consuma-se com a danificação total ou parcial da
pessoa; propriedade alheia, isto é, com o efetivo prejuízo.
z Não admite a forma culposa. O dano culposo cons- Este crime somente se procede mediante queixa.
titui ilícito de ordem civil;
z É crime material, que exige a ocorrência do resul- Dano em Coisa de Valor Artístico, Arqueológico ou
tado (destruição, inutilização ou deterioração). Histórico

Consuma-se quando o agente destrói, inutiliza ou O proprietário comete o delito de dano ambiental,
deteriora a coisa. previsto no art. 62, da Lei nº 9.605, de 1998, e não do
A danificação parcial constitui crime consumado, art. 165, do CP, que foi revogado pela citada lei, quan-
enquadrando-se no verbo deteriorar. do se tratar de coisa de valor artístico, arqueológico,
histórico ou outro bem especialmente protegido por
Dano Qualificado lei, ato administrativo ou decisão judicial, pois nesse
tipo penal não se exige que a coisa seja alheia.
O dano será praticado na modalidade qualificada
se for cometido em uma das hipóteses a seguir: Alteração de Local Especialmente Protegido

Art. 163 [...] Revogado pelo art. 63, da Lei nº 9.605, de 1998, que
Parágrafo único. Se o crime é cometido: dispõe ser crime a conduta de alterar o aspecto ou
I - com violência à pessoa ou grave ameaça; estrutura de edificação ou local especialmente prote-
II - com emprego de substância inflamável ou explo- gido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em
siva, se o fato não constitui crime mais grave
razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico,
III - contra o patrimônio da União, de Estado, do
artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico,
Distrito Federal, de Município ou de autarquia,
fundação pública, empresa pública, sociedade de etnográfico ou monumental, sem autorização da auto-
economia mista ou empresa concessionária de ser- ridade competente ou em desacordo com a concedida.
viços públicos; A pena é de reclusão, de um a três anos, e multa.
IV - por motivo egoístico ou com prejuízo conside-
rável para a vítima: Ação Penal
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa,
além da pena correspondente à violência. Art. 167 Nos casos do art. 163, do inciso IV do
seu parágrafo e do art. 164, somente se procede
76 mediante queixa.
A ação penal é privada no dano simples (caput Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
do art. 163, do CP) e no dano qualificado por motivo
egoístico ou considerável prejuízo para a vítima (inci- O crime de apropriação indébita previdenciária
so IV, § único, art. 163, do CP). Nas demais formas de é um crime próprio, pois só pode ser praticado pelo
dano qualificado, a ação é pública incondicionada. substituto tributário, que é a pessoa que recolhe as
contribuições sociais em nome do INSS para depois
APROPRIAÇÃO INDÉBITA repassá-las.
No caso do contribuinte individual, ele é o res-
Art. 168 Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que ponsável por esse desconto das contribuições e pelo
tem a posse ou a detenção: repasse ao INSS, de modo que é ele que irá responder
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. pelo crime.
No caso de sociedade, para fins penais, o sujeito
O crime de apropriação indébita está previsto no ativo é a pessoa física que no âmbito da empresa tem
art. 168, do Código Penal. Este crime irá se configurar o poder de fato para decidir se irá ou não sonegar a
quando o agente se apropriar de coisa alheia móvel de contribuição arrecadada.
que tem a posse ou a detenção. Tutela-se o patrimônio do INSS, que é uma autarquia
Neste crime, exige-se que a coisa alheia seja móvel. federal, de modo que a competência é da Justiça Federal,
Para que você compreenda a apropriação indébi- conforme o inciso IV, art. 109, da Constituição Federal.
ta, é necessário saber que o agente já tem a posse ou Logo, o sujeito passivo é o INSS.
a detenção da coisa, passando, posteriormente, a agir
como se fosse dono da coisa.
Não se deve confundir a apropriação indébita com Importante!
o crime de estelionato. Veja a diferença:
Conduta principal: ficará configurada quando o
z Apropriação Indébita: o agente recebe a coisa agente deixar de repassar à previdência social
de boa-fé, depois, muda seu ânimo e passa a agir as contribuições recolhidas dos contribuintes,
como se fosse dono da coisa (passa a ter má-fé); no prazo e forma legal ou convencional.
z Estelionato: o agente já recebe a coisa de má-fé,
com a intenção de ficar com ela desde o início.
Observe que o tipo penal principal é praticado na
modalidade omissiva, deixando o agente de praticar
A apropriação indébita é crime que decorre de
uma conduta que deveria (repassar à previdência as
uma relação de confiança entre o autor e a vítima.
contribuições recolhidas após reter os valores).
Este entrega a coisa móvel ao agente, devido à con-
Condutas equiparadas:
fiança que deposita nele.
O agente recebe a coisa com boa intenção, mas,
Art. 168-A [...]
depois (parte da doutrina chama de dolo subsequen-
§ 1° Nas mesmas penas incorre quem deixar de:
te), altera sua intenção, apropria-se da coisa e passa a I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra
agir como dono dela. importância destinada à previdência social que
Veja as principais características da apropriação tenha sido descontada de pagamento efetuado a
indébita: segurados, a terceiros ou arrecadada do público;
II – recolher contribuições devidas à previdência
z É crime comum, que pode ser praticado por qual- social que tenham integrado despesas contábeis ou
quer pessoa; custos relativos à venda de produtos ou à prestação
z Não admite a forma culposa; de serviços;
z Não admite tentativa, conforme doutrina majoritá- III - pagar benefício devido a segurado, quando as
ria, tratando-se de crime unissubsistente, ou seja, respectivas cotas ou valores já tiverem sido reem-
é o conjunto de um só ato, a realização da condu- bolsados à empresa pela previdência social.
ta esgota a concretização do delito, por exemplo,
apropriar-se de objeto de valor; Trata-se de norma penal em branco, complemen-
z É crime material, que se consuma quando o agente tada em diversos dispositivos pela lei previdenciária
inverte a posse da coisa alheia móvel. correspondente.
Veja as características do crime de apropriação
Aumento de Pena indébita previdenciária:
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Art. 168 [...] z É crime omissivo, como dito, já que o agente não
§ 1º A pena é aumentada de um terço, quando o pratica a conduta que se espera dele (repassar);
agente recebeu a coisa: z Não admite a modalidade culposa;
I - em depósito necessário; z Deverá ser praticado de forma dolosa. Segundo o
II - na qualidade de tutor, curador, síndico, liquida- STF, não é necessário dolo específico (especial fim
tário, inventariante, testamenteiro ou depositário de agir);
judicial; z Não admite tentativa.
III - em razão de ofício, emprego ou profissão.
O entendimento majoritário na doutrina é o de que
Apropriação Indébita Previdenciária a apropriação indébita previdenciária é crime formal
e, por isso, dispensa-se o enriquecimento indevido por
Art. 168-A Deixar de repassar à previdência social parte do agente ou o efetivo prejuízo ao erário.
as contribuições recolhidas dos contribuintes, no
prazo e forma legal ou convencional:
77
Contudo, o Supremo Tribunal Federal decidiu que faculdade atribuída ao juiz de deixar de aplicar a pena
o crime de apropriação indébita previdenciária é ou de aplicar somente a pena de multa não se apli-
material, pois, quando o agente omitiu o repasse, con- ca aos casos de parcelamento de contribuições cujo
figurou-se o enriquecimento indevido e o consequen- valor, inclusive dos acessórios, seja superior àquele
te prejuízo ao Erário. estabelecido, administrativamente, como sendo míni-
Essa decisão corrobora com o entendimento exa- mo para ajuizamento de suas execuções fiscais.
rado na Súmula Vinculante nº 24. Faculta-se ao juiz:

Súmula Vinculante nº 24 Na linha da jurisprudên- z Deixar de aplicar a pena (perdão judicial);


cia deste Tribunal Superior, o crime de apropriação z Aplicar somente a pena de multa (crime
indébita previdenciária, previsto no art. 168-A, privilegiado).
ostenta natureza de delito material. Portanto, o
momento consumativo do delito em tela correspon-
Essas situações poderão ocorrer se o agente for
de à data da constituição definitiva do crédito tri-
primário e de bons antecedentes, desde que:
butário, com o exaurimento da via administrativa
(ut, (RHC 36.704/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER,
Quinta Turma, DJe 26/02/2016). Nos termos do art. Art. 168-A [...]
111, I, do CP, este é o termo inicial da contagem do § 3° É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou
prazo prescricional” (AgRg no REsp  1.644.719/SP, aplicar somente a de multa se o agente for primário
DJe 31/05/2017). e de bons antecedentes, desde que:
I – tenha promovido, após o início da ação fiscal
e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da
Importante estudar também o tema do princípio
contribuição social previdenciária, inclusive aces-
da insignificância no crime de apropriação indébita
sórios; ou
previdenciária.
II – o valor das contribuições devidas, inclusive
Neste caso, a Portaria nº 296, de 2007 da Previ-
acessórios, seja igual ou inferior àquele estabele-
dência Social diz que o INSS não executa, não move, cido pela previdência social, administrativamente,
ação de execução fiscal por dívida de até R$ 10 mil, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas
de modo que, se o indivíduo pagasse débitos até esse execuções fiscais.
valor, a punibilidade estaria extinta pelo perdão judi-
cial, obviamente, desde que ele seja primário e de De acordo com a Procuradoria-Geral da Fazenda
bons antecedentes. Nacional, o valor mínimo para ajuizar execuções fis-
Não se trata de aplicação do princípio da insigni- cais por débito para com o fisco é de R$ 20 mil.
ficância, porque a dívida tem um valor significativo,
mas se o valor for irrisório, por exemplo, R$ 100, R$
Apropriação de Coisa Havida por Erro, Caso Fortuito
200 ou R$ 300, ele poderá ser absolvido pelo princípio
ou Força da Natureza
da insignificância.
Quando o valor da dívida atinge uma cifra razoá-
Art. 169 Apropriar-se alguém de coisa alheia vin-
vel de até R$ 10 mil, mas o INSS diz que não é preciso da ao seu poder por erro, caso fortuito ou força da
mover a execução fiscal, nesse caso o réu poderá rece- natureza:
ber o perdão judicial ou então ser condenado apenas Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.
na pena de multa, conforme o § 3º, art. 168, do CP.
A pena deste crime poderá ser extinta (extinção da Neste crime, a apropriação se dá não devido à rela-
punibilidade), caso o agente, espontaneamente, decla- ção de confiança existente entre autor e vítima, mas,
re, confesse e efetue o pagamento das contribuições, sim, porque a coisa chegou ao poder do agente por
importâncias ou valores e preste as informações devi- erro, caso fortuito ou força da natureza.
das à previdência social, na forma definida em lei ou
Ex.: “A” recebe em sua casa, por erro do entregador
regulamento, antes do início da ação fiscal.
de uma loja, uma televisão de 50 polegadas. O agente
se apropria da coisa havida por erro.
Art. 168-A [...]
Caso “A” tenha recebido a coisa de boa-fé, mas,
§ 2° É extinta a punibilidade se o agente, esponta-
neamente, declara, confessa e efetua o pagamento
posteriormente, altere a posse da coisa, apropriando-
das contribuições, importâncias ou valores e presta -se dela, irá cometer o crime de apropriação de coisa
as informações devidas à previdência social, na for- havida por erro, caso fortuito ou força da natureza.
ma definida em lei ou regulamento, antes do início Entretanto, para configuração do delito, o agente
da ação fiscal. não pode ter induzido nem mantido a pessoa em erro
no momento do recebimento da coisa, caso contrário,
Apesar de o Código Penal estabelecer que a condu- tendo em vista a fraude, haverá o crime de estelionato.
ta do agente, para que sua punibilidade seja extinta, Na apropriação de coisa havida por erro, ao tempo
seja praticada antes do início da ação fiscal, o STF e do recebimento da coisa, o agente procede de boa-fé,
o STJ têm admitido a aplicação da exclusão da puni- não percebe o erro. Este é constatado após o recebi-
bilidade com o pagamento efetuado a qualquer tem- mento da coisa.
po, desde que antes do trânsito em julgado (sentença Necessário, portanto, o dolo subsequente, isto é, o
definitiva). agente recebe, identifica que não lhe pertence, mas
Para encerrarmos o crime de apropriação indébita fica com o patrimônio.
previdenciária, vamos verificar uma hipótese de per- O erro deve ser alheio, isto é, de quem concede a
dão judicial e de crime privilegiado. disponibilidade da coisa ao sujeito ativo. É necessário
A Lei nº 13.606, de 2018, lei bastante atual, diga-se que o agente não perceba o aludido erro.
de passagem (importante atentar-se a isso), acrescen- Há uma duplicidade de erros, de quem entrega e
78 tou dispositivo ao Código Penal que estabelece que a de quem recebe a coisa.
Quanto à distinção entre caso fortuito e força da O que dizer sobre “achado não é roubado”, ditado
natureza, uma parcela significativa da doutrina consi- popular muito conhecido?
dera as expressões equivalentes. Mesmo assim, vamos O crime de apropriação de coisa achada não é cos-
estabelecer uma diferenciação. tuma ser mencionado, mas existe.
Força da natureza é o acontecimento de eventos Este crime será aplicado a quem achar coisa alheia
físicos ou naturais, de índole ininteligente, como o gra- perdida e dela se apropriar, total ou parcialmente,
nizo, o raio, a inundação, a tempestade e o terremoto. deixando de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor
Caso fortuito deriva de fatos humanos, como a gre- ou de entregá-la à autoridade competente, dentro do
ve, o motim, a guerra, a queda de um avião etc. prazo de 15 (quinze) dias.
No delito em apreço, a coisa chega ao agente por Trata-se de crime a prazo, que é aquele que, para
meio de um evento imprevisível. sua consumação, exige que transcorra determinado
Exemplo clássico: um vendaval lança as roupas do período (15 dias).
varal do vizinho ao quintal da casa de B e este apro- Sujeito ativo é aquele que acha a coisa perdida.
pria-se delas. Ou uma mala despenca de um avião, Trata-se de crime próprio, pois é praticado por
caindo na chácara de B, que dela se apropria. Ainda, aquele que acha a coisa perdida.
o animal de uma fazenda passa para a fazenda de B, Na hipótese de o sujeito ativo emprestar a coisa
que dele se apropria. à uma outra pessoa, vindo esta a apropriar-se, não
Observe que a coisa não é entregue pela vítima ao cometerá o delito em apreço, e sim o crime de apro-
agente, originando-se o apossamento de um aconteci- priação indébita, previsto no art. 168, do CP.
mento imprevisível. Se, por outro lado, o proprietário achar a própria
Este crime não admite a modalidade culposa, coisa e deixar de restituí-la ao legítimo possuidor, que
podendo ser praticado apenas a título de dolo. a havia perdido, também não se configura o delito,
Trata-se de crime comum, podendo ser praticado
porque o tipo penal exige que a coisa seja alheia.
por qualquer pessoa.
Sujeito passivo é o proprietário ou possuidor.
O Código Penal apresenta duas hipóteses asseme-
O objeto material é coisa alheia perdida.
lhadas, punidas com a mesma pena: a apropriação de
Trata-se de elemento normativo do tipo, cujo signi-
tesouro e a apropriação de coisa achada.
ficado requer um juízo de valor do magistrado.
Coisa perdida é a que se encontra em lugar públi-
Apropriação de Tesouro
co ou de uso público em circunstâncias indicativas do
extravio, por exemplo, uma carteira exposta no meio
Art. 169 [...]
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa. [...]
da rua.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre: No caso de coisa abandonada (res derelicta) ou
I - quem acha tesouro em prédio alheio e se apro- coisa sem dono (res nullius), não haverá crime algum
pria, no todo ou em parte, da quota a que tem direi- por parte de quem apropriar-se. Este torna-se dono da
to o proprietário do prédio; coisa.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, consistente
Irá praticar este crime o agente que achar tesouro na vontade de apropriar-se da coisa.
em prédio alheio e se apropriar, no todo ou em parte, Quanto à consumação, ocorre quando o agente
da quota a que tem direito o proprietário do prédio. deixa de restituir a coisa ao dono ou legítimo possui-
Aqui, pune-se a conduta do indivíduo que acha dor ou de entregá-la à autoridade competente, dentro
tesouro em prédio que pertence a outra pessoa e se do prazo de quinze dias.
apropria da quota-parte que o proprietário do prédio O crime de apropriação de coisa achada poderá se
tem direito, de acordo com o Código Civil, que estabe- configurar:
lece que o tesouro deve ser dividido igualmente entre
aquele que achou e entre o proprietário do local em z Se o agente deixa de restituir a coisa achada ao
que ele foi achado. dono ou legítimo possuidor;
O Código Civil conceitua tesouro como depósito z Se o agente deixa de entregar a coisa achada à
antigo de coisas preciosas, oculto e de cujo dono não autoridade competente.
haja memória.
O tipo penal não se caracteriza com o verbo Por fim, o Código Penal estabelece a possibilida-
“achar”. Tome cuidado. Aquele que acha tesouro não de de se aplicar aos crimes previstos no capítulo da
comete crime algum. A conduta criminosa encontra-se apropriação indébita os institutos aplicáveis ao furto
no verbo “apropriar-se”, quando o agente se apropria privilegiado.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

da parte a que tem direito o proprietário do prédio. Logo:


Para que este crime se configure, é necessário que
o tesouro tenha sido localizado em prédio que possua z Se o criminoso é primário;
proprietário. z Se é de pequeno valor a coisa.

Apropriação de Coisa Achada O juiz poderá:


Art. 169 [...]
z Substituir a pena de reclusão pela pena de
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa. [...]
Parágrafo único. Na mesma pena incorre:
detenção;
II - quem acha coisa alheia perdida e dela se apro- z Diminuir a pena de 1/3 a 2/3;
pria, total ou parcialmente, deixando de restituí-la z Aplicar somente a pena de multa.
ao dono ou legítimo possuidor ou de entregá-la à
autoridade competente, dentro no prazo de quinze
dias. 79
ESTELIONATO E OUTRAS FRAUDES Este crime está previsto no inciso I, § 2º, art. 171,
do CP, ou seja, o agente vende, permuta, dá em paga-
Estelionato mento, em locação ou em garantia coisa alheia como
própria — disposição de coisa alheia como própria. O
Art. 171 Obter, para si ou para outrem, vantagem agente, neste crime, faz com que coisa alheia se passe
ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo como dele, enganando outrem.
alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qual- Os verbos previstos no tipo são: vender, permutar
quer outro meio fraudulento: (trocar), dar como pagamento, locação ou garantia.
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de qui-
nhentos mil réis a dez contos de réis. z Vender: a venda é o contrato pelo qual as partes
se obrigam a dar uma coisa por dinheiro. Aperfei-
O crime de estelionato (art. 171, do CP) será prati- çoa-se com o acordo de vontades acerca da coisa
cado quando o agente obtiver, para si ou para outrem, e do preço, independentemente da tradição. Esta
vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou é necessária para a aquisição da propriedade, e
mantendo alguém em erro, mediante artifício ardil não para a formação do contrato. Consuma-se o
ou qualquer outro meio fraudulento. crime com a obtenção da vantagem e causação do
O agente altera, de modo consciente, a data de óbi- prejuízo;
to de seu genitor, induzindo o tabelião em erro para z Permutar (trocar): a permuta ou troca é o contra-
não pagar multa em procedimento extrajudicial de to pelo qual as partes assumem a obrigação de dar
inventário (vantagem econômica). uma coisa por outra. Aperfeiçoa-se também com
Observe que o crime fala em vantagem ilícita (segun- o simples acordo de vontades, independentemente
do a doutrina majoritária, deve ser vantagem de natu- da entrega do bem. Consuma-se o crime quando a
reza patrimonial), podendo ser coisa móvel ou imóvel. vítima entrega ao estelionatário a coisa, pois, nes-
A vantagem ilícita é obtida pelo agente, que se se momento, opera-se o prejuízo e a obtenção da
utiliza de artificio ardil (método de enganar) ou qual- vantagem;
quer outro tipo de fraude. z Dar em pagamento: a dação em pagamento con-
Ele induz a vítima em erro (ela não estava em erro siste na extinção de uma obrigação vencida pelo
e o agente o faz) ou mantém a vítima em erro (ela fato de o credor consentir em receber prestação
estava em erro, o agente, de má-fé, faz com que ela diversa da que lhe é devida. Consuma-se o crime
permaneça). quando o estelionatário obtém a quitação da dívi-
No estelionato, a vítima, devido ao fato de ter sido da, mediante a promessa de entregar ao seu cre-
enganada, colabora com o agente, entregando-lhe, de dor uma certa coisa;
alguma forma, a vantagem. z Locação: a locação é o contrato pelo qual uma das
Esta condição, inclusive, é fator que serve para partes se obriga a ceder a outra, por tempo deter-
diferenciar o estelionato de outros tipos penais que minado ou não, o uso e gozo de coisa infungível,
com ele possam se confundir. mediante certa retribuição. Consuma-se o crime
Características do crime de estelionato: quando o estelionatário recebe o sinal ou o paga-
mento do primeiro aluguel;
z Crime comum: não se exige características especí- z Garantia: a garantia compreende o penhor, a
ficas do sujeito ativo; hipoteca e a anticrese. Consuma-se o crime quan-
z Crime material: o crime consuma-se com a ocor- do o estelionatário obtém o empréstimo, dando em
rência do resultado obtenção da vantagem ilícita, garantia uma coisa alheia.
acarretando prejuízo a terceiro;
z Não admite a forma culposa: só se pratica a título Alienação ou Oneração Fraudulenta de Coisa Própria
de dolo;
z Admite a modalidade tentada. Art. 171 [...]
§ 2º [...]
O estelionato privilegiado é aquele em que o II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garan-
agente é primário e é de pequeno valor o prejuízo. tia coisa própria inalienável, gravada de ônus ou
Poderá o juiz, neste caso, substituir a pena de reclusão litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro,
pela pena de detenção, diminuir a pena de 1/3 a 2/3 ou mediante pagamento em prestações, silenciando
aplicar somente a pena de multa. sobre qualquer dessas circunstâncias;

Art. 171 [...] Este crime está previsto no inciso II, § 2º, art. 171,
§ 1º Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor do CP, que consiste no agente que vende, permuta,
o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena conforme o dá em pagamento ou em garantia coisa própria ina-
disposto no art. 155, § 2º. lienável, gravada de ônus ou litigiosa, ou imóvel que
prometeu vender a terceiro, mediante pagamento
Vejamos as formas equiparadas do crime de este- em prestações, silenciando sobre qualquer dessas
lionato, que serão submetidas às mesmas penas. circunstâncias.
Temos que destacar que o objeto material do crime
Disposição de Coisa Alheia como Própria pode ser bem móvel ou imóvel.
Vejamos:
Art. 171 [...] Coisa própria inalienável — os bens inalienáveis
§ 2º Nas mesmas penas incorre quem: são: bem de família do Código Civil, bem doado com
I - vende, permuta, dá em pagamento, em locação cláusula de inalienabilidade e bem deixado por testa-
80 ou em garantia coisa alheia como própria; mento com cláusula de inalienabilidade.
Coisa própria gravada de ônus, por exemplo: pe- O crime de fraude para recebimento de indeniza-
nhor, hipoteca, anticrese, enfiteuse, servidão, superfí- ção ou valor de seguro, segundo a doutrina majoritá-
cie, uso, usufruto, habitação e superfície. ria, é crime formal, que se consuma com a prática da
Coisa própria litigiosa: bem sub-judice é aquele conduta, independentemente de o agente conseguir
em que há uma ação judicial acerca da titularidade da ou não receber os valores referentes a indenização ou
propriedade. valor de seguro.
Imóvel próprio que prometeu vender a terceiro, Lembre-se de que o agente não é punido penal-
mediante pagamento em prestações. mente por causar mal somente a si mesmo, sendo
Observa-se que a lei é omissa em relação a imóvel assim, caso ele se lesione sem o fim de receber seguro,
que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento ele não será sujeito passivo do crime.
à vista. Também é omissa sobre o compromisso que O sujeito passivo será a seguradora.
recai sobre bens móveis, ainda que em prestações.
Fraude no Pagamento por Meio de Cheque
Defraudação de Penhor
Art. 171 [...]
§ 2º [...]
Art. 171 [...]
VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos
§ 2º [...]
em poder do sacado, ou lhe frustra o pagamento.
III - defrauda, mediante alienação não consentida
pelo credor ou por outro modo, a garantia pigno-
Leve em consideração que, para configuração des-
ratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;
ta forma equiparada de estelionato, é necessário que
o agente saiba desde o início que não dispõe de fundos
Este crime está previsto no inciso III, § 2º, art. 171,
para cobrir o cheque, não se englobando nesta moda-
do CP, e consiste na conduta de o agente defraudar,
lidade criminosa os casos de não pagamento de che-
mediante alienação não consentida pelo credor ou que por motivos cotidianos (sem má-fé).
por outro modo, a garantia pignoratícia, quando tem É importante conhecer duas súmulas do STF, refe-
a posse do objeto empenhado. rentes ao crime de fraude no pagamento por meio de
É essencial a fraude, isto é, a falta de autorização cheque.
do credor. O consentimento deste exclui o crime.
A consumação ocorre com a efetiva defraudação, Súmula n° 521 O foro competente para o proces-
isto é, com a alienação, ocultação, abandono etc. da so e julgamento dos crimes de estelionato, sob a
coisa empenhada. modalidade da emissão dolosa de cheque sem pro-
A defraudação parcial é suficiente para a consu- visão de fundos, é o local onde se deu a recusa do
mação, porque diminui a garantia do credor, gerando pagamento pelo sacado.
prejuízo. Súmula n° 554 O pagamento de cheque emitido
sem provisão de fundos, após o recebimento da
Fraude na Entrega de Coisa denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação
penal.
Art. 171 [...]
§ 2º [...] Podemos concluir, pela leitura da Súmula n° 554,
IV - defrauda substância, qualidade ou quantidade que se o agente pagar os valores referentes ao cheque
de coisa que deve entregar a alguém; emitido sem fundos antes do recebimento da denún-
cia, será impedido o início da ação penal.
Este crime está previsto inciso IV, § 2º, art. 171, do Vejamos também a Súmula n° 17 do STJ: “Quando o
falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade
CP, em que o agente defrauda substância, qualidade
lesiva, é por este absorvido”.
ou quantidade, de coisa que deve entregar a alguém.
Entenda da seguinte forma: se o uso do documento
Vejamos, o tipo penal faz a seguinte alusão: “coisa
falso se exaurir (extinguir) na prática do estelionato,
que deve entregar a alguém”, pressupondo-se, portan-
este crime absorverá aquele.
to, uma obrigação de prestação de dar entre as partes.
Se não se exaurir, o agente responderá pelos dois
A obrigação deve ser a título oneroso. Se for gratui- crimes em concurso formal.
ta, como o comodato e a doação, desaparece o delito, Observe as causas de aumento de pena previstas
porque não há prejuízo ao credor. Nos negócios gra- no Código Penal para o estelionato:
tuitos, não se pode reclamar sequer vício redibitório,
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

de modo que o devedor não é sancionado nem na Art. 171 [...]


esfera cível. § 3º A pena aumenta-se de um terço, se o crime é
Se não houver uma obrigação antecedente, a cometido em detrimento de entidade de direito
entrega de coisa defraudada pode configurar o delito público ou de instituto de economia popular, assis-
do caput do art. 171. tência social ou beneficência.

Fraude para Recebimento de Indenização ou Valor de A pena será aumentada de 1/3 (um terço) se o cri-
Seguro me é praticado:

Art. 171 [...] z Em detrimento de entidade de direito público


§ 2º [...] ou de instituto de economia popular, assistência
V - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa social ou beneficência. É chamado de estelionato
própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou previdenciário.
agrava as da lesão ou doença, com o intuito de
haver indenização ou valor de seguro 81
A pena será aplicada em dobro: O crime consuma-se independentemente da exis-
tência de prejuízo, trata-se de crime formal. Uma
Estelionato Contra Idoso situação peculiar é que o delito pode ser tanto realiza-
do por meio de jogos ou apostas lícitas quanto ilícitas.
O estelionato contra idoso sofre recentes altera-
ções pela Lei nº 14.155, de 2021 e aumenta a pena do Fraude no Comércio
estelionato de 1/3 ao dobro, quando cometido contra
idoso ou vulnerável. Vejamos: Art. 175 Enganar, no exercício de atividade comer-
cial, o adquirente ou consumidor:
I - vendendo, como verdadeira ou perfeita, merca-
Art. 171 [...]
doria falsificada ou deteriorada;
§ 4º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro,
II - entregando uma mercadoria por outra:
se o crime é cometido contra idoso ou vulnerável,
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
considerada a relevância do resultado gravoso. § 1º Alterar em obra que lhe é encomendada a qua-
lidade ou o peso de metal ou substituir, no mesmo
Importante destacar também que essa majorante caso, pedra verdadeira por falsa ou por outra de
incide sobre todas as modalidades de estelionato. menor valor; vender pedra falsa por verdadeira;
Em regra, a ação procede-se mediante representa- vender, como precioso, metal de ou outra qualidade:
ção, exceto nos casos previstos no § 5º, do art. 171. Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa. [...]

Art. 171 [...] No crime de fraude no comércio, se o criminoso é


§ 5º Somente se procede mediante representação, primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz
salvo se a vítima for: pode substituir a pena de reclusão pela de detenção,
I - a Administração Pública, direta ou indireta; diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a
II - criança ou adolescente; pena de multa.
III - pessoa com deficiência mental; ou
IV - maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz. Outras Fraudes

Duplicata Simulada Art. 176 Tomar refeição em restaurante, alojar-se


em hotel ou utilizar-se de meio de transporte sem
Art. 172 Emitir fatura, duplicata ou nota de ven- dispor de recursos para efetuar o pagamento:
da que não corresponda à mercadoria vendida, em Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.
quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado. Parágrafo único. Somente se procede mediante repre-
sentação, e o juiz pode, conforme as circunstâncias,
Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e
deixar de aplicar a pena.
multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorrerá
aquele que falsificar ou adulterar a escrituração do
A primeira conduta é tomar refeição em restau-
Livro de Registro de Duplicatas.
rante sem dispor de recursos para efetuar o pagamento.
A lei refere-se genericamente a restaurante, de tal
forma que abrange lanchonetes, cafés, bares e outros
O crime em tela é caracterizado pela consumação,
estabelecimentos que sirvam refeição. Esta, aliás,
que ocorre com a mera colocação da duplicata em cir-
engloba a ingestão de bebidas. Entende-se que o deli-
culação, não sendo necessário o prejuízo a terceiros.
to não se configura quando o agente é servido em sua
Não há previsão de forma culposa. própria residência.
A segunda conduta incriminada é alojar-se em
Abuso de Incapazes hotel sem dispor de recursos para efetuar o pagamen-
to. A punição, evidentemente, estende-se a fatos que
Art. 173 Abusar, em proveito próprio ou alheio, de ocorram em estabelecimentos similares, como pen-
necessidade, paixão ou inexperiência de menor, ou sões ou pousadas.
da alienação ou debilidade mental de outrem, indu- A terceira e última conduta criminosa consiste em
zindo qualquer deles à prática de ato suscetível de utilizar-se de meio de transporte (ônibus, táxi, lota-
produzir efeito jurídico, em prejuízo próprio ou de ção, barco, trem) sem possuir recursos para efetuar o
terceiro: pagamento.
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. O tipo penal expressamente exige que o agente
realize as condutas típicas sem dispor de recursos
O crime consuma-se independentemente de pre- para efetuar o pagamento naquele instante.
juízo causado, ou seja, trata-se de crime formal. É necessário (elementar do tipo penal) que o agen-
te não tenha recursos para pagar a refeição, o aloja-
Induzimento à Especulação mento ou o meio de transporte.
Caso o agente tenha os recursos necessários e,
Art. 174 Abusar, em proveito próprio ou alheio, da entretanto, recuse-se a efetuar o pagamento, não
inexperiência ou da simplicidade ou inferioridade cometerá o crime de outras fraudes.
mental de outrem, induzindo-o à prática de jogo ou Deve-se identificar a má-fé do agente quando da
aposta, ou à especulação com títulos ou mercado- prática da conduta descrita no tipo penal. Ele deve
rias, sabendo ou devendo saber que a operação é saber que não dispõe de recursos para pagar e mes-
ruinosa: mo assim utilizar os serviços descritos. Caso ocor-
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. ra um imprevisto, o agente perde seu dinheiro sem
saber, por exemplo, ele não será responsabilizado
82 penalmente.
Trata-se de crime promovido mediante ação penal VI - o diretor ou o gerente que, na falta de balanço,
pública condicionada à representação da vítima. em desacordo com este, ou mediante balanço falso,
Admite-se a aplicação do instituto do perdão judi- distribui lucros ou dividendos fictícios;
cial, já que o juiz, conforme as circunstâncias, poderá VII - o diretor, o gerente ou o fiscal que, por inter-
deixar de aplicar a pena. posta pessoa, ou conluiado com acionista, conse-
gue a aprovação de conta ou parecer;
Fraudes e Abusos na Fundação ou Administração de VIII - o liquidante, nos casos dos ns. I, II, III, IV, V
e VII;
Sociedade por Ações
IX - o representante da sociedade anônima estran-
geira, autorizada a funcionar no País, que pratica
Art. 177 Promover a fundação de sociedade por
os atos mencionados nos ns. I e II, ou dá falsa infor-
ações, fazendo, em prospecto ou em comunicação
mação ao Governo.
ao público ou à assembleia, afirmação falsa sobre a
constituição da sociedade, ou ocultando fraudulen-
tamente fato a ela relativo: Observe que, em tal dispositivo, o legislador pune
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa, se o o diretor, o gerente e, em alguns casos, o fiscal e o
fato não constitui crime contra a economia popular. liquidante, que incidam em fraude em afirmação
referente à situação econômica da empresa, realizem
Trata-se de crime em que o fundador da socieda- falsa cotação de ações, tomem emprestado ou usem
de por ações (sociedade anônima ou comandita por indevidamente bens ou haveres da sociedade, com-
ações) induz ou mantém em erro os candidatos a prem ou vendam ilegalmente ações, prestem caução
sócios, o público ou presentes à assembleia, fazendo ou penhor ilegais, distribuam lucros ou dividendos
falsa afirmação sobre circunstâncias referentes à sua fictícios ou aprovem fraudulentamente conta ou pare-
constituição ou ocultando fato relevante desta. Pode cer. Todos esses crimes são próprios, pois só podem
girar elas sobre falsa informação a respeito de subs- ser cometidos pelas pessoas expressamente mencio-
crições ou entradas, de recursos técnicos da compa- nadas no texto legal.
nhia, de nomes de pseudo-investidores etc. Na forma
omissiva, pode o agente cometer o crime ocultando o Emissão Irregular de Conhecimento de Depósito ou
nome dos fundadores, problemas técnicos etc., cujo “Warrant”
conhecimento poderia prejudicar ou impedir a subs-
crição de ações e a própria constituição da sociedade. Art. 178 Emitir conhecimento de depósito ou war-
A fraude pode constar de prospecto ou de comunica- rant, em desacordo com disposição legal:
ção feita ao público ou em assembleia da empresa. Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa
Trata-se de crime próprio em que o sujeito ativo é
o responsável pela fundação da sociedade por ações. Trata-se de dispositivo fundamentado no Decreto
Sujeitos passivos são as pessoas físicas ou jurídicas nº 1.102, de 1903, que permite a emissão do conheci-
que subscreveram o capital ludibriadas. mento de depósito e do warrant quando mercadorias
É crime formal que se consuma no momento em são depositadas em armazéns gerais.
que é lançado o prospecto ou o comunicado com a Esses títulos, negociáveis por endosso, são entre-
afirmação falsa ou contendo a omissão fraudulenta gues ao depositante, sendo que o primeiro é documen-
de informação relevante, ainda que disso não decorra to de propriedade da mercadoria e confere ao dono o
qualquer resultado lesivo. poder de disposição sobre a coisa, enquanto o segun-
Sobre a pena, é claro que as figuras do § 1º, art. 177, do confere ao portador direito real de garantia sobre
do CP, são subsidiárias, ou seja, cedem lugar quando as mercadorias.
o fato se enquadra como crime contra a economia Quem possui ambos tem a plena propriedade
popular da Lei nº 1.521, de 1951. delas.
Delito é a circulação desses títulos em desacordo
Art. 177 [...] com disposição legal.
§ 1º Incorrem na mesma pena, se o fato não consti- Trata-se de norma penal em branco, complemen-
tui crime contra a economia popular: tada pelo Decreto nº 1.102, de 1903.
I - o diretor, o gerente ou o fiscal de sociedade por De acordo com seus ditames, a emissão é irregular
ações, que, em prospecto, relatório, parecer, balan- quando:
ço ou comunicação ao público ou à assembleia, faz
afirmação falsa sobre as condições econômicas da z A empresa não está legalmente constituída (art.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

sociedade, ou oculta fraudulentamente, no todo ou 1º);


em parte, fato a elas relativo; z Inexiste autorização do Governo Federal para a
II - o diretor, o gerente ou o fiscal que promove, por emissão (arts. 2º e 4º);
qualquer artifício, falsa cotação das ações ou de z Inexistem as mercadorias no documento
outros títulos da sociedade;
especificadas;
III - o diretor ou o gerente que toma empréstimo à
z Há emissão de mais de um título para a mesma
sociedade ou usa, em proveito próprio ou de tercei-
mercadoria ou gêneros especificados no título;
ro, dos bens ou haveres sociais, sem prévia autori-
zação da assembleia geral; z O título não perfaz as exigências reclamadas no
IV - o diretor ou o gerente que compra ou vende, por art. 15 do decreto.
conta da sociedade, ações por ela emitidas, salvo
quando a lei o permite; Sujeito ativo é o depositário da mercadoria. Sujei-
V - o diretor ou o gerente que, como garantia de cré- to passivo é o endossatário ou portador que recebe o
dito social, aceita em penhor ou em caução ações título sem saber da ilegalidade.
da própria sociedade; 83
O crime se consuma quando o título é colocado É crime comum, tanto em relação ao sujeito ativo,
em circulação e a tentativa não é possível, pois, ou o como em relação ao sujeito passivo.
agente o coloca em circulação, consumando o crime, A doutrina divide a receptação simples em própria
ou não o faz, sendo atípica a conduta. ou imprópria. Conheça tal divisão:

Fraude à Execução z Receptação Própria: adquirir, receber, transpor-


tar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou
Art. 179 Fraudar execução, alienando, desviando, des- alheio, coisa que sabe ser produto de crime;
truindo ou danificando bens, ou simulando dívidas: z Receptação Imprópria: influir para que terceiro,
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.
Parágrafo único. Somente se procede mediante
queixa. A receptação é crime de tipo misto alternativo,
podendo o agente ser responsabilizado penalmente
O crime consiste na existência de uma senten- caso pratique qualquer um dos verbos descritos no
ça a ser executada ou de uma ação executiva e tipo penal.
mandamento.
O agente, com o fim de fraudar a execução, desfa- Receptação Qualificada
z-se de seus bens por meio de uma das condutas des-
critas na lei: A receptação qualificada é aquela praticada no
exercício de atividade comercial ou industrial.
z Alienando;
z Desviando; Art. 180 [...]
z Destruindo ou danificando bens; § 1º Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocul-
z Simulando dívidas. tar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar,
vender, expor à venda, ou de qualquer forma utili-
zar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de
Sujeito ativo é o devedor.
atividade comercial ou industrial, coisa que deve
Se for empresário e as condutas forem perpetra- saber ser produto de crime:
das após decretada sua quebra, o ato caracterizará Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa.
crime falimentar.
O sujeito passivo é o credor. É admitido, na receptação qualificada, tanto o dolo
Trata-se de crime material que somente se consu- direto quanto o dolo eventual (coisa que deve saber
ma quando a vítima sofre algum prejuízo patrimonial ser produto de crime).
em consequência da atitude do agente.
A tentativa é possível quando o sujeito não conse- Art. 180 [...]
gue realizar a conduta típica pretendida. § 2º Equipara-se à atividade comercial, para efeito
A ação penal é privada. do parágrafo anterior, qualquer forma de comércio
Se a fraude atingir execução promovida pela irregular ou clandestino, inclusive o exercício em
União, Estado ou Município, a ação será pública residência.
incondicionada.
Receptação Culposa
RECEPTAÇÃO
Art. 180 [...]
§ 3º Adquirir ou receber coisa que, por sua nature-
O crime de receptação pode ser dividido em:
za ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou
pela condição de quem a oferece, deve presumir-se
z Receptação simples; obtida por meio criminoso:
z Receptação qualificada; Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou
z Receptação culposa; ambas as penas.
z Receptação de animal.
Segundo entendimento doutrinário majoritário, a
Antes de iniciarmos a análise de cada uma das receptação será culposa quando o agente adquirir ou
divisões feitas, é importante mencionar que, segundo receber coisa que, por sua natureza ou pela despro-
posicionamento doutrinário majoritário, confirmada porção entre o valor e o preço, ou pela condição de
pela jurisprudência do STF, a coisa deve ser móvel. quem a oferece, presume-se que tenha sido obtida por
É importante que você saiba, também, que a recep- meio criminoso.
tação é punível ainda que desconhecido ou isento de Ex.: Fulano adquiri uma motocicleta, avaliada em
pena o autor do crime de que proveio a coisa. R$ 10.000,00, de Ciclano, que pediu por ela o valor
Logo, a punição da receptação não depende da de R$ 2.500,00. Fulano é abordado por policiais civis,
punição do crime anterior, de que se obteve a coisa. identificando-se, posteriormente, que a motocicleta é
objeto de furto.
Receptação Simples É possível que Fulano seja responsabilizado cri-
minalmente por receptação culposa, já que há muita
Art. 180 Adquirir, receber, transportar, conduzir desproporção entre o valor da coisa e o preço pedido
ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que pelo agente, tendo ele elementos para presumir que a
sabe ser produto de crime, ou influir para que ter- coisa foi obtida por meio criminoso.
ceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: À receptação culposa aplica-se o instituto do per-
84 Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. dão judicial, podendo o juiz deixar de aplicar a pena,
levando em consideração as circunstâncias do fato e z Exceções às imunidades
caso o criminoso seja primário.
No caso de receptação dolosa, aplica-se o institu- Art. 181 É isento de pena quem comete qualquer
to do privilégio, podendo o juiz, caso o agente seja dos crimes previstos neste título, em prejuízo:
primário e seja de pequeno valor a coisa, substituir I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;
II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco
a pena de reclusão pela pena de detenção, reduzir a
legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.
pena de 1/3 a 2/3, ou aplicar somente a pena de multa.
Em 2017, por meio da Lei n° 13.531, foi inserido
As imunidades absolutas isentam de pena quem
importante dispositivo ao Código Penal, que aumenta
comete delito contra o patrimônio em prejuízo de
a pena do agente ao dobro. ascendente, descendente ou cônjuge, na constância
A pena prevista para a receptação simples (pró- da sociedade conjugal.
pria ou imprópria) será aplicada em dobro, tratan- São autênticas escusas absolutórias, vedando
do-se de bens do patrimônio da União, de Estado, do inclusive a instauração do inquérito policial.
Distrito Federal, de Município ou de autarquia, funda- Trata-se de um perdão legal.
ção pública, empresa pública, sociedade de economia Conquanto o fato seja típico, antijurídico e culpá-
mista ou empresa concessionária de serviços públi- vel, há um impedimento legal da punibilidade, que é
cos. Vejamos: excluída antes mesmo da prática do delito, distinguin-
do-se do perdão judicial, que é concedido pelo juiz na
Art. 180 [...] sentença, após o devido processo legal.
§ 6º Tratando-se de bens do patrimônio da União, A primeira causa de imunidade é o delito prati-
de Estado, do Distrito Federal, de Município ou cado em prejuízo de cônjuge, na constância da socie-
de autarquia, fundação pública, empresa pública, dade conjugal; por exemplo, não se instaura sequer
sociedade de economia mista ou empresa conces- inquérito policial quando a esposa furta o marido, ou
sionária de serviços públicos, aplica-se em dobro a vice-versa.
pena prevista no caput deste artigo. A imunidade subsiste na separação de fato.
Exclui-se a imunidade se por ocasião do delito eles
Receptação de Animal estavam separados judicialmente.
A tendência é estender a imunidade à união está-
Trata-se de um tipo autônomo de receptação e não vel, considerando-a equiparada ao casamento.
uma forma qualificada de receptação, já que se altera
os patamares mínimos e máximos da pena.
A receptação de animal (semovente domesticável de Importante!
produção) tem a pena de reclusão, de 2 a 5 anos e multa. O inciso IV, art. 7º, da Lei Maria da Penha, con-
O crime de receptação de animal está previsto no sidera também violência doméstica o atentado
art. 180-A do Código Penal. contra o patrimônio da mulher.
Foi inserido pela Lei nº 13.330, de 2016, sendo, por- Diante disso, uma corrente doutrinária susten-
tanto, um tipo penal bastante recente. ta que não haveria mais imunidade nos crimes
patrimoniais contra a mulher.
Art. 180-A Adquirir, receber, transportar, conduzir, Entretanto, o STJ já decidiu pela manutenção
ocultar, ter em depósito ou vender, com a finalida- da imunidade, à medida que a referida lei não a
de de produção ou de comercialização, semovente
afastou expressamente.
domesticável de produção, ainda que abatido ou
dividido em partes, que deve saber ser produto de
crime: A segunda causa de imunidade, crime contra o
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. patrimônio praticado em prejuízo de ascendente, inci-
de também nos casos de adoção.
Aqui, também é admitido o dolo eventual (que Porém, se o filho adotivo furta o pai biológico, este
deve saber ser produto de crime). responderá pelo delito, e vice-versa, pois a adoção
Semovente domesticável de produção pode ser extingue os vínculos com a família de sangue.
entendido como animais de bando, como bovinos e Tratando-se de vínculo de afinidade, como sogro,
suínos, que constituem patrimônio de alguém, domes- sogra, genro, nora, padrasto, madrasta, enteado e
ticados com finalidade produtiva. enteada, não há imunidade, tendo em vista a vedação
Ex.: Fulano adquire, no exercício do comércio em da analogia.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

seu açougue, gado abatido após ser furtado em uma A última causa de imunidade absoluta, quando se
fazenda, com a finalidade de comercializar a carne. pratica crime contra o patrimônio em prejuízo de des-
Fulano praticou o crime de receptação de animal. cendente, é aplicada também nos casos de adoção.

DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 182 Somente se procede mediante representa-


ção, se o crime previsto neste título é cometido em
prejuízo:
Imunidades nos Crimes Contra o Patrimônio
I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado;
II - de irmão, legítimo ou ilegítimo;
As disposições gerais dos crimes contra o patrimô- III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.
nio versam sobre as:
Nas imunidades penais relativas, previstas no art.
z Imunidades 182, do CP, o delito, de ação pública incondicionada,
„ Imunidades absolutas; transmuda-se para ação pública condicionada à repre-
„ Imunidades relativas ou processuais penais. sentação da vítima ou de seu representante legal. 85
Tratando-se de crime de ação privada, não há que incomunicável. Por exemplo, o terceiro que auxi-
se falar em imunidade processual, cuja finalidade é lia o marido a furtar a esposa responde pelo crime
beneficiar, ao invés de prejudicar. de furto;
A ação penal privada é mais vantajosa do que a z Aos delitos praticados contra pessoa com idade
ação penal pública condicionada à representação. igual ou superior a 60 anos.
A primeira causa de imunidade processual con-
siste no fato de o delito ser praticado em prejuízo de
cônjuge judicialmente separado. Vejamos, marido fur-
ta esposa um tempo depois de o casamento ser dis-
solvido, estão separados judicialmente. Neste caso, há
DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE
imunidade relativa. SEXUAL
Tratando-se de cônjuges divorciados ao tempo do
crime, não há qualquer imunidade. Por exemplo, após BEM JURÍDICO TUTELADO
separados judicialmente, ex-esposa furta ex-marido.
A segunda causa, delito praticado em prejuízo Na redação original do Código Penal de 1940, os
de irmão, abrange os irmãos germanos ou bilaterais tipos constantes no Título VI, da Parte Especial, eram
(filhos dos mesmos pais) e os irmãos unilaterais, que chamados de “Crimes conta os costumes”. “Costu-
podem ser consanguíneos (filhos do mesmo pai) ou mes”, na época, tinha o significado de hábitos, condu-
uterinos (filhos da mesma mãe). tas sexuais que eram aprovadas pela moral vigente.
É claro que a imunidade também se estende aos Com a promulgação da Constituição Federal de
irmãos adotivos. 1988, que adotou a dignidade da pessoa humana
Observa-se que, se o agente comete delito de furto como fundamento, a doutrina passou a entender que
em prejuízo de cunhado: ao invés de tutelar os costumes, a lei penal deveria
proteger o bem jurídico liberdade sexual em sentindo
z Se a sua irmã for casada no regime da comunhão amplo.
universal, haverá imunidade; Seguindo esse entendimento, a Lei nº 12.015, de 2009,
z Se o regime for o da comunhão parcial, só have- promoveu alterações em alguns tipos penais e mudou o
rá imunidade se o furto recaiu sobre bem comum, bem jurídico do Título VI, do CP, que passou a ser deno-
isto é, comunicável em razão do casamento; minado “Dos crimes contra a dignidade sexual”.
z Se o regime for o da separação de bens, não Os crimes contra a dignidade sexual trazem, por-
há falar-se em imunidade, pois os bens não se tanto, a tipificação de condutas sexuais praticadas:
comunicam.
z Contra a vontade da vítima — Capítulo I;
A última causa de imunidade, delito praticado em z Mediante fraude (vontade viciada) — Capítulo I;
prejuízo de tio ou sobrinho com quem o agente coabi- z Contra vulneráveis — Capítulo II.
ta, pode se caracterizar ainda que o crime tenha sido
praticado fora do local em que eles vivem, como, por Em todos os tipos penais dos crimes contra a dig-
exemplo, numa pescaria. nidade sexual, o bem jurídico tutelado é a liberdade
Se não houver coabitação, mas apenas relação de sexual.
hospitalidade, moradia eventual, como a que ocor-
re nas férias escolares em que o sobrinho vai passar
alguns dias na casa de um tio, não há falar-se em Importante!
imunidade.
Inseridos ao tema “crimes contra a dignidade
Art. 183 Não se aplica o disposto nos dois artigos sexual” encontram-se o tipo do estupro (art. 213,
anteriores: CP), o assédio sexual (art. 216-A), o registro não
I - se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em autorizado da intimidade sexual (art. 216-B) e o
geral, quando haja emprego de grave ameaça ou
estupro de vulnerável (art. 217-A), tipos penais
violência à pessoa;
II - ao estranho que participa do crime.
recorrentes em provas de concursos. Dentre
III – se o crime é praticado contra pessoa com idade estes, merece destaque o tipo do art. 217-A, que
igual ou superior a 60 (sessenta) anos. costuma receber maior destaque nas provas.

O art. 183 do CP dispõe que as imunidades absolu-


tas e relativas não se aplicam: ESTUPRO

Estupro
z Ao crime de roubo, ainda que o roubo seja com
violência imprópria, como a subtração ocorrida Art. 213 Constranger alguém, mediante violên-
após o ladrão hipnotizar a vítima, exclui-se a imu- cia ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou
nidade, pois a lei não abre qualquer exceção ao a praticar ou permitir que com ele se pratique outro
delito de roubo; ato libidinoso:
z Ao crime de extorsão, ainda que se trate da extor- Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
são indireta, onde não há violência ou grave amea-
ça, exclui-se a imunidade; No caput do art. 213 encontra-se a modalidade
z Aos delitos cometidos com emprego de grave simples. Constranger significa forçar, coagir alguém
ameaça ou violência à pessoa; usando de violência (vis absoluta) ou grave ameaça
z Ao estranho que participa do crime, pois, a (vis compulsiva). No caso do estupro a coação tem a
86 imunidade é uma circunstância pessoal, logo, finalidade de se obter:
z A conjunção carnal, que é a introdução do pênis Todos os tipos de estupro (caput e parágrafos) são
na vagina (cópula vagínica); considerados hediondos, conforme o inciso V, art. 1º,
z Outro ato libidinoso (diverso da conjunção car- da Lei nº 8.072, de 1990.
nal como, por exemplo, sexo oral, sexo anal,
toques íntimos ou sobre a roupa, masturbação e o z Hediondos:
beijo lascivo). A conjunção carnal é um tipo de ato
„ Art. 213, caput (estupro simples);
libidinoso (gênero).
„ Art. 213, § 1º (qualif. pela lesão grave/idade);
„ Art. 213, § 2º (qualif. pela morte).

Atos libidinosos O sujeito ativo e o sujeito passivo do estupro


(gênero) podem ser qualquer pessoa, sem qualquer qualifi-
cação especial (crime comum). Homens e mulheres
podem ser tanto autores quanto vítimas (crime bico-
Conjunção carnal
(espécie) mum). A esposa pode ser vítima do crime pratica-
do pelo marido, ou seja, ocorre o estupro quando
o marido constrange, mediante violência ou grave
ameaça, sua esposa à prática de conjunção carnal
Trata-se de um tipo misto alternativo, conforme ou ato libidinoso. Não há nada que impeça, também,
doutrina e jurisprudência do STF e STJ. Ou seja, se o que a prostituta seja sujeito passivo.
sujeito constrange a vítima à conjunção carnal e pra- É possível a participação (quando um dos autores
tica sexo oral, responde por um só crime. Da mesma segura a vítima para que com ela se pratique os atos)
forma a prática de vários atos libidinosos configura e a coautoria (quando há instigação, por exemplo).
crime único (claro, desde que contra a mesma víti- Só existe estupro doloso se consumado com a efeti-
ma, no mesmo contexto). va prática da conjunção carnal ou dos atos libidinosos
A redação do estupro antes da Lei nº 12.012, de (crime material).
2009, era assim: A grave ameaça ou a violência constituem cri-
mes-meio para a prática do estupro, ficando por
Art. 213 Constranger mulher à conjunção carnal, ele absorvidos (princípio da consunção).
mediante violência ou grave ameaça. Veremos, agora, algumas particularidades sobre o
crime de estupro que já foram objeto de questiona-
Só mulher poderia ser vítima e somente o homem mento em provas:
poderia ser sujeito ativo, uma vez que só se consuma-
va o crime pela conjunção carnal. z Consumação e tentativa. Observe dois exemplos:
Os demais atos libidinosos eram protegidos pelo
tipo do atentado violento ao pudor, que se encontrava „ O agente aborda sua vítima na rua e a leva para
no art. 214, CP, hoje revogado: um local ermo com a intenção de estuprá-la; lá
chegando começa a tirar a roupa da vítima,
Art. 214 Constranger alguém, mediante violência ou
momento que é interrompido pela chegada da
grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se
polícia, antes da prática de algum ato libidinoso
pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal.
ou de conjunção carnal. Neste caso, vai respon-
der pelo estupro na forma tentada;
Atenção: não houve abolitio criminis, pois, apesar
„ Vamos modificar um pouco o exemplo acima.
de o art. 214 ter sido revogado, as condutas por ele
Nesta situação, ao retirar as roupas da vítima, o
tratadas encontram-se hoje previstas no art. 213, CP
sujeito toca e beija suas partes íntimas, quando
(houve, portanto, o que chamamos de continuidade
é surpreendido pela polícia. Muito embora não
típico-normativa).
tenha praticado a conjunção carnal, que era
O estupro tem, também, duas formas qualifica-
seu dolo, antes de ser interrompido pela polícia
das pelo resultado. A primeira, pela ocorrência de
praticou atos libidinosos ao tocar as partes ínti-
lesão corporal grave (tanto faz as graves quanto as
gravíssimas) ou pela idade da vítima: mas da vítima. Neste caso, vai responder pelo
estupro consumado.
Art. 213 [...]
§ 1º Se da conduta resulta lesão corporal de z “Curra” é o nome vulgarmente dado para a situa-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

natureza grave ou se a vítima é menor de 18 ção na qual dois ou mais agentes se revezam
(dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: na prática do estupro contra a mesma vítima.
Pena – reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. Ocorre, por exemplo, quando um agente segura a
vítima, enquanto o outro mantém com ela conjun-
E a outra forma é qualificada pela morte: ção carnal; logo após, eles se revezam. Neste caso,
cada um dos agentes vai responder por dois
Art. 213 [...] crimes (um como autor e outro como coautor,
§ 2º Se da conduta resulta morte: como no nosso exemplo; ou ainda como partícipe,
Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. dependendo da situação);
z A presença de lesões na vítima não é requisito
São, assim, três as formas qualificadas: necessário, uma vez que certos atos libidinosos não
deixam marcas visíveis que sejam passíveis de serem
z Estupro com resultado lesão corporal grave (§ 1º); apuradas por meio de exame de corpo de delito. Na
z Estupro contra vítima menor de 18 e maior de 14 (§ 1º); verdade, em algumas situações, o contato físico
z Estupro com resultado em morte (§ 2º). entre a vítima e o agressor não é necessário para 87
que haja consumação do estupro (com relação aos Com a entrada em vigor da Lei nº 13.718, de 2018,
atos libidinosos). O tipo do art. 213, menciona “prati- que alterou o art. 225, do Código Penal, todos os cri-
car” ou “permitir” (a vítima), que com ela se pratique mes contra a dignidade sexual passaram a ser crimes
ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Imagine de ação penal pública incondicionada, não precisando
a situação hipotética na qual o agente constrange a mais da representação da vítima.
vítima mediante grave ameaça a tocar seu próprio
corpo de maneira erótica (automasturbação). Neste
caso, o agente vai responder pelo estupro, uma vez Importante!
que constrangeu a vítima a praticar ato libidinoso,
O crime de estupro, previsto no art. 213, seja na
mediante grave ameaça;
z Absurdamente, o casamento da vítima com o
sua forma simples ou qualificada, constitui cri-
agressor (ou com terceiro), até 2005, configu- me hediondo.
rava causa extintiva da punibilidade para os
crimes de estupro. A Lei nº 11.106, de 2005, entre VIOLAÇÃO SEXUAL MEDIANTE FRAUDE
outras mudanças, acabou com essa possibilidade.
A atual redação do art. 215, CP, deu-se com as
Formas Qualificadas Pelo Resultado modificações da Lei nº 12.015, de 2009, da qual já fala-
mos quando estudamos o estupro. Aqui houve nova
O art. 213 apresenta duas formas de estupro qua- continuidade típico-normativa: o tipo do art. 216 foi
lificado pelo resultado: no § 1º (lesão grave) e no § revogado e a conduta, incluída no art. 215, CP.
2º (morte). Em relação à lesão corporal, esta pode ser
tanto grave quanto gravíssima (a distinção encontra- Art. 215 Ter conjunção carnal ou praticar
-se no art. 129, CP, respectivamente, nos §§ 1º e 2º). As outro ato libidinoso com alguém, mediante
lesões leves são absorvidas. fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a
Em relação a estes resultados mais graves (lesão livre manifestação de vontade da vítima:
grave e morte), a maioria da doutrina entende ser Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
hipótese de crime preterdoloso, isto é, o resultado Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim
lesão ou morte se dá por culpa do agente (lembre-se: de obter vantagem econômica, aplica-se também
multa.
preterdolo = dolo na conduta antecedente e culpa na
consequente). Nesse sentido, se o agente quer estu-
Consiste na prática de conjunção carnal ou outro
prar e também tem o dolo de lesionar ou de matar,
ato libidinoso com alguém (homem ou mulher) com
vai responder pelos dois crimes em concurso. Alguns
emprego de fraude ou outro meio que impeça ou
doutrinadores, no entanto, entre eles Guilherme Nuc-
dificulte a livre manifestação de vontade da vítima.
ci, entendem ser indiferente o fato de o agente agir
Na violação sexual mediante fraude, não há o
com dolo ou culpa em relação ao resultado mais grave. emprego de violência ou grave ameaça, o que difere
O § 1º apresenta, ainda, a qualificadora pela ida- do estupro. Nesta situação, o ato é consentido (há a
de da vítima, caso seja menor de 18 e maior de 14. Em manifestação de vontade da vítima), porém o agente
relação à idade da vítima, temos as seguintes hipóteses utiliza meios fraudulentos, enganando a vítima para
(atenção que há uma possível “pegadinha” de prova): que esta conceda.
O exemplo clássico (que já apareceu em mais de
IDADE DA VÍTIMA CONSEQUÊNCIA uma prova) é o do médico que pede para que a pacien-
Estupro simples te tire toda a roupa, pois precisa examiná-la e, sem
Maior de 18 anos que seja necessário, toca as partes íntimas da vítima
(caput, art. 213, CP)
(que foi enganada, pois pensou que os toques fossem
Vítima maior de 14 e menor Estupro qualificado parte normal do exame; ou seja, houve engano sobre
de 18 (§ 1º, art. 213, CP) a legitimidade do ato). Outro exemplo muito usado é o
Estupro de vulnerável do irmão gêmeo que toma o lugar de seu irmão e pra-
Vítima menor de 14 anos
(art. 217-A, CP) tica conjunção carnal com a namorada deste (engano
sobre a pessoa).
É importante não confundir, na hora da prova, o
Você notou uma “falha”? O que acontece se a víti-
crime do art. 215 com o do art. 217-A (que veremos
ma tiver exatos 14 anos, ou seja, se for estuprada exa- mais adiante). A redação da violação sexual mediante
tamente no dia em que completa 14 anos? Existe uma fraude (art. 215) aponta que o agente deve impedir ou
lacuna na lei que deixa de fora da forma qualifica- dificultar a livre manifestação da vontade da vítima:
da a vítima com exatos 14 anos completos na data se o agente retira por completo a vontade da vítima
do crime (que fala em vítima “maior de” 14, mas não (embebedando-a completamente, por exemplo), esta
menciona com idade “igual”) bem como não tipifica se torna vulnerável, sendo o caso então da aplicação
a conduta com estupro de vulnerável (“menor de” do tipo penal do art. 217-A (estupro de vulnerável).
14 anos). Neste caso, o enquadramento é feito como Também não confunda o art. 215 com o 213 (estu-
estupro simples (caput, art. 213). Fique atento a este pro): o meio de execução é diferente:
fato, que pode ser uma típica “pegadinha”.
z Art. 213 (estupro): violência ou grave ameaça;
Causas de Aumento de Pena z Art. 215 (violação): fraude ou outro meio que
impeça ou dificulte a manifestação de vontade.
Atente-se ao fato de que as causas de aumento de
pena que se aplicam a todos os crimes contra a dig- Veja que para que configure este tipo, deve haver
nidade sexual encontram-se no art. 226, que veremos fraude, engano, ardil; se houver violência ou grave
88 mais adiante. ameaça, não configura o art. 215, CP. Se a vítima for
menor de 14 anos, será o caso da incidência do art. obter favorecimento sexual de qualquer forma (pode
217-A. Não é crime hediondo. ser até um beijo), mediante uma ameaça (quer pode
O parágrafo único, do art. 215, prevê a aplicação ser explícita ou não) ou de uma promessa (de promo-
também da pena de multa se o delito é praticado com ção, por exemplo), que também pode ser explícita ou
a finalidade de obter vantagem econômica, como no implícita.
caso do agente que deixa de pagar a prostituta após
O sujeito ativo está em posição hierarquicamente
a realização da conjunção carnal ou de outro ato
superior à vitima (tem maior autoridade na estrutu-
libidinoso.
É importante destacar que, se durante a relação ra administrativa) ou tem ascendência inerente ao
sexual a vítima percebe a fraude e consente com a emprego, cargo ou função que exerce (setor privado);
continuidade do ato, este se tornará atípico perante a por sua vez, o sujeito passivo é o subordinado (assédio
legislação brasileira. vertical). É o que se chama de crime bipróprio (exige
características especiais do sujeito ativo e do passivo).
IMPORTUNAÇÃO SEXUAL Não há assédio sexual entre funcionários do mes-
mo nível (assédio horizontal). Também não se confi-
Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018, o art. 215-A gura quando o subordinado assedia o superior.
revogou o art. 61, da Lei de Contravenções Penais (que São aspectos relevantes relativos ao tipo do art.
previa conduta semelhante), criando o tipo penal de 216-A:
importunação sexual:
z É crime bicomum;
Art. 215-A Praticar contra alguém e sem a sua z O flerte (paquera) ou o namoro não configuram a
anuência ato libidinoso com o objetivo de satis- conduta descrita;
fazer a própria lascívia ou a de terceiro:
z Se a vítima é menor de 14 anos, configura o tipo
Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato
do art. 217-A;
não constitui crime mais grave.
z É crime formal (de resultado cortado), ou seja,
Exemplo de conduta tratada por este tipo penal consuma-se com o constrangimento;
foi objeto de destaque na mídia em tempos recentes, z O parágrafo § 2º determina o aumento de até um
que se materializava quando o sujeito, dentro de um terço se a vítima tem mais de 14 e é menor do que
transporte coletivo, ejaculava na vítima ou se esfre- 18 anos (atente-se ao fato de que o dispositivo fala
gava nela. em menor de 18, mas, como vimos, os menores de
Os principais aspectos sobre esse crime são: 14 são cuidados pelo art. 217-A); não estabelece,
no entanto, o quantitativo mínimo de aumento: a
z Não é hediondo; doutrina aponta que deve ser aplicado o aumento
z É crime subsidiário (só será aplicado se não consti- mínimo existente no CP: um sexto;
tuir crime mais grave); z A paixão do agente pela vítima não exclui o
z É bicomum (homem e mulher podem ser sujeitos crime (veja o inciso I, art. 28, do CP, que afirma
ativos/passivos); expressamente que a emoção e a paixão não afas-
z Se praticado contra menor de 14 anos, é afastado, tam a responsabilidade penal);
incindo o tipo do art. 217-A (estupro de vulnerável); z Não há relação de hierarquia (superioridade)
z Deve ser praticado contra vítima(s) determina(s); entre cônjuges, sendo assim, não é possível a con-
se não é praticado contra pessoa específica, consti- figuração deste crime;
tui ato obsceno (art. 233, CP), como, por exemplo,
z Conforme a doutrina majoritária, é crime ins-
quando o agente se masturba no meio de um par-
tantâneo, não exigindo a prática de atos de forma
que, sem se dirigir a ninguém de forma particular;
reiterada;
z É elementar do delito de importunação sexual que
z Não se exige que o assédio ocorra dentro do
este seja realizado sem a anuência da vítima;
z Não há emprego de violência ou grave ameaça. ambiente de trabalho;
z Por último, temos a questão da relação professor
ASSÉDIO SEXUAL e aluno. Existe o crime, por exemplo, quando o
professor, ao afirmar a uma aluna que precisava
O assédio sexual encontra-se previsto no art. 216-A: de pontos para ser aprovada em sua disciplina,
aproxima-se e toca sua barriga e seus seios? Nes-
Art. 216-A Constranger alguém com o intuito de te caso, temos duas posições: a primeira corren-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

obter vantagem ou favorecimento sexual, pre- te afirma que não, por não haver hierarquia ou
valecendo-se o agente da sua condição de superior ascendência do docente em relação ao aluno (já
hierárquico ou ascendência inerentes ao exer- foi o entendimento predominante e ainda pre-
cício de emprego, cargo ou função. valece na doutrina); já pela segunda corrente,
Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos
adotada pelo STJ em 2019 (ao analisar exatamen-
Parágrafo único. (VETADO)
te um caso como o do exemplo), afirma que, ape-
§ 2º o A pena é aumentada em até um terço se a
vítima é menor de 18 (dezoito) anos. sar de não haver relação de hierarquia, há um
domínio do docente sobre o aluno, sendo apli-
O parágrafo único foi vetado. Temos apenas o § 2º. cável o tipo do assédio sexual. Essa discussão
A palavra constranger, no caso do art. 216-A, não se aplica na relação entre líderes religiosos, como
tem o mesmo sentido do que no estupro: o assédio pastores e padres, e seus fiéis; neste caso, aplica-se
sexual tem a ideia de intimidar alguém a fazer a posição da doutrina que afirma não ser possível.
alguma coisa (atos sexuais, libidinosos) sem o uso
de violência ou grave ameaça. O intuito do agente é 89
Em relação à configuração de crime de assédio na É importante notar que a lei fala em “caráter ínti-
relação entre professor e aluno: mo e privado”. Por exemplo, filmar um casal realizan-
do ato sexual em uma praia não configura o tipo do
z Em uma prova objetiva, o mais indicado é seguir a art. 216-B.
posição do STJ, no sentido de que é possível o assé- É cabível a tentativa: o agente pode tentar regis-
dio sexual entre professores e alunos; trar e não conseguir.

REsp 1.759.135 […] a Sexta Turma entendeu, por Forma Equiparada


maioria, que é possível a configuração do crime de
assédio sexual na relação entre professor e aluno. O parágrafo único, do art. 216-B, apresenta uma
forma equiparada ao registro do caput. Neste caso, o
z Em uma prova discursiva, explique os dois agente não registra cena verdadeira (ou seja, a víti-
posicionamentos. ma não participa do ato), mas sim faz uma montagem
(de fotografia, vídeo, áudio ou qualquer meio) para
Lembre-se: em relação à hipótese de assédio incluir alguém em cena de nudez ou ato sexual ou
sexual entre líderes religiosos, não cabe a configura- libidinoso de caráter íntimo.
ção do crime de assédio sexual. Com o avanço de softwares de manipulação de
imagem cada vez mais potentes, essa forma de crime
REGISTRO NÃO AUTORIZADO DA INTIMIDADE tem aumentado cada vez mais na internet, sobretudo
SEXUAL com a inclusão do rosto de pessoas famosas em cenas
de filmes pornográficos (provavelmente você já ouviu
Incluído em dezembro de 2018, no CP, pela Lei nº falar do chamado deepfake, que consiste na manipula-
13.772, é o único crime que consta do Capítulo I-A, do ção de rostos por meio de inteligência artificial).
Título VI: Vamos aproveitar e estudar outro tipo penal que
tem relação direta com o crime do art. 216-B.
Leia atentamente os verbos que constam no art.
Art. 216-B Produzir, fotografar, filmar ou regis-
trar, por qualquer meio, conteúdo com cena de 216-B: produzir, fotografar, filmar ou registrar.
nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter ínti- Observe que não há a expressão “divulgar”. E então,
mo e privado sem autorização dos participantes: o que acontece se alguém divulga a cena registrada?
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e Neste caso, incide em uma das formas previstas no
multa. art. 218-C, incluído no CP em 2018, Divulgação de
Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerá-
realiza montagem em fotografia, vídeo, áudio ou vel, de cena de sexo ou de pornografia:
qualquer outro registro com o fim de incluir pes-
soa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso Art. 218-C Oferecer, trocar, disponibilizar, transmi-
de caráter íntimo. tir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou
divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de
Note que o art. 216-B constitui em um tipo misto comunicação de massa ou sistema de informática
ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro regis-
alternativo, trazendo os seguintes núcleos: produzir,
tro audiovisual que contenha cena de estupro ou
fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio.
de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou
Trata-se de um crime formal, consumando-se com a induza a sua prática, ou, sem o consentimento da
mera prática de um dos núcleos. Se as imagens forem vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:
divulgadas, estará tipificado o crime do art. 218-C, que Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato
veremos a seguir, do Código Penal. não constitui crime mais grave.
O crime de registro não autorizado da intimidade § 1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3
sexual configura-se, por exemplo, quando um locador (dois terços) se o crime é praticado por agente
instala um equipamento de gravação de vídeo em um que mantém ou tenha mantido relação íntima de
imóvel com a finalidade de captar imagens íntimas afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou
sem o conhecimento dos ocupantes. Ou, ainda, quan- humilhação.
do o vizinho filma a vizinha trocando de roupa. § 2º Não há crime quando o agente pratica as con-
dutas descritas no caput deste artigo em publica-
O consentimento do ofendido afasta a tipicidade,
ção de natureza jornalística, científica, cultural ou
uma vez no tipo consta a expressão “sem a autoriza-
acadêmica com a adoção de recurso que impossibi-
ção dos participantes”. lite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia
autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos.

Importante! Veja bem, o art. 218-C (divulgação) prevê um crime


Apenas o maior de idade, capaz, pode consentir mais grave do que o previsto no art. 216-B (registro).
com o registro. Se a vítima for menor, configura Uma das formas mais comuns de prática é o que
se conhece por pornô de vingança (revenge porn, em
o delito do art. 240, do Estatuto da Criança e do
inglês), na qual, após o término de um relacionamen-
Adolescente:
to, o agente divulga cenas íntimas da(o) ex-parceira(o).
Art. 240 Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, fil- Os pontos relevantes em relação ao tipo do art.
mar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo 218-C são:
explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou
adolescente: z Trata-se de crime subsidiário;
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e z É tipo misto alternativo, ou seja, se o agente prati-
90 multa. car todos os núcleos que constam no artigo, dentro
do mesmo contexto fático, responde somente por Posto isso, imaginemos a seguinte situação: Tício
um crime; conhece Maria pelas redes sociais. Maria afirma tanto
z Assim como os demais crimes contra a digni- em sua página do Facebook, quanto pessoalmente a
dade sexual, procede-se mediante ação pública Tício, possuir 15 anos de idade. Tício e Maria realizam
incondicionada; conjunção carnal consentida. Em que pese Maria afir-
z Em relação ao sujeito passivo: pode ser qualquer mar possuir 15 anos, na realidade esta possui 13 anos.
um, desde que não seja menor de 18 anos. Neste Neste caso, Tício desconhecia o fato de estar se rela-
caso, sendo criança ou adolescente, aplica-se o dis- cionando com menor de 14 anos, o que afasta o dolo
posto no art. 241-B do ECA: de sua conduta. Assim, não é reconhecido o crime do
art. 217-A. Já, nesta mesma situação, caso Tício, conhe-
Art. 241-B Adquirir, possuir ou armazenar, por
cendo da condição de menor de 14 anos de Maria, a
qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de
registro que contenha cena de sexo explícito ou por- procure novamente e venham a se relacionar sexual-
nográfica envolvendo criança ou adolescente: mente, este deverá ser condenado pelo crime do art.
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e 217-A. Este é o entendimento o STJ, consoante HC
multa. 628.870/PR, Rel. Ministro Ribeiro Dantas.10

z O § 1º do art. 218-C do CP, estipula causa especial Forma Equiparada


de aumento de pena (de 1/3 a 2/3) se o agente man-
tém ou já manteve relação íntima de afeto com a O § 1º, do art. 217-A, apresenta a figura equiparada
vítima, ou se o crime é cometido com a finalidade do estupro de vulnerável:
de vingança ou de humilhar a pessoa exposta;
z Por fim, o § 2º indica causa especial de exclusão Art. 217-A [...]
da ilicitude: não há crime quando a conduta se dá § 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações
em publicação que adote recurso que impossibilite descritas no caput com alguém que, por enfermi-
identificar a vítima ou se devidamente autorizado, dade ou deficiência mental, não tem o necessá-
no caso de pessoa maior e capaz. rio discernimento para a prática do ato, ou que,
por qualquer outra causa, não pode oferecer
ESTUPRO DE VULNERÁVEL resistência.

É o primeiro dos crimes do Capítulo II, “Crimes Assim, são considerados vulneráveis (sujeitos pas-
sexuais contra vulnerável”. No caput do art. 217-A, sivos) para os fins dos crimes sexuais:
temos o estupro de vulnerável simples ou próprio:
z Art. 217-A, caput:
Art. 217-A Ter conjunção carnal ou praticar
outro ato libidinoso com menor de 14 (cator-
„ Menores de 14 anos (o Professor Rogério San-
ze) anos:
chez denomina esta vulnerabilidade absoluta).
Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

Conforme podemos notar do tipo do art. 217-A, z Art. 217-A, primeira parte:
não é necessário o constrangimento da vítima
(mediante violência ou grave ameaça): qualquer prá- „ Enfermos e doentes mentais que não pos-
tica de conjunção carnal ou outro ato libidinoso suem discernimento necessário para a prá-
com pessoa menor de 14 anos configura estupro de tica do ato sexual (Rogério Sanchez denomina
vulnerável (o constrangimento é presumido: presun- esta de vulnerabilidade relativa, uma vez que,
ção absoluta). por se tratar de critério biopsicológico, pode
Importante: a súmula nº 593, do STJ, dispõe sobre acontecer de o enfermo ou doente mental ter
o crime de estupro quando praticado com menor de o discernimento exigido para a prática do ato).
14 anos:
z Art. 217-A, parte final:
Súmula nº 593 (STJ) O crime de estupro de vulne-
rável se configura com a conjunção carnal ou prá- „ Qualquer um que, por outra causa, não pos-
tica de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo sa oferecer resistência (por exemplo, uma
irrelevante eventual consentimento da vítima para
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

pessoa que se encontra em coma ou sob efei-


a prática do ato, sua experiência sexual anterior
to de sedação; pessoa desacordada, por moti-
ou existência de relacionamento amoroso com o
agente. vo de embriaguez; vítima de golpe “boa noite
Cinderela”).
É importante mencionarmos que a idade da vítima
é elemento constitutivo do crime de estupro de vul- O parágrafo 5º, do art. 217-A, consiste em norma
nerável. Deste modo, é sabido que o erro sobre o ele- penal explicativa: aplica-se a pena do estupro de vul-
mento constitutivo do crime exclui o dolo do agente, nerável mesmo que a vítima tenha consentido com o
nos termos do § 1º, art. 20, do Código Penal — erro de ato ou ainda que já tenha praticado relações sexuais
tipo — “É isento de pena quem, por erro plenamente anteriores (ou seja, a virgindade é irrelevante).
justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato
que, se existisse, tornaria a ação legítima.”
10 HABEAS CORPUS Nº 628.870 – PR (2020/0311523-6). Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/1206298083/habeas-corpus-
-hc-628870-pr-2020-0311523-6/inteiro-teor-1206298093. Acesso em: 26 jan. 2022. 91
Art. 217-A [...] Alguns autores entendem que quo nomen juris
§ 5º As penas previstas no caput e nos §§ 1º, 3º e 4º (nome do crime) foi revogado (a redação anterior fala-
deste artigo aplicam-se independentemente do con- va em “corromper”, que foi trocada por “induzir”), e
sentimento da vítima ou do fato de ela ter mantido tratam este delito de “indução de vulnerável à lascí-
relações sexuais anteriormente ao crime.
via”. No entanto, essa divergência não traz maiores
implicações.
Os parágrafos 3º e 4º apresentam formas qualifi-
Induzir, como você já sabe, é sugerir, dar a ideia
cadas, pela ocorrência de lesão corporal grave ou de
morte: de algo a alguém. Nesta figura, o sujeito ativo é o
mediador (intermediário ou proxeneta) que induz a
Art. 217-A [...] vítima menor de 14 anos a satisfazer a lascívia (dese-
§ 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natu- jo sexual) de outrem (do beneficiário: o voyeur ou
reza grave: observador).
Pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. É importante saber que para se configurar o tipo
§ 4º Se da conduta resulta morte: do art. 218, CP, o agente deve induzir a vítima (menor
Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. de 14) a praticar algum ato que tenha a finalidade de
satisfazer a lascívia de outra pessoa (o beneficiário).
Todas as hipóteses de estupro de vulnerável (§§ Veja bem, o ato deve ser unicamente contemplativo
1º, 3º e 4º) são consideradas hediondas (conforme
(como, por exemplo, fazer a vítima vestir uma fan-
prevê o inciso VII, art. 1º, da Lei nº 8.072, de 1990).
tasia sensual ou se mostrar nua), ou seja, não ocorre
z Hediondos: contato físico entre o beneficiado e a vítima.
Este terceiro também não pode vir a filmar, foto-
„ Art. 217-A, caput (estupro de vulnerável próprio); grafar ou, de qualquer meio, registrar a cena; caso
„ Art. 217-A, § 3º (qualificada pela lesão grave); isso ocorra, vai responder pelo previsto no art. 240, do
„ Art. 217-A, § 4º (qualificada pela morte). ECA (crime mais grave, com penas de reclusão entre 4
e 8 anos, além de multa).
O art. 217-A tem os seguintes aspectos: Caso ocorra a prática de conjunção carnal ou outro
ato libidinoso envolvendo a vítima, aquele que indu-
z É crime material, consumando-se com a prática da ziu (caso tenha agido dolosamente) o beneficiado vai
conjunção carnal ou de outro ato libidinoso;
responder pelo tipo do art. 217-A (estupro de vulne-
z É cabível a tentativa;
rável). Esta é a corrente majoritária, defendida por
z Trata-se de tipo misto alternativo (lembre-se dos
Rogério Greco, Fernando Capez, Rogério Sanches, Cle-
comentários já feitos em outros crimes contra a
dignidade sexual); ber Masson, entre outros.
z Assim como comentamos no caso do estupro do
art. 213, não é necessário o contato físico entre o SATISFAÇÃO DE LASCÍVIA MEDIANTE PRESENÇA
autor e a vítima. DE CRIANÇA OU ADOLESCENTE

Por fim, cabe mencionar um tema muito inte- Art. 218-A Praticar, na presença de alguém
ressante: trata-se da chamada Exceção de Romeu menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a pre-
e Julieta. Você certamente já ouviu falar do clássico senciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso,
de William Shakespeare: Julieta é uma jovem que se a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem:
apaixona por Romeu, de uma família rival. A per- Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.
sonagem Julieta, na obra, tinha 13 anos quando se
relacionou amorosamente com Romeu (que, tinha 17 O tipo do art. 218-A pode ser divido em duas partes:
anos). Agora imagine tal situação frente à legislação
penal brasileira: Julieta se enquadraria, como vimos, z Praticar conjunção carnal ou outro ato libidinoso
no conceito de vulnerável. Segundo a teoria da Exce- apto a satisfazer o prazer sexual, na frente de víti-
ção de Romeu e Julieta, caso haja consentimento e, ma menor de 14 anos;
desde que haja pequena diferença de idade entre os
z Induzir menor de 14 a presenciar tais atos.
parceiros (normalmente se fala em até 5 anos), não
seria o caso de considerar o ato sexual, por exemplo,
Aspectos que merecem destaque:
de um casal de namorados de 13 e 18 anos, como estu-
pro. No entanto, no Brasil, conforme jurisprudência
consolidada, tal exceção não se aplica (lembre-se, z De acordo com a maior parte da doutrina, não se
de acordo com o STJ, “o consentimento da vítima, sua exige a presença física da vítima no mesmo local
eventual experiência sexual anterior ou a existência de onde ocorre a conjunção ou o ato libidinoso. Ou
relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não seja, pode ser praticado por meio virtual;
afastam a ocorrência do crime” – Resp 148.0881/PI, z É tipo misto alternativo: se o sujeito induz a pre-
julgado em 26/08/2015). senciar e também pratica os atos, responde por um
só crime;
CORRUPÇÃO DE MENORES z Não há envolvimento físico do menor de 14 anos.
Este apenas assiste à prática de libidinagem.
O art. 218, do CP, trata do crime de corrupção de
menores:
Art. 218 Induzir alguém menor de 14 (catorze)
anos a satisfazer a lascívia de outrem.
92 Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.
FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO OU DE OUTRA z O proprietário, gerente ou responsável do local
FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇA OU em que ocorre a prática do delito do caput, lem-
ADOLESCENTE OU DE VULNERÁVEL brando, claro, que devem ter conhecimento (pois
não há responsabilidade objetiva). Neste caso, a cas-
O art. 218-B tem seis núcleos: sação da licença do local é efeito obrigatório (§ 3º).

Art. 218-B Submeter, induzir ou atrair à prosti- Trata-se de crime hediondo, em todas as formas:
tuição ou outra forma de exploração sexual caput, incisos I e II, do § 2º. Agora já sabemos quais
alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, são os três os crimes contra a dignidade sexual que
por enfermidade ou deficiência mental, não tem o são hediondos:
necessário discernimento para a prática do ato,
facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone: z Art. 213, caput e §§:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos.
„ Estupro.
O art. 218-B visa punir o sujeito que insere (sub-
mete, induz ou atrai) o menor de 18 anos ou o vul- z Art. 217-A, caput e §§:
nerável (homem ou mulher) no âmbito da exploração
sexual (prostituição e turismo sexual), tráfico para
„ Estupro de vulnerável.
fins sexuais e pornografia) ou facilita sua permanên-
cia ou impede ou dificulta sua saída.
z Art. 218-B, caput e §§:
Em resumo, é trazer a vítima vulnerável para
a prostituição (ou outra forma de exploração) ou
„ Favorecimento da prostituição ou outra forma
impedir que a vítima saia desse meio (neste último
de exploração sexual de vulnerável.
caso trata-se de crime permanente).
DIVULGAÇÃO DE CENA DE ESTUPRO OU DE CENA
z Trata-se de um crime hediondo;
DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL, DE CENA DE SEXO
z O sujeito passivo é pessoa menor de 18 anos. Se
OU DE PORNOGRAFIA
a pessoa for maior de 18 anos, poderá ser confi-
gurado o crime do art. 228, do CP. Se a pessoa for
O tipo do art. 218-C é um crime subsidiário, que
menor de 14 anos, o crime será o de estupro de possui seis núcleos (tipo misto alternativo):
vulnerável;
z Crime material, se consumando no momento em Art. 218-C Oferecer, trocar, disponibilizar, transmi-
que a vítima passa a realizar atos de prostituição tir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou
ou forma de exploração sexual. divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de
comunicação de massa ou sistema de informática
Existem 4 formas de exploração sexual: ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro regis-
tro audiovisual que contenha cena de estupro ou
de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou
z Prostituição;
induza a sua prática, ou, sem o consentimento da
z Turismo sexual; vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:
z Tráfico para fins sexuais; Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato
z Pornografia. não constitui crime mais grave.

O art. 218-B só cuida da prostituição e do turismo Visa coibir qualquer tipo de divulgação de mate-
sexual envolvendo vulnerável. O tráfico é tratado pelo rial que contenha:
inciso V, art. 149-A, CP (tráfico de pessoas); a pornogra-
fia envolvendo vulnerável, pelos arts. 240, 241, 241-A z Cena de estupro ou estupro de vulnerável ou que
e 241-E, do ECA. faça apologia ou induza a prática de tais crimes;
z Cena de sexo, nudez ou pornografia, sem o consen-
Proxenetismo Mercenário timento da vítima.

Se houver a intenção do agente em obter lucro, Para os fins do art. 218-C, são vulneráveis: pessoas
aplica-se também a pena de multa: com enfermidades ou doença mental ou que não pos-
sam, por qualquer razão, oferecer resistência. Veja
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Art. 218-B [...] bem que estas devem ter mais de 18 anos! No caso da
§ 1º Se o crime é praticado com o fim de obter van- divulgação de imagens de estupro, estupro de vulne-
tagem econômica, aplica-se também multa. rável ou cenas de pornografia, nudez ou sexo, apli-
cam-se as disposições do ECA.
Bem, agora sabemos quais são os crimes contra a
Neste caso, se dá o nome ao agente de proxeneta
dignidade sexual mais importantes (Capítulos I e II) e
mercenário.
quais as divergências doutrinárias e jurisprudenciais
que são aplicados a eles. O Capítulo III, que tratava
Formas Equiparadas sobre o Rapto, está revogado.
O Capítulo IV, nos arts. 225 e 226, apresenta dis-
De acordo com o § 2º, incorre nas mesmas penas: posições gerais que se aplicam aos crimes que já
vimos até agora (do art. 213 ao 218-C). Veja a seguir.
z Quem pratica conjunção carnal ou outro ato
libidinoso com vítima vulnerável em situação z Disposições aplicáveis a todos os crimes dos Capí-
de prostituição ou exploração sexual; tulos I e II: 93
„ Procedem-se mediante ação penal pública Este crime pode ser praticado de duas formas:
incondicionada (art. 225);
„ Aumento de pena (art. 226): FALSIFICAR A MOEDA METÁLICA OU PAPEL-
MOEDA DE CURSO LEGAL NO PAÍS ESTRANGEIRO
Art. 226 [...]
I - de quarta parte, se o crime é cometido com o Neste caso, o agente cria a moeda fal-
concurso de 2 (duas) ou mais pessoas; Fabricando-a
sa ou papel-moeda
II - de metade, se o agente é ascendente, padrasto
ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companhei- Neste caso, o agente altera uma moe-
ro, tutor, curador, preceptor ou empregador Alterando-a da ou papel-moeda que são verdadei-
da vítima ou por qualquer outro título tiver ros, transformando-os em falsos
autoridade sobre ela;
IV - de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime
é praticado: Sobre o crime de moeda falsa, é importante levar
a) mediante concurso de 2 (dois) ou mais agen- em consideração o seguinte:
tes (estupro coletivo);
b) para controlar o comportamento social ou z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
sexual da vítima (estupro corretivo)
quer pessoa;
z Não admite a modalidade culposa, podendo ser
O Capítulo V apresenta 5 tipos penais (arts. 227,
praticado somente a título de dolo;
228, 229, 230 e 232-A). Sobre esses tipos, não há diver-
z Admite a tentativa;
gências doutrinárias ou jurisprudenciais, valendo a
z Segundo posicionamento doutrinário majoritário,
leitura da lei seca (note que o art. 232-A não tem nada
para configuração deste crime, a falsificação ou
a ver com dignidade sexual, tratando de migração). Os
arts. 231 e 231-A foram revogados, passando o tema a alteração não podem ser grosseiras (aquela vista a
ser tratado pelo art. 149, CP. olho nu por qualquer pessoa dotada de capacidade
O Capítulo VI traz dois tipos, o do art. 233 (ato mediana) — neste caso, estaremos diante de con-
duta que configura crime impossível em relação
obsceno) e o do art. 234 (escrito ou objeto obsceno).
ao crime de moeda falsa.
Sobre eles, além da leitura da lei, cabe mencionar que
há discussão sobre a constitucionalidade de ambos,
Contudo, caso a falsificação seja grosseira, o seu
em relação ao primeiro por violação ao princípio da
uso pode caracterizar o crime de estelionato, confor-
taxatividade (seria muito vago, subjetivo) e, quanto ao
me entendimento sumulado do STJ.
segundo, por ferir a liberdade de expressão.
Por fim, o Capítulo VII, nos arts. 234-A e 234-B,
Súmula n° 73 (STJ) A utilização de papel moeda
apresenta disposições que são aplicáveis a todo o grosseiramente falsificado configura, em tese, o
Título dos crimes contra a dignidade sexual, con- crime de estelionato, da competência da Justiça
forme observado a seguir: Estadual.

z Disposições aplicáveis a todos os crimes contra a Exige-se que a moeda metálica ou papel-moeda
dignidade sexual: tenham curso legal no país ou no estrangeiro. Caso
não tenham, ou estejam fora de circulação, não irá se
„ Aumento de pena (234-A): configurar este crime.

Art. 234-A [...] Art. 289 [...]


III - de metade a 2/3 (dois terços), se do crime resul- § 1º Nas mesmas penas incorre quem, por conta
ta gravidez; própria ou alheia, importa ou exporta, adquire,
IV - de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o agente: vende, troca, cede, empresta, guarda ou introduz
a) transmite à vítima doença sexualmente na circulação moeda falsa.
transmissível de que sabe ou deveria saber ser
portador;
b) ou se a vítima é idosa (igual ou maior de 60 anos) Importante!
ou pessoa com deficiência.
O princípio da insignificância não é aplicado aos
z Correm em segredo de justiça (234-B). crimes contra a fé pública. No crime de falsifica-
ção de moeda, pouco importa a quantidade de
E assim finalizamos o estudo dos crimes contra a moedas e o seu valor.
dignidade sexual. Agora, vamos fazer alguns exercícios
para fixar os conhecimentos adquiridos.
Sobre o crime de circulação de moeda falsa, fique
atento às seguintes informações:

z É crime de ação múltipla, que se configura com a


DOS CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA prática de quaisquer um dos verbos descritos no
tipo penal;
MOEDA FALSA z Caso o agente pratique mais de um verbo, no mes-
mo contexto fático, responderá por apenas um cri-
Art. 289 Falsificar, fabricando-a ou alterando-a, me de circulação de moeda falsa;
moeda metálica ou papel-moeda de curso legal no z O crime somente poderá ser praticado dolosamen-
país ou no estrangeiro: te, portanto, é necessário que o agente saiba ou
94 Pena - reclusão, de três a doze anos, e multa. tenha dúvida sobre a falsidade da moeda;
z Admite tentativa; § 4º Nas mesmas penas incorre quem desvia e faz
z É crime comum, que pode ser praticado por qual- circular moeda, cuja circulação não estava ainda
quer pessoa, salvo aquele que falsifica a moeda autorizada.
— não se trata de hipótese de concurso de crimes,
assim, caso o agente falsifique a moeda e a guarde, Responderá pelo crime de moeda falsa na moda-
responderá apenas pelo crime de moeda falsa. lidade qualificada o funcionário público ou diretor,
gerente ou fiscal de banco de emissão que fabrica,
Art. 289 [...] emite ou autoriza a fabricação ou emissão de moeda
§ 2º Quem, tendo recebido de boa-fé, como verda- com título ou peso inferior ao determinado em lei ou
deira, moeda falsa ou alterada, a restitui à circula- de papel-moeda em quantidade superior à autoriza-
ção, depois de conhecer a falsidade, é punido com da. Neste caso, trata-se de crime próprio, que somente
detenção, de seis meses a dois anos, e multa. poderá ser praticado pelo funcionário público ou dire-
tor, gerente ou fiscal de banco de emissão.
Se o agente recebe a moeda de boa-fé, mas, para Também pratica o delito de moeda falsa na moda-
não ficar no prejuízo, a restitui à circulação, ele res- lidade qualificada o agente que desvia e faz circular
ponderá criminalmente? moeda, cuja circulação não estava ainda autorizada.
Sim. A resposta é positiva. O crime de moeda falsa na modalidade qualificada
Neste caso, responderá o agente pelo crime de não admite a forma culposa.
circulação de moeda falsa na modalidade privilegia- Os crimes relacionados à moeda falsa são proces-
da, com uma pena bem mais branda em relação aos sados e julgados pela Justiça Federal.
outros dois tipos penais que já estudamos. A ação penal é pública incondicionada.
Sobre o crime de circulação de moeda falsa privile-
giada, fique atento ao seguinte:
Importante!
z O recebimento da moeda dá-se de boa-fé, pois o
agente acredita que é verdadeira; Tratando-se de falsificação grosseira, poderá
z A restituição à circulação deve dar-se dolosamen- caracterizar o estelionato, de competência da
te, isto é, o agente já conhece sobre a falsidade da Justiça Estadual.
moeda; E, anote: não se aplica o princípio da insignificân-
z É crime comum, que pode ser praticado por qual- cia ao crime de moeda falsa.
quer pessoa, exceto o falsificador que pratica o cri-
me de falsificar moeda;
z Admite tentativa. Crimes Assimilados ao de Moeda Falsa

Dica: Não se aplica o instituto do arrependi- Art. 290 Formar cédula, nota ou bilhete representa-
mento posterior ao crime de moeda falsa. tivo de moeda com fragmentos de cédulas, notas ou
bilhetes verdadeiros; suprimir, em nota, cédula ou
Imagine a seguinte situação: o réu utilizou uma bilhete recolhidos, para o fim de restituí-los à circu-
moeda falsa para comprar um fogão em determinado lação, sinal indicativo de sua inutilização; restituir
comércio. Descobriu-se, em momento posterior, que à circulação cédula, nota ou bilhete em tais condi-
ções, ou já recolhidos para o fim de inutilização:
se tratava de uma moeda falsa e, antes da denúncia,
Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.
o réu realizou o pagamento do fogão com uma moeda
verdadeira, evitando o prejuízo. Neste ínterim, ainda
É importante, sobre o delito assimilado à moeda
que o réu se arrependa e evite o prejuízo, o crime de
falsa:
moeda falsa já estará consumado (o dano patrimonial
é mero exaurimento do crime).
O STJ entende que a vítima do crime de moeda z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
falsa é a coletividade, não sendo passível de repara- quer pessoa;
ção. Desse modo, os crimes contra a fé pública, seme- z O crime é doloso;
lhantes aos demais crimes não patrimoniais em geral, z Não admite a modalidade culposa;
são incompatíveis com o instituto do arrependimento z Admite tentativa;
posterior, dada a impossibilidade material de haver z É processado e julgado pelo Justiça Federal,
mediante ação penal pública incondicionada;
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

reparação do dano causado ou a restituição da coisa


subtraída.11 z Trata-se de tipo penal misto alternativo, que se
O crime de moeda falsa possui formas qualificadas. consuma com a prática de quaisquer das condutas
previstas no tipo penal.
Art. 289 [...]
§ 3º É punido com reclusão, de três a quinze anos, Art. 290 [...]
e multa, o funcionário público ou diretor, gerente, Parágrafo único. O máximo da reclusão é elevado
ou fiscal de banco de emissão que fabrica, emite ou a doze anos e multa, se o crime é cometido por fun-
autoriza a fabricação ou emissão: cionário que trabalha na repartição onde o dinhei-
I - de moeda com título ou peso inferior ao determi- ro se achava recolhido, ou nela tem fácil ingresso,
nado em lei; em razão do cargo.
II - de papel-moeda em quantidade superior à
autorizada.

11 TJ. 6ª Turma. REsp 1242294-PR, Rel. originário Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 18/11/2014
(Info 554). 95
Existe a possibilidade de ser crime próprio, caso Emissão de Título ao Portador Sem Permissão Legal
seja cometido por funcionário que trabalha na repar-
tição onde o dinheiro se achava recolhido, ou nela Art. 292 Emitir, sem permissão legal, nota, bilhe-
tenha fácil ingresso, em razão do cargo. te, ficha, vale ou título que contenha promessa de
Neste caso, o máximo da reclusão é elevado a doze pagamento em dinheiro ao portador ou a que falte
indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago:
anos.
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único. Quem recebe ou utiliza como
Petrechos para Falsificação de Moeda dinheiro qualquer dos documentos referidos neste
artigo incorre na pena de detenção, de quinze dias
Art. 291 Fabricar, adquirir, fornecer, a título one- a três meses, ou multa.
roso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo,
aparelho, instrumento ou qualquer objeto espe- O crime de emissão de título ao portador sem
cialmente destinado à falsificação de moeda: emissão legal é praticado quando o agente emite, sem
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. permissão legal, nota, bilhete, ficha, vale ou título que
contenha promessa de pagamento em dinheiro ao
O objeto material deste crime é o maquinismo, portador ou a que falte indicação do nome da pessoa
aparelho, instrumento ou qualquer objeto especial- a quem deva ser pago.
mente destinado à falsificação de moeda. Considera-se menos grave a conduta de quem uti-
Embora o artigo tenha a previsão do termo “espe- liza nota, bilhete, ficha, vale ou título que contenha
cialmente”, é desnecessário o uso exclusivo do petre- promessa de pagamento em dinheiro ao portador ou
cho para falsificação de moeda. De acordo com o a que falte indicação do nome da pessoa a quem deva
Informativo n° 633, do STJ, basta que o agente detenha ser pago como dinheiro.
a posse de petrechos especialmente destinados à falsi- É importante saber, sobre o delito de emissão de
ficação de moeda, sendo prescindível que o maquiná- título ao portador legal:
rio seja de uso exclusivo para esse fim.
Dica: o uso de tais objetos, para a configuração do z Exige-se que o agente não tenha permissão legal
crime em tela, depende da análise do elemento subje- para a emissão;
z Se o agente tem permissão para emitir o título ao
tivo do tipo (dolo), de modo que, se o agente detém a
portador, o fato será atípico;
posse de impressora, ainda que manufaturada visan-
z O delito é doloso;
do ao uso doméstico, mas com o propósito de a utilizar
z Não admite a modalidade culposa;
precipuamente para contrafação de moeda, incorre
z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
no crime de petrechos para falsificação de moeda. quer pessoa.
É desnecessário que a posse de petrechos seja espe-
cificamente com o uso exclusivo para falsificação de FALSIDADE DE TÍTULOS E OUTROS PAPÉIS
moeda.12 PÚBLICOS
Temos, neste artigo, uma conduta que constitui
exceção à punição de um crime a partir do momen- Falsificação de Papéis Públicos
to em que se inicia a execução do crime. Isso porque,
caso um agente tenha a finalidade de falsificar moe- Art. 293 Falsificar, fabricando-os ou alterando-os:
da e, para isso, adquira um aparelho, mesmo que não I - selo destinado a controle tributário, papel
inicie a execução da falsificação, poderá ser responsa- selado ou qualquer papel de emissão legal destina-
bilizado criminalmente pelos atos preparatórios, que do à arrecadação de tributo;
constituem crime autônomo. II - papel de crédito público que não seja moeda
de curso legal;
Sobre o crime de petrechos para emissão de moe-
III - vale postal;
da, é importante ficar atento ao seguinte: IV - cautela de penhor, caderneta de depósito
de caixa econômica ou de outro estabelecimento
z É crime de ação múltipla, que poderá ser praticado mantido por entidade de direito público;
por meio da execução de quaisquer um dos verbos V - talão, recibo, guia, alvará ou qualquer outro
previstos no tipo penal: fabricar, adquirir, forne- documento relativo a arrecadação de rendas
cer, possuir ou guardar; públicas ou a depósito ou caução por que o
z É crime comum, que pode ser praticado por qual- poder público seja responsável;
quer pessoa; VI - bilhete, passe ou conhecimento de empresa de
transporte administrada pela União, por Estado ou
z O crime configura-se ainda que o agente pratique
por Município:
as condutas descritas no tipo penal sem finalidade Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.
onerosa;
z No verbo guardar, trata-se de crime permanente, O tipo penal do caput poderá ser praticado com a
que admite a prisão em flagrante enquanto não se falsificação de quaisquer um dos documentos vistos
cessar a permanência; acima, de duas formas: fabricando-os (neste caso, o
z O delito é doloso; agente cria um documento) ou alterando-os (o agente
z Não admite a modalidade culposa; altera documento já existente).
z Admite tentativa. Existem formas equiparadas ao crime de falsifica-
ção de papéis públicos, incorrendo o agente nas mes-
mas penas deste.
96 12 STJ. 6ª Turma. REsp 1758958-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 11/09/2018 (Info 633).
Art. 293 [...] Sobre o crime de falsificação de papéis públicos, é
§ 1º Incorre na mesma pena quem: importante levar em consideração o seguinte:
I - usa, guarda, possui ou detém qualquer dos papéis
falsificados a que se refere este artigo; z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
II - importa, exporta, adquire, vende, troca, cede, quer pessoa;
empresta, guarda, fornece ou restitui à circulação z Só admite a modalidade dolosa — não pode ser
selo falsificado destinado a controle tributário; praticado culposamente;
III - importa, exporta, adquire, vende, expõe à z Caso a falsificação seja grosseira, haverá a atipici-
venda, mantém em depósito, guarda, troca, cede,
dade deste crime;
empresta, fornece, porta ou, de qualquer forma,
z Admite a tentativa;
utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício
z Se o papel for de emissão da União, será processa-
de atividade comercial ou industrial, produto ou
mercadoria:
do e julgado pela Justiça Federal;
a) em que tenha sido aplicado selo que se destine a z Será de competência do Juizado Especial Criminal
controle tributário, falsificado; Federal nas hipóteses de crime privilegiado, defi-
b) sem selo oficial, nos casos em que a legislação nido no § 4º, art. 293, do CP.
tributária determina a obrigatoriedade de sua
aplicação. Petrechos de Falsificação
§ 2º Suprimir, em qualquer desses papéis, quan-
do legítimos, com o fim de torná-los novamente Art. 294 Fabricar, adquirir, fornecer, possuir ou
utilizáveis, carimbo ou sinal indicativo de sua guardar objeto especialmente destinado à falsifi-
inutilização: cação de qualquer dos papéis referidos no artigo
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. anterior:
§ 3º Incorre na mesma pena quem usa, depois de Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
alterado, qualquer dos papéis a que se refere o
parágrafo anterior. Sobre o crime de petrechos de falsificação, é impor-
§ 4º Quem usa ou restitui à circulação, embora tante que você saiba, para a sua prova, as seguintes
recibo de boa-fé, qualquer dos papéis falsificados informações:
ou alterados, a que se referem este artigo e o seu
§ 2º, depois de conhecer a falsidade ou alteração, z É crime de ação múltipla, que poderá ser praticado
incorre na pena de detenção, de seis meses a dois mediante a execução de qualquer um dos verbos
anos, ou multa. previstos no tipo penal: fabricar, adquirir, forne-
§ 5º Equipara-se a atividade comercial, para os fins cer, possuir ou guardar;
do inciso III do § 1º, qualquer forma de comércio
z É crime comum, que poderá ser praticado por
irregular ou clandestino, inclusive o exercido em
qualquer agente;
vias, praças ou outros logradouros públicos e em
z Entretanto, caso o crime seja praticado por fun-
residências.
cionário público, prevalecendo-se este do cargo, a
pena será aumentada da sexta parte (1/6).
O tipo penal do crime de falsificação de papéis
públicos apresenta três modalidades em que a pena
Art. 295 Se o agente é funcionário público, e come-
será mais branda se comparada ao tipo penal prin- te o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a
cipal e às formas equiparadas, que têm como pena a pena de sexta parte.
reclusão de dois a oito anos e multa:
A pena do crime de petrechos de falsificação será
z Aquele que suprimir, em qualquer dos papéis vis- aumentada de 1/6 (um sexto) se o agente é funcionário
tos anteriormente, quando legítimos, com o fim de público e comete o crime prevalecendo-se do cargo.
torná-los novamente utilizáveis, carimbo ou sinal
indicativo de sua inutilização, incorrerá na pena z Assim como o crime de petrecho para falsificação
de reclusão de um a quatro anos e multa; de moeda, o objeto deve ser destinado especial-
z Aquele que usar os papéis, depois de alterados mente para falsificar os papéis previstos no art.
(após a supressão de carimbo ou sinal indicativo 293; caso o objeto tenha outras finalidades (tem
de inutilização, quando legítimos, com o fim de outras utilidades e também serve para falsificar
torná-los utilizáveis), incorrerá na pena de reclu- papéis), não há que se falar na prática deste tipo
são de um a quatro anos e multa; penal;
z Aquele que usar ou restituir à circulação, embora
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

z Só poderá ser praticado dolosamente;


recebido de boa-fé, qualquer dos papéis falsifica- z Admite a modalidade tentada;
dos ou alterados, depois de conhecer a falsidade z No verbo guardar, trata-se de crime permanente,
ou alteração, incorrerá na pena de detenção, de protraindo-se a conduta no tempo.
seis meses a dois anos, ou multa.
FALSIDADE DOCUMENTAL
Qualquer forma de
comércio irregular ou De acordo com o art. 232, do CPP, documentos são
Equipara-se clandestino, inclusive quaisquer escritos, instrumentos ou papéis públicos
à atividade o exercido em vias, ou particulares.
comercial praças ou outros O CPP estabelece requisitos para que um papel
logradouros públicos e seja considerado documento: forma escrita, autor
em residências certo, possuir conteúdo de relevância jurídica e valor
probatório.
Vejamos os crimes deste capítulo: 97
Falsificação do Selo ou Sinal Público I - na folha de pagamento ou em documento de
informações que seja destinado a fazer prova
Art. 296 Falsificar, fabricando-os ou alterando-os: perante a previdência social, pessoa que não pos-
I - selo público destinado a autenticar atos oficiais sua a qualidade de segurado obrigatório;
da União, de Estado ou de Município;
II - na Carteira de Trabalho e Previdência Social do
II - selo ou sinal atribuído por lei a entidade de
direito público, ou a autoridade, ou sinal público de empregado ou em documento que deva produzir
tabelião: efeito perante a previdência social, declaração falsa
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. ou diversa da que deveria ter sido escrita;
§ 1º Incorre nas mesmas penas: III - em documento contábil ou em qualquer outro
I - quem faz uso do selo ou sinal falsificado; documento relacionado com as obrigações da
II - quem utiliza indevidamente o selo ou sinal
empresa perante a previdência social, declaração
verdadeiro em prejuízo de outrem ou em pro-
veito próprio ou alheio. falsa ou diversa da que deveria ter constado.
III - quem altera, falsifica ou faz uso indevido de § 4º Nas mesmas penas incorre quem omite, nos
marcas, logotipos, siglas ou quaisquer outros sím- documentos mencionados no § 3º, nome do segu-
bolos utilizados ou identificadores de órgãos rado e seus dados pessoais, a remuneração, a
ou entidades da Administração Pública. vigência do contrato de trabalho ou de prestação
§ 2º Se o agente é funcionário público, e comete de serviços.
o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a
pena de sexta parte.
A sua conduta típica é: falsificar, no todo ou em
parte, documento público, ou alterar documento
FALSIFICAÇÃO DE SELO OU SINAL PÚBLICO público verdadeiro.
Falsificar (fabricando ou alterando) O crime pode ser praticado das seguintes formas:

Selo público destinado Selo ou sinal atribuído por


a autenticar atos ofi- lei a entidade de direito Falsificar, total
Alterar documento
ciais da União, de Esta- público, ou a autoridade, ou ou parcialmente,
público verdadeiro
do ou de Município sinal público de tabelião documento público

Sobre este crime, é importante que você leve em


consideração as seguintes disposições:
Aqui, o agente cria Aqui, o agente
z É crime comum, que pode ser praticado por qual- um documento modifica o
quer pessoa; público que não documento público
z Caso o crime seja praticado por funcionário públi- existia que já existia
co, prevalecendo-se do cargo, a pena será aumen-
tada da sexta parte (aumento de 1/6);
z Só pode ser praticado dolosamente; Trata-se de falsidade material, na qual o agente
z Admite a modalidade tentada, já que se trata de cria um documento público falso ou modifica o docu-
crime plurissubsistente, quando o delito, para ser mento público verdadeiro, tornando-se falsos em seu
praticado, necessita de vários atos para atingir o aspecto material, podendo o conteúdo ser verdadeiro
resultado; ou não.
z A falsificação pode dar-se de 2 (duas formas): com São condutas equiparadas ao crime de falsificação
a fabricação (o agente cria o selo ou sinal) ou com
de documento público, incorrendo nas mesmas penas
a alteração (o agente modifica o selo ou sinal).
o agente que insere ou faz inserir, as que estão descri-
Trata-se de crime de forma livre, que pode ser pra- tas nos incisos do § 3º, do art. 297, do CP.
ticado de qualquer modo pelo agente.

Falsificação de Documento Público Importante!

Art. 297 Falsificar, no todo ou em parte, docu- Cleber Masson (2018) destaca que se a falsida-
mento público, ou alterar documento público de lançada na Carteira de Trabalho e Previdência
verdadeiro: Social relacionar-se com os direitos trabalhistas
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
do empregado, incidirá o crime definido no art.
§ 1º Se o agente é funcionário público, e comete o
crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena 49, do Decreto-lei 5.452, de 1943. Por seu turno,
de sexta parte. se a falsidade atingir a Previdência Social, estará
§ 2º Para os efeitos penais, equiparam-se a docu- caracterizado o crime tipificado no inciso II, § 3º,
mento público o emanado de entidade paraestatal,
art. 297, do CP.
o título ao portador ou transmissível por endosso,
as ações de sociedade comercial, os livros mercan-
tis e o testamento particular.
É de suma importância você saber que não se
§ 3º Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz
inserir: pode confundir a falsidade material com a falsidade
98 ideológica.
FALSIDADE MATERIAL FALSIDADE IDEOLÓGICA
O agente cria um documento falso ou modifica um docu- O agente falsifica a declaração que deveria constar no do-
mento verdadeiro cumento público ou privado, que é verdadeiro
O documento é materialmente falso O documento é materialmente verdadeiro, com o conteúdo
Altera-se o aspecto formal do documento, podendo o con- falso
teúdo ser verdadeiro ou não Altera-se o conteúdo do documento, mas o aspecto formal
Crimes: falsificação de documento público ou particular continua intacto
Por exemplo, criar uma certidão de nascimento Crime: falsidade ideológica
Por exemplo, alterar data de nascimento em certidão de
nascimento

Sobre o crime de falsificação de documento público, é importante que você leve em consideração as seguintes
informações:

z O crime é comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa;


z Na hipótese de o agente ser funcionário público e, ainda, se prevaleça do cargo para praticar o delito, a pena
será aumentada em um sexto;
z O delito é doloso, não exige fim especial;
z Não admite a modalidade culposa;
z Admite a tentativa;
z O objeto material do crime é o documento público.

É muito importante que você saiba o que é documento público, para fins de configuração deste crime, já que
existe, também, o crime de falsificação de documento particular, já que eles são apenados de formas diferentes,
sendo aquele mais grave do que este.
Para fins de concurso público, pode-se conceituar documento público como aquele emitido por funcionário
público, no exercício de suas funções, a serviço da União, estados-membros, Distrito Federal ou municípios (emi-
tido por órgãos ou entidades públicas).
Porém, o Código Penal equipara alguns outros documentos, embora emitidos por particulares, a documento
público.

z Falsificação total: criação de todo o material escrito que representa o documento;


z Falsificação parcial: há uma criação de uma parte falsa do documento público verdadeiro, a qual pode dele
ser individualizada;
z Alteração de documento público: inserir ou suprimir falsamente informações escritas no próprio corpo do
documento verdadeiro, após a sua criação.

ALTERAÇÃO FALSIFICAÇÃO PARCIAL

A falsidade diz respeito às informações falsamente inse- Parte do documento, que dele pode ser individualizada, é
ridas ou retiradas do papel, o que ocorre posteriormente à criada falsamente
criação do documento

O título ao portador é documento de crédito que não informa o seu beneficiário, a exemplo do cheque no valor
de até R$ 100,00 (cem reais). O endosso é uma forma de transferir a propriedade de um título (do endossante para
o endossatário), como os cheques em geral e as notas promissórias, que constituem exemplos de títulos transmis-
síveis por endosso.

Falsificação de Documento Público X Estelionato


NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Súmula n° 17 (STJ) Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido.

Esta súmula se refere à aplicação do princípio da consunção ou absorção. Quando o crime de falsificação de
documento público for meio para praticar o crime de estelionato, será por este absorvido.
Por exemplo, agente que, para obter ilícita vantagem em prejuízo de terceiro, altera sua carteira de identidade
verdadeira, responderá apenas pelo crime de estelionato caso a potencialidade lesiva da falsificação fique exau-
rida com a prática do estelionato.
Caso a falsificação ou alteração sejam grosseiras, haverá atipicidade deste crime, podendo configurar outra
infração penal.

Falsificação de Documento Particular

Art. 298 Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa. 99
O crime de falsificação de documento particular
A FALSIDADE IDEOLÓGICA CONFIGURA-SE DAS
é praticado quando o agente age de acordo com o SEGUINTES FORMAS:
núcleo do tipo, ou seja, falsifica, no todo ou em parte,
documento particular ou altera (segundo núcleo do Omitir, em documento Inserir ou fazer inserir, em do-
tipo) documento particular verdadeiro. público ou particular, cumento público ou particular,
declaração que dele declaração falsa ou diversa
A conduta é muito semelhante ao crime de falsifi-
devia constar da que devia constar
cação de documento público, sendo diferente no que
se refere ao objeto material do crime. Estes crimes
também se diferenciam em relação à pena cominada. A falsidade ideológica pode ser praticada tanto em
documento público quanto em documento particular,
Falsificação de documento Falsificação de documento tendo, como distinção, tão somente a pena, vejamos:
público particular
z Documento público: reclusão, de um a cinco anos,
Objeto Material: documento Objeto material: documento
público particular e multa;
z Documento particular: reclusão, de um a três
Pena: Reclusão, de dois a seis Pena: Reclusão, de um a cinco
anos, e multa.
anos, e multa anos, e multa

Em relação ao crime de falsidade ideológica, é


Já estudamos o documento público e agora esta- importante que você leve em consideração as seguin-
mos compreendendo o particular. Mas, o que é docu- tes informações:
mento particular?
Documento particular é aquele que não é docu- z Não admite a modalidade culposa — só pode ser
mento público, nem equiparado a documento públi- praticado dolosamente;
co, por exemplo, cartão de identificação de veículo de z Exige-se dolo específico (especial fim de agir): fim
moradores de condomínio residencial. de prejudicar direito, criar, obrigação ou alterar a
Neste delito, a falsidade também pode ser mate- verdade sobre fato juridicamente relevante;
rial, alterando-se a forma estrutural do documento,
z É crime comum;
podendo o conteúdo ser verdadeiro ou não.
z Caso a conduta seja praticada sem uma das finali-
É importante destacar sobre o crime de falsifica-
dades específicas (dolo específico) vistas acima, o
ção de documento particular o seguinte:
crime não irá se configurar;
z Admite a modalidade tentada nas condutas comis-
z É crime comum;
sivas, mas não admite, segundo posicionamen-
z Admite a tentativa;
to doutrinário majoritário, na conduta omissiva
z É delito doloso, sem a necessidade de exigir espe-
(omitir);
cial fim;
z Aplica-se a Súmula n° 17, do STJ: Quando o falso z Neste crime, a forma do documento segue intacta;
se exaure no estelionato, sem mais potencialidade o que se falsifica é o conteúdo das informações con-
lesiva, é por este absorvido; tidas no documento público ou particular (com a
z Na hipótese de a falsificação ser grosseira, não irá omissão de declaração ou com a declaração falsa).
se configurar este crime, mas poderá se configurar
outro tipo penal. Causas de aumento de pena (aumento da sexta
parte — 1/6):
Para fins de aplicação deste crime, equipara-se a
documento particular o cartão de crédito ou de débito. z Se o agente é funcionário público, e comete o cri-
me prevalecendo-se do cargo. Não basta que seja
Falsificação de Cartão praticado por funcionário público, para se aplicar
a causa de aumento da pena, mas, também, que ele
Art. 298 [...] se prevaleça do cargo para praticar o crime;
Parágrafo único. Para fins do disposto no caput, z Se a falsificação ou alteração é de assentamento de
equipara-se a documento particular o cartão de registro civil.
crédito ou débito.
Falso Reconhecimento de Firma ou Letra
Falsidade Ideológica
Art. 300 Reconhecer, como verdadeira, no exer-
Art. 299 Omitir, em documento público ou par- cício de função pública, firma ou letra que o não
ticular, declaração que dele devia constar, ou seja:
nele inserir ou fazer inserir declaração falsa Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o
ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de documento é público; e de um a três anos, e multa,
prejudicar direito, criar obrigação ou alterar se o documento é particular.
a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o
Este crime se configura com a prática da seguinte
documento é público, e reclusão de um a três anos,
conduta típica: reconhecer, como verdadeira, no exer-
e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de
réis, se o documento é particular. cício de função pública, firma ou letra que o não seja.
Parágrafo único. Se o agente é funcionário públi- Entenda da seguinte forma:
co, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou
se a falsificação ou alteração é de assentamento de z Firma: assinatura;
100 registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte. z Letra: manuscrito daquele que assina.
A pena do crime será distinta conforme a natureza Falsidade Material de Atestado ou Certidão
do documento:
Art. 301 [...]
z Se documento público: reclusão de um a cinco § 1º Falsificar, no todo ou em parte, atestado ou
anos, e multa; certidão, ou alterar o teor de certidão ou de atesta-
z Se documento privado: reclusão de um a três do verdadeiro, para prova de fato ou circunstância
anos, e multa. que habilite alguém a obter cargo público, isenção
de ônus ou de serviço de caráter público, ou qual-
quer outra vantagem:
Sobre o crime de falso reconhecimento de firma ou
Pena - detenção, de três meses a dois anos.
letra, você deve ficar atento ao seguinte:
§ 2º Se o crime é praticado com o fim de lucro, apli-
ca-se, além da pena privativa de liberdade, a de
z É crime próprio, que só poderá ser praticado pelo multa.
funcionário público que possui como atribuição
reconhecer firma ou letra (ex.: tabeliães); Ainda no § 1º, art. 301, do CP, temos um outro tipo
z Admite a participação de particular, desde que penal: Certidão ou Atestado Ideologicamente Falso.
conheça a condição de funcionário público do Sobre este crime, é importante levar em conside-
agente; ração o seguinte:
z Só poderá ser praticado dolosamente;
z Não exige fim especial de agir (dolo específico);
z É crime comum, que poderá ser praticado por
z Segundo posicionamento que prevalece, trata-se
qualquer pessoa;
de crime plurissubsistente, que admite, portanto,
a tentativa;
„ O crime previsto no caput deste artigo é crime
z A ação penal será pública incondicionada;
próprio (só pode ser praticado por funcionário
z Para diferenciar o crime de falso conhecimento de
público autorizado a emitir atestados ou certi-
firma ou letra, do crime de falsa perícia, devemos
dões), ao passo em que o crime do § 1º é crime
nos atentar ao contexto em que o agente está inse-
comum.
rido. No primeiro crime, o agente possui atribui-
ção para reconhecer firma ou letra, já no segundo,
z Só pode ser praticado dolosamente — não admite
o agente é o perito que falseia a perícia e pode
a forma culposa;
envolver a análise de letra (exame grafotécnico).
„ É crime não transeunte (deixa vestígios mate-
Certidão ou Atestado Ideologicamente Falso
riais), ou seja, é necessária a comprovação da
materialidade do delito por meio de perícia;
Art. 301 Atestar ou certificar falsamente, em razão
de função pública, fato ou circunstância que habi-
lite alguém a obter cargo público, isenção de ônus z Admite a modalidade tentada;
ou de serviço de caráter público, ou qualquer outra z É crime de ação múltipla, que pode ser pratica-
vantagem: do mediante a execução de quaisquer uma das
Pena - detenção, de dois meses a um ano. seguintes condutas:

Conduta típica: atestar ou certificar falsamente, „ Falsificar, no todo ou em parte, atestado ou


em razão de função pública, fato ou circunstância que certidão;
habilite alguém a obter cargo público, isenção de ônus „ Alterar o teor de certidão ou atestado
ou de serviço de caráter público, ou qualquer outra verdadeiro.
vantagem.
Sobre este crime, é importante levar em conside-
ração o seguinte: Importante!
Caso o crime tenha como finalidade a obtenção
z Trata-se de crime próprio, que só pode ser prati- de lucro (finalidade específica), será aplicada,
cado por funcionário público, em razão da função
também, a pena de multa.
pública;
z Admite o concurso de pessoas com particulares,
desde que estes conheçam sobre a situação de fun-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Falsidade de Atestado Médico


cionário público;
z Não admite a modalidade culposa; Art. 302 Dar o médico, no exercício da sua profis-
z Admite a forma tentada; são, atestado falso:
z É crime de ação múltipla, que pode se configurar Pena - detenção, de um mês a um ano.
com a prática de quaisquer um dos verbos previs- Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim
tos no tipo penal: atestar ou certificar; de lucro, aplica-se também multa.
z Para a configuração deste crime, exige-se que a
certificação ou o atestado se deem para as finali- Este crime tem como figura típica a seguinte con-
dades previstas no tipo penal: habilitar alguém a duta: dar o médico, no exercício da sua profissão, ates-
obter cargo público; isentar de ônus ou de serviço tado falso.
de caráter público, ou qualquer outra vantagem; Sobre este crime, é importante levar em consideração:
z Caso o crime tenha como finalidade a obtenção de
lucro (finalidade específica), será aplicada, além z É crime próprio, que só poderá ser praticado por
da pena privativa de liberdade, a pena de multa. médico; 101
z Não admite a forma culposa — deve ser praticado O uso de qualquer um dos documentos previstos
dolosamente; acima configura o crime de uso de documento falso,
z Não exige fim especial de agir (dolo específico), sal- respondendo o agente com a mesma pena correspon-
vo no caso de obtenção de lucro; dente à falsificação ou alteração.
z Admite a tentativa; Por exemplo, caso um agente seja surpreendido
z Caso o médico pratique a conduta com finalidade utilizando um documento público falso, será respon-
de obter lucro (dolo específico), será aplicada a ele, sabilizado com a pena de reclusão de dois a seis anos,
além da pena privativa de liberdade, a pena de e multa, mesma pena aplicada ao crime de falsificação
multa; de documento público.
z Exige-se que a conduta praticada pelo médico se Se o agente que fez uso do documento falso for o
dê no exercício da função. mesmo que o falsificou, ele será responsabilizado de
que forma?
Segundo entendimento que predomina no STJ,
Importante! neste caso, deverá o agente responder apenas por fal-
Se o médico fornece o atestado no exercício de sificação de documento público.
função pública (médico que trabalha em hospital Assim, caso o agente falsifique e use o documento
público — funcionário público), cometerá o crime falso, deverá responder apenas por aquele.
previsto no art. 301 (certidão ou atestado ideolo- De acordo com o entendimento jurisprudencial
gicamente falso). do STF e STJ, o crime de uso, quando cometido pelo
Se o médico, funcionário público, aufere vanta- próprio agente que falsificou o documento, configura
gem para emissão de atestado falso, será cons- “post factum” não punível, vale dizer, é mero exauri-
tatado o crime de corrupção passiva, presente no mento do crime de falso. Há impossibilidade de con-
capítulo “Crimes contra a Administração Públi- denação pelo crime previsto no art. 304, do Código
Penal.13
ca”, do Código Penal.
Sobre este crime, é importante saber:

É importante ressaltar também que, caso o falso z Para caracterização deste crime, não basta o mero
atestado médico seja destinado à pratica de outro cri- porte do documento falso, exigindo-se que o agen-
me, tendo o médico ciência desta circunstância, será te o use efetivamente, apresentando-o a alguém;
este responsabilizado como partícipe pelo crime mais z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
grave (princípio da consunção), restando absorvido o quer pessoa;
crime do art. 302. z É crime formal;
z Não admite a modalidade culposa — só pode ser
Reprodução ou Adulteração de Selo ou Peça praticado dolosamente;
Filatélica z Não exige fim especial de agir (dolo específico);
z Caso o agente desconheça a falsidade do documen-
Art. 303 Reproduzir ou alterar selo ou peça filaté- to e o utilize, não há que se falar na configuração
lica que tenha valor para coleção, salvo quando a deste tipo penal, já que, como visto acima, o ele-
reprodução ou a alteração está visivelmente anota- mento subjetivo é somente o dolo;
da na face ou no verso do selo ou peça:
z Prevalece o entendimento de que não admite a
Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
modalidade tentada, já que se trata de crime unis-
Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem,
para fins de comércio, faz uso do selo ou peça subsistente, perfazendo-se mediante a execução
filatélica. de um único ato (ou o agente usa o documento e
pratica o crime; ou o agente não usa o documento
O crime tipificado neste artigo foi tacitamente e o fato será atípico);
revogado pelo art. 39, da Lei nº 6.538, de 1978. z Segundo o STJ, se o documento usado for grosseira-
mente falsificado, perceptível aos olhos do homem
Uso de Documento Falso comum, não irá se configurar o crime de uso de
documento falso.
Art. 304 Fazer uso de qualquer dos papéis falsifi-
cados ou alterados, a que se referem os arts. 297 A Súmula n° 522, do STJ, diz respeito ao uso de
a 302: documento falso e o instituto da autodefesa. Vejamos:
Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.
Súmula n° 522 (STJ) A conduta de atribuir-se falsa
Vamos recordar quais são os tipos penais previstos identidade perante autoridade policial é típica, ain-
entre os arts. 297 e 302, do Código Penal: da que em situação de alegada autodefesa.

z Falsificação de documento público; A respeito da competência para processar e julgar


z Falsificação de documento particular e Falsifica- o crime de uso de documento falso, vejamos:
ção de cartão;
z Falsidade ideológica; Súmula n° 546 (STJ) A competência para proces-
z Falso reconhecimento de firma ou letra; sar e julgar o crime de uso de documento falso é
z Certidão ou atestado ideologicamente falso; firmada em razão da entidade ou órgão ao qual foi
z Falsidade material de atestado ou certidão; apresentado o documento público, não importando
z Falsidade de atestado médico. a qualificação do órgão expedidor.

102 13 (STF — AP 530 — Rel. Min. Rosa Weber — Rel. p/ Acórdão: Min. Roberto Barroso — 1ª Turma — julgado em 9-9-2014).
Assim, caso o agente utilize uma carteira de iden- alfandegária, ou usar marca ou sinal dessa natu-
tidade falsa, não será relevante para fins de análise reza, falsificado por outrem:
de competência para processo e julgamento o órgão Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
expedidor do documento (unidade da federação que Parágrafo único. Se a marca ou sinal falsificado é o
o expediu), mas sim o órgão ou entidade ao qual foi que usa a autoridade pública para o fim de fiscali-
apresentado o documento. zação sanitária, ou para autenticar ou encerrar
Caso o agente apresente o documento falso a um determinados objetos, ou comprovar o cumprimen-
órgão ou entidade federais, a exemplo da Polícia Rodo- to de formalidade legal:
Pena - reclusão ou detenção, de um a três anos, e
viária Federal e do INSS, a competência para processo
multa.
e julgamento será da Justiça Federal. Se o documento
falso for apresentado a órgão ou entidade estaduais, a
Trata-se de crime de ação múltipla, que pode ser
exemplo das polícias civis ou da SANEAGO, o processo
praticado mediante a execução dos verbos:
e julgamento será de competência da Justiça Estadual.
z Falsificar;
Supressão de Documento
z Usar.
Art. 305 Destruir, suprimir ou ocultar, em benefício
próprio ou de outrem, ou em prejuízo alheio, docu- Responderá o agente com uma pena mais branda,
mento público ou particular verdadeiro, de que não podendo ser reclusão ou detenção, de um a três anos,
podia dispor: e multa, se a marca ou sinal falsificado é o que usa a
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa, se o autoridade pública para o fim de:
documento é público, e reclusão, de um a cinco
anos, e multa, se o documento é particular. z Fiscalização sanitária;
z Autenticar ou encerrar determinados objetos;
Trata-se de crime de ação múltipla, que poderá ser z Comprovar o cumprimento de formalidade legais.
praticado com a execução das seguintes condutas:
Sobre este crime, é importante levar as seguintes
z Destruir, Suprimir e Ocultar: documento público informações para a sua prova:
ou particular verdadeiro, de que não podia dispor,
em benefício próprio ou de outrem, ou em prejuí- z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
zo alheio. quer pessoa;
z Não admite a modalidade culposa — só pode ser
A pena do crime será diferente, a depender da praticado dolosamente;
natureza do documento destruído, suprimido ou z Não exige dolo específico;
ocultado. z Admite a forma tentada, salvo quando executado
por meio verbo usar.
z Documento público: reclusão, de dois a seis
anos, e multa; Dica
z Documento particular: reclusão, de um a cinco
anos, e multa. Falsificar, fabricando-o ou alterando-o, admite
tentativa.
Em relação aos tipos penais que apresentam penas Usar não admite tentativa.
como visto acima, você deve ter um cuidado redobra-
do ao analisar o tipo penal e possíveis questões de pro- Falsa Identidade
va sobre o tema.
Sobre este crime, faz-se necessário ficar atento às Art. 307 Atribuir-se ou atribuir a terceiro fal-
seguintes informações: sa identidade para obter vantagem, em proveito
próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem:
z É crime comum, que pode ser praticado por qual- Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa,
quer agente; se o fato não constitui elemento de crime mais
z Não admite a modalidade culposa; grave.
z É necessário que o agente pratique as condutas des-
critas no tipo penal em benefício próprio ou alheio Figura típica: atribuir-se, ou atribuir a terceiro, fal-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

ou em prejuízo alheio (finalidade específica); sa identidade para obter vantagem, em proveito pró-
z Exige-se, para configuração deste tipo penal, que o prio ou alheio, ou para causar dano a outrem.
agente não possa dispor do documento público ou O crime pode ser praticado das seguintes formas:
particular;
z Admite a tentativa. FALSA IDENTIDADE

OUTRAS FALSIDADES Atribuir-se Atribuir a Terceiro

O agente atribui a falsa O agente atribuiu falsa iden-


Falsificação do Sinal Empregado no Contraste de identidade a si próprio tidade a uma outra pessoa
Metal Precioso ou na Fiscalização Alfandegária, ou
para Outros Fins
Neste crime, o agente se passa por uma outra pessoa.
Art. 306 Falsificar, fabricando-o ou alterando-o, Por exemplo, um indivíduo, chamado Tício, saben-
marca ou sinal empregado pelo poder público do que se encontra, em seu desfavor, um mandado de
no contraste de metal precioso ou na fiscalização prisão em aberto, com a finalidade de não ser preso 103
e de que não se descubra a sua condição de procura- Pena - detenção, de quatro meses a dois anos, e
do, ao ser abordado por uma equipe policial, atribui a multa, se o fato não constitui elemento de crime
si próprio o nome de Mévio, contra quem não existe mais grave.
nenhuma medida judicial.
Vejamos: no exemplo acima, configurou-se o crime Este crime pode ser praticado das seguintes
de falsa identidade, já que o agente, com a finalidade formas:
de obter proveito próprio, atribuiu a si mesmo falsa
identidade. z Quando o agente faz uso de documento de identi-
Mas o fato de Tício se atribuir falsa identidade ficação alheio;
para evitar prisão não está de acordo com o princípio z Quando o agente cede, para que outro utilize,
do Direito Processual Penal, que permite que o indi- documento de identificação próprio ou alheio.
víduo não seja compelido a produzir provas contra
si mesmo, podendo, inclusive, mentir? Caso ele seja
O tipo penal apresenta hipótese de interpretação ana-
responsabilizado penalmente, não haveria violação
lógica, já que exemplifica quais são os documentos de
ao princípio da não autoincriminação?
identidade, a exemplo do passaporte, título de eleitor e
Por muito tempo, este assunto foi divergente.
O entendimento que predomina atualmente é o de caderneta de reservista (fórmulas casuísticas), e, por fim,
que a responsabilização penal por falsa identidade, amplia as possibilidades ao utilizar a expressão “qual-
ainda que diante de situação de alegada autodefesa, quer documento de identidade (fórmula genérica)”.
não viola o princípio da não autoincriminação, sendo, Sobre este crime, é importante que você leve para
portanto, fato típico. a sua prova o seguinte:
Importante:
z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
Súmula n° 522 (STJ) A conduta de atribuir-se falsa quer indivíduo;
identidade perante autoridade policial é típica, ain- z Para que o delito se configure, basta que o agente
da que em situação de alegada autodefesa. atue com dolo, sendo desnecessário o fim especial
de agir;
Sobre o crime de falsa identidade, é importante z Não admite a modalidade culposa — só pode ser
que você leve em consideração: praticado dolosamente;
z Admite-se a modalidade tentada;
z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
z É crime subsidiário, não respondendo o agente
quer pessoa;
por ele se o fato constituir elemento de crime mais
z Não admite a modalidade culposa — o elemento
grave.
subjetivo exigido é sempre o dolo;
z Exige dolo específico: o agente deve praticar a con-
duta com o fim de obter vantagem, em proveito Os crimes a seguir apresentam condutas bastante
próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem; parecidas. Cuidado para não as confundir:
z Não admite tentativa. Parte da doutrina admite-a,
ainda que de difícil configuração, caso o crime seja FALSIFICAÇÃO
Conduta: falsificar, no todo ou em parte, docu-
DE DOCUMENTO
praticado de forma escrita; PÚBLICO OU
mento público ou particular ou alterar documen-
z É crime formal, que se consuma independente- to público ou particular verdadeiro
PARTICULAR
mente de o agente conseguir obter a vantagem ou
Conduta: fazer uso de qualquer dos papéis fal-
efetivamente causar dano;
USO DE DOCU- sificados ou alterados, a que se referem os arts.
z Trata-se de crime subsidiário, respondendo o MENTO FALSO 297 a 302 (incluindo documento público ou
agente por ele apenas se o fato não constituir ele- particular)
mento de crime mais grave;
Conduta: atribuir-se, ou atribuir a terceiro, falsa
FALSA
identidade para obter vantagem, em proveito
IDENTIDADE
Dica próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem

O crime de falsa identidade é subsidiário, e só Conduta: usar, como próprio, passaporte, título
será cabível quando o fato não constituir ele- USO DE DOCU- de eleitor, caderneta de reservista ou qualquer
MENTO DE IDEN- documento de identidade alheia ou ceder a ou-
mento de crime mais grave. Desta feita, caso TIDADE ALHEIO trem, para que dele se utilize, documento dessa
o indivíduo, valendo-se da falsa identidade, natureza, próprio ou de terceiro
obtenha efetivamente a vantagem indevida em
prejuízo alheio, estará configurado o crime de
Fraude de Lei Sobre Estrangeiro
estelionato.
Art. 309 Usar o estrangeiro, para entrar ou perma-
z Não se exige que o agente atribua a si ou a tercei-
necer no território nacional, nome que não é o seu:
ro nome de pessoa real, podendo ocorrer caso o
Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
nome seja inexistente.
Parágrafo único. Atribuir a estrangeiro falsa qua-
lidade para promover-lhe a entrada em território
Uso de Documento de Identidade Alheia
nacional:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Art. 308 Usar, como próprio, passaporte, título de
eleitor, caderneta de reservista ou qualquer docu-
mento de identidade alheia ou ceder a outrem, Trata-se de crime bastante parecido com o crime
para que dele se utilize, documento dessa nature- de falsa identidade, porém, com este não se confunde.
104 za, próprio ou de terceiro:
DIFERENÇAS
Suponha que Augusto, brasileiro nato, preste-se a
figurar como proprietário de empresa jornalística e
Fraude de Lei sobre
Falsa Identidade de radiodifusão sonora e de sons e imagens, que, na
Estrangeiro
verdade, pertence a Alfred, estadunidense nato.
Crime Finalidade Crime próprio Finalidade Vejamos, a conduta praticada por Augusto configu-
comum, que específica: que só pode específica:
ra o tipo penal previsto no art. 310, do CP, podendo ele
pode ser obter ser praticado entrar ou
praticado vantagem pelo permanecer ser incurso nas penas de detenção, de seis meses a três
por qualquer em proveito estrangeiro no território anos, e multa.
pessoa próprio ou nacional Sobre o crime previsto no art. 310, é importante
alheio, ou levar em consideração:
para causar
dano a z É crime próprio, que só poderá ser praticado por
outrem
brasileiro, seja nato ou naturalizado;
z Não admite a modalidade culposa — só pode ser
z Forma simples: usar o estrangeiro, para entrar ou praticado dolosamente;
permanecer no território nacional, nome que não z Não exige fim especial de agir (dolo específico);
é o seu. z É necessário que o agente saiba que a propriedade
ou posse dos bens seja proibida por lei ao estran-
„ Detenção, de um a três anos, e multa. geiro (lembre-se de que o crime não admite a for-
ma culposa);
z Forma qualificada: atribuir a estrangeiro falsa z Admite tentativa.
qualidade para promover-lhe a entrada em terri-
tório nacional. Adulteração de Sinal Identificador de Veículo
Automotor
„ Reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Art. 311 Adulterar ou remarcar número de chassi
Sobre este crime, é importante que você leve em ou qualquer sinal identificador de veículo auto-
consideração as seguintes informações: motor, de seu componente ou equipamento:
Pena - reclusão, de três a seis anos, e multa.
z É crime próprio; § 1º Se o agente comete o crime no exercício da fun-
z Não admite a modalidade culposa — só poderá ser ção pública ou em razão dela, a pena é aumenta-
praticado dolosamente; da de um terço.
z Exige finalidade especial de agir (dolo específico):

„ Forma simples: entrar ou permanecer no terri- Importante!


tório nacional; Este crime apresenta uma causa de aumento de
„ Forma qualificada: promover a entrada do
pena, ou seja, a pena será aumentada de um ter-
estrangeiro no território nacional.
ço se o agente cometer o crime no exercício da
função pública ou em razão dela.
z Não admite a modalidade tentada;
z Caso o estrangeiro tente entrar ou permanecer no
território nacional utilizando-se de documento Art. 311 [...]
falso, irá responder pelo art. 304, do Código Penal § 2º Incorre nas mesmas penas o funcionário
(uso de documento falso); público que contribui para o licenciamento ou
z Caso pratique as duas condutas, irá responder registro do veículo remarcado ou adulterado,
pelos crimes em concurso. fornecendo indevidamente material ou infor-
mação oficial.
Falsidade em Prejuízo da Nacionalização da
Sociedade Incorrerá nas mesmas penas (forma equiparada) o
funcionário público que contribui para o licenciamen-
Art. 310 Prestar-se a figurar como proprietário ou to ou registro do veículo remarcado ou adulterado,
possuidor de ação, título ou valor pertencente a fornecendo indevidamente material ou informação
oficial.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

estrangeiro, nos casos em que a este é vedada por


lei a propriedade ou a posse de tais bens: Neste caso, trata-se de crime próprio, que só pode-
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa. rá ser praticado pelo funcionário público.
Sobre o crime de adulteração de sinal identifica-
Este crime tipifica a conduta daquele que figura dor de veículos, fique atento ao seguinte:
como “laranja” de estrangeiro, que age como proprie-
tário ou possuidor de valores, ações ou títulos que, z Em regra, é crime comum, que pode ser praticado
na verdade, pertencem a um estrangeiro, já que a lei por qualquer pessoa;
proíbe a este a propriedade ou a posse. z O aumento de pena é aplicável no caso de ser pra-
Por exemplo, a Constituição Federal estabelece ticado por funcionário público no exercício da fun-
que a propriedade de empresa jornalística e de radio- ção ou em razão dela e à forma equiparada, que
difusão sonora e de sons e imagens é privativa de bra- constitui crime próprio;
sileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, z Trata-se de crime instantâneo;
não podendo o estrangeiro ser proprietário de uma z Este crime não é permanente. Portanto, a sua con-
dessas empresas. duta não se prolonga no tempo; 105
z Não admite a modalidade culposa — só será prati- avaliação ou exame públicos; processo seletivo
cado com dolo; para ingresso no ensino superior; ou exame ou
z Não exige dolo específico; processo seletivo previstos em lei;
z Admite a modalidade tentada. z Forma qualificada: se da ação ou omissão resultar
dano à administração pública;
DAS FRAUDES EM CERTAMES DE INTERESSE z Forma majorada: a pena será aumentada de 1/3 (um
PÚBLICO terço) se o fato é cometido por funcionário público.

Fraudes em Certames de Interesse Público Sobre este crime, é importante ficar atento às
seguintes informações:
Art. 311-A Utilizar ou divulgar, indevidamente,
com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de com- z Este crime se aplica a certames de interesse públi-
prometer a credibilidade do certame, conteúdo sigi- co de maneira geral, e não apenas a concursos
loso de: públicos em sentido estrito;
I - concurso público; z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
II - avaliação ou exame públicos; quer pessoa.
III - processo seletivo para ingresso no ensino supe-
rior; ou É comum acharem que se trata de crime próprio,
IV - exame ou processo seletivo previstos em lei: que só pode ser praticado por funcionário público.
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Contudo, não é crime próprio. Na verdade, para este
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem permite ou
crime, a condição de funcionário público não é ele-
facilita, por qualquer meio, o acesso de pessoas não
mentar, constituindo, contudo, causa de aumento de
autorizadas às informações mencionadas no caput.
§ 2º Se da ação ou omissão resulta dano à adminis- pena de 1/3 (um terço).
tração pública: Vejamos os pontos importantes deste crime:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.
§ 3º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o fato é z Não admite a modalidade culposa — só pode ser
cometido por funcionário público. praticado dolosamente;
z Exige fim especial de agir (dolo específico): fim de
Este tipo penal foi editado para proteger a lisura beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a
dos certames de interesse público. credibilidade do certame;
Este crime tem como figura típica a prática da z Trata-se de crime formal, que se consuma com a
seguinte conduta: utilizar ou divulgar, indevidamen- mera divulgação ou utilização das informações
te, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de sigilosas, ainda que o agente não consiga benefi-
comprometer a credibilidade do certame, conteúdo ciar a si ou a terceiro ou não consiga comprometer
sigiloso de: a credibilidade do certame público;
z Admite a forma tentada;
z Concurso público (segundo Sanches, instrumento z Caso o agente promova a utilização ou divulgação
de acesso a cargos e empregos públicos); das informações sigilosas devidamente (com justa
z Avaliação ou exame públicos (segundo Sanches, causa), não há que se falar na prática deste crime.
abrange, por exemplo, os exames psicotécnicos);
z Processo seletivo para ingresso no ensino superior REFERÊNCIAS
(conforme Sanches, engloba vestibulares e outras
formas de avaliação para ingresso no ensino supe- CAPEZ, F. Curso de Direito Penal. Vol. 1, 19. ed.
rior, a exemplo do ENEM); São Paulo: Saraiva, 2016.
z Exame ou processo seletivo previstos em lei (con- CUNHA, R. S. Pacote Anticrimes — Lei 13.964, de
forme ensina Rogério Sanches, a exemplo do exa- 2019: Comentários às Alterações no CP, CPP e LEP.
me da OAB). Salvador: Juspodium, 2020.
GONÇALVES, V. E. R. Direito penal esquematiza-
do: parte especial. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
FRAUDES EM CERTAMES DE INTERESSE PÚBLICO JESUS, D. de. Código Penal Anotado. 22. ed. São
Paulo: Saraiva, 2017.
Conduta: utilizar ou divulgar, indevidamente, com o MASSON, C. Código Penal Comentado. 2. ed. São
fim de beneficiar a si ou a outrem, ou comprometer a Paulo: Método, 2019.
credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de:

Processo Exame ou
Concurso Avaliação ou seletivo para processo DOS CRIMES CONTRA A
público exame públicos ingresso no seletivo previsto
ensino superior em lei ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
CRIMES PRATICADOS POR FUNCIONÁRIOS
O crime de fraude em certames de interesse pública PÚBLICOS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL
apresenta uma forma equiparada, uma forma qualifi-
cada e uma forma majorada (com aumento de pena): Nos crimes contra a Administração Pública, o bem
jurídico genericamente tutelado é a moralidade ou
z Forma equiparada: incorre nas mesmas penas o probidade administrativa.
agente que permite ou facilita, por qualquer meio, Tratam-se de crimes próprios, que exigem uma
o acesso de pessoas não autorizadas às informa- condição especial do sujeito ativo: ser funcionário
106 ções sigilosas relacionadas a concurso público; público.
Os crimes praticados por funcionário público con- z Emprego público, por sua vez, é a função pública
tra a administração em geral são chamados de crimes exercida em caráter temporário ou extraordinário
funcionais. Os crimes funcionais são aqueles prati- (por exemplo, diarista que presta serviço de faxi-
cados contra a Administração Pública por indivíduo na em uma repartição pública). Assim, obtém-se
que se encontra investido em uma função pública. São por exclusão o conceito de emprego público como
divididos em funcionais próprios, ou puros, e funcio- sendo todo aquele que não se classifica como cargo
nais impróprios, ou impuros. público;
Os crimes funcionais próprios são aqueles que z Função pública é toda e qualquer atividade que
serão atípicos caso não sejam praticados por funcio- realiza os fins próprios do Estado (por exemplo,
nários públicos. Segundo a doutrina, neste caso, ocor- perito judicial, estagiário do Ministério Público ou
rerá uma hipótese de atipicidade absoluta. da Defensoria Pública ou de qualquer outro órgão
Os crimes funcionais impróprios são aqueles que público, juiz de direito, Presidente da Repúbli-
serão desclassificados para outras infrações penais ca, Governador de Estado, escreventes, Prefeitos,
caso não sejam praticados por funcionários públicos. vereadores, faxineiros do fórum etc.).
Segundo a doutrina, neste caso, ocorrerá uma hipóte-
se de atipicidade relativa. Além dos dispositivos legais, é importante termos
Já a conduta que define o crime de peculato-furto, ciência de alguns julgados que estabelecem que são
praticada por meio do verbo subtrair, será desclassi- considerados funcionários públicos para fins penais:
ficada para o crime de furto, caso não seja praticada
por um funcionário público. z Diretor de organização social;14
O Código Penal, em seu art. 327, define o que é fun- z Administrador de Loteria;15
cionário público. Vejamos: z Advogados dativos;16
z Médico de hospital particular credenciado/conve-
Art. 327 Considera-se funcionário público, para os niado ao SUS;17
efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou z Estagiário de órgão ou entidade públicos.18
sem remuneração, exerce cargo, emprego ou fun-
ção pública. Nestes termos, não são considerados funcionários
§ 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce públicos para fins penais os depositários judiciais.19
cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, No § 2º, do art. 327, o Código Penal apresenta uma
e quem trabalha para empresa prestadora de ser-
causa de aumento de pena aplicável a todos os crimes
viço contratada ou conveniada para a execução de
praticados por funcionário público contra a adminis-
atividade típica da Administração Pública.
tração em geral. Observe:
§ 2º A pena será aumentada da terça parte quan-
do os autores dos crimes previstos neste Capítu- A pena será aumentada de 1/3 (terça parte) quan-
lo forem ocupantes de cargos em comissão ou de do os autores dos crimes praticados por funcionário
função de direção ou assessoramento de órgão da público contra a administração em geral forem ocu-
administração direta, sociedade de economia mis- pantes de cargos em comissão ou de função de direção
ta, empresa pública ou fundação instituída pelo ou assessoramento de órgão da administração direta,
poder público. sociedade de economia mista, empresa pública ou fun-
dação instituída pelo poder público.
É importante saber que a pena não será aumen-
Importante! tada caso o funcionário público ocupe cargo em
comissão ou função de direção ou assessoramento em
Para o Direito Penal, funcionário público é aquele autarquias, por falta de previsão legal. Lembre-se de
que, embora transitoriamente ou sem remunera- que o nosso ordenamento jurídico não admite a ana-
ção, exerce cargo, emprego ou função pública. logia para prejudicar o agente.
Como é possível de se observar, o conceito de Não podemos deixar de tratar do concurso de pes-
funcionário público é bastante amplo. No § 1º, soas nos crimes funcionais.
art. 327, o Código Penal equipara a funcionário Os crimes funcionais são crimes próprios, à medi-
público quem exerce cargo, emprego ou função da que o autor deve ser funcionário público e, em
em entidade paraestatal, e quem trabalha para regra, não podem serem praticados por qualquer pes-
empresa prestadora de serviço contratada ou soa. Todavia, admitem a participação e a coautoria,
conveniada para a execução de atividade típica bem como a autoria mediata.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

da Administração Pública. Os crimes funcionais são próprios, porém admi-


tem a coautoria de particular, sendo possível que este
venha a ser responsabilizado por delito funcional
O art. 327, do CP, faz menção a cargo público, contra a Administração Pública, desde que pratique a
emprego público e função pública. Vamos distinguir: infração penal em concurso com funcionário público
e que tenha conhecimento desta qualidade.
z Cargo público é o criado por lei, com nomencla- Isso é decorrente da teoria monista ou unitária da
tura e número certo, junto à administração direta; ação, prevista nos arts. 29 e 30, do CP, segundo a qual
14 STF. 1ª Turma. HC 138484/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 11/9/2018 (Info 915).
15 STJ. 5ª Turma. AREsp 679.651/RJ, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 11/09/2018.
16 STJ. 5ª Turma. HC 264.459- SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 10/3/2016 (Info 579).
17 STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1101423/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 06/11/2012.
18 STJ. 6ª Turma. REsp 1303748/AC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 25/06/2012.
19 STJ. 6ª Turma. HC 402949-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 13/03/2018 (Info 623). 107
todo aquele que concorre para o crime responde para z O sujeito passivo é a Administração Pública; con-
o mesmo crime. tudo, no caso de bem particular, o dono do bem
Vamos exemplificar: José, funcionário público, também será sujeito passivo do delito.
convida seu amigo de infância, Jonas, para juntos
subtraírem um computador na repartição pública em O peculato-desvio ocorrerá quando o funcioná-
que aquele trabalha. O funcionário público obteria rio público desviar, em proveito próprio ou alheio,
facilidades para praticar o crime, já que havia ficado dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, públi-
com a chave da repartição naquele período. No dia co ou particular. O funcionário público dá destinação
determinado, os agentes vão ao local e subtraem o diversa ao bem que está sob sua responsabilidade;
computador. esse desvio será necessariamente em proveito próprio
No exemplo apresentado, tanto José quanto Jonas ou alheio.
Segundo posicionamento majoritário (apesar de
responderão pelo crime de peculato (vamos estudar
algumas posições jurisprudenciais em sentido con-
suas características a seguir), já que praticaram a condu-
trário), para que se configure o peculato-desvio, é
ta em concurso de pessoas e a condição de caráter pes-
necessário que o bem seja desviado para integrar o
soal (ser funcionário público) comunica-se aos demais
patrimônio do próprio funcionário público ou de ter-
agentes (é necessário que eles conheçam a condição). ceiros, não se configurando o tipo penal caso ocorra
Vejamos agora cada um dos crimes funcionais: mero desvio de finalidade.
Uma parte minoritária da doutrina defende que,
Peculato para que se configure o peculato-desvio, não é neces-
sária a intenção de assenhoramento (apoderar-se) por
Art. 312 Apropriar-se o funcionário público de parte do funcionário público, podendo se configurar
dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, com o mero uso irregular da coisa pública, em provei-
público ou particular, de que tem a posse em to próprio ou alheio.
razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito pró- Com base no que foi exposto acima, é importante
prio ou alheio: mencionar que o peculato de uso, em regra, é conside-
Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa. rado figura atípica.
§ 1º Aplica-se a mesma pena, se o funcionário públi- Segundo Cleber Masson, o uso momentâneo de coi-
co, embora não tendo a posse do dinheiro, valor sa infungível, sem a intenção de incorporá-la ao patri-
ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja mônio pessoal ou de terceiro, seguido da sua integral
subtraído, em proveito próprio ou alheio, valen- restituição a quem de direito, é atípico.
do-se de facilidade que lhe proporciona a qua- É necessário sabermos o que significa infungível.
lidade de funcionário.
O art. 85, do CC, dispõe que são fungíveis os móveis
que podem substituir-se por outros da mesma espécie,
O crime de peculato, previsto no art. 312, do CP, é qualidade e quantidade.
dividido doutrinariamente da seguinte forma: O Código Civil não define os bens infungíveis,
mas podemos compreender que são os bens que não
z Peculato próprio: podem ser substituídos por outros da mesma espécie,
quantidade e qualidade.
„ Peculato-apropriação; É importante mencionar que é necessário, para
„ Peculato-desvio. que não seja típica a conduta do peculato de uso, que
o bem seja infungível e não consumível, a exemplo de
z Peculato impróprio: um carro oficial ou de um computador.
Caso o bem seja fungível e consumível, a exemplo
„ Peculato-furto. do dinheiro, a conduta será típica.
Se a conduta relacionada ao peculato de uso for
z Peculato culposo; praticada por Prefeito, o fato será típico, independen-
z Peculato mediante erro de outrem (peculato temente da natureza do bem, por expressa previsão
estelionato). legal no inciso II, art. 1º, do Decreto-Lei nº 201, de 1967.
O administrador que desconta valores da folha de
O peculato-apropriação configurar-se-á quando pagamento dos servidores públicos para quitação de
empréstimo consignado e não os repassa à instituição
o funcionário público se apropriar de dinheiro, valor
financeira pratica peculato-desvio, sendo desnecessá-
ou qualquer outro bem móvel, público ou particular,
ria a demonstração de obtenção de proveito próprio
de que tem a posse em razão do cargo; por exemplo,
ou alheio, bastando a mera vontade de realizar o
vereador que se apropria de bens (aparelho de celu-
núcleo do tipo.20 Deste modo, podemos constatar que
lar, notebook) do qual tem posse em razão do cargo basta a destinação diversa daquela que deveria ter o
(eletivo) que ocupa. bem para que se consume o crime de peculato-desvio.
É muito importante que você fique atento, em rela- A obtenção de vantagem indevida é mero exaurimen-
ção ao peculato-apropriação, ao seguinte: to do crime. Trata-se de crime formal.
O peculato-furto configurar-se-á quando o funcio-
z Para que se configure, é necessário que o agente nário público, embora não tendo a posse do dinhei-
tenha a posse do bem em razão do seu cargo; ro, valor ou bem, subtrai-lo ou, concorre para que ele
z O bem pode ser público ou particular (imagine um seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valen-
objeto particular — notebook — apreendido em do-se de facilidade proporcionada pela qualidade de
uma delegacia de polícia); funcionário.
20 APn 814-DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Rel. Acd. Min. João Otávio de Noronha, Corte Especial, por maioria, julgado em 06/11/2019,
108 DJe 04/02/2020.
O peculato-furto pode ser praticado de duas Dos crimes praticados por funcionário público
formas: contra a administração em geral, o peculato é o úni-
co que prevê expressamente a possibilidade de ser
z Subtraindo o dinheiro, valor ou bem; cometido na modalidade culposa.
z Concorrendo para que seja subtraído o dinheiro, No peculato culposo, o funcionário público não
valor ou bem. tem intenção em praticar o crime, contudo, por culpa,
acaba concorrendo para a subtração da coisa.
É importante mencionar que: Neste sentido, Damásio ensina que no peculato
culposo podem ocorrer as seguintes situações:
z Para que se configure este crime, é necessário que
o funcionário público não tenha a posse da coisa; z Um funcionário, por culpa, concorre para que
z O primeiro é o verbo “subtrair”, que é o fato de o bem outro funcionário cometa peculato (caput ou § 1º);
ser arrebatado pelo próprio funcionário público; z Um funcionário, por culpa, concorre para que
z O segundo é o verbo “concorrer”, que significa outro funcionário ou um particular cometam o
induzir, instigar ou auxiliar uma outra pessoa a fato;
realizar a subtração (por exemplo, o funcionário z Um funcionário, por culpa, concorre para que um
público distrai os demais para que o seu amigo, particular cometa o fato (furto etc.).
que é ladrão, ingresse na repartição para surru-
piar os bens); Vejamos: José, agente de polícia legislativa, esque-
z Para que se configure o peculato-furto, é necessá- ce, por omissão, já que queria assistir a um jogo de
rio que o ato seja doloso; futebol, de trancar uma porta da Câmara Legislativa
z A qualidade de funcionário público deve acarretar do Distrito Federal, ao qual somente ele tem acesso.
alguma facilidade para a subtração da coisa. Caso No ambiente em que a porta se encontra, há vários
não haja facilidade, o agente responderá por furto objetos de valor considerável para o Poder Legislativo
normalmente. distrital. Simba, também policial legislativo, aprovei-
tando-se do fato de a porta estar aberta, ingressa no
Vamos trazer dois exemplos: local e subtrai uma câmera fotográfica.
Exemplo 1: Carlos é funcionário público. Certo Neste exemplo, José poderá ser responsabiliza-
dia, na hora de sair, valendo-se do fato de estar sozi- do criminalmente pelo crime de peculato culposo, já
nho na repartição, Carlos subtrai um notebook do que concorreu culposamente para o crime de outrem
órgão público. Está certamente configurado o crime (peculato-furto de Simba). O agente foi omisso ao dei-
de peculato-furto, já que a condição de funcionário xar de trancar a porta, fator que contribuiu para a
público de Carlos foi uma facilidade para que ele sub- prática da subtração.
traísse o bem.
Exemplo 2: Michele é funcionária pública de Tri- Art. 312 […]
bunal Federal. Certo dia, ao passar em frente a uma § 3º No caso do parágrafo anterior, a reparação do
escola que se encontra próxima a sua casa, Michele dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a
percebe que o vigilante esqueceu a porta dos fundos punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a
aberta, estando próximo um aparelho celular da esco- pena imposta.
la. Michele entra pela porta e subtrai o aparelho. Não
há que se falar em peculato-furto, já que a qualidade Sobre o peculato culposo, é importante saber que o
de funcionária pública de Michele em nada contri- § 3º, do art. 312, do CP, dispõe que:
buiu para a prática da subtração, podendo qualquer
pessoa, na mesma situação, praticar a conduta deli- z Se a reparação do dano resultante do peculato cul-
tuosa apresentada pelo exemplo. Michele responderá poso ocorrer antes de a sentença transitar em jul-
pelo crime de furto. gado, extingue a punibilidade;
Observe que: z Se a reparação do dano resultante do peculato cul-
poso ocorrer após a sentença transitar em julgado,
z Admite a modalidade tentada, já que se trata de a pena será reduzida da metade.
crime plurissubsistente (atos múltiplos, ou seja, o
Art. 313 Apropriar-se de dinheiro ou qualquer uti-
autor entra no local, o autor subtrai a coisa);
lidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro
z O bem subtraído pode ser público ou particular; de outrem:
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

z O sujeito passivo é a administração pública. Caso Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
o bem seja particular, também será sujeito passivo
da infração penal o dono do bem; O peculato mediante erro de outrem está previs-
z É crime material. to no art. 313, do CP, configurando-se quando o funcio-
nário público se apropriar de dinheiro ou qualquer
Peculato Culposo utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro
de outrem.
Art. 312 […] Parte da doutrina chama esta modalidade de
§ 2º Se o funcionário concorre culposamente peculato-estelionato.
para o crime de outrem: Sujeito ativo é o funcionário público que, por erro
Pena - detenção, de três meses a um ano. de outrem, toma posse de um bem móvel, em razão
da função, apropriando-se do mesmo. O terceiro que
O peculato culposo, previsto no § 2º, art. 312, con- induz o funcionário a apropriar-se do bem que rece-
figura-se quando o funcionário público concorre cul- beu por erro será partícipe deste delito de peculato
posamente para o crime de outrem. mediante erro. 109
O elemento subjetivo do tipo é o dolo subsequente, z Inserir dados falsos;
isto é, posterior ao recebimento da coisa. z Facilitar a inserção de dados falsos;
Em um primeiro momento, o funcionário público z Alterar dados corretos;
toma posse do bem de boa-fé, sem constatar o erro z Excluir indevidamente dados corretos.
alheio, mas, posteriormente, após detectar o erro,
apropria-se da coisa. É necessário, para a tipificação do delito, que as
É importante levar em consideração as seguintes condutas acima sejam realizadas em sistema informa-
características do crime de peculato mediante erro de tizado (computador) ou bancos de dados (fichários,
outrem: livros ou outro meio físico) da Administração Pública.
Objeto material:
z É crime material, que se consuma quando o agen-
te inverte a propriedade do dinheiro ou outra uti- z Sistemas informatizados ou bancos de dados da
lidade, sabendo que eles chegaram ao seu poder Administração Pública.
por erro de outra pessoa, passando a agir como se
dono fosse;
Finalidade (dolo específico):
z Segundo a doutrina majoritária, admite a modali-
dade tentada;
z Obter vantagem indevida para si ou para outrem;
z O funcionário público deve receber a coisa em
z Causar dano.
razão do cargo que exerce;
z O sujeito passivo é a Administração Pública. Caso
o bem seja particular, também será sujeito passivo O elemento subjetivo do tipo é o dolo específico,
o dono do bem; que consiste no fim de obter vantagem indevida para
z Parte da doutrina entende que se a pessoa for si ou para outrem ou causar dano à Administração
induzida a erro, configurar-se-á o crime de estelio- Pública ou a uma terceira pessoa.
nato, previsto no art. 171, do CP, sendo necessário, Sem esta finalidade de obter vantagem ou causar
para caracterização do crime de peculato median- dano, haverá o crime do art. 313-B, do CP.
te erro de outrem, que a vítima entregue a coisa O crime consuma-se com a conduta, independen-
por erro próprio. temente do resultado. Trata-se de crime formal, que
se caracteriza ainda que a vantagem ou o dano alme-
Inserção de Dados Falsos em Sistemas de jado não se verifique.
Informação Admite-se a tentativa na hipótese de o agente ser
surpreendido antes de ultimar a conduta, por exem-
O crime de inserção de dados falsos em sistemas plo, agente é flagrado quando iniciava a supressão dos
de informação está previsto no art. 313-A, do CP: dados corretos.

Art. 313-A Inserir ou facilitar, o funcionário autori- Modificação ou Alteração Não Autorizada de
zado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir Sistemas de Informação
indevidamente dados corretos nos sistemas infor-
matizados ou bancos de dados da Administração O crime de modificação ou alteração não autori-
Pública com o fim de obter vantagem indevida para zada de sistemas de informação está previsto no art.
si ou para outrem ou para causar dano: 313-B, do Código Penal.
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e
multa.
Art. 313-B Modificar ou alterar, o funcionário,
sistema de informações ou programa de infor-
Dica mática sem autorização ou solicitação de autori-
dade competente:
“Inserção de dados falsos em sistemas de
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos,
informação” é também chamado de peculato
e multa.
eletrônico. Parágrafo único. As penas são aumentadas de
um terço até a metade se da modificação ou altera-
Sujeito ativo é apenas o funcionário público auto- ção resulta dano para a Administração Públi-
rizado a inserir ou excluir dados do sistema. Outros ca ou para o administrado.
funcionários que não dispõem desta competência res-
pondem pelo crime do art. 313-B, do CP. Trata-se de Trata-se de crime próprio, sendo praticado somen-
crime próprio. te por funcionário público, qualquer que seja a sua
A fraude no sistema informatizado ou em bancos função, estando autorizado ou não a manipular sis-
de dados pelo funcionário competente, para obter temas de informações ou programas de informática.
vantagem para si ou para outrem, caracteriza o delito A consumação deste crime se dá com a modifica-
em análise, sendo que o estelionato, por ser um crime ção ou alteração não autorizada do sistema. Não é
menos grave, é absorvido. necessário um especial fim de agir.
Para que este crime se configure, é necessário que Caso o funcionário público seja autorizado ou pra-
as condutas descritas no tipo penal sejam praticadas tique a conduta por solicitação da autoridade compe-
por funcionário público autorizado a operar os siste- tente, o fato será atípico.
mas informatizados ou bancos de dados da Adminis- A pena deste crime será aumentada de 1/3 (um
tração Pública. terço) até metade caso da modificação ou alteração
Trata-se de crime plurinuclear, já que o tipo penal resulte dano para a Administração Pública ou para o
descreve vários verbos que podem ser praticados administrado.
para a sua configuração. Fique atento às diferenças entre os tipos penais
110 Condutas: do crime de inserção de dados falsos em sistemas de
informação e do crime de modificação ou alteração Este crime não se aplica ao Prefeito Municipal, res-
não autorizada de sistemas de informação: pondendo este pelo crime previsto em lei específica, o
Decreto nº 201, de 1967.
MODIFICAÇÃO OU AL- Exige que o emprego irregular aconteça em bene-
INSERÇÃO DE DADOS fício da própria Administração Pública, contrariando
TERAÇÃO NÃO AUTO-
FALSOS EM SISTEMAS a legislação, não podendo o agente desviar as verbas
RIZADA DE SISTEMAS
DE INFORMAÇÃO ou rendas em benefício próprio, sob pena de respon-
DE INFORMAÇÃO
der por outro crime.
Verbos: Inserir, facilitar a Verbos: modificar ou alterar Vamos exemplificar: a Câmara Legislativa do
inserção, alterar, excluir Se praticado por funcio- Município XYZ aprova a utilização de um milhão de
indevidamente nário autorizado, será fato reais para construção de uma passarela. A autoridade
Deve ser praticado por atípico pública competente utiliza a verba mencionada para
funcionário autorizado Não exige dolo específico a construção de uma escola.
Exige dolo específico de Pronto, configurou-se o crime de emprego irregu-
obter vantagem indevida lar de verbas ou rendas públicas. O agente deu às ver-
ou de causar dano bas públicas destinação diversa daquela estabelecida
em lei.
Extravio, Sonegação ou Inutilização de Livro ou Observe que a destinação da verba ocorreu no inte-
Documento resse da administração, já que, caso se dê em benefí-
cio próprio, o agente responderá por outro crime.
Está previsto no art. 314, do Código Penal. É importante mencionar a aplicação da excludente
de ilicitude do estado de necessidade: caso o empre-
Art. 314 Extraviar livro oficial ou qualquer docu- go se dê devido a uma situação de perigo iminente
mento, de que tem a guarda em razão do cargo; (utilizou-se verba pública destinada ao esporte para
sonegá-lo ou inutilizá-lo, total ou parcialmente: se construir um abrigo durante perigo de chuvas que
Pena - reclusão, de um a quatro anos, se o fato não desabrigaram grande parte da população), o fato será
constitui crime mais grave. típico, mas não será antijurídico.
Sobre o emprego irregular de verbas ou rendas
Os núcleos do tipo são os verbos extraviar (fazer públicas, é importante mencionar:
desaparecer), sonegar (não apresentar) e inutilizar
(tornar imprestável). z Este crime será praticado pelo funcionário público
Sobre este crime, é importante que você saiba: que tem poder de decisão sobre as verbas ou ren-
das públicas, podendo delas dispor;
z Trata-se de crime subsidiário (o crime fica absorvi- z Não exige nenhum fim específico;
do quando o fato constitui crime mais grave), res- z Não admite a modalidade culposa;
pondendo por ele, o funcionário público, apenas se z Admite a tentativa;
não se configurar crime mais grave; z Não exige a ocorrência de dano pela Administra-
z Não admite a modalidade culposa; ção Pública para a sua configuração.
z Admite tentativa;
z O extravio, a sonegação e inutilização podem ser Concussão
parciais ou totais.
Art. 316 Exigir, para si ou para outrem, direta
ou indiretamente, ainda que fora da função ou
Sujeito ativo é apenas o funcionário público res-
antes de assumi-la, mas em razão dela, vanta-
ponsável pela guarda do livro oficial ou documen- gem indevida:
to. Se a conduta for praticada por outro funcionário Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
público, o crime será o previsto no art. 337, do CP. Caso
seja praticado por advogado ou procurador, que inu- No crime de concussão, o funcionário público,
tiliza documento ou objeto do processo, o enquadra- valendo-se de sua autoridade, exige (conduta mais
mento será no art. 356, do CP. forte do que apenas pedir) o pagamento de vanta-
O delito em estudo é subsidiário, pois só será apli- gem não devida pela pessoa. O particular, por temer
cado se não houver outro crime mais grave. qualquer represália por parte do funcionário público,
Assim, o funcionário público que recebe dinheiro pode ou não pagar a vantagem indevida.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

para destruir livro ou documento responderá apenas Vamos exemplificar: funcionário público, agen-
pelo crime de corrupção passiva, que é mais grave. te de trânsito, exige de particular a quantia de R$
Por fim, quando se tratar de livros ou documentos 2.000,00 para que libere o seu veículo, sob pena de
relativos a tributos, o funcionário que tinha a guar- levá-lo indevidamente ao pátio do Detran.
da e praticou uma das condutas acima responderá A vantagem indevida, segundo posicionamento
pelo crime do inciso I, art. 3º, da Lei nº 8.137, de 1990, majoritário, não necessita ser patrimonial, podendo
quando o fato acarretar pagamento indevido ou ine- ser qualquer outra vantagem.
xato de tributo. É importante mencionar que a concussão ocorrerá
em razão da função do agente público, não se exigindo
Emprego Irregular de Verbas ou Rendas Públicas que o fato seja praticado no efetivo desempenho das
atribuições do cargo. Sendo assim, este crime pode ser
Art. 315 Dar às verbas ou rendas públicas aplica- cometido por funcionário público de férias e, segundo
ção diversa da estabelecida em lei: a doutrina dominante, nomeado, mas não empossado
Pena - detenção, de um a três meses, ou multa. (antes de assumir). 111
A violência ou grave ameaça (morte, prisão) não O núcleo do tipo é o verbo exigir que, diferente-
são elementos integrantes do crime de concussão. mente do crime de concussão, não significa uma
Se o funcionário público exigir o pagamento de ameaça, mas sim a simples cobrança indevida.
vantagem indevida, mediante violência ou grave A cobrança é indevida quando o tributo ou a con-
ameaça, estará cometendo o crime de extorsão, pre- tribuição social não existe ou então já foi pago, bem
visto no art. 158, do Código Penal. como na hipótese em que a cobrança é excessiva, em
Sobre a concussão, é importante que você conheça valor maior que o devido.
as seguintes informações, frequentemente cobradas O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste
em prova: no fato de o agente ter consciência, ou dúvida, de que
se trata de uma cobrança indevida.
z Não pode ser praticada na modalidade culposa; Na segunda modalidade criminosa, cobrança
z Trata-se de crime formal, que se consuma com a vexatória ou gravosa, o tributo ou contribuição social
prática da exigência, sendo o recebimento da van- é devido. O problema reside no “modus operandi” da
tagem mero exaurimento do crime; cobrança, que é feita de forma vexatória, humilhante,
z O particular, de quem se exigiu a vantagem inde- ou gravosa, vale dizer, com a imposição de medidas
vida, é sujeito passivo secundário deste crime. A totalmente desnecessárias.
Administração Pública é o sujeito passivo primário; Neste caso, o crime consuma-se com a simples
z Em regra, não admite a tentativa, salvo quando cobrança vexatória ou gravosa, independentemente
for possível fracionar o iter criminis, a exemplo da do recebimento.
concussão praticada mediante carta endereçada à Admite-se a tentativa quando a cobrança vexató-
vítima; ria ou gravosa é realizada por escrito, mas, por cir-
z É possível praticar a concussão indiretamente,
cunstâncias alheias à vontade do agente, é descoberta
quando, por exemplo, o funcionário público exige a
antes que a vítima tomasse conhecimento.
vantagem indevida por intermédio de outra pessoa.
Vejamos: José, funcionário público da prefeitu-
ra do Município de Simplicidade, sabendo que seu
É importante diferenciar concussão e corrupção
vizinho, Márcio, deve dez mil reais em tributo, para
passiva:
cobrá-lo, coloca uma faixa enorme na entrada da rua,
com a seguinte frase escrita: “Márcio, deixe de ser
Tem no núcleo do tipo o verbo “exi- irresponsável e pague os dez mil reais que você deve
gir” — há um caráter intimidativo na de tributo à prefeitura”.
CONCUSSÃO
conduta No exemplo, José cobrou imposto devido, fazendo
O ato de exigir é algo impositivo uso de meio vexatório, não autorizado por lei, confi-
Tem os verbos “solicitar ou receber, gurando-se, assim, o excesso de exação.
ou aceitar” Sobre o excesso de exação, é importante mencionar:
Solicitar é pedir, o que, portanto, não
CORRUPÇÃO pressupõe intimidação z Não admite a modalidade culposa, pois a expres-
PASSIVA Receber e aceitar pressupõem uma são “que sabe” é dolo direto, e a expressão “devia
conduta ativa do particular, ou seja, saber” é dolo eventual;
além de não ocorrer intimidação, há z Admite a tentativa quando for possível fracionar o
uma conduta inicial do terceiro iter criminis, a exemplo do excesso de exação prati-
cado mediante carta endereçada à vítima.
Excesso de Exação Art. 316 […]
§ 2º Se o funcionário desvia, em proveito próprio ou
O excesso de exação, previsto no § 1º, art. 316, do de outrem, o que recebeu indevidamente para reco-
CP, é uma forma de concussão. Configura-se quando lher aos cofres públicos:
o funcionário público exige tributo ou contribuição Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.
social, que sabe ou deveria saber indevido, ou, quan-
do devido, emprega na cobrança meio vexatório ou Se o funcionário desviar, em proveito próprio ou
gravoso, que a lei não autoriza. de outrem, o que recebeu indevidamente para reco-
lher aos cofres públicos, responderá por excesso de
Art. 316 [...] exação na modalidade qualificada.
§ 1º Se o funcionário exige tributo ou contribui-
Quando observamos a forma qualificada do exces-
ção social que sabe ou deveria saber indevido,
ou, quando devido, emprega na cobrança meio
so de exação, é possível compreender que o tipo penal
vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: não exige que o funcionário público tenha a intenção
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. de ficar para si ou para outro aquilo que recebeu. Caso
o faça, responderá pelo crime na forma qualificada.
Exação significa correção, exatidão. Na concussão propriamente dita, exige-se que o fun-
cionário público pratique a conduta visando obter a
vantagem indevida para si ou para outrem, constituin-
Importante! do-se, assim, elemento de distinção entre os tipos penais.

São duas as formas de cometer este delito: Corrupção Passiva


� Exigência indevida de tributo ou contribuição
social; Art. 317 Solicitar ou receber, para si ou para
� Cobrança devida de tributo ou contribuição outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora
112 social, mas de forma vexatória ou gravosa. da função ou antes de assumi-la, mas em razão
dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa público exige a vantagem indevida por meio de
de tal vantagem: outra pessoa.
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e
multa. É importante realizar um breve paralelo com o cri-
me de corrupção ativa, que será estudado no tópico
A corrupção passiva, prevista no art. 317, do Códi- dos crimes cometidos por particulares contra a admi-
go Penal, configurar-se-á quando o funcionário públi- nistração em geral, que é aquela em que o particular
co solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta oferece ou promete vantagem indevida a funcionário
ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes público.
de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, Atenção! Na corrupção passiva, o particular que
ou aceitar promessa de tal vantagem. paga a vantagem indevida solicitada pelo funcio-
A doutrina classifica a corrupção passiva em pró- nário público não pratica crime algum, por falta de
pria ou imprópria, antecedente ou subsequente: tipicidade penal.
O crime de corrupção, seja ativa ou passiva, é uni-
z Própria: quando o funcionário público pratica os lateral e formal — são independentes em si. A com-
verbos do tipo penal para praticar ato ilícito (por provação de um dos crimes não pressupõe a do
exemplo, oficial de justiça recebe dinheiro para outro.
retardar o cumprimento do mandado de citação); A corrupção passiva possui uma forma privilegiada.
z Imprópria: quando o funcionário público pratica
os verbos do tipo penal para praticar ato lícito (por Art. 317 […]
exemplo, escrevente solicita dinheiro para que a § 2º Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou
certidão seja expedida dentro do prazo); retarda ato de ofício, com infração de dever funcio-
nal, cedendo a pedido ou influência de outrem:
z Antecedente: quando a vantagem indevida é
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.
entregue ao funcionário público antes de sua ação
ou omissão (por exemplo, juiz recebe vantagem
Observe que na corrupção passiva privilegiada
indevida para prolatar sentença absolutória);
o agente pratica a conduta não com a finalidade de
z Subsequente: quando a vantagem indevida é
conseguir alguma vantagem indevida, mas sim com
entregue ao funcionário público depois de sua
a finalidade de ceder a pedido ou influência de outro.
ação ou omissão (por exemplo, após retardar o
Trata-se de crime material e consuma-se quando
processo até levá-lo à prescrição, o juiz solicita
o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda o
vantagem indevida ao réu). ato de ofício.
Por outro lado, a pena da corrupção passiva será
Observe que a corrupção passiva pode ser direita aumentada de 1/3 (um terço) se, em consequência
ou indireta: da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou
deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica
z Direta: quando é o próprio funcionário público infringindo dever funcional.
que solicita, recebe ou aceita promessa de vanta-
gem indevida; Art. 317 […]
z Indireta: quando uma interposta pessoa, em con- § 1º A pena é aumentada de um terço, se, em con-
luio com o funcionário público, solicita, recebe sequência da vantagem ou promessa, o funcionário
ou aceita promessa de vantagem indevida. Nesse retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício
caso, tanto o “testa de ferro” quanto o funcionário ou o pratica infringindo dever funcional.
público responderão por corrupção passiva.

Entende a doutrina majoritária que o mero presen- Importante!


te recebido pelo funcionário público, por gratidão ou
Não seja surpreendido por pegadinhas em pro-
amizade (por exemplo, uma lembrancinha de natal)
va: a corrupção passiva e a concussão diferen-
não configura o crime de corrupção passiva.
ciam-se nos verbos que configuram o tipo penal
A vantagem indevida, segundo posicionamento
incriminador.
majoritário, não necessita ser patrimonial, podendo
� Corrupção passiva: solicitar, receber ou aceitar
ser qualquer outra vantagem.
Sobre a corrupção passiva, leve em consideração
promessa;
que: � Concussão: exigir.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

z Não pode ser praticada na modalidade culposa; Facilitação de Contrabando ou Descaminho


z Trata-se de crime formal, quando praticada por
meio dos verbos solicitar e aceitar promessa, que O crime de facilitação de contrabando ou descami-
se consuma com a conduta, sendo o efetivo recebi- nho está previsto no art. 318, do CP.
mento da vantagem mero exaurimento do crime.
Quando praticada por meio do verbo receber, é Art. 318 Facilitar, com infração de dever funcio-
crime material, que exige o efetivo recebimento nal, a prática de contrabando ou descaminho
para se consumar (§ 2º, art. 317, do CP); (art. 334):
z Em regra, não admite a tentativa, salvo quando for Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.
possível fracionar o iter criminis, a exemplo da cor-
rupção passiva praticada mediante emprego de carta; Configurar-se-á quando o funcionário público faci-
z É possível praticar a corrupção passiva indire- litar, com infração de dever funcional, a prática de
tamente, quando, por exemplo, o funcionário contrabando ou descaminho. 113
Contrabando é a exportação ou a importação do A prevaricação própria configurar-se-á quando o
território nacional de uma mercadoria proibida. funcionário público retardar ou deixar de praticar,
Descaminho é a exportação ou importação do terri- indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra dis-
tório nacional de uma mercadoria lícita, mas median- posição expressa de lei, para satisfazer interesse ou
te sonegação dos direitos ou impostos devidos. sentimento pessoal.
O núcleo do tipo é o verbo facilitar, que signifi- O crime em estudo não se confunde com a corrup-
ca viabilizar, tornar mais simples o contrabando ou ção passiva privilegiada, em que o agente age ou deixa
descaminho. de agir cedendo a pedido ou influência de outrem.
O elemento subjetivo é o dolo que pode ser direto Na prevaricação não existe esse pedido ou influên-
ou eventual. cia. O agente toma a iniciativa de agir ou se omitir para
Relembrando: satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Assim, se
um fiscal flagra um desconhecido cometendo irregula-
z Dolo direto (determinado): ocorre quando o agen- ridade e deixa de autuá-lo em razão de insistentes pedi-
te prevê determinado resultado, dirigindo sua con- dos deste, há corrupção passiva privilegiada, mas, se o
duta na busca de realizar esse mesmo resultado; fiscal deixa de autuar porque percebe que a pessoa é
z Dolo eventual: o agente prevê pluralidade de um antigo amigo, configura-se a prevaricação.
resultados, porém dirige sua conduta na realiza- A prevaricação poderá ser praticada de três for-
ção de um deles. Quer um resultado, mas aceita o mas diferentes:
outro resultado.
z Retardar indevidamente a prática de ato de ofício;
Observa-se que o crime se consuma com a primei- z Deixar de praticar indevidamente ato de ofício;
ra conduta que facilita o contrabando ou descaminho, z Praticar ato de ofício contra disposição expressa
ainda que não haja efetivamente a entrada ou saída de lei.
da mercadoria do território nacional.
Trata-se de crime formal, pois se consuma com a O crime de prevaricação exige um fim específico
conduta, independentemente da ocorrência do con- de agir: satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
trabando ou descaminho. Não confundir com o crime de corrupção passiva pri-
Admite-se a tentativa quando o agente se empenha vilegiada (estudado anteriormente). Vejamos a tabela
para realizar a conduta de facilitar o contrabando ou a seguir para facilitar seu entendimento:
descaminho, mas é surpreendido antes de concluí-la.
É possível extrair da leitura do tipo penal que o cri- CORRUPÇÃO PASSIVA
PREVARICAÇÃO
me será praticado pelo funcionário público que tem o PRIVILEGIADA
dever funcional de evitar a prática dos crimes de con-
Praticar, deixar de pra-
trabando e descaminho. Retardar ou deixar de
ticar ou retardar ato de
A doutrina dominante entende que, caso o funcio- praticar ato de ofício
ofício
nário público não tenha o dever funcional de evitar
a prática do contrabando ou descaminho, responderá Para satisfazer interesse
como partícipe do crime de contrabando ou do crime Cedendo a pedido ou ou sentimento pessoal
de descaminho. influência de outrem (não há atuação de
Sobre este crime, é pertinente saber: terceiro)
z Pode ser praticado de forma comissiva (quando o
funcionário indica uma forma de o contrabandista Você pode entender interesse ou sentimento
desviar-se da fiscalização), ou omissiva (quando o
funcionário, ciente de que há produto de descami- pessoal de diversas formas: vingança, compai-
nho em um compartimento, não o inspeciona, libe- xão, ódio, amizade, preguiça, entre outros.
rando as mercadorias);
z Não admite a modalidade culposa; Dica
z É crime formal, que se consuma com a facilitação,
independente ou não de o agente conseguir prati- Sobre a prevaricação, leve para a sua prova:
car o contrabando ou o descaminho; � Não admite a forma culposa;
z Admite a tentativa somente na forma comissiva, � Pode ser praticado de forma omissiva (retardar
quando o funcionário público indica o método ou deixar de praticar) ou comissiva (praticar);
de se desviar da fiscalização, mas outro servidor � Admite tentativa apenas quando praticado de
impede o desvio; forma comissiva.
z A competência é da Justiça Federal.
Tentativa na prevaricação:
Prevaricação � Retardar ou deixar de praticar, indevidamente,
Art. 319 Retardar ou deixar de praticar, indevida-
ato de ofício: não admite tentativa;
mente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição � Praticar ato de ofício contra disposição expres-
expressa de lei, para satisfazer interesse ou senti- sa de lei: admite tentativa.
mento pessoal:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Art. 319-A Deixar o Diretor de Penitenciária e/
ou agente público, de cumprir seu dever de vedar
O crime de prevaricação é dividido em: ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio
ou similar, que permita a comunicação com
z Própria: prevista no art. 319, do Código Penal; outros presos ou com o ambiente externo:
114 z Imprópria: prevista no art. 319-A, do Código Penal. Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.
A prevaricação imprópria configurar-se-á quando o diretor de penitenciária e/ou agente público deixar de cumprir
seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros
presos ou com o ambiente externo.
Trata-se de crime próprio, só podendo ser praticado pelo diretor de penitenciária ou pelo funcionário público
que tem o dever funcional de impedir que o preso tenha acesso a aparelho de comunicação com outros presos ou
com o ambiente externo.
Sobre a prevaricação imprópria, é importante ressaltar:

z Não admite a forma culposa;


z Não admite tentativa.

Condescendência Criminosa

A condescendência criminosa está prevista no art. 320, do Código Penal:

Art. 320 Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exer-
cício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente:
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.

Este crime pode ser praticado de duas formas:

z Quando o funcionário público, por indulgência, deixa de responsabilizar o subordinado que cometeu infração
no exercício do cargo;
z Quando o funcionário público, que não é competente para responsabilizar aquele que cometeu infração no
exercício do cargo, por indulgência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente.

A doutrina majoritária entende que o crime de condescendência criminosa só pode ser praticado por superior
hierárquico, que dolosamente, se omite. O funcionário que foi beneficiado não responde pelo delito em tela.
Você pode entender indulgência como compaixão, pena, piedade, clemência.
Há um requisito que deve ser cumprido para a prática da condescendência criminosa: uma infração funcional
(que pode ser uma violação administrativa ou penal) praticada por subordinado no exercício das atribuições do
seu cargo.
A consumação dá-se quando o superior toma conhecimento da infração e não providencia imediatamente a
responsabilização do infrator ou não comunica o fato à autoridade competente.
Sobre a condescendência criminosa, fique atento:

z Não admite a forma culposa;


z É crime omissivo;
z Não admite tentativa.

Como é possível observar, os crimes de corrupção passiva privilegiada, prevaricação e condescendência crimi-
nosa possuem características similares. Vejamos as diferenças:

CORRUPÇÃO PASSIVA
PREVARICAÇÃO CONDESCENDÊNCIA CRIMINOSA
PRIVILEGIADA

O agente deixa de praticar ato de ofí- O agente deixa de praticar ato de O agente deixa de praticar ato de ofí-
cio cedendo a pedido ou influência ofício para satisfazer sentimento ou cio (responsabilizar o subalterno) por
de outrem interesse pessoal indulgência

Advocacia Administrativa

O crime de advocacia administrativa, previsto no art. 321, do Código Penal, pode ser praticado na modalidade
simples ou qualificada.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Art. 321 Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da
qualidade de funcionário
Pena - detenção, de um a três meses, ou multa
Parágrafo único. Se o interesse é ilegítimo:
Pena - detenção, de três meses a um ano, além da multa.

Modalidade simples: configura-se quando o funcionário público patrocinar, direta ou indiretamente, interes-
se privado perante a Administração Pública, valendo-se da qualidade de funcionário.
É necessário que a condição de funcionário público proporcione alguma facilidade ao sujeito ativo, que patro-
cina interesse de terceiro, pessoa privada; caso não haja facilidade alguma proporcionada pelo cargo, o fato será
atípico.
O agente pode praticar este crime de diversas maneiras, como, por exemplo, fazendo uma petição, solicitando
um benefício.
Modalidade qualificada: o crime de advocacia administrativa será qualificado caso o interesse privado seja
ilegítimo. 115
z Forma simples: interesse privado legítimo; Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
z Forma qualificada: interesse privado ilegítimo.
A conduta típica é: abandonar cargo público, fora
Sobre a advocacia administrativa, fique atento em dos casos permitidos em lei.
sua prova: O nome do crime é abandono de função, porém,
o tipo penal fala em abandono de cargo público. É
z Não admite a modalidade culposa; importante que você saiba que o conceito de função
z É crime formal, que se consuma com a conduta, pública é mais amplo que o de cargo público (não há
não se exigindo que se atinja o interesse privado cargo sem função, mas há função sem cargo).
pleiteado; Sendo assim, não haverá crime se ocorrer mero
z Segundo doutrina majoritária, admite tentativa abandono de função pública (apesar do nome) ou de
quando for possível se fracionar o iter criminis; emprego público, mas tão somente no caso de aban-
z É desnecessário que o fato ocorra na própria repar- dono de cargo público (não se admite a analogia in
tição em que trabalha o agente. Este pode usar da malam partem).
sua qualidade de funcionário para pleitear favores Trata-se de um crime de mão própria, ou seja, só
em qualquer esfera da Administração. pode ser praticado pelo funcionário público ocupante
do cargo que foi abandonado. Este abandono deve ser
Violência Arbitrária por tempo juridicamente relevante.
De acordo com posicionamento doutrinário majoritá-
Art. 322 Praticar violência, no exercício de função rio, as hipóteses de greve não configuram este tipo penal.
ou a pretexto de exercê-la. As hipóteses em que o agente abandona o cargo
Pena - detenção, de seis meses a três anos, além da público, admitidas em lei, não configuram o crime de
pena correspondente à violência. abandono de função.
O crime de abandono de função tem circunstân-
Este delito encontrava divergência quanto a sua cias que o qualificam:
aplicação, tendo em vista as edições realizadas pela
Lei de Abuso de Autoridade (Lei nº 13.869, de 2019). z Se o fato resulta prejuízo público;
Esta discussão não mais possui fundamento, sendo z Se o fato ocorre em lugar compreendido na faixa
que esta lei não tipificou o crime de violência arbi- de fronteira.
trária. Sendo assim, o delito ainda esse encontra em
vigor. Cabe destacar qualificadora do § 2º no que diz res-
A prática da violência deve dar-se em razão da peito à faixa de fronteira. Essa qualificadora é uma
função pública, não havendo a exigência de que seja norma penal em branco, visto que a definição da fai-
praticado no efetivo desempenho das funções do car- xa de fronteira é fornecida pela Lei nº 6.634, de 1979,
go, podendo, portanto, ser praticada, por exemplo, compreendendo um raio de 150 (cento e cinquenta)
por um funcionário público que se encontre de folga. quilômetros ao longo das fronteiras nacionais.
Sobre esse crime, leve em consideração os seguin- O fundamento desta qualificadora é a proteção à
tes pontos: soberania nacional que, nas fronteiras, torna-se mais
vulnerável.
z A violência arbitrária não admite a forma culposa, Exige-se que o abandono se dê por um prazo rele-
devendo ser praticada dolosamente; vante, apesar de o Código Penal não fixar prazo deter-
z Admite tentativa; minado. Entende a doutrina que o prazo será fixado
z Segundo Rogério Greco, o objeto material será o pelo estatuto a que estiver submetido o funcionário
administrado contra o qual é praticada a violência público.
arbitrária; Em regra: o prazo será de 30 (trinta) dias — pra-
z A violência tem que ser praticada arbitrariamente, zo previsto na maioria dos estatutos de servidores
não se enquadrando neste tipo penal as hipóteses públicos.
de uso necessário e progressivo da força, admiti-
das em lei; Dica
z O crime aperfeiçoa-se ainda que as vítimas da
agressão não sofram lesões; Sobre o crime de abandono de função, leve para
z Caso alguma das vítimas sofra lesão ou morra, o a sua prova:
agente responderá por este crime e pelo crime cor- � É crime omissivo;
respondente à violência praticada (lesões corpo- � Não admite tentativa;
rais ou homicídio). � Só pode ser praticado dolosamente — não
admite a culpa.
Abandono de Função
Exercício Funcional Ilegalmente Antecipado ou
O crime de abandono de função está tipificado no Prolongado
art. 323, do CP.
Este crime está previsto no art. 324, do CP.
Art. 323 Abandonar cargo público, fora dos casos
permitidos em lei: Art. 324 Entrar no exercício de função pública
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa. antes de satisfeitas as exigências legais, ou conti-
§ 1º Se do fato resulta prejuízo público: nuar a exercê-la, sem autorização, depois de saber
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. oficialmente que foi exonerado, removido, substi-
§ 2º Se o fato ocorre em lugar compreendido na fai- tuído ou suspenso:
116 xa de fronteira: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.
Tutela-se a Administração Pública, no tocante ao z Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo
seu normal funcionamento, pois o exercício ilegal de e que deva permanecer em segredo;
função pública afeta a prestação de serviços públicos. z Facilitar a revelação de fato de que tem ciência em
Conduta típica: entrar no exercício de função razão do cargo e que deva permanecer em segredo.
pública antes de satisfeitas as exigências legais, ou
continuar a exercê-la, sem autorização, depois de É importante mencionar que o agente toma conhe-
saber oficialmente que foi exonerado, removido, cimento do fato em relação ao qual deve permanecer
substituído ou suspenso: em segredo em razão do cargo que ocupa, não se exi-
Este crime pode ser praticado de duas formas: gindo que tenha sido no efetivo desempenho das atri-
buições do cargo.
z Entrar no exercício de função pública antes de Logo, o crime pode ser praticado no caso de o
satisfeitas as exigências legais; agente tomar conhecimento do fato durante período
z Continuar a exercer a função pública, sem autori- de licença, mas em razão do cargo.
zação, depois de saber oficialmente que foi exone- O Código Penal apresenta duas formas equipara-
rado, removido, substituído ou suspenso. É exigido das do crime de violação de sigilo funcional. Observe:
Incorrerá nas mesmas penas o funcionário público
que o funcionário público tenha sido oficialmente
que:
comunicado sobre sua exoneração, remoção, subs-
tituição ou suspensão. Neste aspecto, ressalta-se
z Permite ou facilita, mediante atribuição, forneci-
que o crime é instantâneo e prescinde de habitua-
mento e empréstimo de senha ou qualquer outra
lidade da conduta para sua consumação.
forma, o acesso de pessoas não autorizadas a siste-
mas de informações ou banco de dados da Admi-
Observe que o exercício funcional ilegalmente
nistração Pública;
antecipado ou prolongado somente pode ser prati- z Utiliza-se, indevidamente, do acesso restrito.
cado por funcionário público já nomeado, mas ainda
sem ter cumprido todas as exigências legais (1ª parte), Forma qualificada: se da ação ou omissão resulta
ou então pelo indivíduo que era funcionário público, dano à Administração Pública ou a outrem.
porém deixou de sê-lo em razão de ter sido oficial- Sobre este crime, fique atento:
mente exonerado, removido, substituído ou suspenso
(parte final). z Só será praticado dolosamente — não admite for-
Em ambas as hipóteses, o crime é de mão própria, ma culposa;
de atuação pessoal ou de conduta infungível, pois z Em regra, não admite tentativa, salvo casos excep-
somente pode ser cometido pela pessoa expressamen- cionais, a exemplo de ser praticado na forma
te indicada no tipo penal. escrita.
Se um particular entrar no exercício da função
pública, a ele deverá ser imputado o crime de usurpa- Violação de Sigilo de Proposta de Concorrência
ção de função pública (art. 328 do CP).
Sobre o tipo penal em comento, é importante saber: Este tipo penal era previsto no art. 326, e foi revo-
gado pelo art. 337-J também do Código Penal.
z Não admite a forma culposa;
z Admite tentativa. Art. 326 Devassar o sigilo de proposta de concor-
rência pública, ou proporcionar a terceiro o ensejo
Violação de Sigilo Funcional de devassá-lo:
Pena - Detenção, de três meses a um ano, e multa.
O crime de violação de sigilo funcional encontra-se
previsto no art. 325, do Código Penal: CRIMES PRATICADOS POR PARTICULAR CONTRA
A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL
Art. 325 Revelar fato de que tem ciência em razão
do cargo e que deva permanecer em segredo, ou Os crimes praticados por particular contra a Admi-
facilitar-lhe a revelação: nistração Pública estão previstos entre os arts. 328 e
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou mul- 337-A, do Código Penal.
ta, se o fato não constitui crime mais grave. Tratam-se de crimes comuns, que não exigem
§ 1º Nas mesmas penas deste artigo incorre quem: nenhuma condição ou qualidade especial do sujeito
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

I - permite ou facilita, mediante atribuição, forne- ativo, podendo ser praticados por qualquer pessoa.
cimento e empréstimo de senha ou qualquer outra
forma, o acesso de pessoas não autorizadas a siste- Usurpação de Função Pública
mas de informações ou banco de dados da Adminis-
tração Pública; O crime de usurpação de função pública configu-
II - se utiliza, indevidamente, do acesso restrito. rar-se-á quando o agente usurpar o exercício de fun-
§ 2º Se da ação ou omissão resulta dano à Adminis- ção pública.
tração Pública ou a outrem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. Art. 328 Usurpar o exercício de função pública:
Pena - detenção, de três meses a dois anos, e multa.
Este delito irá se configurar quando o agente públi-
co revelar fato de que tem ciência em razão do cargo Usurpar significa apoderar-se, tomar algo pela for-
e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a ça ou sem direito.
revelação. Inicialmente, é importante que você não confunda
Este crime pode ser praticado de duas formas: o usurpador de função com o funcionário ou agente 117
público de fato (assunto bastante cobrado, tanto na z Não admite a modalidade culposa;
disciplina Direito Penal, quanto na disciplina Direito z Admite tentativa;
Administrativo): z Pode ser praticado por funcionário público, segun-
do posicionamento que prevalece, mas a função
z Usurpação de função pública: o agente exerce a usurpada deve ser totalmente alheia à função dele
função sem nenhum tipo de investidura, apode- (sendo ele considerado particular);
rando-se dela. É crime; z É crime formal, não se exigindo para a sua configu-
z Funcionário ou agente de fato: o agente exerce a ração prejuízo ou dano à Administração Pública;
função pública, por ter ocorrido alguma irregula- z Ação penal pública incondicionada.
ridade. Não é crime.
Resistência

Importante! O crime de resistência está previsto no art. 329, do


Segundo posicionamento doutrinário majoritá- Código Penal:
rio, é necessário, para fins de consumação, que
Art. 329 Opor-se à execução de ato legal, mediante
o agente execute algum ato inerente ao exercício violência ou ameaça a funcionário competente para
da função, não configurando o crime a mera apre- executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio:
sentação a terceiros como funcionário público. Pena - detenção, de dois meses a dois anos.
§ 1º Se o ato, em razão da resistência, não se
Vamos exemplificar: executa:
Pena - reclusão, de um a três anos.
z Exemplo 1: Antônio apresenta-se como policial § 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuí-
militar para seus conhecidos como forma de se zo das correspondentes à violência.
autovalorizar. Não há que se falar em configura-
ção do crime de usurpação de função pública, já A conduta típica deste crime é opor-se à execução
que o agente não praticou nenhum ato inerente ao de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcio-
exercício da função policial militar, podendo, con- nário competente para executá-lo ou a quem lhe este-
forme o caso, configurar outra infração penal. ja prestando auxílio.
z Exemplo 2: Antônio adquire, fraudulentamente, uma Sobre a conduta típica, as seguintes informações
farda da polícia militar. Em determinado dia, ele pro- são muito importantes:
move uma falsa barreira e passa a abordar as pessoas
que nela passam. Há a prática do crime de usurpação z Exige-se que o ato praticado pelo funcionário
de função pública, já que o agente praticou ato ineren- público seja legal;
te ao exercício da função policial militar. z Se o ato praticado por funcionário público for ile-
gal, não há que se falar em resistência;
Não confunda o crime de usurpação de função z Exige-se que o funcionário público seja competen-
pública com o crime exercício funcional ilegalmente te para executar o ato;
antecipado ou prolongado: z Não se exige que a violência ou ameaça seja empre-
gada diretamente contra o funcionário competen-
te, podendo ser empregada contra o terceiro que
EXERCÍCIO FUNCIONAL esteja auxiliando o funcionário.
USURPAÇÃO DE ILEGALMENTE
FUNÇÃO PÚBLICA: ANTECIPADO OU Sobre a resistência, é importante que você leve em
PROLONGADO: consideração:
O agente não possui víncu- O agente possui algum
lo algum com a Adminis- tipo de vínculo com a Ad- z Deve ser praticada dolosamente;
tração Pública (em relação ministração Pública z A oposição constitui um ato positivo, devendo o
à função usurpada) É crime praticado por fun- agente empregar violência ou grave ameaça;
É crime praticado por par- cionário público contra a z O emprego de violência ou ameaça contra dois ou
ticular contra a Adminis- Administração Pública mais funcionários públicos, em uma situação fáti-
tração Pública ca, configura crime único.21

O direito brasileiro não pune a resistência passiva,


Há uma forma qualificada do crime de usurpação que é aquela em que o agente resiste ao ato sem o uso
de função pública: de violência ou ameaça, a exemplo daquele que, ao
ser preso, deita-se no chão para impedir o ato.
Art. 328 [...] A violência ou ameaça deve ser empregada contra
Parágrafo único. Se do fato o agente aufere pessoa, não constituindo o crime se empregada contra
vantagem: coisa (posição dominante).
Pena - reclusão, de dois a cinco anos, e multa. É crime formal, que se consuma com a prática da
violência ou ameaça.
Ocorre se, do fato, o agente auferir vantagem Admite tentativa, nas hipóteses de fracionamento
(qualquer tipo de vantagem e não necessariamente do iter criminis.
financeira).
Sobre o crime de usurpação de função pública, é z Resistência qualificada: se, em razão da resistên-
importante que você leve em consideração: cia, o ato não se executa.
118 21 (TJSP — Rel. Onei Raphael — RT 577/342).
Por fim, leve para a sua prova: o agente responde- z Exemplo 1: Diego Souza xinga Cássio, policial civil,
rá pela resistência e pela violência empregada. que estava no exercício de sua função, de “poli-
Vejamos: se, para se opor à execução de ato legal cialzinho de merda”, quando este estava prestes a
praticado por funcionário competente, o particular prender aquele.
usa de violência, causando lesão corporal de nature- z Exemplo 2: Diego Souza xinga Cássio, policial
za grave, responderá pelos dois crimes: resistência e civil, em um restaurante em Porto Seguro, durante
lesão grave. as férias deles, de “policialzinho de merda”, pelo
fato de Cássio tê-lo prendido no passado.
Desobediência z Exemplo 3: Diego Souza xinga Cássio, policial civil,
de “babaca sem noção”, em uma partida de fute-
Este crime está previsto no art. 330, do Código bol, pelo fato deste ter pegado um pênalti daquele.
Penal. Configurar-se-á quando o agente desobedecer
à ordem legal de funcionário público. Nos exemplos 1 e 2, configura-se o crime de desa-
cato, já que a ofensa proferida pelo agente se deu em
Art. 330 Desobedecer a ordem legal de funcionário razão da função exercida pelo funcionário público.
público: No exemplo 3, não há que se falar em desacato.
Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, e Embora Cássio seja funcionário público, a ofensa pro-
multa. ferida pelo agente em nada tem a ver com a função
pública.
Vitor Eduardo Rios Gonçalves destaca que: Sobre o desacato, é importante que você fique
atento às seguintes considerações:
z Deve haver uma ordem: significa determinação,
mandamento. O não atendimento de mero pedido z O desacato pode dar-se por qualquer meio: insul-
ou solicitação não caracteriza o crime; tos, vias de fato, gestos, entre outros;
z A ordem deve ser legal: material e formalmente. z O desacato deve ser praticado contra funcionário
Pode até ser injusta, só não pode ser ilegal; público, não caracterizando este tipo penal a críti-
z Deve ser emanada de funcionário público com- ca ou ofensa à repartição pública;
petente para proferi-la. Ex.: Delegado de polícia z É crime formal, que se consuma com a prática da
requisita informação bancária e o gerente do ban- conduta descrita no tipo penal, independentemen-
co não atende. Não há crime, pois o gerente só está te de o funcionário público se considerar ofendido
obrigado a fornecer a informação se houver deter- ou não;
minação judicial; z Só pode ser praticado dolosamente;
z É necessário que o destinatário tenha o dever jurí- z Deve ser praticado na presença do funcionário
dico de cumprir a ordem. Além disso, não haverá público — doutrina dominante.
crime se a recusa se der por motivo de força maior
ou por ser impossível por algum motivo o seu
cumprimento. Importante!
A ordem deve ser legal. Caso de trate de ordem Não se confunde o crime de desacato com os
ilegal, não há que se falar na configuração deste tipo crimes contra a honra. No desacato, a ofensa é
penal. dirigida à figura do funcionário público e não à
Sobre a desobediência, é importante que você leve pessoa em si. Deste modo, a doutrina majoritária
em consideração: entende que o crime de desacato deve ser prati-
cado na presença do funcionário público, ao pas-
z Não admite a culpa; so que, caso a ofensa seja irrogada na ausência
z Pode ser praticada tanto na forma omissiva quan- física do funcionário, será caracterizado crime
to na forma comissiva; contra a honra.
z Na forma omissiva, não admite tentativa, na forma
comissiva, admite;
z Deve haver ordem emanada por funcionário Em dezembro de 2016, a 5ª turma do STJ decidiu
público, não caracterizando este crime a mera pela descriminalização do crime de desacato, por
solicitação. entender que este crime viola a liberdade de expres-
são do indivíduo, em julgamento de habeas corpus.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Desacato Contudo, a 3ª seção do STJ pacificou posiciona-


mento do tribunal no sentido de que o desacato con-
O crime de desacato, previsto no art. 331, do Código tinua sendo crime, pois isso não viola a liberdade de
Penal, tem como conduta típica desacatar funcionário expressão.
público no exercício da função ou em razão dela.
Tráfico de Influência
Art. 331 Desacatar funcionário público no exercí-
cio da função ou em razão dela: O crime de tráfico de influência está previsto no
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. art. 332, do Código Penal:

Desacatar = ofender, faltar com respeito. Art. 332 Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou
Não se exige que o funcionário público esteja no para outrem, vantagem ou promessa de vantagem,
efetivo desempenho das atribuições do seu cargo para a pretexto de influir em ato praticado por funcioná-
caracterização do crime de desacato, mas sim que a rio público no exercício da função:
ofensa se dê em razão da função pública. Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. 119
Parágrafo único. A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada
ao funcionário.

Conduta típica: solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem,
a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função.
Trata-se de crime plurinuclear, que pode ser praticado com o exercício de qualquer um dos verbos previstos
no tipo penal:

z Solicitar;
z Exigir;
z Cobrar;
z Obter.

O agente não tem influência sobre o funcionário público, mas passa a impressão de que a tem, com a finalida-
de de obter vantagem ou promessa de vantagem.
Caso o agente realmente tenha poder de influência sobre o funcionário público que praticará o ato, não há que
se falar em tráfico de influência, podendo, no entanto, configurar-se outro crime.
Sobre o tráfico de influência, é importante que você tome cuidado com as seguintes informações:

z A pessoa que paga a vantagem pratica indiferente penal, por falta de previsão legal desta conduta;
z Em regra, é crime formal, consumando-se com a solicitação, exigência ou cobrança.
z No caso do verbo obter, o crime é material;
z Só pode ser praticado dolosamente;
z Exige um especial fim de agir: obter vantagem ou promessa de vantagem para si ou para outrem.

A pena do crime de tráfico de influência será aumentada de metade se o agente alega ou insinua que a vanta-
gem é também destinada ao funcionário.

Corrupção Ativa

O crime de corrupção ativa, previsto no art. 333, do Código Penal, é um dos tipos penais mais cobrados em
relação aos crimes contra a administração pública.

Art. 333 Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou
retardar ato de ofício.
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou
omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.

Conduta típica: oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar,
omitir ou retardar ato de ofício.

CORRUPÇÃO PASSIVA CORRUPÇÃO ATIVA

Solicitar
Oferecer
Receber

Aceitar Prometer

Fique atento às informações a seguir, muito importantes em relação à corrupção ativa:

z Trata-se de crime plurinuclear, já que o tipo penal prevê mais de um verbo para sua prática: oferecer e prome-
ter. Por exemplo, João oferece uma quantia em dinheiro ao policial rodoviário federal para não ser multado
pela prática de infração de trânsito. Pedro promete entregar uma quantia em dinheiro ao guarda municipal
quando retornar ao seu veículo que está estacionado em local proibido;
z É crime formal, que se consuma com a prática da conduta delituosa, não se exigindo que o funcionário público
aceite a vantagem ou promessa de vantagem;
z Não admite a forma culposa;
z Exige-se dolo específico: a intenção de determinar o funcionário público a praticar, omitir ou retardar ato de
ofício;
z Caso o particular ceda à solicitação (corrupção passiva) ou à exigência (concussão), e entregue vantagem inde-
vida, seja em pagamento ou dando algo, a sua conduta será atípica, conforme posicionamento jurisprudencial
majoritário;
z A pena da corrupção ativa será aumentada de 1/3 (um terço) se em razão da vantagem ou promessa, o funcio-
nário público retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional

120 Não confunda os crimes de corrupção ativa, corrupção passiva e concussão:


CORRUPÇÃO ATIVA CORRUPÇÃO PASSIVA CONCUSSÃO
Verbos: oferecer e prometer Verbos: solicitar, receber e aceitar Verbo: exigir
Praticado por particular contra a Admi- promessa
nistração Pública Crime praticado por funcionário públi-
É crime quando o agente, com oferta Quando se tratar de corrupção passi- co contra a Administração Pública
ou promessa de vantagem, quer que o va privilegiada, quando o funcionário
funcionário público retarde ato de ofí- público “dá o jeitinho” e não pratica O agente exige, para si ou para outrem,
cio, omita ato de ofício ou pratique ato o ato que deveria, o particular figu- vantagem indevida, direta ou indireta,
de ofício ra como partícipe por ter praticado o ainda que fora da sua função pública,
Quando a corrupção ativa é para obter induzimento ou antes de assumi-la, mas em razão
voto, o crime será o tipificado no art. dela
229, do Código Eleitoral
Se o agente se limitar a pedidos como
“dar um jeitinho” ou “quebrar o galho”,
não se configura crime de corrupção
ativa por falta de elementares

Descaminho e Contrabando

Os crimes de descaminho e contrabando, previstos nos arts. 334 e 334-A, respectivamente, do Código Penal,
constituem práticas distintas, que devem ser observadas. Vamos simplificar estes crimes:

z Descaminho: consiste em não pagar direito ou imposto devido pela entrada, saída ou consumo de mercadoria.
z Contrabando: consiste na importação ou exportação de mercadoria proibida.

No descaminho, a mercadoria não tem a comercialização proibida no território brasileiro, já no contrabando,


sim.
No passado, os dois tipos penais estavam previstos no mesmo dispositivo. Contudo, houve alteração e, no
momento, cada um destes crimes integra um tipo penal distinto.
Vejamos cada um deles:

z Descaminho

Art. 334 Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou
pelo consumo de mercadoria.
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
§ 1º Incorre na mesma pena quem:
I - pratica navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei;
II - pratica fato assimilado, em lei especial, a descaminho;
III - vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no
exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira que introduziu clandes-
tinamente no País ou importou fraudulentamente ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território
nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem;
IV - adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mer-
cadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal ou acompanhada de documentos que
sabe serem falsos.
§ 2º Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou
clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências.
§ 3º A pena aplica-se em dobro se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo, marítimo ou fluvial.

Sobre o crime de descaminho, é importante que você leve em consideração o seguinte:


NOÇÕES DE DIREITO PENAL

„ Trata-se de crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa;
„ Trata-se de crime tributário formal, ou seja, não é necessária a prévia constituição definitiva do crédito
tributário;
„ Admite a forma tentada, quando, no caso de exportação, o crime é tentado se a mercadoria não chega a
sair do país;
„ A fraude utilizada pelo agente para iludir o pagamento de imposto pode se dar tanto em relação à quanti-
dade quanto em relação à qualidade do produto;
„ Não admite a modalidade culposa;
„ O crime consuma-se com a simples conduta de iludir o Estado quanto ao pagamento dos tributos devidos;
„ Admite a aplicação do princípio da insignificância, nos casos em que o valor seja inferior àquele considera-
do irrelevante para fins de execução fiscal;

121
Importante! Impedimento, Perturbação ou Fraude de
Concorrência
Tanto para o STF quanto para o STJ, atualmente,
poderá ser aplicado o princípio da insignificância O crime previsto no art. 335 foi revogado pelos art.
337-I e 337-K, do Código Penal.
ao crime de descaminho que não exceda o valor
de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Art. 335 Impedir, perturbar ou fraudar concorrên-
cia pública ou venda em hasta pública, promovida
pela administração federal, estadual ou municipal,
„ O pagamento integral da dívida tributá- ou por entidade paraestatal; afastar ou procurar
ria não extingue a punibilidade do crime de afastar concorrente ou licitante, por meio de vio-
descaminho.22 lência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de
vantagem:
z Contrabando Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou mul-
ta, além da pena correspondente à violência.
Art. 334-A Importar ou exportar mercadoria Parágrafo único - Incorre na mesma pena quem se
proibida: abstém de concorrer ou licitar, em razão da vanta-
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 ( cinco) anos. gem oferecida.
§ 1º Incorre na mesma pena quem:
Inutilização de Edital ou de Sinal
I - pratica fato assimilado, em lei especial, a
contrabando;
Art. 336 Rasgar ou, de qualquer forma, inutilizar ou
II - importa ou exporta clandestinamente merca-
conspurcar edital afixado por ordem de funcionário
doria que dependa de registro, análise ou auto- público; violar ou inutilizar selo ou sinal empregado,
rização de órgão público competente; por determinação legal ou por ordem de funcionário
III - reinsere no território nacional mercadoria público, para identificar ou cerrar qualquer objeto:
brasileira destinada à exportação; Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.
IV - vende, expõe à venda, mantém em depósito ou,
de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou Conduta típica: rasgar ou, de qualquer forma,
alheio, no exercício de atividade comercial ou inutilizar ou conspurcar edital afixado por ordem de
industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira; funcionário público; violar ou inutilizar selo ou sinal
V - adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio empregado, por determinação legal ou por ordem de
ou alheio, no exercício de atividade comercial ou funcionário público, para identificar ou cerrar qual-
industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira. quer objeto.
§ 2º Equipara-se às atividades comerciais, para os O crime de inutilização de edital ou de sinal, pre-
efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio visto no art. 336, do Código Penal, é de ação múltipla,
irregular ou clandestino de mercadorias estrangei- podendo ser praticado da seguinte forma:
ras, inclusive o exercido em residências.
§ 3º A pena aplica-se em dobro se o crime de con- z Rasgar ou, de qualquer forma, inutilizar ou cons-
trabando é praticado em transporte aéreo, marí- purcar (manchar ou tornar sujo, de forma que não
timo ou fluvial. possa ser utilizado) edital afixado por ordem de
funcionário público;
Sobre o crime de contrabando, é importante que z Violar ou inutilizar selo ou sinal empregado, por
você leve o seguinte para a sua prova: determinação legal ou por ordem de funcionário
público, para identificar ou cerrar (encobrir) qual-
„ Trata-se de crime comum, que pode ser pratica- quer objeto.
do por qualquer pessoa;
„ Não admite a modalidade culposa; Sobre o crime de inutilização de edital ou de sinal,
„ Admite tentativa; leve em consideração:
„ Não admite a aplicação do princípio da
insignificância. z É crime comum;
z Admite tentativa;
É importante mencionar que, no caso de produ- z Segundo posicionamento doutrinário dominante,
caso a conduta seja praticada quando não mais
tos específicos, a exemplo de armas de fogo ou subs-
produz efeito o edital (fora do seu prazo de vali-
tâncias entorpecentes, prevalecerá a aplicação da
dade, por exemplo), não se configurará este tipo
legislação especial, aplicando-se, respectivamente, o
penal.
Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826, de 2003) e a
Lei de Drogas (Lei nº 11.343, de 2006). Subtração ou Inutilização de Livro ou Documento
De acordo com a Súmula 151, do STJ:
O crime de subtração ou inutilização de livro ou
Súmula 151 (STJ) A competência para o processo documento está previsto no art. 337, do CP.
e julgamento por crime de contrabando ou desca-
minho define-se pela prevenção do Juízo Federal do Art. 337 Subtrair, ou inutilizar, total ou parcial-
lugar da apreensão dos bens. mente, livro oficial, processo ou documento confia-
do à custódia de funcionário, em razão de ofício, ou
de particular em serviço público:

22 STJ. 5ª Turma. RHC 43558-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 5/2/2015 (Info 555). STJ. 6ª Turma. HC 271650/PE, Rel. Min. Reynaldo Soa-
122 res da Fonseca, julgado em 03/03/2016.
Pena - reclusão, de dois a cinco anos, se o fato não II - deixar de lançar mensalmente nos títulos pró-
constitui crime mais grave. prios da contabilidade da empresa as quantias
descontadas dos segurados ou as devidas pelo
Tutela-se a Administração Pública, relativamente empregador ou pelo tomador de serviços;
ao normal funcionamento da atividade administrativa. III - omitir, total ou parcialmente, receitas ou lucros
Cabe destacar que o livro oficial, processo ou docu- auferidos, remunerações pagas ou creditadas e
mento (público ou particular) é confiado à custódia de demais fatos geradores de contribuições sociais
funcionário, em razão de ofício, ou de particular em previdenciárias:
serviço público. Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
§ 1º É extinta a punibilidade se o agente, espon-
Por isso, é dever que seja confiada a custódia a
taneamente, declara e confessa as contribuições,
funcionário, em razão de ofício, não se verificando
importâncias ou valores e presta as informações
este crime quando alguém subtrai ou inutiliza, total
devidas à previdência social, na forma definida em
ou parcialmente, um livro oficial, processo ou docu- lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.
mento de quem não o guarda por conta da sua função. § 2º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou
É importante analisar que, na parte final do precei- aplicar somente a de multa se o agente for primário
to primário do dispositivo em estudo, há a expressão e de bons antecedentes, desde que:
“ou de particular em serviço público”, pois existem, I - (vetado)
em certas hipóteses excepcionais, particulares que II - o valor das contribuições devidas, inclusive
desempenham funções públicas (por exemplo, mesá- acessórios, seja igual ou inferior àquele estabele-
rio nas eleições). Observe que se alguém subtrair ou cido pela previdência social, administrativamente,
inutilizar, total ou parcialmente, algum documento como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas
confiado a essas pessoas, a ele será imputado o crime execuções fiscais.
de subtração ou inutilização de livro ou documento. § 3º Se o empregador não é pessoa jurídica e sua
Sobre o núcleo do tipo: folha de pagamento mensal não ultrapassa R$
1.510,00 (um mil, quinhentos e dez reais), o juiz
z Subtrair: retirar o livro oficial, processo ou docu- poderá reduzir a pena de um terço até a metade ou
mento do local em que se encontra, dele se apode- aplicar apenas a de multa.
§ 4º O valor a que se refere o parágrafo anterior será
rando o agente;
reajustado nas mesmas datas e nos mesmos índices
z Inutilizar: tornar imprestável o livro oficial, pro-
do reajuste dos benefícios da previdência social.
cesso ou documento, total ou parcialmente. Não se
reclama sua efetiva destruição.
Extinção da punibilidade: caso o agente, de for-
ma espontânea, declare ou confesse as contribuições,
Consuma-se o crime em estudo no instante em que
importâncias ou valores e preste as informações devi-
o livro oficial, processo ou documento é subtraído,
das à previdência social, na forma definida em lei ou
mediante seu apoderamento pelo agente, seguido da
regulamento, antes do início da ação fiscal (não se exi-
inversão da sua posse e sua consequente retirada da
ge o pagamento do tributo sonegado).
esfera de vigilância da vítima, ou então inutilizado,
A declaração ou confissão e a prestação das infor-
total ou parcialmente.
mações deverão ocorrer antes do início da ação fiscal.
Observe que se o documento se destina a fazer
Sobre o crime de sonegação de contribuição previ-
prova de relação jurídica, e o agente visa beneficiar a
denciária, é importante ficar atento ao seguinte:
si próprio ou a terceiro, o fato constituirá crime mais
grave.
z Não admite a modalidade culposa;
Sobre o este tipo penal, é importante ficar atento
z De acordo com o art. 34, da Lei nº 9.249, de 1995,
ao seguinte:
confirmado pela doutrina majoritária, o pagamen-
to integral do tributo ou contribuição social, após a
z É crime comum;
ação fiscal, mas antes do recebimento da denúncia,
z Admite tentativa;
também acarretará a extinção da punibilidade:
z É crime subsidiário, respondendo o agente por ele
apenas caso não se configure um crime mais grave;
Art. 34 (Lei n° 9.249, de 1995) Extingue-se a puni-
z Na hipótese de o documento destinar-se a fazer
bilidade dos crimes definidos na Lei 8.137, de 27 de
prova de relação jurídica, e o agente visar bene-
dezembro de 1990, e na Lei n° 4.729, de 14 de julho
ficiar a si próprio ou a terceiro, o fato constituirá
de 1965, quando o agente promover o pagamento
mais grave;
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

do tributo ou contribuição social, inclusive acessó-


z Somente será praticado na modalidade dolosa. rios, antes do recebimento da denúncia.

Sonegação de Contribuição Previdenciária Será extinta a punibilidade se o agente, espon-


taneamente, declarar e confessar as contribuições,
O crime de sonegação de contribuição previden-
importâncias ou valores e prestar as informações
ciária está previsto no art. 337-A, do Código Penal:
devidas à previdência social, na forma definida em lei
ou regulamento, antes do início da ação fiscal.
Art. 337-A Suprimir ou reduzir contribuição social
previdenciária e qualquer acessório, mediante as O termo final para o pagamento é o início da ação
seguintes condutas: fiscal.
I - omitir de folha de pagamento da empresa ou de Se o agente for beneficiado pela concessão do par-
documento de informações previsto pela legislação celamento dos valores devidos a título de contribui-
previdenciária segurados empregado, empresário, ção social previdenciária, ou qualquer acessório, o
trabalhador avulso ou trabalhador autônomo ou a pagamento integral do débito importará na extinção
este equiparado que lhe prestem serviços; da punibilidade (§ 4º, art. 83, da Lei nº 9.430, de 1996). 123
O Supremo Tribunal Federal entende, com amparo Não se pode confundir este crime com o crime de
no art. 69, da Lei nº 11.941, de 2009, que o pagamento corrupção ativa. Vejamos a tabela comparativa:
integral do débito fiscal acarreta na extinção da puni-
bilidade do agente, ainda que efetuado após o julga- CORRUPÇÃO ATIVA EM
mento da ação penal, desde que antes do trânsito em TRANSAÇÃO COMER- CORRUPÇÃO ATIVA
julgado da condenação. CIAL INTERNACIONAL
Destaca-se:
Verbos: prometer, oferecer Verbos: oferecer e prometer
z A competência para julgar o crime de sonegação de e dar
contribuição previdenciária é da Justiça Federal; Fim específico: determi- Fim específico: determi-
z Admite a forma tentada; nar o funcionário público nar o funcionário público
z É crime material; estrangeiro a praticar, omi- a praticar, omitir ou retar-
z Este tipo penal admite a aplicação do princípio da tir ou retardar ato de ofício dar ato de ofício
insignificância, excluindo-se, assim, a tipicidade relacionado à transação
material do crime; comercial internacional
z Se o empregador não é pessoa jurídica e sua folha
de pagamento mensal não ultrapassa R$ 1.510,00
(um mil, quinhentos e dez reais), o juiz poderá O crime de corrupção ativa em transação comer-
reduzir a pena de um terço até a metade ou aplicar cial internacional terá sua pena aumentada de 1/3
apenas a de multa. (um terço) se, em razão da vantagem ou promessa, o
funcionário público estrangeiro retarda ou omite o
CRIMES PRATICADOS POR PARTICULAR CONTRA ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.
A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ESTRANGEIRA Sobre este crime, é importante mencionar que:

Dividem-se em dois tipos penais: z Só poderá ser praticado dolosamente;


z É crime comum;
z Corrupção ativa em transação comercial interna- z Nos verbos oferecer e prometer, trata-se de crime
cional; formal, de consumação antecipada;
z Tráfico de influência em transação comercial z No verbo dar, trata-se de crime material, que se
internacional. consuma com a obtenção do resultado;
z Admite tentativa, quando for possível fracionar
Inicialmente, é importante destacar quem é o fun- o iter criminis, as fases do crime, da cogitação ao
cionário público estrangeiro e quem se equipara a exaurimento.
funcionário público estrangeiro.
É a fase mental de preparação do crime: idealização de
COGITAÇÃO OU
liberação e resolução
z Funcionário público estrangeiro: quem, ainda FASE INTERNA
Não há conduta penalmente relevante
que transitoriamente ou sem remuneração, exer-
ce cargo, emprego ou função pública em entida-
des estatais ou em representações diplomáticas de ATOS
O crime começa a se projetar no mundo exterior.
O agente adquire arma de fogo
país estrangeiro; PREPARATÓRIOS
Em regra não são puníveis, salvo nos crimes-obstáculo
z Equipara-se a funcionário público estrangeiro:
quem exerce cargo, emprego ou função em empre-
sas controladas, diretamente ou indiretamente, ATOS DE
O agente começa a realizar o núcleo do tipo penal, de forma idô-
nea e inequívoca.
pelo Poder Público de país estrangeiro ou em orga- EXECUÇÃO
Nesta fase, pode haver punição pela tentativa
nizações públicas internacionais.

Corrupção Ativa em Transação Comercial Crime consumado é quando nele se reúnem todos os elementos
CONSUMAÇÃO de sua definição legal.
Internacional Fim do iter criminis

O crime de corrupção ativa em transação comer-


cial internacional, previsto no art. 337-B, do Código Não influi na tipicidade, mas pode influenciar na dosimetria da
EXAURIMENTO pena, ser reconhecido como qualificadora ou configurar crime
Penal, é bastante parecido com o tipo penal de cor- autônomo
rupção ativa, crime praticado por particular contra a
administração em geral, que já analisamos.
Tráfico de Influência em Transação Comercial
Art. 337-B Prometer, oferecer ou dar, direta ou Internacional
indiretamente, vantagem indevida a funcioná-
rio público estrangeiro, ou a terceira pessoa, Art. 337-C Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si
para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ou para outrem, direta ou indiretamente, vantagem
ato de ofício relacionado à transação comercial ou promessa de vantagem a pretexto de influir em
internacional: ato praticado por funcionário público estrangeiro
Pena – reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa. no exercício de suas funções, relacionado a transa-
Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/3 (um ção comercial internacional:
terço), se, em razão da vantagem ou promessa, o Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
funcionário público estrangeiro retarda ou omi- Parágrafo único. A pena é aumentada da metade,
te o ato de ofício, ou o pratica infringindo dever se o agente alega ou insinua que a vantagem é tam-
124 funcional.  bém destinada a funcionário estrangeiro.
O crime de tráfico de influência em transação comercial internacional, previsto no art. 337-C, do Código Penal,
é muito parecido com o crime de tráfico de influência, crime praticado por particular contra a administração em
geral, previsto no art. 332, do Código Penal.
Vejamos a tabela comparativa:

TRÁFICO DE INFLUÊNCIA EM TRANSAÇÃO


TRÁFICO DE INFLUÊNCIA
COMERCIAL INTERNACIONAL
Verbos: solicitar, exigir, cobrar ou obter Verbos: solicitar, exigir, cobrar ou obter
Pretexto: influir em ato praticado por funcionário público Pretexto: influir em ato praticado por funcionário público
estrangeiro no exercício de suas funções, relacionado à no exercício da função
transação comercial internacional

O crime de tráfico de influência em transação comercial internacional terá sua pena aumentada da metade se
o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário público estrangeiro.
Em relação a este tipo penal, é importante ficar atento ao seguinte:

z Só poderá ser praticado dolosamente;


z É crime comum;
z Nos verbos solicitar, exigir e cobrar, trata-se de crime formal, de consumação antecipada;
z No verbo obter, trata-se de crime material, que se consuma com a obtenção do resultado;
z Admite tentativa, quando for possível fracionar o iter criminis.

CRIMES EM LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS (INCLUÍDO PELA LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE


2021)

Em 1º de abril de 2021, foi publicada a Lei nº 14.133, de 2021, Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
Além de inovar na disposição sobre licitações e contratos, a nova lei trouxe algumas alterações legislativas em outros
diplomas, dentre os quais o Código Penal.
A grande novidade é que agora os crimes licitatórios estão dentro do Código Penal, inseridos dentro do
título “Dos Crimes Contra a Administração Pública” (arts. 337-E ao art. 337-P).

Importante!
Com a entrada em vigência da Lei nº 14.133, de 2021, os crimes licitatórios passaram a ser crimes contra a
Administração Pública.

Vale destacar que não houve grande mudança em relação aos crimes que eram previstos na lei de licitações
anterior (Lei nº 8.666, de 1993), sendo as condutas praticamente as mesmas, com idêntica ou muito parecida
tipificação.
Resumidamente, foram as seguintes as alterações:

z Os crimes licitatórios ganharam “nomes legais” (contratação direta ilegal; frustração do caráter competitivo
de licitação etc.);
z A punição ficou mais rigorosa, uma vez que a maioria dos crimes que eram punidos com detenção agora são
punidos com reclusão;
z A punição ficou mais rigorosa, também, em relação à quantidade de pena, e foi inserido um novo tipo penal, o
crime de omissão grave de dado ou de informação por projetista, no art. 337-O, do CP.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Veja, a seguir, de forma esquematizada, com ficaram os crimes licitatórios após a mudança e sua inclusão no
CP.

Contratação Direta Ilegal

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL

Art. 89 Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses Contratação direta ilegal
previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades per- Art. 337-E Admitir, possibilitar ou dar causa à contratação
tinentes à dispensa ou à inexigibilidade: direta fora das hipóteses previstas em lei:
Pena – detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa. Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, ten-
do comprovadamente concorrido para a consumação da
ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade
ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público
125
Veja que, apesar da redação diferente, o tipo é basicamente o mesmo, punindo a contratação direta ilegal. O
que houve foi o aumento substancial no tipo e na quantidade de pena. Trata-se de uma lex gravior, não retroativa.
A exclusão do parágrafo único, que dispunha sobre o beneficiário, não exclui a possibilidade de que ele seja
punido, uma vez que o crime se aplica a qualquer pessoa que incorra na conduta de admitir, possibilitar ou dar
causa à contratação direta fora das hipóteses previstas em lei (o que inclui o beneficiário).
Observe, também, que todos os crimes passaram a ter um nomen criminis (nome do crime).
Trata-se de crime formal, e se consuma com a mera dispensa ou inexigibilidade de licitação fora das hipóteses
legais. Para a prática deste crime, é necessária a comprovação do dolo específico do agente.

Frustração do Caráter Competitivo de Licitação

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL

Art. 90 Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou Frustração do caráter competitivo de licitação
qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedi- Art. 337-F Frustrar ou fraudar, com o intuito de obter para si ou
mento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, para outrem vantagem decorrente da adjudicação do objeto
vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação: da licitação, o caráter competitivo do processo licitatório:
Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa Pena - reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa

Novamente, o destaque é para o tratamento mais rigoroso.


O sujeito ativo é o concorrente que frusta o caráter competitivo da licitação, com intuito de receber vantagem
(especial fim de agir).
Trata-se de crime formal, consumando-se com o ato capaz de frustrar ou fraudar o caráter competitivo da
licitação. Não é necessário que o agente venha a obter vantagem na licitação.

Frustração do Caráter Competitivo de Licitação

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL

Art. 91 Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse priva- Patrocínio de contratação indevida


do perante a Administração, dando causa à instauração de Art. 337-G Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse priva-
licitação ou à celebração de contrato, cuja invalidação vier do perante a Administração Pública, dando causa à instaura-
a ser decretada pelo Poder Judiciário: ção de licitação ou à celebração de contrato cuja invalidação
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa vier a ser decretada pelo Poder Judiciário:
Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa

Redação quase idêntica, com tratamento mais rigoroso.


Trata-se de crime material, consumando-se com a instauração de licitação ou com a celebração do contrato.

Modificação ou Pagamento Irregular em Contrato Administrativo

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL


Art. 92 Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modi- Modificação ou pagamento irregular em contrato
ficação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em administrativo
favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos ce- Art. 337-H Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer mo-
lebrados com o Poder Público, sem autorização em lei, no ato dificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual,
convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos em favor do contratado, durante a execução dos contratos
contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem celebrados com a Administração Pública, sem autorização
cronológica de sua exigibilidade, observado o disposto no em lei, no edital da licitação ou nos respectivos instrumentos
art. 121 desta Lei: contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem
Pena – detenção, de dois a quatro anos, e multa. cronológica de sua exigibilidade:
Parágrafo único. Incide na mesma pena o contratado que, Pena - reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa
tendo comprovadamente concorrido para a consumação da
ilegalidade, obtém vantagem indevida ou se beneficia, injus-
tamente, das modificações ou prorrogações contratuais

Veja que foi um dos mais significativos aumentos de pena.


Trata-se de crime próprio, e só pode ser praticado pelo administrador que admite, possibilita ou dá causa à
modificação ilegal do contrato ou o que paga ou dá causa ao pagamento de fatura. É admitida a participação do
contratado.

126
Modificação ou Pagamento Irregular em Contrato Administrativo

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL

Art. 93 Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qual- Perturbação de processo licitatório


quer ato de procedimento licitatório: Art. 337-I Impedir, perturbar ou fraudar a realização de
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa qualquer ato de processo licitatório:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa

A nova redação é idêntica à da lei anterior; houve apenas a inclusão do nome do crime e o aumento na quan-
tidade de pena (o legislador manteve o crime apenado com detenção).
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Trata-se de crime comum.
A conduta do agente deve ser apta a lesionar o bem jurídico, quais sejam: os atos que compõem o processo
licitatório.

Violação de Sigilo em Licitação

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 93 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL

Art. 94 Devassar o sigilo de proposta apresentada em pro- Violação de sigilo em licitação


cedimento licitatório, ou proporcionar a terceiro o ensejo de Art. 337-J Devassar o sigilo de proposta apresentada em
devassá-lo: processo licitatório ou proporcionar a terceiro o ensejo de
Pena – detenção, de 2 (dois) a 3 (três) anos, e multa devassá-lo
Pena - detenção, de 2 (dois) anos a 3 (três) anos, e multa

Este foi o único crime licitatório que não foi alterado, havendo apenas a inclusão do nomen criminis.

Afastamento de Licitante

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL


Art. 95 Afastar ou procurar afastar licitante, por meio de vio- Afastamento de licitante
lência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem Art. 337-K Afastar ou tentar afastar licitante por meio de
de qualquer tipo: violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vanta-
Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, gem de qualquer tipo:
além da pena correspondente à violência. Pena - reclusão, de 3 (três) anos a 5 (cinco) anos, e multa,
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem se abstém além da pena correspondente à violência.
ou desiste de licitar, em razão da vantagem oferecida Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem se abstém
ou desiste de licitar em razão de vantagem oferecida

Neste tipo, houve apenas o aumento de pena.

Fraude em Licitação ou Contrato

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL


Art. 96 Fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação Fraude em licitação ou contrato
instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercado- Art. 337-L Fraudar, em prejuízo da Administração Pública,
rias, ou contrato dela decorrente: licitação ou contrato dela decorrente, mediante:
I – elevando arbitrariamente os preços; I - entrega de mercadoria ou prestação de serviços com qua-
II – vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria lidade ou em quantidade diversas das previstas no edital ou
falsificada ou deteriorada; nos instrumentos contratuais;
III – entregando uma mercadoria por outra; II - fornecimento, como verdadeira ou perfeita, de mercadoria
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

IV – alterando substância, qualidade ou quantidade da mer- falsificada, deteriorada, inservível para consumo ou com pra-
cadoria fornecida; zo de validade vencido;
V – tornando, por qualquer modo, injustamente, mais onero- III - entrega de uma mercadoria por outra;
sa a proposta ou a execução do contrato: IV - alteração da substância, qualidade ou quantidade da
Pena – detenção, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa mercadoria ou do serviço fornecido;
V - qualquer meio fraudulento que torne injustamente mais
onerosa para a Administração Pública a proposta ou a exe-
cução do contrato:
Pena - reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa

No crime de fraude em licitação ou contrato, o destaque é para a inclusão do inciso I e a punição mais grave.
O crime consuma-se com a ocorrência do prejuízo à Administração Pública.

127
Contratação Inidônea

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL


Art. 97 Admitir à licitação ou celebrar contrato com empre- Contratação inidônea
sa ou profissional declarado inidôneo: Art. 337-M Admitir à licitação empresa ou profissional decla-
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. rado inidôneo:
Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que, de- Pena - reclusão, de 1 (um) ano a 3 (três) anos, e multa.
clarado inidôneo, venha a licitar ou a contratar com a § 1º Celebrar contrato com empresa ou profissional declarado
Administração inidôneo:
Pena - reclusão, de 3 (três) anos a 6 (seis) anos, e multa.
§ 2º Incide na mesma pena do caput deste artigo aquele que,
declarado inidôneo, venha a participar de licitação e, na mes-
ma pena do § 1º deste artigo, aquele que, declarado inidôneo,
venha a contratar com a Administração Pública

O novo tipo apresenta o mesmo teor do tipo revogado, apenas disposto de forma diferente e com pena maior.

Impedimento Indevido

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL


Art. 98 Obstar, impedir ou dificultar, injustamente, a inscri- Impedimento indevido
ção de qualquer interessado nos registros cadastrais ou Art. 337-N Obstar, impedir ou dificultar injustamente a ins-
promover indevidamente a alteração, suspensão ou cance- crição de qualquer interessado nos registros cadastrais ou
lamento de registro do inscrito: promover indevidamente a alteração, a suspensão ou o can-
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa celamento de registro do inscrito:
Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa

Novamente, o novo tipo apresenta a mesma redação do tipo revogado, aumentando-se a pena.

Omissão Grave de Dado ou de Informação por Projetista

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL

Sem correspondente na Lei anterior Omissão grave de dado ou de informação por projetista
Art. 337-O. Omitir, modificar ou entregar à Administração
Pública levantamento cadastral ou condição de contorno
em relevante dissonância com a realidade, em frustração
ao caráter competitivo da licitação ou em detrimento da se-
leção da proposta mais vantajosa para a Administração Pú-
blica, em contratação para a elaboração de projeto básico,
projeto executivo ou anteprojeto, em diálogo competitivo
ou em procedimento de manifestação de interesse:
Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa.
§ 1º Consideram-se condição de contorno as informa-
ções e os levantamentos suficientes e necessários para a
definição da solução de projeto e dos respectivos preços
pelo licitante, incluídos sondagens, topografia, estudos de
demanda, condições ambientais e demais elementos am-
bientais impactantes, considerados requisitos mínimos ou
obrigatórios em normas técnicas que orientam a elabora-
ção de projetos.
§ 2º Se o crime é praticado com o fim de obter benefício,
direto ou indireto, próprio ou de outrem, aplica-se em do-
bro a pena prevista no caput deste artigo

O art. 337-O, do CP, que dispõe sobre o crime de omissão grave de dado ou informação por projetista, é o único
que não encontra correspondente na Lei nº 8.666, de 1993.
O tipo pune com pena de reclusão 6 meses a 3 anos e multa o contratado pela Administração Pública com a
finalidade de elaborar anteprojeto, projeto básico ou projeto executivo de obras e serviços de engenharia, que
omita, modifique ou entregue algum dado ou informação errado.
O dispositivo visa coibir que o contratado omita, modifique ou entregue informações relevantes para o pro-
cesso licitatório que não reflitam a realidade no que diz respeito ao levantamento cadastral ou à condição de
contorno.
Observe que a pena se aplica em dobro se o crime for praticado com o fim de obter benefício, direto ou indi-
reto, próprio ou de outrem.
128
Da Pena de Multa Cominada aos Crimes em Licitações e Contratos Administrativos

REDAÇÃO NA LEI Nº 8.666, DE 1993 REDAÇÃO ATUAL NO CÓDIGO PENAL

Art. 99 A pena de multa cominada nos arts. 89 a 98 desta Art. 337-P A pena de multa cominada aos crimes previs-
Lei consiste no pagamento de quantia fixada na sentença e tos neste Capítulo seguirá a metodologia de cálculo pre-
calculada em índices percentuais, cuja base corresponde- vista neste Código e não poderá ser inferior a 2% (dois
rá ao valor da vantagem efetivamente obtida ou potencial- por cento) do valor do contrato licitado ou celebrado com
mente auferível pelo agente. contratação direta
§ 1º Os índices a que se refere este artigo não poderão ser
inferiores a 2% (dois por cento), nem superiores a 5% (cin-
co por cento) do valor do contrato licitado ou celebrado
com dispensa ou inexigibilidade de licitação.
§ 2º O produto da arrecadação da multa reverterá, con-
forme o caso, à Fazenda Federal, Distrital, Estadual ou
Municipal

Outra modificação trazida foi a exclusão do teto previsto para a multa cominada aos crimes licitatórios, que
antes era limitada a 5% do valor do contrato licitado ou celebrado com dispensa ou inexigibilidade de licitação.
Além disso, o art. 99, da Lei nº 8.666, de 1993, trazia forma especial de cálculo de multa, que era aplicada em
porcentagem sobre o valor da vantagem efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo agente. Agora,
segue-se a regra geral do CP, com a estipulação de dias-multa.
O único ponto mantido de acordo com a Lei anterior foi que o valor da pena não pode ser inferior a 2% do
valor do contrato licitado ou celebrado com contratação direta.
A forma do cálculo da pena de multa dos crimes licitatórios seguia forma especial na Lei nº 8.666, de 1993;
agora, o cálculo segue a sistemática prevista no CP .

CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA

Os crimes contra a administração da justiça têm como finalidade proteger uma regular fruição da atividade
judicial brasileira, incluindo atividades de natureza policial.
A atividade judicial é de fundamental importância para a sociedade, necessitando, assim, de proteção por
parte do Direito Penal.

Reingresso de Estrangeiro Expulso

Art. 338 Reingressar no território nacional o estrangeiro que dele foi expulso:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, sem prejuízo de nova expulsão após o cumprimento da pena.

Este crime, previsto no art. 338, do Código Penal, irá se configurar quando o estrangeiro que foi expulso do
Brasil reingressar ao território nacional.
Nos termos do art. 54, da Lei de Migração (Lei nº 13.445, de 2017), a expulsão consiste em medida administrativa
de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional, conjugada com o impedimento de reingresso
por prazo determinado.

Importante!
O agente será responsabilizado penalmente, podendo, ainda, sofrer nova expulsão do território brasileiro.

Sobre o crime de reingresso de estrangeiro expulso, é importante ficar atento ao seguinte:


NOÇÕES DE DIREITO PENAL

z É crime de mão própria, praticado pelo estrangeiro expulso, não podendo a figura típica ser praticada por
intermédio de terceira pessoa. O fato de o crime ser de mão própria não exclui a possibilidade de concurso de
pessoas na modalidade participação;
z É necessário, para configuração do crime, que o estrangeiro tenha ciência de que foi expulso do território bra-
sileiro (prévia e oficial expulsão do estrangeiro, por meio de decisão administrativa);
z Admite tentativa;
z É crime material, que se consuma com o devido reingresso ao território nacional, após ter deixado o país em
razão da expulsão. Não é necessário que o agente realize alguma conduta típica criminosa específica. Trata-se
de crime instantâneo;
z Trata-se de crime de competência da justiça federal;
z Não se tipifica o crime quanto o estrangeiro, após decretada sua expulsão, permanece indevidamente no país.

129
Denunciação Caluniosa Observe as principais diferenças entre a denuncia-
ção caluniosa e o crime de calúnia:
A denunciação caluniosa está prevista no art. 339,
do Código Penal: DENUNCIAÇÃO
CALÚNIA
CALUNIOSA
Art. 339 Dar causa à instauração de investigação
policial, de processo judicial, instauração de inves- É crime contra a adminis- É crime contra a honra
tigação administrativa, inquérito civil ou ação de tração da justiça A ação penal é privada
improbidade administrativa contra alguém, impu- A ação penal é pública in- Punida pelo fato de o agen-
tando-lhe crime de que o sabe inocente: condicionada; discute-se te ofender a honra objetiva
Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa. na doutrina e jurisprudên- da vítima
§ 1º A pena é aumentada de sexta parte, se o agente cia se o processo por de- É admitida a imputação
se serve de anonimato ou de nome suposto. nunciação caluniosa pode falsa apenas de crime
§ 2º A pena é diminuída de metade, se a imputação ser iniciado antes do des-
é de prática de contravenção. fecho do procedimento ou
ação originários
Tem como figura típica a seguinte conduta: dar Punida pelo fato de o agen-
causa direta ou indireta à instauração de investigação te movimentar falsamente
policial, de processo judicial, instauração de investiga- o aparato estatal, tentando
ção administrativa, inquérito civil ou ação de impro- prejudicar a vítima perante
bidade administrativa contra alguém, imputando-lhe o Estado
crime de que o sabe inocente. É admitida a imputação
falsa de crime ou contra-
Como é possível se extrair pela leitura da figura
venção penal
típica, o crime pode ser praticado mesmo que o agen-
te dê causa a outro procedimento, ainda que não seja
processo judicial, a exemplo de investigação policial Comunicação Falsa de Crime ou Contravenção
ou administrativa. É importante compreender isso,
pois muitas questões abordam esta situação. Art. 340 Provocar a ação de autoridade, comuni-
Sobre o crime de denunciação caluniosa, é impor- cando-lhe a ocorrência de crime ou de contraven-
tante ficar atento ao seguinte: ção que sabe não se ter verificado:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
z Só pode ser praticado dolosamente. Parte da dou-
trina não admite o dolo eventual neste crime, já
que o tipo penal exige que o agente saiba que o
Importante!
fato é imputado contra pessoa inocente.
Ao contrário do que ocorre no crime de denun-
A denunciação caluniosa poderá se configurar ciação caluniosa, no crime de falsa comuni-
quando o agente imputa crime que realmente acon-
cação de crime ou contravenção o agente não
teceu contra pessoa que sabe ser inocente ou quando
imputa a alguém a prática de crime que não existiu individualiza o autor do fato que não existiu, mas
(neste caso, não há dúvidas sobre a inocência da pes- apenas comunica à autoridade crime ou contra-
soa, já que o fato sequer aconteceu); venção penal que sabe não ter ocorrido.

z É necessário que o fato imputado seja crime ou


contravenção penal (no caso de contravenção Sobre este crime, é importante mencionar que:
penal, a pena será reduzida de metade), não se
configurando este tipo penal caso o agente impute z Não admite a forma culposa. Assim, se o agente
infração administrativa ou civil; comunica à autoridade, sem intenção, crime ou
z É crime comum; contravenção penal, provocando a ação desta, este
z Admite a forma tentada. Por exemplo, o agente tipo penal não estará configurado;
narra ao delegado de polícia que o autor de deter-
z É crime comum;
minado crime foi a pessoa A, mas o delegado não
z Admite tentativa;
inicia qualquer investigação porque o verdadeiro
autor do crime é B, que se apresenta e confessa ter z Se o fato imputado for infração administrativa ou
cometido o delito antes mesmo de a autoridade ter civil, não irá se configurar o crime;
iniciado qualquer investigação; z A maioria da doutrina, não se configura o crime
z A pessoa contra quem se imputa o crime deve ser quando o agente se limita a comunicar ilícito penal
determinada, sendo ela, assim como o Estado, o diverso do que realmente ocorreu, desde que o
sujeito passivo da prática delituosa; fato comunicado e o que realmente ocorreu sejam
z Em regra, a denunciação caluniosa absorve o cri- crimes da mesma natureza;
me de calúnia.
z Se o agente faz a comunicação falsa para tentar
A pena será aumentada de 1/6 (sexta parte), caso ocultar outro crime por ele praticado, responde
o agente se sirva de anonimato ou de nome suposto. também pela comunicação falsa de crime.
No caso de denunciação caluniosa privilegiada, a
pena será diminuída de metade, caso a imputação seja
130 de prática de contravenção penal.
Art. 342 Fazer afirmação falsa, ou negar ou
COMUNICAÇÃO
DENUNCIAÇÃO calar a verdade como testemunha, perito, con-
FALSA DE CRIME OU
CALUNIOSA tador, tradutor ou intérprete em processo judi-
CONTRAVENÇÃO
cial, ou administrativo, inquérito policial, ou em
O agente não aponta pes- juízo arbitral:
soa certa e determinada O agente aponta pessoa Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e
como autora da infração certa e determinada como multa.
penal, mas apenas comu- autora da infração penal
nica fato inexistente Trata-se de crime plurinuclear, que poderá ser
Instaura inquérito policial, praticado mediante a execução de quaisquer um dos
procedimento investiga- verbos previstos no tipo penal.
Adota alguma ação com tório criminal, processo Sua consumação ocorre com o encerramento do
finalidade de apurar os judicial, processo adminis- depoimento.
fatos trativo disciplinar, inquérito Sobre o crime de falso testemunha ou falsa perícia,
civil ou ação de improbida- é importante levar para a sua prova:
de administrativa
z Não admite a forma culposa;
Exemplo: José Carlos viu uma publicação no Face- z Sujeito ativo: é crime de mão própria, que só pode-
rá ser praticado por uma das pessoas previstas no
book relacionada a um aborto. De imediato, ligou
tipo penal (testemunha, perito, contador, tradutor
para uma delegacia de polícia e comunicou o crime ao
ou intérprete).
delegado de polícia, que iniciou as investigações sobre
o fato. Entretanto, não sabia José Carlos que o abor-
to não existiu, já que a publicação se tratava de uma
Importante!
brincadeira por parte daquele que a realizou.
Não há que se falar em figura típica da comunica- � O ofendido (vítima) que praticar quaisquer dos
ção falsa de crime, já que o agente não teve dolo de verbos previstos no tipo penal não pratica o crime
comunicar falsamente o fato que não existiu. de falso testemunho, já que ele não é testemunha;
� Os investigados ou acusados não cometem o
Autoacusação Falsa crime de falso testemunho, pois não são consi-
derados testemunhas;
Art. 341 Acusar-se, perante a autoridade, de crime � As pessoas descompromissadas ou dispensa-
inexistente ou praticado por outrem: das de depor, bem como as pessoas proibidas
Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou de depor, poderão ser responsabilizadas pelo
multa.
delito em tela.
É possível a configuração deste tipo penal quando
o agente se acusar de: Segundo posicionamento doutrinário dominante:

z Crime não existente (a conduta criminosa sequer z O falso testemunho não admite coautoria, mas é
foi praticada, sequer existiu); possível a participação;
z Crime existente, mas praticado por outra pessoa z A falsa perícia admite coautoria e participação.
(a conduta criminosa foi realmente realizada, mas
foi outro indivíduo que a praticou). Causas de Aumento de Pena

Sobre a autoacusação falsa, é importante levar em Art. 342 [...]


consideração: § 1º As penas aumentam-se de um sexto a um ter-
ço, se o crime é praticado mediante suborno ou
se cometido com o fim de obter prova destinada a
z Só pode ser praticado dolosamente;
produzir efeito em processo penal, ou em processo
z Admite a modalidade tentada na forma escrita,
civil em que for parte entidade da administra-
quando a confissão falsa remetida se extravia; ção pública direta ou indireta.
z Não se exige que seja praticado apenas perante
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

a autoridade policial, mas pode ser na presença O tipo penal apresenta hipóteses que aumentarão
de qualquer autoridade competente (delegado de a pena do agente. As penas aumentam-se de 1/6 (um
polícia, membro do Ministério Público, autoridade sexto) a um terço, se o crime é:
judicial etc.);
z Não se exige a prática de qualquer ato por parte da z Praticado mediante suborno;
autoridade para a consumação do crime, bastando z Cometido com o fim de obter prova destinada a
a autoacusação falsa; produzir efeito em processo penal;
z O direito da autodefesa não permite que se impute z Cometido com o fim de obter prova destinada a pro-
falsamente crime a si mesmo. duzir efeito em processo civil em que for parte enti-
dade da Administração Pública direta ou indireta.
Falso Testemunho ou Falsa Perícia

O crime de falso testemunho ou falsa perícia está


previsto no art. 342, do Código Penal. 131
Retratação — Causa Especial de Extinção da Sobre o crime de corrupção ativa de testemunha
Punibilidade contador, perito, intérprete ou tradutor, é importante
ficar atento ao seguinte:
Art. 342 [...]
§ 2º O fato deixa de ser punível se, antes da sen- z Não pode ser praticado culposamente;
tença no processo em que ocorreu o ilícito, o z Nos verbos oferecer ou prometer, é crime formal;
agente se retrata ou declara a verdade. z No verbo dar, é crime material;
z Admite tentativa, quando for possível fracionar o
Se o agente se retratar ou falar a verdade poderá iter criminis;
ter extinta a punibilidade do crime, desde que isso: z O crime de corrupção ativa de testemunha ou
perito deixa de ser punível se, antes da sentença
z Seja realizado antes da sentença (ainda preva- no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se
lece o entendimento de que se trata da sentença retrata ou declara a verdade, mas não se estende
recorrível); ao crime apurado no procedimento em que a tes-
z Seja realizado no processo em que ocorreu o ilícito temunha faltou com a verdade.
(no processo em que se deu o falso e não no proces-
so referente ao falso). Coação no Curso do Processo

Não responderá pelo crime de falso testemu- Art. 344 Usar de violência ou grave ameaça,
nho a pessoa que praticar as condutas descritas no com o fim de favorecer interesse próprio ou
tipo penal incriminador com a finalidade de não se alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer
outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir
autoincriminar.
em processo judicial, policial ou administrativo, ou
Lembre-se de que ninguém será prejudicado por
em juízo arbitral:
não produzir provas contra si mesmo. Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa, além
Quando a testemunha mente por estar sendo da pena correspondente à violência.
ameaçada de morte ou algum outro mal grave, não
responde pelo crime de falso testemunho. O crime de coação no curso do processo é aquele
em que, para beneficiar a si ou a terceiro, o agente
Corrupção Ativa de Testemunha ou Perito emprega violência ou grave ameaça contra pessoas
que participam do processo ou juízo arbitral.
Art. 343 Dar, oferecer ou prometer dinheiro ou Observe as duas hipóteses:
qualquer outra vantagem a testemunha, perito,
contador, tradutor ou intérprete, para fazer afirma- z Suponha que André tenha praticado um crime de
ção falsa, negar ou calar a verdade em depoimento, roubo a um supermercado, estando ele sendo pro-
perícia, cálculos, tradução ou interpretação: cessado por isso. Thais, funcionária do supermer-
Pena - reclusão, de três a quatro anos, e multa. cado, é testemunha, tendo sido marcado um dia
para que ela comparecesse em juízo para dar seu
O art. 343, do Código Penal, apresenta um outro depoimento. André, com a finalidade de favorecer
tipo penal, chamado por parte da doutrina de corrup- seus próprios interesses, vai à casa de Thais e, uti-
ção ativa de testemunha contador, perito, intérprete lizando-se de uma arma de fogo para ameaçá-la,
ou tradutor. exige que ela diga que não foi ele quem praticou o
fato, mas outra pessoa. André praticou o crime de
z Verbos: dar, oferecer ou prometer; coação no curso do processo, já que empregou gra-
z Destinatário: testemunha, perito, contador, tra- ve ameaça contra pessoa chamada a intervir em
dutor ou intérprete; processo judicial;
z Finalidade: fazer com que as pessoas façam z Aproveitando a mesma hipótese anterior, porém,
afirmação falsa, neguem ou calem a verdade agora André, sabendo sobre o que Thais disse na
em depoimento, perícia, cálculos, tradução ou inquirição, vai à casa dela e, utilizando-se de uma
interpretação. arma de fogo para ameaçá-la, diz que irá matá-la
por não dizer que foi outra pessoa que praticou o
Art. 342 [...] crime, por tê-lo incriminado. André, nesta hipó-
Parágrafo único. As penas aumentam-se de um sex- tese, praticou o crime de ameaça, uma vez que
to a um terço, se o crime é cometido com o fim de empregou grave ameaça contra a pessoa após o
obter prova destinada a produzir efeito em proces- depoimento, exaurindo-se a participação daquela
so penal ou em processo civil em que for parte enti- na ação.
dade da administração pública direta ou indireta.
Caso o agente se utilize de violência para praticar o
As penas irão aumentar de 1/6 a 1/3 (um sexto a crime de coação no curso do processo, responderá por
um terço), se o crime é: este, além da pena correspondente à violência.
Sobre a coação no curso do processo, fique atento
z Cometido com o fim de obter prova destinada a às seguintes informações:
produzir efeito em processo penal;
z Cometido com o fim de obter prova destinada a z Pode ser praticado contra as autoridades respon-
produzir efeito em processo civil em que for par- sáveis pela condução do processo, como juízes,
te entidade da Administração Pública direta ou promotores, delegados de polícia, entre outros;
132 indireta. z Só pode ser praticado dolosamente;
z Exige-se o dolo específico por parte do agente de z Trata-se de crime próprio. Exige-se que a coisa seja
favorecer interesse próprio ou alheio; própria do agente que praticou a conduta deli-
z É crime formal, que se consuma com o uso de vio- tuosa. Pode haver coautoria ou participação de
lência ou grave ameaça, independentemente de o terceiros;
coagido ceder; z O objeto deve estar em poder de terceiro por deter-
z Admite a forma tentada na hipótese de o crime ser minação judicial ou convenção. Se for por outro
praticado por escrito e haver extravio. motivo, não se configurará este crime;
z Admite tentativa.
Exercício Arbitrário das Próprias Razões
Para consumação deste crime, existem duas
correntes:
Art. 345 Fazer justiça pelas próprias mãos, para
satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quan- z O crime é formal e consuma-se quando o agente
do a lei o permite: emprega o meio executório;
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, z O crime é material e só se consuma com a satisfa-
além da pena correspondente à violência. ção da pretensão visada.
Parágrafo único. Se não há emprego de violência,
somente se procede mediante queixa. Fraude Processual

Observe a parte final da figura típica: salvo quan- Art. 347 Inovar artificiosamente, na pendência de
do a lei o permite. processo civil ou administrativo, o estado de lugar,
Pode-se concluir que, quando houver permissão de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir a erro o
legal, o agente que fizer justiça com as próprias mãos juiz ou o perito:
não será responsabilizado criminalmente. Assim, caso Pena - detenção, de três meses a dois anos, e multa.
o agente mate alguém em legítima defesa, não será ele Parágrafo único. Se a inovação se destina a produ-
responsabilizado criminalmente. zir efeito em processo penal, ainda que não inicia-
Observe o exemplo a seguir: Tício é proprietário do, as penas aplicam-se em dobro.
de uma casa que se encontra alugada para Mévio. O
inquilino está devendo 6 (seis) meses de aluguel. Tício, Com previsão legal no art. 347, do Código Penal, o
indignado com a situação, vai até o local, troca todas crime de fraude processual configurar-se-á quando o
as fechaduras e coloca os objetos pessoais de Mévio agente inovar artificiosamente, na pendência de proces-
do lado de fora. Neste caso, Tício praticou o crime de so civil ou administrativo, o estado de lugar, de coisa ou
exercício arbitrário das próprias razões, já que fez jus- de pessoa, com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito.
tiça com as próprias mãos, para satisfazer pretensão Aplica-se a pena em dobro se a inovação se destina
legítima (ele tinha o direito de receber os valores cor- a produzir efeito em processo penal, ainda que não
respondentes ao aluguel de seu imóvel). indiciado o agente.
A pretensão do agente deveria ter sido soluciona- Exemplo: Carlos praticou o crime de homicídio, ao
da pelos meios legais pertinentes. matar Cláudio, que lhe devia uma quantia em dinhei-
Sobre o exercício arbitrário das próprias razões, ro. Com a finalidade de simular uma hipótese de legíti-
deve-se ficar atento ao seguinte: ma defesa, para induzir o perito a erro, Carlos coloca,
fraudulentamente, nas mãos da vítima, uma arma de
z É crime comum, que pode ser praticado por qual- fogo, modificando o estado de pessoa.
quer pessoa; Carlos praticou o crime de fraude processual, res-
z Só poderá ser praticado dolosamente; pondendo pelo crime com a pena dobrada, já que ino-
z É crime formal, consumando-se com o emprego ou vou artificiosamente, na pendência de processo penal.
uso do meio arbitrário, independentemente de o Sobre o crime de fraude processual, fique atento
agente alcançar ou não a pretensão; ao seguinte:
z Admite tentativa;
z Caso o agente pratique o crime com emprego de z É crime comum;
violência, responderá também por ela. z Não admite a modalidade culposa;
z Exige dolo específico: fim de induzir a erro juiz ou
Subtração ou Dano de Coisa Própria Legalmente em perito;
Poder de Terceiro z É crime formal, que se consuma com a prática da
conduta prevista no tipo penal, ainda que não seja
Art. 346 Tirar, suprimir, destruir ou danificar coi- efetivamente induzido a erro o juiz ou o perito;
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

sa própria, que se acha em poder de terceiro por z Admite a modalidade tentada.


determinação judicial ou convenção:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
Importante!
No art. 346, do Código Penal, há uma outra figu-
ra típica, bastante parecida com o crime de exercício A respeito do direito à não autoincriminação,
arbitrário das próprias razões. vejamos o entendimento do STJ: “O direito à não
Sobre este tipo penal, é importante salientar: autoincriminação não abrange a possibilidade
de os acusados alterarem a cena do crime, ino-
z Só pode ser praticado dolosamente; vando o estado de lugar, de coisa ou de pessoa,
z É crime de ação múltipla, que irá se configurar com para, criando artificiosamente outra realidade,
a prática de quaisquer um dos verbos previstos no levar peritos ou o próprio Juiz a erro de avalia-
tipo penal: tirar, suprimir, destruir ou danificar; ção relevante”.23
23 (STJ: HC 137.206/SP, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª Turma, j. 01.12.2009). 133
Favorecimento Pessoal Sobre o favorecimento pessoal, leve para a sua
prova o seguinte:
Art. 348 Auxiliar a subtrair-se à ação de autorida-
de pública autor de crime a que é cominada pena z Não pode ser praticado culposamente;
de reclusão: z É crime comum;
Pena - detenção, de um a seis meses, e multa. z O crime consuma-se com o êxito na subtração do
§ 1º Se ao crime não é cominada pena de reclusão: criminoso;
Pena - detenção, de quinze dias a três meses, e z Caso não ocorra êxito na subtração, haverá a
multa. modalidade tentada;
§ 2º Se quem presta o auxílio é ascendente, des- z É crime acessório, que exige a ocorrência de delito
cendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica anterior;
isento de pena.
z A infração penal cometida pelo agente deve cons-
tituir um crime. Se a infração for tipificada como
O favorecimento pessoal, previsto no art. 348, do contravenção penal, o favorecimento será atípico;
Código Penal, configurar-se-á quando o agente auxi- z Não pratica o crime o agente que auxiliar a sub-
liar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor trair-se à ação de autoridade pública autor de con-
de crime a que é cominada pena de reclusão. travenção penal.
O crime consiste no apoio dado ao criminoso, seja
dando refúgio, abrigo ou facilitando a sua fuga. Neste Favorecimento Real
crime, o auxílio dá-se após a prática do crime, o que
difere da participação, em que o auxílio é prestado Art. 349 Prestar a criminoso, fora dos casos de
antes ou durante o crime. co-autoria ou de receptação, auxílio destinado
a tornar seguro o proveito do crime:
Pena - detenção, de um a seis meses, e multa.
FAVORECIMENTO PARTICIPAÇÃO NO
PESSOAL DELITO
Requisitos do favorecimento real:
Auxílio ao criminoso ocor- Auxílio ao criminoso ocorre
re após a prática do crime antes ou durante o crime z Prestar auxílio a criminoso após a prática do
crime;
Este tipo penal pode gerar algumas dúvidas. Para z O auxílio é destinado a tornar seguro o proveito do
esclarecê-las, vamos analisar alguns exemplos: crime (que já ocorreu) — não abrange o provento
Exemplo 1: Júnior pratica o crime de roubo. O de contravenção penal;
delegado de polícia da região está a sua procura. O z Aquele que presta auxílio não pode ser coautor ou
autor do crime pede para se esconder do delegado na receptador do crime praticado anteriormente.
casa de Danilo, seu amigo. Danilo, em sua casa, escon-
de Júnior. Júnior responderá pelo crime de roubo; Ao favorecimento real não se aplica a escusa penal
Danilo, pelo crime de favorecimento pessoal, já que absolutória mesmo que a conduta seja praticada pelo
auxiliou a se subtrair da ação de autoridade pública ascendente, descendente, cônjuge ou irmão.
Sobre o favorecimento real, é importante mencio-
autor de crime a que se comina pena de reclusão.
nar que:
Exemplo 2: Francisco, Jefferson e César combinam
um crime de roubo. Francisco e Jefferson vão prati-
z Não admite a culpa;
car o verbo descrito no tipo penal, César irá dar fuga
z Admite tentativa;
aos agentes. O crime é praticado, os policiais acabam
z O auxílio não pode ter sido combinado previamen-
tomando conhecimento da prática delituosa e vão
te pelos agentes; caso os agentes combinem antes,
atrás dos criminosos, contudo, eles conseguem se eva-
o crime não será de favorecimento real, e sim
dir. Todos os agentes responderão apenas pelo crime
haverá participação;
de roubo. Não se aplica a César, responsável pela fuga,
z É crime comum.
o crime de favorecimento pessoal, porque, para que
se configure este crime, não pode o agente ter partici-
Favorecimento Real Impróprio ou Ingresso Não
pado do crime anterior nem pode haver liame subjeti-
Autorizado de Aparelho Telefônico ou Similar em
vo prévio entre os agentes, ou seja, ligação ou vínculo
Presídio
psicológico e subjetivo entre os agentes do delito.
Este crime apresenta uma forma privilegiada, à
Há uma conduta típica, prevista no art. 349-A, do
qual se comina uma pena mais branda se ao crime
Código Penal, inserida no ano de 2009, chamada por
praticado não é cominada pena de reclusão (detenção,
parte da doutrina de favorecimento real impróprio.
por exemplo).
Haverá isenção de pena (escusa penal absolutória) Art. 349-A Ingressar, promover, intermediar, auxi-
caso a conduta que configura o favorecimento pessoal liar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de
seja praticada por: comunicação móvel, de rádio ou similar, sem auto-
rização legal, em estabelecimento prisional.
z Ascendente; Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.
z Descendente;
z Cônjuge; Trata-se de crime plurinuclear, que poderá ser
z Irmão. praticado mediante a execução de quaisquer um dos
verbos descritos no tipo penal incriminador.
134
Sobre este crime, é importante levar para a sua z Forma culposa:
prova:
Art. 351 [...]
z Não admite a culpa; § 4º No caso de culpa do funcionário incumbido da
z Caso haja autorização legal para ingresso do apa- custódia ou guarda, aplica-se a pena de detenção,
relho, o fato será atípico; de três meses a um ano, ou multa.
z É crime comum;
z A pessoa que se encontra presa poderá responder Na forma culposa, é crime próprio, que será prati-
por este tipo penal; contudo, caso apenas utilize o cado pelo funcionário incumbido da guarda ou custó-
aparelho que ingressou no estabelecimento prisio- dia da pessoa presa.
nal, não será punida por este crime, cometendo
apenas falta grave, de acordo com a Lei de Execu- Sobre o crime de fuga de pessoa presa ou subme-
tida à medida de segurança, é importante levar em
ções Penais.
consideração:
Exercício Arbitrário ou Abuso de Poder
z Pode ser praticado tanto intramuros (no interior
de estabelecimento de natureza prisional) quando
Este crime, previsto no art. 350, do Código Penal,
extramuros (durante procedimento de escolta ou
encontrava-se revogado tacitamente pela Lei de Abu-
condução);
so de Autoridade, Lei n° 4.898, de 1965.
z Em regra, trata-se de crime comum, que pode ser
Com a Lei nº 13.964, de 2019, o crime foi expressa-
praticado por qualquer pessoa;
mente revogado.
z Admite a forma culposa;
z É necessário, para configuração do crime, que a
Fuga de Pessoa Presa ou Submetida à Medida de prisão a que está submetida a pessoa seja legal;
Segurança z Trata-se de crime material, que se consuma com a
efetiva fuga;
Art. 351 Promover ou facilitar a fuga de pessoa z Admite a forma tentada;
legalmente presa ou submetida a medida de segu-
z Caso seja praticado mediante violência contra pes-
rança detentiva:
soa, responderá o agente também pela violência.
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
Evasão Mediante Violência Contra Pessoa
Previsto no art. 351, do CP, este crime tem a seguin-
te figura típica: Promover ou facilitar a fuga de pessoa Art. 352 Evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou
legalmente presa ou submetida a medida de segurança o indivíduo submetido a medida de segurança
detentiva. detentiva, usando de violência contra a pessoa:
Como se pode observar pela leitura da figura típi- Pena - detenção, de três meses a um ano, além da
ca, este tipo penal poderá ser praticado de 2 (duas) pena correspondente à violência.
formas:
Sobre este crime, é muito importante que você
z Com a promoção da fuga; leve em consideração:
z Com a facilitação da fuga.
z Trata-se de crime próprio, que só poderá ser prati-
z Forma qualificada: cado por pessoa presa ou submetida a medida de
segurança detentiva;
Art. 351 [...] z Só pode ser praticado dolosamente;
§ 1º Se o crime é praticado a mão armada, ou por z É crime de atentado ou de empreendimento, pois
mais de uma pessoa, ou mediante arrombamento, a prevê expressamente em sua descrição típica a
pena é de reclusão, de dois a seis anos. conduta de tentar o resultado, por isso, não admi-
§ 2º Se há emprego de violência contra pessoa, apli- te a tentativa;
ca-se também a pena correspondente à violência. z Exige-se o emprego de violência contra pessoa.
§ 3º A pena é de reclusão, de um a quatro anos, se o
crime é praticado por pessoa sob cuja custódia ou Caso não haja emprego de violência ou se esta seja
guarda está o preso ou o internado. empregada contra coisa, não irá se configurar este
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

crime.
„ Se o crime é praticado por pessoa sob cuja cus-
tódia ou guarda está o preso ou internado, será z Exemplo 1: Michele, presa em uma penitenciá-
crime próprio. Obs: Se a prisão for ilegal, não ria feminina, para fugir, emprega violência con-
haverá a incidência deste crime, uma vez que tra uma agente prisional, conseguindo, assim,
estará presente a legítima defesa de terceiro; evadir-se.
„ Se o crime é praticado à mão armada, ou por z Exemplo 2: Michele, presa em uma penitenciária
mais de uma pessoa, ou mediante arromba- feminina, aproveitando de um momento de des-
mento, a pena é de reclusão, de dois a seis anos; cuido dos agentes prisionais, quebra uma janela
„ Se há emprego de violência contra a pessoa, o com um soco e foge do estabelecimento prisional.
agente responderá também pelo crime corres- z Exemplo 3: Michele, presa em uma penitenciária
pondente à violência. feminina, ao verificar que os agentes prisionais
estão distraídos, foge, pulando o muro do estabe-
lecimento prisional. 135
Apenas no exemplo 1 haverá a configuração do z O Código Penal não faz referência ao número de
crime de evasão mediante violência contra pessoa, já presos que é necessário para a configuração do
que no exemplo 2 a violência foi empregada contra tipo penal, mas deixa claro se tratar de um crime
coisa e no exemplo 3 não houve emprego de violência. coletivo;
z Não é relevante, para fins de caracterização des-
te crime, se o interesse dos presos é legítimo ou
Importante! ilegítimo;
z Caso seja praticado com emprego de violência, res-
Se da violência resultarem lesões, ainda que
ponderão os agentes, também, por ela;
leves, ou morte, o agente responderá pelos dois z Caso os agentes consigam evadir-se em decorrên-
crimes, e as penas serão somadas. cia da violência empregada para o motim, respon-
derão também pelo crime do art. 352, do CP;
z Admite a forma tentada.
Arrebatamento de Preso

Art. 353 Arrebatar preso, a fim de maltratá-lo, Patrocínio Infiel


do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, além da pena Art. 355 Trair, na qualidade de advogado ou procu-
correspondente à violência. rador, o dever profissional, prejudicando interesse,
cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado:
Sobre este crime, são relevantes as seguintes Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na pena deste artigo o
informações:
advogado ou procurador judicial que defende na
mesma causa, simultânea ou sucessivamente, par-
z Não admite a modalidade culposa; tes contrárias.
z Exige dolo específico: fim de maltratar o preso
(aplicar-lhe uma surra, por exemplo);
No art. 355, do CP, temos dois crimes distintos,
z É crime comum, pode ser praticado por qualquer
com as seguintes condutas típicas: patrocínio infiel
pessoa;
no caput e patrocínio simultâneo ou tergiversação no
z O tipo penal diz preso, sem discriminar se a prisão
parágrafo único.
é legal ou ilegal; por isso, o agente pode cometer o
crime mesmo que a prisão seja ilegal;
z Patrocínio Infiel: trair, na qualidade de advogado
z O direito penal não permite a analogia, portan-
ou procurador, o dever profissional, prejudicando
to, não haverá a incidência deste crime se o ato é
interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado.
cometido contra pessoa internada por medida de
segurança;
Sobre o crime de patrocínio infiel, é importante
z O preso arrebatado é sujeito passivo secundário;
que você saiba que:
z É crime formal, que se consuma com o arrebata-
mento, independentemente de se conseguir mal-
tratar o preso; „ É crime próprio, que só será praticado pelo advo-
z Admite a forma tentada; gado ou procurador que trair o dever funcional;
z Quando o agente empregar a violência em con- „ É crime material, que se consuma quando se
curso com o arrebatamento de preso, seja lesão prejudicar o interesse do representado;
corporal leve, grave ou gravíssima, mesmo que o „ Não admite forma culposa;
resultado seja morte, o sujeito ativo responderá „ Admite tentativa somente quando o advogado
pelos dois crimes (arrebatamento de preso e lesão ou procurador pretende cometer o crime na
corporal, por exemplo). forma comissiva, uma vez que na forma omis-
siva não se admite a tentativa;
Motim de Presos „ É crime próprio;
„ Não admite a forma culposa;
Art. 354 Amotinarem-se presos, perturbando a „ É crime formal, que não exige o prejuízo;
ordem ou disciplina da prisão:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da z Patrocínio simultâneo ou tergiversação: defen-
pena correspondente à violência. der, na mesma causa, o advogado ou procura-
dor judicial, simultânea (patrocínio simultâneo)
Amotinarem-se transmite a ideia de revolta cole- ou sucessivamente (tergiversação ou patrocínio
tiva dos presos com a ordem e a disciplina da prisão, sucessivo), partes contrárias.
provocando perturbação e alvoroço.
Ordem diz respeito à tranquilidade do ambiente O patrocínio simultâneo configura-se quan-
prisional. do o advogado patrocinar as partes contrárias
Disciplina consiste no respeito e obediência às simultaneamente.
regras previamente estabelecidas. A tergiversação configura-se quando o advogado
deixa de patrocinar o seu cliente para patrocinar a
Sobre este crime, fique atento ao seguinte: parte contrária.

z É crime plurissubjetivo ou de concurso necessário, Sobre o crime de patrocínio simultâneo ou tergi-


já que será praticado por “presos”; versação, é importante saber que:
z É crime próprio, que só poderá ser praticado por
pessoas presas; „ É crime doloso;
136 z Só pode ser praticado dolosamente; „ Não admite a modalidade culposa;
„ A traição do advogado ou procurador deve pro-
EXPLORAÇÃO DE TRÁFICO DE INFLUÊNCIA
duzir prejuízo relevante de qualquer natureza, PRESTÍGIO (ART. 357) (ART. 332)
material ou moral, desde que lícito;
Juiz, jurado, órgão do Minis- Em ato praticado por funcio-
„ Admite tentativa;
tério Público, funcionário de nário público no exercício da
„ A ação penal é pública incondicionada.
justiça, perito, tradutor, in- função
térprete ou testemunha
Sonegação de Papel ou Objeto de Valor Probatório

Art. 356 Inutilizar, total ou parcialmente, ou A pena do crime de exploração de prestígio será
deixar de restituir autos, documento ou objeto aumentada de 1/3 (um terço) se o agente alega ou insi-
de valor probatório, que recebeu na qualidade de nua que o dinheiro ou utilidade também se destina
advogado ou procurador: ao juiz, ao jurado, ao órgão do ministério público, ao
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa. funcionário de justiça, ao perito, ao tradutor, ao intér-
prete ou à testemunha.
Previsto no art. 356, do CP, este crime se configu- Sobre o crime de exploração de prestígio, leve para
ra quando o agente inutilizar, total ou parcialmente, a sua prova:
ou deixar de restituir autos, documento ou objeto de
z É crime comum, que poderá ser praticado por
valor probatório, que recebeu na qualidade de advo-
qualquer pessoa;
gado ou procurador.
z Só poderá ser praticado dolosamente;
Este crime pode ser praticado de duas formas:
z No verbo solicitar, é crime formal;
z No verbo receber, é crime material;
z Inutilizar, total ou parcialmente, autos, documento z Admite tentativa.
ou objeto de valor probatório (forma comissiva);
z Deixar de restituir autos, documento ou objeto de Violência ou Fraude em Arrematação Judicial
valor probatório (forma omissiva).
Art. 358 Impedir, perturbar ou fraudar arrema-
Sobre este tipo penal, é importante ficar atento ao tação judicial; afastar ou procurar afastar con-
seguinte: corrente ou licitante, por meio de violência, grave
ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem:
z É crime próprio, que só pode ser praticado pelo Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa,
advogado ou procurador que recebeu os autos, além da pena correspondente à violência.
documento ou objeto de valor probatório;
z Não é punido na modalidade culposa; Arrematação judicial, também conhecida como
leilão ou praça, é o ato de transferência dos bens
z A doutrina dominante admite a tentativa na moda-
penhorados do devedor, em que um funcionário da
lidade comissiva — “inutilizar”, mas não admite
justiça apregoa e um interessado os adquire, em hasta
na modalidade omissiva — “deixar de restituir”.
pública, pelo maior lance.
Trata-se de atividade inerente ao Poder Judiciário,
Exploração de Prestígio
consistente em verdadeira expropriação destinada à
satisfação de crédito não cumprido voluntariamente.
Está previsto no art. 357, do CP: Sobre este crime, é importante ficar atento ao
seguinte:
Art. 357 Solicitar ou receber dinheiro ou qualquer
outra utilidade, a pretexto de influir em juiz, jura- z É crime comum, que pode ser praticado por qual-
do, órgão do Ministério Público, funcionário de jus- quer pessoa;
tiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha: z Não admite a forma culpada;
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa. z Admite tentativa quando o agente não consegue,
Parágrafo único. As penas aumentam-se de um por circunstâncias alheias a sua vontade, impedir,
terço, se o agente alega ou insinua que o dinheiro perturbar ou fraudar a arrematação judicial.
ou utilidade também se destina a qualquer das pes- z No caso de emprego de violência, responderá o
soas referidas neste artigo. agente, também, por ela.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Não se deve confundir este tipo penal com o cri- Desobediência a Decisão Judicial Sobre Perda ou
me de tráfico de influência, previsto no art. 332, do CP. Suspensão de Direito
Vejamos a diferença na tabela a seguir:
Art. 359 Exercer função, atividade, direito, autori-
EXPLORAÇÃO DE TRÁFICO DE INFLUÊNCIA dade ou múnus, de que foi suspenso ou privado por
PRESTÍGIO (ART. 357) (ART. 332) decisão judicial:
Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou
Crime contra a administra- Crime contra a administra-
multa.
ção da justiça ção em geral
Solicitar ou receber dinheiro Solicitar, exigir, cobrar ou Este crime está previsto no art. 359, do CP, e confi-
ou qualquer outra utilidade, obter, para si ou para ou- gurar-se-á quando o agente exercer função, atividade,
a pretexto de influir em trem, vantagem ou promes- direito, autoridade ou múnus, de que foi suspenso ou
sa de vantagem, a pretexto privado por decisão judicial.
de influir em 137
O crime de desobediência a decisão judicial sobre Contratação de Operação de Crédito
perda ou suspensão de direito, inserido no Código
Penal entre os crimes contra a administração da justi- Este crime se encontra previsto no art. 359-A, do
ça, representa uma modalidade especial do delito de CP:
desobediência, capitulado no art. 329, do CP, entre os
crimes praticados por particular contra a administra- Art. 359-A Ordenar, autorizar ou realizar operação
ção em geral. de crédito, interno ou externo, sem prévia autoriza-
Há, nos dois delitos, o descumprimento de ordem ção legislativa:
legal emanada de funcionário público. No entanto, o Pena – reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos.
crime definido no art. 359, do CP, possui elementos Parágrafo único. Incide na mesma pena quem orde-
especializantes, pois o agente não desobedece a uma na, autoriza ou realiza operação de crédito, interno
simples ordem legal emitida por qualquer funcioná- ou externo:
rio público. I - com inobservância de limite, condição ou mon-
tante estabelecido em lei ou em resolução do Sena-
Neste crime, o agente vai além, exercendo função,
do Federal;
atividade, direito, autoridade ou múnus de que estava
II - quando o montante da dívida consolidada ultra-
suspenso ou privado por decisão judicial.
passa o limite máximo autorizado por lei.
Tutela-se a administração da justiça.
Quanto ao sujeito ativo, verifica-se que se trata
Conduta típica: ordenar, autorizar ou realizar ope-
de crime próprio ou especial, pois somente pode ser
ração de crédito, interno ou externo, sem prévia auto-
praticado pela pessoa que, por decisão judicial, foi
rização legislativa.
suspensa ou privada relativamente ao exercício de
Trata-se de crime de ação múltipla, que poderá ser
determinada função, atividade, direito, autoridade ou
praticado mediante a execução de qualquer um dos
múnus.
verbos previstos no tipo penal. Responde por este cri-
O sujeito passivo é o Estado.
me aquele que praticar a conduta típica.
Consuma-se com o simples exercício da função,
Há formas equiparadas do crime de contratação
atividade, direito, autoridade ou múnus do qual o
de operação de crédito, incorrendo nas mesmas penas
agente foi suspenso ou privado por decisão judicial,
aquele que ordena, autoriza ou realiza, operação de
ainda que desta conduta não seja produzido nenhum
crédito, interno ou externo:
resultado naturalístico.
Basta a prática de um único ato capaz de afrontar a
z Com inobservância de limite, condição ou montan-
determinação emanada do Poder Judiciário.
te estabelecido em lei ou em resolução do Senado
Sobre este crime, é importante que você leve em
Federal;
consideração as seguintes informações:
z Quando o montante da dívida consolidada ultra-
passa o limite máximo autorizado por lei.
z Só poderá ser praticado dolosamente;
z Admite a modalidade tentada;
Sobre este crime, é importante levar em conside-
z Exige-se que a suspensão ou privação se dê por
ração que:
decisão judicial. Caso se trate de decisão adminis-
trativa, não se configurará este tipo penal.
z Não admite a modalidade culposa;
z Caso o agente pratique as condutas com autoriza-
CRIMES CONTRA AS FINANÇAS PÚBLICAS
ção legislativa prévia, o fato será atípico, mas, se
ultrapassar os limites da lei, o fato será típico;
Os crimes contra as finanças públicas foram acres-
z Nos verbos ordenar e autorizar, o crime é formal;
cidos ao Código Penal, em capítulo próprio dos crimes
z No verbo realizar, o crime é material.
contra a Administração Pública, no ano 2000.
Estão previstos do art. 359-A ao art. 359-H.
Inscrição de Despesas Não Empenhadas em Restos
a Pagar
Dica
Os crimes contra as finanças públicas são pró- Este crime está previsto no art. 359-B, do CP.
prios, praticados por funcionário público (crimes
funcionais), exigindo-se que este funcionário Art. 359-B Ordenar ou autorizar a inscrição em
restos a pagar, de despesa que não tenha sido pre-
possa dispor sobre as finanças públicas.
viamente empenhada ou que exceda limite estabe-
lecido em lei:
Parte considerável da doutrina entende ser possí- Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.
vel que o particular seja sujeito ativo dos crimes con-
tra as finanças públicas, desde que, por força de lei, Configurar-se-á quando o agente ordenar ou auto-
tenha disponibilidade sobre elas. Entretanto, tal pos- rizar a inscrição em restos a pagar de despesa que não
sibilidade é caso extremamente excepcional. tenha sido previamente empenhada ou que exceda
Todos os crimes contra as finanças públi- limite estabelecido em lei.
cas são processados mediante ação penal pública Pode ser praticado de duas formas:
incondicionada.
z Ordenar ou autorizar a inscrição em restos a
pagar de despesa que não tenha sido previamente
empenhada;
z Ordenar ou autorizar a inscrição em restos a pagar
de despesa que exceda limite estabelecido em lei.
138
Faz-se necessário compreender o que significa exercício seguinte, que não tenha contrapartida
empenho, liquidação e ordem de pagamento: suficiente de disponibilidade de caixa.

z Empenho: ato emanado de autoridade competen- A prática do crime não está apenas relacionada ao
te que cria para o Estado obrigação de pagamento mantado eletivo, mas também ao mandato decorrente
pendente ou não de implemento de condição; de indicação.
z Liquidação: consiste na verificação do direito Trata-se de crime próprio ou especial, por isso,
adquirido pelo credor, tendo por base os títulos e somente agentes públicos titulares de mandato ou
documentos comprobatórios do respectivo crédito; legislatura, representantes dos órgãos e entidades
z Ordem de pagamento: despacho exarado por indicados no art. 20 da Lei Complementar nº 101, de
autoridade competente, determinando que a des- 2000, Lei de Responsabilidade Fiscal, podem ser o
pesa seja paga. sujeito ativo, pois apenas tais pessoas têm atribuição
para assunção de obrigações.
Sobre os restos a pagar, trata-se das despesas O sujeito passivo é a União, os estados, os municí-
empenhadas, mas não pagas até o dia 31 de dezem- pios ou o Distrito Federal, dependendo do ente federa-
bro. Dessa forma, o tipo penal pune o administrador tivo afetado pela conduta criminosa, e, mediatamente,
que: a coletividade, em face do prejuízo causado pelo abalo
nas finanças públicas.
z Inscreve em restos a pagar despesas que não foram Consuma-se quando o sujeito ativo ordena ou auto-
previamente empenhadas; riza a assunção de obrigação, nos últimos oito meses
z Inscreve em restos a pagar despesas previamente do mandato ou legislatura, cuja despesa não possa
empenhadas, mas com excesso aos limites legais. ser paga naquele exercício financeiro ou reste parte
a ser paga no exercício seguinte, sem contrapartida
Quanto ao sujeito ativo, somente pode ser pra- suficiente para tanto, independentemente da compro-
ticado pelo agente público dotado da atribuição de vação de prejuízo aos cofres públicos.
ordenar ou autorizar a inscrição da despesa. Se o fun- Sobre este crime, é importante ficar atento às
cionário público praticar o ato sem atribuição legal seguintes disposições:
para tanto, este será passível de anulação pelo próprio
Poder Público, tornando atípica a conduta. z Só pode ser praticado dolosamente;
O sujeito passivo é a União, os estados, os municí- z Este crime só se configura se as condutas típicas
pios ou o Distrito Federal, dependendo do ente federa- forem praticadas nos dois últimos quadrimestres
tivo afetado pela conduta criminosa, e, mediatamente, (oito meses anteriores ao término do mandato) do
a coletividade, em face do prejuízo causado pelo abalo último ano do mandato ou legislatura;
nas finanças públicas. z É crime de ação múltipla;
Consuma-se no momento da prática da conduta z Admite a modalidade tentada, apesar de ser de
legalmente descrita (ordenar ou autorizar a inscrição difícil comprovação, segundo posicionamento
em restos a pagar), independentemente da lesão ao doutrinário majoritário.
erário.
Sobre este crime, é importante levar em Ordenação de Despesa não Autorizada
consideração:
O crime de ordenação de despesa não autorizada
z Não admite a modalidade culposa; está previsto no art. 359-D, do CP:
z Trata-se de crime de ação múltipla.
Art. 359-D Ordenar despesa não autorizada por lei:
Assunção de Obrigação no Último Ano do Mandato Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
ou Legislatura
Ordenar tem o sentido de mandar, determinar que
Art. 359-C Ordenar ou autorizar a assunção de se realize a despesa pública, a qual compreende os
obrigação, nos dois últimos quadrimestres do últi- desembolsos efetuados pelo Estado para fazer frente
mo ano do mandato ou legislatura, cuja despesa às suas diversas responsabilidades junto à sociedade.
não possa ser paga no mesmo exercício financei- Sobre o sujeito ativo, trata-se de crime próprio ou
ro ou, caso reste parcela a ser paga no exercício especial, pois somente pode ser cometido pelo funcio-
seguinte, que não tenha contrapartida suficiente de nário público com atribuição para ordenar despesas,
disponibilidade de caixa: conhecido como “ordenador de despesas”.
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. O tipo penal não alcança o “realizador de despesas”,
compreendido como a pessoa que se limita a cumprir
O objeto material do crime é a obrigação assumi- ou executar a ordem expedida pelo ordenador.
da nos dois últimos quadrimestres do último ano do O sujeito passivo é a União, os estados, os muni-
mandato ou legislatura. cípios ou o Distrito Federal, dependendo do ente
Pode ser praticado de duas formas: federativo prejudicado pela conduta criminosa, e,
secundariamente, a coletividade, em decorrência dos
z Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação, prejuízos causados pela ordenação de despesas públi-
nos dois últimos quadrimestres do último ano do cas não autorizadas em lei.
mandato ou legislatura, cuja despesa não possa ser Consuma-se o crime quando o funcionário público
paga no mesmo exercício financeiro; ordena a realização da despesa sem autorização legal,
z Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação, nos independentemente da comprovação de efetiva lesão
dois últimos quadrimestres do último ano do man- ao erário.
dato ou legislatura, se restar parcela a ser paga no
139
Sobre este tipo penal, é importante mencionar que: o funcionário público que assume o cargo deverá ser
responsabilizado por não ter determinado o “cance-
z Não admite a forma culposa; lamento do montante de restos a pagar” (art. 359-F),
z É crime de ação simples; inscrito em valor superior ao legalmente permitido.
z Caso a despesa seja ordenada com autorização Os dois agentes contribuem para o mesmo resul-
legislativa, o fato será atípico; tado, mas a eles serão imputados crimes diversos, em
z É crime formal, segundo Nucci. face do especial tratamento conferido pela lei penal.
O sujeito passivo é a União, os estados, os municí-
Prestação de Garantia Graciosa pios ou o Distrito Federal, dependendo do ente federa-
tivo afetado pela conduta criminosa, e, mediatamente,
Está prevista no art. 359-E, do CP: a coletividade, em razão dos prejuízos causados pelo
não cancelamento de restos a pagar.
Art. 359-E Prestar garantia em operação de crédito O crime consuma-se quando o sujeito ativo deixa
sem que tenha sido constituída contragarantia em de ordenar, de autorizar ou de promover o cancela-
valor igual ou superior ao valor da garantia pres- mento do montante de restos a pagar inscrito inde-
tada, na forma da lei: vidamente, independentemente de comprovação de
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. lesão patrimonial ao erário.
A omissão que não ultrapassa os limites de restos a
O tipo penal pune a conduta do funcionário públi- pagar não configura este crime.
co que presta garantia sem a observância do requisito Sobre este crime, fique atento ao seguinte:
legal.
Quanto aos requisitos legais, devemos entender z Só pode ser praticado dolosamente;
que “prestar” tem o sentido de conceder ou autorizar z É crime omissivo;
garantia, e isso está em conformidade com o inciso IV, z Não admite tentativa.
art. 29, da Lei Complementar nº 101, de 2000, Lei de
Responsabilidade Fiscal, que afirma que concessão de Aumento de Despesa Total com Pessoal no Último
garantia é o compromisso de adimplência de obrigação Ano do Mandato ou Legislatura
financeira ou contratual assumida por algum ente da
Federação ou entidade a ele vinculada. Art. 359-G Ordenar, autorizar ou executar ato que
As condições para a concessão de garantia encon- acarrete aumento de despesa total com pessoal,
tram-se no art. 40, da citada lei. Destaca-se entre elas nos cento e oitenta dias anteriores ao final do man-
o oferecimento de contragarantia, em valor igual ou dato ou da legislatura:
superior ao da garantia a ser concedida, visando ao Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
equilíbrio das finanças públicas.
Sobre este crime, fique atento: Ordenar é determinar alguma coisa.
Autorizar significa permitir que algo seja feito.
z Este crime não admite a modalidade culposa; Executar traz a ideia de realizar ou concretizar
z Não basta que seja constituída a contragarantia, algo.
exige-se que ela seja igual ou superior ao valor da Este crime tem como finalidade evitar que se
garantia prestada; aumente as despesas totais com pessoal, concedendo
z Caso a contragarantia seja inferior ou não seja aumentos, contratando, fazendo alterações na carrei-
prestada, este crime estará configurado. ra, entre outras formas, nos últimos dias do mandato
ou legislatura, deixando para outro funcionário públi-
Não Cancelamento de Restos a Pagar co a responsabilidade de arcar com os compromissos.
A diferença entre o art. 359-G e o art. 359-C, do
Art. 359-F Deixar de ordenar, de autorizar ou de pro- CP, é que o crime em estudo não se relaciona com a
mover o cancelamento do montante de restos a pagar infração penal tipificada no art. 359-C, do CP, porque
inscrito em valor superior ao permitido em lei: na assunção de obrigação no último ano do manda-
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. to ou legislatura levam-se em conta despesas que não
podem ser pagas no mesmo exercício, ficando a obri-
Deixar de ordenar é não determinar a terceiro que gação de pagamento ao sucessor, sem ter disponibili-
algo seja feito. dade orçamentária para tanto.
Deixar de autorizar é não permitir que terceira No art. 359-G, do CP, o aumento de despesa com pes-
pessoa faça algo. soal é permanente, ou seja, ultrapassará o exercício
Deixar de promover equivale a não realizar direta- financeiro, atingindo anos futuros. Consequentemen-
mente alguma coisa. te, o orçamento do ente federativo ou órgão público
O administrador público que se depara com restos ficará inevitavelmente comprometido, deixando de
a pagar inscritos em valor superior ao limite permiti- propiciar ao administrador público futuro condições
do em lei tem o dever legal de autorizar, ordenar ou para gerir adequadamente a máquina estatal.
promover o seu cancelamento, sob pena de incorrer Destaca-se que o elemento temporal do art. 359-G,
no crime de não cancelamento de restos a pagar. do CP, está consubstanciado na expressão “nos cento
O sujeito ativo é o funcionário público com atribui- e oitenta dias anteriores ao final do mandato ou da
ção para ordenar, autorizar ou promover o cancela- legislatura”.
mento do montante de restos a pagar indevidamente Assim, fora do período legalmente indicado, não
inscritos. Trata-se de crime próprio ou especial. Com há que se falar na prática do delito, ainda que exista
isso, o funcionário público que deixa o cargo será res- ilegal aumento da despesa total com pessoal.
ponsabilizado pela “inscrição de despesas não empe-
nhadas em restos a pagar” (art. 359-B), ao passo que
140
O sujeito ativo somente pode ser praticado pelo Sobre este crime, é importante mencionar:
funcionário público com atribuição para ordenar,
autorizar ou executar ato que acarrete aumento de z Só pode ser praticado dolosamente;
despesa total com pessoal, nos últimos 180 dias do z É crime de ação múltipla;
mandato ou legislatura. z Caso os títulos da dívida pública tenham sido cria-
O sujeito passivo é a União, os estados, os municí- dos por lei ou estejam registrados no sistema cen-
pios ou o Distrito Federal, dependendo do ente federa- tralizado de liquidação e de custódia, a prática da
tivo afetado pela conduta criminosa, e, mediatamente, conduta prevista no tipo penal será atípica.
a coletividade, em razão dos prejuízos causados pelo
aumento de despesa total com pessoal no último ano
do mandato ou legislatura.
Consuma-se quando o agente público ordena, HORA DE PRATICAR!
autoriza ou executa o ato de aumento de despesa com
pessoal, nos últimos 180 dias de mandato ou legislatu- 1. (CEBRASPE-CESPE — 2022) O princípio da legalidade
ra, independentemente da comprovação de prejuízo desdobra-se em alguns subprincípios, entre os quais
econômico ao erário. se incluem
Sobre este crime, leve em consideração o seguinte:
a) reserva legal, culpabilidade e anterioridade.
z Só pode ser praticado dolosamente; b) reserva legal, culpabilidade e retributividade.
z É crime de ação múltipla; c) reserva legal, retributividade e anterioridade.
z Para sua configuração, deve ser praticado nos 180 d) culpabilidade, retributividade e taxatividade.
dias que antecedem o fim do mandato ou legisla- e) reserva legal, anterioridade e taxatividade.
tura. Caso realizado em outro período, não irá se
configurar; 2. (CEBRASPE-CESPE — 2022) João foi condenado, em
z Admite tentativa. sentença penal transitada em julgado, pela prática
de crime, (1) à pena privativa de liberdade; (2) à pena
Oferta Pública ou Colocação de Títulos no Mercado restritiva de direitos, consistente na prestação de ser-
viços em um abrigo de idosos; (3) a reparar o dano
Este crime se encontra previsto no art. 359-H, do causado à vítima; e (4) a perder os bens adquiridos
CP: ilicitamente. Poucos dias depois, João faleceu.

Art. 359-H Ordenar, autorizar ou promover a ofer- Nesse caso, à luz da ordem constitucional, uma vez
ta pública ou a colocação no mercado financeiro preenchidos os requisitos legais e observados os limi-
de títulos da dívida pública sem que tenham sido tes estabelecidos, podem ser transmitidas aos herdei-
criados por lei ou sem que estejam registrados em ros de João as consequências descritas:
sistema centralizado de liquidação e de custódia:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
a) somente em 1 e 2;
b) somente em 1 e 3;
Ordenar é determinar.
c) somente em 3 e 4;
Autorizar equivale a permitir que algo seja feito.
d) somente em 2, 3 e 4;
Promover traz a ideia de realizar, concretizar a
e) em 1, 2, 3 e 4.
oferta pública ou colocação de títulos no mercado.
O objeto material do crime são os títulos da dívida
3. (CEBRASPE-CESPE — 2022) A incompletude da
pública. Nos termos do inciso II, art. 29, da Lei Com-
ordem jurídica torna indispensável a aplicação ana-
plementar nº 101, de 2000, Lei de Responsabilidade
lógica, pela qual o sistema jurídico estende toda sua
Fiscal, considera-se dívida pública mobiliária aquela
força reguladora a situações não previstas, buscando
representada por títulos emitidos pela União, inclusive
uma solução que lhe seja imanente. Sobre o tema, é
os do Banco Central do Brasil, Estados e Municípios.
correto afirmar que:
O sujeito ativo somente pode ser praticado pelo
funcionário público dotado da atribuição para orde-
a) normas penais não incriminadoras gerais podem ser
nar, autorizar ou promover oferta pública ou colo-
alvo do emprego do argumento analógico
cação no mercado financeiro de títulos da dívida
b) normas penais não incriminadoras podem ser inter-
pública.
pretadas em prejuízo do réu;
O sujeito passivo é a União, os estados, os muni-
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

c) normas penais que definem o injusto culpável são pas-


cípios ou o Distrito Federal, dependendo do ente
síveis de aplicação analógica;
federativo atingido pela conduta criminosa, e, media-
d) normas penais que estabelecem as consequências
tamente, a pessoa física ou jurídica prejudicada pela
jurídicas do injusto culpável são passíveis de aplica-
compra de títulos irregularmente emitidos.
ção analógica;
Consuma-se o crime em estudo no momento em
e) normas penais não incriminadoras excepcionais
que o agente público ordena, autoriza ou promove a
podem ser alvo do emprego do argumento analógico.
oferta pública ou a colocação no mercado financeiro
de títulos da dívida pública sem que tenham sido cria-
dos por lei ou sem que estejam registrados em sistema 4. (CEBRASPE-CESPE — 2021) O conceito analítico
centralizado de liquidação e de custódia, independen- de crime exige a realização de um comportamento
temente de efetivo prejuízo ao erário. humano.

Um comportamento humano que pode ensejar inte-


resse jurídico-penal e responsabilização do agente
que o desempenha é: 141
a) ação por coação física irresistível; 8. (CEBRASPE-CESPE — 2022) Suponha que um indiví-
b) atos reflexos; duo tenha provocado lesão na filha de um policial penal
c) condutas culposas; estadual, em razão da função pública exercida pelo pai
d) perda brusca de consciência; da vítima. Nessa hipótese, o indivíduo cometeu
e) atos automatizados.
a) lesão corporal simples.
5. (CEBRASPE-CESPE — 2022) Sônia deu à luz um bebê. b) lesão corporal qualificada, por ser a vítima do sexo
No dia seguinte, acometida pelo estado puerperal, feminino.
Sônia pretendia matar seu próprio bebê atirando-o do c) lesão corporal com causa de aumento de pena, em
terraço da maternidade. Para tanto, solicitou a ajuda razão de a vítima ser familiar de agente de segurança
de sua amiga Beatriz, que vigiava para que ninguém pública.
visse a ação. Em sequência, Sônia dirigiu-se ao andar d) lesão corporal simples e desacato.
de cima. Mesmo vendo que os degraus da escada e) lesão corporal qualificada, pela prevalência de rela-
estavam molhados, caiu com o bebê no colo. Diante ções domésticas da vítima.
da queda, Sônia sofreu lesões leves, porém o bebê
veio a falecer. 9. (CEBRASPE-CESPE — 2022) Em relação ao delito de
maus-tratos, é correto afirmar que:
Nesse caso, é correto afirmar que
a) o crime é previsto por um tipo misto alternativo, haven-
a) Sônia e Beatriz devem responder criminalmente pelo do crime único se as condutas forem praticadas no
delito de infanticídio em concurso de agentes. mesmo contexto fático e se relacionarem à mesma
b) Sônia deve responder por infanticídio e Beatriz por vítima;
homicídio culposo em concurso de agentes. b) trata-se de delito de forma livre, admitindo multipli-
c) Sônia deve responder por homicídio culposo e Beatriz cidade de modos de execução, limitando-se a lei a
por infanticídio. exemplificar algumas ações;
d) Sônia e Beatriz devem responder criminalmente por c) o titular do direito de correção ou de disciplina não
homicídio doloso, pois agiram mediante dolo direto. pode ser sujeito ativo do delito de maus-tratos, desde
e) Sônia deve responder por homicídio culposo, tendo que não sejam empregados castigos físicos;
em vista sua conduta eivada de imprudência; Beatriz d) trata-se de crime de mão própria, pois reclama vincula-
não deve responder por crime algum. ção especial entre o autor e a vítima dos maus-tratos;
e) se a vida ou a saúde de criança ou adolescente for
6. (CEBRASPE-CESPE — 2022) À luz do Código Penal, exposta a perigo por quem detenha sua guarda ou vigi-
assinale a opção correta acerca dos crimes contra a lância, será caracterizado o delito do Art. 232 do ECA.
pessoa.
10. (CEBRASPE-CESPE — 2022) Kelly ajuizou queixa-crime
a) A mulher que, sob a influência do estado puerperal, em face de seu ex-namorado Daniel em razão de decla-
matar o próprio filho durante o parto responderá por rações atentatórias à sua honra, com caráter misógino,
aborto provocado pela gestante. nas redes sociais, imputando- lhes os crimes de injú-
b) A gravidade da lesão corporal será equivalente se ria e difamação. Após ser citado por oficial de justiça,
ocorrer tanto a debilidade permanente quanto a perda Daniel manifestou-se publicamente nas mesmas redes
ou a inutilização de membro, sentido ou função. sociais em pedido de desculpas a Kelly.
c) O aborto necessário — quando não há outro meio de
salvar a gestante — e o aborto no caso de gravidez Diante do cenário exposto, assinale a afirmativa
decorrente de estupro excluem a ilicitude por inexigibi- correta.
lidade de conduta diversa.
d) O agente que induzir ou instigar alguém a suicidar- a) Poderá ser caracterizada a extinção da punibilidade
-se ou a praticar automutilação responderá por crime pela retratação apenas quanto ao crime de difamação.
doloso contra a vida, punido com reclusão. b) A retratação não é cabível, pois Daniel manifestou-se
e) A circunstância de o crime de feminicídio ser pratica- somente após a citação.
do durante a gestação ou nos seis meses após o parto c) Tendo em vista a retratação realizada por Daniel, pode-
é qualificadora desse crime. rá ser decretar a extinção da punibilidade dos crimes
de injúria e difamação.
7. (CEBRASPE-CESPE — 2021) No texto do Art. 123 do d) Quanto ao crime de injúria, Kelly poderá conceder o
Código Penal brasileiro (infanticídio), a expressão “sob perdão do ofendido independentemente da vontade
a influência do estado puerperal” significa que: de Daniel, por se tratar de ato unilateral.
e) Kelly poderá conceder perdão do ofendido quanto aos
a) a mãe está na vigência de um surto psicótico no crimes de injúria e difamação.
momento do crime;
b) as condições hormonais e a dor do parto modificam a 11. (CEBRASPE-CESPE — 2022) A Lei n.º 13.964/2019
compreensão da mãe com relação ao crime; introduziu na legislação penal brasileira, entre outros
c) o estado puerperal representa um fator de exclusão da dispositivos, a previsão de que a pena pelo crime de
ilicitude do fato; roubo será majorada quando
d) a capacidade de entendimento da mãe está diminuída
pelo sentimento de desonra relativo à gestação; a) o agente praticá-lo com arma branca.
e) a pena é reduzida quando comparada à prevista para b) o bem subtraído for veículo automotor que, em segui-
o homicídio porque há perda da autodeterminação da da ao crime, seja transportado para outro estado fede-
mãe. rado ou para o exterior.
142
c) o agente mantiver a vítima em seu poder, restringindo d) somente no crime de estupro, praticado mediante violên-
a liberdade dela. cia real, é que a ação penal é pública incondicionada. Nas
d) a vítima estiver em serviço de transporte de valores e demais modalidades de violência, trata-se de crime de
o agente conhecer tal circunstância. ação penal condicionada a representação.
e) a conduta for praticada em concurso de duas ou mais e) segundo a legislação brasileira, o estupro coletivo é aque-
pessoas. le praticado mediante concurso de três ou mais pessoas.

12. (CEBRASPE-CESPE — 2021) Ao avistar uma patrulha 15. (CEBRASPE-CESPE — 2021) Em relação ao crime de
da Polícia Militar, Marcelo resolve arremessar uma casa de prostituição (Art. 229 do CP), é correto afirmar
pedra na direção do veículo de propriedade do Estado, que impede a configuração do delito:
com a intenção de danificá-lo. A pedra efetivamente
atinge o retrovisor do carro, quebrando o vidro. a) a ausência de intuito de lucro na exploração sexual;
b) a ausência de mediação direta do proprietário na
Percebendo a situação, os policiais militares pren- exploração sexual ;
deram Marcelo e o conduziram à delegacia, onde foi c) por si só, a adequação social da mercancia carnal;
constatado que ele possuiria uma única condenação d) por si só, a manutenção de menores para realização
com trânsito em julgado pela prática de crime militar de mercancia sexual;
próprio, cuja extinção da punibilidade ocorreu dois e) por si só, a manutenção de casa para fins libidinosos.
anos antes do novo flagrante.
16. (CEBRASPE-CESPE — 2022) Durante as comemora-
Com base nos fatos acimas, é correto afirmar que ções do carnaval, na cidade do Rio de Janeiro, Asclé-
Marcelo responderá pio se desloca ao Centro, para acompanhar famoso
bloco de foliões. Mergulhado na festividade e sob o
a) por dano simples, devendo ser considerando sol impiedoso, passa a ingerir diversas bebidas. Desa-
reincidente. tento às filas formadas nos mictórios químicos, é
b) por dano qualificado, devendo ser considerado reinci- acometido por intensa vontade de urinar. Procurando
dente, mas não portador de maus antecedentes. rua lateral, ao pé de uma árvore, passa a urinar, opor-
c) por dano qualificado, devendo ser considerado tecni- tunidade em que é abordado pela Guarda Municipal e
camente primário. encaminhado para a unidade de Polícia Judiciária.
d) por dano simples, devendo ser considerado tecnica-
mente primário. Quanto à conduta desenvolvida por Asclépio, é correto
e) por dano qualificado, devendo ser considerado reinci- afirmar que:
dente e portador de maus antecedentes.
a) é atípica;
13. (CEBRASPE-CESPE — 2022) Quanto ao delito de apro- b) constitui ato obsceno;
priação indébita, em caso de bem de valor inferior a c) constitui importunação sexual;
um salário mínimo e sendo primário o agente, é corre- d) constitui objeto obsceno;
to afirmar que e) constitui assédio sexual.

a) não há qualquer afetação da configuração do crime. 17. (CEBRASPE-CESPE — 2021) Com relação ao crime de
b) há expectativa ao reconhecimento da forma privilegiada. moeda falsa, assinale a opção correta.
c) há direito subjetivo à aplicação de atenuante obrigatória.
d) há direito subjetivo ao reconhecimento da forma a) A conduta do agente pode recair sobre moeda estrangei-
privilegiada. ra, ainda que não tenha curso legal no país de origem.
e) há incidência do princípio da insignificância. b) O crime é compatível com o instituto do arrependi-
mento posterior, desde que o agente repare moneta-
14. (CEBRASPE-CESPE — 2019) De acordo com o ordena- riamente o dano causado.
mento jurídico e o posicionamento dos tribunais supe- c) O tipo penal não admite a modalidade culposa, mas é
riores sobre os crimes contra a dignidade sexual, punível a modalidade tentada.
d) O crime, em qualquer de suas hipóteses, consuma-se
a) a prática de passar as mãos nas coxas e seios da víti- no momento em que a moeda é colocada em circula-
ma menor de 14 anos, por dentro de sua roupa, não ção, desde que a falsificação seja convincente.
pode ser tipificado como crime de estupro de vulne- e) Caracteriza o crime, em sua forma tentada, a guarda
NOÇÕES DE DIREITO PENAL

rável (art. 217-A do Código Penal), haja vista que não ou a aquisição de maquinário destinado à falsificação
houve a conjunção carnal. de moeda.
b) o estupro (art. 213 do Código Penal), com redação dada
pela Lei no 12.015/2009, é tipo penal misto alternativo. 18. (CEBRASPE-CESPE — 2019) De acordo com o Código
Logo, se o agente, no mesmo contexto fático, pratica con- Penal, o agente que altera selo destinado a controle
junção carnal e outro ato libidinoso contra uma só vítima, tributário comete crime
pratica um só crime do art. 213 do Código Penal.
c) a conduta consistente em manter casa para fins libidino- a) de reprodução ou adulteração de selo ou peça
sos é suficiente para a caracterização do crime tipificado filatélica.
no art. 229 do Código Penal, sendo desnecessário, para a b) de falsificação de selo ou sinal público.
configuração do delito, que haja exploração sexual, assim c) de falsidade ideológica.
entendidacomo a violação à liberdade das pessoas que d) de falsificação de papéis públicos.
ali exercem a mercancia carnal. e) contra a ordem tributária.

143
19. (CEBRASPE-CESPE — 2022) Com base no Código
18 D
Penal e na jurisprudência atualizada dos Tribunais
Superiores acerca do crime de desacato, analise as 19 C
afirmativas a seguir e assinale (V) para a verdadeira e
(F) para a falsa. 20 C

( ) O tabelião pode ser sujeito passivo primário do crime


de desacato.
( ) O crime de desacato foi recepcionado pela Constitui-
ção da República de 1988.
ANOTAÇÕES
( ) Se o réu, que comete o crime de desacato, for reinci-
dente em crime doloso e portador de maus antece-
dentes, o juiz, na sentença condenatória, pode fixar o
regime fechado para cumprimento da pena.
( ) Considerando as circunstâncias do caso, o juiz pode
deixar de aplicar a pena privativa de liberdade e con-
denar o réu, que cometeu o crime de desacato, apenas
ao pagamento de multa pela prática do delito.

As afirmativas são, na ordem apresentada, respectivamente,

a) V – F – F – V.
b) F – V – V – F.
c) F – V – F – V.
d) V – F – V – V.

20. (CEBRASPE-CESPE — 2022) O delito de frustração do


caráter competitivo de licitação (Art. 337-F do Código
Penal) é classificado como crime:

a) material;
b) de mera conduta;
c) formal;
d) de atentado;
e) a prazo.

9 GABARITO

1 E

2 C

3 A

4 C

5 E

6 D

7 B

8 C

9 A

10 A

11 A

12 C

13 D

14 B

15 E

16 A

17 C
144

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