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Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Centro de Tecnologia
Departamento de Engenharia Química

Revista Descomplicando a Termodinâmica

Grupo 6
Estudo experimental do equilíbrio líquido-líquido ternário (sistema
água-ácido acético-querosene).
Cecília E. Lima da Silva a, Francisca Iara A. Franco a,⁎ , Raquel S. Medeirosa,
a
Departamento de Engenharia Química, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal

I N F O R M A Ç Õ ES RESUMO

Palavras-chave: Muitos pares de espécies químicas, quando misturadas em certa composição, acabam não
Composição, formando uma única fase líquida. Consequentemente, tais sistemas se dividem em duas
diagrama ternário, fases líquidas com composições diferentes. Se essas fases estão em equilíbrio, o fenômeno
fases, equilíbrio. é um exemplo de equilíbrio líquido-líquido, que é importante em muitas operações
industriais como a extração com solventes. Através dos diagramas de fase é possível
identificar e descrever as condições da separação de fase dos líquidos com relação às suas
composições e temperaturas envolvidas na mistura em equilíbrio. De acordo com Treybal
(1980), os dados de equilíbrio líquido-líquido podem ser representados em diagramas a
temperatura constante, na forma de um triângulo, conhecido como diagrama ternário.
Diante dos conceitos abordados, este trabalho tem como objetivo realizar o estudo
experimental dos sistemas ternários por meio de três etapas, tendo em vista, a determinação
do diagrama ternário para as misturas em análise do experimento, fazendo-se a
determinação dos pontos de solubilidade mútua, da região de equilíbrio e das linhas de
amarração para a mistura água-ácido acético-querosene. Com base nos dados
estequiométricos obtidos a partir do experimento, foi possível a construção de um
diagrama de equilíbrio líquido-líquido ternário, permitindo a análise do comportamento do
sistema. Através da região binodal percebeu-se a formação de dois pares parcialmente
imiscíveis, resultando em um diagrama do tipo II. Além disso, a formação da fase aquosa
e orgânica para os três balões de separação analisados, permitiu concluir que o ácido
acético tem mais afinidade com a água do que com o querosene, justificando sua maior
concentração na fase aquosa.

Autor correspondente (Francisca Iara A. Franco). E-mail: iaraaraujof20@gmail.com .

1. Introdução

Quando substâncias líquidas são misturadas numa certa faixa de composição, pode ocorrer a formação de duas fases
líquidas ao invés de apenas uma. Nesse caso, isso ocorre devido à estabilidade do estado bifásico ser maior que o estado
monofásico. Se as fases do sistema bifásico estão em equilíbrio termodinâmico, diz-se que o sistema está no equilíbrio
líquido-líquido (ELL).
Muitos pares de espécies químicas, quando misturadas em certa composição, acabam não formando uma única fase
líquida. Consequentemente, tais sistemas se dividem em duas fases líquidas com composições diferentes. Se essas fases
estão em equilíbrio, o fenômeno é um exemplo de equilíbrio líquido-líquido, que é importante em muitas operações
industriais como a extração com solventes.
O processo de separação envolve o uso de sistemas compostos de no mínimo três substâncias, e embora a maior parte
das fases insolúveis seja quimicamente muito diferente, após o equilíbrio, geralmente os três componentes estão presentes,
em quantidades diferenciadas, em ambas as fases.
Se os três componentes do sistema se misturam em todas as proporções formando soluções homogêneas, não há
interesse para a extração em fase líquida. Os sistemas de importância nesta extração são aqueles que ocorrem
imiscibilidade. Assim, para o equilíbrio líquido-líquido, o interesse está na parte heterogênea da mistura, na qual o sistema
é instável, ou seja, no qual não é possível a coexistência dos três componentes numa única fase, ocorrendo a separação do
sistema em duas fases.
O conhecimento do equilíbrio de fases, com ou sem reações químicas simultâneas, é claramente importante no projeto
e análise de uma grande variedade de operações de processamento químicas, incluindo reatores e unidades de separação.

1.1. Diagrama de Fases

Através dos diagramas de fase é possível identificar e descrever as condições da separação de fase dos líquidos com
relação às suas composições e temperaturas envolvidas na mistura em equilíbrio.
Em um sistema formado por dois componentes, as duas substâncias podem combinar-se em certa proporção
formando-se uma fase líquida. Os componentes possuem, nesse caso, uma miscibilidade homogênea ou completa. É
possível que em outras condições, as duas substâncias não se misturem completamente, o que é a chamada miscibilidade
parcial, formando duas fases. As composições das fases em equilíbrio são obtidas do gráfico da temperatura – composição
pela intersecção de uma linha de temperatura constante (tie-line) com as fronteiras da curva binodal. Quando as
substâncias não se misturam em nenhuma proporção, ocorre a miscibilidade total.
De acordo com Treybal (1980), os dados de equilíbrio líquido-líquido podem ser representados em diagramas a
temperatura constante, na forma de um triângulo, como ilustrado na Figura 1. Nesse tipo de figura, é representada uma
mistura ternária, onde o componente C se dissolve completamente em A e B, mas os componentes A e B dissolvem-se de
forma limitada e são apresentados no diagrama de equilíbrio pela linha de base ou de solubilidade mútua.
A curva LRPEK é denominada de curva binodal e indica a mudança de solubilidade das fases A e B com a adição de
C. Qualquer mistura fora da curva LRPEK será uma solução homogênea. Também, qualquer mistura dentro da curva,
como, por exemplo, a mistura M, formará duas fases líquidas insolúveis com as composições indicadas em R (rica no
componente A) e E (rica no componente B). A linha RE é uma linha de amarração, ou tie-line, que deverá passar
necessariamente pelo ponto M, que representa a mistura como um todo. O ponto P, conhecido como ponto crítico ou plait
point, representa a última linha de amarração e o ponto onde as curvas de solubilidade das fases ricas nos componentes A
e B se encontram.

Figura 1. Diagrama esquemático de equilíbrio líquido-líquido. (FONTE: Google Imagens, 2022)

Diante dos conceitos abordados, este trabalho tem como objetivo realizar o estudo experimental do sistema ternário
querosene-ácido acético-água por meio de três etapas, tendo em vista a determinação do diagrama ternário para as misturas
em análise do experimento, fazendo-se a determinação dos pontos de solubilidade mútua, da região de equilíbrio e das
linhas de amarração.

2. Metodologia

2.1 Procedimento Experimental

2.1.1 Teste de solubilidade mútua

A primeira etapa do procedimento consistiu na utilização de uma técnica conhecida como cloud point, na tradução
ponto de nuvem, que possibilita a visualização à olho nu da formação de duas fases, onde a mistura se torna turva. Foram
separados 6 tubos de ensaio, nos dois primeiros foram adicionados 2 mL de água destilada, em outros 2 mL de querosene
e nos dois últimos 2 mL de ácido acético. Um componente foi gotejado no outro, com agitação cautelosa e notando-se se
houve formação de turbidez. Os dados dos volumes foram anotados.

2.1.2 Determinação da região bifásica - curva binodal

A curva binodal é a região na qual duas fases distintas podem coexistir. Nesta etapa do procedimento realizamos os
testes para obter esta curva. Foram separados 3 tubos de ensaio e neles foram inseridos água e ácido acético nas proporções
diferentes de 25, 50 e 75% de água, com um volume final de 4 mL. Esta mistura foi titulada com querosene, até o
surgimento de uma segunda fase. Todos os volumes gastos foram anotados.

2.1.3 Determinação das linhas de amarração

Nesta etapa do procedimento experimental foram preparadas 3 soluções em balões de separação. No balão A foram
adicionados 9 mL de querosene, 15 mL de ácido acético e 6 mL de água, no balão B foram 12 mL, 9 mL e 9 mL seguindo
a mesma ordem do primeiro e no balão C foram 9 mL, 3 mL e 18 mL. Estas soluções foram agitadas com cuidado durante
5 minutos e deixadas repousar o suficiente para que a separação das fases fosse bem definida.
Em seguida, foram retirados 5 mL de cada fase formada, onde foi pesada e titulada com NaOH e fenolftaleína como
indicador. Essas fases são classificadas como orgânicas na qual terá maior quantidade de querosene, intermediário de
ácido e pouco de água e a aquosa, que terá maior quantidade de água e pouco de querosene. Para o cálculo das composições
são considerados somente as quantidades de querosene e ácido acético na fase orgânica e na aquosa somente água e ácido,
e com o auxílio da titulação das duas encontra-se a massa de CH₃COOH.

2.2 Procedimento Pós-Experimental

Os dados coletados em todos os estágios do procedimento experimental foram anotados e alocados em tabelas para
posterior análise e discussão. Na Tabela 1 foram colocados os dados para determinar a solubilidade mútua, que com o
volume dos compostos e as suas densidades (dH2O= 1g/mL; dQuer= 0,758 g/mL; dHAc= 1,051 g/L), foram calculadas as suas
massas.

Tabela 1. Dados experimentais da etapa I.


Tubo H2O (mL) Ácido Acético (mL) Querosene (mL)
1 4 0 0,132
2 0,132 0 4
3 0 0,132 4
4 0 4 0,132

Na etapa II foram obtidos os dados correspondentes à curva binodal.

Tabela 2. Dados experimentais da etapa II.


Curva Binodal
H2O (mL) Querosene (mL) Ácido Acético (mL)
0,75 0,231 0,25
0,5 0,66 0,5
0,25 1,98 0,75

Na etapa III foram obtidos os valores da fase aquosa e orgânica em cada mistura e após titulação com NaOH, como
também a quantidade em mL de NaOH utilizado e a massa do ácido acético para cada fase mediante aos cálculos
estequiométricos realizados.
Tabela 3. Dados da etapa III do experimento.
Balão Fase Massa da fase (g) Massa de Querosene (g) Massa de H2O (g) Massa do ácido (g) Volume de NaOH (L)
Orgânica 3,8597 3,7037 0 0,156 0,0026
Balão A
Aquosa 5,3383 0 1,9303 3,408 0,0568
Orgânica 3,8269 3,7549 0 0,072 0,0012
Balão B
Aquosa 5,3374 0 2,8474 2,49 0,0415
Orgânica 3,7774 3,6994 0 0,078 0,0013
Balão C
Aquosa 5,0882 0 4,3262 0,762 0,0127

Com os valores em massa dos componentes, calculou-se as frações de cada um deles na etapa I e II pela fórmula: xi=
mi/mT, onde mi é a massa do composto e mT massa total da mistura. As frações dos componentes na etapa III foram
calculadas levando em consideração os valores das massas de ácido acético em cada fase.

3. Resultados e Discussão

Com base nos dados estequiométricos obtidos a partir do experimento da etapa III, foi determinada a quantidade em
gramas de ácido acético presente na fase aquosa e na fase orgânica para cada um dos três balões de separação. No Gráfico
1, nota-se a diferença evidente na quantidade do ácido entre as duas fases líquidas, tendo uma maior concentração deste
na fase aquosa. Essa evidência comprova que o ácido acético tende a estar em maior concentração na fase aquosa, pois
possui maior afinidade com a água se comparado ao querosene. Esta afinidade se dá devido a molécula de ácido acético
possuir uma hidroxila (OH) na extremidade de sua estrutura, que realiza ligações de hidrogênio com as moléculas de água.
Como estas forças intermoleculares são muito mais intensas comparadas às ligações dipolo-dipolo que ocorrem entre o
ácido acético e o querosene, torna-se mais favorável para que haja uma maior concentração do ácido acético na fase
aquosa, juntamente com a água.

4
3.5
Ác. Acético na fase aquosa (g)

3
2.5
2 Balão A
1.5 Balão B
1 Balão C
0.5
0
0 0.05 0.1 0.15 0.2

Ác. Acético na fase orgânica (g)

Gráfico 1. Quantidade de ácido acético na fase aquosa em função da quantidade de ácido acético na fase orgânica.

Utilizando as frações mássicas de cada um dos componentes de uma mistura de água, ácido acético e querosene, foi
realizada a construção de um diagrama de equilíbrio líquido-líquido ternário (Gráfico 2). Nas condições de temperatura e
pressão trabalhadas, obteve-se um diagrama ternário do tipo II, no qual exprime dois pares parcialmente imiscíveis e suas
áreas de imiscibilidade mútua intersectam-se. Desta forma, nota-se que o ácido acético tem baixa solubilidade com o
querosene, enquanto é totalmente miscível com a água. Com base nos dados experimentais utilizados para a construção
do diagrama, resultou-se em uma imiscibilidade parcial entre a água e o querosene, embora é de conhecimento prático
que o querosene é imiscível na água.
As tie-lines, retas 1, 2 e 3, correspondem aos balões de separação da etapa III do experimento, a qual obteve-se a
separação da mistura em duas fases. É considerado que a fase aquosa é composta por água e ácido acético, enquanto a
fase orgânica é constituída por querosene e ácido acético. Isto porque, para obter a composição do terceiro componente
na fase aquosa e fase orgânica, seria necessária a utilização de outro equipamento, o qual não disponibilizado para a
realização do experimento, como, por exemplo, o equipamento Karl Fischer. Esta consideração não interfere na análise
geral do experimento, visto que, como já foi discutido, tanto a presença de querosene na fase aquosa, quanto a presença
de água na fase orgânica, resulta em uma fração muito pequena. Então, para expressar de uma maneira o mais próximo
do real possível, foi feita uma interpolação das tie-lines para que ficassem compreendidas dentro da curva binodal.

Gráfico 2. Diagrama ternário água-ácido acético-querosene do tipo II. As retas 1, 2 e 3 indicam as tie-lines para
cada balão de separação.

4. Conclusões

À temperatura e pressão constantes, no estudo de mistura ternária entre água, querosene e ácido acético, foi possível
analisar o comportamento das três substâncias em equilíbrio líquido-líquido. Através da região binodal percebeu-se que
os pares formados por água e querosene e ácido acético e querosene são parcialmente imiscíveis, caracterizando um
diagrama ternário do tipo II. Com a formação de duas fases, aquosa (água + ácido acético) e orgânica (querosene + ácido
acético), conclui-se que o ácido acético tem mais afinidade com a água, justificado pela capacidade de realizar ligações
de hidrogênio com as moléculas de água, enquanto que realiza ligações dipolo-dipolo com as moléculas de querosene, o
que é comprovado pela maior concentração de ácido acético no meio aquoso.
Referências

1. Lobo, L. Q.; Ferreira, A. G. M. Termodinâmica e 3. SMITH, J. M.; VAN NESS, H.C.; ABBOTT, M. M.
Propriedades Termofísicas, Volume I, Introdução à Termodinâmica da Engenharia
Termodinâmica das Fases; Imprensa da Química. 5ª ed. Rio de Janeiro: LTC, 2000.
Universidade de Coimbra: Coimbra, 2006.
2. HACKBART, L. M. Equilíbrio Líquido-Líquido
de Sistemas Contendo Fenol Água-solvente:
Obtenção e Modelagem Termodinâmica.
Dissertação (Mestrado em Engenharia de
Processos Químicos e Térmicos) - Universidade
Federal do Paraná, Curitiba – PR, 2007.

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