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Intervenção Social em Crianças e Jovens – Resumos 2018/2019

Convenção sobre os direitos da criança


Definição de criança
A criança é definida como todo o ser humano com menos de dezoito anos, exceto se a lei nacional confere
a maioridade mais cedo.

1. Não discriminação - Todos os direitos se aplicam a todas as crianças sem exceção.


• O Estado tem obrigação de proteger a criança contra todas as formas de discriminação e de tomar
medidas positivas para promover os seus direitos.
2. Interesse superior da criança - Todas as decisões que digam respeito à criança devem ter plenamente
em conta o seu interesse superior.
• O Estado deve garantir à criança cuidados adequados quando os pais, ou outras pessoas
responsáveis por ela não tenham capacidade para o fazer.
3. Aplicação dos direitos - O Estado deve fazer tudo o que puder para aplicar os direitos contidos na
Convenção.
4. Orientação da criança e evolução das suas capacidades - O Estado deve respeitar os direitos e
responsabilidades dos pais e da família alargada na orientação da criança de uma forma que
corresponda ao desenvolvimento das suas capacidades.
5. Sobrevivência e desenvolvimento - Todas as Crianças têm o direito inerente à vida, e o Estado tem
obrigação de assegurar a sobrevivência e desenvolvimento da criança.
6. Nome e nacionalidade - A criança tem direito a um nome desde o nascimento. A criança tem também
o direito de adquirir uma nacionalidade e, na medida do possível, de conhecer os seus pais e de ser
criada por eles.
7. Proteção da identidade - O Estado tem a obrigação de proteger e, se necessário, de restabelecer os
aspetos fundamentais da identidade da criança (incluindo o nome, a nacionalidade, e relações
familiares).
8. Separação dos pais
1. A criança tem o direito de viver com os seus pais a menos que tal seja considerado incompatível
com o seu interesse superior.
2. A criança tem também o direito de manter contacto com ambos os pais se estiver separada de
um ou de ambos.
9. Reunificação da família - As crianças e os seus pais têm o direito de deixar qualquer país e entrar no
seu para fins de reunificação ou para a manutenção das relações pais-filhos.
10. Deslocações e retenções ilícitas - O Estado tem obrigação de combater as deslocações e retenções
ilícitas de crianças no estrangeiro levadas a cabo por um dos pais ou por terceiros.
11. Opinião da criança - A criança tem o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre questões que
lhe digam respeito e de ver essa opinião tomada em consideração.
12. Liberdade de expressão - A criança tem o direito de exprimir os seus pontos de vista, obter
informações, dar a conhecer ideias e informações, sem considerações de fronteiras.
13. Liberdade de pensamento, consciência e religião - O Estado respeita o direito da criança à liberdade
de pensamento, consciência e religião, no respeito pelo papel de orientação dos pais.
14. Liberdade de associação - As crianças têm o direito de se reunir e de aderir ou formar associações.
15. Proteção da vida privada - A criança tem o direito de ser protegida contra intromissões na sua vida
privada, na sua família, residência e correspondência, e contra ofensas ilegais à sua honra e reputação.

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16. Acesso a informação apropriada - O Estado deve garantir à criança o acesso a uma informação e a
materiais provenientes de fontes diversas, e encorajar os media a difundir informação que seja de
interesse social e cultural para a criança.
• O Estado deve tomar medidas para proteger a criança contra materiais prejudiciais ao seu bem-
estar.
17. Responsabilidade dos pais - Cabe aos pais a principal responsabilidade comum de educar a criança, e
o Estado deve ajudá-los a exercer esta responsabilidade.
• O Estado deve conceder uma ajuda apropriada aos pais na educação dos filhos.
18. Proteção contra maus tratos e negligência - O Estado deve proteger a criança contra todas as formas
de maus tratos por parte dos pais ou de outros responsáveis pelas crianças e estabelecer programas
sociais para a prevenção dos abusos e para tratar as vítimas
19. Proteção da criança privada de ambiente familiar - O Estado tem a obrigação de assegurar proteção
especial à criança privada do seu ambiente familiar e de zelar para que possa beneficiar de cuidados
alternativos adequados ou colocação em instituições apropriadas.
• Todas as medidas relativas a esta obrigação deverão ter devidamente em conta a origem cultural
da criança.
20. Adoção - Em países em que a adoção é reconhecida ou permitida só poderá ser levada a cabo no
interesse superior da criança, e quando estiverem reunidas todas as autorizações necessárias por
parte das autoridades competentes, bem como todas as garantias necessárias.
21. Crianças refugiadas - Proteção especial deve ser dada à criança refugiada ou que procure obter o
estatuto de refugiada.
• O Estado tem a obrigação de colaborar com as organizações competentes que asseguram esta
proteção.
22. Crianças deficientes - A criança deficiente tem direito a cuidados especiais, educação e formação
adequados que lhe permitam ter uma vida plena e decente, em condições de dignidade, e atingir o
maior grau de autonomia e integração social possível.
23. Saúde e serviços médicos - A criança tem direito a gozar do melhor estado de saúde possível e a
beneficiar de serviços médicos.
• Os Estados devem dar especial atenção aos cuidados de saúde primários e às medidas de
prevenção, à educação em termos de saúde pública e à diminuição da mortalidade infantil.
• Neste sentido, os Estados encorajam a cooperação internacional e esforçam-se por assegurar que
nenhuma criança seja privada do direito de acesso a serviços de saúde eficazes.
24. Revisão periódica da colocação - A criança colocada numa instituição pelas autoridades competentes
para fins de assistência, proteção ou tratamento tem direito a uma revisão periódica dessa colocação.
25. Segurança social - A criança tem o direito de beneficiar da segurança social, incluindo prestações
sociais.
26. Nível de vida - A criança tem direito a um nível de vida adequado ao seu desenvolvimento físico,
mental, espiritual, moral e social.
• Cabe aos pais a principal responsabilidade primordial de lhe assegurar um nível de vida adequado.
• O Estado tem o dever de tomar medidas para que esta responsabilidade possa ser – e seja –
assumida.
• A responsabilidade do Estado pode incluir uma ajuda material aos pais e aos seus filhos.

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27. Educação - A criança tem direito à educação e o Estado tem a obrigação de tornar o ensino primário
obrigatório e gratuito, encorajar a organização de diferentes sistemas de ensino secundário acessíveis
a todas as crianças e tornar o ensino superior acessível a todos, em função das capacidades de cada
um.
• A disciplina escolar deve respeitar os direitos e a dignidade da criança. Para garantir o respeito
por este direito, os Estados devem promover e encorajar a cooperação internacional.
28. Objetivos da educação - A educação deve destinar-se a promover o desenvolvimento da
personalidade da criança, dos seus dons e aptidões mentais e físicas, na medida das suas
potencialidades.
• Deve preparar a criança para uma vida adulta ativa numa sociedade livre e inculcar o respeito
pelos pais, pela sua identidade, pela sua língua e valores culturais, bem como pelas culturas e
valores diferentes dos seus.
29. Crianças de minorias ou de populações indígenas - A criança pertencente a uma população indígena
ou a uma minoria tem o direito de ter a sua própria vida cultural, praticar a sua religião e utilizar a sua
própria língua.
30. Lazer, atividades recreativas e culturais A criança tem direito ao repouso, a tempos livres e a participar
em atividades culturais e artísticas.
31. Trabalho das crianças - A criança tem o direito de ser protegida contra qualquer trabalho que ponha
em perigo a sua saúde, a sua educação ou o seu desenvolvimento.
• O Estado deve fixar idades mínimas de admissão no emprego e regulamentar as condições de
trabalho.
32. Consumo e tráfico de drogas - A criança tem o direito de ser protegida contra o consumo de
estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, e contra a sua utilização na produção e tráfico de tais
substâncias.
33. Exploração sexual - O Estado deve proteger a criança contra a violência e a exploração sexual,
nomeadamente contra a prostituição e a participação em qualquer produção de carácter
pornográfico.
34. Venda, tráfico e rapto - O Estado tem a obrigação de tudo fazer para impedir o rapto, a venda ou o
tráfico de crianças.
35. Outras formas de exploração - A criança tem o direito de ser protegida contra qualquer outra forma
de exploração não contemplada nos artigos 32, 33, 34 e 35.
36. Tortura e privação de liberdade - Nenhuma criança deve ser submetida à tortura, a penas ou
tratamentos cruéis, à prisão ou detenção ilegais.
• A pena de morte e a prisão perpétua sem possibilidade de libertação são interditas para infrações
cometidas por pessoas menores de 18 anos.
• A criança privada de liberdade deve ser separada dos adultos, a menos que, no superior interesse
da criança, tal não pareça aconselhável.
• A criança privada de liberdade tem o direito de beneficiar de assistência jurídica ou qualquer outro
tipo de assistência adequada, e o direito de manter contacto com a sua família.
37. Conflitos armados - Os Estados Partes tomam todas as medidas possíveis na prática para que
nenhuma criança com menos de 15 anos participe diretamente nas hostilidades.
• Nenhuma criança com menos de 15 anos deve ser incorporada nos exércitos.

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• Os Estados devem assegurar proteção e assistência às crianças afetadas por conflitos armados,
nos termos das disposições previstas pelo direito internacional nesta matéria.
38. Recuperação e reinserção - O Estado tem a obrigação de assegurar que as crianças vítimas de conflitos
armados, tortura, negligência, exploração ou sevícias beneficiem de cuidados adequados para a sua
recuperação e reinserção social.
39. Administração da justiça de menores - A criança suspeita, acusada ou reconhecida como culpada de
ter cometido um delito tem direito a um tratamento que favoreça o seu sentido de dignidade e valor
pessoal, que tenha em conta a sua idade e que vise a sua reintegração na sociedade.
• A criança tem direito a garantias fundamentais, bem como a uma assistência jurídica ou outra
adequada à sua defesa. Os procedimentos judiciais e a colocação em instituições devem ser
evitados sempre que possível.
40. Respeito pelas normas estabelecidas - Se uma disposição relativa aos direitos da criança que figura
no direito nacional ou internacional em vigor num Estado for mais favorável do que a disposição
análoga na Convenção, é a norma mais favorável que se aplica.
41. Aplicação e entrada em vigor - As disposições dos artigos 42 a 54 preveem nomeadamente os pontos
seguintes:
• A obrigação do Estado tornar amplamente conhecidos os direitos contidos na Convenção, tanto
pelos adultos como pelas crianças.
• A criação de um Comité dos direitos da criança composto por dez peritos encarregados de
examinar os relatórios que os Estados Partes devem submeter dois anos após a ratificação e, em
seguida, de cinco em cinco anos. A Convenção entra em vigor após a sua ratificação por 20 países,
sendo então constituído o Comité.
• Os Estados Partes asseguram aos seus relatórios uma larga difusão nos seus próprios países.
• O Comité pode propor a realização de estudos específicos sobre questões relativas aos direitos
das crianças. Essas sugestões e recomendações de ordem geral são transmitidas aos Estados
interessados e levadas ao conhecimento da Assembleia Geral.
• A fim de «promover a aplicação efectiva da Convenção e encorajar a cooperação internacional»,
agências especializadas das Nações Unidas (como a OIT, a OMS e a UNESCO) e a UNICEF podem
assistir às reuniões do Comité. E podem – como qualquer organismo considerado «competente»,
nomeadamente as ONGs que gozem de um estatuto consultivo junto das Nações Unidas e órgãos
das Nações como o ACNUR – apresentar informações pertinentes ao Comité e vir a ser convidadas
a dar parecer sobre a melhor forma de garantir a aplicação da Convenção.

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Tema 1. Perspetivas teórico-concetuais da infância e da juventude


Sociologia da Infância: Correntes e Confluências Manuel Jacinto Sarmento
Abordagem sociológica da infância.
A Sociologia da Infância não encontrou um alargado reconhecimento como área de referência e
responsabilidade vital entre a comunidade de sociólogos e na definição do campo sociológico.
• Apesar da enorme importância das políticas demográficas,
• das transformações geracionais em curso, das realidades sociais de exclusão e pobreza e da
enorme mediatização de fenómenos associados à infância
• os recentes desenvolvimentos científicos da área
Exemplo disso mesmo é o facto do mais recente manual internacional de Sociologia (Calhoun, Rojek e
Turner, 2005) não dedicar à infância senão umas discretas referências no capítulo dedicado à pobreza
(Conley, 2005).

Génese e afiliações da Sociologia da Infância


Desde os anos 30 que a expressão “sociologia da infância” se encontra formulada (Qvortrup, 1995:8).
• Ainda antes, a consideração da infância como geração sobre a qual os adultos realizam uma ação
de transmissão cultural e de “socialização” constituiu-se como objeto de uma das mais
importantes obras do início do pensamento sociológico: o da teoria da 3 socialização de Emile
Durkheim (1972[1938]).

Sociologia da Infância tem vindo, sobretudo no decurso das duas últimas décadas, a ganhar maior
expressão, através da criação dos seus próprios conceitos, da formulação de teorias e abordagens
distintas e de constituição de problemáticas autónomas.
➢ Considerando, simultaneamente, as dimensões estruturais e interativas da infância, a Sociologia da
Infância desenvolve-se contemporaneamente, em boa parte, por necessidade de compreensão do
que é um dos mais importantes paradoxos atuais (nunca como hoje as crianças foram objeto de
tantos cuidados e atenções e nunca como hoje a infância se apresentou como a geração onde se
acumulam exponencialmente os indicadores de exclusão e de sofrimento.)
➢ Incorpora na sua agenda teórica, a interpretação das condições atuais de vida das crianças
(construção da reflexividade contemporânea sobre a realidade social)

Razões da longa ausência da infância do estudo sociológico


➢ subalternidade da infância relativamente ao mundo dos adultos
➢ as crianças, durante séculos, foram representadas prioritariamente como “homúnculos”, seres
humanos miniaturizados que só valia a pena estudar e cuidar pela sua incompletude e
imperfeição.
A precocidade do estudo das crianças pela medicina, pela psicologia e pela pedagogia encontra aqui as
suas razões de ser:
1. as crianças eram consideradas, antes de mais, como o destinatário do trabalho dos adultos
2. o seu estudo só era considerado enquanto alvo do tratamento, da orientação ou da ação
pedagógica dos mais velhos

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Estatuto pré-social:
1. as crianças são “invisíveis” porque não são consideradas como seres sociais de pleno direito.
2. Acresce a isto o facto da modernidade ter confinada às crianças ao espaço privado, ao cuidado da
família e ao apoio de instituições sociais (asilos, infantários, creches, etc),
3. A privatização da infância não apenas opera um efeito de ocultamento e invisibilização da condição
social da infância
4. não tematizado como atividade social e não referenciado tradicionalmente como atividade económica
5. O trabalho de construção científica do objeto social infância torna indispensável, por isso mesmo,
desconstruir a produção pericial da infância pelas ciências do indivíduo, tarefa esta que não é feita
sem escolhos teóricos e epistemológicos, 5 gerações.

O conceito de socialização, constitui, mais do que um constructo interpretativo da condição social da


infância, o próprio factor da sua ocultação: se as crianças são o “ainda não”, o “em vias de ser”, não
adquirem um estatuto ontológico social pleno
1. no sentido em que não são “verdadeiros” entes sociais completamente reconhecíveis em todas
as suas características, interactivos, racionais, dotados de vontade e com capacidade de opção
entre valores distintos
2. nem se constituem, como um objecto epistemologicamente válido, na medida em que são sempre
a expressão de uma relação de transição, incompletude e dependência.

Qvortup (1995) afirma que as crianças, mais do que ignoradas, têm sido marginalizadas e “menorizadas”
pelo discurso sociológico.
➢ A emergência contemporânea de um novo surto do discurso sociológico centrado na infância toma
por referência uma revisão crítica do conceito de “socialização”:
1. sendo as crianças analisadas como atores no processo de socialização e não como destinatários
passivos da socialização adulta
2. considerando a complexidade das variáveis sociais em presença (onde as relações de classe,
género, etnia se associam a características interindividuais que tornam o processo de transmissão
e receção dos saberes, normas e valores sociais muito mais complexo do que aquilo que a
conceção tradicional de socialização propõe).
3. Acresce à revisão científica do conceito de socialização, o facto da sociologia se ter vindo a ocupar
progressivamente das dimensões sociais do espaço privado e individual.

Programa para uma nova Sociologia da Infância (Bernard Lahire):


1. o estudo das socializações (familiares, escolares, nos grupos de pares, ou nas instituições
culturais, desportivas, políticas, religiosas) e os processos de interiorização das relações de
autoridade, das disposições sócio-políticas, das disposições culturais-cognitivas, dos quadros de
valores culturais e morais;
2. o estudo dos fenómenos de transferibilidade das disposições mentais e comportamentais entre
universos distintos de inserção infantil e adolescente e de tensão de disposições contraditórias
entre quadros socializadores parcial ou completamente incompatíveis
Para além dos desafios teóricos suscitados no interior do campo sociológico, é a infância como problema
social que mais fortemente tem pressionado o trabalho científico da Sociologia da Infância.

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O que motivou a realização do programa:


1. porque em torno delas se constituiu um mercado global de produtos para a infância de
importância económica estratégica;
2. porque as crianças mobilizam contemporaneamente um número crescente de adultos que
trabalham com crianças (por exemplo, os professores constituem cerca de um terço da totalidade
dos funcionários públicos portugueses e são, de longe, o maior contingente profissional
empregado pelo Estado);
3. finalmente, the last not the least, porque as crianças são percentualmente cada vez menos na
sociedade contemporânea e a significativa redução tem influência:
➢ equilíbrios demográficos,
➢ nas relações de afeto
➢ na própria formação do rendimento das famílias e na estabilidade do EstadoProvidência

O Objeto da Sociologia da Infância:


Infância como categoria social e crianças como atores sociais

Duplo objeto de estudo:


1. as crianças como atores sociais, nos seus mundos de vida,
2. a infância, como categoria social do tipo geracional, socialmente construída.

A infância depende da categoria geracional constituída pelos adultos para a provisão de bens
indispensáveis à sobrevivência dos seus membros,
➢ Esta dependência tem efeitos na relação assimétrica relativamente ao poder, ao rendimento e ao
status social que têm os adultos e as crianças, sendo esta relação transversal (ainda que não
independente) das distintas classes sociais.
O poder de controlo dos adultos sobre as crianças está reconhecido e legitimado, não sendo verdadeiro
o inverso, o que coloca a infância – independentemente do contexto social ou da conjuntura histórica –
numa posição subalterna face à geração adulta.
➢ A existência de um grupo que é socialmente subalterno devido a sua condição etária é, por
consequência, essencial à definição da infância.

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Definição de Criança:
A Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas, de 1989, estabelece o limite da infância
nos 18 anos e adotamos este marco referencial como o arbítrio mais consensual para a definição dos
limites da infância, sem prejuízo da consideração da existência de vários subgrupos etários, como
categorias sócias (e não apenas psicológicas) no interior da infância.

Contradições
1. No plano diacrónico, essas diferenças e contradições ocorrem a propósito das várias e sucessivas
imagens sociais construídas sobre a infância e aos vários papeis sociais atribuídos: (Ex: trabalho
das minas, aproveitando a diminuta estatura das crianças para penetrar nas galerias mais estreitas
hoje geralmente condenado.
2. No plano sincrónico, essas diferenças e contradições operam por efeito da pertença a diferentes
classes sociais, ao género, à etnia, ao contexto social de vida (urbano ou rural), ao universo
linguístico ou religioso de pertença, etc.

A condição social da infância é simultaneamente homogénea;


A categoria social, por relação com as outras categorias geracionais, e heterogénea, por ser cruzada pelas
outras categorias sociais.

Aspetos-chave do paradigma de investigação sociológica da infância (Prout e James):


1. A infância é entendida como uma construção social.
➢ indica um quadro interpretativo para a contextualização dos primeiros anos da vida humana.
➢ A infância, sendo distinta da imaturidade biológica, não é uma forma natural nem universal dos
grupos humanos, mas aparece como uma componente estrutural e cultural específica de muitas
sociedades.
2. A infância é uma variável da análise social.
➢ Ela não pode nunca ser inteiramente divorciada de outras variáveis como a classe social, o género
ou a pertença étnica.
➢ A análise comparativa e multicultural revela uma variedade de infâncias, mais do que um
fenómeno singular e universal.
3. As relações sociais estabelecidas pelas crianças e as suas culturas:
➢ devem ser estudadas por seu próprio direito (“in their own right”) independentemente da
perspetiva e dos conceitos dos adultos.
4. As crianças são e devem ser vistas como atores:
➢ na construção e determinação das suas próprias vidas sociais, das vidas dos que as rodeiam e das
sociedades em que vivem.
As crianças não são os sujeitos passivos de estruturas e processos sociais.
5. Os métodos etnográficos são particularmente úteis para o estudo da infância.
➢ Eles transportam uma voz e participação mais diretas na produção dos dados sociológicos do que
é usualmente possível através de métodos experimentais de pesquisa ou do que inquéritos.
6. A infância é um fenómeno que revela agudamente a dupla hermenêutica das ciências sociais
➢ Quer isto dizer que proclamar um novo paradigma da sociologia da infância é também envolver-
se no processo de reconstrução da infância na Sociedade

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As 9 teses que Jans Qvortrup formulou como síntese da interpretação da Sociologia da Infância sobre:
A infância como fenómeno social:
Tese 1: A infância é uma forma particular e distinta de uma estrutura social da sociedade (…).
Tese2: A infância é, sociologicamente falando, não uma fase transitiva mas uma categoria social
permanente (…).
Tese 3: A ideia da [essência] da criança enquanto tal é problemática, dado que a infância é uma categoria
histórica e intercultural (…).
Tese 4: A infância é uma parte integrante da sociedade e da sua divisão de trabalho (…).
Tese 5: As crianças são elas próprias co-construtoras da infância e da sociedade (…).
Tese 6: A infância está em princípio exposta às mesmas forças macro-sociais que a adultez (e.g. forças
económicas e institucionais), ainda de que uma forma particular (…)
Tese 7: A dependência estipulada das crianças tem consequências para a invisibilidade das crianças nas
descrições históricas e sociais, bem como na sua consideração como beneficiárias do Estado Providência
(…).
Tese 8: A ideologia familialista, não a parentalidade, constitui um obstáculo contra os interesses e o bem-
estar das crianças (…).
Tese 9: A infância é uma clássica categoria minoritária, dado que é sujeita a tendências marginalizadoras
e paternalistas.” (Qvortrup, 2001:223-232)

Programa da nova Sociologia da infância está presente nos dois textos de enunciação programática que
transcrevemos:
1. o carácter não natural, mas histórico e social, da categoria infância, a diferenciação categorial da
infância face à adultez,
2. outras categorias estruturais da sociedade (classe, género, etnia, etc.)

Pontos de confluência teórica


1. A infância deve ser estudada em si própria (ou a partir do seu próprio campo), independentemente
da delimitação dos objetos teóricos construídos pela ciência “adulta”,
➢ tomando como ponto de partida aquilo que é distintivo no grupo geracional da infância face a
outros grupos geracionais
➢ assumindo a autonomia analítica da acção social das crianças (e não dos adultos sobre as
crianças).
Isso implica o corte com o adultocentrismo, isto é, a perspectiva analítica que estuda as crianças a partir
do entendimento adulto, das expectativas dos adultos face às crianças ou da experiência do adulto face
à sua própria infância.

2. A infância é uma categoria geracional que necessita de ser estudada


• de modo a articular os elementos de homogeneidade (estatuto social como grupo etário
dependente dos adultos; estatuto político idêntico com inibição de direitos eleitorais até aos
16/18 anos; interdições e obrigações geracionais - proibição de trabalhar, de casar, etc)
• com os elementos de heterogeneidade, inerentes ao facto das crianças serem também
desigualmente distribuídas pelas diferentes categoriais sociais (classe social, género, etnia,
subgrupos etários).

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3. O conceito de geração é central na configuração sociológica da infância, porque permite resgatar,


quer no plano da análise de estrutura social, quer no plano da análise da ação social das crianças,
aquilo que é distintivo.
➢ O conceito de geração necessita de ser articulado nas suas várias dimensões:
• 1º, como conceito que refere um grupo social constituído, intemporalmente, por indivíduos do
mesmo escalão etário;
• 2º, como conceito que compreende, no plano histórico, um grupo de pessoas do mesmo escalão
etário que viveu uma experiência semelhante;
(Ex: as crianças marcadas pela experiência de guerras, em como as crianças da última década do
século XX, marcadas pela disseminação das tecnologias de informação de massas - computadores,
telemóveis, Internet, etc.);
• 3º, como conceito que compreende a diferença da experiência de um grupo etário, formado em
condições históricas precisas, ao longo do seu trajeto de vida.

4. A construção social da infância, historicamente consolidada,


➢ realizou-se segundo o princípio da negatividade - conceito que diz respeito ao processo social de
negação de determinadas características ou condições de um grupo, categoria ou aspeto da
sociedade;
➢ Suposta incompetência das crianças:
1. a criança é o que não vota, nem pode ser eleito;
2. o que não sabe e por isso tem de estudar;
3. não é responsável e por isso é inimputável;
4. não se pode casar; não paga impostos; não trabalha; não frequenta espaços onde se
vendem bebidas alcoólicas; não participa em negócios, etc.
➢ Sociologia da Infância estrutura-se em torno da ideia ou paradigma da competência infantil: todas
as crianças são competentes no que fazem, considerando a sua experiência e as suas
oportunidades de vida, sendo que as suas áreas de competência são distintas das áreas de
competência adulta.

5. A infância não é uma idade de transição


➢ As crianças são atores sociais competentes, com características próprias, que se exprimem na
alteridade
➢ A Sociologia da infância é crítica da tradição piagetiana da Psicologia do Desenvolvimento, e da
ideia de desenvolvimento, como expressão de uma visão teleológica, linear e estratificada em
etapas do percurso ou itinerário de vida de cada ser humano

6. As condições de vida das crianças necessitam, igualmente, de ser estudadas considerando a


especificidade da infância perante as esferas sociais da produção e da cidadania,
➢ a categoria geracional infância é a que é mais afetada globalmente por fatores estruturais como
a desigualdade social, os conflitos bélicos, as carências das políticas sociais e os efeitos a curto e
longo prazo dos problemas sociais e ambientais.

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7. As crianças são produtoras culturais.


➢ A diferença das culturas da infância decorre do modo específico como as crianças, como seres
biopsicosociais com características próprias, simbolizam o mundo, nomeadamente pela
conjugação que fazem de processos e dimensões como o jogo, a fantasia, a referência face aos
outros e a circularidade temporal.

8. As instituições para crianças configuram em larga medida o “ofício de criança”


➢ As instituições desenvolvem processos de socialização vertical, isto é, de transmissão de normas,
valores, ideias e crenças sociais dos adultos às gerações mais jovens;
➢ O papel da escola e o trabalho pedagógico que “inventou o aluno” e “institucionalizou a infância”
é especialmente significativo no trabalho institucional;
➢ As instituições são também preenchidas pela ação das crianças, seja de forma direta e
participativa seja de modo intersticial.

9. As mutações da modernidade têm implicações nas condições de vida das crianças e no estatuto
social da infância.
➢ As crianças exprimem fortemente as mudanças sociais, interpretando-as e posicionando-se
perante elas;
➢ As mudanças radicam nas transformações mais profundas da sociedade contemporânea:
• emergência da “sociedade de risco”
• pela globalização hegemónica, com inerentes alterações culturais e tecnológicas,
• pelo agravamento das desigualdades sociais, incremento dos fatores de desproteção e
desenvolvimento dos dispositivos de influência da indústria cultural para
➢ A Sociologia da Infância promove o entendimento de que as transformações e mudanças sociais
não levam ao desaparecimento da infância, mas promovem transformações estruturais e
simbólicas nas condições de vida e nas culturas da infância envolvendo-se num projeto social mais
amplo de promoção dos direitos de cidadania da infância.
10. A Sociologia da Infância só poderá desenvolver-se se for capaz de se articular com um programa em
renovação na própria Sociologia e de dar conta das transformações sociais e da “mudança
paradigmática”
➢ necessita de dar conta do “declínio do programa institucional”, com os processos
contemporâneos de subjetivação;
➢ carece de esbater as suas barreiras disciplinares, constituir-se também, como uma sociologia da
construção discursiva da infância;
➢ só poderá concretizar o seu programa científico:
1. se assumir a participação da criança como referente a um tempo social e metodológico;
2. se tomar a criança como sujeito de conhecimento e se fizer de si própria uma verdadeira
Sociologia.

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Tema 2. Problemáticas atuais: ser criança e ser jovem na contemporaneidade


JOVENS E CIDADANIA
Unicef 2017

• Os jovens entre os 15 e 24 anos de idade são o grupo etário mais conectado. Mundialmente 71%
está online, comparado a 48% da população total.
• Crianças e adolescentes abaixo dos 18 anos, uma em cada três usam internet.
• Há cada vez mais crianças a aceder à internet a partir de idades cada vez mais baixas. Em alguns
países crianças abaixo dos 15 anos usam tanto a internet como um adulto com 25 anos.
• Existem cada vez mais crianças a usar smartphones com acesso online, criando uma cultura de
quarto, torna-se assim mais pessoal, mais privado e menos supervisionado.
• Conectividade pode ser uma mais-valia para algumas crianças marginalizadas do mundo,
ajudando-as a alcançar o seu potencial e a quebrar ciclos de pobreza intergeracionais.
• As tecnologias digitais podem ser oportunidade económicas, dando aos jovens oportunidades de
treino e serviços de conjugação de trabalho, criando assim novos tipos de trabalho.
• O acesso ao mundo digital está a tornar-se na nova linha de divisão, há medida que milhões de
crianças poderiam beneficiar do mesmo, outras encontram-se a perder oportunidades.
• 29% dos jovens ao nível mundial não estão a usar internet.
• A juventude africana é a menos conectada, cerca de 60% em contraste com 4% na Europa.
• As divisões digitais vão para além da questão do acesso, crianças que utilizam telemóveis em vez
de computadores obtêm uma experiência online inferior, e aquelas que têm falta de aptidão
digital ou falam línguas minoritárias frequentemente não conseguem encontrar conteúdo
relevante online.
• As divisões digitais espelham as discrepâncias económicas, amplificando as vantagens das crianças
mais ricas e falhando em distribuir oportunidades às crianças mais pobres, com menor vantagens.
• Existe também uma disparidade entre géneros. Mundialmente os homens usam 12% mais
internet que as mulheres (2017). Na Índia menos de um terço dos utilizadores de internet são
mulheres.
• A tecnologia digital pode fazer com que as crianças sejam mais susceptíveis a danos online ou
offline. As crianças mais vulneráveis poderão correr um risco maior, incluindo perda de
privacidade.
• As TIC estão a favorecer os riscos na infância: bulling, servindo assim de combustível a novas
formas de abuso a crianças – pedofilia e pornografia infantil.

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Intervenção Social em Crianças e Jovens – Resumos 2018/2019

• Os predadores entram com mais facilidade em contacto com as crianças, criando perfis falsos e
acedendo a perfis que não se encontrem protegidos nos media sociais e em fóruns de jogos.
• Dark web
• Holanda, Canadá, EUA, Rússia e França, são os países em que 92% dos endereços associados a
abusos sexual de crianças estão sedeados.
• As atitudes variam em função da cultura. As crianças frequentemente recorrem aos seus
seguidores ou visualizadores quando experienciam riscos ou danos online, tornando difícil para
aos pais proteger os filhos.
• Os uso das TIC, contribuem para crises como depressões, ansiedade, gerando até obesidade
infantil, mas em alguns casos poderá ser benéfico, providenciando apoio às crianças que não o
recebem offline.
• É importante uma boa gestão do tempo online, sendo que é aconselhável uma concentração
naquilo que as crianças fazem online em detrimento de quanto tempo estão online, por via a faze-
los obter o máximo proveito do tempo na internet.

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Tema 3. Políticas sociais para a infância e a juventude


Políticas para a infância em Portugal - Segurança Social (2015)

1- Definição de criança
O conceito de criança encontra-se expressamente definido no artigo 1.º da Convenção sobre os Direitos
da Criança, segundo o qual: “criança é todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da lei
que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo”

No domínio do emprego, por exemplo, os 18 anos constituem a idade mínima para o desempenho de
trabalhos perigosos ou suscetíveis de comprometer a saúde, segurança ou moralidade da pessoa, mas a
idade mínima geral de acesso ao emprego está fixada nos 15 anos, podendo ser de 14 para os países em
desenvolvimento e admitindo-se mesmo a possibilidade de desempenho de trabalhos leves, que não
prejudiquem a frequência escolar, a partir dos 13 anos (artigo 32.º CDC e Convenção n.º 138 da OIT,
artigos 2.º, n.os 3 e 4 e 3.º e 7.º).

O Comité dos Direitos da Criança, por exemplo, tem vindo a considerar reiteradamente que a fixação de
idades mínimas tem de ser levada a cabo no contexto dos princípios básicos subjacentes à CDC,
nomeadamente os princípios da não discriminação e do interesse superior da criança, devendo também
respeitar o “desenvolvimento das suas capacidades” (artigo 5.º CDC).

• Sublinha também que todas as crianças — tanto de tenra idade como adolescentes até aos 18
anos de idade — são titulares de todos os direitos previstos na Convenção, tendo direito a
medidas gerais de proteção e, de acordo com as suas capacidades em evolução, ao exercício
progressivo dos seus direitos2.
• Considera ainda dever haver coerência entre, por exemplo, as idades fixadas para a conclusão do
ensino obrigatório e a admissão ao emprego. Está neste momento em elaboração um Comentário
Geral específico sobre os direitos dos adolescentes3.

2- Instrumentos e órgãos internacionais na área dos direitos da criança


universalidade um dos princípios básicos subjacentes a todo o ordenamento jurídico-internacional de
direitos humanos, todos os instrumentos existentes na área se aplicam indistintamente a adultos e a
crianças. Tal não impede, contudo, que em muitos desses instrumentos tenham sido incluídas disposições
relativas à proibição da discriminação contra crianças ou a medidas especiais de proteção da infância.

É o caso, entre outros, da


1. Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH)
2. Pactos Internacionais sobre os direitos civis e políticos (PIDCP) e sobre os direitos económicos,
sociais e culturais (PIDESC)
3. tratados das Nações Unidas nas áreas da discriminação contra as mulheres (CEDAW), direitos dos
trabalhadores migrantes (CTM) e desaparecimentos forçados.
O elevado número de disposições relativas a crianças constante da Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência reflete a preocupação da comunidade internacional com os especiais desafios
de direitos humanos enfrentados pelas crianças com deficiência (é aliás interessante notar que a CDC foi

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o primeiro tratado de direitos humanos a mencionar expressamente a “incapacidade” como um


fundamento proibido de discriminação).
➢ O controlo da aplicação destas e de outras disposições destes tratados que, juntamente com a
Convenção contra a Tortura (CAT) constituem os nove “tratados fundamentais” de direitos humanos
das Nações Unidas, é levado a cabo por comités de peritos independentes criados para o efeito.

Na área do direito internacional humanitário, refira-se que 25 artigos das Convenções de Genebra de 12
de agosto de 1949 e seus Protocolos de 1977 tratam de questões relativas às crianças, como o tratamento
preferencial na assistência alimentar e médica e a proibição do recrutamento e participação direta nas
hostilidades dos menores de 15 anos

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), com as crianças praticamente desde a sua fundação,
adotou até hoje mais de uma dezena de tratados que visam especificamente a proteção das crianças,
dois deles considerados tratados fundamentais:
1. as Convenções n.º 138, sobre a idade mínima de admissão ao emprego (1973)
2. n.º 182, relativa à eliminação das piores formas de trabalho das crianças (1999).

Conferência da Haia de Direito Internacional Privado (CHDIP) - Foram adotados desde 1956, sob a égide
da, onze tratados que visam expressamente a proteção internacional da infância, abrangendo áreas como
a garantia das obrigações de alimentos, o rapto de crianças e as adoções.

O Conselho da Europa, por exemplo, adotou já:


1. convenções relativas a temas como a adoção (1967 e 2008),
2. repatriamento de crianças (1970),
3. crianças nascidas fora do casamento (1975),
4. guarda de crianças (1980),
5. exercício dos direitos das crianças (1996),
6. cibercriminalidade (2001),
7. contactos com crianças (2003)
8. proteção das crianças contra o abuso e a exploração sexual (2007).
➢ Seria, contudo, o trabalho das Nações Unidas a desenvolver de forma mais significativa e abrangente
a área dos direitos da criança, muito especialmente desde a adoção, em 1989, da Convenção sobre
os Direitos da Criança.
➢ Segundo a UNICEF, este tratado, o primeiro a instrumento jurídico internacional autónomo e
vinculativo a enunciar detalhadamente um amplo catálogo de direitos da criança — civis, culturais,
económicos, políticos e sociais — “mudou a forma como as crianças são vistas e tratadas.

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A Convenção sobre os Direitos da Criança e seu Comité


A CDC é hoje considerada o padrão universal de promoção e proteção destes direitos.
1. desenvolveu o enquadramento jurídico-internacional relativo aos direitos da criança
2. consagrou num instrumento único e formalmente vinculativo uma ampla variedade de direitos
civis, culturais, económicos, políticos e sociais,
➢ A redação da Convenção teve início em 1979 — proclamado Ano Internacional da Criança — com
base num projeto apresentado pela Polónia e as negociações decorreram no seio de um Grupo de
Trabalho de composição aberta estabelecido pela Comissão de Direitos Humanos.
➢ A Convenção sobre os Direitos da Criança seria suplementada com três Protocolos Facultativos:
1. um relativo à venda de crianças, prostituição infantil e pornografia infantil (2000);
2. outro à participação de crianças em conflitos armados (2000);
3. o terceiro instituindo um procedimento de queixa para o Comité (2011), com competência para
examinar queixas:
➢ individuais por alegada violação da Convenção ou seus Protocolos Facultativos pelos respetivos
Estados Partes,
➢ interestaduais e instaurar procedimentos de inquérito em caso de “violações graves ou
sistemáticas” das disposições da Convenção ou seus Protocolos

➢ Outros organismos do sistema da ONU se ocupam de questões relacionadas com a promoção e


proteção dos direitos da criança:
1. UNICEF, fundo autónomo especificamente mandatado para “defender a proteção dos direitos das
crianças e tentar estabelecer os direitos das crianças como princípios éticos constantes e normas
internacionais de conduta face às crianças”.
2. Assembleia Geral (AGNU),
3. Conselho de Segurança,
4. Conselho de Direitos Humanos
5. Alto Comissariado para os Direitos Humanos (ACDH),

Comité dos Direitos da Criança - foi criado para a monitorização da aplicação da Convenção sobre os
Direitos da Criança, é hoje composto por 18 peritos independentes e com natureza e competências
idênticas às dos restantes oito órgãos dos tratados fundamentais de direitos humanos da ONU.

O Comité examina relatórios que lhe são periodicamente apresentados pelos Estados Partes dando conta
das medidas adotadas para cumprir as obrigações impostas pela Convenção:
1. elabora comentários gerais interpretativos das disposições da Convenção a fim de auxiliar tais
Estados no cumprimento das suas obrigações,
2. formula recomendações gerais e organiza regularmente debates temáticos sobre assuntos
relacionados com os direitos da criança.

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A Convenção sobre os Direitos da Criança – Princípios Gerais


1º - o princípio da não discriminação (artigo 2.º), que obriga cada Estado Parte;
➢ a garantir que os direitos consagrados são respeitados e garantidos a todas as crianças sujeitas à
sua jurisdição
➢ e proíbe expressamente qualquer discriminação baseada na raça, cor, sexo, língua, religião,
opinião política ou outra da criança, de seus pais ou representantes legais, ou da sua origem
nacional, étnica ou social, fortuna, incapacidade, nascimento ou qualquer outra situação.
O Comité considera também que este princípio exige que os Estados tentem ativamente identificar as
crianças e grupos de crianças para as quais será necessário adotar medidas especiais com vista ao pleno
gozo dos seus direitos, sublinhando a este respeito a importância da recolha de dados estatísticos
desagregados que permitam medir a extensão da discriminação real ou potencial.

2º - o princípio do interesse superior da criança (artigo 3.º),


“[t]odas as decisões relativas a crianças, adotadas por instituições públicas ou privadas de proteção social,
por tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, terão primacialmente em conta o
interesse superior da criança”, que é considerado simultaneamente um direito substantivo, um princípio
jurídico interpretativo fundamental e uma regra de procedimento.
O Comité considera que a interpretação do conceito de interesse superior da criança não pode prejudicar
o gozo de qualquer um dos direitos previstos na Convenção e que a plena aplicação deste conceito “exige
o desenvolvimento de uma abordagem baseada nos direitos, que envolva todos os agentes, para
assegurar de forma holística a integridade física, psicológica, moral e espiritual da criança e promover a
sua dignidade humana.

3º-o direito da criança à vida, à sobrevivência e ao desenvolvimento (artigo 6.º).


Estabelece que os Estados Partes têm a obrigação de assegurar “na máxima medida possível a
sobrevivência e o desenvolvimento da criança” e estes são conceitos de importância crucial para a
interpretação de toda a Convenção.
O Comité dos Direitos da Criança, o conceito de “desenvolvimento” deve ser interpretado no sentido
mais amplo possível “enquanto conceito holístico, compreendendo o desenvolvimento físico, mental,
espiritual, moral, psicológico e social da criança” e recomenda que as medidas de implementação visem
alcançar o desenvolvimento ótimo de todas as crianças.
➢ Vários artigos da Convenção mencionam expressamente o desenvolvimento da criança enquanto
objetivo, ao passo que outros destacam o papel fundamental dos pais e da família no
desenvolvimento da criança e a obrigação do Estado de os apoiar.
➢ A proteção contra a violência e a exploração é considerada fundamental para a sobrevivência e
desenvolvimento das crianças na máxima medida possível.

4º-o princípio do respeito pelas opiniões da criança (artigo 12.º),


destaca o papel da criança “enquanto participante ativa na promoção, proteção e monitorização dos seus
direitos e se aplica igualmente a todas as medidas adotadas pelos Estados para implementar a
Convenção”, rejeitando uma conceção paternalista e caritativa das crianças e obrigando à sua
participação nos processos decisórios que as afetem - tem ligação direta com outras disposições da
Convenção, nomeadamente as liberdades de expressão, pensamento e associação.

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2.2. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF)


A UNICEF — Fundo das Nações Unidas para a Infância — é “a principal agência humanitária e de
desenvolvimento que trabalha à escala global em prol dos direitos de todas as crianças”, estando
mandatada pela AGNU para “defender a proteção dos direitos das crianças, ajudar a satisfazer as suas
necessidades básicas e alargar as oportunidades para que atinjam o seu pleno potencial”.
➢ Foi criada em 1946 tendo em vista proporcionar comida, roupa e cuidados de saúde às crianças
europeias afetadas pela Segunda Guerra Mundial e o seu mandato prorrogado indefinidamente pela
AGNU em 1953.
iniciativas por si apoiadas e/ou promovidas,
1. a adoção da Declaração dos Direitos da Criança em 1959
2. Convenção sobre os Direitos da Criança trinta anos mais tarde,
3. a proclamação de 1979 como Ano Internacional da Criança,
4. a Cimeira Mundial para a Infância realizada em 1990,
5. o primeiro debate do Conselho de Segurança sobre crianças em situações de conflito em 1998
6. a primeira Sessão Especial da AGNU sobre crianças em 2002,
7. recente processo de consultas e debates sobre os ODS.

➢ tem hoje uma ligação umbilical com a CDC, já que é a única agência expressamente mencionada no
texto da Convenção (artigo 45.º) - o seu trabalho é orientado por esta, tentando mobilizar vontade
política e recursos materiais para ajudar os países, particularmente países em desenvolvimento, a
dar prioridade às crianças e adotar políticas e serviços adequados a estas e suas famílias.
➢ No seu trabalho, a UNICEF diz-se empenhada em garantir a proteção especial das crianças em
situação de maior desvantagem, como vítimas de guerra, desastres, pobreza extrema, todas as
formas de violência e exploração e com deficiência.
➢ Trabalhando em parceria com entidades do sistema da ONU e agências humanitárias, tenta dar
resposta em situações de emergência e prosseguir os objetivos de desenvolvimento sustentável.
➢ Os seus programas no terreno promovem ainda a igualdade de género e a participação das mulheres
e raparigas no desenvolvimento político, social e económico das suas comunidades.

Inteiramente financiada por contribuições voluntárias, a UNICEF desenvolve o seu trabalho enquanto
parte integrante das atividades da ONU em cada país, estando atualmente presente em 190 Estados:
• quer através dos seus gabinetes no terreno, que desenvolvem programas individualizados de
cooperação com os governos anfitriões (sob orientação e com o apoio dos gabinetes regionais);
• quer através dos comités nacionais, ONG que, nos países industrializados, apoiam a promoção dos
direitos da criança, angariam fundos e estabelecem parcerias com a sociedade civil e o mundo
empresarial.

A gestão e administração geral UNICEF


• é levada a cabo a partir da sua sede, em Nova Iorque, sendo o seu trabalho orientado e mo-
nitorizado por um Comité Executivo composto por representantes dos Estados, que define as
políticas e aprova os programas, planos e orçamentos.
• Os seus membros são eleitos pelo Conselho Económico e Social das Nações Unidas, em geral para
mandatos de três anos.

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De acordo com o Plano Estratégico 2014-2017,


O trabalho da UNICEF prossegue objetivos concretos nas áreas da saúde, VIH/ SIDA, alimentação,
educação, água, saneamento e higiene, proteção das crianças e inclusão social, bem como nos domínios
da igualdade de género e atuação em situações de emergência.
As estratégias de implementação passam pelo:
1. desenvolvimento de capacidades a nível nacional e local;
2. apoio na recolha de dados;
3. diálogo político e atividades de sensibilização;
4. estabelecimento de parcerias;
5. promoção da cooperação sul-sul e triangular;
6. identificação e promoção da inovação;
7. integração e estabelecimento ligações transsetoriais;
8. prestação de serviços.

3 Direitos da criança internacionalmente reconhecidos


Entre as disposições coincidentes com as de outros instrumentos de direitos humanos contam-se:
1. a proibição da discriminação (enunciada no artigo 2.º da CDC e constante, explícita ou implici-
tamente, de todos os instrumentos de direitos humanos);
2. o direito à vida (artigo 6.º CDC e artigo 6.º PIDCP, por exemplo);
3. a proibição da tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes (artigo 7.º
PIDCP);
4. o direito das pessoas privadas de liberdade a um tratamento digno (artigos 37.º CDC e 10.º PIDCP);
a liberdade de pensamento, consciência e religião (artigos 14.º CDC e 18.º PIDCP);
5. a liberdade de opinião e de expressão (artigos 13.º CDC e 19.º PIDCP);
6. o direito a um nível de vida adequado (artigos 27.º CDC e 11.º PIDESC);
7. o direito à saúde e a cuidados de saúde (artigos 24.º CDC e 12PIDESC);
8. e o direito à educação (artigos 28.º CDC e 13.º PIDESC).
9. direito a conhecer os pais e ser educada por eles, sempre que possível (CDC artigo 7.º),
10. o direito a não ser separada dos pais contra a vontade destes, salvo se tal for necessário no interesse
superior da criança (artigo 9.º, n.º 1),
11. o direito à proteção contra todas as formas de violência e maus-tratos (artigo 19.º),
12. exploração económica e trabalhos perigosos (artigo 32.º),
13. consumo ilícito de estupefacientes e substâncias psicotrópicas (artigo 33.º)
14. todas as formas de exploração e violência sexuais (artigo 34.º).
15. As crianças privadas do seu ambiente familiar têm direito a proteção e assistência especial (artigo
20.º).
16. A criança vítima de negligência, exploração ou sevícias tem direito a medidas adequadas para
promover a sua recuperação física e psicológica e reinserção social (artigo 39.º),
17. existindo ainda disposições sobre os direitos das crianças refugiadas (artigo 22.º)
18. com deficiência (artigo 23.º).
19. é proibida a imposição da pena de morte ou prisão perpétua sem possibilidade de libertação por
factos cometidos antes dos 18 anos de idade (artigo 37.º, alínea a)),

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20. exige-se que as crianças sejam tratadas de forma consentânea com a sua idade (artigo 37.º, alínea c)
e artigo 40.º, n.º 4) e que as crianças privadas de liberdade sejam separadas dos adultos (artigo 37.º,
alínea c)).
21. Obriga-se também ao estabelecimento de leis, processos, autoridades e instituições especificamente
adequadas a crianças suspeitas, acusadas ou reconhecidas como tendo infringido a lei penal (artigo
40.º, n.º 3), nomeadamente a fixação de uma idade mínima de imputabilidade penal e, sempre que
possível, a adoção de medidas sem recurso ao processo judicial.
22. A criança institucionalizada tem direito à revisão periódica do seu tratamento e colocação (artigo
25.º).
23. Os Estados Partes na CDC ficam também obrigados a respeitar as responsabilidades, direitos e
deveres dos pais, representantes legais, membros da família e da comunidade (artigo 5.º) e
nomeadamente a responsabilidade primacial e comum dos pais na educação e desenvolvimento da
criança (artigo 18.º, n.º 1), assim como a combater a deslocação e retenção ilícitas de crianças no
estrangeiro (artigo 11.º) e a divulgar a Convenção (artigo 42.º).

A UNICEF agrupa os direitos previstos na CDC em quatro grandes grupos:

1º os princípios orientadores (vide supra), entendidos como os requisitos indispensáveis à realização de


todos os outros direitos:
• não discriminação; interesse superior da criança; direito à vida, sobrevivência e desenvolvimento;
e direito à participação.
2º os direitos relativos à sobrevivência e desenvolvimento, entendidos como os direitos aos recursos,
aptidões e contribuições necessários à sobrevivência e pleno desenvolvimento da criança e que exigem,
não só a existência dos meios necessários à sua realização, mas também o acesso aos mesmos:
• uma alimentação adequada, habitação, água potável, educação formal, cuidados de saúde
primários, lazer e recreio, atividades culturais e informação sobre os respetivos direitos
• disposições relativas às crianças refugiadas, com deficiência e pertencentes a grupos minoritários
ou indígenas.
3º os direitos de proteção, incluindo a proteção contra todas as formas de abuso, maus-tratos,
abandono, exploração e crueldade face às crianças;
• aqui está compreendida a proteção especial em situações de conflito armado e a proteção contra
os maus-tratos no âmbito do sistema de justiça penal.
4º os direitos de participação, que abrangem as liberdades de opinião, expressão e associação, o direito
à informação e o direito a ser ouvido e a que as respetivas opiniões sejam tidas em conta em todas as
decisões que afetem a respetiva vida social, económica, religiosa, cultural ou política.
• Segundo a UNICEF, “o exercício destes direitos à medida que crescem envolve as crianças na
realização de todos os seus direitos humanos e prepara-as para assumir um papel ativo na
sociedade.”

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4 Estado de realização dos direitos da criança


No mundo
Em 2015, por ocasião do 25.º aniversário da entrada em vigor da CDC, a UNICEF fez um balanço do
impacto da Convenção na situação das crianças, considerando que “[e]m todas as regiões do mundo, do
Brasil ao Burkina Faso, da Finlândia às Fiji, de Madagáscar ao México, a Convenção tem inspirado
alterações nas leis e práticas que melhoraram as vidas de milhões de crianças”.

Como exemplos, são nomeadamente apontados os seguintes:


✓ Entre 1990 e 2012, redução da mortalidade infantil em um terço e da mortalidade de crianças com
menos de cinco anos em quase 50 %;
✓ Redução da mortalidade materna em cerca de 45 %;
✓ Melhorias na alimentação de milhões de crianças, resultando, nomeadamente, numa redução de 37
% na percentagem de crianças com malnutrição, em cerca de 56 % de aumento na utilização de sal
enriquecido com iodo e na duplicação do número de crianças com adequada ingestão de vitamina A;
✓ Melhoria do saneamento básico e fornecimento de água potável em muitos países, resultando
nomeadamente na eliminação da defecação ao ar livre para 200 milhões de pessoas e na diminuição
das mortes por diarreia (em mais de 50 %), assim como da transmissão de doenças infeciosas;
✓ Aumento da vacinação que, entre 2000 e 2012, salvou a vida a 13,8 milhões de crianças,
nomeadamente reduzindo em 99 % os casos de poliomielite;
✓ Expansão dos programas de prevenção da transmissão do VIH de mãe para filho, o que resultou na
redução de mais de metade das infeções de crianças com menos de 14 anos;
✓ Proibição dos castigos corporais nas escolas em 117 países;
✓ Criação de um importante movimento global contra a mutilação genital feminina, com mais de 10
000 comunidades e 8 milhões de pessoas a declararem o seu compromisso em prol da erradicação
desta prática;
✓ Desde 1998, mais de 100 000 crianças associadas a forças armadas ou grupos armados receberam
assistência da UNICEF, nomeadamente para voltar à escola;
✓ Aumento dos esforços para garantir a realização do direito de todas as crianças à educação, mesmo
em situações de emergência (por exemplo, através da iniciativa School-in-a-box);
✓ Aumento de 33 para 50 % na frequência da educação pré-escolar entre 1990 e 2011;
✓ Reforço do trabalho em prol da proteção dos direitos das crianças com deficiência e das crianças
migrantes;
✓ Aumento da participação das crianças na vida das respetivas comunidades, a nível nacional e
internacional, por exemplo através das novas tecnologias e em fóruns criados para o efeito;
✓ No que respeita aos esforços de redução da pobreza (que atinge com especial dureza as crianças), a
percentagem de pessoas que vivem com menos de $1.25 por dia diminuiu de 47 % em 1990 para 20
% em 2010;
✓ Reconhecimento e fomento do direito de brincar, enquanto direito humano de todas as crianças e
não apenas um privilégio de algumas;
✓ Redução de um terço do trabalho infantil entre 2000 e 2012;
✓ Aumento de 58 para 65 % nos registos de nascimentos entre 2000 e 2010;
✓ Melhoria da recolha de dados e do conhecimento sobre a situação mundial da infância.

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Não podemos esquecer que muito ainda há por fazer,


1. cerca de 6,6 milhões de crianças com menos de 5 anos morrem todos os anos, na sua maioria por
causas evitáveis;
2. um terço das crianças da mesma idade não estão registadas, vendo-se assim privadas de
existência legal e do gozo efetivo de muitos dos seus direitos;
3. 168 milhões de crianças são ainda forçadas a trabalhar;
4. 11 % das raparigas são forçadas a casar antes dos 15 anos de idade, assim vendo comprometidos
os seus direitos à saúde, à educação e à proteção.

Em Portugal
Em janeiro de 2014 apresentou ao Comité dos Direitos da Criança, reunido em Genebra:
• o seu terceiro e quarto relatórios periódicos sobre a aplicação da Convenção
• os relatórios iniciais relativos à aplicação dos Protocolos Facultativos sobre a participação de crianças
em conflitos armados e sobre a venda de crianças, prostituição infantil e pornografia infantil.

Reconheceu então o Comité - tal como havia já reconhecido aquando da análise dos dois primeiros
relatórios, em 1995 e 2001, respetivamente — a adoção pelo Estado português de diversas medidas com
impacto positivo no cumprimento das obrigações impostas pela Convenção, nomeadamente:
1. alterações no regime de proteção na parentalidade,
2. atribuição de subsídio pré-natal a mulheres grávidas e prestações sociais a famílias com filhos;
3. regime de execução das medidas de promoção e proteção das crianças e jovens em perigo em
meio natural de vida;
4. aumento da proteção social às famílias monoparentais;
5. aumento do apoio à educação pré-escolar e ao ensino básico e secundário;
6. adoção do Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais (PARES) e do Programa
de Apoio ao Investimento em Equipamentos Sociais (PAIES);
7. criminalização de todas as formas de castigos corporais em 2007 (em resultado de uma queixa
apresentada em 2006 pela ONG World Organisation against Torture ao Comité Europeu dos
Direitos Sociais, o qual concluiu que a legislação então em vigor em Portugal não assegurava
satisfatoriamente a proteção das crianças, conforme exigido pela Carta Social Europeia Revista);
8. medidas de combate à discriminação contra as pessoas com deficiência;
9. novo regime legal da adoção de 2003;
10. adoção dos planos/programas nacionais nas áreas da igualdade, violência de género e violência
doméstica, tráfico de seres humanos, integração de imigrantes e integração das pessoas com
deficiência;
11. adoção do Programa de Emergência Social em 2011;
12. medidas de apoio às comunidades ciganas, como gabinetes de apoio e projetos-piloto de
mediadores municipais; e criação da rede nacional de centros de acolhimento para vítimas de
violência doméstica.

O Comité felicitou também Portugal pela ratificação de diversos instrumentos internacionais, incluindo
a maioria dos principais tratados de direitos humanos da ONU e outros com incidência específica na
proteção da infância.

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Destaca-se ainda:
1. uma notável redução na taxa de mortalidade infantil,
2. campanhas contra o bullying em meio escolar (incluindo o bullying homofóbico),
3. melhorias no acolhimento e tratamento das crianças imigrantes
4. programas específicos nas áreas da inserção social e educação, intervenção precoce na infância,
segurança em meio escolar, saúde infantil e juvenil, prevenção de acidentes e mutilação genital
feminina.

A atual crise económica e financeira que Portugal atravessa foi, no entanto, identificada como um dos
obstáculos à plena realização das disposições da Convenção e várias são as recomendações que visam
minimizar o seu impacto sobre as crianças, nomeadamente com vista à afetação de recursos adequados
aos mecanismos de proteção da infância e sistemas de educação, saúde e segurança social.
➢ Recomendações do Comité
1. uma avaliação completa das necessidades das crianças e a afetação dos recursos financeiros
adequados a tais necessidades,
2. a adoção de uma perspetiva de direitos da criança na elaboração do orçamento,
3. o estabelecimento de mecanismos de avaliação do impacto do orçamento na situação das crianças
4. dotações específicas para crianças em situação de desvantagem ou vulnerabilidade.
5. a plena compatibilização da legislação nacional com as disposições da Convenção,
6. a adoção de uma estratégia nacional abrangente para a implementação da Convenção,
7. a melhoria dos mecanismos de coordenação e monitorização na área dos direitos da criança,
8. o desenvolvimento de procedimentos e critérios para orientar todas as partes competentes na
determinação do interesse superior da criança em todas as áreas relevantes
9. o reforço dos esforços para assegurar o respeito do direito da criança a ser ouvida em todos os
processos judiciais ou administrativos que afetem os seus interesses.
10. uma série de medidas relativas à recolha de dados estatísticos sobre a situação das crianças,
designadamente a introdução de um sistema de recolha de dados abrangendo toda a infância, até
aos 18 anos de idade,
11. o desenvolvimento de um sistema de indicadores na área dos direitos da criança.
12. o reforço das medidas de informação e sensibilização sobre direitos da criança, bem como da
formação dos profissionais que trabalham com e para crianças, como juízes e outros magistrados,
assistentes sociais, polícias, profissionais de saúde e jornalistas.
13. deverão ser intensificados os esforços para eliminar todas as formas de discriminação contra
crianças imigrantes, estrangeiras e pertencentes a minorias étnicas e raciais, incluindo de origem
cigana e afrodescendentes, bem como discriminadas com base na sua orientação sexual ou
identidade de género. (há ainda outras recomendações).

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5. Perspetivas para o futuro: A agenda pós-2015


Esta agenda prevê 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que devem ser atingidos em
todo o mundo (já não apenas nos países em desenvolvimento) até 2030:
1. erradicação da pobreza em todas as suas formas;
2. erradicação da fome, segurança alimentar, melhoria da alimentação e promoção de uma
agricultura sustentável;
3. saúde e bem-estar em todas as idades;
4. educação de qualidade; igualdade de género; água potável e saneamento para todos; energia
acessível e limpa;
5. trabalho decente e crescimento económico;
6. construção de infraestruturas resilientes, promoção de uma industrialização inclusiva e
sustentável e fomento da inovação;
7. redução das desigualdades a nível nacional e internacional;
8. cidades e comunidades inclusivas, seguras e sustentáveis;
9. padrões de consumo e produção responsáveis;
10. medidas urgentes para combater as alterações climáticas;
11. conservação e uso sustentável dos recursos aquáticos;
12. proteção, reabilitação e uso sustentável dos ecossistemas terrestres;
13. inclusão social, acesso de todos à justiça e instituições robustas;
14. reforço dos meios de implementação e das parcerias para um desenvolvimento sustentável.
➢ Para atingir estes Objetivos, 169 metas concretas foram igualmente acordadas.
➢ Os ODS pretendem responder às necessidades e aspirações de todas as pessoas em todos os locais.

A UNICEF lembra que as medidas que vieram a ser adotadas para proteger os oceanos e ecossistemas,
criar cidades sustentáveis, investir na energia e nas infra-estruturas, reforçar as instituições e estabelecer
parcerias “darão forma” à vida das crianças e ao mundo que as rodeia e, nesta medida, influenciarão
decisivamente o gozo dos seus direitos.
➢ A realização de cada ODS terá pois impacto na realização dos restantes e, nesta medida, de todos
os direitos da criança.

Direitos da Criança: Políticas para a Infância em Portugal na área da Segurança Social

Em termos de investimento na qualidade e disponibilidade de serviços sociais para as famílias, tem-se


mostrado crucial facilitar o acesso à rede de serviços e equipamentos de cuidados às crianças de famílias
mais vulneráveis, numa lógica de promoção da inclusão social dessas crianças e de conciliação da
atividade profissional com a vida pessoal e familiar dos agregados, que já experienciam dificuldades
acrescidas, em particular na forma como participam no mercado de trabalho e/ou noutras atividades.
➢ Das várias medidas existentes, referem-se, a título de exemplo:
1. as medidas de reforço da intervenção junto das crianças, como o Sistema Nacional de
Intervenção Precoce na Infância (SNIPI),
2. o alargamento do número de Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ),
3. as medidas de responsabilidade parental.

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Apoio e proteção da infância em Portugal


• A consagração explícita deste princípio-base veio a ocorrer através da Convenção dos Direitos da
Criança,
• no contexto nacional, o artigo 69.º da Constituição da República Portuguesa assegura à criança a
proteção do Estado com vista ao seu desenvolvimento integral, garantindo ainda uma especial
proteção às crianças por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal.
➢ no seu artigo 67.º, a família como elemento fundamental da sociedade, identificando o que de
essencial compete ao Estado relativamente à sua proteção, nomeadamente a definição e
execução de uma política de família com carácter global e integrado.
➢ A própria Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo define o papel de cada uma das partes
do sistema ao explicitar que “a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo
incumbe às entidades com competência em matéria de infância e juventude, às comissões de
proteção de crianças e jovens e aos tribunais”.

Pirâmide representativa do Sistema de Proteção de Infância e Juventude


1. Tribunais
2. CPCJ
3. Entidades com competência em matéria de infância e juventude
➢ Apenas na impossibilidade de o fazerem com sucesso, devem estas entidades com competência em
matéria de infância e juventude referenciar as crianças e jovens para a Comissão de Proteção de
Crianças e Jovens correspondente à área de residência da família.
➢ As CPCJ apenas farão transitar a situação para a esfera judicial caso não consigam atuar no
sentido de prevenir ou remover a situação de perigo identificada, ou ainda na ausência ou
retirada de consentimento dos progenitores ou representantes legais da criança ou jovem.

Outros princípios de intervenção constantes na Lei(interesse superior da criança e subsidiariedade):


1. Interesse superior da criança e do jovem;
2. Direito à privacidade;
3. Intervenção atempada, mínima e proporcional à situação;
4. Responsabilidade parental e a prevalência da família;
5. Obrigatoriedade de informação à criança ou jovem e às famílias sobre os seus direitos e sobre a
intervenção;
6. Audição obrigatória e participação da criança ou jovem e da família nas ações e decisões que lhes
dizem respeito.

Em suma - o sistema português de apoio e de proteção da infância e juventude procura:


• não apenas uma coerência teórica que lhe é conferida a partir do reconhecimento da pessoa e dos
seus direitos, assente na Declaração dos Direitos Humanos, e o aprofundamento daí decorrente,
traduzido na melhor compreensão da identidade da criança e respetivas especificidades, à luz da Con-
venção dos Direitos da Criança.
• o sistema procura promover o ordenamento jurídico e a organização do serviços por forma a melhor
garantir a promoção e proteção num contexto de contemporaneidade, em que as crises económicas
e sociais, no seu conjunto interno e externo, mais fazem perigar os direitos reconhecidos à criança.

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Medidas de política para a infância e família


integram três princípios incontornáveis constantes na própria Constituição mas também decorrentes do
ordenamento jurídico internacional que Portugal subscreve:
1. o superior interesse da criança no que tem a ver com a primazia deste princípio na tomada de
decisões,
2. a família enquanto elemento fundamental da sociedade, em geral, e na função generativa, em
particular
3. o princípio da igualdade, no reconhecimento de direitos e deveres comuns aos pais e,
consequentemente, no direito à proteção na paternidade e maternidade.

As medidas de política incidem,


• sobre as famílias ao procurarem atenuar os desequilíbrios sociais e financeiros decorrentes da sua
opção pela procriatividade e na consequente necessidade de conciliação entre a vida familiar e
profissional, prevenindo riscos maiores de pobreza e promovendo a natalidade
• sobre as próprias crianças no direito à vida e a um futuro saudável e feliz, que às mesmas é
reconhecido e expresso na Convenção dos Direitos da Criança e que, faz intervir um recurso de
promoção e proteção dos seus direitos quando esses mesmos direitos são violados.

Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância


Principais medidas de apoio às famílias nas suas funções parentais - Resposta que visa garantir
condições de desenvolvimento:
1. das crianças com alterações nas funções ou estruturas do corpo que limitam o crescimento
pessoal e social e a sua participação nas atividades típicas para a idade,
2. das crianças com risco grave de atraso de desenvolvimento.

Decorre da articulação entre três Ministérios:


1. Solidariedade,
2. Emprego e Segurança Social,
3. Educação e Saúde.

Tem por objetivos:


1. Assegurar às crianças a proteção dos seus direitos e desenvolvimento das suas capacidades;
2. Detetar e sinalizar todas as crianças com risco de alterações ou alterações nas funções e estruturas do
corpo ou risco grave de atraso de desenvolvimento;
3. Intervir, após a deteção e sinalização daquelas situações, em função das necessidades do contexto
familiar de cada criança elegível, de modo a prevenir ou reduzir os riscos de atraso no desenvol-
vimento;
4. Apoiar as famílias no acesso a serviços e recursos dos sistemas da Segurança Social, da Saúde e da
Educação, envolvendo a comunidade através da criação de mecanismos articulados de suporte social.

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Respostas de acompanhamento de crianças e jovens:

1. Ama - Atividade desenvolvida por pessoa capacitada que, por conta própria e mediante retribuição, cuida
de uma ou mais crianças até aos 3 anos de idade que não sejam suas parentes ou afins na linha reta ou
no 2.º grau da linha colateral, por um período de tempo correspondente ao trabalho ou impedimento
dos pais ou da pessoa que tenha a guarda de facto.
Tem por objetivos:
➢ Apoiar as famílias mediante o acolhimento de crianças;
➢ Manter as crianças em condições de segurança;
➢ Proporcionar, num ambiente familiar, as condições adequadas ao desenvolvimento integral da
criança.

2. Creche - Resposta social de natureza socioeducativa, para acolher crianças até aos 3 anos de idade,
durante o período de impedimento dos pais ou da pessoa que tenha a sua guarda de facto.
Tem por objetivos:
➢ Proporcionar, através de um atendimento individualizado, o bem-estar e desenvolvimento integral
das crianças num clima de segurança afetiva e física;
➢ Colaborar com a família na partilha de cuidados e responsabilidades no desenvolvimento das
crianças;
➢ Colaborar no despiste precoce de qualquer inadaptação ou deficiência assegurando o seu
encaminhamento adequado.

3. Estabelecimento de educação pré-escolar - Resposta social orientada para o desenvolvimento de


crianças com idades compreendidas entre os 3 anos e a idade de ingresso no ensino básico,
proporcionando-lhes atividades educativas e atividades de apoio à família.
Tem por objetivos:
➢ Promover o desenvolvimento pessoal e social da criança e proporcionar-lhe condições de bem-
estar e segurança;
➢ Contribuir para a igualdade de oportunidades no acesso à escola e para o sucesso da
aprendizagem e desenvolvimento da expressão e da comunicação;
➢ Estimular a curiosidade e o pensamento crítico;
➢ Despistar inadaptações, deficiências e precocidades para melhor orientação e encaminhamento
da criança;
➢ Incentivar a participação das famílias no processo educativo e estabelecer relações de
colaboração com a comunidade;
➢ Apoiar a família através de fornecimento de refeições às crianças e de prolongamento de horários
com atividades de animação socioeducativa.

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4. Centro de atividades de tempos livres - Resposta social que proporciona atividades de lazer a crianças e
jovens a partir dos 6 anos, nos períodos disponíveis das responsabilidades escolares, desenvolvendo-se
através de diferentes modelos de intervenção, nomeadamente acompanhamento/inserção e prática de
atividades específicas.
Tem por objetivos:
➢ Criar um ambiente favorável ao desenvolvimento de cada criança ou jovem;
➢ Colaborar na socialização de cada criança ou jovem, através da participação na vida em grupo;
➢ Favorecer a relação entre família, escola, comunidade e estabelecimento, com vista a uma
valorização, aproveitamento e rentabilização de todos os recursos do meio;
➢ Proporcionar atividades integradas num projeto de animação sócio-cultural;
➢ Melhorar a situação social e educativa e a qualidade de vida das crianças;
➢ Potenciar a interação e a integração social das crianças com deficiência, em risco e em exclusão
social e familiar.

5. Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental - Resposta social, desenvolvida através de um


serviço, vocacionada para o estudo e prevenção de situações de risco social e para o apoio a crianças e
jovens em situação de perigo e suas famílias, concretizado na sua comunidade, através de equipas
multidisciplinares.
➢ esta resposta visa a qualificação familiar mediante a aquisição e o fortalecimento de competências
parentais nas diversas dimensões da vida familiar e compreende níveis diferenciados de intervenção
de cariz pedagógico e psicossocial que, de acordo com as características das famílias, integram as
seguintes modalidades:
1. Preservação familiar (visa prevenir a retirada da criança ou do jovem do seu meio natural de vida);
2. Reunificação familiar (visa o regresso da criança ou do jovem ao seu meio familiar);
3. Ponto de encontro familiar (constitui-se como um espaço neutro e idóneo que visa a manutenção
ou o restabelecimento dos vínculos familiares nos casos de interrupção ou perturbação grave da
convivência familiar, designadamente em situação de conflito parental e de separação conjugal).

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Medidas de promoção e proteção da infância e juventude


São quatro as medidas em meio natural de vida definidas no Decreto-Lei n.º 12/2008 de 17 de janeiro:
1. Apoio junto dos pais — consiste em proporcionar à criança ou jovem e aos seus pais apoio de
natureza psicopedagógica e social e, quando se justifique, apoio económico.
2. Apoio junto de outro familiar — consiste na colocação da criança ou jovem sob a guarda de um
familiar com quem resida ou a quem seja entregue.
➢ Ambas as medidas equacionam ainda a frequência de programa de educação parental pelos
progenitores ou familiares a quem seja entregue a criança ou jovem, visando a melhoria do
exercício das funções parentais.
3. Confiança a pessoa idónea — consiste na colocação da criança ou jovem sob a guarda de uma pessoa
que, não sendo da sua família, estabeleceu com ela uma relação de afetividade recíproca e possui
capacidade educativa e disponibilidade para assegurar as condições necessárias ao seu
desenvolvimento integral.
4. Apoio para autonomia de vida — destina-se a jovens de idade superior a 15 anos e a jovens mães
com idade inferior, quando a situação o aconselhe. Integra medidas de apoio económico e
acompanhamento psicopedagógico e social, nomeadamente através do acesso a programas de
formação escolar e/ou profissional visando proporcionar aos jovens, condições que os habilitem e
lhes permitam viver por si só, e adquirir progressivamente autonomia de vida.

Medidas de Colocação - Nas situações em que a manutenção da criança ou do jovem no seu agregado
familiar de origem não corresponde ao seu superior interesse, estão previstas medidas de colocação por
forma a assegurar, de forma temporária ou mais prolongada, a satisfação das suas necessidades básicas
e educativas.
1. Acolhimento familiar — consiste na atribuição da confiança da criança ou do jovem a uma pessoa
singular ou a uma família, habilitada para o efeito, proporcionando:
• a sua integração em meio familiar
• a prestação de cuidados adequados às suas necessidades e bem-estar,
• a educação necessária ao seu desenvolvimento integral.
➢ As famílias de acolhimento podem constituir-se em lar familiar ou em lar profissional, sendo que,
neste último caso, o mesmo deverá ser constituído por uma ou mais pessoas com formação técnica
adequada às necessidades específicas da criança.
➢ O acolhimento familiar, por seu turno, poderá ser de curta duração ou prolongado, consoante,
respetivamente, seja previsível o retorno da criança ou do jovem à família natural em prazo não
superior a seis meses ou em que, sendo previsível o retorno à família natural, circunstâncias
relativas à criança ou ao jovem exijam um acolhimento de maior duração.

2. Acolhimento residencial — tem lugar em casas de acolhimento, as quais são organizadas em


unidades que favoreçam uma relação afetiva do tipo familiar, uma vida diária personalizada e a
integração na comunidade.
➢ O obedecem a modelos de intervenção socioeducativos adequados às crianças e jovens nela
acolhidos.

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As casas de acolhimento podem organizar-se por unidades especializadas, designadamente:


1. Casas de acolhimento para resposta em situações de emergência;
2. Casas de acolhimento para resposta a problemáticas específicas e necessidades de intervenção
educativa e terapêutica evidenciadas pelas crianças e jovens a acolher;
3. Apartamentos de autonomização para o apoio e promoção de autonomia dos jovens.
➢ Em qualquer dos casos, estas instituições de acolhimento podem ser públicas ou cooperativas, sociais
ou privadas, com acordo de cooperação com o Estado.

Medidas complementares

1. Abono de família pré-natal — prestação atribuída à mulher durante o período de gravidez, para
compensar os encargos acrescidos.
2. Abono de família para crianças e jovens — prestação paga mensalmente para compensar os encargos
familiares respeitantes ao sustento e educação das crianças e jovens. Existem majorações para
ambos os abonos nas seguintes situações:
a) Famílias monoparentais: aumento de 20 % no valor do abono;
b) Famílias com 2 ou mais crianças: aumento do valor do abono de família para crianças e jovens.
3. Subsídio parental — prestação atribuída ao pai e à mãe, durante o período de impedimento para o
exercício de atividade profissional, por nascimento de filho.
4. Subsídio social parental — prestação atribuída ao pai e à mãe, em situação de carência económica,
por nascimento de filho.
5. Subsídio parental alargado — prestação atribuída aos pais, após a concessão do subsídio parental
inicial ou do subsídio parental alargado do outro progenitor, durante os períodos de impedimento
para a atividade profissional, para assistência a filho.
6. Subsídio por risco clínico durante a gravidez — prestação atribuída à trabalhadora, durante os
períodos de impedimento para a atividade profissional, nas situações de risco clínico para a grávida
ou para o nascituro.
7. Subsídio social por risco clínico durante a gravidez — prestação atribuída à trabalhadora, em situação
de carência económica, em caso de risco clínico para a grávida ou para o nascituro.
8. Subsídio por interrupção da gravidez — prestação atribuída à trabalhadora, durante o período de
impedimento para o exercício de atividade profissional, nas situações de interrupção da gravidez.
9. Subsídio social por interrupção da gravidez — prestação atribuída à trabalhadora, em situação de
carência económica, em caso de interrupção da gravidez.
10. Subsídio por riscos específicos — prestação atribuída à trabalhadora grávida, puérpera e lactante
que desempenhe trabalho noturno ou esteja exposta a riscos específicos que prejudiquem a sua
segurança e saúde, durante o período de impedimento para o exercício de atividade profissional.
11. Subsídio social por riscos específicos — prestação atribuída à trabalhadora grávida, puérpera e
lactante, em situação de carência económica, que desempenhe trabalho noturno ou esteja exposta
a riscos específicos que prejudiquem a sua segurança e saúde.
12. Subsídio para assistência a filho — apoio em dinheiro dado às pessoas que têm que faltar ao trabalho
para prestar assistência urgente e necessária aos filhos (biológicos, adotados ou do seu cônjuge), em
caso de doença ou acidente. Aplica-se a filhos menores ou maiores que integrem o agregado familiar

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do beneficiário, bem como aos filhos que, independentemente da idade, sejam deficientes ou
doentes crónicos.
13. Subsídio para assistência a neto — prestação atribuída aos avós ou equiparados, por nascimento de
neto, com vista a substituir os rendimentos de trabalho perdidos durante o período de impedimento
para a atividade profissional.
14. Subsídio por adoção — apoio em dinheiro dado aos candidatos a adotantes que estão de licença
(podem faltar ao trabalho) por adoção de uma criança menor de 15 anos, e destina-se a substituir os
rendimentos de trabalho perdidos durante o período de licença.
15. Subsídio de assistência a filhos com deficiência ou doença crónica — apoio em dinheiro dado às
pessoas que tiram uma licença no seu trabalho para acompanharem os filhos (biológicos, adotados
ou do seu cônjuge) devido a deficiência ou doença crónica, por período até 6 meses, prorrogável até
ao limite de 4 anos.
15. Subsídio por assistência de terceira pessoa — valor em dinheiro que é pago em cada mês às crianças
ou adultos portadores de deficiência, a receber abono de família com bonificação por deficiência ou
subsídio mensal vitalício, e que necessitem de acompanhamento permanente de uma terceira
pessoa.
16. Subsídio de bonificação por deficiência — consiste num acréscimo ao abono de família para crianças
e jovens que é atribuído quando por motivo de perda ou anomalia congénita ou adquirida, de
estrutura ou função psicológica, intelectual, fisiológica ou anatómica, a criança ou jovem necessite
de apoio pedagógico ou terapêutico.
17. Subsídio por frequência de estabelecimento de ensino especial — apoio para as crianças ou jovens
(com menos de 24 anos) com deficiência, pago mensalmente às pessoas que tenham a criança ou
jovem a seu cargo, destinada a compensar as despesas com frequência de estabelecimentos
particulares de ensino especial ou regular, frequência de creche ou estabelecimentos de educação
pré-escolar particular, apoio individual especializado.
18. Pensão por orfandade — apoio mensal em dinheiro dado a crianças e jovens órfãos, até atingirem os
18 anos ou se tornarem emancipados (o que acontecer primeiro) que sejam órfãos de pessoa que
não descontou para a Segurança Social nem para qualquer outro sistema de proteção social ou não
tem período contributivo de, pelo menos, 36 meses.
19. Bolsa de estudo — informação sobre prestação, paga mensalmente, para combater o abandono
escolar, melhorar a qualificação dos jovens em idade escolar e compensar os encargos acrescidos
com a frequência obrigatória de nível secundário ou equivalente.
20. Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores — o Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos
a Menores assegura o pagamento das prestações de alimentos, em substituição do pai/mãe
faltoso(a), no caso de incumprimento desta obrigação.

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Desafios para o futuro


• Qualquer política para a infância assenta, necessariamente, numa centralidade do binómio criança e
família, tal como, de resto, está previsto na Constituição da República Portuguesa.

• Rec (2006) - Esta Recomendação reconhece a família como a instância em que a coesão social é
primeiramente experienciada e aprendida pelo que se recomenda aos Estados a adoção das
necessárias medidas legislativas, administrativas e financeiras com vista ao exercício de uma
parentalidade positiva.

• É da conjugação do interesse superior da criança, traduzido, no seu essencial, no direito à segurança,


desenvolvimento e bem-estar, que se considera a parentalidade positiva como um comportamento
parental que assegura a alimentação, educação e desenvolvimento das capacidades da criança,
exercido sem violência, mas com fixação de limites que permitam o seu pleno desenvolvimento.
➢ Tendo em vista este objetivo, as medidas recomendadas destinam-se a assegurar padrões de vida
adequados para as famílias com crianças, prevenir a pobreza infantil e a exclusão social das
famílias com crianças, permitir aos progenitores a conciliação da vida familiar com a vida
profissional e, finalmente prestar serviços de cuidados de alta qualidade para todas as crianças.

• Particular relevância é dada a este exercício da parentalidade em situações de exclusão social ou em


risco de exclusão social, alertando a Recomendação em causa para a necessidade de, nestes casos,
ser assegurado o necessário apoio a longo prazo com vista a atingir os mesmos resultados idênticos
aos das restantes famílias. Por Ex:
1. apoiar os pais na aquisição das necessárias competências relativamente às suas
responsabilidades para com os filhos,
2. garantir o acesso aos direitos sociais (rendimento adequado, saúde, educação, habitação e
emprego),
3. garantir a integração das famílias e crianças no seu contexto natural,
4. construir relações de confiança,
5. promover a necessária e adequada formação a profissionais e a famílias
6. prevenir o abandono escolar, a estigmatização e a marginalização das crianças e suas famílias.

• O contexto de crise financeira, que Portugal tem vivido nos últimos anos, introduziu uma tendência
de concentração de apoios nas famílias de maior fragilidade sócio-económica, mas acabou por não
permitir, por outro lado, um apoio mais abrangente e direcionado à generalidade das famílias.
➢ Se esta última vertente decorre necessariamente da opção por políticas de carácter mais
generalista, suportadas por uma evolução prestacional positiva e por um desenvolvimento da
disponibilidade e qualidade de apoios e serviços, a luta contra a pobreza, especialmente a infantil,
constituiu-se necessariamente como um dos grandes desafios na área das políticas sociais para a
infância.

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O conceito de pobreza infantil - para além dos indicadores e critérios por regra utilizados no seu
aferimento, acaba por corresponder à insuficiência ou mesmo ausência de respostas satisfatórias, tendo
em conta os parâmetros anteriormente referidos, no que concerne às famílias e suas crianças antes
identificadas como em situações de exclusão social ou em risco de exclusão social.
➢ Sendo, pois, na dupla vertente acima identificada que se colocam os grandes desafios às políticas
sociais para a infância em Portugal, com especial preocupação, como também já foi acentuado,
relativamente ao fenómeno da pobreza infantil, importa, contudo, partindo do mesmo,
considerar, de forma mais alargada, todos os quadros, individuais, familiares e socioeconómicos,
em que os fatores de risco (e não apenas económico) surgem com maior intensidade bem como
a sua passagem a contextos de perigo quando não prevenidos oportuna e eficazmente.

• A avaliação que Portugal teve oportunidade de fazer da sua realidade a este nível e no quadro da
avaliação a que, nos termos do artigo 44.º da Convenção dos Direitos da Criança, foi alvo em 2014,
por parte do Comité dos Direitos da Criança, acaba por se constituir como indicador relevante dos
desafios para o presente e também para o futuro.

• encontra-se já em curso um conjunto de iniciativas e alterações suportadas no entendimento de que


o superior interesse da criança se polariza em torno da família e, nesse sentindo, reforçando a sua
capacitação seja através de incentivos económicos no âmbito do sistema prestacional, ou outros, de
carácter mais alargado, tendo em conta a necessidade de conciliação da vida familiar e profissional
e até o incentivo à natalidade.
➢ Destacam-se aqui, por mais significativas, as medidas que vieram permitir o aumento de vagas
em creche bem como o reforço relativamente ao alargamento do respetivo horário de
funcionamento e, ainda, a alteração do estatuto profissional das amas, obrigando ao seu
licenciamento e introduzindo o conceito de obrigatoriedade de formação para as mesmas,
possibilitando o desenvolvimento da sua atividade enquadrada em outra instituição ou a título
individual, constituindo-se esta resposta como alternativa credível à creche.

Nesta centralidade de intervenção em redor da família, assume também particular destaque:


➢ o aumento do número de unidades da resposta social Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento
Parental
➢ a sua maior clarificação e intencionalidade da sua intervenção especializada:
1. no diagnóstico, prevenção e reparação de situações de risco psicossocial das famílias,
2. na promoção de uma parentalidade positiva.

• Regime Jurídico do Processo de Adoção - recentemente publicado, veio dar mais um passo no
aprofundamento do direito da criança a uma família, criando e consolidando um conjunto de
mecanismos e procedimentos com vista à garantia de uma maior eficácia no respeito desse mesmo
direito.
➢ Assim, de referir, em termos mais genéricos, o dever de informação e apoio técnico no acesso
ao conhecimento das suas origens por parte da criança adotada.

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• Em termos mais específicos, salienta-se aqui a criação de um Conselho Nacional para a Adoção a par
de uma especialização das equipas técnicas intervenientes, autonomizando o processo de avaliação
e seleção dos candidatos do processo posterior de estudo da situação das crianças e concretização
dos respetivos projetos adotivos.
➢ De referir ainda a consagração do acompanhamento após a adoção, o qual se poderá prolongar
até aos 18 ou mesmo 21 anos, de acordo com solicitação expressa dos destinatários.

A recente alteração à Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo vem corresponder de forma mais
operativa ao princípio da prevalência da família, nomeadamente:
1. na preferência que deve ser dada ao acolhimento familiar relativamente ao acolhimento
residencial, em particular relativamente a crianças até aos seis anos de idade
2. ao criar uma nova medida de confiança a família de acolhimento com vista a futura adoção,
viabilizando-se por esta via uma transição harmoniosa entre o acolhimento familiar e o projeto
adotivo.

• Pretendeu-se ainda dar um sentido mais eficaz e direcionado para a construção de projetos de vida
das crianças e jovens, desde logo alterando a sua designação de institucional para residencial, de
casas de acolhimento temporário e lares de infância e juventude tão só para casas de acolhimento,
as quais, por sua vez, se podem organizar por unidades especializadas, nomeadamente para
situações de emergência, para resposta a problemáticas específicas ou para apartamentos de
autonomização para o apoio e promoção de autonomia dos jovens.

O princípio do interesse superior da criança e do jovem, - especifica nomeadamente “a continuidade


de relações de afeto de qualidade e significativas”.
• De considerar também no mesmo sentido alterações ocorridas na organização e funcionamento das
Comissões de Proteção de Crianças e Jovens bem como da respetiva Comissão Nacional, agora
reforçada na sua capacidade de acompanhamento qualificado de proximidade relativamente às
comissões e, por outro lado, com uma área de intervenção mais genérica, preventiva e promotora,
bem refletida na sua nova designação enquanto Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e
Proteção das Crianças e Jovens.

Políticas públicas - um conjunto das grandes linhas de orientação e ação assentes em princípios e
normativos não apenas nacionais como internacionais,
➢ elas materializam-se em programas e serviços, estes últimos entendidos como instrumentos
institucionais ou emergentes da sociedade civil, tendo em vista a execução dos referidos programas
enquanto conjunto de projetos e iniciativas num tempo e contexto específicos.

Conjunto de políticas de carácter social para a infância em Portugal - Procurou-se, assim e desta forma
identificar e caracterizar sucintamente, ainda que tendo em atenção as evoluções mais significativas
ocorridas, reafirmando o denominador comum a todas elas assente num paradigma que busca os seus
referenciais na Convenção dos Direitos da Criança consubstanciada no seu princípio basilar da criança
como sujeito de direitos, devendo, assim, tal como define o respetivo artigo 3.º, todas as decisões
relativas à infância e juventude terem primacialmente em conta o interesse superior da criança.

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Tema 4. Teorias e modelos de intervenção social com crianças e jovens


1- O sistema familiar
A família é um conjunto de pessoas em interação ligadas emocionalmente: compreendendo duas ou mais
gerações.
➢ É um sistema, isto é, “um conjunto de elementos ligados por um conjunto de nr loções em contínua
relação om o exterior e mantendo o seu equilíbrio ao longo dum processo de desenvolvimento
percorrido através de estados de evolução diversificados ”.
➢ E um sistema que recebe influências de outros sistemas, que passa por crises geradoras de stress,
de tensões emocionais e de comportamentos sintomáticos.
➢ Embora haja várias abordagens teóricas possíveis, a análise que iremos fazer tem por base um
quadro conceptual actualmente identificado como Teoria Sistémica.

1.1 A família como um sistema


Cada família tem um dinamismo único - Não é uma unidade fechada. - Entra em interação:
1. com outras pessoas, grupos e contextos (como a família alargada, os amigos, os colegas de
trabalho);
2. com outros sistemas mais amplos (como o bairro ou a comunidade);
3. com acontecimentos externos (como as crises económicas ou as guerras).
É um sistema de interação que articula e supera no seu seio os vários componentes individuais.

Ricci e Selvini sintetizaram as dificuldades da análise da interação familiar da seguinte forma:


“A complexidade interacional de um sistema é baseada em pelo menos três fatores interligados:
1. o número das partes componentes ou jogadoras;
2. a natureza da interdependência entre as partes;
3. o grau de incerteza que afeta o comportamento do sistema.

Modelos de Família
1. O modelo de sistema fechado é caracterizado pela rigidez da organização, sendo a sua estabilidade
resultante de uma homeostasia predominante.
2. O modelo de sistema aberto, com a inclusão complexa do tempo, isto é, a evolução histórica das
entradas e saídas do sistema, implica elementos de crescimento, de crise e de criatividade, elementos
característicos de uma auto-organização em evolução.

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A família, como sistema aberto que é, tem as seguintes características:


1. Totalidade - isto é, o todo é maior que a soma das partes, havendo uma inter-relação e
interdependência dos comportamentos de todos os elementos da família;
➢ por exemplo quando estão juntos têm uma forma de se relacionar, de comunicar, que é própria
deles como família e que os torna diferentes de quando cada um está com outras pessoas.
2. Feedback - um sistema não fica indiferente à informação vinda dos seus elementos ou do ambiente,
mas reage-lhe, modificando o seu comportamento de forma a assegurar a sua própria continuidade;
➢ por exemplo: quando o senhor Soares chega a casa alcoolizado, a mãe reage pedindo à Ana e ao
Armindo que estejam sossegados para não incomodar o pai, procurando assim evitar que ele se
tome agressivo.
3. Equifinalidade - corresponde à capacidade do sistema de se reunir em tomo de um objetivo ou de
uma finalidade comum;
➢ por exemplo: um casal une-se para conviver, para ter prazer, para trocar afetividade, sentir
segurança para constituir uma família mais ampla.

Os subsistemas familiares
1. o individual, isto é, o indivíduo que além de desempenhar funções diferenciadas no sistema familiar,
desempenha papéis e funções noutros sistemas que o influenciam, e consequentemente vão
influenciar o seu posicionamento na família;
2. o conjugal, que emerge quando dois adultos se unem numa relação interdependente e
complementar, formando um casal;
3. o parental, surge com o nascimento dos filhos, pela diferenciação do subsistema conjugal, para
desempenhar as tarefas ligadas à educação, proteção, socialização e desenvolvimento das gerações
mais novas, sendo na maior parte das vezes constituído pelos pais;
4. o fraternal, constituído pelos irmãos, que aprendem e treinam entre si as relações sociais,
aprendendo a cooperar, a competir, a negociar, a fazer amigos e aliados.

Subsistema (Relvas, A.R 1996) - uma unidade sistémico-relacional criada por interações particulares que
têm que ver com os indivíduos nelas envolvidos, com os papéis desempenhados e os estatutos ocupados,
com as finalidades e objetivos comuns e, finalmente, com as normas transacionais que se vão
progressivamente construindo”.

Estrutura familiar
À forma como se organizam os subsistemas, como se desenvolvem as relações dentro de cada subsistema
e entre eles-, chama-se estrutura de família.
➢ A estrutura familiar é consequência de transações e comunicações repetidas que levam à definição
de padrões de relação (como, quando e com quem se relacionar) que regulam o comportamento
dos seus membros.
➢ A estrutura tem um limiar de tolerância a padrões alternativos que, quando ultrapassado, faz surgir
mecanismos que repõem os padrões preferidos. Por exemplo: quando a mãe lembra ao filho/filha
que está na hora de se ir deitar e ele/ela obedece, define naquele contexto um padrão transacional.
➢ A estrutura familiar vai-se alterando à medida que as circunstâncias de vida mudam, sem perder a
continuidade que oferece um esquema de referência aos seus membros.

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Os padrões de autoridade são importantes na organização familiar, pois tendo em si um potencial para
a harmonia ou conflito, podem ser desafiados à medida que os membros da família crescem e se
modificam.

Fronteiras
As fronteiras delimitam o sistema familiar em relação ao exterior e os diferentes subsistemas familiares
entre si tendo a função de proteger a diferenciação de sistemas.
➢ Por exemplo: quando a mãe diz ao filho mais velho “não és o pai do teu irmão! Se ele faz uma
asneira não lhe bates, diz-me que eu saberei o que fazer”.

As fronteiras implicam a diferenciação com o mundo exterior - “somos uma família, não queremos
problemas com os vizinhos e diferenciação entre gerações (os adultos têm funções e relacionamentos
diferentes dos seus filhos).

A família, matriz de identidade


A família imprime aos seus membros um sentimento de identidade independente, um cunho de
individualidade. A experiência humana de identidade inclui dois sentimentos:
1. um sentimento de pertença,
2. um sentimento de separação.

A família é a matriz do desenvolvimento psicossocial dos seus membros e como sistema socio-cultural
aberto e em transformação requer flexibilidade e responsabilidade compartilhada.

À família competem dois níveis de funções com objetivos distintos:


1. função interna - assegurar a proteção material e psicossocial dos seus membros, facilitando o seu
desenvolvimento e a sua emancipação;
2. função externa - favorecer a socialização e a transmissão de cultura.

1.2 A família como um sistema em transformação

Minuchin refere que a família é «um sistema que se adapta a diferentes exigências das diversas fases de
desenvolvimento, assim como às mudanças nas solicitações sociais, com o fim de assegurar continuidade
e crescimento psicossocial aos membros que a compõem».

Este duplo processo de continuidade e crescimento desenvolve-se através de equilíbrios dinâmicos


entre:
1. a tendência homeostática ou de coerência - isto é, a tendência de estabilidade e defesa em relação
aos sistemas circundantes e que impede mudanças excessivas ou demasiado abruptas, impedindo a
degradação da família.
2. a capacidade de transformação, de mudança, inerente à família: os seus membros crescem, mudam,
influenciam-se mutuamente e são influenciados por acontecimentos externos.

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Regras familiares
É a existência de regras familiares que permite a qualquer família sobreviver e escapar à destruição.
As regras são diferentes de família para família:
➢ Democrática ou mais autoritária, uma família é, portanto, um sistema auto-regulado por regras
passíveis de modificação ao longo do tempo, através de tentativas e erros que permitem -os vários
membros perceber o que é permitido e o que não é permitido, até uma definição estável da
interacção.

Comunicação na família - Comunicar não é só falar.


➢ Falamos e o que dizemos é confirmado ou se explica ou não pelo nosso olhar, pelo corpo, pelo
sorriso, pela tensão muscular. Comunicamos ideias e sentimentos - o amor e a raiva, a tristeza e
a alegria.
➢ Há famílias que têm maior dificuldade em expressar sentimentos negativos, outras os positivos.

Ciclo vital
➢ Ao longo do tempo a família sofre transformações na sua organização.
➢ O caminho que a família percorre desde que nasce até que morre.
➢ Integra de forma interactiva factores como a dinâmica interna do sistema, os aspectos e
características individuais e a relação com os contextos em que a família se insere.

O ciclo vital da família comporta duas interfaces desenvolvimentais:


1. indivíduo-família;
2. família - meio sócio-cultural.

A primeira classificação das etapas do ciclo vital surge com Duvall (1977) que usa como critério para a
delimitação dos diferentes estádios a presença de crianças na familia, e a idade e evolução do filho mais
velho.
➢ Define oito etapas: casal sem filhos, família com recém-nascido, família com criança(s) em idade
pré-escolar, família com criança(s) em idade escolar, família com filho(s) adolescente(s), família
com jovem(ns) adulto(s), casal na meia-idade, envelhecimento.

A maioria dos autores considera que o ciclo de vida familiar se inicia no casamento.
Relvas (1996 op.cit.) propõe o seguinte esquema:
1. a etapa - formação do casal
2. a etapa - família com filhos pequenos
3. a etapa - família com filhos na escola
4. a etapa - família com filhos adolescentes
5. a etapa - família com filhos adultos
(normalmente não acontece reais famílias reais)

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1 .3 O genograma, instrumento de avaliação familiar

O genograma consta de um diagrama visual da árvore genealógica da família. E utilizado como técnica
de trabalho quando se lida com famílias numa perspetiva transgeracional.
➢ E normalmente preenchido em colaboração com a família.

Tratando-se de uma árvore genealógica, a sua elaboração dá-nos indicações preciosas sobre a passagem
através das gerações de tradições, crenças e comportamentos específicos da família com que lidamos.
➢ Abrange habitualmente três gerações familiares, permitindo registar os seus movimentos ao
longo do ciclo vital da família.

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2. A Família: Modelos, Desenvolvimento e Contextos


A formação do casal - A base da construção da relação conjugal é, na maioria das situações o amor.
➢ Para que o amor se mantenha vai ser necessário o crescimento de ambos os cônjuges, de forma a
que construam novas competências, isto é, que vão de quando as suas respostas às diferentes formas
de amar e ser amado.

Influência dos mitos e crenças na construção da família


➢ Muitos estereótipos e mitos existem em relação à construção da nova família, bem como à escolha
do parceiro, que podem ter grande importância, mais tarde, na dinâmica do casal, podendo tomar-
se problemáticos para o desenvolvimento familiar.
➢ O estereótipo de que as mulheres devem procurar um parceiro mais velho, mais alto, a fidelidade da
mulher ao homem, a virgindade, as promessas de amor no casamento também trazem dificuldades.

O sistema conjugal - sistema entre sistemas


Ao falarmos de casamento, foi assumido o desejo de dois indivíduos viverem juntos, criarem um lar e um
modelo de relação própria. Referimo-nos a um processo, independentemente da sua legalização.
(dinheiro, férias, relacionamento com a família de origem).

Diferenciação
A interação que cada cônjuge estabelece com a sua família de origem está muitas vezes na base de
conflitualidade conjugal.
➢ Os cônjuges adotam diferentes padrões de funcionamento com as suas famílias de origem.

Fusão versus intimidade


• Uma vez o sistema conjugal constituído, vai iniciar-se o processo de permanente descoberta dos seus
elementos, ao longo das diferentes fases do ciclo de vida familiar.
• A proximidade e a intimidade já iniciadas durante o namoro, aumentam com a partilha do espaço, das
coisas pessoais e das revelações íntimas de cada um.
➢ Contudo a exploração do parceiro e a intimidade vão pondo a nu falhas, vão revelando expectativas
e desejos insatisfeitos que conduzem inevitavelmente a desapontamentos com o parceiro escolhido.
• Os problemas conjugais transformam-se num bom motivo para a mudança de padrões e de regras de
funcionamento.
➢ O respeito pela diferença do outro, a clareza na definição das regras, a forma como e por quem vão
ser estabelecidas, são aspectos que vão ter grande importância na construção da relação conjugal e
da nova família.

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Gulotta, define do seguinte modo as regras do sistema conjugal:


1. Aquelas que os próprios cônjuges definem.
➢ Ex: a mulher lava a loiça e o marido enxuga-a São as regras admitidas.
2. Aquelas que o casal não define explicitamente, mas que reconheceria caso fosse questionado a esse
respeito.
➢ Ex: a mulher não deve dançar muito próximo de outro homem que não o marido. São as regras
implícitas.
3. Aquelas que um observador minucioso e atento pode notar, mas cuja existência o casal ou um dos
seus membros negaria.
➢ Ex: o marido boicota as receções organizadas pela mulher porque tem ciúmes do sucesso dela
junto dos amigos. São as regras secretas .”

A criança, o adolescente e a família

2.2.1 O desenvolvimento da criança - O desenvolvimento é um processo ativo.


➢ É através das interações, das trocas com o mundo que a cerca, que a criança integra o que
necessita para crescer e progredir.
As potencialidades são diferentes de criança para criança e são provenientes de uma dupla herança:
1. a herança parental - que vai condicionar o desenvolvimento somático e as tendências pessoais
2. a herança filogenética - que leva a que as sequências do desenvolvimento sejam bastante parecidas,
de acordo com uma sequência biológica determinada: o bebé aprende a rolar antes de se sentar.

O desenvolvimento da criança realiza-se num ambiente.


➢ O ambiente circundante facilita ou dificulta o crescimento pessoal da criança, na medida em que
tem em conta ou não as suas necessidades específicas.
➢ A família é um lugar privilegiado para a educação e o desenvolvimento, é intermediária entre a
criança e o mundo.

O desenvolvimento do sentimento de segurança e autonomia na criança está ligado:


1. à qualidade e estabilidade das interações;
2. à atualização das experiências anteriores que atenuam ou aumentam o desejo de conhecer;
3. à qualidade dos espaços e dos objetos (pessoas e coisas) colocados à sua disposição.

A importância do jogo - O jogo tem para a criança uma importância vital.


➢ Piaget (1963) insistiu em que o desenvolvimento da brincadeira está intimamente ligado ao
desenvolvimento da inteligência.
➢ As atividades criativas, a construção, o faz de conta, são brincadeiras que fazem apelo à
comunicação e à linguagem da criança.
➢ À medida que o pensamento da criança se toma mais lógico ela começa a incorporar nos seus
jogos as regras.

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Fases do desenvolvimento da criança


A constituição da individualidade - dos 0 aos 2/3 anos - As bases das funções mentais, da organização
da individualidade, a diferenciação do Eu e do Não-Eu constroem-se nesta etapa, sendo as finalidades
gerais do desenvolvimento dotar a pessoa das capacidades de:
1. Conhecer e identificar as diferentes partes do seu corpo e as suas capacidades funcionais
2. Organizar um “aparelho mental” que lhe permitirá lidar com os estímulos internos e externos e
dar-lhes significado
3. Perceber-se como uma individualidade autónoma dos objetos, quer humanos quer das coisas que
a rodeiam.
A consolidação do EU - dos 2/3 aos 6/7 anos
• A criança no confronto com os outros não só faz a aprendizagem de papéis sociais como aprende
a posicionar-se e a conhecer qual o seu lugar e o papel que desempenha na vida de cada uma das
pessoas que a rodeiam e com quem interage.
• Reconhecerá as competências que lhe pertencem e as competências que não lhe pertencem, as
suas limitações pessoais e as que lhe são impostas pelos outros.
Apreensão e representação do mundo em que vive - dos 6/7 aos 11/12
• período de reorganização interna, de procura de novos contactos sociais cada vez mais intensos
e consequente abrandamento do interesse investido nos pais, pela procura de um melhor
conhecimento do mundo que a cerca.

Do nascimento do primeiro filho à entrada na escola - O nascimento do primeiro filho exige uma
reorganização familiar, exige espaço para a parentalidade
• por vezes difícil de criar, na medida em que a atividade profissional deixa pouco espaço para a
vida familiar.
• A integração no jardim infantil, prática corrente nos dias de hoje, é o início da relação com um
sistema novo mais organizado, com outras regras, valores e normas, que exige especial atenção.
• Dificuldades de adaptação persistentes e manifestações psicossomáticas frequentes (vómitos,
dores de barriga, faltas de apetite) são sinais de sofrimento psíquico a ter em conta.

A entrada para a escola - Com a entrada dos filhos para a escola, a família é posta à prova no exterior,
quer em termos das competências que a criança manifesta para as aprendizagens, quer em termos das
competências do relacionamento com os outros (crianças e adultos).
➢ Com a entrada na escola ocorrem necessariamente mudanças na família:
1. mudanças ao nível das actividades do quotidiano, desde a concertação dos horários e partilha
das tarefas parentais (quem acompanha a criança à escola, quem a ajuda a fazer os deveres, etc.)
até ao arranjo dos espaços em casa (criação de uma zona de estudo, de uma zona de brincadeira,
etc.).
2. mudanças e ajustamentos relacionais - tendo em conta o movimento recíproco de separação
pais-filhos, movimento que se acelera quantitativa e qualitativamente, pois a criança vê-se
reforçada com novas possibilidades afetivas, relacionais, sociais e cognitivas.

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Os pais, a escola e a ocupação dos tempos livres


Espaço de concordância ou espaço concorrencial
➢ A escola e a família estão frequentemente em concorrência e em conflito.
➢ Este contacto com novos modos de vida e com novos saberes implica, se o desenvolvimento da
criança se está a processar saudavelmente, um reforço da sua competência e segurança, implica que
à medida que cresce os pais deixem de ser os seus únicos mentores - o professor, os colegas, os pais
dos colegas passam também a ser referências importantes.
➢ Família e Escola tomam-se os dois motores de aprendizagem e desenvolvimento para a criança, com
papeis e competências específicas e complementares.

Os papéis da família e da escola são diferentes:


➢ no que diz respeito à socialização, na família sobressai a vertente afetiva e pessoal, e na escola a
vertente da generalização das aprendizagens e do desempenho escolar;
➢ no que diz respeito à prestação de cuidados, a responsabilidade da família é muito maior:
compete-lhe prestar cuidados básicos de saúde, afetivos e económicos, competindo à Escola
apenas um papel complementar.

A importância da organização dos tempos livres


➢ Na sociedade de hoje, torna-se crescente a importância de instituições que permitam à criança a
ocupação dos tempos livres como espaço complementar de educação, recreação e socialização,
já que o horário escolar deixa a descoberto um tempo significativo enquanto os pais ainda estão
ligados ao mundo do trabalho.
➢ Também o poder local (freguesias e municípios), tem um papel fundamental na adequação dos
espaços urbanísticos e arquitetónicos (espaços verdes, campos desportivos, estruturas sócio-
culturais próprias, etc.) que ravoreçam a organização coletiva dos tempos livres.

Diana, uma criança em risco, uma família problemática


(apresentação de um caso)
Comentário: A intervenção desenvolveu-se em duas vertentes:
➢ uma terapêutica (criança, mãe, casal), outra de acção social, envolvendo a rede social de apoio na
superação dos problemas sócias e no restabelecimento de relações de convivência extra-familiar
como suporte a um desenvolvimento harmonioso da Diana e da irmã.
Note que a um pedido aparentemente ligado a dificuldades de aprendizagem estava associada uma grave
crise familiar, e como foi importante a sinalização por parte da professora das dificuldades da menor.

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O adolescente e o jovem adulto


Podemos dizer que o conceito de adolescência é bastante recente, devendo-se o seu aparecimento às
profundas alterações que a família “sofreu”.
➢ nas sociedades pré-industriais, a célula familiar assumia uma função eminentemente produtiva,
em que os filhos eram integrados desde o fim da infância (e até antes) nas tarefas da vida familiar.
As tarefas de educação e de aprendizagem cumpriam-se na família. O jovem entrava rapidamente
no trabalho produtivo.
➢ As mudanças sociais profundas entre as quais se conta, com particular importância, a
escolaridade prolongada, têm determinado significativamente o modo de passagem à idade
adulta, segregando a juventude.
➢ A importância que as sociedades modernas dão à cultura e educação dos seus elementos, tem
como consequência que os jovens permaneçam muito tempo dependentes da família. Há uma
maior demora na entrada no mundo do trabalho, pelo que a família e o grupo de amigos se
tomam, para os jovens, espaços emotivos importantes.

Família e adolescência - Alteração da relação com os progenitores


➢ O abandono progressivo da posição de dependência face aos seus pais e o percurso para a sua
autonomia constituem processos que por vezes são dolorosos quer para o(a) adolescente quer
para os pais que vêm alterado o tipo de relacionamento que a família vinha a manter.
➢ Autonomizar-se significa separar-se progressivamente dos pais.
➢ Sendo um período de frequentes conflitos familiares, esta autonomização é importante para a
aquisição de confiança do(a) adolescente em si próprio(a) e nas suas capacidades. O confronto no
seio da família é parte fundamental na construção da sua autonomia e da sua identidade.

Estilos diferentes de pais (Daniel Sampaio)


1. estilo democrático, os pais tomam as decisões explicando-as e negociando-as e as regras do
funcionamento familiar estão bem claras e definidas, sendo flexíveis;
2. estilo autocrático, as decisões são impostas pelos pais, as negociações são raras e as regras não
mudam;
3. estilo permissivo, os pais lideram de forma frágil e inconstante, as negociações são intermináveis,
mudando constantemente as regras.

Alteração da relação com os pares


O desvio da influência da família para o grupo de pares é com frequência observado pelos pais com
receios. O(a) jovem tende a idealizar o grupo, procurando nele outras formas de interação que lhe
proporcionam parte da sua segurança e vivências emocionais de que necessita.

Efetivamente, a mudança do contexto social da geração dos pais para o atual, não permite comparar a
adolescência daqueles com a dos filhos, não adiantando que façam eco da sua adolescência no sentido
de apontarem soluções.
A compreensão deste aspecto é um bom ponto de partida para que a comunicação se estabeleça.

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A principal função do grupo de iguais na adolescência centra-se em três aspectos:


1. Facilitar a separação em relação à família,
2. Favorecer a aquisição de um certo grau de conformismo face às normas e a distinção entre limites
pessoais e sociais ou convencionais;
3. Permitir o desenvolvimento de um autoconceito positivo, reassegurando o indivíduo de que a sua
aceitação foi merecida e não oferecida.

A construção da identidade - A construção da identidade está ligada às tarefas anteriormente descritas:


a definição, a formação do carácter e a formação de um sistema de valores indicam o fim da adolescência.
➢ Cumpridas as tarefas de abandono da dependência infantil, da evolução do e co grupo, de experiências
de envolvimento afetivo e sexual e da progressiva definição de valores pessoais que nem sempre
correspondem aos da família, podemos considerar que estamos perante o estado adulto.
➢ Este processo é também caracterizado por inúmeros avanços e recuos. O adolescente como que
necessita de regredir emocionalmente nalguns momentos para que o progresso emocional se
concretize. Experimenta sucessivos papéis e emoções, no final de contas para descobrir quem é.

O contexto Escolar - A forma como o sistema familiar vai lidar com a vida escolar do(a) filho(a) terá
reflexos nesta mesma aprendizagem, bem como na gestão das próprias relações intra-familiares.
➢ Efetivamente podem avolumar-se as dificuldades desta etapa do desenvolvimento se não for
prestada atenção ao contexto escolar e às características próprias da adolescência.
➢ É no contexto da escola que o(a) adolescente vai protagonizar nova conquista da sua autonomia,
desta vez face ao professor.
O abandono da escolaridade obrigatória vai resultar:
➢ da experiência de insucesso escolar vivida ano após ano pelo(a) jovem,
➢ das fortes pressões internas e externas à família, para a entrada precoce no mundo do trabalho.

Os Tempos Livres - no essencial, o conceito de tempo livre baseia-se em dois pressupostos: ser capaz de
fazer algo; ter a liberdade de o fazer.
➢ Surge inicialmente associado ao adulto e ao mundo do trabalho, no decurso da Revolução
Industrial, em que os horários de trabalho passam a ser coletivos e rígidos.
➢ Só recentemente aparece o conceito de tempo livre associado à infância, à juventude e aos
reformados.
➢ Assistimos atualmente a uma tomada de consciência da necessidade do lazer, bem como a formas
coletivas e organizadas de dar resposta a esta necessidade.
➢ Associado a lazer, entraram no vocabulário corrente um conjunto de termos tais como: recreação,
ocupação ou animação de tempos livres, desporto para todos, etc.

Família com jovem adulto


As novas tarefas que a família vai ter de cumprir assentam, mais uma vez, em mudanças:
1- renegociação da relação conjugal, parental e filial;
2- redefinição dos limites com as diferentes gerações;
3- transformação dos papéis.

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Outros modelos familiares - O surgimento da família nuclear, que ainda hoje é o modelo mais enraizado
na sociedade ocidental, será anterior à industrialização embora se reforce neste período.
A família evoluiu em três aspetos fundamentais (Shorter, E.):
1. rutura das ligações dos jovens às gerações antigas (diferença de valores entre pais e filhos)
2. instabilidade da vida do casal (insatisfação conjugal e crescente número de divórcios)
3. destruição da ideia da família nuclear como “ninho” acolhedor e protetor, com a mãe/esposa
sempre presente e sempre disponível.
➢ Hoje em dia, viver numa família monoparental ou numa família reconstruída não é uma situação
anómala, mas frequente.

Da família em processo de divórcio à família pós-divórcio - O divórcio tem vindo a aumentar


significativamente.
➢ Segundo Holmes e Rahe é considerado o segundo evento mais stressante da vida a seguir à morte
de um dos cônjuges, pelo seu impacto na família como um sistema, quer na família nuclear, quer
na família alargada.

Carter (1982)26 define quatro fases neste processo:


1. Tomada de decisão - implicando a aceitação da incapacidade de resolver os problemas pelo menos
por um dos cônjuges;
2. planeamento da separação - período de grande sofrimento com grande dificuldade de comunicação;
3. separação - gerir a nova organização familiar;
4. o divórcio.

Divórcio - Estádios no processo de ajustamento (Ahrons):


1. cognição individual: pelo menos um dos cônjuges está a considerar o divórcio e a iniciar o processo
de separação emocional; período caracterizado por um aumento de stress, brigas, acusações,
desvalorização do outro, ansiedade, separação.
2. Meta-cognição familiar: pré-separação com revelação do segredo ou desejo de separação; para o
cônjuge que não toma a iniciativa parece ser mais difícil o ajustamento emocional, experimentando
um sentimento de baixa auto-estima e humilhação.
3. Separação do sistema: a separação concretiza-se, embora persista frequentemente o apego apesar
da raiva ou ressentimento; pode haver uma série de separações e reconciliações, criando-se
fronteiras ambíguas.
4. Reorganização do sistema: reconstrução de fronteiras, novas regras e padrões, papéis, mudança de
estrutura hierárquica; mantém-se por vezes o conflito entre as duas novas famílias, nomeadamente
por questões económicas e por diferentes práticas de educação dos filhos.
5. Redefinição do sistema: quando se atinge uma nova auto-definição; papéis e fronteiras foram
clarificados.
➢ Todo este processo pode decorrer num período de dois a três anos, com grande impacto na vida
emocional e relacional do casal em separação, na interação dos pais com os seus filhos e no que
implica de alteração da natureza da relação dos filhos com a família alargada - avós, tios, etc.

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Famílias monoparentais
A incidência deste tipo de família está em crescendo na sociedade moderna.
➢ pode resultar de três situações:
1. mãe solteira (14,5%);
2. mãe divorciada ou separada (45%);
3. mãe viúva (29,9%).
➢ três problemas que se inter-relacionam, a dominar a sua vida:
➢ a sobrevivência económica
➢ a paternidade (entendida aqui como função parental)
➢ os relacionamentos sociais.

Famílias reconstruídas
➢ um segundo casamento significa (quando existem filhos do casamento anterior), envolvimento de
três ou mais famílias (nova família, família de origem da mãe, família de origem do pai, família de
origem da madrasta ou padrasto), o que torna complexo o processo de estabilização e recuperação
da confiança desenvolvimental.
➢ Esta nova família exige que se tenha em conta novos relacionamentos e papéis extremamente
complicados.

Orientação os papéis e normas da família provocar graves problemas relacionais (Cárter e McGoldrick ):
1. Uma estreita fronteira de lealdade em torno dos membros da família excluindo pais ou filhos
biológicos não é realista, embora seja extremamente difícil para todos abandonarem a ideia da
“família nuclear”.
2. O facto de que o vínculo progenitor - filho antecede o vínculo conjugal, frequentemente por
muitos anos, faz com que o padrasto/ madrasta comece a competir com os seus enteados pela
primazia em relação ao cônjuge, como se os relacionamentos fossem ao mesmo nível.
3. Os tradicionais papéis de género, exigindo que as mulheres assumam responsabilidade pelo bem-
estar emocional da família, coloca a madrasta e a enteada em posições antagónicas e a ex-mulher
e a nova mulher em posições de adversárias, especialmente em relação aos filhos.

O novo modelo de família requer o seguinte:


1. Fronteiras permeáveis em tomo dos membros das diferentes famílias, que permitam aos filhos ir
e vir facilmente, conforme combinado nos acordos de visita e custódia.
2. A aceitação das responsabilidades e dos sentimentos paternos do cônjuge, sem assumir essas
responsabilidades por ele ou tentar competir com o apego progenitor - filhos ou combater o
necessário contacto com o ex - cônjuge.
3. Revisão dos tradicionais papeis de género na família. Esses papeis tradicionais, rigidamente
aplicados, são uma das mais sérias falhas na actual e instável estrutura dos primeiros casamentos.

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Dahl e seus colegas (1987)30, num estudo sobre famílias reconstruídas não atendidas clinicamente,
concluíram que:
1. são necessários vários anos (3 a 5) para todos os seus membros se sentirem vinculados à nova família;
2. os problemas de autoridade mais graves em relação aos filhos eram geridos pelos progenitores
biológicos;
3. a satisfação conjugal estava relacionada com a relação que era estabelecida com os respetivos
enteados.

Os principais problemas a resolver no seio do novo casamento são:


1. ligados à transformação das relações / vínculos;
2. ligados à transformação dos modos de vida;
3. ligados à relação entre os dois núcleos familiares (família do pai, família da mãe),

Lígia, a menina que recusa comer


(descrição de um caso)
Comentário:
Os problemas de autoridade e as dificuldades de relação próprios da etapa do ciclo vital de uma família
com filhos adolescentes agudizaram- se com a tentativa do padrasto de substituir o pai biológico, numa
altura em que provavelmente os jovens ainda não se sentiam vinculados à nova família.
A Lígia adoece, permitindo à família manter a sua unidade.
Quando se toma possível explicitar as dificuldades e negociar a autonomia dos jovens mais velhos e o
exercício da autoridade naquela família, a Lígia supera os seus sintomas, tendo-se redefinido os vínculos
familiares e recriado um novo equilíbrio.

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3. A Intervenção em Situação de Crise Psicológica e Relacional da Família


Crise, factores de risco - sintomas e sinais de alarme

Noção de crise - A palavra crise vem do grego crisia, que significa vulnerável, momento em que uma
decisão muda uma situação.
➢ Erickson considera-a como “um período crucial de vulnerabilidade acrescida e de
potencialidade acentuada (...) força criativa mas também de desequilíbrio”. Insiste na
reciprocidade evolutiva, considerando que “uma família só conseguirá educar um filho na
medida exacta em que se deixar educar por ele...”.
➢ Franck Pittman (1973)31 considera que crise é “o estado de um sistema no momento em que
está eminente a mudança”.
Crise individual - o seu aparecimento e desenvolvimento está necessariamente interligado:
1. à pessoa e à sua personalidade,
2. ao contexto,
3. aos recursos existentes e disponíveis,
4. às trocas e interações que se passam na família.
Considera-se que a crise está ultrapassada quando o novo equilíbrio é conseguido, quando se
recupera a confiança em si e nos outros.

Tipos de crise:
1. as crises de desenvolvimento - quer sejam individuais, ligadas ao ciclo de vida individual, quer
sejam familiares, ligadas ao ciclo de vida familiar;
2. as crises acidentais ou situacionais - causadas por acontecimentos inesperados (desemprego,
doença súbita, perdas);
3. as crises ecológicas ou da natureza - consequência de acontecimentos externos (terramotos,
secas, inundações) ou consequência de falhas humanas (acidentes);
4. as crises transacionais - provocadas por acontecimentos inesperados, pouco prováveis ou de
curta duração (saída de um filho de casa para ir estudar, mudança de emprego para longe da
residência).

Fatores de risco
➢ A Organização Mundial de Saúde define “fatores de risco” como “condições de vida de uma
pessoa ou grupo que os expõem a uma maior probabilidade de desenvolver um processo
mórbido ou sofrer os seus efeitos

Podemos considerar que há fatores predisponentes que podem gerar situações de crise (individual
ou familiar) e que têm a ver
1. com a pessoa, destacando a generalidade dos autores os acontecimentos ligados à relação
precoce e à primeira infância como os que envolvem maior risco individual;
2. com a família
3. com a sociedade

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FACTORES DE RISCO
INDIVIDUAL
1. Separação mãe/filho no pós-parto
2. Perda da mãe antes dos 5 anos
3. Ausência da mãe ou substituto materno
4. Prematuridade com perda de contacto com a mãe
5. Mudanças múltiplas de amas, infantários, escolas
6. Abandono
7. Maus tratos físicos ou psíquicos Hospitalização ou internamento em instituição
FAMILIAR
1. Progenitor com doença grave orgânica/mental Progenitor alcoólico ou toxicodependente
Progenitor preso Separação precoce dos pais Desentendimentos e conflitos conjugais graves
Famílias monoparentais
2. Famílias pouco diferenciadas, com baixo nível de estimulação e socialização
3. Famílias numerosas com problemas económicos ESCOLAR
4. Má adaptação social à escola desde início Deficiente qualidade das interações pedagógicas
professor/aluno Atitude negativa em relação à escola Desinvestimento escolar
SOCIAL
1. Precariedade económica e social
2. Problemas de vizinhança com alto índice de delinquência e atividades marginais
3. Problemas urbanísticos e habitacionais - degradação da habitação Ausência de infraestruturas
e saneamento básico
4. Deficiente cobertura em serviços educativos e de ocupação de tempos livres
5. Insuficiência de equipamentos no âmbito da saúde

Sintomas ou sinais de alerta


No casal - fatores suscetíveis de entravar a evolução satisfatória do relacionamento conjugal:
1. conhece-se ou casa-se logo depois de uma perda significativa.
2. O desejo de se distanciar da família de origem é um dos fatores do casamento.
3. Os backgrounds familiares dos cônjuges são significativamente diferentes (religião, educação,
etc).
4. Os cônjuges vêm de constelações fraternas incompatíveis.
5. reside ou extremamente perto ou a uma grande distância de cada família de origem.
6. depende de alguma das famílias de origem em termos financeiros, físicos ou emocionais.
7. O casal casa antes dos vinte anos
8. casa depois de um conhecimento de menos de seis meses ou de mais de três anos de namoro.
9. O casamento ocorre sem a presença da família ou dos amigos.
10. A mulher fica grávida antes ou durante o primeiro ano de casamento.
11. Um dos cônjuges tem um relacionamento difícil com os seus irmãos ou pais.
12. Um dos cônjuges considera a sua infância ou adolescência uma época infeliz.
13. Os padrões conjugais numa das famílias de origem eram instáveis.

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Sinais de alerta que podem permitir ao técnico que trabalha com famílias detetar eventuais
disfuncionalidades:
1. - o casal tende a ter poucas atividades recreativas em conjunto;
2. - o tempo que passa em conjunto é sentido como desagradável;
3. - ao nível da comunicação, o casal tem respostas negativas à emissão do outro e reciprocamente;
4. - a desigualdade de poder na relação conduz a uma luta constante por esse poder;
5. - a interpretação negativa do comportamento do outro é permanente;
6. - a desqualificação dos aspetos positivos do outro é uma constante;
7. - a interação do casal é de defesa e de retraimento;
8. - as discussões são frequentes;
9. - existe violência verbal e física.

Na criança

Os sintomas podem ter os seguintes significados:


1. sintoma como sinal de alerta - as atitudes da criança como que procuram chamar a atenção para
dificuldades, expressando a necessidade de ajuda e indicando ocorrência de problemas;
2. sintoma indicativo de falha ambiental - quando o ambiente não cumpre os papéis que lhe cabem
tem consequências na criança (dificuldades de sono, inibição etc);
3. sintoma como tentativa de solução de conflitos - procura de compatibilização de necessidades
contraditórias e aparentemente irreconciliáveis da vida afetiva;
4. sintoma como busca de equilíbrio em situações de vida difíceis e sofridas (agressividade como
tentativa de evitar a depressão em situações de carência afetiva).

Agrupamentos sintomáticos Celeste Malpique):


1. Angústia de separação;
2. Dificuldades no adormecimento;
3. Dificuldades na adaptação escolar;
4. Comportamento de dependência e submissão passiva;
5. Comportamentos apelativos.

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No adolescente
Não é consensual nos autores que se dedicam ao estudo e investigação da adolescência, que nesta
etapa, para que o desenvolvimento se processe, tenha que existir crise.
➢ Ausloos entende a crise da adolescência como “ uma época de instabilidade do sistema onde
se torna necessário uma renegociação entre as finalidades individuais ( do jovem) e as
finalidades do conjunto do sistema (a família)

Fatores que podem colocar em risco a vida familiar, particularmente nesta fase do seu ciclo vital:
1. Rutura do diálogo na família;
2. Indiferença afetiva, mais que a própria hostilidade parental;
3. Atitudes constantes de recriminação e reprovação;
4. Atitudes de permanente desconfiança em relação ao adolescente;
5. Existência de segredos familiares que originam a dissimulação e mentira permanente,
6. Rigidez do sistema familiar - resistência à mudança;
7. A forma como a autoridade é exercida na família - modelo permissivo, modelo autocrático;
8. Dificuldades que a família revela nas trocas com o exterior - famílias fechadas;
9. Distância emocional entre o casal e conflitos conjugais que conduzem à noção de que os
adultos vivem juntos estritamente para cumprirem a sua função parental;
10. Famílias aglutinadas na definição dos seus limites
11. Famílias desagregadas na definição dos seus limites,
12. Limites do subsistema parental e filial esbatidos,

No que diz respeito ao adolescente, enumeramos alguns sinais de alarme no seu comportamento:
1. Períodos de tristeza frequentes em que o adolescente deixa de sair e de manter as distrações
que lhe davam prazer;
2. Quebra no aproveitamento escolar;
3. Faltas frequentes às aulas;
4. Sanções disciplinares repetidas;
5. Abandono escolar precoce;
6. Grupo de pares como substituto, demasiado cedo, da socialização oferecida pela família;
7. Ausência de amigos e de programas de saídas à noite, onde pode encetar desafios e correr
riscos;
8. Problemas de comportamento alimentar como anorexia nervosa e bulimia;
9. Consumo de bebidas alcoólicas ou de drogas;
10. Comportamentos de grande agressividade - auto e heteragressividade;
11. Comportamentos de grande bizarria e/ou desadequação;
12. Ideação ou tentativas de suicídio.

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A intervenção

As famílias ditas problemáticas ou disfuncionais - para além dos problemas/dificuldades nela


existentes, há poderosas forças emocionais que interagem com os comportamentos dos seus
membros.
➢ Podem reagir de formas diferentes:
1. famílias integrativas - fechando-se sobre si mesmas e quase impedindo qualquer comunicação
com o mundo exterior;
2. famílias centrífugas - privilegiando papéis estereotipados em que cada um dos seus membros
investe em contextos diferentes, interagindo prioritariamente com outros sistemas e
permanecendo no seio da família cada vez mais isolados e desinteressados

Famílias integrativas - aquelas em que a “harmonia” é considerada de suprema importância e em


que os seus membros para se vincularem mutuamente precisam de um progressivo isolamento do
mundo exterior.
➢ Os laços emocionais são tão fortes que a família parece tornar-se o seu único mundo.

Famílias centrífugas - aquelas em que os estereótipos são rígidos, não podendo os sentimentos ser
partilhados. Cada membro procura satisfazer essas necessidades emocionais fora da sua família.

Solução de problemas - Neste processo consideramos três fatores essenciais:


1. as capacidades inerentes à pessoa ou família em crise;
2. a forma como cada um as mobiliza;
3. os recursos que a comunidade lhe oferece.
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A resolução de um processo de crise pode necessitar de ajuda profissional, estando sempre em


confronto duas variáveis:
➢ a pessoa/família em crise, com as suas capacidades, aptidões e motivação,
➢ a intervenção profissional que se pode caracterizar por:
1. uma relação de ajuda que implica participação compartilhada do problema;
2. sensibilidade, respeito e compreensão face às reações do sistema em crise;
3. confiança nas capacidades pessoais e recursos ambientais para resolver o problema;
4. equilíbrio entre uma atitude empática e protetora do técnico e a consideração do grau de
autonomia do sistema em crise;
5. um olhar mais racional e distante sobre o problema;
6. a identificação e mobilização face aos recursos (informais, formais e institucionais), facilitando
o melhor acesso aos mesmos por parte do sistema em crise

Esta intervenção pode desenvolver-se a três níveis:

Antes da crise, a intervenção - situa-se ao nível da prevenção e criação de condições para o


desenvolvimento integral das crianças/adolescente e sua família
1. favorece a melhoria da qualidade de vida, intervindo ao nível do planeamento e organização
de serviços (educativos ou ocupação de tempos livres e outros)
2. favorece a criação de recursos para satisfazer necessidades básicas (saúde, educação, etc.)
3. identifica situações de risco e aponta soluções para as mesmas no âmbito da comunidade
4. esclarece e mobiliza as famílias.

Durante a crise a intervenção - centra-se na identificação da natureza da crise e meios de a


solucionar, quer seja centrada no indivíduo ou família, quer seja centrada no ambiente ou sistema de
vida em interação.
➢ Quando centrada no indivíduo/família em crise, exige:
1. estar atento aos sintomas/sinais de alerta, como sinais de sofrimento pessoal ou familiar
2. identificar a crise e meios de intervenção
3. orientar a família e reforçar a sua capacidade de enfrentar e superar
4. informar a família dos recursos disponíveis
5. apoiar a família mostrando-se disponível para ajudar
➢ Quando centrada no ambiente/sistema de vida em interação exige:
1. agir como mediador entre o indivíduo/família em crise e os recursos de Comunidade (escola,
atividades de tempos livres, etc.) procurando superar as dificuldades identificadas,
desenvolvendo capacidades de ajuda à família e às estruturas envolvidas.

Depois da crise a intervenção - centra-se no acompanhamento da família, prestando as informações


e o apoio para que for solicitado, atendendo a que as famílias após uma crise ficam por vezes
fragilizadas e com dificuldades de “caminhar sozinha”.

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Rede de suporte informal e formal - estratégias


1. o recurso ao médico de família, num primeiro momento de identificação da crise,
2. o recurso aos serviços de psiquiatria/pedopsiquiatria ou psicologia,

Para uma nova interação técnico-família


➢ A intervenção do técnico terá como objetivo, a devolução à família da sua capacidade de
resolução do problema.
➢ O técnico toma-se no impulsionador da mudança, ajudando a família a criar alternativas.
➢ A noção de que a mudança vai acontecer, mesmo que o técnico não intervenha, deve estar
presente, já que o sistema familiar é dinâmico e interativo.

Princípios a ter em conta na relação técnico família:


1. ouvir a Família e tratá-la com respeito
2. reconhecer os valores, interesses e crenças da família
3. falar claramente em linguagem acessível
4. esclarecer a família e dar informações completas
5. ter em conta preocupações e necessidades, mesmo que sejam diferentes das próprias
6. respeitar as escolhas da família

Estratégias para identificar problemas/necessidades da família


1. prepare com cuidado o Io contacto
2. organize o espaço de atendimento tendo em conta a privacidade necessária e a distância
adequada.
3. disponha de tempo para o Io contacto
4. dê importância ao momento inicial da relação; a criação de um clima favorável passa por um
momento informal de acolhimento
5. elabore o genograma familiar
6. clarifique logo no início o seu objetivo
7. encoraje a família a partilhar preocupações e aspirações
8. ajude a família a clarificar as suas preocupações e necessidades
9. ouça com empatia e procure responder ao pedido
10. estabeleça consensos, respeitando a hierarquia de prioridades definida pela família.

Estratégias para identificar fontes de apoio/recursos


1. identifique a rede pessoal e social da Família
2. dê ênfase à rede familiar e à rede informal da Família
3. procure perceber a forma como a Família mobiliza os recursos da rede familiar e social
4. ajude a identificar necessidades das quais a Família não se apercebeu
5. desenvolva estratégias com a Família para mobilizar recursos
6. promova a capacidade da Família para desenvolver/adquirir competências face aos
problemas/necessidades.

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A propósito de uma notícia


(descrição de um caso em que o aluno agride funcionário de escola)
Comentário
Na notícia são de destacar os problemas de autoridade e violência numa escola situada em meio
social desfavorecido e problemático, gerador de grande insegurança.

Os sistemas em crise são:


1. a escola, entendida como um conjunto de subsistemas em professores, funcionários, alunos;
2. as famílias dos alunos em geral, e dos alunos intervenientes diretamente nas ações de
violência em particular;
3. o bairro em que a escola está inserida.

Se a intervenção se desenvolve a partir da escola, é importante debater institucionalmente a


metodologia de intervenção, de forma a evitar resistências e favorecer transformações.
➢ Poder-se-ão realizar sessões de grupo (professores, alunos etc)
➢ Uma estratégia adequada poderá ser apoiar os pais na constituição de Associação de pais -
parceira, no âmbito da legislação vigente, na definição de projetos educativos da escola
➢ a hipótese da orientação dos jovens agressores para acompanhamento clínico

Se a intervenção se desenvolve a partir dum serviço de saúde,


➢ centro de saúde ou consulta especializada, definir-se-á em equipa a intervenção terapêutica
junto dos jovens e suas famílias, procurando o envolvimento do sistema escolar para a
definição de estratégias conjuntas.

Se a intervenção se desenvolve a partir do serviço de ação social local, para além do


acompanhamento às famílias em crise é essencial a articulação de estratégias conjuntas com a escola,
com os serviços de saúde quando necessário, e com outras estruturas locais.

Por último, destacamos a importância de, com a população e as estruturas locais, pôr em curso
projetos que promovam um desenvolvimento global da comunidade em que a escola está inserida.

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