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ARTIGO

ASPECTOS DA LIDERANÇA NO TRABALHO DO ENFERMEIRO


Aspects of Leardership in Nursing Practice

Enaura Helena Brandão Chaves1

RESUMO ABSTRACT
Liderança em enfermagem é um tópico bastante Leadership in nursing is a topic of great concern
discutido entre professores de enfermagem e enfermei- among nursing educators and nursing service personnel.
ros de campo. A enfermagem necessita possuir líde- Nursing must have leaders to become professionalized.
res para tornar-se profissionalizada. Sendo que a lide- Since leadership can be learned, we believe that nurses
rança pode ser aprendida, acreditamos que os enfer- sould be educated to become leaders. The purpose of
meiros podem ser educados para tornarem-se líderes. this pape r is offer a theoretical basis of the concept and
O presente artigo propõe-se a oferecer alguns subsídi- its application to nursing practice.
os para auxiliar enfermeiros e estudantes de enferma-
gem a formarem uma base teórica sobre a questão da
liderança e sua aplicação na prática de enfermagem.

UNITERMOS: liderança, enfermeira-chefe, grupo de KEY WORDS: leadership, nurse-leader, work group.
trabalho.

1 INTRODUÇÃO O presente estudo destina-se a abordar aspectos


da liderança na prática profissional de enfermeiro, en-
Liderança em enfermagem é um tema de grande fatizando a importância da liderança para a profissio-
interesse entre educadores e profissionais de campo. nalização do trabalho Ma enfermagem.
Muitas teorias sobre liderança têm sido desenvolvidas, Ressalta á possibilidade de treinarem-se enfer-
algumas delas extremamente úteis ao enfermeiro em meiros para o exercício de uma liderança efetiva, des-
sua posição de líder, uma vez que acreditamos que a tacando aspectos contigenciais deste processo
enfermagem necessita de líderes para tornar-se multidimensional que é liderança em enfermagem, uma
profissionalizada. vez que envolve a interação entre líder e grupo e o
Acreditamos ainda, que o fato de trabalhar em ambiente organizacional onde esta interação ocorre, os
conjunto com outros profissionais, faz com que a lide- quais interferem nas diferentes estratégias a serem
rança seja para o enfermeiro, como afirma Secaf (1977), empregadas pelo enfermeiro-líder.
seu principal instrumento de trabalho ou seu ponto fra- Será realizada uma ampla revisão da literatura
co. sobre liderança, a partir da qual serão tecidas algumas
Sendo assim, é natural que este tema seja bas- considerações sobre a atuação do enfermeiro do de-
tante preocupante para nós neste momento, pois sempenho da função gerencial. Finalmente, serão
encontramo-nos atuando como membro da comissão estabelecidas algumas considerações finais para um
de carreira do curso de graduação em enfermagem, desempenho efetivo e tão livre quanto possível de con-
como docente da disciplina de Administração e como flitos, de acordo com o ponto de vista de alguns estudi-
chefe de um serviço de enfermagem hospitalar onde osos e da própria experiência dos autores.
trabalham aproximadamente 60 enfermeiros, todos,
sem exceção, atuando na liderança de pessoas ou gru- 2 DESENVOLVIMENTO
pos.
2.1 Liderança - Conceituação

Ao revisar a literatura sobre liderança, parece-nos


oportuno fazer como Megginson et ai. (1986), Kotter
1
Professor Assistente do Departamento de Assistência e (1990), Koontz e O'Donnel (1964) a distinção entre
Orientação Profissional (DAOP) - EENFUFRGS. Administração e Liderança.

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Para Kotter (1990), liderança é diferente de admi- coordenar tarefas relevantes nas iniciativas grupais, ou
nistração não apenas pelas razões que a maioria das quem, na ausência do líder designado, assume a prin-
pessoas imaginam. Liderança não é mística nem mis- cipal responsabilidade de desempenhar tais funções no
teriosa, não tem nada a ver com "ter carisma" ou outro grupo".
traço exótico qualquer de personalidade. Nem é tão Para Hampton (1983, p.322) "liderança é o pro-
pouco mais necessária do que administração ou· um cesso interpessoal, pelo qual os gerentes tentam influ-
substituto para ela. Liderança e Administração são, na enciar os empregados a realizarem objetivos de traba-
opinião do autor, dois sistemas distintos e complemen- lho estabelecidos".
tares de ação. Cada um tem sua própria função e ativi- Howells (1973, p.90) define "liderança como um
dades características. Ambos são necessários para o encadeamento de atividades que precisam ser postas
sucesso da organização. A administração controla as em prática, para tornar um grupo mais eficaz".
pessoas, mantendo-as na direção certa, enquanto a li- Drake e Smith (1976, p.1 03) definem liderança
derança motiva-se satisfazendo suas necessidades hu- como: comportamento, e como tal, é uma função da
manas básicas; está mais dirigida às mudanças com personalidade e da situação. A liderança é estabelecida
as quais as organizações enfrentam-se atualmente face por eles como um problema de influência e comporta-
ao desenvolvimento tecnológico que, por sua vez, gera mento de pessoas para a execução de tarefas.
necessidade de maior competição e permanente atua- Segundo Bernhard e Walsh (1981, p.12) "lideran-
lização. ça é um processo usado para levar um grupo a alcan-
Megginson et ai. (1986) afirmam que a Adminis- çar objetivos. Este processo pode ser usado por qual-
tração envolve liderança mas também abrange outras quer pessoa; portanto, qualquer pessoa pode teorica-
funções como planejar, organizar e controlar. Liderar mente ser um líder em um dado momento; a liderança
para eles é uma importante função da administração, pode também ser apreendida".
mas não é a mesma coisa que administração.
Para Koontz e O'Donnel (1964) Administração é 2.2 Caracterização do Líder
o processo de atingir objetivos por intermédio de pes-
soas; ·não devemos, portanto, esquecer que quando O fator liderança foi gradativamente adquirindo
alguém esta organizando, recrutando, planejando e con- importância dentro do contexto organizacional, à medi-
trolando, ou seja, "administrando", está trabalhando com da que as empresas cujo funcionamento era predomi-
pessoas e o seu sucesso dependerá em grande parte nantemente resultado do trabalho de grupos de pesso-
de sua capacidade de liderar. as, sentiram a necessidade de coordenar os esforços
Uma outra abordagem relevante foi feita por individuais dessas pessoas a fim de alcançar as metas
Maximiano (1986), que faz distinção entre líder formal e os objetivos organizacionais.
e o líder informal. Nem sempre aquele que ocupa uma Segundo Bergamini (1982) cada dia mais se tem
posição de autoridade formal tem liderança informal valorizado aqueles que, patentemente, usam com efi-
sobre seus colaboradores, e da mesma forma, nem cácia seus recursos pessoais no cumprimento das res-
sempre aquele que tem liderança informal ocupa um ponsabilidades de bem dirigir seus subordinados. Afir-
cargo com autoridade formal correspondente. ma a autora que, na maioria dos casos, as pessoas
Em relação ao aspecto formal e informal da lide- posicionadas em cargos de chefia acabaram por apren-
rança abordado por Maximiano (1986), consideramos der a conduzir pessoas através de uma metodologia
de muito valor para o presente estudo a ponderação de aleatória e desordenada. Atingiram sua eficiência como
que a capacidade de comandar com sucesso envolve chefes, atuando por ensaios e erros no decorrer do seu
tanto a autoridade formal que o cargo empresta ao ocu- dia-a-dia de trabalho. Sendo assim, é muito comum que
pante, quanto as qualidades que o transformam num essas pessoas apresentem uma real dificuldade em
líder informal junto aos comandados. O conceito de lí- ordenar essas experiências quando se vêem diante da
der envolve, portanto a aceitação voluntária de sua necessidade de transmiti-las aos demais.
autoridade pelos demais membros, assim como o re- Embora seja claramente definido na maioria das
conhecimento de sua contribuição para o progresso do profissões a existência de cargos gerenciais, ao assu-
grupo. A autoridade do líder deriva-se assim, da contri- mir tal posição ocorre uma importante mudança, bas-
buição que o mesmo dá ao grupo para atingir seus tante estressante, porque exige a necessidade de es-
objetivos. tabelecer diferentes relacionamentos com colegas pro-
Diferentes autores dedicaram-se ao estudo da li- fissionais, sendo que estes raros desafios originarão,ou
derança, estabelecendo, portanto, diferentes conceitos não, satisfação no trabalho tanto para o "chefe" como
e abordagens. para os chefiados.
Bergamini (1982, p.97) define líder como "o indi- Quando alguém é promovido de membro de um
víduo no grupo, a quem é dada a tarefa de dirigir e grupo de trabalho para supervisor, isto poderá signifi-

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car uma quebra súbita no relacionamento, porque aque- gem lentas e demoradas sondagens da nova situação.
le elemento do grupo passa, agora, a ser visto como o São inúmeros e significativos os trabalhos escri-
"chefe". Neste momento, a postura a ser assumida pelo tos sobre o assunto liderança; no entanto, para alguém
líder é muito importante. Como diz Tannenbaum e recentemente promovido a chefe, existem alguns co-
Schmidt (1986, p.27) "saber quando o administrador nhecimentos básicos que foram estabelecidos por
deve ser democrático, autocrático, ou ficar no meio- · Barnard (1938) os quais consideramos indispensáveis
termo, é a característica de um líder bem-sucedido". ao embasamento de toda e qualquer atividade de lide-
Para Bernhard e Walsh (1981 , p.12-13) alguém rança. Estabeleceu ele quatro condições básicas que
pode tornar-se líder de duas formas: a primeira é ser devem ser satisfeitas para que a relação de liderança
informalmente escolhido ou formalmente eleito para tal se estabeleça entre o líder e seus seguidores; primeiro,
posição pelos membros do grupo. Assim os membros valorizou o veículo de comunicação a ser utilizado; su-
ou seguidores reconhecem e aceitam a influência do gestões, conselhos ou ordens, dependendo do caso,
líder. É o chamado, "líder emergente". necessitam ser passíveis de entendimento. A experi-
A segunda forma é ser eleito ou indicado para esta ência mostra que muitas vezes as ordens não são cum-
posição por uma pessoa ou grupo externo ao grupo a pridas por não serem bem entendidas. Segundo, a pes-
ser liderado. Ex: quando um novo enfermeiro chefe de soa precisa ser capaz, e possuir os recursos necessá-
unidade é indicado pela administração do hospital, o rios à execução daquilo que lhe está sendo solicitado.
pessoal da unidade, e o grupo que será liderado não Os líderes devem certificar-se de que o pessoal está
tem voz no processo de seleção. É a chamada lideran- equipado com a habilidade, conhecimento, tempo, ener-
ça imposta ou organizacional. gia e ferramentas indispensáveis ao trabalho que exe-
A vantagem da liderança emergente sobre a im- cutam.
posta é que se o grupo tiver oportunidade de indicar ou Terceiro, a pessoa deve concordar com o que lhe
participar do processo de seleção de seu superior será está sendo solicitado, precisa acreditar que a ação é
realmente seu seguidor e o verá como alguém em quem de alguma forma coerente com seus valores e interes-
confia e valoriza. ses pessoais. Quarto, as pessoas precisam ter certeza
Se o novo chefe é trazido de outro setor, pode ser de que o seu superior é coerente com os propósitos e
mais difícil de ser aceito pelo grupo e não receber o valores da organização.
devido apoio porque o grupo não o conhece e não con- Os líderes efetivos, segundo Barnard (1983), im-
fia nele. Podem também haver reações negativas por plícita ou explicitamente procuram preencher estes
parte do pessoal que gostaria de ter sido selecionado. quatro requisitos, e isto está de acordo com nossa
Isto poderá significar uma barreira séria para o idéia central de que liderança é menos um atributo indi-
chefe recém-chegado que necessita estar próximo do vidual do que uma mudança social, uma transação en-
grupo de trabalho para entender os detalhes de seu tre líder e liderados.
funcionamento, avaliar suas dificuldades, identificar
melhorias que poderão ser feitas e assim ganhar o re- 2.3 Estilos de liderança x Aspectos Contigenciais
conhecimento e a confiança de seus subordinados.
Hyett (1984) ao abordar este tema relata o caso Não é objetivo deste trabalho esgotar a bibliogra-
ocorrido em uma grande companhia de transportes, fia existente sobre liderança, mas destacar pontos sig-
quando um dos membros do grupo de trabalhadores nificativos para sua aplicação na área de enfermagem
foi apontado para o cargo de gerente. Este chamou e, embora inúmeros estilos de liderança tenham sido
todos os seus colegas motoristas dentro do refeitório encontrados , vamos nos ater a um aspecto comum
da companhia e desenhou uma linha de giz a qual divi- apontado em quase todas: a necessidade de conduzir
dia o solo ao meio. Postou-se em um dos lados deixan- as pessoas e fazer com que o grupo produza frente
do os curiosos motoristas do outro. Feito isso, ele deli- aos objetivos que devem ser atingidos.
neou planos para gerenciar o grupo de maneira eficien- Vários autores concordam que é bastante impro-
te e coerente. Convidou todos aqueles que queriam tra- vável que exista um único quadro básico de conheci-
balhar com ele para cruzar a linha e postar-se a seu mento e características peculiares à personalidade do
lado. Após poucos e tensos minutos os motoristas jun- líder. Acreditam que determinadas características são
taram-se a ele, para seu alívio, porque ele não havia extremamente importantes, mas acreditam, acima de
planejado o que fazer se eles não tivessem feito isso. tudo, que estas modificam-se e diferenciam-se confor-
Para Hyett ( 1984), questões sobre direção e controle me a circunstância.
tal como: Qual é o melhor caminho pala começar como Hyett (1984) , afirma, entretanto, que um gerente
um administrador? Sua resposta seria ambígua, pois precisa decidir-se por um método de abordagem. Para
isto depende, obviamente das situações apresentadas; ele, basicamente, existe uma escolha entre três abor-
algumas demandam dramáticas estréias e outras exi- dagens. Uma é para ser um estilo "executivo", o qual

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permanece no posto atendendo a administração, exer- ticipação e influência nos processos organizacionais,
cendo controle através do planejamento e delegação, nem a crescente preocupação com a qualidade de vida
mas mantendo-se totalmente alheio à rotina diária. no trabalho e suas relações com produtividade, partici-
Uma segunda abordagem é um estilo denomina- pação e satisfação do trabalhador.
do por ele como "Chefe-professor", o qual está em _ con- Como resposta a essas pressões sociais, novos
tato estreito com seu grupo, exercendo supervisão e conceitos de administração surgiram em organizações.
proporcionando treinamento e educação continuada, A teoria de sistema aberto, com sua ênfase em
através do conhecimento que possui das funções ad- interdependência de sistemas e na interação da orga-
ministrativas. O terceiro estilo é o "trabalhador-diretor", nização com o ambiente (interno e externo), exerceu
o qual não é apenas envolvido com o pessoal mas, na influência e impacto sobre os administradores, desen-
verdade, executa o mesmo trabalho que eles. volvendo a preocupação com o desenvolvimento de
O verdadeiro estilo adotado por um indivíduo não pessoal.
é uma questão de preferência pessoal; um balanço entre As prerrogativas acima, foram emitidas com a fi-
os três extremos é necessário e, se houver uma ênfa- nalidade básica de concluir esta revisão sobre lideran-
se particular em um dos três estilos, esta deverá ser ça, na qual não foram abordados, discriminadamente,
determinada pela chefia, a partir de uma visão crítica os diferentes estilos de liderança encontrados na litera-
da situação. tura, considerando que atualmente existe uma orienta-
Dez anos exercendo atividade de supervisão e ção bem mais ampla e abrangente nesse sentido, a qual
controle como chefe de unidade em um hospital esco- valoriza, ao estabelecer uma estratégia de liderança,
la, oportunizaram-nos uma privilegiada posição para as características de personalidade do líder, as princi-
tentar abordar este assunto, bem como para tentar dis- pais orientações comportamentais do grupo que está
cutir estes estilos de abordagem apresentados por sendo chefiado, e os requisitos das tarefas e da tecno-
Hyett. Nossa experiência mostrou que existe uma ten- logia com as quais se está trabalhando.
dência para a segunda linha de liderança, na qual o
chefe é também envolvido com os problemas de rotina 2.4 Liderança em Enfermagem
de seu departamento e atende atividades de gerência,
tais como: freqüentar reuniões, escrever relatórios, res- Liderança em enfermagem segundo Bernhard e
ponder memorandos, proceder requisições e/ou sele- Walsh (1981) é um processo multidimensional que de-
ção do material, mas é, antes de mais nada, preocupa- pende do relacionamento entre enfermeiro-líder e um
do com a qualidade da assistência prestada aos seus grupo, do ambiente ou da organização na qual a
pacientes e como o relacionamento e satisfação de seu internação ocorre e da Teoria da liderança escolhida
pessoal. pelo enfermeiro-líder.
Existe total concordância dos autores com a afir- Em nossa vida profissional temos observado que
mativa de Tannenbaum e Schmidt (1986) de que um a liderança é necessária em todas as áreas da enfer-
líder bem sucedido é aquele que tem viva noção das magem. O chefe de serviço, o supervisor, o chefe de
forças mais relevantes para seu comportamento em unidade, o enfermeiro de unidade, todos precisam ser
qualquer momento. Compreende perfeitamente a si líderes, cada um em seu próprio campo de prática.
próprio, os indivíduos e o grupo com que está lidando e Segundo Kron (1971 ), o profissional enfermeiro,
a companhia e o ambiente social mais amplo em que no hospital, hoje, está distanciando-se da cabeceira do
atua. O líder bem sucedido é aquele capaz de compor- paciente, porque precisa assumir mais e mais tarefas
tar-se apropriadamente à luz dessas percepções. Se administrativas. O que não significa que ele deva tor-
direção é o conveniente, ele é capaz de dirigir; se con- nar-se menos preocupado com o cuidado dos pacien-
siderável liberdade participativa é necessária, ele é tes, mas que, em adição, para ser capaz de dar um
capaz de proporcionar tal liberdade. bom cuidado de enfermagem, ele precisa ser capaz de
Assim, não poderá ser caracterizado como líder dirigir outros que também estão prestando assistência.
diretivo nem como líder permissivo. É uma pessoa, que Trabalhar com e através de pessoas é uma necessida-
mantém alta média de acerto na avaliação precisa das de para o enfermeiro, que obrigatoriamente precisa ser
forças que determinam qual deve ser o comportamen- um líder.
to mais apropriado em determinado momento, e efeti- Para Blake et ai. (1981 ), o chefe de enfermagem,
vamente adaptar-se à contingência. como um administrador, tem duas grandes preocupa-
Vê-se, então, o caráter contigencial da liderança ções: A primeira é a preocupação com a produção ou
que não pode mais existir isolada ou desconhecendo resultados, provendo todas aquelas atividades
os recentes desenvolvimento sociais, tal como o movi- assenciais para cuidado de pacientes. Isto envolve a
mento de direitos civis, que exige que seja dada a to- verificação de que procedimentos estão sendo cumpri-
dos os grupos minoritários maior oportunidade de par- dos, ou seja, que o pessoal esteja medindo a pressão

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arterial e temperatura axilar, administrando medicamen- Tornando-se um enfermeiro chefe de unidade, a


tos conforme prescrição, enfim, verificando que, seja mudança vai desde a relacão direta enfermeiro-
qual for a ação que esteja sendo executada, esteja paciente,para a habilidade que necessita nesta nova
sendo corretamente executada. Isto também significa função, ou seja, fazer disto um todo, provendo, ao
supervisionar o banho dos pacientes, a troca do leito, mesmo tempo, pacientes e subordinados de suporte e
os cuidados com a manutenção dos quartos e de toda condições ideais.
a unidade. Significa transmitir para o paciente e famflia A técnica chave para toda chefia parece ser o uso
informações para depois da alta. Significa a responsa- da efetiva delegação - arte de atribuir tarefas e respon-
bilidade de tomar atitude no sentido de corrigir as fa- sabilidades para outros. Para isto é preciso distinguir-
lhas e resolver os problemas encontrados. se entre permitir ao pessoal suficiente autonomia para
A segunda preocupação é com os recursos hu- completar as tarefas delegadas ou simplesmente a pas-
manos do hospital, ou seja, com as pessoas. Esta pre- sagem de pequenas tarefas rotineiras sem total e apro-
ocupação é evidente e sentida pelas pessoas, na me- priado significado de controle (delegação, não abdica-
dida em que elas recebem informações a respeito de ção).
seu desempenho e têm oportunidade de treinamento e É importante considerar que delegação ajuda a
desenvolvimento. desenvolver habilidade. Aceitar mais responsabilidade
Desde que o chefe de unidade esteja em desem- é certamente obter maior satisfação no trabalho.
penho de sua atividade administrativa, isto também Hyett (1984) identifica ainda o que chamou de sin-
envolve orientações de novos funcionários, escalas, trei- tomas de delegação ineficiente: super-envolvimento e/
namento e avaliação. Todas essas tarefas vêm juntas ou controle estrito que podem causar ressentimento
na forma de preocupação pelos serviços hospitalares, por parte do grupo e falta de compromisso como resul-
serviços estes que dão suporte ao paciente enquanto tado. Isto por sua vez gera outro problema administra-
internado no hospitaL tivo, ou seja, a preocupação em não delegar trabalho
Em todas as profissões e carreiras, o mais difícil que exceda a jornada de trabalho. O tempo precisa ser
degrau é primeira promoção. Em um dia você pode ser racionalmente distribuído entre as diferentes priorida-
promovido de engenheiro projetista para projetista che- des, e sem dúvida, esta é uma parte essencial do tra-
fe, de vendedor para gerente de vendas ou de profes- balho administrativo do enfermeiro chefe de unidade.
sor para diretor de escola. Achamos aqui necessário salientar que cada se-
De igual, a promoção de enfermeiro de unidade ção de uma organização é parte de um todo e uma
para enfermeiro chefe de unidade, é uma transição seção deve garantir que exista adequada colaboração
dentro da profissão, uma quase nova profissão-enfer- com outras seções e um apropriado relaciomento en-
meiro administrador. Não aquele "mal-falado" adminis- tre seus membros.
trador da burocracia hospitalar e sim aquele que co- Trazemos novamente as ponderações de Hyett
nhece o verdadeiro sentido da administração e seus (1984); afirma este que existem inúmeros cursos de
princfpios. treinamento, bem como livros textos os quais orientam
Quais serão então os problemas mais comuns a como dirigir subordinados, mas que, por outro lado, é
serem enfrentados por um enfermeiro que assume o pequena a preocupação manifestada no manejo do
cargo de enfermeiro chefe de unidade? Quando assu- relaciomento de chefes e subordinados entre si. Refe-
me um posto que exige controle e direção, o novo che- re ainda outro importante elemento de um papel diretivo,
fe, no nosso caso o enfermeiro-chefe, defrontar-se-á qual seja, estar envolvido e preocupado com as am-
com algumas dificuldades tais como dificuldades inici- plas questões organizacionais que possam interessar
ais e de curta duração e dificuldades contínuas que seu próprio setor e também oportunizar progressão fun-
envolvem preparo administrativo efetivamente. cional. Critica, porém, alguns chefes que passam dos
Todos estes enfermeiros com tarefa de controle e limites e tornam-se demasiadamente envolvidos na
direção, estão frente à responsabilidade básica de ga- política da companhia negligenciando as tarefas ine-
rantir que seu setor funcione adequadamente e contri- rentes à eficiência de seu departamento, ou que
bua para os objetivos gerais da organização. Todos os então,inescrupulosamente, usam seu pessoal como
novos chefes têm que enfrentar novas prioridades, além garantia em seu esforço para chegar ao topo.
da prioridade máxima que teve até o momento que foi Um enfermeiro chefe de unidade é provalvelmente
prestar assistência aos pacientes. Agora, ao invés de destacado para ser o foco de cinco diferentes recursos
apenas usar seus conhecimentos técnicos e sua habi- de pressão: o pessoal de enfermagem, hierarquia de
lidade para executar seu trabalho, ele tem uma nova enfermagem, a equipe médica, os familiares, os admi-
prioridade: garantir que os demais elementos que com- nistradores hospitalares e principalmente os pacientes.
põem a equipe de enfermagem também o executem
adequadamente.

Rev. Gaúcha de Enferm., Porto Alegre, v.14, n.1, p.53-58, jan. 1993 57
Aspectos da liderança... Chaves, E. H. 8.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS professionalization of nursing. New York: Me Graw-Hill,


1981.184p.
4 8LAKE, R.R. et ai. Grid approaches for managerical
É muito comum que, ao término de uma leitura
leadership in nursing. 2.ed. London: Mosby, 1981 . Cap.5-
ou mesmo de um curso sobre liderança, aquele que 1O, p.49-94.
ocupa um cargo de gerência sinta-se habilitado a_apli- 5 8LOORE, Joan . Who should be the general manager?
car uma ou outra técnica de liderança, julgando com Nursing time, London, v.80, n.27, p.64-65, july 11-17,
isso ter encontrado a solução de todos os problemas. 1984.
Isto no entanto não é verdade; a liderança eficaz não 6 DRAKE, R.l., SMITH, P.J. Ciência e comportamento na
se desenvolve através de uma fórmula ou receita, é indústria. São Paulo: Me Graw-Hill, 1976. cap.8,
p.I03-106: liderança.
uma tarefa dasafiadora e difícil que exige uma visão
7 HAMPTON, D.R. Administração Contemporânea. 2.ed. São
global que acentua o clima total e reconhece as dife- Paulo: Me Graw-Hill, 1983. Cap.ll, p.319-346: Lideran-
renças individuais, exigindo um esforço contínuo; as ça.
várias técnicas de liderança são meios para conseguir- 8 HAND, Lee. Nursing SupeNision. Virgínia: Reston, 1981.
se um fim e não um fim em si mesmas. Cap. 3/4, p.36-86: Personal qualifications of the nurse
Finalmente, julgamos oportuno emitir nossas re- leader.
comendações pessoais, principalmente às estudantes 9 HERSEY, P., 8LANCHARD, K.H., LA MONICA, E. A
situational approach to supervision: leadership theory and
de enfermagem que serão certamente as líderes de
the supervising nurse. SupeNision Nurse, London, v.7,
amanhã. Tais recomendações, como já foi dito anteri- n.5, p.17-22, 1976.
ormente, originam-se de nossa prática como enfermei- 1OHYETT, 8. A. Establishing yourself as a manager. Nursing
ros chefe de unidade e de uma incessante busca de Time, London, v.80, n.27, p.48-50, july 11-17, 1984.
informação na literatura disponível. Sendo assim, con- 11 HOWELLS, G. W. Aspectos humanos da gerência.
sideramos de extrema importância a todo aquele em Petrópolis: Vozes, 1972. Cap.5, p.89-91: o supervisor
posição de liderança, possuir conhecimento de sua pro- como líder.
12 KOONTZ, H ., O'DONNEL, C. Princípios de administra-
fissão e ser capaz de ensiná-la, conhecer-se a si pró-
ção. São Paulo: Livraria Editora Pioneira, 1964. v.2,
prio e buscar auto-desenvolvimento, conhecer seu gru- cap.20, p.469-490.
po de trabalho e garantir seu bem-estar. Além disso, 13 KOTTER, P. John. What leaders really do. Harvard
manter o grupo sempre informado de tudo aquilo que business review, p.l03-111, May/June 1990.
diz respeito ao seu trabalho, ou mesmo sobre coisa 14 KRON, T. The management of patient care, putting
que lhes possam interessar. Também acreditamos ser /eardership skills to work. 2.ed. Philadelphia: W.B.
importante reforçar o aspecto contigencial da lideran- Saunders, 1976.
15 _ _ .Team nursing - how valid is it today? Joumal of
ça, levando em conta fatores tais como: o meio ambi-
nursing Administration, London, v.1, p.19-22, 1971.
ente organizacional, a personalidade dos membros da 16 MARRINER, Ann. Guide to nursing management. London:
organização, a similaridade dos grupos, e os objetivos Mosby, 1980. 2250p.
da organização. A primeira tarefa e desafio em chefiar 17 MAXIMIANO, A.C.A. Introdução à administração. 2.ed.
uma unidade é ganhar forças trabalhando junto de uma São Paulo: Atlas, 1986. Cap.8, p.211-235: Liderança.
boa equipe de enfermagem, estabelecendo suas pró- 18 MEGGINSON, L., MOSLEY, D., PIETRI Jr. Administra-
prias prioridades para o trabalho e desenvolvendo uma ção e aplicações. São Paulo: Harper, 1986. Cap.13,
p.336-365: Liderança.
rede de relacionamentos. A chave disto é estar aberto
19 MERTON, R.K. The social nature of leadership. In:
e preparado para aprender a partir de experiências tam- STONE, S. et ai. Management for nurses - a multi-
bém. Assim, sendo receptivo e ativo em buscar conse- disciplinary approach. 3.ed. Toronto: Mosby, 1984. p.55-
lhos e informações de outros, incluindo chefias e su- 61.
bordinados, sendo perseverante e flexível, poderá cer- 20 SECAF, V. Liderança: desafio para as enfermeiras. En-
tamente este novo chefe embarcar em uma carreira fermagem em novas dimensões, v.3, n.4, p.250-255,
que o fará como afirma Joan Bloore (1984, p.63) "não 1977.
21 TANNENBAUM, R., SCHMIDT, H.W. Como escolher um
apenas chefiar e gerenciar bem, mas necessariamente
padrão de liderança. São Paulo: Nova Cultural, 1986.
administrar seu pessoal".
p.27-52. (Coleção Harward de Administração) .

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Endereço do Autor: Enaura Helena B. Chaves
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Author's address: Escola de Enfermagem da
Cambridge: Harvard Universty Press, 1983. p.8.
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ção de empresa. 3.ed. São Paulo: Atlas, 1982. cap.4, Campus da Saúde
p.94-1 02: O comportamento nas organizações: os gru- Rua São Manoel, 96390.620-110 Porto Alegre/
pos, a liderança e a motivação. RS
3 8ERNHARD, L. WALSH, M. Leadership - The key to lhe

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