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Universidade Federal de Minas Gerais

Escola de Veterinária

Departamento de Tecnologia e Inspeção de Produtos de Origem Animal


TEI 011 – Tecnologia de Carnes e Produtos Derivados

“Dry aged”

Daniel Amaral Bezerra


Isabela Gomes Ferreira
Janaina Ribeiro Duarte
Maria Luiza Castilho Baldi
Luana A. Boggione Silva
Raquel Fernandes Pereira

Junho, 2023
Belo Horizonte
1. Introdução

O Dry-Aging é um processo de maturação no qual a carne é armazenada em baixas


temperaturas e baixa umidade por algumas semanas, e o resultado atingido é maior maciez e
sabor único.

Após serem retiradas do animal as peças, geralmente cortes de alto valor agregado
(devido ao alto custo do processo de maturação Dry-aging), são colocadas sob refrigeração, em
uma câmara fria com umidade (70-80%), temperatura(0-4°C) e ventilação controladas.

No processo dry-aged, a carne é maturada por 28-55 dias, porém existem experimentos
nos quais a maturação ultrapassa os 160 dias. O efeito principal é a concentração do sabor e a
quebra das proteínas e gorduras, levando à maior maciez e sabor mais intenso.

O processo de dry-aging é mais caro em relação à outros processos, pois a carne perde
em média 6-15% do seu peso inicial (podendo chegar à 30%) devido à perda de umidade, cerca
de 3 a 24% do seu peso devido a necessidade de aparar a camada externa ao final do processo,
pelo alto risco de contaminação e altas exigências para as condições de maturação e espaços
adequados.

Além disso, é um processo demorado que precisa de cuidado especial, e a carne


utilizada necessita de camada de gordura distribuída por toda a peça e marmoreio adequado.
Sendo assim, apenas os cortes de alta qualidade e valor agregado são utilizados.

O processo de Dry-aging envolve restringir o crescimento bacteriano e estimular o


crescimento de culturas fúngicas benéficas, como as do gênero Thamnidium, na superfície da
carne. Este microrganismo é muito desejado durante o processo de dry aging, pois as enzimas
produzidas por ele conseguem penetrar na carne. Tais enzimas são colagenolíticas, atuando na
quebra de tecido conjuntivo e aumentando a maciez do produto.

O MAPA estabelece parâmetros microbiológicos para carnes cruas, maturadas ou não,


estabelecendo limites máximos para a presença de microrganismos como Salmonella spp. e
Escherichia coli.
2. Definição e classificação do produto

A maturação da carne é um processo tecnológico de grande importância e utilizado para


melhorar as características organolépticas e sensoriais como coloração, sabor e maciez. Há uma
inexistência de legislação específica no Brasil para o processo de maturação a seco, que origina
a carne Dry Aged.

De acordo com a Relação de Inovações Tecnológicas que receberam termo de não


objeção do DIPOA/SDA/MAPA, têm se como características técnicas básicas sobre a carne
Dry Aged que a maturação de cortes de carne bovina deve ser sem embalagem e sob
refrigeração em câmara fria, de forma que todas as superfícies das peças fiquem expostas à
circulação de ar. Os parâmetros básicos de controle do processo de maturação são: Tempo de
maturação entre 21 e 45 dias; Fluxo de ar entre 0,5 e 2,0 m/s; Umidade relativa do ar entre 75%
e 85%; Temperatura da carne entre 0° e 4°C; Temperatura da câmara entre 0° e 4°C. Em
relação aos condicionantes adicionais, o registro do produto no sistema eletrônico do DIPOA
deve passar por análise prévia da DREP/CGI/DIPOA. A aprovação do processo de
reforma/ampliação e memorial econômico e sanitário é junto à área competente do MAPA. O
produto resultante da aplicação da inovação do processo de fabricação deve obedecer aos
padrões de identidade e qualidade conforme legislação vigente. Além disso, deve ter validação
da tecnologia nas condições específicas de cada estabelecimento industrial. No protocolo de
validação, entre outras informações, deverão constar os limites adotados para os parâmetros de
controle do processo e as análises (sensoriais e instrumentais) que serão realizadas para
comprovar os efeitos do processo de maturação no produto. Em caso de exportação, compete
ao fabricante fornecer os subsídios para certificação oficial relacionada com as exigências de
mercados externos, quanto às possíveis restrições a produtos fabricados mediante uso desta
tecnologia.

O Departamento Estadual de Inspeção de Produtos de Origem Animal da Companhia


Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (CIDASC) relatou na Nota Técnica
nº 121.2022 de 05 de abril de 2022 esclarecimentos sobre a Carne Dry Age: O processo de
maturação a seco pode trazer inovações para a indústria da carne, porém, carece de estudos
aprofundados na área e de legislação própria com descrição de procedimentos tecnológicos
específicos que garantam a segurança e qualidade sensorial do produto, bem como, atenção aos
direitos básicos do consumidor.

Além disso, para o comércio, todo o produto de origem animal, incluindo Dry Age deve
ser realizado em empresas que possuem Serviço de Inspeção. A produção de Dry Age deve se
restringir a indústrias sob inspeção, havendo a necessidade de controle de todo o processo
produtivo, de modo que o produto final deve ser isento de contaminantes que possam causar
danos à saúde. Esse controle deve ser feito conforme disposto na Portaria SAR 9 de 27 de
março de 2019.

2.1. Composição

A carne maturada a seco do tipo Dry Age carece de legislação para composição dos
ingredientes obrigatórios e opcionais e rotulagem de tais produtos.

3. Curiosidades

3.1. Origem:

Dry Aged, conhecida como uma forma de maturação de carnes a seco, teve seus
primeiros relatos nos Estados Unidos no início do século XX, quando açougueiros no Texas
descobriram que as peças maturadas por mais tempo ficavam mais macias e suculentas.
Entretanto, foi somente na década de 1980, que a técnica foi reconhecida como Dry Aged e
disseminada amplamente, uma vez que, também facilitava o transporte, já que a carne
maturada a seca perde bastante volume.
O sucesso dos produtos maturados a seco chegou ao Brasil e, cada vez mais,
aumenta-se a disponibilidade dos alimentos Dry Aged no mercado. Em 2019, o Pão de
Açúcar fez uma parceria com a marca Friboi, para comercialização das carnes Dry Aged em
São Paulo.

Atualmente, a técnica não se limita somente à carne bovina, se estendendo, também,


para carnes suínas, cordeiro e até mesmo peixes.

3.2. Estatísticas de produção

Durante o processo da maturação a seco da carne, existe a perda de gordura e água do


produto, o que impacta diretamente no volume final da peça, tendo, assim, um encolhimento
da carne, além de que existem as perdas devido à limpeza da camada externa da peça que fica
exposta ao ar. Dessa forma, há um baixo rendimento do alimento, o que torna-o mais caro ao
final da produção. Levando em consideração, que há uma perda durante o processo, esse
dado pode participar das estatísticas de produção.

Outra curiosidade relativa a dados de produção da carne Dry Aged, é que ela possui
um tempo de maturação que varia conforme a preferência do consumidor e, no Brasil, é
frequente que essa etapa varie entre 30, 45 ou 60 dias.

Existe a maturação úmida e seca e ambas possuem notáveis diferenças. A carne Dry
Aged possui um sabor descrito pelos consumidores, relacionado a nozes, alimento
amanteigado com notas de sabor, enquanto a carne Wet Aged (maturação úmida) é descrita
com sabor mais ácido, devido a concentração de sangue, sem mais nenhum outro sabor. Em
relação ao rendimento, assim como descrito anteriormente, a Dry Aged possui grandes perdas
no processo de maturação e isso é o oposto para a Wet Aged. Por isso, o carne maturada a
seco será mais valorizada, enquanto a que passa por maturação úmida possui um processo
mais ágil e com menos perdas.

3.3. Hábitos de consumo

Cada vez mais, os consumidores dão preferências aos alimentos mais gourmetizados e
de qualidade, o que favorece a eleição à carne maturada a seco, pois, como já visto, ela é mais
saborosa com um sabor único e inigualável, além de existirem cortes diferentes oferecidos
aos consumidores.

Em 2019, quando houve a parceria entre o Supermercado Pão de Açúcar e Friboi, o


valor dos cortes variaram entre R$129 a R$169 por quilo, a depender do grau de maturação
da carne. O supermercado Super Nosso, em parceria com a Friboi, também começou a fazer a
comercialização de carnes Dry Aged em Belo Horizonte e a encomenda da carne pode ser
realizada para o atendente do açougue, por meio da solicitação do tempo de maturação
desejada do alimento e o posterior agendamento da data para retirada no local, quando será
realizada a limpeza externa da carne.

Em um artigo da Embrapa, foi realizada uma avaliação da preferência de carne bovina


fresca ou maturada a seco para os consumidores. Ambas as carnes eram do mesmo animal e
foram selecionadas dos mesmos cortes e tiveram os mesmos tratamentos, sendo diferenciadas
apenas na maturação. 82 consumidores participaram do teste e 71 deles preferiram a carne
Dry Aged, 7 preferiram a carne fresca e 4 pessoas não tiveram preferência por nenhuma das
amostras. Com isso, conclui-se, que a carne maturada a seco é uma boa alternativa para
atender aos gostos do consumidor.

3.4. Características sensoriais

O paladar reconhece 4 gostos básicos, que são: doce, salgado, amargo e azedo,
entretanto um quinto gosto também é citado, o umani. O umani é um quinto sentido/excitador
natural do paladar e provoca uma sensação de gosto que fica entre o doce e o salgado. O
método Dry Aged é complexo e intensificador da permanência do sabor e, por isso, muitos
consumidores afirmam que a Dry Aged diverge do gosto comparado às outras carnes, com
um sabor no meio do doce e salgado.

O umani pode ser justificado devido à perda de água durante o processo de maturação,
o que diminui o volume e concentra o sabor. Além disso, durante a refrigeração, as proteínas
cárneas são quebradas por enzimas, reduzindo acidez e intensificando o sabor. Esse processo,
em conjunto, caracteriza o produto com o gosto umani.

De acordo com as opiniões dos consumidores, a carne é adocicada, macia, com


gordura de sabor e textura amanteigados aos 30 dias de maturação. Com 90 dias de
maturação, os sabores aparentam ser mais fracos, com uma ligeira acidez da gordura e macia
como um todo. O processo mais comercializado, costuma ser o maturado a 30 dias, portanto,
o de maior aceitação para paladar consumidor.
4. Fluxo de produção

Durante o processo de maturação devem ser considerados alguns fatores como os dias
de maturação, a temperatura de armazenamento, a umidade, o fluxo de ar e a exposição a luz
ultravioleta. O tempo de maturação é variável sendo mais comumente utilizado períodos de 14
a 40 dias que parecem ser eficazes. A carne então será maturada em câmaras frias a 5० C por
duas semanas ou a -0,5० C por quatro semanas para atingir os mesmos níveis de maciez,
temperatura que vai ser importante para o funcionamento adequado dos sistemas enzimáticos.

Em relação a umidade, é recomendado que seja mantida a uma faixa de 61% a 85% para
que não haja o crescimento indesejado de bactérias deteriorantes que vão resultar em sabores
estranhos ao produto, e nem restrinja o crescimento bacteriano que resultaria uma maior perda
de peso e na carne secar rapidamente, afetando a sua suculência.

Também é importante que se mantenha um fluxo de ar no local do processo de


maturação, realizado por ventiladores que puxam o ar em diferentes direções, a uma velocidade
de 0,5 a 2,0 m/s para que haja a liberação da umidade necessária para atingir o processo de
secagem sem que a carne seque rapidamente o que resultaria em perdas no produto final.
Também é importante a utilização de luz ultravioleta para eliminar possíveis bactérias trazidas
pelo ar.

5. Produtos

O Dry aged corresponde a metodologia de maturação a seco, em que não são


utilizados ingredientes e aditivos para o processamento do produto, ou seja, o envelhecimento
a seco é feito submetendo as carcaças, cortes primários ou sub primários, sendo os mais
utilizados, o lombo e a costela, á condições controladas de umidade, temperatura e circulação
de ar por um tempo estabelecido.

Além disso, como não há legislação específica para Dry Aged no Brasil, este é um
produto não rotulado, portanto, observa-se que nos produtos comercializados por diferentes
marcas, em sua embalagem apenas contém informações básicas como, o corte cárneo, o
tempo de maturação e, em algumas, a raça de bovino.
Produto 1

Fonte: boutique.carapretaoficial.com.br

● Marca: Boutique Carapreta

● Raça bovina: Angus

● Corte cárneo: contrafilé

● Tempo de maturação: 40 dias

Produto 2
Fonte: sixdryaged.com.br

● Marca: Six Dry Aged

● Raça bovina: Angus

● Corte cárneo: Ribeye - filé de costela

● Tempo de maturação: 30 dias

● Empresa com registro para produção de Dry Aged

Produto 3 (bônus)
Fonte: Blog Supernosso

● A rede de supermercados Super Nosso, juntamente com a Friboi investiram na


metodologia de encomenda de carne Dry aged, sendo o tempo de maturação do
produto estabelecido pelo cliente, variando de 30 a 90 dias

5.1. Comparação

Uma vez que o produto em questão não possui aditivos ou ingredientes opcionais e
obrigatórios, ass diferenças principais entre as marcas que vendem a carne Dry aged são o
tempo de maturação estabelecido e o corte cárneo escolhido, mas a raça do animal também
pode interferir. Fatores esses que impactam na qualidade do produto final e nas características
sensoriais e microbiológicas.

O tempo de maturação da carne afeta diretamente a sua maciez e suculência devido a


possibilidade das enzimas naturais agirem sobre as fibras musculares e permitirem um maior
espaço entre elas. Mas também, quando mantidas por um longo tempo em maturação seca, as
carnes podem perder sua qualidade devido a proliferação de microorganismos e o processo de
rancidez da gordura, por isso os níveis de temperatura, umidade e fluxo de ar devem ser
controlados para evitar a ocorrência precoce desse fatores.

O corte cárneo escolhido impacta na qualidade sensorial do produto e no processo de


maturação, uma vez que dependendo do músculo ele pode ser mais ou menos macio e ter
maior ou menor marmoreio, que acontece devido a quantidade de gordura do corte.

Além disso, temos a interferência na qualidade do animal abatido, levando em


consideração principalmente a sua raça, mas também os fatores ambientais como dieta,
estresse, temperatura e outros que interferem na qualidade do produto final, ou seja, a carne
maturada.

Logo, conclui-se que o Dry aged ainda é um produto recente no Brasil, que tem
crescido aos poucos e que possui um nicho de mercado bastante exigente e preocupado.
Portanto, apesar de não existirem legislações e muitas informações sobre regras a serem
seguidas para produção, as empresas que atendem esse mercado consumidor estão bastante
empenhadas e buscam fazer um produto de ótima qualidade atendendo a demanda. Com isso,
por exigir um processamento bastante demorado e com controles específicos, além de serem
de cortes nobres, as carnes Dry aged são de valor bastante elevado.

Referências

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10.1186/s49781-016-0101-9
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sem autor: CARNES DRY AGED SUPERNOSSO, Blog Supernosso.com.br, 2023.
Disponível em: https://conteudo.blogsupernosso.com.br/carnes-dry-aged. Acesso em:
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sem autor: SIX DRY AGED. sixdryaged.com.br, 2023. Disponível em:
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https://jbs.com.br/imprensa/releases/friboi-e-pao-de-acucar-fecham-parceria-para-venda-de-ca
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SEGALLA, Amauri. O Dry Aged, sistema de maturação de carnes a seco, vira sensação. Veja,
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ANAIS DA XI JORNADA CIENTÍFICA - EMBRAPA SÃO CARLOS, 2019, São Carlos.
Avaliação da preferência de carne bovina fresca ou maturada a seco ("dry-aged") de animais
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