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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE


CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES CURSO DE
COMUNICAÇÃO SOCIAL
HABILITAÇÃO: RADIALISMO

CRIAÇÃO DE PERSONAGEM 3D
A eficácia do planejamento para uma produção audiovisual

Diego Gomes Brandão

João Pessoa, Paraíba


2009
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE


CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES CURSO DE
COMUNICAÇÃO SOCIAL
HABILITAÇÃO: RADIALISMO

Diego Gomes Brandão

CRIAÇÃO DE PERSONAGEM 3D
A eficácia do planejamento para uma produção audiovisual

Memorial analítico/descritivo apresentado


à banca examinadora do curso de
Comunicação Social da Universidade
Federal da Paraíba como requisito parcial
para a obtenção do título de bacharel em
Comunicação Social, habilitação em
Radialismo.

Orientador: Prof. Ms. Alberto Lucena Barbosa Júnior

João Pessoa
2009
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE


CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES CURSO DE
COMUNICAÇÃO SOCIAL
HABILITAÇÃO: RADIALISMO

Diego Gomes Brandão

CRIAÇÃO DE PERSONAGEM 3D

A eficácia do planejamento para uma produção audiovisual

BANCA EXAMINADORA NOTA

Prof. Ms. Alberto Lucena Barbosa Júnior


Orientador (Universidade Federal da Paraíba)

Prof. Dr. Phd. Pedro Nunes Filho


Membro (Universidade Federal da Paraíba)

Prof. Dr. Derval Gomes Golzio


Membro (Universidade Federal da Paraíba)

MÉDIA:

Aprovada em de de
5
AGRADECIMENTOS

Aos meus pais e irmão, por serem a base de toda uma vida.

À minha esposa Jamille, por ser motivação e conforto.

Ao professor Alberto Júnior pela grande contribuição teórica e prática acerca desta laboriosa
e bela arte que é a animação.

A Leo e Danilo, pelo apoio técnico e pelas conversas infindáveis sobre animação e
computação gráfica.

A Alexandre Prazim, grande amigo e artista, pelos longos diálogos sobre desenho e
pintura.

A Elton e Alexandre, amigos indiscutíveis no decorrer destes longos anos dentro e fora da
universidade.

Aos professores do Decom que contribuíram para a minha formação.


6

Todos os personagens de desenho


animado e jCJbulas tem que ser
exagerados, caricaturescos, Esta
e a principal essencia da fantasia
e dafabula,

- Walt Disney
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APRESENTAÇÃO

O presente trabalho busca descrever e analisar o processo de criação de um


personagem 3D integrante de um curta-metragem. Tem como objetivo geral, demonstrar as
etapas de trabalho fundamentais na produção de personagens, para se chegar a um produto
com elementos estéticos capazes de causar empatia no público, tornando-se apto a disputar
no mercado. Comprovando que as novas tecnologias da computação gráfica devem ser
entendidas como ferramentas de trabalho do artista com função de suprir as necessidades
técnicas.
É então criado o personagem Antônio Celeste da Anunciação. Através de pesquisa
de estereótipos, definição de arte conceitual, design e figurino, é construída a sua
identidade. Posteriormente é concluída a produção 3D, onde envolve desde a etapa de
modelagem até a renderização do modelo. Finaliza-se com os testes de animação.
A metodologia utilizada foi baseada nos processos de produção dos estúdios de
animação, tendo como material de pesquisa: vídeos de bastidores de animações, literatura
específica e websites, demonstrando diversas técnicas e tecnologias utilizadas para
obtenção de um produto de arte.
8
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO...................................................................................................... 7
INTRODUÇÃO............................................................................................................ 9
1 PESQUISA E ARTE CONCEITUAL..................................................................... 10
1.1. Referências......................................................................................................... 11
1.1.1. Jeca Tatu................................................................................................... 12
1.1.2. Chicó......................................................................................................... 12
1.1.3. Cabo Setenta............................................................................................. 14
1.2. Identidade do personagem............................................................................... 15
1.3. Arte Conceitual................................................................................................. 17
1.3.1. Design de caricatura.................................................................................. 18
1.3.2. Figurino..................................................................................................... 20
1.3.3. Model Sheets............................................................................................. 20
1.4. Dublagem........................................................................................................... 22
2 PRODUÇÃO 3D........................................................................................................ 23
2.1. Modelagem......................................................................................................... 23
2.1.1. Topologia................................................................................................... 24
2.1.2. Processo de Modelagem............................................................................. 26
2.2. Projeção de mapas de textura.......................................................................... 37
2.3. Textura............................................................................................................... 42
2.4. Rig....................................................................................................................... 44
2.5. Skin..................................................................................................................... 45
2.6. Blend Shapes...................................................................................................... 47
2.7. Dinâmicas........................................................................................................... 48
2.8. Render................................................................................................................ 49
3 ANIMAÇÃO.............................................................................................................. 50
3.1. Ciclo de Caminhada.......................................................................................... 30
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 51
REFERÊNCIAS........................................................................................................... 54
ANEXO A – Imagem Finalizada................................................................................ 57
9
INTRODUÇÃO

A arte depende da técnica. Ambas sempre estiveram ligadas uma à outra de tal
forma que, a obtenção de uma obra de arte através da técnica, dar-se-á necessariamente
buscando a estética. No entanto, na produção de arte, a ferramenta de trabalho de um
artista é apenas um subsídio tecnológico para atingir-se o objetivo principal: a expressão.
A evolução do homem proporcionou com que o instrumento de trabalho fosse
considerado como um prolongamento da mão, onde a atividade humana revestia
características diferentes conforme se usasse ou não das máquinas. Sendo assim, para se
executar um trabalho de arte, a técnica comporta uma parte de habilidade, de adaptação, de
pesquisa e de escolha dos meios mais propícios. (Francastell, 1973, p. 50-51).
Estamos vivenciando um mercado emergente no ramo das artes gráficas no Brasil,
mais especificamente nas novas tecnologias da computação gráfica. A abrangência de
funções que são envolvidas na produção de mídias audiovisuais como o cinema de
animação, publicidade e games, necessitam cada vez mais de profissionais artistas e
técnicos capacitados para cada função, favorecendo ao estímulo de uma nova produção de
conhecimento e consequentemente um novo mercado de trabalho.
Na produção de uma animação 3d, existe a etapa de criação de personagens, e esta
envolve uma equipe formada por artistas, os quais serão responsáveis pela criação da
pesquisa e arte conceitual. Posteriormente, inicia-se a fase de produção 3D, a qual deve
envolver técnicos e artistas: modelador, mapeador, texturizador, character TD (Character
Technical Director – Diretor Técnico de personagens), animador, iluminador, texturizador
e equipe de renderização – lembrando que o render envolve duas equipes distintas: uma
equipe de artistas que interferem constroem a composição final, definindo a iluminação
correta, uso de sombras, divisão de camadas, dentre outras tarefas; e a equipe técnica, que
manuseia o trabalho de processamento mecânico das imagens geradas pelo computador, ou
seja, uma espécie de “arte-finalização” programada.
Atualmente, a facilidade de acesso à informação através da internet e as soluções de
softwares 3D que oferecem aplicações cada vez mais interativas, tornaram estreitas a
relação homem/máquina, favorecendo ao surgimento de um novo profissional autônomo, o
3D generalista. Trata-se do desenvolvedor de personagens, paisagens e objetos 3D, onde
mescla todas as funções de uma equipe de produção 3d (da modelagem até a pós-
produção).
10
Temos nos dedicado a estudos variados das novas tecnologias apresentadas em
softwares de computação gráfica e a pesquisa em artes gráficas, vislumbrando a
diversidade de composições visuais em filmes de animação. Também, a análise dos
bastidores de produções européias e norte-americanas de animação.
Para a metodologia de trabalho na criação de personagens 3d atingir um padrão de
qualidade apto a disputar o mercado, é imprescindível um planejamento que envolva as
seguintes etapas: pesquisa e arte conceitual, produção 3d e animação.
Pesquisamos em livros, making of de curtas e longas-metragens e sites de estúdios
de animação. Colhemos informações de depoimentos de experiência de trabalho de
profissionais dos estúdios, com a meta de ilustrarmos uma metodologia padrão eficaz.
Decidimos então, registrar todas as etapas de criação através de um memorial, que segundo
França, possui uma estrutura semelhante à das dissertações e teses, porém a divisão do
texto fica a critério do autor. (p. 44, 2007).
O personagem que produzimos, faz parte do curta-metragem “A Saideira”, que
encontra-se em processo de produção. Como este curta não possui diálogo entre os
personagens, a etapa de Dublagem não foi desenvolvida.

1 PESQUISA E ARTE CONCEITUAL

Esta primeira etapa seria algo similar ao que os profissionais de agências de


publicidade e propaganda denominam como Brainstorming, que significa tempestade
cerebral, e trata-se de um método de criatividade que segundo Sousa, consiste na produção
de idéias em grupo, é o momento onde a equipe se reúne e o moderador apresenta o
problema, recorrendo, por vezes a imagens, que funcionam como estímulos visuais. Os
participantes exprimem suas idéias acerca do problema. (2006, p. 360).

[...] Buscam-se idéias que sejam “expelidas” pelos participantes no


momento exato em que vêm à mente [...] tem o objetivo de acumular o
maior número possível de idéias (Sant’Anna, 1996, p. 150).

Realizamos uma pesquisa de personagens já existentes na mídia e partindo dessa


pesquisa, procuramos capturar três elementos: estereótipo, design e figurino.
Através deste estudo construímos as características do personagem, produzindo os
modelos de referência (Model Sheets), que são desenho onde definimos poses, expressões
11

faciais, e comportamento do personagem.

1.1 Referências

Temos observado a figura do sertanejo nordestino em várias produções brasileiras:


filmes, séries, e telenovelas. Mais precisamente, Mirian Reis aponta que, vários filmes ao
longo dos anos, tem se proposto a dar visibilidade à figura do sertanejo. Podemos perceber
em Vidas Secas (1963), de Nelson Pereira dos Santos, O Cangaceiro (1953), de Lima
Barreto, e Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), de Glauber Rocha. (Reis, 2008, p. 3).
Recentemente, a representação folclórica do sertanejo tem funcionado como um
chamariz de público. Uma prova disto foi o sucesso de bilheteria do filme O Auto da
Compadecida (2000), de Guel Arraes, este apresentou uma diversidade de figuras
folclóricas do sertão nordestino: o palhaço, o aproveitador, o covarde contador de mentiras,
o padeiro avarento marido de uma mulher adúltera, o sacristão conservador, o cangaçeiro
que encontrou no crime uma forma de sobrevivência, dentre outros. Em seguida, vimos o
lançamento de Lisbela e o Prisioneiro (2003), também de Guel Arraes, que mostra o
folclórico aproveitador Leléu Antônio da Anunciação, e O Homem que desafiou o Diabo
(2007), de Moacyr Góes, que mostra o herói alegórico do sertão que é movido a cachaça.
Percebemos que há uma diversificação de estereótipos do sertanejo. Reis afirma que,
no Nordeste, destacam-se três principais figurações do homem sertanejo:

[...] o flagelado da seca, eterna vítima acomodada, tal qual Jeca Tatu, do
ambiente inóspito e do esquecimento das autoridades; o cangaceiro, que
usa a violência como instrumento de revolta contra a condição injusta em
que vive a sua região; e, por fim, a figura alegórica, do sertanejo
folclórico que preserva a tradição popular, seus mitos, costumes e
façanhas. (2008, p. 2).

Para Albuquerque, o nordestino vem se definindo como um homem de costumes


conservadores, rústicos, ásperos, masculinos; um macho capaz de resgatar aquele
patriarcalismo em crise [...]. (2003, p. 162).
Nosso personagem se enquadra no sertanejo folclórico. E para isso, buscamos os
elementos visuais caricaturescos, as características psicológicas e feições de vários
personagens do imaginário brasileiro: Jeca Tatu, Chicó e Cabo Setenta.
12
1.1.1 Jeca Tatu

A primeira referência pesquisada foi o personagem Jeca Tatu, criado por Monteiro
Lobato. Faz parte da sua obra Urupês, e foi incorporado pelo ator Amácio Mazzaropi.

FIGURA 1 – Ator Mazzaropi interpretando o personagem Jeca Tatu.

Segundo Silva (2007), o Jeca é baseado no trabalhador rural paulista, um caipira de


barba rala e calcanhares rachados, pobre, ignorante e averso aos hábitos de higiene
urbanos. Simboliza a situação do caboclo brasileiro, abandonado pelos poderes públicos.
Assistimos a alguns episódios da série Jeca Tatu, a fim de capturarmos sua
personalidade e realizamos esboços de expressões faciais e corporais. A protuberância de
seu bigode e sobrancelhas potencializam a visualização de sua expressão facial.
Capturamos a sua característica de ocioso, e adequamos a construção de nosso
personagem.

1.1.2 Chicó

A segunda referência foi o personagem Chicó, que integra o grupo de personagens


da obra O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna.
Trata-se de um homem covarde, que ilustra histórias de suas aventuras pelo sertão
afora, mas que não passam de mentiras. Companheiro constante de João Grilo e,
especialmente, seu diálogo. Chicó envolve-se nos expedientes de João Grilo e é seu
parceiro, mais por solidariedade do que por convicção íntima. Mas é um amigo leal.
13
“Simbolizam a esperteza, a pobreza e perspicácia do povo nordestino e da maioria da
população brasileira, em superar as dificuldades”. (Moreira, 2007, p. 5).

FIGURA 2 – Ator Selton Melo interpretando o personagem Chicó.

FIGURA 3 – Expressões faciais do ator.

Durante os bastidores da produção de O Auto da Compadecida, o ator Matheus


Nachtergaele - o qual fez o papel do personagem João grilo – faz seu depoimento
esclarecendo que
Aqui sobrevivem muitas características medievais ainda [...] Agente se
mistura no local e trás um monte de vivências, os personagens vão
ficando mais verossímeis, agente sai nas ruas e vai encontrando os
14
personagens, agente bate papo com os personagens, as pessoas vão
trazendo agente para a realidade do sertão. (O AUTO DA
COMPADECIDA, Guel Arraes, 2000).

Procuramos capturar algumas das características psicológicas do Chicó -


desatenção, hábito de mentir e covardia - para podermos construir a personalidade do
nosso personagem.

1.1.3 Cabo Setenta

A terceira e marcante referência foi a do personagem Cabo setenta, também da obra


O Auto da Compadecida. Este apresenta o estereótipo do soldado do interior, com traços
caricaturescos marcantes – magro, esguio, narigudo, bigodudo e com o pomo de adão
saliente – demonstrando ser valente, porém não passa de disfarce.

FIGURA 4 – Personagem Cabo 70., interpretado pelo ator Aramis Trindade.

FIGURA 5 – Expressões faciais do ator.


15
Capturamos o design da caricatura deste personagem, e definimos as características
físicas de nosso personagem – essencialmente as suas características físicas, psicológicas,
sua atuação e apelo (um dos princípios fundamentais da animação estabelecidos por Walt
Disney) – que foi, sem dúvidas, a referência mais próxima de nossos insights durante o
brainstorming. De acordo com Thomas e Johnston, um desenho complicado ou difícil de
ler não tem apelo. Enquanto que o ator vivo tem carisma, o desenho animado tem apelo.
(1981, p. 68).
É neste ponto onde queremos chegar. O ator consegue explorar muito bem a técnica
teatral a serviço da arte, nos fornecendo a expressão. Já o ofício do animador é tentar
conseguir se expressar através do seu personagem – digamos que é o seu alter-ego – onde
identificamos ali no papel, o traço inerente ao artista.
A sua expressão facial nos fornece uma fonte rica para a construção de um
personagem cômico. Percebemos que o ator consegue explorá-la muito bem em sua
atuação, o que o torna bastante caricaturesco.
Assistimos a vários trechos do filme “O Auto da Compadecida”, onde podemos
capturar poses em momentos interessantes de sua performance. Comparamos a sua
expressão corporal a alguns conceitos de poses em animação, onde Lango (2007) afirma
que quanto melhor formos em construir poses para permitir que as pessoas atendam e
acessem àquele personagem, seremos melhores em contar histórias, porque por fim, nossa
capacidade de contar histórias só é tão boa quanto nossa capacidade de expressar
personagens.

1.2 Identidade do personagem

Keane (2006) explica que o personagem é quem torna a história viva. Sendo assim,
é necessário conhecermos alguns elementos para caracterização de um personagem,
através de alguns questionamentos:

a) Roteiro
- O que acontece com o personagem?
- Qual é o conflito?
b) Personalidade
- Como é que o personagem sente sobre si mesmo?
16
- O que ele quer? Quais suas esperanças e desejos?
- Do que ele tem medo?
- Como é a sua aparência?
- Qual é a sua visão do mundo?
- Quais são os seus pontos fracos?

c) História
- Deve-se traçar uma história do seu personagem trazendo-o até o presente.
- Que eventos ou pessoas moldaram o que ele é?

d) Ambiente
- Qual é o seu mundo circundante? Hostil\Amistoso, Ingênuo\culto,
Revigorante\Opressivo, Mora na cidade\Mora no interior, Luxuoso\ Desolado, Oriental -
Ocidental, Rico\Pobre.

d) Música
- Que estilo de música reflete o coração e a atitude do seu personagem?

e) Design
- Deve-se descrever a aparência: intimidado, sensual, atarracado, etc.
- Atitude – Por quem seu personagem é motivado?
- Traje – nos dá conhecimento sobre o personagem?
- Formas - As formas dele estão simples, claras e comunicáveis?

Chegamos a uma identidade definitiva para nosso personagem: Antônio Celeste da


Anunciação, 33 anos de idade. Trata-se de um ex-cabo da polícia militar da cidade de
Ribeirinha (cidade fictícia). Antônio perdeu seu cargo por causar um caos na cidade,
afirmando que existiam extraterrestres engravidando as mulheres da simplória cidade de
Ribeirinha, causando uma crise de adultérios entre vários casais, prejudicando as famílias.
As autoridades demitiram-no e também o expulsaram da cidade. Antônio passou a viver
sozinho em montanhas distante do povoado, onde se acomodou a tomar conta de uma
cachaçaria.
17
Baseados na referência mais influente: o personagem Cabo Setenta; definimos as
particularidades do semblante do nosso personagem, concebendo a este as seguintes
características:
a) Estatura média;
b) Magro e esguio;
c) Raça mestiça;
d) Pele queimada pelo sol do sertão;
e) Usa bigode grande;
f) Chapéu de couro;

Stanchfield explica que, o artista deve se concentrar nos gestos individualistas de um


personagem, nas diferenças entre cada personalidade, e como um bom caricaturista,
capturar a essência destas diferenças. “O Mickey Mouse teve a sua própria personalidade
— os seus próprios movimentos e gestos, compatíveis com a sua estrutura de corpo e a
personalidade dada a ele”. (1990, p. 7)

Quanto à personalidade do nosso personagem, definimos a seguinte:


a) Se faz de corajoso, mas na verdade é medroso;
b) Ignorante;
c) Tem aversão aos hábitos de higiene urbanos, só anda descalço;
d) Ocioso, passa a vida tomando conta de uma cachaçaria tombada como patrimônio
histórico de uma cidade do interior;

1.3 Arte Conceitual

A arte conceitual compreende todo o planejamento e decisões que serão tomadas


antecipadamente pelo artista, sendo a execução um assunto secundário. A idéia torna-se a
máquina que origina a arte.
Neste planejamento, deve haver o foco na comunicação visual do personagem, que
para Munari, deve haver por meio de mensagens visuais. A mensagem quando
decomposta, é dividida em: informação e suporte. O suporte é o conjunto dos elementos
que tornam visível a mensagem, devendo ser consideradas para que haja máxima coerência
18
em relação à informação veiculada. Os elementos são: textura, forma, estrutura, módulo e
movimento. (1968, p. 92).
Tendo como exemplo uma árvore, vemos a textura na casca, a forma nas
folhas e no conjunto da árvore, a estrutura nas nervuras, nos canais, nas
ramificações, o módulo no elemento estrutural típico daquela árvore, a
dimensão temporal no ciclo evolutivo que vai desde a semente até a
planta, flor, fruto e de novo a semente. (MUNARI, 1968, p. 93).

Procuramos adequar a comunicação visual do nosso personagem a estes elementos,


e todas as concepções de forma, cor, textura e estrutura são apresentados nos próximos
tópicos.

1.3.1 Design de Caricatura

A caricatura é um desenho de personagem que procura enfatizar e exagerar as


características de uma pessoa de forma humorística, tomando como referência pessoas da
vida real.
A busca pela expressão caricaturesca convincente e atrativa de um personagem é
um trabalho árduo. Segundo Gombrich “[...] se há efeito mais difícil de analisar que a impressão da
textura é o da expressão fisionômica. [...] é árduo para o pintor distinguir se um rosto está chorando ou
rindo”. (1986, p. 292).
Tratando-se do design da caricatura na construção de personagens, este pode captar
aspectos da personalidade de uma pessoa através do jogo com as formas. E para adequar a
um design simples e chamativo, procuramos mesclar as idéias de formas das três
referências anteriores, tentando chegar a um híbrido que atendesse as seguintes
necessidades:
a) Causasse empatia no público;
b) Possuísse comicidade;
c) Não fugisse do estereótipo do sertanejo folclórico do nordeste;
d) Possuísse caráter e expressão;
e) Facilitasse as etapas de produção 3d.
Para atingir estas metas, investigamos a respeito das teorias de design de
personagens e dos experimentos da caricatura, e encontramos que:

Normalmente, cada uma das formas geométricas usadas na construção de um


personagem possuem alguma relação emocional de forma geral para nós. O
triângulo apontando para baixo pode representar uma figura atlética; já o círculo
19
representa uma figura obesa; dois triângulos opostos ligados representam uma
figura feminina; e o retângulo sugere uma figura sólida (MATTESI, 2008, p. 79).

Matessi (2008) lembra que, na abstração das formas, um triângulo muitas vezes pode
sugerir uma composição de personagens vilões, pois a sua forma pontiaguda sugere
agressividade. É o mais dinâmico de todas as formas básicas, devido à força contida nos
seus ângulos. O círculo é considerado uma forma mais simpática, sugere algo relacionado
à família, geralmente as formas arredondadas sugerem segurança.
Dondis (1997) explica que o design é uma coisa fluída - manipulação dos elementos
visuais – mas o método de pré-visualização ilustra o caráter da mensagem sintetizada, e
reforça afirmando que

A pré-visualização é um processo flexível. Idealmente, é a etapa do design em que


o artista-compositor manipula o elemento visual pertinente com técnicas
apropriadas ao conteúdo e à mensagem, ao longo de uma série de livres tentativas.
(DONDIS, 1997, p. 135).

Observando a silhueta do personagem Cabo setenta, capturamos a representação de


suas formas geométricas para a construção do design do nosso personagem, a fim de
reproduzir a caricatura inerente ao personagem do Ariano Suassuna e ao mesmo tempo
definir um estilo cartoon que possuísse a nossa identidade e também originalidade.
Planejamos as formas geométricas já pensando na modelagem 3d, desta maneira
procuramos acentuar o aspecto de esguio que o personagem deveria possuir, então
definimos: braços finos, com as mãos bem detalhadas, o que foi figurado por retângulos
longos; pernas longas, pés não muito detalhados, também buscando formas retangulares;
busto curto, com ombro pouco saliente, representando quadrados; cabeça possui formato
de balão, transfigurando uma forma de losango com curvas suavizadas, tal como o
personagem Cabo Setenta.
Desta forma, chegamos a um personagem que foi construído a partir das características
caricaturescas de cada um dos três personagens pesquisados: características psicológicas e
hábitos do Jeca Tatu; trejeitos do Chico; Feição e características físicas do Cabo Setenta.
Os esboços do personagem serão apresentados na etapa de Model Sheets (Folha de
Modelos), e na próxima etapa veremos a pesquisa do figurino.
20
1.3.2 Figurino

Para Costa, um figurino descuidado afeta a chamada “suspensão da descrença”,


interferindo na verossimilhança da narração; como toda roupa, ele está em contato com o
corpo, funcionando, ao mesmo tempo, como seu substituto e cobertura, e funciona assim
como elemento do visual da obra cinematográfica e tudo que é inferido dele (2002, p. 38).
Partindo desse argumento, compreendemos que é imprescindível uma atenção na
comunicação visual do figurino do personagem.
Para isso, pesquisamos no personagem “Zé Lezin”, do comediante Nairon Barreto,
o figurino comum das pessoas do interior do sertão. Encontramos no personagem Zé
Lezin, o figurino que mais se adequava a nossa proposta: blusa com estampa formada por
quadriculados, calça jeans e chapéu de couro.

FIGURA 6 – Comediante Nairon Barreto interpretando o personagem Zé Lezin.

1.3.3 Model Sheets (Folha de Modelo)

Trata-se de um documento utilizado para ajudar a padronizar a aparência, poses e


gestos de um personagem animado. As folhas de modelo são necessárias também quando
um grande número de artistas estão envolvidos na produção de um filme animado, para
ajudar a manter a continuidade e fornecer um padrão de referência, servindo como guia
para construção de personagens.
21
As folhas de modelo apresentam a unidade dos desenhos de um personagem a
serem seguidos. Normalmente se esboçam a cabeça e o corpo do personagem, apresentado-
os em vários ângulos, incluindo esboços das mãos e pés, e também várias expressões
faciais básicas.
Nosso personagem foi definido em uma proporção de quatro cabeças e meia, o que
é comum em personagens cartum.

FIGURA 7 – Esboços da cabeça do personagem.

Procuramos não fugir das características principais definidas no design, seguindo as


referências pesquisadas – a estatura do cabo setenta, seu bigode cobrindo boa parte da
boca, as característica físicas de esguio, magro e alto – mas sempre tentando construir uma
identidade nova.
O personagem é desenhado nas visões de frente, lateral e costas para servirem como
modelo na etapa de modelagem, sem que se fuja da idéia principal da arte conceitual.
22

FIGURA 8 – Esboços do corpo do personagem.

1.4 Dublagem

Geralmente, os grandes estúdios de animação norte-americanos e europeus,


contratam atores famosos para fazerem a dublagem das vozes dos personagens. Então, a
partir destas dublagens que além de serem gravados os áudios, também são filmados, para
que os animadores captem as feições, expressões faciais, personalidade e trejeitos dos
atores e adaptem ao personagem da arte conceitual as características do ator. Um exemplo
disto, é o personagem Buddy Pine, do longa Os Incríveis, da Pixar/Disney. Este
personagem tem a voz dublada pelo diretor Brad Bird, percebemos todas as feições do
diretor no personagem, e ao assistirmos o making of, compreendemos o processo de
dublagem de uma cena e depois a adaptação para o personagem 3D.
Fica a critério da produção, possuir recursos para contratar atores, filmá-los
dublando as vozes do personagem o qual terá sua feição e expressões faciais estudadas
pelos animadores posteriormente.
23
No nosso curta-metragem não há diálogos entre os personagens, nem narração,
portanto não foi necessário a execução desta etapa.

2 PRODUÇÃO 3D

Após concluirmos a etapa de pesquisa e arte conceitual, iniciamos a fase de


produção 3d. Nesta etapa, cada fase é ancorada na fase seguinte, sendo assim de extrema
importância o planejamento de cada uma. Por exemplo, um mapeamento só será bem
sucedido se a modelagem seguir uma topologia bem planejada, contendo edgeloops (voltas
das arestas, atendendo ao sistema muscular humano) corretos, e que favoreçam a uma
fluidez de polígonos na movimentação do personagem. O mesmo acontecerá com a
texturização, o mapeamento deverá está bem organizado e nítido para quem vai texturizá-
lo.
As fases de produção 3d são as seguintes: modelagem, mapeamento, texturização,
rigging, skin, blend shapes e dinâmicas.

2.1 Modelagem

O planejamento para uma modelagem eficaz e sem problemas futuros na malha 3d,
encontra-se na boa definição dos esboços de model sheets feitos na etapa de pesquisa e arte
conceitual, onde reforçamos: deve ser bem planejado.
Para compreendermos o processo da modelagem, achamos interessante saber como
se desenvolveram os métodos de modelagem:
Os principais métodos para modelagem 3D, ainda hoje empregados, foram
aperfeiçoados ou desenvolvidos na década de 1970. É o caso de representação
por primitivas, geometria sólida construtiva, modelagem de forma livre,
modelagem por procedimento, técnicas de extrusão, revolução, seção transversa
serial, entre outras (LUCENA, 2002, p.289).

Todos os softwares de modelagem dispõem de primitivas geométricas por padrão,


tais como, cubo, esfera, cone e cilindro, para iniciarmos a modelagem. Este tipo de
modelagem a partir de primitivas é denominado de Poligonal Modeling (modelagem por
malha de polígono).
Também é posto à disposição do usuário o polígono, onde a partir dele, pode-se
obter formas orgânicas de modelagem através de extrusões das suas arestas. Este tipo de
24
modelagem é chamado de Poly-by-poly.
Outro tipo de técnica é a modelagem denominada por NURBS (Non Uniform
Rational B-Splines), onde através de curvas vetoriais podemos definir um modelo, que será
posteriormente preenchido com malhas de polígonos nas regiões delimitadas.
Para o manuseio destas técnicas encontramos vários tipos de operações de malha,
como a soldagem, corte, recorte, fatiamento, intrusão, extrusão, operações booleanas,
dentre outros.
Faz-se necessário antes de entrarmos no estudo da topologia, apresentar algumas
regras básicas para uma modelagem direcionada para animação:
a) Malha All Quad (Malha com polígonos quadrados): Devem-se evitar polígonos
com mais de quatro vértices, porque durante a suavização será obtida uma malha
com deformações irregulares. Assim como também devemos evitar polígonos com
menos de quatro vértices. Logo, cada polígono deve está perfeitamente em forma
de um quadrado;
b) Fusão de vários vértices: É importante evitar o encontro de vários vértices num
único ponto, criando arestas em forma de estrela. Poderá acarretar deformações
irregulares;
c) Edges loops (Volta das arestas): Trata-se das voltas cíclicas das arestas dos
polígonos. Por exemplo, as expressões faciais do rosto dos seres humanos são
formadas devido à elasticidade dos músculos faciais, os esfíncteres. Estes músculos
estão dispostos em voltas circulares, o que provocam a elasticidade e compressão
da face. O que deve ser o mesmo na construção de modelos 3D, devemos modelar
sempre construindo voltas de arestas, pois sem as mesmas, as deformações serão
irregulares.

2.1.1 Topologia

A topologia é a etapa de planejamento da malha 3D a ser modelada. São


esquematizados nos desenhos de model sheets. Trata-se de todo o aramado de um modelo
3D, onde buscamos as soluções de edge loops (contorno de arestas) que concebam uma
malha pronta para receber influência de um esqueleto, e que posteriormente será animado.
A topologia depende exclusivamente do conceito de contorno de arestas, que
permite que, relativamente, pouca geometria deva transmitir grandes quantidades de
25
informação espacial em uma determinada malha de objeto. Este determina o fluxo de
geometria sobre uma superfície, e normalmente tem uma grande influência sobre a
movimentação destes contornos.
Os olhos e a boca são as os pontos focais mais evidentes na deformação de arestas
de contornos. Quando você abrir a boca para falar, sorrir, terá vários elos consecutivos que
contribuirá com a deformação da boca. Criar contornos de arestas nestes locais facilitarão
as deformações.
Edges loops são essencialmente concebidos para seguir o fluxo dos músculos do
seu rosto para que irá deformar a geometria da mesma forma que o rosto humano faz
naturalmente.
De acordo com Brito (2008), o processo de aprendizagem e domínio das inúmeras
ferramentas 3d para modelagem é até curto, se comparado com o perfeito entendimento da
topologia de um modelo 3d complexo, como a cabeça de um personagem. Na maioria dos
casos, os artistas 3d acabam usando a técnica da tentativa e erro, para conseguir chegar até
a forma desejada em um projeto.
Desta forma, planejamos toda topologia do personagem através dos model sheets
criados na etapa de pesquisa e arte conceitual. Percebemos que, realmente, o fluxo de
trabalho de modelagem melhorou consideravelmente, pois solucionamos todos os
problemas de malha 3D na esquematização da topologia.

FIGURA 9 – Estudo de Topologia facial.

É preciso identificar os contornos principais da face, delimitando estes contornos


para as aberturas do rosto, como boca, olhos, orelha e nariz. Estas áreas precisam de
26
arestas de contorno (edge loops), para que não haja deformações incorretas. Para
personagens que terão expressões faciais exageradas – estilo cartoon – é imprescindível a
estruturação de uma topologia com todos os contornos de arestas posicionados de forma
correta, para quando movimentar qualquer ponto facial, a deformação desta malha
tridimensional gere uma expressão com superfície suavizada.

FIGURA 10 – Estudo de Topologia do corpo e roupa.

2.1.2 Processo de Modelagem

Na plataforma 3D, há uma hierarquia quanto à seleção e manipulação de malhas 3d


que é padrão em todos os softwares. Existe o objeto, ou seja, o todo; e os sub-objetos,
vértices, arestas e faces que compõem o todo. Estes podem ser selecionados, agrupados,
associados e até mesclados. Para chegar a uma forma, o modelador realiza procedimentos
27
de operação na malha: corte, recorte, intrusão, extrusão, soldagem, operações booleanas,
edgeloops (seleções de voltas de arestas), edgerings (seleção de arestas paralelas) são os
mais comuns a serem utilizados, e suficientes para a obtenção de um modelo.
Para o detalhamento de modelos, os softwares disponibilizam ferramentas de
pintura de malha, onde se é possível puxar, distorcer, suavizar e deformar polígonos. Para
uma melhor interação entre homem-máquina, artistas usam mesas digitalizadoras (tablets)
para, simulando assim um ambiente de pintura digital.
Utilizamos o software Silo, da empresa Nevercenter. Trata-se de um software
específico em modelagem. O escolhemos porque encontramos uma ergonomia perfeita
para uma modelagem rápida e eficaz.
O visual do seu desktop nos disponibiliza botões com ícones intuitivos que
conduzem o artista a uma perfeita assimilação a ferramentas de trabalho comum em todos
os softwares de modelagem. Há um alto grau de interatividade nas inovações apresentadas
pelos recursos descritos abaixo:
- Multi Selection Mode (Modo de Multi Seleção): recurso que permite selecionar e mover
qualquer sub-objeto, sem que precise escolher o tipo de seleção, então podemos selecionar
vértices, arestas e faces simultaneamente;
- Universal Manipulator Tool (Ferramenta de Manipulação Universal): ativa todos os tipos
de manipulação de objeto e sub-objeto, simultaneamente, sem precisar escolher o tipo de
manipulação, seja mover, escalar ou rotacionar;
- Tweak (puxador): permite a manipulação interativa de todos os sub-objetos, ao mesmo
tempo, sem precisar selecioná-lo antes para depois movê-lo. É um ótimo recurso, pois
agilizou muito o detalhamento de pequenas áreas do personagem;
O artista agora não precisa selecionar vértices, faces e arestas para depois move-las,
basta passar o cursor sobre . Não precisa
Iniciamos modelando a calça do personagem, onde usamos como primitiva um
cilindro dividido em cinco secções. Criamos novos edgeloops para a deformação do joelho
e também para a definição da região inguinal e pélvica do personagem. Após concluirmos
o detalhamento, espelhamos a parte esquerda da calça e obtemos a forma por inteiro,
através do comando Mirror Geometry (Espelhamento).
28

FIGURA 11 – Modelagem de calça a partir de cilindros.

FIGURA 12 – Aplicação de simetria e inserção de detalhes.


29
Concluída a modelagem da calça, iniciamos a blusa. Criamos um cilindro com duas
secções para a base, e a partir daí iniciamos a dá forma e criamos novos edgeloops. Para
obter a manga da blusa, modelamos uma cilíndrica e fizemos uma extrusão, obtendo assim
uma manga arredondada. Criamos mais alguns edgeloops para a região das axílas, pois é
necessário uma boa quantidade de polígonos para que haja uma deformação regular
quando o personagem for mover os braços. Por fim, modelamos em seguida a gola, através
de extrusões.
Procuramos sempre iniciar a modelagem com poucos polígonos partindo sempre de
um planejamento de topologia, para apenas sugerir a forma da blusa. Posteriormente,
vamos detalhando, adicionando mais contornos de arestas nos locais onde o personagem
irá fazer movimentações que precisarão de uma certa quantidade de polígonos para
deformação.

FIGURA 13 – Modelagem da blusa a partir de cilindros.


30

FIGURA 14 – Aplicação de simetria e detalhamento.

Com a calça e blusa preparadas, iniciamos a modelagem dos membros do corpo do


personagem. Resolvemos modelar separadamente cada membro, sem precisar soldá-los
posteriormente, pois ficariam escondidos entre os tecidos.
Iniciamos com o braço, a partir de um cilindro com quatro secções, fomos dando
forma, fazendo extrusão e criando loops para definir os detalhes. Em seguida, duplicamos
os braços, para ter uma noção de composição, se as proporções estavam corretas de acordo
com os model sheets, logo fizemos alguns ajustes.
O braço tomou uma forma mais realista, podemos sugerir a musculatura do bíceps,
tríceps, e dá um aspecto de magro, tentando deixa-lo com a saliência dos ossos no tecido.
O mesmo ocorreu para as mãos, onde demos uma saliência nos ossos dos dedos,
procurando sempre passar o aspecto de magro. As unhas foram bem definidas. Criamos
algo em torno de 7 arestas de contorno para cada membro do dedo, para que, quando
precise animar os eu fechamento, haja uma deformação regular de polígonos nesta região.
O mesmo para o pulso, onde a mão deve fazer giros de 360º, adicionamos 5 arestas de
contorno nesta região.
31

FIGURA 15 – Modelagem a partir de cilindros, usando fotografia de braço como


referência.

FIGURA 16 – Modelagem das mãos.

Após ajustes de proporção, iniciamos a modelagem das mãos. Através de extrusões


do pulso, fizemos a forma do punho. Modelamos os dedos separadamente e depois
soldamos ao punho. Iniciamos um detalhamento da mão, queríamos passar uma idéia de
mão desgastada e magra, então definimos bem os ossos quase que saindo da pele.
32

Iniciamos a modelagem da cabeça, e seguindo o design do personagem, vimos que


a cabeça possui um formato de balão, então usamos uma esfera com sete secções e demos
esta forma básica de balão a ela. Em seguida, criamos os loops que dividem a simetria do
rosto, e criamos loops circulares para a região dos olhos. Foi aplicada a simetria, e obtemos
as duas regiões dos olhos. Criamos loops para a região da boca, de forma que esta se
deformasse sem problemas.

FIGURA 17 – Modelagem da cabeça a partir de uma esfera.

Existem várias formas de se iniciar a modelagem de uma cabeça, depende de cada


modelador, de qual técnica lhe favorece para um melhor fluxo de trabalho. Geralmente,
modeladores iniciam a partir de uma esfera, dão forma a base do rosto, e partir de então, ou
fazem extrusões para definir o nariz, boca, orelha e pálpebras, ou modelam por fora cada
parte e depois soldam.
A forma como alguns modeladores iniciam uma cabeça é diversa, alguns
costumam começar com caixas, e ir arredondando até chegar a uma forma adequada.
Alguns modelam polígono por polígono, colando a referência no software.
33

FIGURA 18 – Criação de edges loops e perfuração para os olhos.

Modelamos o nariz separadamente. Soldamos o nariz a cabeça e demos forma ao


queixo.

FIGURA 19 – Modelagem do nariz, separadamente.


34

FIGURA 20 – Soldagem do nariz na cabeça e detalhamento do rosto.

Para ter noção da composição, modelamos o bigode, posicionamos e moldamos


abaixo do nariz. Enchemos mais a região da bochecha e consertamos alguns loops que
estão com cinco lados.
Demos forma ao pescoço e modelamos o pomo de adão, assim podemos obter na
face do personagem feição cartoon e realista.

FIGURA 21 – Definição do rosto, modelagem do bigode e criação do busto.


35
Modelamos os olhos, através de uma simples esfera e posicionamos na região da
pálpebra para poder modelá-la.
Modelamos a Arcada dentária através de cilindros para a forma da gengiva e caixas
(box) para os dentes.

FIGURA 22 – Modelagem da acádia dentária e olhos.

Modelamos o chapéu, criamos uma esfera, partimos esta na metade e fizemos


extrusões de sua borda para criar a auréola.

FIGURA 23 – Modelagem do chapéu.


36
Iniciamos a modelagem do pé. Para a base, criamos um box com quatro secções, na
extremidade dividimos em cinco partes para depois fazer a extrusão dos dedos. Por fim
fomos detalhando cada parte do dedo através de loops.

FIGURA 24 – Modelagem dos pés a partir de cilindros, detalhamento com extrusões.

Voltamos para o corpo, onde modelamos o busto. Aproveitamos a forma da blusa e


moldamos para o busto. Soldamos os braços e pescoço.
Voltamos para o rosto, e melhoramos o fluxo de loops, acrescentando edgeloops na
região da boca, dos olhos e do nariz. Fechamos os loops que estavam abertos no topo da
cabeça e suavizando as formas. Iniciamos a modelagem da orelha, onde fizemos através de
extrusão.
Usamos a metodologia de modelagem das partes do corpo separadamente,
diferente da metodologia de extrusão e definção de todas as partes a partir de uma base.
Como o personagem usa roupas, podemos esconder os membros do corpo e por isso não
achamos necessário a soldagem de todas as partes do corpo.
Concluímos toda a composição do personagem 3d, em seguida partimos para a
etapa de mapeamento.
37

FIGURA 25 – Composição de todas as partes modeladas, finalizando o personagem.

2.2 Projeção de mapas de textura

Trata-se da projeção da malha 3D do personagem num plano 2D, ou seja, abrimos o


modelo 3d, de modo que seja preparado para receber a textura em algum software de
pintura digital.
Para obtermos alta resolução nas texturas, dividimos o personagem em três
conjuntos de mapas: Roupas e acessórios (Calça, blusa e chapéu); Pele (Todo o corpo do
personagem); Face (dentes, olhos e bigode).
Iniciamos o mapeamento importando o conjunto de roupas e acessórios para o
software UVLayout, da empresa Headus. Trata-se de um software específico em
mapeamento. Diferente do mapeamento padrão utilizado nos softwares generalistas, o
UVLayout não precisa de projeções de mapeamento (cilíndricas, planares, esféricas ou
38
automáticas) para abrir a malha 3d. Através de ferramentas de corte, solda, relaxamento,
suavização e outras, o usuário pode recortar e montar suas uvs da forma mais intuitiva.
Abrimos a malha da blusa nas áreas onde ela é costurada por padrão, ou seja,
recortamos dividindo em frente e verso. Em seguida, jogamos na área de edição de uvs,
onde podemos relaxar a malha e organizá-la.
Em seguida, trabalhamos na calça, da mesma forma, recortamos na área onde é
costurada por padrão, nas laterais, dividindo em frente e verso. Abrimos e relaxamos no
editor de uvs.
O chapéu só precisou de um corte na região da borda, pois possui subdivisões para
dentro do chapéu, o que é comum nestes chapeis usados por interioranos.

FIGURA 26 – Visualização 3D das peças de roupas mapeadas no programa UVLayout.


39

FIGURA 27 – Visualização UV das peças de roupas mapeadas.

As áreas avermelhadas indicam que os polígonos estão grandes para receberem a


pintura, e nas áreas azuladas indicam que os polígonos estão pequenos e consequentemente
a textura ficará pequena naquela área uv.
Após o mapeamento dos acessórios, iniciamos a pele, o que consideramos a etapa
mais complexa do mapeamento, pois exige um planejamento correto de cortes para que a
textura não jorre em outras áreas e também tivemos que controlar o tamanho das uvs para
cada região, para que a textura não ficasse grande em áreas pequenas e vice-versa.
Separamos o pescoço e os braços do busto. Uma grande vantagem do Uvlayout é a
ferramenta de simetria, pois ela permite com que trabalhemos apenas na metade do
personagem, aplicando tudo no outro lado. Então usamos esta ferramenta para mapear os
braço, recortamos o braço em duas partes, na parte superior e inferior, e então enviamos
para o editor de uvs. Da mesma forma, recortamos o busto em duas partes, frente e verso.
40

FIGURA 28 – Busto, braços e cabeça recortados para abertura da UV.

Para a cabeça, tratamos com certa minúcia. Iniciamos recortando regiões internas
da cabeça: entrada do nariz, da orelha, metade dos lábios até a garganta e a região interna
das pálpebras. Em seguida, recortamos da região da testa até o pescoço, sendo necessário
fazer um corte ao redor da orelha ligando até o corte central da cabeça. Desta forma,
obtemos uma abertura satisfatória da cabeça, onde podemos posteriormente soldar estas
partes recortadas na edição de uvs.
Percebemos que a região do nariz apresentou áreas avermelhadas, o que significa
que os polígonos ficaram muito grandes, o que acarretará o esticamento da textura naquela
área, mas como será apenas a cor da pele, sem detalhes de pintura, decidimos deixar desse
jeito, sem precisar alterar. Apenas suavizamos um pouco a UV para não ficar muito
vermelho nesta região.
41

FIGURA 29 – Cabeça recortada para abertura da UV.

Por fim, trabalhamos no dentes, olhos e bigodes. Os dentes, como não teriam
detalhes, fizemos um corte padrão para todos, dividindo em duas partes. O mesmo para o
bigode e olhos também.

FIGURA 30 – Finalização do mapa UV.


42
2.3 Textura

Esta etapa do trabalho é o momento onde exige a atenção específica de um artista,


pois se trata do momento da criação da pintura digital. No nosso caso, não tivemos tempo
de conceber as texturas através de pintura, coletamos todas as texturas necessárias em um
site profissional de texturas em alta resolução.
Utilizamos o software Photoshop, da empresa Adobe, para o tratamento das
texturas. Como o personagem possui calça jeans e blusão com botões, procuramos por
texturas de jeans e estampas com formas xadrez coloridas.
Para o material do jeans, além da textura, encontramos fotos de bolsos e costuras,
onde podemos montar uma calça.
Para o material da blusa, encontramos vários tipos de texturas xadrez, e
combinamos com o jeans para ver qual ficaria mais adequado para nossa proposta.
O processo de texturização é iniciado quando importamos os mapas para o
Photoshop, e então criamos outras camadas para sobrepor a do mapa. Em seguida,
importamos as texturas baixadas no site, e colamos no mapa para ver seu tamanho em
relação a cada polígono, caso esteja muito grande, criamos um novo arquivo, diminuímos a
textura e multiplicamos esta. Salvamos nas dimensões de 4096 x 4096, resolução de 300
dpi e coloração RGB. A partir daí, iniciamos a texturização do personagem.
Com as texturas prontas, exportamos os arquivos em formato PSD, formato nativo
do software photoshop.
Dentro do Maya, selecionamos as malhas do personagem e importamos o material
feito no photoshop, onde é aplicado e podemos visualizar em tempo real o personagem
texturizado.
43

FIGURA 31 – Texturização dos mapas criados.

FIGURA 32 – Aplicação das texturas no personagem.


44
2.4 Rig (Criação do esqueleto)

Na produção 3D, um personagem só pode ser movimentado por meio de um


esqueleto, o qual deve possuir controles em cada membro do corpo (braços, mãos e dedos,
perna e pés, busto, cabeça, olhos, mandíbula, língua) que façam a locomoção e deformação
da malha poligonal. Esta etapa é chamada de Rig (armação), e é uma das funções mais
cobiçadas no mundo da computação gráfica.
Um animador tradicional pode atender aos princípios elaborados por Walt Disney
através da expressividade de seu traço, pois detém total controle da manipulação de
qualquer forma desejada para naquele personagem. Por exemplo, se um artista quer
explorar o princípio de Achatamento e Alongamento (Squash and stretch) no seu modelo,
não há dificuldade de desenhá-lo no papel. Já no modelo 3D, é necessário que profissional
do rig consiga criar soluções de rig para viabilizar este princípio, seja através da criação de
atributos ou scripts para achatar e encolher o personagem.
Percebemos que as animações 3D procuram cada vez mais se aproximarem da
expressividade artística da animação tradicional. Para isso, a computação gráfica tem
desenvolvido aplicações cada vez mais sofisticadas para suprirem essa necessidade.
Consequentemente tem exigido cada vez mais profissionais especializados em dá vida e
personalidade a um personagem, – são os chamados Riggers e Character TD – através de
uma construção de rig.
Através do plugin Setup Machine, da empresa Anzovin, pudemos melhorar nosso
fluxo de trabalho nesta etapa de produção. Neste aplicativo, orientamos as áreas de
influência de cada membro do corpo, e em seguida ele automatiza a construção de toda
estrutura de Rigging, cinemáticas, controles e atributos para animação.
Então, em volta de cada membro do corpo, colocamos o guia que irá influenciá-lo.
Os guias verdes referem-se ao busto do personagem, devemos encaixá-lo perfeitamente
nesta região. As guias azuis correspondem ao braço, é composto com três manipuladores,
onde devemos ajustar a posição do antebraço e escalar a espessura do braço. As guias lilás
correspondem as pernas, também ajustamos de modo que não houvesse influência entre
um pé e outro, o que é comum acontecer. Por fim, a guia vermelha corresponde a cabeça,
tivemos que escalar a guia do pescoço de modo que atendesse a influência naquela região.
45

FIGURA 33 – Ajuste das áreas de influência do RIG, através do Setup Machine.

Feitos todos os ajustes, executamos a aplicação “Rig”, então o maya constrói toda
estrutura de rig atendendo a nossa pré-configuração através das guias do Setup Machine. É
necessário salvarmos uma cópia de segurança antes de aplicar o Rig, pois não há como
voltar atrás, não podemos desfazer uma aplicação de rig.

2.5 Skin (pele)

Após a construção do Rig, e todos os ajustes de posicionamento de cada membro


do corpo, iniciamos a etapa de Skin. Trata-se do acoplamento da malha 3D ao esqueleto do
Rig, onde a partir daí pintaremos as influências de cada região muscular, para quando o
personagem se mover, ocorrer deformações corretas.
46

FIGURA 34 – Criação automática do RIG, controles, cinemáticas e atributos.

É preciso destacar a eficiência deste plugin, o Setup Machine. Geralmente, os


profissionais chamados de Character TD (Character Technical Director – Diretor Técnico
de Personagens) são os responsável por criar o Rig, cinemáticas, controles, blend shapes,
atributos, setup e scripts de um personagem. Cada uma destas etapas são geralmente feitas
a partir do zero por estes profissionais. Ou seja, eles recebem todo o projeto de um
personagem, desde arte conceitual, model sheets, expressões faciais e modelo 3d
finalizado. A partir daí, criam todo o aparato técnico de manipulação deste personagem,
através de setup´s que serão facilitados para o animador que irá trabalhar nele
posteriormente.
Boa parte deste trabalho de rig(digamos que 40% dele) é automatizado por plugins
de criação de RIG, a exemplo do Setup Machine, que cria apenas o setup do corpo.
47
2.6 Blend Shapes

Faigin explica que, para os artistas que desejam informar-se sobre a questão da
expressão facial, sempre houve três opções de estudo: olhar em um espelho, olhar para
outras imagens e a observação direta. (1990, p.11).
Procuramos pesquisar imagens de referências em websites e no filme O Auto da
Compadecida, onde podemos capturar as expressões do personagem Cabo Setenta, para
construirmos as expressões faciais do nosso personagem.
Com as influências da malha pintadas e configuradas, iniciamos a criação dos
Blend Shapes (deformações de formas).
De acordo com Zhang, em Azevedo, trata-se da transformação de uma forma em
outra bastante diferente (2003, p. 219).
É a etapa das expressões faciais do personagem, onde multiplicamos a cabeça do
modelo e modelamos várias expressões, em seguida ligamos todas as expressões à cabeça
base, assim é criado um gráfico com controles para cada expressão, onde controlamos a
intensidade de cada expressão, e podemos animá-las em seguida para testar as
deformações.
Inicialmente precisamos duplicar o personagem, mantendo assim o que contém a
expressão facial padrão. Utilizamos a ferramenta de escultura do maya (Sculpt Tool),
através dela temos um grande controle na deformação de áreas com muitos polígonos.
Criamos as expressões básicas, independente do roteiro, pois o mesmo ainda
passará por revisão de um roteirista profissional e poderá sofrer alterações. Falamos do
roteiro porque é através dele que definiremos quais serão as expressões faciais necessárias
para o personagem, de acordo com as necessidades de cada plano e cena.
O controle facial pode ser feito através das chaves que são criadas pelo próprio
maya, através do painel de blend shapes. Através dele, pode animar as expressões faciais
do personagem. É possível combinar as deformações do rosto, atribuindo valores de 0 a
100% de cada expressão facial.
48

FIGURA 35 – Blend Shapes básicos (expressões faciais)


2.7 Dinâmicas

As dinâmicas se enquadram na categoria de animação representacional, que


segundo Wilhelms, em Azevedo, trata-se da animação de objetos suaves usada para animar
a deformação de objetos, por exemplo, pele acima de um corpo, músculos faciais, tecidos e
formas elásticas (2003, p. 219).
O software Maya oferece ferramentas bastante úteis para a criação de dinâmicas.
Utilizamos o modo NCloth (Tecidos), o qual corresponde a todas as dinâmicas aplicadas
em tecidos.
Procuramos utilizar dinâmicas para os tecidos do personagem, no caso, a camisa e
calça. Onde poderíamos simular a rigidez, elasticidade, peso e outros atributos físicos a
cada tipo de malha.
O procedimento para a blusa foi o seguinte: primeiro precisamos definir qual o
objeto que será tecido e quem será o passível a colisões, no caso, a blusa e o corpo do
personagem, respectivamente. Definimos o local onde há uma fixação da malha da blusa
no corpo do personagem, neste caso prendemos a gola da blusa. Fizemos o mesmo
procedimento para a calça, definimos a área de fixação da calça na cintura do personagem.
A próxima etapa foi a de suavizar bastante a malha da blusa, e um pouco do busto
para que o atrito da malha no corpo não tivesse deformações bruscas. Esta conduta
compromete bastante o desempenho da malha, pois como sabemos, quanto mais
subdivisões de polígonos houver, o software irá exigir mais hardware.
O maya nos oferece vários tipos de simulações de tecidos, desde malha de algodão,
cetim, seda, dentre outros. Configuramos o tipo de tecido, e também precisamos configurar
49

todos os tipos de reações físicas da malha, o que exige muito da máquina quando se faz
testes.
Esse tipo de aplicação exige muito da máquina para poder obter resultados
satisfatórios, o que não ocorreu com este trabalho. Nossa máquina de trabalho não
agüentou os cálculos de simulação dos tecidos quando animamos o personagem, houve
muitos problemas, como por exemplo:
- partes da blusa entrando no corpo do personagem;
- pontas da blusa se distorcendo;
- blusa atravessando o personagem e caindo;
- sistema operacional sendo travado e reiniciado;
Logo, não conseguimos realizar testes de simulação dos tecidos do nosso
personagem, quando animado, pois não teríamos tempo suficiente até a data de
encaminhamento deste trabalho para que a máquina calculasse todas as configurações para
correção destes problemas em tempo real.

2.8 Render

O render é a etapa onde finalizamos o modelo aramado 3D (wireframe) – até então,


temos visualizado o personagem em seu estado de modelo aramado - com toda sua
composição de textura, materiais e simulação de superfícies aplicados. O render gera a
imagem finalizada, com pré-configurações de resolução, quantidade de pixels por polegada
(dpi), canal de cor (CMYK, RGB) e dimensões, formatando-a para a mídia desejada
(cinema, vídeo, internet, e outros).
Se comparamos com a arte tradicional, o render se enquadraria na etapa de arte-
finalização, onde o artista dá o acabamento a sua arte. Lembrando que esta etapa necessita
tanto de artistas quanto técnicos, pois quem concebe as soluções de cor, contraste,
saturação, iluminação, dentre outros processos direcionados a qualidade estética da
imagem é o artista. Já o técnico, se responsabiliza pela configuração do arquivo finalizado,
todos procedimentos de geração de imagem através do software.
Nosso personagem foi renderizado no próprio software Maya, através do seu
renderizador Mental Ray (Raios inteligentes). Antes de configurarmos, planejamos a
iluminação, e decidimos não usar luzes direcionadas, nem spots, enfim, nenhum tipo de
50
iluminação. O próprio mental ray disponibiliza simulações de iluminação, fizemos a
seguinte configuração de render:

- Definimos a quantidade de raios que rebatem no personagem;


- Utilizamos uma imagem HDRI (High Dinamic Range Image) – são tipos de imagem que
guardam as informações de luminosidade dos pixels, destacando áreas que recebem maior
ou menor quantidade de luz – para simular uma ambientação de iluminação real.
Aplicando esta simulação, o maya envolve o personagem dentro de uma esfera, e nesta
esfera há a projeção da imagem HDRI, que por sua vez ilumina o cenário com a
luminosidade de seus pixels;
- Não utilizamos iluminação do software (spots, direcionais, omnis), apenas simulamos
iluminação do mental ray;

3 ANIMAÇÃO

3.1. Ciclo de Caminhada

Para constatar se o personagem está apto para animação, testamos animações


cíclicas de caminhada, onde observamos todas as deformações da malha e as dinâmicas de
tecido.
De acordo com Williams, a primeira coisa a fazer em uma animação de caminhada
é estabelecer as batidas, geralmente as pessoas andam em 12 quadros (frames) - tempo de
marcha (2002, p. 109).
Halas e Whitaker afirmam que:

Há muitas variações numa caminhada. Por exemplo, em um passeio agressivo o


corpo inclina-se para frente, o queixo se sobressai para fora, os punhos são
juntados firmemente. Em um passeio orgulhoso ou pomposo o corpo pode
inclinar-se ligeiramente para trás, com o peito fora e a abundância da ação do
ombro, com a posição mais alta quanto ao desenho 'de passo'. Em um passeio
cansado o corpo e inclinação dianteira, os braços podem suspender livremente e os
pés podem arrastar ao longo da terra, e assim por diante (HALAS, 2002, p. 65).
51
Quanto a velocidade de uma caminhada, Williams define oito tipos de caminhadas
de acordo com a quantidade de quadros usados numa animação: 4 quadros, seria uma
corrida muito rápida; 6 quadros, uma corrida ou caminhada muito rápida; 8 quadros,
corrida lenta ou caminhada estilo cartum; 12 quadros, pessoas indo ao trabalho nas ruas,
caminhada natural; 16 quadros, vagaroso; 20 quadros, pessoa idosa ou cansada; 24
quadros, passo lento; 32 quadros, “mostre-me o caminho para voltar para casa” (2002, p.
110).

FIGURA 36 – Quadros-chave da animação de caminhada.

Baseados nas características do sertanejo nordestino, decidimos fazer um teste de


animação de caminhada com 16 quadros, dentre estes, 5 são os quadros-chave, o que
caracteriza um personagem vagaroso.
Elaboramos a mecânica do personagem com o objetivo da definição de sua
personalidade pelo movimento.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho realizado, então, nos fornece procedimentos básicos para que possamos
entender a construção de um personagem por meio das tecnologias da arte tradicional –
papel, lápis, tinta – e das tecnologias da computação gráfica – computador, mesas
digitalizadoras -, ambas devem sempre andar juntas, procurando sempre o objetivo
primordial no produto artístico: a expressão.
Buscamos produzir um personagem expressivo enquanto caricatura, explorando
alguns conceitos básicos de design e alguns princípios da animação como o apelo e o
exagero. As formas que compuseram a sua silhueta, destacando o seu pescoço esticado,
bigode grande cobrindo boa parte da boca, a sua estatura mediana, mãos magras com veias
salientes, braços e pernas finas, enfatizam o aspecto caricaturesco, buscando torna-lo
52

convincente quanto a sua figura, se realmente ele se enquadraria no estereótipo do


nordestino folclórico.
O processo de modelagem exigiu um conhecimento em desenho da figura humana,
e a transposição do personagem desenhado no papel para o ambiente tridimensional nos
forçou a aprofundarmos nas ferramentas de modelagem 3D, buscando sempre soluções
ágeis e eficientes na reprodução mais fiel possível da arte conceitual.
Percebemos que esta metodologia de trabalho nos proporcionou uma organização
que só vem a melhorar o fluxo de trabalho na rotina de um estúdio de animação, agência de
publicidade ou produtora de vídeo.
Tal como funciona nos estúdios de animação, notamos que para um trabalho atingir
um nível apto ao mercado, primeiramente é necessário seguir corretamente todas as etapas
deste processo, e segundo, é importante haver uma equipe de profissionais especialistas em
cada função que é distribuída nas etapas de um projeto.
No mercado atual, a internet tem favorecido a diversas áreas, e o compartilhamento
de arquivos de grande porte tem ajudado a suprir algumas necessidades de aprendizado de
qualquer área. No entanto, os profissionais autônomos são muito solicitados por empresas.
Dentre estes, os chamados 3D Generalistas, são grandes detentores da produção de
animação no mercado publicitário e até o cinematográfico. Trata-se do profissional que
conhece na prática todas as etapas de produção 3D até a sua animação.
Mas é preciso ter cuidado e compreender que o mundo da computação gráfica é
bastante envolvente – chega a ser mágico nos primeiros contatos – e quem começa a se
interessar por produzir modelos a partir de tutoriais aprendidos em websites achando que
estará fazendo arte, estará enganado, e contagiado pelo vislumbre das tecnologias da nova
era.
Este problema tem causado a deficiência na qualidade neste mercado, que é o
surgimento de pseudo-artistas – usuários vislumbrados com o potencial dos softwares
gráficos que se dizem artistas por produzir imagens aprendidas em tutoriais de internet -
satisfeitos com o pouco que recebem por trabalhos limitados às idéias de quem está
pagando. Não sabem eles que estão acabando com a classe.
Então, se faz necessário o contato com obras de arte, sendo imprescindível a
imersão total na história da arte, no conhecimento das técnicas e tecnologias existentes,
para que possamos entender que é fundamental o conhecimento da arte tradicional – estudo
53

do desenho, da pintura e da escultura -, e para que tenhamos instrumentos críticos que


propiciem a formação de um julgamento estético independente.
Este trabalho passa a ser uma contribuição e impulso para aqueles que desejam
enveredar na área das artes visuais - especificamente na criação de personagens – e que
buscam material de pesquisa como ponto de partida para o fantástico universo da
animação. Creio que nunca devemos parar, e nos satisfazer com o conhecimento que
achamos ou julgamos ser o necessário para produzir um trabalho artístico.
É preciso ir além.
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REFERÊNCIAS

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história do gênero masculino (Nordeste 1920 1940). Maceió: Catavento. 2003.

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comunicacao-media.pdf>. Acesso em: 09 mar. 2009

Vídeos

O AUTO da compadecida. Direção: Guel Arraes. Produtor Associado: Daniel Filho.


Roteiro: Guel Arraes, Adriana Falcão e João Falcão. Intérpretes: Fernanda Montenegro;
Matheus Nachtergaele; Selton Mello e outros. Brasil: Globo Filmes, 2000. 1 DVD vídeo
(157min), NTSC, cor, legendado.
ANEXO A – Imagem Finalizada
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