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Título: Nightfall
Revisão: Maria Carlos Brito
Capa: Genevieve Stonewell
Diagramação: Ana França (Portfólio D'Ana)
No dia seguinte eu acordei quando o sol ainda nascia, olhei para o lado
e Dylan dormia tranquilamente, tão lindo e tão sereno que nem quis acordá-
lo.
Me inclinei e deixei um beijo em sua testa. Fui até o banheiro e fiz toda
a minha higiene matinal para depois vestir uma roupa confortável. Optei por
um vestido florido leve que havia trazido na mala.
Pelo o horário, ninguém havia acordado ainda, por isso não me
surpreendi ao não ver nenhum movimento na casa. Enquanto preparava um
café preto a noite de ontem me veio na cabeça e claro que sorri como uma
boba.
Nadamos no mar, nos beijamos, conversamos e até mesmo brincamos
de jogar água um no outro. Quando chegamos em casa, não encontramos
Matthew e Alisson, então fomos direto para o quarto tomamos banhos juntos
e acabamos transando de novo, para depois deitarmos na cama e dormir.
Até me surpreendia estar acordada tão cedo, já que fomos dormir tarde
ontem, mas talvez fosse o fato da minha agitação, de todas as emoções que
estava vivendo nas últimas semanas.
Fui mandada para Nightfall porque meus pais tinham medo do que eu
podia fazer contra mim mesmo.
Quase morri ao beber mais do que devia e mergulhar no lago. Naquela
noite percebi o que eu estava me tornando, como as coisas poderiam piorar se
continuasse lidando com o luto daquela forma.
Então veio Dylan, me ajudando a superar o luto, sendo uma pessoa que
eu não percebi que precisava até tê-lo em minha vida.
Não me apaixonei porque ele se tornou meu porto seguro, me apaixonei
por quem ele realmente é. Um homem gentil, romântico, sedutor, bonito e
preocupado com tudo o que me faz mal.
Peguei uma xicara e me servi de café, não estava com muita fome, por
isso sai de casa e caminhei até a praia e me sentei na areia.
Havia algumas pessoas afastada olhando o sol nascer também.
Observei as ondas e o sol aparecendo devagar para logo iluminar todo o dia.
Suspirei.
Bebi um gole do café e deixei que as lembranças me levassem para a
última vez que senti essa paz no peito.
“— Maninha, se você não acordar agora vai perder a cena mais linda
de todas, que é o sol nascendo — Archer me sacudiu novamente.
— Odeio você — resmunguei.
— Você não me odeia, me ama que eu sei, agora trate de levantar essa
bunda gorda da cama.
Ele sabia que eu ficaria brava com o que ele acabou de falar e percebi
que essa foi sua tática quando sorriu convencido ao me ver fora da cama.
— Escove os dentes, arrume os cabelos, coloque uma roupa e vamos
lá.
Revirei meus olhos, mas acabei sorrindo. Quem eu queria enganar?
Amava isso, tanto quanto ele.
Me arrumei rapidamente para depois ser puxada do quarto por um
Archer muito animado.
Vinte anos e ainda continuávamos com isso, mesmo que não
frequentássemos mais Nightfall devido a tudo que aconteceu com meu tio e
meu pai, ainda gostávamos de apreciar a vista do sol nascendo,
principalmente na casa de praia de nossos pais.
— É lindo, não é? — Ele sorriu, observando a paisagem.
— Muito — deitei minha cabeça em seu ombro.
— Sinto falta de Nightfall — admitiu.
— Sinto falta todos os dias — falei.
— Amo a faculdade de direito, mas sempre gostei das atividades no
campo. Já parou para pensar o que seriamos se papai não tivesse vendido o
nosso rancho?
Sorri, porque essa era tão fácil.
— Eu seria uma campeã de Hipismo e você o melhor administrador de
ranchos de Franklin.
Ele riu.
— Com certeza!
Ele me abraçou de lado e vimos juntos o sol nascer. Aqueles momentos
nosso era o que eu mais amava.
— As aulas começam daqui uma semana, acha que conseguirá lidar
com Cameron? Ou eu terei que encher ele de porradas?
Ri.
— Não será preciso. Quero distância daquele idiota.
Idiota mesmo! Cameron gostava muito de controlar, se drogar e tentar
me fazer de namoradinha que faz tudo por ele. Só que comigo as coisas não
funcionam dessa forma, no momento que ele tentou ser agressivo, eu dei um
pé na bunda dele, como Archer mesmo disse.
Cameron passou as férias todas ligando para tentar se desculpar, dizer
que havia mudado e que me queria de volta. Mas acontece que a paixão que
eu sentia por ele, foi apenas isso, uma paixão passageira, que sumiu no
momento que vi o nível de idiota que ele é.
— Um dia quero que você se apaixone intensamente — Archer desejou
— Que ele seja um homem bom, que a trate como uma princesa e que a ame
como merece ser amada.
— Acho que esse homem não existe — me lamentei — Todos que
conheci até agora são idiotas.
— Um dia esse homem irá bater na sua porta e você nem vai perceber
no início, mas ele será o seu amor. É quando não esperamos que acontece,
maninha. ”
Uma lágrima escorreu do meu rosto, o coração apertando de saudades,
mas dessa vez senti que era uma dor diferente.
Sorri fraco em meio as lágrimas. Meu irmão tinha razão, afinal.
Tirando a parte que um homem bateria na minha porta, já que fui eu que bati
na dele.
— Sinto sua falta, maninho — sussurrei, olhando para o céu — Espero
que esteja vendo tudo aí de cima, acho que ele é o homem que você tanto
desejou para mim. Ontem me senti tão feliz por ele ter me pedido em namoro
oficialmente, e acabo me sentindo uma pessoa horrível por estar feliz nesses
momentos e me desligar da dor do luto.
Enxuguei as lágrimas ao colocar tudo para fora. Eu estou feliz quando
meu irmão está morto, isso não soa horrível?
— Ei — Alisson apareceu do meu lado e se sentou na areia — O que
foi? Brigou com Dylan?
Eu acabei soltando um riso fraco.
— Não.
— Então o que aconteceu?
— Bateu uma saudade de Archer — confessei — Ontem eu fui pedida
em namoro por Dylan, ele me deu esse colar aqui — mostrei a corrente no
pescoço — Me senti tão feliz, na verdade, eu me sinto tão feliz com ele
que...que...
— Não sente a dor de antes, não é?
Assenti.
— E eu me sinto péssima porque parece que estou sendo uma pessoa
horrível e egoísta.
— Olha para a sua prima aqui — fiz o que ela pediu — Você não é
uma pessoa horrível e nem uma pessoa egoísta, está seguindo em frente.
Raven, toda essa saudade sempre vai permanecer no peito, tem dias que me
pego chorando também porque sinto a falta dele, mas você não pode se sentir
culpada por estar feliz.
— Eu sei! Eu juro que sei disso.
— Archer está feliz lá em cima vendo que encontrou um homem
perfeito.
— Sei que ele está.
— Agora limpe esse rostinho — me ajudou a enxugar as lágrimas — E
vamos lá para dentro tomar um café e aproveitar nosso último dia nesse
paraíso tropical.
Nos levantamos e seguimos para a casa.
— E como estão as coisas com Matthew? — Perguntei.
— Nos beijamos ontem — ela sorriu, toda boba — Passamos boa parte
do tempo nos beijando e conversando.
— Fico feliz por vocês dois — entrelacei meu braço no dela.
— E você e Dylan estão oficialmente namorando?
Assenti.
— Com direito a pedido e presente.
— O colar é a sua cara, ele soube escolher — sorriu — Vocês são
perfeitos juntos.
Sorri. Entramos dentro de casa, Dylan e Matthew já estavam na
cozinha, preparando o café.
Quando me viu, Dylan se aproximou e me beijou.
— Bom dia! Por que não me acordou?
— Bom dia! Porque estava muito cedo, fui ver o sol nascer.
— Está tudo bem?
Provavelmente estava com os olhos um pouco vermelho ainda, o que
explicava a análise dele por todo o meu rosto e sua feição preocupada.
— Apenas lembranças que me deixaram com saudades.
Dylan assentiu, parecendo compreender.
— Se quiser conversar, estou aqui — beijou minha testa.
Sorri com aquele gesto, meu namorado é muito fofo.
— Casalzinho perfeito o café está na mesa — Matthew interrompeu —
Bom dia, Ravenna! Espero que tenha dormido bem porque iremos curtir
muito nosso último dia aqui.
— Bom dia! Eu dormi muito bem.
— Depois do pedido de namoro de Dylan até eu dormiria bem —
Matthew brincou.
— Eu estou pensando seriamente que você tem uma queda por mim,
Brown — meu namorado devolveu.
— Um Dylan brincalhão? — Matthew fingiu uma cara de surpresa —
Eu vivi para ver esse momento.
Eu e Alisson rimos, enquanto Dylan apenas revirou os olhos, mas vi
que tentava segurar a risada.
Tomamos o nosso café ao som de risadas por culpa das provocações
que Matthew fazia para Dylan.
Meu namorado não queria assumir, mas estava na cara que gostava da
presença de Brown em sua vida e que já eram amigos, ou melhores amigos,
como Matthew insistia em dizer.
Ver aquela amizade se formando bem ali na minha frente me fez bem.
Dylan estava abaixando todos os muros em volta do seu coração e voltando a
confiar novamente.
Eu não podia estar mais orgulhosa do meu namorado.
Infelizmente tivemos que nos despedir de Outer Banks no domingo de
noite. Viajamos a madrugada inteira e chegamos em Nightfall seis horas da
manhã. Por mais cansados que todos estivessem, aproveitamos muito bem
nosso último dia na praia.
Dylan deixou primeiro Matthew na sua casa, para depois deixar eu e
Alisson, se despediu com um beijo e foi para a casa tomar um banho e se
trocar.
Diferente de minha prima, ainda tínhamos um dia de trabalho pela
frente.
Recebi uma mensagem na noite anterior de meus pais, eles visitariam
Nightfall sábado e iriam passar dois dias aqui. Fiquei feliz em revê-los, ainda
mais que apresentaria Dylan para eles, mandei uma mensagem no Whatsapp
para minha mãe, mostrando o colar e dizendo que estava namorando, nem
preciso dizer que ela mandou um áudio surtando e papai um fingindo estar
furioso.
Não percebi como eu sentia falta dos dois até aquele momento.
Desde a morte de meu irmão me afastei deles, com medo que quando
os olhassem, apenas enxergasse um olhar de repulsa e de raiva.
Mas parando para pensar agora, eu nunca recebi isso deles.
Tudo era eu.
Era eu achando que podia curar minha dor com álcool e depois com
drogas.
Era eu com medo de magoar mais os meus pais.
Sou eu me culpando pela morte do meu irmão.
— Filha! Ah, já estava morrendo de saudades — minha tia abraçou
Alisson assim que entramos dentro de casa.
— Mãe foram apenas dois dias fora — Ali zombou.
— Uma mãe não pode sentir falta de seus filhos? E você também,
Raven, senti sua falta.
Sorri.
— Nina e Tempestade também.
Tio Eitan entrou dentro da sala com minha cadela, que no momento que
me viu, correu até mim, quase me derrubando ao apoiar seu peso no meu
corpo e começar a me lamber.
— Oi meu amor, também senti sua falta — a abracei.
Ela lambeu meu rosto e tive que rir, parecia muito feliz.
— Onde está Billy? — Perguntei.
Nem precisaram me responder, Billy entrou na sala e veio direto na
minha direção. Eu fui para trás quando ele pulou em cima de mim.
— Descem os dois — pedi e eles obedeceram, me agachei para ficar na
altura deles — Vocês são muito pesados para ficarem pulando desse jeito nas
pessoas, ok? Não aguento com os dois.
Alisei a cabeça de Billy, que farejava a procura de algo.
— Seu dono já vai vir buscar você, não se preocupa.
Ele latiu e me lambeu, em seguida os dois iniciaram uma brincadeira na
minha frente, um avançava no outro ao mesmo tempo que puxavam as
orelhas um do outro.
— Passaram boa parte do tempo assim — Millie disse — Nunca vi dois
cachorros que não cresceram juntos se darem tão bem.
Me levantei e sorri.
— É porque os pais estão namorando — Alisson fofocou.
— Namorando? — Amélia apareceu na sala também, automaticamente
fechei minha expressão.
Minha tia soltou um gritinho animado, para depois expressar:
— Fico feliz por vocês, de verdade — olhou para o meu pescoço —
Isso não estava aí.
— Foi um presente — falei.
— Estou muito feliz em ter apresentado vocês dois oficialmente, me
sinto até um cúpido — meu tio ergueu a cabeça orgulhoso.
Eu ri.
— Você, Billy e Nina são os cúpidos.
— Estou feliz por vocês, Ravenna — Amélia disse e eu a olhei.
Não parecia estar sendo debochada, mas mesmo assim não acreditei em
suas palavras.
— Eu preciso tomar um banho, colocar algumas roupas para lavar e ir
trabalhar — falei — Nos vemos depois?
Minha tia assentiu.
— Mas não pense que vai escapar dos meus interrogatórios. Tenho
muitas perguntas, inclusive... — pegou a mão de Alisson — O que acha de
tomarmos um chá enquanto me conta tudo o que você e Matthew fizeram em
Outer Banks?
Alisson até tentou se esquivar, mas as mãos do meu tio a guiando para
a cozinha foram o suficiente para ela se render.
Meus tios eram tão enciumados como meus pais, provavelmente a
encheriam de perguntas como dois melhores amigos querendo saber de tudo.
— Podemos conversar hoje? — Amélia, que gostaria de ignorar para o
resto dos dias, perguntou.
— O que você quer? Desejar mais um monte de coisas odiáveis para
mim? Me culpar? Me magoar? Me odiar? Não quero conversar, Amélia.
— Apenas me escute por alguns minutos, é tudo o que eu preciso.
Respirei fundo.
— Preciso ir trabalhar.
Era final da tarde quando deixei Nina com meus tios e Alisson e fui
para a pista de treinamento treinar com Tempestade.
Dylan já estava me esperando e quando me aproximei com a égua me
puxou para si e me beijou.
— Agora que estamos mais longe um do outro — disse depois que
afastou os lábios dos meus — Você vai ir dormir com mais frequência lá em
casa, não é?
— Só dormir?
Ele revirou os olhos e riu.
— Você sabe que não — deixou um selinho nos meus lábios — Está
pronta para treinar de verdade com Tempestade?
— Estou, mas antes... preciso te mostrar uma coisa — peguei o telefone
no bolso e abri a galeria, mostrei as fotos para Dylan logo depois — Tirei
hoje, não é incrível? Ela simplesmente deixou ele se aproximar dela e cheirá-
la.
Dylan arregalou levemente os olhos para as imagens no telefone,
surpresa tomando conta de seu rosto.
— Isso é mais que incrível — ele disse — Isso quer dizer que ela está
superando, Ravenna, com a sua ajuda.
Sorri, eu também sentia aquilo e me sentia mais feliz por ter sido um
tipo de âncora para ela finalmente seguir em frente.
Guardei meu telefone no bolso e beijei mais uma vez Dylan antes de
dar a devida atenção para Tempestade.
Ela já estava selada por isso me aproximei dela e a acariciei.
— Pronta para isso, parceira?
Tempestade relinchou, olhei para Dylan e ele sorria observando nossa
interação.
— Vocês vão ser incríveis nas regionais, eu sinto isso — disse.
— Também acho que seremos — coloquei o pé no estribo e a montei
— Vamos lá, garota, ainda temos um longo caminho pela frente.
Dylan ficou escorado na cerca enquanto eu guiava Tempestade por
todo o cercado.
Completamos as três voltas para o reconhecimento de campo para
depois seguirmos para o primeiro obstáculo. Com uma habilidade
impressionante passamos pelo vertical composto por três varas.
Isso é incrível!
Foi tudo o que consegui pensar ao saltar pela primeira vez em um
obstáculo tão simples como o vertical com Tempestade, mal estávamos
começando e era incrível a forma como o corpo dela pulava e me levava
junto, como o meu cabelo voava ao descermos e corrermos até o próximo
obstáculo.
Tudo era incrível!
E se tornava mais porque eu estava com Tempestade.
Sorri e alisei o seu pescoço, assim fomos para o segundo obstáculo, o
muro, que ela também passou tranquilamente.
Conforme saltávamos eu me perguntava se Tempestade sabia o que
estava fazendo e ao olhar para Dylan, acho que ele também pensava na
mesma coisa.
A égua sabia o que estava fazendo.
E quando passamos por todos os obstáculos ela só havia cometido duas
faltas.
— Impressionante — Dylan disse enquanto eu descia de cima de
Tempestade — Duas faltas para um primeiro treino de salto é um bom sinal.
— É estranho... é como se ela soubesse seguir cada salto, cada regra.
Comecei a tirar os equipamentos de Tempestade. Já começava a
anoitecer e ela merecia um bom descanso hoje.
— Não é estranho, ela sabe o que está fazendo — Dylan me ajudou a
tirar a sela de cima da égua — Desconfio que ela veio de uma fazenda que
não só vende cavalos, como treina e adestra para o hipismo.
— E exigem o aprendizado dos cavalos os torturando? Isso é horrível!
— Se eu soubesse quem eles são, já teria denunciado — Dylan disse —
Mas infelizmente não sei, pode ser daqui de Franklin ou da cidade vizinha.
Só gostaria de saber para impedir que outros animais sofram o mesmo que
ela.
— E se tentássemos investigar? Deve ter alguma forma de saber quem
fez e continua fazendo isso.
— Não é tão fácil assim, Raven. Quando Tempestade apareceu aqui e
eu a ajudei, passei meses tentando achar alguma pista. — informou — Quem
faz isso é muito esperto e sabe se esconder. Pode ser um fazendeiro muito
famoso como também alguém que ainda está começando nesse ramo.
Compreendi no mesmo momento o que ele estava dizendo. Estávamos
no escuro quanto a isso. Podia ser qualquer um e o que mais tinha para esse
lado do Tennessee, eram fazendas e ranchos. Me decepcionei no mesmo
momento, queria tanto poder fazer alguma coisa por todos os outros cavalos
que ainda sofriam.
Não podíamos nem ao menos denunciar porque iriam querer saber mais
sobre Tempestade, o que poderia resultar de pegarem ela de nós, já que a
égua não era nossa nos papéis.
— Eu acredito na justiça divina, sabe? Uma hora ou outra, esse cara vai
aparecer e pagar por todos os pecados.
Assenti. Eu só esperava que essa hora chegasse o mais rápido possível.
No fim, minha mãe teve que cozinhar para nós. Meu pai a ajudou na
cozinha enquanto eu fiquei no meu quarto.
Um pouco mais calma do episódio com Cameron, aproveitei aquele
tempo para dormir. Fui acordar por minha mãe algumas horas depois,
dizendo que o almoço estava pronto.
Almoçamos e passamos a tarde assistindo filme. Não queríamos sair de
casa e encontrar Cameron de novo, ou qualquer pessoa do meu passado.
Meus pais acabaram dormindo no meio do terceiro filme, sorri com a
cena e desliguei a televisão. Fui para o meu quarto e me deitei na minha
cama.
Ainda eram sete horas da noite, por isso não estava com sono e nem
disposta a tentar dormir. Peguei o telefone e não havia nenhuma mensagem
de Dylan. Me perguntei o que ele estava fazendo naquele momento.
Abri a caixa de mensagens para mandar um oi, mas desisti no mesmo
momento. Precisávamos daquele tempo.
Fiz outra coisa que estava me chamando o dia inteiro, abri o navegador
do celular e comecei a pesquisar sobre adoção.
Havia alguns requisitos para adotar uma criança nos Estados Unidos,
nada muito fora do comum para o processo.
Existem duas formas de adoção, a doméstica e a internacional. Para a
família que quiser um recém-nascido geralmente a melhor opção é a adoção
doméstica.
A pessoa que quiser adotar precisa passar por um processo chamado
Home Study feito pelas assistentes sociais. Depois de feito e aprovado, há
ainda mais coisas a ser feita, algumas agências pedem até mesmo uma carta
explicando o motivo de querer adotar determinada criança.
Fechei a página aberta em meu celular e soltei um riso que mais saiu de
forma nervosa do que verdadeiro. Eu estava há um mês com Dylan, precisava
manter a calma e deixar a ansiedade de lado. Quando fosse o momento certo,
procuraríamos nos informar melhor.
Isso. Eu tomei minha decisão no momento em que estava na frente de
Dylan e vi sua fragilidade, mas não foi ela que me fez aceitar o meu
namorado da forma que ele é. Foi o amor. De repente, adotar filhos e não
passar por todo o processo de um parto me pareceu muito melhor.
Caramba, eu poderia ter uma família enorme sem sofrer um pingo de
dor.
Ri alto dessa vez. Não acredito que eu estava pensando nisso. Mas era
todo o lado positivo da situação.
Havia mais um que fez encher o meu coração de amor. Eu daria família
a crianças que estavam sem, algumas até sem esperanças de ter o amor dos
pais novamente.
Eu daria isso.
E isso foi o suficiente para saber que havia tomado a decisão certa.
Eu só não imaginava que o momento certo dito um pouco mais acima
fosse chegar tão rápido.
Era segunda-feira no final da tarde quando cheguei em Nightfall.
Passar o domingo e parte da segunda com os meus pais foi ótimo para
mim. Percebi que realmente precisava do carinho, da atenção e da
compreensão deles.
Em nenhum momento meus pais foram contra eu continuar o
relacionamento com Dylan, não que eu esperasse algo parecido deles, já que
ambos são muito compreensíveis. Mas os conselhos que me deram, levaria
para a vida toda.
Eram conselhos de pessoas com mais experiência e que só querem o
meu bem.
Quando me despedi dos dois no aeroporto de Nova Iorque percebi a
tristeza misturada com o orgulho no olhar deles. Ambos estavam tristes por
eu ter crescido e tomado a decisão de viver em Nightfall por um tempo, até
ter o meu próprio rancho, da mesma forma que estavam orgulhosos pelos
mesmos motivos.
Não deveria ser nada fácil ver sua filha crescer e ir para longe. Eu os
entendia, da mesma forma que eles me entendiam.
— Tem certeza? — Foi o que meu pai perguntou antes de eu embarcar
— Mesmo se não tiver saiba que seu quarto sempre estará esperando por
você.
Eu sorri e apertei sua mão que estava na minha.
— Tenho certeza, eu me encontrei naquele lugar novamente e não
quero me afastar de novo.
Minha mãe sorriu e me abraçou.
— Você vai ser uma grande campeã de hipismo, Raven, e seu futuro
marido um excelente veterinário.
Foi o que ela me disse antes de me deixar ser abraçada pelo meu pai
para depois embarcar.
Agora, pensando no que minha mãe profetizou para mim e Dylan,
torcia para que estivesse certa e isso realmente acontecesse.
O amor pelo o hipismo era superior há tantas coisas que achei estar
fazendo porque gostava, como o direito e depois a medicina. Agora eu
entendia o que aquela frase de “se fazer o que ama” queria dizer.
— De volta ao lar — meu tio sorriu enquanto pegava a mochila da
minha mão — Nina já estava morrendo de saudades.
Eu também estava. Acompanhei meu tio até entrarmos dentro de casa,
ele havia me buscado no aeroporto. Nina me recebeu da forma calorosa de
sempre, latindo de felicidade e me lambendo.
— Também senti sua falta, amor — alisei sua cabeça.
Na sala estavam Alisson, Matthew, Amélia e minha tia. Acenei para os
quatro que devolveram sorrindo.
— Como foi a viagem, querida? — minha tia perguntou.
— Tranquila.
Minhas primas se levantaram no mesmo momento e vieram até mim,
Amélia pegou a mala que estava na minha outra mão e Alisson entrelaçou o
braço com o meu. Franzi a testa em estranheza para todo aquele
comportamento.
— Mala gigante, algo me diz que vai passar mais tempo do que o
esperado do início — minha tia piscou — Seja bem-vinda ao lar, querida.
Eu havia trazido todo o restante de roupas que havia ficado no meu
guarda roupa em Nova Iorque, não eram muitas, mas ocupava boa parte de
uma mala grande.
— Espero que não tenha problemas — eu falei, um pouco incerta, já
que não havia conversado com eles antes.
— Problema? Você sempre será bem-vinda aqui, Raven — meu tio
falou — Pode ficar o tempo que quiser.
Sorri em agradecimento.
— Agora, se nos derem licença, temos muito o que conversar — Ali
disse — Já volto para você, Matt.
Matthew sorriu e piscou.
— Não me importo em ficar aqui conversando com os meus sogros —
ele disse.
Subimos para o meu quarto. Amélia deixou a mala em um canto e eu
fui puxada por Alisson até a cama, onde me colocou sentada.
— Posso saber o porquê está parecendo que serei interrogada?
— Porque você vai — Amélia parou em minha frente — Que história é
essa de que Cameron a atacou?
Franzi a testa mais uma vez naquela tarde, sem entender como elas
sabiam disso.
— Como vocês sabem? — Perguntei.
— Sua mãe me ligou — Ali explicou — Ela disse para a gente
conversar com você e prestar apoio, já que você ficou apavorada e não quis
mais tocar no assunto pelos restos dos dias que passou com eles.
Engoli em seco. Meus pais até tentaram falar sobre e perguntaram
como eu estava, a verdade é que eu não queria falar sobre Cameron. Vê-lo fez
com que eu me lembrasse de tudo o que aconteceu naquela trágica noite.
O nojo por ele só aumentou, junto com toda a raiva e angústia que
senti. Eu nunca pensei que poderia odiar uma pessoa, mas eu sentia o maior e
mais verdadeiro ódio por Cameron Tate.
— Não quero falar sobre isso, já passou e eu estou bem.
— Sua mãe disse que você teve um pesadelo — Amélia disse — Foi
por isso que ela nos ligou.
Definitivamente a minha mãe não conseguia ficar com a boca fechada.
Na noite anterior eu fui dormir contente por estar mais tranquila sobre o
meu futuro com Dylan, mas acordei de madrugada aos gritos.
Meu pesadelo ainda estava vivo em minha memória e eu tentava
ignorá-lo, mas era quase impossível. Eu ainda conseguia ouvir a voz e ver o
sorriso perverso de Cameron dizendo que eu era a culpada por tudo o que
aconteceu na noite em que meu irmão morreu. Junto com flashes de
memórias do carro explodindo bem na minha frente, sem sobrar nada do meu
irmão para enterrar.
Senti o choro ficar preso em minha garganta, nem isso eu conseguia
fazer mais.
— Ei — Amélia se sentou ao meu lado — Se você não quiser contar
tudo bem, mas geralmente desabafar faz bem e se o problema é a minha
presença aqui, eu deixo vocês duas sozinhas para conversarem.
Neguei. O problema não era a minha prima mais velha, o problema era
eu.
— Você pode ficar, prefiro a Amélia amiga — falei e ela sorriu.
— Amanhã você tem uma consulta com a Elena. Não sei como
funciona, mas talvez já ajude um pouco — Alisson falou.
Assenti.
— Eu espero. Não aguento mais, Ali — admiti — Fazia tempo que
esses pesadelos não aconteciam, mas foi só ver Cameron que tudo voltou.
— Você estava feliz e conseguindo seguir em frente — Amélia disse
—Você ocupou sua cabeça, por isso não pensava ou tinha pesadelos com
frequência do que aconteceu naquela noite. E antes que você comece a dizer
que se sente culpada por isso, não se sinta. Você não vai viver no luto pelo o
resto da sua vida.
Provavelmente a cara de surpresa que fiquei foi a mesma que Alisson,
porque minha prima mais velha revirou os olhos e riu.
— O que foi? Não são só vocês que sabem falar frases bonitas.
— E você mesmo disse lá na beira da praia que a dor que sentia era
diferente — Ali lembrou — Você está superando, prima, está começando a
entender que tudo não passou de uma fatalidade e tudo isso porque está
cercada de pessoas que querem o seu bem, eu, meus pais, Dylan, Matthew e
agora, Amélia.
— Eu sempre quis o bem da Raven — a mais velha revidou — Sério
que vocês pensavam o mais perverso de mim?
— Sério — Eu falei — Por um momento achei que você era a cobra da
história.
Amélia fez uma cara de ofendida e colocou a mão no peito.
— Não posso acreditar nisso. A cobra da história sempre foi Briana.
— Agora eu vejo isso — falei.
Rimos.
Não considerava mais tão estranho ter aquela Amélia descontraída e
amigável na minha vida. Ela estava feliz. Eu sabia o quanto a felicidade e o
amor podiam mudar a vida de uma pessoa.
— Eu estava na lanchonete em frente ao Central Park com meus pais
ontem, fui para a fila e os deixei sentados esperando os pedidos. Foi então
que Cameron me encontrou — comecei a contar o que aconteceu — Ele
estava totalmente drogado, mas me agarrou e quis me levar para a sua casa.
Alisson pegou minha mão em forma de conforto.
— Meu pai conseguiu impedir com sua pose de advogado, mas mesmo
assim as lembranças vieram. Cameron me agarrou da mesma forma que
aquela noite... tudo veio na minha cabeça.
— Sentimos tanto por isso — Amélia disse — Esse garoto deveria estar
preso.
— Preso pelo o que? Fizemos a denúncia de tentativa de estupro, mas
um dia depois ele estava fora da cadeia. O pai dele é um empresário influente,
nunca deixaria o filho estragar a imagem da família Tate.
— E a justiça sempre falha — Ali se pronunciou — Pelo menos deve
ter pago uma bela de uma fiança.
Dei de ombros.
— Você não precisa se preocupar agora que está aqui em Nightfall. Ele
não irá procurá-la mais, pode até tentar, mas não vai achar — Amélia falou.
— É o que me conforta.
Saber disso e estar prestes a consultar com uma psicóloga excelente me
confortava. Era irônico pensar que no início de tudo isso eu não queria nada
do tipo, mas agora eu realmente queria conversar com alguém que me
ajudasse a passar por todo esse pesadelo ainda vivo em minha memória.
— Bom, sem assuntos pesados agora, vamos deixá-los enterrados nesse
fim de semana horrível — Alisson sorriu antes de voltar a dizer: — Matthew
passou a tarde com Dylan ontem.
Suspirei um pouco aliviada. Eu me perguntei por muitos momentos em
que estive fora se Dylan estava bem. Felizmente teve a companhia
descontraída e alegre de Matthew para não pensar em bobagens que sei
poderia pensar.
— E como ele está? — Perguntei.
— Mais confiante do que nunca, segundo meu namorado — Ali falou
— Você sabe que Matthew consegue deixar alguém bem como ninguém.
Assenti.
— Estou ansiosa para vê-lo.
— Por que não faz isso agora? — Amélia perguntou — Tenho certeza
que ele está louco para ver você também.
Me levantei, decidida a fazer exatamente isso. Abri a boca para dizer
que não viria dormir em casa, mas Alisson foi mais rápida.
— Já sei que você não vem para casa hoje.
Sorri e olhei para Nina que me observava com expectativa.
— Vamos visitar Billy, amor?
Ela latiu animada e se colocou ao meu lado.
Acenei para minhas primas e deixei o quarto com Nina. Matthew e
meus tios estavam na sala conversando sobre um programa que passava na
televisão.
— Vou ver o Dylan — anunciei.
— Até que enfim — Matthew piscou — Ele já deve estar com
saudades.
— Também estou — sorri.
Sai de casa com Nina e encontrei Rebeca preste a bater na porta.
— Oi, Raven, como você está?
— Rebeca, oi, estou bem e você?
— Ótima, apenas um pouco ansiosa para as competições — disse.
— Tenho que admitir que também estou sentindo essa ansiedade.
— Amélia está lá dentro? — Assenti — Antes de entrar eu queria
agradecer por ter perdoado ela.
— Todo mundo merece uma segunda chance — falei.
— Mas poucos no seu lugar dariam, pelo o que minha namorada me
contou, ela infernizou sua vida.
— Eu recompensei a fazendo sentir ciúmes do meu irmão na infância.
Rebeca riu.
— Isso é verdade. Mas mesmo assim, obrigada por ter dado essa
chance para ela. Quando a conheci, Amélia era um pouco arrogante e fria
com os sentimentos, mas conforme nos aproximamos e nos apaixonamos, ela
foi percebendo tudo a sua volta e como foi injusta com você.
Sorri. A história das duas tinha um pouco de semelhanças com a minha
e a de Dylan.
— Eu vejo isso nela, estamos indo bem no quesito tentar ter uma
relação amigável — falei — O amor a mudou, Rebeca.
Ela concordou.
— Me sinto honrada por fazer parte disso.
Nina late, impaciente ao meu lado, louca para ir até Billy.
— Acho que vocês estavam de saída, vejo você qualquer dia desses?
— Claro.
Rebeca entrou dentro de casa enquanto eu e Nina fomos para o rancho
de Dylan.
O sol já começava a se por, apressei os passos junto com Nina para não
pegarmos a escuridão. Mesmo que Nightfall tivesse iluminação, ainda sim
era fraca para de noite.
Chegamos no rancho de Dylan alguns minutos depois, meu namorado
estava fechando a porta grande de madeira do seu pequeno estábulo e não me
viu se aproximar.
Nina me surpreendeu ao não fazer barulho para anunciar a nossa
chegada, parecendo perceber que eu queria pegar ele de surpresa.
Antes que Dylan virasse e me enxergasse, eu abracei sua cintura.
Percebi o exato momento que seu corpo tremeu levemente pelo o susto, mas
assim que viu que eram os meus braços em sua volta, relaxou.
— Sentiu minha falta, cowboy? — Perguntei com um sorriso no rosto.
Ele se virou lentamente, com o mesmo sorriso de felicidade ao me ver,
manteve meus braços em volta da sua cintura e fez o mesmo com a minha
com os seus braços.
— Você não imagina o quanto, garota da cidade.
Aproximei meus lábios dos seus e fechei meus olhos para em seguida
grudar minha boca na sua. Dylan me prende mais ao seu corpo quando pede
passagem com sua língua, que é cedida no mesmo momento. Nos beijamos
com paixão, com amor e com saudades. Me lembrei do questionamento que
me fiz quando ele me beijou pela segunda vez, se toda vez seria perfeito
daquela forma.
Posso responder com toda certeza que sim, é perfeito.
— Isso é um sinal que você decidiu ficar comigo? — Ele perguntou
depois que afastamos os lábios um do outro.
— Eu já fui decida que ficaria com você, amor.
Ele voltou a sorrir, tirou um pouco da minha franja que caia no meu
rosto e perguntou:
— Você percebeu do que me chamou?
Eu ri ao mesmo tempo em que concordava.
— Amor — repeti de novo — Você é o meu amor, portanto terá que
arrumar algo mais grave para me afastar de você.
— Esse era o meu único segredo, então acho que está presa a mim pelo
o resto da sua vida — ele completou: — amor.
Sorri e o beijei novamente. Feliz demais por estar em seus braços. Era
como se nada conseguisse me deixar mal, a forma como nos conectamos é
incrível.
Segurei seu rosto com as minhas duas mãos quando nos afastamos.
— Nada nem ninguém pode destruir isso que temos — falei — Eu não
me importo que você tem azoospermia não obstrutiva, eu amo você pelo o
que você é. Vamos passar por tudo isso juntos.
— Eu amo você — ele beijou meus lábios — Amo você demais.
Sorri.
— E sabe o que mais eu estava pensando? Não irei sentir nenhuma
dorzinha no parto. Isso é fantástico.
Dylan começou a rir.
— É sério que você foi para Nova Iorque e começou a pensar nas
vantagens?
— Mas é claro que sim! Confesso que o que sempre me apavorou em
uma gravidez é o parto, não precisarei fazer nada disso.
— Você não se importa em futuramente adotar?
— Não, por que eu me importaria? Podemos dar uma família para
crianças que acham que nunca mais poderão ter uma.
Ele assentiu.
— Você é incrível, sabia?
— Claro que eu sabia disso — brinquei.
Rimos.
Era engraçado como conversávamos sobre o futuro quando estávamos a
pouco mais de um mês juntos. Essa era a maior prova de que qualquer que
fosse a dificuldade passaríamos por ela sem estragar o que temos.
— O que acha de eu cozinhar para a minha namorada?
— Acho que sua namorada adoraria ser mimada dessa forma.
— Lasanha? — sugeriu.
— Sim! Por favor!
Ele pegou minha mão e me levou para dentro de casa. Nina e Billy já
estavam no sofá brincando um com o outro.
Fomos para a cozinha, Dylan pegou o frango do freezer e levou até o
micro-ondas para descongelar. Peguei alguns tomates e uma faca para cortá-
los e fazer o molho.
Enquanto cozinhávamos juntos com as brincadeiras um com outro, as
provocações e o amor transbordando em cada palavra dita um para o outro,
percebi que nada havia mudado, apenas fortalecido.
No dia seguinte eu acordei com o despertador tocando. O desliguei
assim que localizei meu celular em cima da pequena mesinha ao lado da
cama de Dylan. Tentei me espreguiçar, mas o corpo do meu namorado
grudado ao meu e seus braços em volta do meu corpo me impediram.
Precisava me levantar e me arrumar para a consulta com a psicóloga
Elena. Confesso que estava um pouco nervosa agora que havia chegado o
momento.
— Amor — murmurei tentando acordar Dylan, mas ele dormia como
uma pedra.
O que me fez pensar que eu também havia dormido muito bem essa
noite. Sem nenhum pesadelo, apenas com as lembranças boas entre eu e
Dylan ontem à noite.
Já havia percebido que o meu subconsciente era travesso. Quando eu
estava bem, ele fazia questão de me deixar mal.
— Dylan... — o sacudi.
Dessa vez ele abriu os olhos azuis, um sorrisinho brotou em seu rosto e
eu derreti como uma boba apaixonada.
— Precisamos levantar, cowboy — falei — Daqui uma hora tenho
consulta.
Ele fez um beicinho fofo.
— E eu preciso trabalhar.
— Da mesma forma que precisamos voltar a treinar com Tempestade
— falei — Por falar nela, estou com saudades.
— Tenho certeza que ela também está — se endireitou na cama,
desfazendo o abraço em minha cintura. — Mas ela se comportou bem na sua
ausência, não foi tão difícil de tirá-la da baia e deixar no ar livre.
Levantei da cama e fui até o seu roupeiro procurar algo para vestir.
Algumas das minhas roupas estavam ali.
— Ela está superando o seu passado — falei — E confiando
novamente.
Peguei uma calça e uma blusa vermelha sem estampas. Felizmente eu
tinha um conjunto de lingerie preto no seu guarda roupa também.
— Preciso tomar um banho, Alisson vai passar aqui daqui a pouco.
— Vai enquanto eu preparo um café para você.
Fui até ele e dei um selinho em seus lábios antes de sair do quarto para
ir ao banheiro.
Depois de tomar meu banho e comer as panquecas deliciosas que só
Dylan sabia fazer, me despedi do meu namorado no mesmo momento que
minha prima buzinava na frente da sua casa.
Deixei Nina com Dylan e Billy, já que eles iriam para Nightfall logo
em seguida e caminhei em direção ao carro de minha prima. Assim que entrei
na caminhonete, ela sorriu.
— Bom dia! Vejo que as coisas estão ótimas por aqui.
— Bom dia! Estamos melhores do que nunca — falei.
Minha prima deu partida no carro e seguiu para a cidade.
— Estou feliz por vocês — ela disse — Mal posso esperar pelo
casamento.
— Alisson — eu ri — Ainda é cedo para pensar nisso.
— Cedo? Até pode ser, mas que vocês já estão tomando decisões
baseado em um futuro onde ambos estarão casados... isso não pode negar.
— Ontem eu parei para pensar como conversamos com tanta facilidade
sobre um futuro juntos — lembrei — É incrível.
— Ah, o amor... tão perfeito.
— E você e Matthew? Quando será o casamento? — a provoquei.
Ela riu.
— Quando for o seu — piscou para mim antes de voltar a olhar para a
estrada novamente — Já imaginou? Um casamento duplo.
— Nunca imaginei, mas até que gostei da ideia.
— Eu só dou ótimas ideias. Mas respondendo sua pergunta, eu e
Matthew estamos bem, ele é um fofo e estou cada dia mais apaixonada.
— Vocês dois se merecem.
Chegamos no hospital alguns minutos depois. Alisson estacionou a
caminhonete na sua vaga reservada no estacionamento e seguimos para
dentro do prédio.
— Parece nervosa — ela comentou quando entramos no elevador.
Apertei o segundo andar e as portas se fecharam.
— Eu estou — admiti — Nunca consultei com uma psicóloga, nunca
achei que precisaria, não sei se conseguirei me abrir para ela.
— Deve ter um motivo para as pessoas amarem a Elena, tenho certeza
que ela é boa no que faz — Ali tentou me tranquilizar — Todo mundo
deveria procurar um psicólogo, a vida seria bem mais simples.
Concordei. Também começava a acreditar nisso.
As portas dos elevadores se abriram e seguimos para o lado direito do
corredor. Como eu já tinha hora marcada era só anunciar minha chegada para
a recepção na área dos psicólogos. Passamos pela área da maternidade e meus
olhos automaticamente procuraram por Skyller.
Ela ainda estava na mesma incubadora. Os olhinhos fechados,
respirando através dos fios e aparelhos que a cercavam. Senti algo em meu
peito que não consegui identificar, apenas me aproximei mais do vidro que
nos separava.
— Ela vai ser uma garotinha linda, não é? — Ali perguntou ao meu
lado sorrindo para o vidro.
Assenti.
— O que acontece depois que ela já tiver meses o suficiente para sair
daqui?
— Como ela não tem nenhuma família, fica em poder do estado.
Provavelmente eles irão a ceder para uma daquelas famílias Foster Parent,
onde a criança fica temporariamente até encontrar uma família que a queira.
— Como faz para se tornar um Foster Parent? — Perguntei sem ao
menos pensar no que estava dizendo.
Ali percebeu no mesmo momento.
— Você está pensando em adotar Skyller?
Não sei. Eu estava? Não conseguiria responder aquela pergunta de
forma imediata, estávamos falando de uma criança, afinal.
— Só estou curiosa — falei.
— Eu não sei muito bem, teríamos que pesquisar, mas como aqui é
cidade pequena, acredito que não exijam muitas coisas — ela disse — Seria
incrível se você e Dylan a adotassem.
— Estamos nesse relacionamento há um mês, seria estranho se eu
falasse que gostaria de adotar um bebê.
— Então você quer adotar Skyller.
Suspirei. Eu deveria saber que minha prima estava jogando verde para
saber mais sobre esse meu interesse.
— Foi hipoteticamente falando.
— Claro, com certeza foi — ela foi irônica — Você vai ser uma ótima
mãe, Raven, e tenho certeza que Skyller teria sorte de ter você e Dylan.
Sorri. Fiquei mais alguns minutos admirando o pequeno bebê naquela
incubadora. Ela era uma pequena guerreira. Passou por um acidente de carro
e ainda lutava para sobreviver.
Me assustei com o pensamento que me veio a seguir: eu realmente
gostaria de chamá-la de filha.
— Preciso ir para a consulta — falei, mesmo que não quisesse me
afastar dela.
Aquele mesmo sentimento que me tomou quando a vi pela primeira vez
parecia um pouco mais forte agora.
Me afastei e me virei de costas para o vidro.
— Nos vemos mais tarde? — perguntei para Ali que ainda me olhava
daquela forma que sabia o que eu estava sentindo.
— Claro — ela sorriu.
Fui para ala dos psicólogos enquanto minha prima foi se vestir para
começar a trabalhar.
Dei o meu nome para a recepcionista e ela pediu para eu aguardar mais
cinco minutos. Me sentei em uma das cadeiras de espera e aguardei.
O que será que Dylan acharia de Skyller?
A pergunta me veio assim que me sentei e encarei um ponto fixo. Com
certeza me acharia estranha por já falar de adoção quando há poucos dias
havia descoberto sobre sua doença.
Mas era impossível não me imaginar com a pequena garotinha em
meus braços, fazendo a dormir, brincando com ela, dando todo o amor do
mundo que merecia.
Aquilo era muito estranho.
Eu nunca havia me sentido dessa forma.
Talvez fosse todas as emoções dos últimos dias falando mais alto.
Afinal eu descobri que para ser mãe estando casada com Dylan terei que
adotar, e saber que Skyller está sem pais me comovia.
— Srta. Blackwood? — uma mulher de cabelos curtos e preto parou em
minha frente — Sou a Doutora Elena.
Estendeu a mão para mim, me levantei e a apertei.
— Sou a Ravenna.
— Vamos para a minha sala — ela indicou com a cabeça.
A segui até o consultório. Elena se sentou na sua cadeira em frente à
mesa e eu fechei a porta e me aproximei.
— Vamos nos sentar naquelas poltronas ali, eu não suporto essa mesa
separando a gente como se fossemos médico e doente — ela sorriu, pegou
um caderno e se levantou.
Fiz o que ela pediu. Me sentei em uma poltrona que tinha mais afastado
da sua mesa. Elena se sentou ao meu lado.
— Quero que saiba que eu sou como uma amiga — ela começou — A
diferença é que não posso fofocar sobre o que dirá dentro dessa sala.
Sorri.
— Fico um pouco mais tranquila em saber disso.
— Bom, deixa eu me apresentar para você. Sou Elena, tenho quarenta
anos, moro aqui mesmo na cidade e sou solteira. Divido a minha casa com
um gato e um cachorro, costumo dizer que eles são os meus ouvintes. Amo a
minha profissão e sou formada em psicologia desde os meus vinte e três anos.
Depois disso fiz mestrados e doutorado, e aqui estou eu, dando o meu melhor
a cada dia que passa. — Ela se apresentou — Alguma pergunta?
Neguei. Mais nervosa ainda para me apresentar.
— Tudo bem se não quiser se apresentar, mas sempre temos que
começar por um começo — ela disse — Não precisa se sentir pressionada a
nada aqui dentro.
— Meu nome é Ravenna e tenho vinte e dois anos — comecei — Estou
morando há pouco mais de um mês com os meus tios aqui na cidade, eles têm
um rancho, você deve conhecer, Nightfall o nome.
Elena assentiu enquanto anotava alguma coisa em seu bloquinho.
— Famoso pelo treinamento de hipismo — disse.
— Sim, e eu estava ajudando com o treinamento até ter que me afastar
porque um mauricinho idiota não gostou do fora que eu dei, e pediu para eu
não treinar mais os cavalos já que irei competir também.
Só então notei o que eu havia falado, sorri, um pouco envergonhada.
— Desculpa.
Ela riu e balançou a cabeça.
— Não se preocupe, somos amigas, lembra? — assenti — Continua,
você disse que vai competir…isso é incrível. Gosta do hipismo?
— Sou apaixonada desde criança.
— Desejo toda a sorte para você nas regionais.
— Obrigada.
— E você é formada em alguma coisa? — Perguntou.
— Ensino médio conta?
Ela sorriu e assentiu.
— Então é só isso mesmo — falei — Tentei fazer faculdade de direito
e não deu muito certo, da mesma forma que tentei fazer faculdade de
medicina. Eu até que estava gostando, mas não sentia aquele amor e euforia,
só que mesmo assim iria continuar... até a morte de meu irmão.
Elena me olhou por alguns segundos em silêncio, parecendo montar um
quebra cabeça em sua cabeça.
— É por isso que está aqui?
Engoli em seco ao mesmo tempo em que concordei.
— Eu morava em Nova Iorque — comecei a falar desde o início,
sentindo-me extremamente confortável em me abrir com uma estranha.
Contei sobre tudo, desde os meus atos rebeldes de beber tanto até
dormir, de me juntar com pessoas que só queriam o meu mal e eu achava que
não. Pessoas que me ofereceram drogas na última aventura minha porque me
fizeram ter certeza que isso acalmaria a minha dor. Todas as vezes que fui
presa pelo delegado Stuart. Tudo. Eu contei tudo.
Depois de desabafar eu não enxergava mais direito a Doutora Elena em
minha frente devido aos meus olhos estarem embaçados de tantas lágrimas.
Só notei que ela estava na minha frente quando me estendeu um lenço.
O peguei, e limpei meu rosto. Minutos se passaram até ela voltar a falar.
— Sinto muito por ter passado por tudo isso, querida — ela começou
— Vamos trabalhar juntas para que isso que sente se transforme em apenas
uma dor de saudades.
— Acha que eu posso...superar a culpa? — perguntei incerta olhando
em seus olhos.
— É claro que sim! Sabe por quê? Porque você não tem culpa,
Ravenna. E eu garanto que nem consigo contar nos dedos quantas vezes já te
disseram isso. Pelo o que me contou, seus pais, seus tios, suas primas,
Dylan... todos eles são pessoas maravilhosas e que nunca a culparam.
— É apenas eu, não é?
Elena assentiu lentamente.
— Infelizmente é a consequência que passamos por ter presenciado um
episódio tão traumático. Não foi apenas um carro e uma pessoa explodindo
na sua frente. Foi o seu irmão, seu irmão gêmeo. A pessoa que estava sempre
ali para você.
Concordei.
— Nos últimos dias estava tão feliz com Dylan... por um momento me
permitir esquecer da dor — admiti aquilo que me fazia me sentir ainda mais
culpada — Acha que eu sou um monstro?
— Pelo o contrário, eu acredito que você está superando. E isso é
incrível porque poucas pessoas conseguem sozinha.
— Eu não estava sozinha.
— Verdade. Você tinha um cowboy de ombros largos ao seu lado.
Sorrimos uma para a outra. Agora entendi o porquê Elena era tão
requisitada.
Ela não era apenas uma profissional agindo como uma profissional.
Elena fazia questão de conhecer o paciente, de ser amiga dele, de
depositar confiança. Foi por isso que me senti tão bem no primeiro minuto
que passei aqui.
— Vamos superar tudo isso juntas, Raven... posso te chamar assim?
Assenti.
— Iremos iniciar um tratamento, com muitas conversas e terapia. Você
vai passar por tudo isso com a minha ajuda.
— Obrigada, doutora.
— Eu que agradeço por confiar em mim. Poucos pacientes conseguem
se abrir na primeira consulta, significa que você quer isso tanto quanto eu.
Concordei mais uma vez com ela.
— É tudo o que eu preciso.
Encontrei Dylan terminando de selar Coronel na pista de adestramento.
Assim que me viu, veio até mim e me beijou. Eu havia mandado uma
mensagem mais cedo dizendo que iria almoçar com Ali na cidade, já que
minha prima estava louca para passar no shopping e comprar um vestido para
um jantar que teria com os pais de Matthew hoje à noite.
— Como foi a consulta? — Perguntou.
— Muito boa. Elena é ótima, não imaginava que seria tão boa assim.
— Fico feliz que tenha gostado — ele acariciou meu rosto — Você é
forte e já superou tantas coisas, vai conseguir passar por isso também.
— É o que eu espero.
— Vai treinar com Tempestade?
— Sim, mas você viu ela? Passei na baia e no cercado e a égua não
estava lá.
Dylan indicou com a cabeça para algo que estava atrás de mim. Me
virei e vi Tempestade e Olaf apreciando o calor do sol bem próximos um do
outro.
— Eles estão tão apaixonados um pelo o outro — comentei sorrindo.
— Da mesma forma que nós dois e aqueles dois lá — apontou para
Billy e Nina que estavam deitados no gramado com cabeça apoiada um no
outro.
— Sempre achei que fossem amigos — falei.
— Amigos? Esses dias eles estavam se lambendo, amigos não fazem
isso.
Rimos.
— Preciso ir trabalhar, Coronel está dando trabalho na parte de
adestramento. Nos vemos depois?
— Sim, nos vemos depois — beijei seus lábios — Vou aproveitar que a
pista de saltos está disponível e treinar com Tempestade.
Ele assentiu.
— Se cuida, tudo bem?
— Eu sempre me cuido.
O beijei uma última vez antes de ir até a égua preta, que assim que me
viu soltou um sopro em cumprimento. Olaf, tão inteligente quanto ela, soltou
um relincho me saudando.
— Vamos treinar, garota? — Ela balançou a cabeça.
Tempestade estava sem sua rédea, mas apenas um toque sutil em sua
crina e ela começou a me acompanhar. Olaf fez a mesma coisa e eu sorri.
— Parece que não consegue ficar longe de sua dama, em?
Fomos os três para a pista de saltos, não era muito longe da de
adestramento.
Deixei Tempestade em frente ao cercado e entrei no galpão em busca
dos equipamentos para selar a égua. Peguei todos e fui até ela, a selei e a
levei para o meio da pista.
— Estou um pouco ansiosa — admiti para ela — Da mesma forma que
sinto que precisamos fazer isso, tenho medo de algo dar errado.
Tempestade movimentou minha mão com o nariz e eu comecei a fazer
carinho em sua cabeça. Ela gostava muito disso.
Continuei a acariciando por um tempo até o momento em subi em cima
dela para começarmos o treinamento.
Completamos três voltas para reconhecimento de campo e fomos até o
primeiro obstáculo. Saltamos com perfeição o muro para depois irmos até o
salto duplo, que também passamos com maestria.
— Caramba... desse jeito vamos ganhar, campeã — sorri enquanto
alisava seu pescoço.
Conforme o tempo passava, saltávamos por todos os obstáculos de
forma correta. Sem cometer nenhuma falta.
Era impossível não sorrir orgulhosa de todo o trabalho feito até aqui.
— Amo você, Tempestade, e vamos dar um show nas regionais.
A égua relinchou e balançou a cabeça, como se concordasse.
Minha mãe era a única que sabia o motivo de eu sair trinta minutos
mais cedo do que o marcado das consultas. Ela sempre me dizia que era
porque essa garotinha já havia roubado meu coração e que eu deveria contar
o mais rápido para Dylan e ver se ele sentiria o mesmo.
Minha primogênita...
Seria possível?
— Minha mãe acha que é um sinal — falei para Dylan — Acha que
Skyller pode ser nossa primogênita.
Dylan sorriu e pegou minha mão a levando até os lábios e deixando um
beijo ali. Me lembrei de meses atrás quando ele decidiu vir me encontrar na
festa da cidade e assumir tudo o que sentia por mim.
— Eu também acho — ele disse — Não pensei que adotaríamos um
filho tão rápido, mas não podemos controlar o destino, se ele nos trouxe
Skyller é porque tem um motivo.
Sorri.
— Acha que será fácil para adotá-la?
— É o que veremos.
Chegamos no hospital alguns minutos depois, nos identificamos na
recepção e fomos até a área da maternidade. Lá estava Skyller, mas dessa vez
algo estava diferente, seus olhos estavam abertos e assim que notou nossa
presença através do vidro, nos olhou e estendeu os braços, emitindo sons pela
boquinha pequena. Seus olhos eram castanhos claros e o cabelo bem loirinho,
ela ainda estava mais linda do que a última vez que a vi.
— É ela? — Dylan apontou.
Assenti.
— Ela é linda.
— Vocês querem entrar? — Uma enfermeira se aproximou de nós —
São a família que ficará com Skyller?
Engoli em seco, sentindo uma tristeza profunda ao entender o que
significava aquela pergunta.
— Ela já tem família? — Dylan que perguntou.
— Os agentes me disseram que estavam vendo um casal para ficar com
ela, pensei que fossem vocês.
Neguei.
— Não somos, mas podemos entrar mesmo assim? — perguntei.
A enfermeira pareceu meio receosa no início, mas concordou me
fazendo suspirar aliviada.
Colocamos um protetor de roupa, luvas e toucas. Procedimento padrão
para entrar em uma área que exigia muitos cuidados com bebês recém-
nascidos e prematuros.
Nos aproximamos de Skyller, que nos observava com atenção. Os
bracinhos pequenos se estenderam para nós em um claro pedido de colo.
— Posso pegá-la? — Pedi para enfermeira.
Ela assentiu.
Com muito cuidado estendi meus braços e segurei Skyller a trazendo
para perto de mim.
— Oi, Skyller — a cumprimentei — Você é linda.
Ela ergueu uma mãozinha e tocou o meu pescoço. Senti um arrepio ao
ser tocada por ela, aquela mesma sensação que tive no sonho estava presente
novamente e meus olhos umedeceram.
Dylan se aproximou mais da gente e tocou a sua bochechinha com o
polegar, em uma caricia suave que a fez sorrir para nós dois.
Quando ergui meus olhos encontrei os seus também marejados. Nós
dois percebemos naquele momento que não era apenas uma visita para uma
criança que perdeu os pais em um acidente trágico de carro, era mais, muito
mais.
O sonho não havia sido apenas um sonho. Eu querer consultar com um
psicólogo não era apenas por querer.
Eu lembro que aquele dia em que vim marcar a minha primeira
consulta com a Doutora Elena parecia ter algo me puxando para esse lugar,
eu achei que era eu mesma em busca de superar todos os meus medos e
culpa, mas não era só isso, era Skyller.
Sempre foi Skyller.
A garotinha em meu colo me despertou dos pensamentos ao segurar o
dedo de Dylan fortemente para uma simples bebê e nós dois rimos.
— Você é forte, Sky — Dylan a apelidou.
Rimos entre lágrimas que escorregavam por nossos rostos ao ver ela
sorrir lindamente para nós de novo.
Uma batida na porta chamou nossa atenção. Uma mulher de cabelos
escuros e um homem de pele negra estavam do outro lado do vidro nos
olhando.
— Sãos os assistentes sociais — A enfermeira disse — Temos que ir.
Decepcionada por não ter passado mais tempo com Skyller em meu
colo a larguei em seu berço. Foi nos virarmos de costas para sair da
maternidade que ela começou a chorar, voltei a me virar para ela e segurei
sua mãozinha.
— Está tudo bem, Skyller — garanti.
Dylan parou ao meu lado.
— Lembra o que falamos no carro? — ele perguntou — Ela é a nossa
primogênita, amor, eu sinto.
Assenti. Porque eu também sentia.
Naquele momento eu senti que me tornava mãe, mesmo que eu não
soubesse como realmente é ter essa responsabilidade. Aquela era a nossa
garotinha, a nossa primeira filha e faríamos de tudo para sair daquele hospital
com ela em nossos braços.
— Nossa filha — eu disse — Skyller é nossa filha.
Dylan concordou.
— Vamos falar com os assistentes e nos informar melhor sobre o que
fazer para adotá-la.
Larguei a mãozinha de Skyller que já se encontrava quase dormindo e
fomos em direção a saída da maternidade. Retiramos os equipamentos de
proteção e nos aproximamos dos assistentes sociais.
— Olá — a mulher cumprimentou — Sou Jéssica Wilson e esse é meu
colega George Hanks, somos responsáveis pelo o caso de Skyller.
— Oi, eu sou Dylan Blossom e essa é minha noiva, Ravenna
Blackwood — Dylan nos apresentou.
Sorri em cumprimento.
— Não podemos de deixar de notar que pareciam muito interessados na
bebê — George disse — Os pais que estavam certo em adotá-la desistiram
agora.
O suspiro que soltei foi de puro alivio.
— Estamos interessados — eu falei.
— Ah, que bom! Hoje em dia está cada vez mais difícil que família
adote crianças, ainda mais pelo o estado — Jéssica disse.
— O que é preciso para adotar?
— No caso de Skyller não é muito, vocês se tornariam primeiro Foster
Parent, onde ficariam com a criança temporariamente, mas já garanto que
podem solicitar a adoção definitiva depois de dois ou três meses. Será cedido
se vocês forem aprovados nas visitações que faremos.
Assenti.
— E como se torna Foster Parent? — Dylan perguntou.
— Vocês passariam por uma entrevista, uma habilitação para a adoção
chamada Home Study e participariam de palestras sobre crianças que
precisam de um lar.
— Ainda não são casados, certo? — George perguntou.
Dylan negou.
— Mas estamos noivos — eu falei.
— A adoção definitiva fica mais fácil se estiverem casados — ele
informou — Como estão noivos, acredito que o estado pode liberar para
adotarem temporariamente a Skyller.
— E então? Topam fazer uma entrevista hoje mesmo? — Jéssica
perguntou.
— Claro! — respondemos juntos.
Os assistentes sociais sorriam ao mesmo tempo.
— Serão ótimos pais — George disse.
— Com certeza! Aqui está o endereço do lugar que vocês têm que ir
para fazer a entrevista — Jéssica me entregou um cartão — Boa sorte aos
dois!
— Obrigada — eu agradeci.
— Nós que temos que agradecer por ter encontrado pessoas dispostas a
adotar tão rápido assim — George riu — Skyller é mesmo uma bebê
encantadora.
Concordei. Os assistentes sociais foram embora logo em seguida, eu e
Dylan ainda ficamos olhando a nossa filha dormindo profundamente no
berçário, tão serena e tão perfeita.
— Não sei como é ser pai — Dylan admitiu ao meu lado.
Segurei sua mão.
— Eu também não sei ser mãe, mas iremos aprender isso juntos com
ela.
Ele me olhou sorrindo.
— Nós iremos adotar uma criança, é o início da nossa família, eu não
consigo expressar em palavras o quão feliz eu estou.
— Eu também não consigo. Quem poderia imaginar que
encontraríamos nossa filha tão rápido assim?
Dylan me trouxe para mais perto do seu corpo e abraçou minha cintura,
minhas mãos seguraram sua nuca.
— Obrigada por me fazer viver dessa experiência incrível — ele
agradeceu — Não sei o que seria de mim se você não tivesse invadido a
minha propriedade naquele final da tarde.
Eu sorri acariciando sua nuca.
— Eu sei o que você seria. Um cowboy extremamente arrogante — o
provoquei.
Rimos.
— Minha vida não fazia sentido antes de encontrar você.
— Amo você, amo nossa futura filha, amo tudo isso — eu expressei
todo o amor que estava sentindo naquele momento.
— Eu também amo muito tudo isso.
Nos beijamos bem ali na frente da nossa futura bebê. Contentes por dar
início a nossa família, sem perder tempo sentindo medo e inseguranças por
saltar para um passo tão grande como esse.
O destino é assim.
Ele não escolhe tempo, hora ou lugar. Quando ele quer que duas
pessoas se encontre, move montanhas para que isso aconteça.
Eu e Dylan estávamos destinados a encontrar Skyller.
E eu precisei daquele sonho para acordar e enxergar o que estava bem
na minha frente: Skyller se tornou minha no momento que coloquei meus
olhos nela.
A vida é mesmo surpreendente. Se me contassem há dez meses que eu
não sentiria mais culpa pela morte de meu irmão, eu chamaria a pessoa de
idiota e insensível.
Mas aqui estava eu. Encerrando uma etapa importante na minha vida
com a Doutora Elena, que me ajudou em todos os momentos.
Hoje eu entendo mais que o que aconteceu foi uma fatalidade, algo que
infelizmente não podia ser mudado. A dor que eu sentia agora era apenas
saudades e ela nunca iria embora. Eu buscava conforto em lembranças boas
de momentos em que passamos juntos e nos divertíamos. Era tudo o que eu
podia fazer agora.
— Nos vemos no seu casamento? — Elena perguntou com um sorriso
no rosto.
— Claro que sim! Conto com sua presença lá.
— Eu não perderia por nada.
Me despedi dela e sai de sua sala. Aquela era a minha última consulta,
mas eu sentia que não era a nossa última conversa.
Elena, como disse no nosso primeiro encontro acabou se tornando uma
grande amiga.
Entrei dentro do carro que eu havia comprado há pouco mais de duas
semanas e dirigi em direção ao meu rancho.
Sorri comigo mesmo, aquele lugar deveria estar uma loucura. Faltava
duas semanas para o casamento e mesmo dizendo que eu e Dylan faríamos
uma cerimônia simples apenas com os mais próximos, Amélia e Alisson
insistiam em preparar o casamento do século.
Elas estavam muito empolgadas.
Estacionei o carro na sombra da árvore em frente ao casarão. Eu e
Dylan havíamos nos mudado definitivamente quando conseguimos a guarda
temporária de Skyller.
Sim, Skyller era nossa filha agora.
Ainda como temporários, mas já havíamos aberto o pedido de adoção
definitiva e ele estava em análise. Jéssica e George afirmaram que não
precisávamos temer, que com certeza o estado cederia a guarda definitiva de
Skyller.
Tudo o que sentimos naquele dia estava ainda mais vivo entre nós com
ela em nossos braços, em nossa casa. Em nenhum momento houve receio ou
arrependimento. Aquele era o lugar dela, junto com nós.
— Aí está você — Amélia falou assim que entrei dentro de casa, estava
com a minha garotinha nos braços — Precisa provar o vestido e temos que
aproveitar que Dylan saiu com Matthew para ver o terno.
— Não provamos ele semana passada?
Caminhei até ela e estendi os braços para Skyller, que se impulsionou
no mesmo momento para vir para o meu colo. Amélia me entregou ela e
disse:
— Mas precisamos ter certeza que ele está perfeito.
— Eu tenho certeza que está, mas se vocês fazem tanta questão.
Falei enquanto brincava com as mãozinhas de minha filha.
— Cadê o amor da mamãe? — Ela deu um gritinho com aquele sorriso
lindo no rosto — Onde está o papai, em? Não acredito que ele deixou você
com essas loucas.
Amélia revirou os olhos, mas acabou rindo.
— Graças a Deus você chegou! Precisamos provar o vestido — Alisson
entrou na sala — E estou um pouco nervosa com Matthew ajudando Dylan a
comprar um terno. Homens são tão práticos, eu não duvido que eles vão
escolher o primeiro que ver pela frente e ignorar todos os requisitos que
anotei para eles.
— Eu tenho certeza que eles farão isso — Rebeca apareceu logo atrás
dela — Não se preocupe, Raven, cuidamos muito bem de sua filha.
— Eu não esperava menos de vocês — falei e beijei o rostinho da
minha menina. Eu já a amava tanto.
— Já ligamos para encomendar o bolo com o sabor que vocês dois
escolheram ontem à noite, já encomendamos alguns salgadinhos e também os
champanhes sem álcool. Por que eu sinto que estou esquecendo alguma
coisa? —Alisson se perguntou enquanto andava de um lado para o outro com
o bloquinho de anotações em mãos.
— Não quero nem ver quando for o seu casamento — brinquei com ela
— Você está ansiosa desse jeito com o meu, imagina com o seu.
— Ainda falta alguns meses e eu consigo me preparar
psicologicamente até lá — ela disse — E por que você não está nervosa?
Faltam exatamente duas semanas e você nem ao menos disse que está
ansiosa.
Eu ri. Matthew havia pedido a minha prima em casamento há algumas
semanas, ela aceitou, obviamente, mas os dois se casariam só no próximo
verão na beira da praia da ilha de Outer Banks.
— Se você não percebeu eu tenho tudo o que preciso bem aqui, o
casamento vai ser apenas uma cerimônia para oficializar tudo.
— Concordo com a Raven. Ela e Dylan já tem uma filha e moram
juntos, quer mais vida de casados do que isso? — Rebeca concordou
enquanto se sentava ao lado de Amélia.
Minha filha soltou um resmungo e começou a puxar meus cabelos,
claramente pedindo atenção. Comecei a brincar com suas mãozinhas
enquanto a segurava com um braço.
— Sentiu minha falta, não é amor? — esfreguei meu nariz no seu.
Eu estava muito boba, confesso, mas como não ficar com aquela
garotinha linda do meu colo? Ela se tornou tão especial para mim e para
Dylan de uma forma que não sei o que faríamos se o pedido definitivo da
adoção fosse negado. Felizmente as assistentes sociais que visitavam nossa
casa com frequência para saber como cuidávamos de Skyller só nos
elogiavam. Então estávamos no caminho certo.
— Eu sabia! As rosas! Meu Deus, como eu fui me esquecer das rosas?
— Alisson exclamou e saiu da sala rapidamente em busca de algo.
— Minha irmãzinha está pirando, quando chegar no dela já terá surtado
— Amélia comentou.
Todas nós rimos, inclusive Skyller que deu um daqueles sorrisinhos de
lado que eu sou apaixonada.
— Quem é o amor da mamãe? — brinquei com seu narizinho.
Ela emitiu um som como se quisesse falar e levantava as mãos para o
alto para pegar o meu dedo.
— Amo você, meu amor — murmurei.
— Ravenna! — Alisson gritou do segundo andar — Você precisa vir
provar o vestido logo, daqui a pouco eles chegam.
Revirei meus olhos, mas fiz o que ela pediu ou então surtaria
totalmente, como Amélia havia falado. Entreguei Skyller para Rebeca e
subimos para o quarto vazio em que estávamos preparando tudo para o
casamento.
O cômodo estava uma bagunça. Havia fitas de todas as cores
espalhadas pelos cantos e toalhas de todos os tipos.
— Para que tantas toalhas azuis?
— Porque eu fiquei indecisa em qual tom usar — Ali explicou — Não
é como o branco que é só branco, azul tem tantos tons.
— Eu te falei o motivo que nos fez escolher o azul, nossos olhos. Era
só escolher o tom deles — falei.
— Damos atenção para isso depois, ok? Aqui está o vestido — Ela
pegou um saco enorme preto e abriu o zíper revelando a peça branca cheia de
detalhes.
— Então vamos provar.