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Título original: Bad Lies

Copyright © 2022 por Bianca Pohndorf.


 
 
Edição: Mari Vieira
Preparação de Texto: Mari Vieira
Revisão: Elaine Cardoso
Capa: Designer Tenório
Diagramação: Grazi Fontes
Ilustrador: Carlos Miguel Ilustrações
 
Esta é uma obra de ficção.
Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são
produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com
nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.
Todos os direitos reservados.
Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida por qualquer forma
e/ou quaisquer meios existentes sem prévia autorização por escrito
da autora.
Os direitos morais foram assegurados.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido pela lei nº.
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Versão Digital — 2022.
Sumário
Sinope
Nota de autora
Epígrafe
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítlo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Epílogo
Avaliações
Agradecimentos
 
Ouça a playlist de “Bad Lies” no Spotify. Para ouvi-la, basta abrir o
leitor de QR Code do seu aparelho e apontar a câmera para o
código abaixo:
 
Aos 13 anos, Aiden Thorne perdeu aquilo que mais amava:
seu pai, quando descobre que um tal “grupo” arquitetou e executou
o assassinato daquele que mais amava, ele prometeu para si que a
vingança será o prato principal que irá servir a todos daquela pacata
cidade.
 
Dez anos se passaram, e Aiden está pronto para colocar seu
plano em prática, agora não é mais um garoto indefeso, ele
aprendeu a viver nas sombras, ser hacker o ensinou que alguns
segredos nunca estão bem escondidos.
 
Madelyn Sutherland é uma garota que a vida inteira foi
oprimida por seu pai, tendo que acatar todas as suas ordens como
lei. Quando seu caminho se cruza com o novo jogador de Rugby da
cidade, os olhos carregados de mistérios atiçam nessa garota todo o
seu desejo de pertencer a ele, mas o que ela não sabe é que a
submissão pode ter uma função bem mais prazerosa em sua vida.
 
Dizem que a vingança é como adrenalina, Aiden vai ensinar a
Madelyn que a vingança não só pode, como deve carregar algumas
pitadas de prazer.
 
Ele aprendeu a dominar;
Ela sempre foi dominada;
Eles são a combinação perfeita daquilo que chamamos de
desordem.
 
Algumas mentiras não podem ser tão ruins, ou podem?
 
New Adult; BDSM; Rugby; Hacker; Bad Boy.
 

 
Dedico este livro a você que encontrou esperanças mesmo na falta
dela, e, assim, conseguiu se desfazer das cicatrizes que lhe
habitavam.
 
 
Antes de embarcar na jornada de Aiden Thorne precisa saber
que:
Ele não é um herói, muito menos um vilão, é apenas a
consequência daquilo que o forjaram, um jovem que perdeu seu pai
aos 13 anos, e descobriu tão cedo do que a maldade humana é
capaz de fazer com as pessoas.

A vingança é a peça fundamental dessa história, mas não se


engane, de bom-moço Aiden não tem nada, o rastro do caos é um
elemento fundamental nesta história.

OS GATILHOS presentes neste livro podem trazer desconforto


para muitas pessoas, então acho importante que saiba que aqui
trato temas como: pedofilia, abuso físico e mental, violência
contra a mulher, consumo de drogas, violência com cenas
gráficas, práticas sexuais não convencionais.
Trata-se de um romance Dark, então, se porventura,
quaisquer um desses temas lhe fizer mal, não continue, leia um dos
meus romances mais leves.
 
“Bem-vindo ao meu mundo,
cuidado para não se perder no caos.”
Como pode, de todas as pessoas no mundo, ser ela a luz que
afasta à minha escuridão?
Logo ela, a filha do homem que me empurrou para o desastre.

Logo ela, que conseguiu remendar o que ele quebrou.


 
10 anos antes.

O filme de terror passa pela tela da televisão em frente aos


meus olhos. Um homem aterroriza algumas pessoas que alugaram
uma cabana no meio da floresta para passar o fim de semana. As
janelas do meu quarto estão fechadas, deixando o local
mergulhado  em um escuro perturbador.

Eu sempre preferi os filmes que fazem o meu coração bater


com força e as palmas das minhas mãos suarem em desespero.
Gosto da adrenalina causada pelas sensações do medo todas as
vezes em que uma cena perturbadora se desenrola na TV.

Minha mãe não gosta muito dessas coisas, ela sempre me


critica, diz que o mundo já é ruim o suficiente para assistir a filmes
de terror. Meu pai fala que ela é assim por conta da profissão,
mamãe é promotora de justiça, lida diretamente com o crime na
nossa cidade, enquanto papai é dono de um banco.
Tateio os cobertores em busca do meu celular, encontrando-o
enroscado nos lençóis, encaro a tela desbloqueada procurando por
alguma mensagem do Miles, meu melhor amigo, mas não encontro
nada. Ele ficou de vir aqui em casa para jogarmos videogame, mas,
como sempre, está atrasado.

Um grito de desespero me faz estremecer e erguer os olhos


para a televisão, o serial killer caça uma mulher e está prestes a
matá-la, assim como fez com todos os seus amigos antes.
Que idiota! Quem é que foge de um assassino em série e sai
gritando e ao mesmo tempo dando a sua localização? Bufo.

Se ao menos a cidade tivesse algo de interessante para se


fazer no tempo livre, eu não precisaria ficar assistindo a filmes tão
tolos quanto este.

Jogo as pernas para fora da cama, me direciono até a


televisão e pressiono o botão, desfazendo-me da imagem que
passava na tela. Coloco as mãos na cintura e encaro o teto liso,
vasculhando em minha mente algo para fazer e me tirar do tédio
mortal.

Meu estômago ronca, um alerta de que eu não comi nada além


do almoço. Deixo o quarto e caminho em direção a cozinha, pulando
os degraus da escada de dois em dois. A casa está silenciosa,
papai está no trabalho e mamãe atarefada em seu escritório.

Misturo cereal com leite dentro de uma vasilha e dou a primeira


colherada. O barulho da mastigação reverbera pela cozinha,
quebrando o silêncio.

Observo o quintal através da janela, os carvalhos fazem


sombra sobre as espreguiçadeiras que descansam à beira da
piscina. O vento bate contra as folhas, soprando-as pela grama
verde e aparada.

A campainha toca, quebrando o feitiço que mantinha os meus


olhos fixos no quintal. Pulo da banqueta, limpo as mãos molhadas
pelo suor do leite nas minhas calças e vou até a porta,
escancarando-a sem nem mesmo conferir.

Xerife Sherwood aguarda no rol de entrada, as mãos estão nos


bolsos do uniforme, a estrela que carrega no peito brilha, ofuscando
por um momento a minha visão. Ele é um homem de idade próxima
aos meus pais, cabelos escuros, alto e robusto. O bigode que
acentua a parte de cima da boca lhe deixa um tanto engraçado, mas
ele mexe nas pontas com vasto orgulho.

– Olá, xerife – cumprimento-o, a mão fechada em punho na


porta.

Os olhos escuros do xerife encontram os meus, há um ar


pesaroso em seu semblante, os lábios estão franzidos para baixo.
Ele pigarreia.

– Como vai, rapaz? – Estufa o peito e encara a sala vazia atrás


de mim. – Estou procurando a senhora Thorne, me informaram em
seu trabalho que ela estava em casa.
Claro que sim; com a ausência da senhora Wild, mamãe
precisou ficar em casa para não me deixar sozinho. A senhora Wild
é a nossa governanta, ela trabalha conosco desde que eu me
lembro, sempre carinhosa e prestativa. Sei que ela possui uma filha
problemática, a menina fugiu de casa e deixou o filho para a
senhora Wild criar, parece que a criança amanheceu doente e por
isso ela precisou faltar.

– Ela está em casa – Confirmo com um leve aceno de cabeça.


– O senhor gostaria de entrar? – Empurro a porta ainda mais para o
lado.
Não é incomum ver o xerife em nossa casa, por ser a única
promotora de justiça da cidade, mamãe recebe visitas frequentes,
tanto dele quanto dos outros policiais que trabalham com ele.
O homem atravessa a porta com as mãos ainda nos bolsos e
consigo reparar nos músculos rígidos das suas costas. Seja lá o que
tenha acontecido, não parece ser nada bom.

– Vou chamar ela – aviso, fechando a porta e me afastando.


O escritório fica no fim do corredor do primeiro andar. Longe da
sala e dos quartos para impedir qualquer intervenção da minha
parte ou de papai, afinal, ela odeia ser interrompida enquanto
trabalha. Paro de frente para a porta fechada e respiro fundo, antes
de empunhar a mão e bater contra a madeira fina.

Só ouço silêncio do outro lado e sei que estou sendo ignorado,


giro a maçaneta e entro, sem esperar por uma resposta que nunca
irei receber.

Papeis cobrem todo o tampo envernizado da mesa amadeirada


do escritório, mamãe está inclinada sobre ele, os olhos correm de
uma linha para a outra. A parede do fundo é coberta por uma
estante onde vários livros de direito e economia cobrem cada canto.
Há uma janela que tem vista para o jardim, mas está fechada,
isolando-a do mundo exterior.

Pigarreio.
– Mãe... – minha voz morre assim que ela ergue a cabeça para
me encarar, seus olhos estão vazios, opacos, como se uma
profunda tristeza estivesse acometendo a sua alma. Os cabelos
escuros caem sobre o rosto com o movimento, quebrando a ligação.
– O xerife está aqui.

Ela espreme os olhos com força e gira a cabeça para cima, um


suspiro resignado deixa o seu peito.
– Diga a ele que estou indo. – Se levanta, a coluna está ereta
sob o blazer verde-musgo que veste e faz conjunto com a saia que
cai aos joelhos, os saltos ecoam no piso laminado. – E você, vá
para o seu quarto, o assunto é sigiloso – diz, lançando-me um olhar
ameaçador.

Eu sempre achei a minha mãe uma mulher incrível, ela é forte


e determinada, não deixa nada e nem ninguém atrapalhar os seus
planos. Mas, com o tempo, descobri que ela também é fria e
distante, bem diferente das mães dos meus amigos, mas nunca me
importei na verdade, não quando papai sempre fez questão de
suprir a falta de afeto vindo da parte dela. Ele é meu melhor amigo
no mundo todo e a pessoa que eu mais amo.

– Tudo bem – confirmo, balançando os ombros com


indiferença.
Óbvio que não vou seguir as suas regras, já estou entediado o
bastante para ouvir cada detalhe da conversa e depois ir fofocar
com Miles e tentar desvendar o mistério do novo crime cometido
nessa cidade em que nada de interessante acontece.
Giro nos calcanhares e me direciono até as escadas, às
minhas costas posso ouvir o seu salto bater enquanto ela percorre o
corredor indo em direção contrária. O rol do segundo andar serve
com uma sacada para o primeiro, o único problema é que é todo em
vidro, então preciso encontrar um lugar melhor para me esconder.
Caminho até o meu quarto e bato a porta com força como se tivesse
acabado de entrar nele, sei que mamãe não iniciaria a conversa se
eu não fizesse isso, essa não é a primeira vez que espiono os seus
assuntos.

Na ponta dos pés, me ajoelho contra uma das poltronas


escuras que fica contra o vidro da sacada, nessa localização posso
tanto ouvi-los quanto vê-los.

– Sim? – diz mamãe, em tom direto.


Ela para de frente ao xerife, posso ver o topo da sua cabeça,
não o seu rosto, pois ela é alguns palmos mais baixa que o homem.
– Eu vim trazer notícias... – responde, coçando o maxilar com
as pontas dos dedos, pesaroso. – Aconteceu, Grace, eu sinto muito.

Ouço uma oscilação deixando o corpo de mamãe.

– O que aconteceu, seja mais específico? – grunhi,


controlando-se para manter o tom de voz neutro.
O xerife solta um lento e profundo suspiro.

– Seu marido foi morto, Grace. – A voz não passa de um


sussurro.

Arregalo os olhos e mordo os lábios com força para conter um


grito, sinto o gosto ferruginoso na boca, mas não me importo nem
um pouco com isso. Estou sufocando em uma maré de abismo
profundo e alucinante. Meu corpo não corresponde, não consegue
acompanhar as voltas que a minha mente está dando.

Mamãe segura os braços do sofá, as pernas não possuem


força o suficiente para mantê-la em pé.
– Co-como? – A voz treme, não consigo ver os olhos, mas
posso sentir as lágrimas através do seu tom.

O xerife dá um passo em sua direção e segura o seu braço,


ajudando-a a se manter em pé.
– O grupo – murmura, ainda segurando com firmeza minha
mãe.
Mamãe solta um soluço misturado com a dor do choro, sem
condições de se manter, escora-se contra o encosto do sofá,
trêmula e abatida.

– Quan-quando? – gagueja, fungando.


Eu continuo imóvel, mergulhado na minha própria dor, me
afogando em agonia a cada segundo que passa, a cada palavra que
eu escuto, mais e mais. Morrendo a cada instante, até não restar
nada.

– Agora a pouco, quando saiu do trabalho.

Balanço a cabeça, consternado demais para pronunciar


qualquer palavra que seja. Eu sei por que ele estava saindo mais
cedo do trabalho, ele ia passar no mercado para comprar algumas
coisas para o jantar, já que Miles está vindo para cá.
– Co-como? – repete a pergunta, balbuciando-a, trancando o
choro enquanto pode.

O xerife leva a mão à nuca, retraído.


Um grito furioso e agoniado deixa os lábios de mamãe, ela se
curva para a frente e leva a mão ao peito, apertando-o com força.

– DIZ! – grita, desesperada.


– Um tiro na cabeça enquanto saía do mercado – cicia o
homem, claramente desconfortável em ser o portador da notícia. –
Encontraram ele há alguns minutos caído no meio do
estacionamento. Foi tudo rápido e muito bem articulado, ninguém
viu ou ouviu nada, só encontraram o corpo.

Minhas pernas falham, forçando-me a sentar no chão e perder


a visão que eu mantinha deles. Espalmo a mão no peito, sentindo
que os meus pulmões estão fazendo força para trabalhar, já que o
ar parece ter sumido do ambiente, como se tivesse sido sugado.
Lembranças do meu pai me alvejam, coloco a mão nos lábios e
mordo com força, rompendo a pele, o sangue banhando a minha
língua.

– Quem? – Ouço mamãe perguntar através do torpor em que


eu me encontro.
O xerife faz um barulho com o fundo da garganta.

– Paul estava se metendo em algo maior que ele, investigando


contas que não deveria...

– QUEM? – brada com força, deixando o abalo ceder, a raiva


assumindo.
– Sutherland – diz, e eu preciso fazer força para conseguir
ouvir o nome com coerência.

Sutherland.

O maldito prefeito da cidade.

Por quê?

Deus, como isso dói. Arde tanto que eu sinto como se alguém
estivesse rasgando o meu peito e estraçalhando o meu coração
com as próprias mãos, partindo-o em inúmeros pedaços, até não
haver mais conserto, até não restar mais nada. Nada além de
sombras e escuridão.

Meu pai.

Meu melhor amigo.


Não ouço o restante da conversa, embora eu saiba que eles
estão falando alguma coisa, o burburinho baixo das vozes atinge os
meus ouvidos, mas minha audição está distante.

Eu estou morrendo por dentro.

Deitado no silêncio da minha alma. Me refugiando em mim


mesmo, enquanto eu quebro, me desfazendo em pó.

Morto. Meu pai está morto. Assassinado de maneira cruel por


Sutherland.
Afinal, qual é o preço de uma vida?
Tapo os meus ouvidos e me encolho balançando o corpo para
frente e para trás. Não consigo ver nada, as lágrimas tingem a
minha visão.

Eu não passo, nesse momento, de uma montanha de cinzas.


Um desastre ambulante, quebrado e sem esperanças.

Morto.

E eu estou morrendo junto com ele, sem ninguém para me


salvar.

Me mantenho imóvel no mesmo lugar em que estive pelas


últimas horas, sem reação. Pisco, encarando o cenário à minha
frente. Nossa casa está repleta de pessoas que deslizam por aí
vestindo cores escuras.

Mais cedo nós estivemos no cemitério e, sem muita comoção,


enfiaram meu pai debaixo da terra como se ele não importasse mais
nada. E, simples assim, ele sumiu para sempre, não passando de
um cadáver soterrado.

Pela visão periférica, noto Miles se aproximando. Ele se senta


ao meu lado e fica em silêncio por um momento, me dando um
pouco de tempo e privacidade.

– Seu pai era muito querido, tem muitas pessoas aqui –


comenta, levando um copo de suco aos lábios.

Não respondo, porque não me importo nem um pouco com


isso. São todos falsos, nenhum deles de fato se importa com a
morte dele, só estão aqui para prestar condolências à família em um
gesto educado, mas assim que saírem pela porta, esquecerão tudo.

A morte de Paul Thorne não marcou nenhum deles, não como


marcou a mim.

– Quer um pouco? Está muito bom, foi a minha mãe que fez. –
Miles estende o copo na minha direção e eu permaneço imóvel, sem
esboçar qualquer reação. Ele suspira, recolhendo o copo de volta. –
Cara, você precisa reagir.
Acontece que eu não sinto vontade nenhuma de reagir, não
consigo desencadear nenhuma reação. Nada é capaz de me puxar
para fora desse desastre. Nada.
A porta da frente é aberta e o desgraçado do prefeito entra
acompanhado da mulher e da filha. O filho da mãe que matou o meu
pai – o assassino. Ele está usando um terno preto, os cabelos
escuros estão impecáveis e o semblante é impassível, ele não
demonstra nada, nem mesmo arrependimento.

Aperto as mãos em punho ao meu lado e trinco a mandíbula


com tanta força que um músculo estala. Miles me lança um olhar
enviesado.

– Cara, isso só vai te meter em problemas, sabemos como


essa gente é – avisa, rígido.

Eu sei o porquê esse desgraçado está aqui, ele é o prefeito da


cidade e meu pai era um bancário importante, como um bom político
ele precisa prestar as condolências à família enlutada.

Raiva pura infla o meu peito, uma lágrima solitária rola pela
minha bochecha esquerda. O corpo reagindo, explodindo de alguma
forma, já que eu não posso socar esse homem, não agora, não
ainda.
– Aiden, você precisa se acalmar – Miles se inclina para
sussurrar próximo ao meu ouvido – ele vai vir até aqui te dar os
pêsames e eles não sabem que nós sabemos.

E nem irão saber tão cedo. Não até que eu tenha me vingado
da morte do meu pai. Não até que eu coloque o assassino na
cadeia.

A única pessoa que sabe toda a verdade é Miles, foi o único


para quem contei tudo o que eu descobri e ouvi. Grace não faz
ideia, mas percebeu, assim que pôs os olhos em mim, que eu me
envolveria em problemas por conta da morte, então de imediato
entrou em contato com a minha avó paterna e assim que o velório
terminar, irei embora da cidade com ela.
Sutherland cumprimenta a minha mãe, apertando a sua mão e
proferindo lamentações falsas. Sua esposa faz o mesmo, mas a
criança que lhes acompanha permanece presa às pernas da mãe,
assustada com o clima fúnebre à sua volta.

– Eles estão vindo – comenta Miles como se eu não estivesse


prestando atenção, quando não consigo tirar os olhos do homem e
imaginar mil e uma formas de vingança.

Eles se aproximam, a postura ereta, os olhos claros são frios


como gelo.

– Rapaz, sinto muito pela morte do seu pai – fala, esfregando a


palma da mão na minha cabeça.

Continuo sem reação, ignorando-o, encarando o meu colo para


evitar a sua presença. Sutherland franze o nariz fino, incomodado
com o meu comportamento, ou a falta dele.
– Ele era um bom homem – acrescenta, dando um passo para
o lado para que a esposa possa chegar a mim.
A mulher profere algumas palavras que são perdidas na minha
mente distante e turbulenta, ouço o nome de Deus sendo proferido,
assim como o nome do meu pai e um “tudo vai ficar bem, era o
propósito dele”. O que soa tão ridículo quanto o próprio assassino
estar aqui se lamentando. Ao terminar, ela segue o marido,
acompanhando-o nas centenas de cumprimentos que terão pela
frente.

Permaneço do mesmo jeito por mais alguns segundos,


absorvendo a presença do desgraçado, consternado em uma mente
quebrada.

Ouço um pigarreio singelo. Ergo os olhos e encontro a filha do


prefeito parada em minha frente, os cabelos castanhos estão
alinhados, presos no topo da cabeça e os olhos castanhos são
doces, diferentes dos olhos do pai.
– Eu sinto muito pela sua perda – profere, e sinto verdade no
que ela diz. – Espero que fique bem.

A menina não parece ter mais do que dez anos de idade,


mesmo assim, parece tão madura que chega a ser estranho. Ela
agarra o tecido fino do vestido cor-de-rosa que veste, amarrotando-o
com as mãos.

– Qual é o seu nome? – pergunto.

Miles ofega ao meu lado.


Depois que contei tudo para ele, eu não disse mais uma única
palavra para ninguém, há três dias.

Uma cor cobre suas bochechas, destacando-as ainda mais.

– Madelyn, mas todos me chamam de Maddie.

Balanço a cabeça em um singelo sinal.


– Obrigado – respondo em um sussurro, porque, de todo esse
mar de pessoas, a única que eu realmente senti verdade nas
palavras, foi ela.

Madelyn olha para os lados, as mãos continuam contorcendo-


se contra o tecido.

– Eu preciso ir até os meus pais – avisa, dando um passo para


trás. – É... até mais.
E, como um balde de realidade, eu lembro de quem ela é filha,
o sangue que carrega nas veias e o sobrenome que leva. Madelyn é
filha do demônio, do homem que desgraçou a minha vida.
– Nem acredito que você falou – cicia Miles ao meu lado.

Ignoro-o, os olhos fixos na garotinha que sorri para as pessoas


com sinceridade e carisma. Todos a cumprimentam de volta, felizes
com a atenção que a princesinha da cidade distribui.

– Eu vou me vingar – aviso para ninguém em específico.

Miles se engasga com o suco que estava bebendo.


– O quê? – pergunta, sinto a sua mão tocando em meu braço.

– Eu vou fazer com que ele pague pela morte do meu pai.
Cada um deles.
Miles me puxa, forçando-me a encará-lo.
– Eles são perigosos, Aiden e você não passa de um garoto
idiota de treze anos de idade.

Um sorriso delineia os meus lábios fazendo Miles estremecer.


– Eu não disse que seria agora – contraponho, alimentando a
raiva a cada segundo. – Quando eu voltar para a cidade, estarei
pronto e vou derrubar um por um, até não restar mais ninguém.
Miles esfrega os cabelos com a mão livre.

– Droga, ficou maluco?

Balanço a cabeça.

– Eles me destruíram, Miles. – Aperto os lábios, inspirando o ar


profundamente enquanto observo mamãe conversar com o prefeito
e a esposa. – E alimentaram um demônio no processo, o
responsável pela ruína deles.

– Se vingar não trará o seu pai de volta – insiste, tentando me


persuadir a tirar isso de cabeça.

Amplio o sorriso.

– Para toda ação existe uma reação. Não é vingança, é a Lei


de Newton, a famosa lei do retorno.

Miles não fala mais nada, as palavras morrem dentro do pavor


em que ele se encontra. E eu não preciso que ele diga, porque nada
e nem ninguém pode me impedir.

O Aiden que ele conheceu morreu junto com o pai. O bom


garoto, se foi. Eles mataram o melhor de mim, eles assassinaram
quem eu era. Agora precisarão aceitar as consequências do
monstro que eles mesmo ajudaram a criar.
 
10 anos depois.

Prendo os meus cabelos no alto da cabeça e lanço um último


olhar no espelho conferindo o meu reflexo. Estou vestindo uma
calça legging preta, blusa de alça escura e tênis esportivo, pronta
para a minha corrida matinal com Emy. Há manchas escuras abaixo
dos meus olhos castanhos em decorrência da noite mal dormida,
mas, fora isso, ninguém pode afirmar ao olhar para mim que passei
um terço da noite chorando.

Balanço a cabeça, desvanecendo minha mente das


lembranças.

Caminho até a cama e recolho o meu celular, confiro a tela de


bloqueio aliviada por não ter nenhuma notificação ainda, o que
significa que não estou tão atrasada assim. Abro a gaveta do
aparador e retiro os fones de ouvido de dentro, antes de deixar o
quarto.
Emy e eu saímos para correr todos os dias no final da tarde,
usamos esse tempo para conversar e espairecer e já aproveitamos
para praticar alguma atividade física.

Desço as escadas pulando alguns degraus para chegar mais


rápido ao limiar. Mamãe está sentada em uma das poltronas da sala
com um livro em uma mão e uma xícara de chá na outra, assim que
nota a minha presença, seus olhos deixam o livro para me encarar.
– Vai sair, meu bem? – pergunta, a voz doce e melosa.

Mamãe é linda e delicada, se eu fosse descrevê-la como nos


livros de romance que costuma ler, diria que é uma lady. Os cabelos
ruivos estão presos em um coque, mas a cor não deixa de ser
reluzente ou menos bonita, pois é incrível. Os olhos castanhos
possuem marcas de expressão, e, ainda assim, são os mais
amistosos que já encarei. Ela está vestindo um hobby rosa florido e
parece relaxada, aproveitando o momento favorito de lazer.

– Hora do treino com a Emy – aviso, arrumando os fones e


colocando o celular na braçadeira.

Ela toma um gole do chá, antes de pousar a xícara na mesinha


ao lado.

– Cuidem-se e voltem antes de anoitecer, não quero as duas


correndo por aí no escuro – ordena em tom maternal.

Caminho até ela e planto um beijo no topo da sua cabeça,


inspirando o cheiro de flores que seu cabelo costuma expelir.

– Pode deixar, uma corrida rápida, nada demais. – Aponto com


o queixo para o livro. – Qual é esse?

Um sorriso franze os seus lábios.


– Um romance entre uma jovem escritora do futuro e um
Duque do passado.

Ela ama romances de época, a estante do escritório de papai


está repleta de vários títulos parecidos com esse. Ela conseguiu
poluir toda a estante, tornando parcos os livros de política no meio
de tantos romances.

– Hum, parece bom. – Me afasto, caminhando até a porta de


entrada. – Depois me conta se realmente gostou, talvez eu leia.

Seus olhos assumem contornos de diversão.

– E desde quando você lê esses livros, Maddie? – Sinto o tom


de zombaria em sua voz.

Faço um movimento com os ombros.

– É... tem razão, prefiro os mais picantes. – Pisco, soltando


uma risada ao ver o tom rosado que cobre as suas bochechas.
Enquanto mamãe prefere os romances comportados, eu gosto
de ler putaria de todos os tipos, desde que tenha. E não tenho
vergonha alguma de admitir isso, pois é um gênero literário, assim
como tantos outros. Por mais que os estudantes de literatura inglesa
prefiram os clássicos, posso ser considerada um exemplo fora dos
padrões.

– Volte cedo! – fala. Giro a cabeça para encará-la sobre o


ombro. – Eu amo você – completa, terminando sua despedida.

– Também amo você, até mais.

Empurro a porta da frente e inspiro o ar gelado que arrepia os


cabelos da minha nuca. A temperatura não está condizente com o
que eu estou vestindo, mas isso irá mudar em segundos, assim que
eu começar a correr. Coloco os fones nos ouvidos e clico no play, a
música alta e animada entoa, quebrando qualquer som exterior além
da melodia.
Começo a correr, meu coração acelera e minha respiração se
torna mais densa, forçando o meu peito a subir e descer em rápidas
sucessões. Fecho os olhos, apreciando a sensação da adrenalina
que corre pelas minhas veias e torno minha mente vaga, diluindo
qualquer pensamento intrusivo sobre o que aconteceu ontem,
aliviando a tensão que estava sob as minhas costas, tornando os
músculos rígidos.
Mantenho o ritmo pelos próximos minutos, sem diminuir as
passadas, nem mesmo quando minha garganta seca e meu peito
esquenta implorando por respirações lentas e calmas. Ao virar a
esquina, encontro Emy me esperando sentada na varanda da sua
casa. Ela parece descontente, as pernas estão cruzadas, o cotovelo
descansa sobre o joelho e o rosto sobre a mão. Os cabelos loiros,
lisos e sedosos, estão presos como os meus, os olhos azuis me
encaram com profundidade e um ponto de interrogação explícito.

Retiro um dos fones do ouvido.


– Eu sei, mas me atrasei pouco tempo – falo, parando a alguns
metros de distância.
Emy se levanta em um movimento e leva as mãos à cintura
fina.

– Sabe muito bem que não é por isso que estou puta com
você! – contrapõe, um tom de irritação em sua voz.

Franzo as sobrancelhas e dou um passo para trás.

– Então não sei o verdadeiro motivo – digo, embora eu e ela


saibamos que estou mentindo.
Emy balança a cabeça, repreensiva, e solta um suspiro.

– Vai me contar cada detalhe, e só então, decidirei se vale a


pena manter Lennon vivo ou não – retruca, pondo-se em
movimento.
Caminhamos em silêncio por alguns segundos, afastando-nos
da casa. Entramos em uma rua pouco movimentada, as sombras
das árvores cobrem todos os cantos, impedindo que os raios de sol
permeiam o caminho.

– Então? Estou esperando. – Emy vira o corpo em minha


direção, sem perder o ritmo dos passos.

Mordo as bochechas e mantenho minha visão fixa à nossa


frente. Folhas de cascalho voam pelo chão cimentado fazendo um
barulho seco. Não há ninguém além de nós duas nesse trecho e é
justamente por esse motivo que é o nosso favorito para caminhar e
espairecer.
– Maddie... – insiste em um suspiro.

– Eu e Lennon terminamos – confesso, ainda sem coragem de


encará-la. – Ontem à noite descobri que, durante todo o nosso
namoro, ele me traía com Gretha.

A sensação é tão dolorosa; como se mil agulhas estivessem


espetando a minha pele. Lennon e eu namoramos pelos últimos três
anos. Ele é filho do xerife da cidade, nossas famílias são amigas
antigas, e isso tornou as coisas mais fáceis para nós, pois o namoro
foi aceito e aplaudido antes mesmo de começar.

Lennon é dois anos mais velho que eu e sempre mantivemos


um relacionamento amigável, até as coisas mudarem depois de uma
festa de Halloween na casa de uma garota da escola, quando nos
beijamos e nunca mais perdemos o contato.

– Com certeza eu irei matá-lo – grunhi Emy, apertando as


mãos em punho. – Aquele filho da puta desgraçado!

Pisco para afastar as lágrimas, Lennon não vale o meu


sofrimento, muito menos a minha dor. Ele não respeitou os meus
sentimentos, não respeitou o nosso relacionamento, então de mim
de hoje em diante só terá a minha indiferença.
– Não vale a pena. – Passo uma mão nos cabelos, girando a
cabeça para encará-la. – E eu nem queria mais, lembra? Estava
pensando em terminar muito antes de descobrir tudo isso.
Em algum momento do nosso relacionamento, nós nos
perdemos no meio do tumulto. Lennon e eu nos tornamos
incompatíveis, ele não tinha mais tempo para mim e eu não queria
ter tempo para ele. Mas, isso não diminui o fato de ele ter me traído
com Gretha por todo esse tempo.

– Como você soube? – indaga, controlando o temperamento


tempestuoso.
Um homem surge na nossa linha de visão, ele corre em nossa
direção, exercitando-se. Espero ele se aproximar, então passar por
nós e se afastar o suficiente para que não possa ouvir a nossa
conversa, antes de responder a sua pergunta:
– Eu vi uma mensagem no celular dele de um número
desconhecido, eles estavam marcando um encontro para tratar de
assuntos urgentes, então peguei o meu carro e fui até o local. – Emy
abre a boca para protestar, mas eu continuo falando, impedindo-a. –
Eu vi quando Lennon parou o Jeep e Gretha entrou no carro, assim
como os vi se beijando. – Trinco a mandíbula quando os detalhes da
cena alvejam a minha mente, me inundando.
– Primeiro, estou furiosa contigo! – Emy levanta o dedo em
riste. – Eu queria ter ido junto, queria estar presente quando
descobriu tudo.

Um sorriso sincero brota em meus lábios.


– Pra quê? Pra descer do carro e quebrar a cara dele? –
Lanço-lhe um olhar zombeteiro.

Isso seria a cara dela, Emy é muito explosiva e pularia para


fora do carro no momento em que Gretha embarcasse no Jeep de
Lennon. Tenho certeza de que a minha melhor amiga não só se
contentaria em quebrar a cara do meu ex-namorado, como
destruiria o carro que ele tanto ama.
Emy não tem nem mesmo o descaramento de contestar o que
eu disse.

– Óbvio! – confirma, me fazendo soltar uma gargalhada


estrangulada. – E o que você fez depois que descobriu?
Um vento forte sopra os meus cabelos para a frente do meu
rosto, afasto as mechas finas com as pontas dos dedos.

– Eu tirei uma foto, então enviei pra ele com uma mensagem
informando o rompimento do nosso relacionamento. Depois exclui
todas as nossas fotos juntos e bloqueei o contato dele, quando
começou a me ligar como um louco, não me deixando em paz.
Não foi covardia da minha parte ter rompido o nosso
relacionamento por mensagem, eu só não queria olhar para a cara
do desgraçado! Me doeu muito o que Lennon fez, pois, embora eu
não sinta mais nada por ele além de amizade, ainda assim, o
respeitava e esperava que fosse recíproco.

– E se ele for na sua casa?


– Ele não vai, não quando sabe que eu tenho provas da traição
e não quando sabe que o pai dele iria matá-lo por isso.

O xerife respeita muito o meu pai, sendo assim, se chegar a


desconfiar que o filho me traiu, ele mesmo o mataria, sem Emy
precisar sujar as mãos. E é por isso também que não contei aos
meus pais, só comuniquei que terminamos o nosso namoro por falta
de parceria e sentimentos.

Meus pais não se envolveram, embora o meu pai tenha me


lançado um olhar duro e cheio de promessas rigorosas. Mas eu já
estava esperando por isso. Na verdade, acredito que tenha sido
justamente esse motivo que me fez postergar ainda mais o término
iminente do namoro. A liberdade que o relacionamento trazia.

Emy fica em silêncio por um momento, pensativa.

– Acho que ele não vai deixar isso pra lá, tenho certeza de que
Lennon vai achar outros meios de chegar até você.
Encaro-a, sorrindo.

– Seria perfeito, assim você terá a oportunidade de quebrar a


cara dele.

Emy gargalha alto, um brilho ferino pisca em seus olhos.

– Pode apostar que farei isso, se eu já não gostava muito dele


antes, agora mesmo é que eu o odeio.
Minha melhor amiga nunca foi a fã número um do meu
namorado, Emy sempre teve um pé atrás com Lennon, mas
aprendeu a... conviver com ele por causa de mim. Agora eu entendo
que era o seu sexto sentido avisando que ele não prestava, pena
que não dei ouvidos na época.

Suspiro, abstendo-me do que aconteceu. Já chorei e


extravasei a minha mágoa, agora é vida que segue.
Independentemente, nosso namoro estava fadado ao fracasso no
momento em que percebi que não amava mais Lennon.

– Sabe de alguma festa legal pra gente ir? – pergunto, ao


virarmos em uma esquina e o sol bater em nossos rostos assim que
saímos do rastro de sombra da rua anterior. – Miles deve saber de
algo.

Emy bufa.
– Claro que deve saber, mas acho que ele não vai ser muito
útil por agora.
Sinto a minha testa franzir.

– Como assim?

Miles é o irmão mais velho de Emy, ele é simplesmente a


pessoa mais divertida que eu já conheci. Por causa da pouca
diferença de idade – dois anos –, Miles e Emy se dão muito bem e
costumam ir à festa juntos.

– O melhor amigo dele está voltando para a cidade e Miles


está envolvido nisso, ele é pura ansiedade e animação.

– E quem é?

Emy faz um movimento de desdém com as mãos.

– Você deve se lembrar dele, ele era filho do sócio do meu pai.
– Vasculho a minha mente em busca de algo, mas não consigo
lembrar de nada, então Emy continua: – A mãe é a promotora de
justiça, à senhora Thorne, o pai morreu há uns dez anos, eu acho,
daí ele foi embora.
Arregalo os olhos ao lembrar vagamente da situação.

– Ei, o pai foi o homem assassinado no estacionamento? –


Emy concorda com um sinal. Abro a boca em espanto. – Nossa
senhora, eu nem lembrava mais disso, mas por que ele foi embora
da cidade e deixou a mãe sozinha?

Emy mexe os ombros.


– Parece que ele se revoltou, então a mãe o mandou para a
casa da avó paterna por todos esses anos – revela, brincando com
os cabelos entre os dedos.
Coitado do garoto, me lembro como a cidade ficou chocada
com o assassinato. Também lembro de ouvir o quanto o pai dele era
um homem bondoso e simpático e como falavam que não havia
motivos para o que aconteceu. E lembro que nunca encontraram o
assassino.

– E ele voltou por quê? – refuto, curiosa.

– Eu não sei, só sei que Miles está surtando com isso e talvez
faça uma festa para comemorar o retorno do amigo.

Abro um largo sorriso.


– Bem, então teremos uma festa no final das contas.

Emy responde ao meu sorriso.

– É, acho que sim! – confirma.


 
Retiro um cigarro de dentro do maço e coloco-o entre os meus
lábios. Acendo e dou uma tragada, expelindo a fumaça pelo nariz.
Observo a vista do jardim da casa da minha mãe, admirando as
sombras que se espalham pelo gramado. As árvores parecem
maiores do que da última vez em que estive aqui olhando através
dessa mesma janela, há dez anos.

Eu nunca mais coloquei os pés nessa cidade desde a morte do


meu pai, até agora. Fui embora prometendo vingança ou justiça,
depende do ponto de vista, e aqui estou pronto para cobrar e punir
cada envolvido, mas tenho um alvo bem certo.

– Tudo pronto para a festa – diz Miles, entrando na cozinha


com o celular nas mãos.

Encaro-o sobre o ombro.


– Avisou a cidade inteira? – pergunto. Miles confirma com um
aceno. – Ótimo, não quero nada menos que um retorno triunfal, no
estilo de Edmond Dantès[1].
Miles dá alguns passos e para ao meu lado. Retiro o cigarro da
boca e ofereço a ele que nega com um sinal de desdém com as
mãos.

– Tem certeza disso?


Embora sua pergunta seja enigmática, não preciso mais do
que dois segundos para entender, assim como para saber a
resposta. Eu passei minha vida toda ansiando por este momento,
cada mísero movimento que eu tive nos últimos anos foi calculado
para que pudesse estar aqui agora.

– Absoluta – respondo, tragando o cigarro profundamente.

Eu descobri coisas interessantes nos últimos anos ao


aprofundar o meu conhecimento em tecnologia e me tornar um
hacker profissional.

– Quem será o primeiro? – questiona, interrompendo o


silêncio.

Mexo os ombros e estalo a língua no céu da boca.

– Ainda não sei, talvez o juiz, ou o xerife..., talvez o mais fraco


e fácil de derrubar, preciso estudar melhor o plano.

Eu invadi muitos sistemas, dentre eles, o da polícia e o do


governo. Descobri o verdadeiro nome do assassino do meu pai, mas
não consegui comprovar a autoria dele no assassinato por causa do
lapso de tempo, mas consegui comprovar em alguns dos outros
inúmeros crimes que cometeu ao longo dos anos. O desgraçado
pegou pena capital – hoje está ardendo no inferno.

Com a primeira parte concluída, passei para à busca do


restante. Não foi fácil conseguir os nomes dos outros depois que eu
identifiquei o primeiro, levei anos até juntar todos os pontos e
conseguir tudo o que precisava para a identificação. Precisei invadir
o celular dele e as contas bancárias até chegar na primeira pista, e
só então soube do que se tratava o tão mencionado “grupo” e
descobri que se trata de um pequeno e seleto número de pessoas
que comanda esta cidade, dentre eles, as principais e mais
influentes figuras:

O prefeito;

O juiz;

O xerife;

E o homem mais rico da cidade, o irmão do prefeito;

O GSQCT - Grupo Secreto Que Comanda Tuscaloosa.

Meu pai entrou no radar dessa máfia por causa de um desvio


de dinheiro feito na conta da prefeitura. Ele estranhou e começou a
investigar, não cedendo às ameaças dos inimigos ou aos suplícios
da esposa. Então foi apagado, extinto do radar, como qualquer outra
pessoa que tente se meter nos negócios deste grupo.

– Sabe que pode contar comigo pra qualquer coisa, só não se


coloque em perigo. – Miles passa uma mão nos cabelos loiros,
preocupado e pensativo.

– Eu me coloquei em perigo no dia que jurei vingar a morte


dele, cara – refuto com a verdade.

Eu já me meti com gente sinistra o suficiente para não temer a


morte. Sou um hacker fodido pra caralho, assim como consegui
apontar o desgraçado nos crimes do sistema da polícia, já fiz coisas
muito piores, me envolvendo com gente perigosa para conseguir
algumas informações em troca. Claro que sempre mantendo a
minha verdadeira identidade no anonimato, mas não significa que
tenha me mantido fora do radar deles.
– Só não me deixe de fora – avisa, um comando misturado
com uma súplica.

Confirmo com um aceno de cabeça, mesmo que eu não esteja


sendo sincero, pois, jamais colocaria Miles nas minhas merdas, não
quando posso colocar a vida dele em perigo.

Apago o cigarro no mármore do balcão da cozinha e jogo a


bituca no lixo, expelindo a última fumaça de nicotina. Me viro para
Miles, seus olhos azuis me lançam um olhar analítico.
– Qual foi a merda agora? – Franzo a testa.

– Já foi no Dominators?
Sei que estamos sozinhos, mas, por precaução, olho para os
lados mesmo assim, garantindo que não há ninguém ouvindo a
nossa conversa.

– Ainda não, mas planejo ir na semana que vem, por quê?


Dominators é um clube de BDSM que eu e Miles fundamos
juntos usando o nome de alguns laranjas, já que não poderíamos
ser associados ao clube.
Descobri o BDSM há cerca de quatro anos com uma das
amigas da minha avó, a mulher era uma dominadora e viu o meu
problema com raiva e descontrole, assim como o meu instinto de
dominar. Ela, em segredo, me levou até o clube e me apresentou as
técnicas. Eu gostei tanto da coisa que levei Miles até o clube em
uma das suas visitas. Então decidimos que deveríamos criar um
clube em Tuscaloosa, uma maneira fácil de ganhar dinheiro sem
entrar no radar dos nossos pais com o que estávamos gastando.
Com o valor que ganhei de herança, investi no Dominators. Nunca
conheci o lugar, mas sei que é um sucesso e muito rentável, como
imaginávamos.

Miles confirma com um singelo sinal.


– E já está matriculado na faculdade?

Bufo.

– Tudo certo.
A faculdade é só um instrumento para jogar na cara das
pessoas que tenho uma formação, e claro, ter uma desculpa
plausível quando perguntam o que eu faço, afinal de contas, estudo
ciência da computação para aprender a mexer melhor nos sistemas
do banco quando for assumir o lugar que pertencia ao meu pai.

Eu não precisei de um diploma para acusar o assassino, assim


como não precisarei quando acabar com a máfia desta maldita
cidade.

Miles bate as mãos nas pernas causando um estalo que


reverbera pela cozinha silenciosa.

– Vou pra casa, quero ajeitar algumas coisas para a festa de


amanhã. – Me lança um olhar enviesado. – Se cuida, cara, e não se
meta em nenhuma merda, ainda.

Meus lábios franzem em um sorriso.


– Os jogos ainda não começaram, mas confesso que estou
bem ansioso para admirar a derrota de todos os jogadores.

Miles balança a cabeça em reprimenda e eu até acreditaria


nele, se não fosse os contornos de diversão em seus olhos, o filho
da mãe gosta tanto disso quanto eu.
Acompanho-o com o olhar conforme deixa a cozinha e some
das minhas vistas. Ouço a porta da frente bater, um sinal de que
estou sozinho em casa.
Coloco as mãos nos bolsos e volto a encarar os jardins,
evitando pensar no meu pai ou em todas as lembranças que essa
casa me fornece de uma infância feliz. Uma felicidade precoce
graças a um grupo de desgraçados.
Trinco a mandíbula e abafo o rugido que meu peito faz.

Transformei a dor em um ódio tão profundo que eu não sei


onde ele começa. E esse ódio é o combustível que me manteve nos
últimos anos. Sempre em frente. Sempre mirando a vingança.

Bebo um gole da cerveja que Miles me entregou, o líquido


amargo e quente desce pelo meu esôfago me forçando a fazer uma
careta com o gosto.

A sala de estar dos Portman foi transformada em uma pista de


dança, os sofás afastados e o lustre que costuma iluminar o cômodo
foi retirado para evitar desastres desnecessários. A geladeira
também foi invadida, latas e mais latas de cerveja tomaram conta de
cada canto.

Observo as pessoas entrando através da porta aberta, alunos


da universidade do Alabama, jovens que buscam divertimento e não
se importam com o significado da festa. Eles sabem que eu retornei
para a cidade e que isso tudo é para comemorar a minha volta, mas
até agora ninguém se importou em vir atrás de mim e me dar as
boas-vindas ou me cumprimentar, não que eu me importe com
qualquer uma dessas pessoas ou que eu esteja me sentindo
ofendido, afinal, se não fosse a vingança, jamais colocaria os pés na
cidade de novo.
Vejo Miles surgir de um dos corredores, ao notar a presença de
diversas pessoas que já chegaram, Miles sorri para um grupo de
garotas e pisca um olho para elas. Se eu não conhecesse, diria que
ele está flertando por pura diversão e não tentando garantir alguém
para foder no final da festa.
– Uau, já está lotando – comenta Emy, parando ao meu lado.

Emy está tão diferente da última vez que eu a vi que eu quase


não a reconheci mais cedo. Quando fui embora, ela não passava de
uma criança bem introvertida que não largava as pernas da mãe.
Hoje ela é gata e gostosa pra caralho, mas não tem o meu
interesse, eu ainda a vejo como uma irmã mais nova e tenho
certeza de que ela me vê do mesmo jeito, embora não tenhamos
tido nenhum contato nos últimos dez anos.

– Essa cidade é o mesmo tédio de sempre – digo, engolindo


mais um pouco da cerveja quente. – Eu já imaginava que iria lotar,
não tem mais nada interessante para se fazer aqui nos finais de
semana.
Emy arqueia uma sobrancelha.

– Nossa, você parece mesmo feliz em ter voltado às origens –


zomba.

Sorrio de boca fechada.

– A diversão não está estampada no meu rosto? – Aponto para


a minha face com o indicador. – Pensei que eu estivesse fazendo
um trabalho melhor.

Emy leva as mãos à cintura e morde as bochechas para conter


a gargalhada silenciosa que zumbe em seu peito.

– Lamento informar, mas está falhando.

Meu rosto se contorce em uma expressão genuína de fingido


horror.
– Prometo melhorar isso em breve, Deus me livre que alguém
descubra que não amo perdidamente essa cidade.

Emy não consegue se controlar, sua risada se sobressai, me


fazendo acompanhá-la. Ela olha para o lado e seus olhos se
arregalam, então ajeita a postura e pigarreia.

– Eu já volto – grita e some pelo meio da multidão que se


formou durante o pouco tempo da nossa conversa.

Me escoro contra a parede e volto a minha observação total do


lugar. Não reconheço ninguém além de Emy e Miles, as pessoas
mudaram muito desde a minha partida e nenhum rosto foi
importante o suficiente para me fazer gravar.
Nenhum além dela.

Emy surge de novo no meu campo de visão e ao seu lado está


a garota que invadiu os meus sonhos nos primeiros anos em que fui
embora. A garota dos olhos castanhos mais doces e meigos.

Madelyn Sutherland.

A filha do assassino do meu pai.


Tranco a respiração, inquieto com o deslumbre da garota.

Ela está incrível. Os cabelos castanhos lisos e sedosos batem


no meio das costas. O rosto é simétrico com as maçãs bem
delineadas, maxilar fino, lábios carnudos em formato de coração,
olhos castanhos, grandes e expressivos e nariz delicado. O corpo
infantil foi embora e cedeu lugar para curvas alinhadas e sedutoras.
Madelyn está vestindo um conjunto preto de saia e top que realça
ainda mais as curvaturas do corpo. Os seios redondos estão em
evidência pelo pequeno pedaço de pano que ela vestiu para vir a
festa essa noite e a bunda arrebitada está marcada pela saia
apertada, assim como a cintura fina e barriga reta.

Madelyn está extraordinária!


A maldita é gostosa e se destaca como uma deusa no meio da
multidão.

Ela ainda é como um ímã que puxa as pessoas para a sua


volta, pois mal pisou na festa e já está recebendo tantos olhares que
é como se um filete de luz refletisse no centro da sua cabeça, assim
como era quando criança, sempre recebendo atenção, sempre
sendo o centro delas. Mas não culpo as pessoas por isso, eu
mesmo não consigo quebrar o contato, não consigo forçar meus
olhos para qualquer outro ponto que não seja ela. Eu não consigo
focar em mais ninguém, como se todos na sala tivessem sumido,
restando somente ela.

Porra, ela é a filha do maldito! Minha mente ralha, me forçando


a lembrar a quem pertence o sangue que corre naquelas veias.

Ela não é a mesma menina com quem eu sonhava, a menina


que aparecia nos meus sonhos me dando um certo consolo quando
a saudade do meu pai comprimia o meu peito até o ar faltar.

É claro que não, ela está pior!

Está mais atraente. Mais linda. Mais fatal.

Engulo saliva em seco para molhar a garganta. Meu coração


bombeia sangue com força total, alimentando as minhas veias com
adrenalina e êxtase.

Queria perguntar que porra está acontecendo comigo, mas


todo o meu sistema nervoso para de funcionar no exato instante em
que Madelyn traz os olhos de encontro aos meus.
 
Como eu pude apagar da minha memória os olhos mais
incríveis que já encarei?

É ele.

Aiden Thorne. O pobre garoto que perdeu o pai ainda tão


jovem. O menino de quem a minha mãe falava às vezes com tanta
piedade, entristecida com a infelicidade do garoto com a morte
precoce e agressiva que o pai teve.

Aiden está... irreconhecível, exceto pelos olhos diferentes e


misteriosos.
Encaro-o, meu coração martelando em meus ouvidos e minha
respiração falhando como se o ar tivesse se tornado rarefeito.
Os olhos bicolores de Aiden são como piscinas profundas e
fascinantes que me deixam presa como em um transe. A mancha
castanha no olho esquerdo perdida no meio do azul intenso parece
brilhar como uma estrela noturna. A boca carnuda e delineada
combina perfeitamente com o nariz fino e reto, dando-lhe um ar de
“menino-mau”. Os cabelos castanhos-lisos são ralos nos cantos da
cabeça e espessos na parte de cima onde estão bagunçados, mas,
ainda assim, não parecem menos sedosos e charmosos. Tatuagens
cobrem o pescoço e somem pela gola da blusa, assim como
acontece com as mãos e pulsos.
Aiden está todo de preto. A blusa de tecido liso modela os
bíceps bem-marcados do peitoral definido, a jaqueta de couro se
ajusta aos braços torneados e as calças jeans escuras se
acomodam bem às pernas longas e grossas. Ele usa um coturno
também em preto, sendo os olhos bicolores a única coisa que
quebra a escuridão que lhe consome.

Lindo. Misterioso. Enigmático.


Sinto os cabelos da minha nuca se arrepiando sob o peso do
seu olhar. Engulo em seco e dou um passo para trás, abalada
demais com a sua presença, consternada com as sensações que
me consomem.
Aiden curva um dos cantos dos lábios em um meio-sorriso
debochado e repleto de promessas cruéis, então leva o copo de
bebida até a boca e ergue uma sobrancelha escura, sem quebrar o
nosso contato por nem um momento.

Por algum motivo desconhecido, sua atitude depreciativa me


irrita, parece que ele está me subestimando. Ergo o maxilar
beligerantemente e respondo ao seu sorriso insolente. Aiden pisca e
franze a testa, abismado, como se não estivesse esperando essa
atitude vindo de mim.
Me viro, ignorando-o e quebrando o nosso contato visual. Emy
está ao meu lado, ocupada demais conversando com algumas
garotas da faculdade para perceber o que acabou de acontecer.

– Ei, eu preciso beber alguma coisa! – aviso-a, cochichando


em seu ouvido.

Emy balança a cabeça em confirmação, sorrindo para as


meninas e se desfazendo da conversa aos poucos, até o assunto
morrer de vez e ela me puxar para longe. Ela empurra algumas
pessoas para os lados, abrindo passagem no meio da multidão em
direção a cozinha da casa. Meus olhos traidores disparam para o
canto em que Aiden estava escorado, mas não o encontro, apenas
o lugar vazio.

A mistura de música e vozes diminui ao nos aproximarmos da


cozinha. Pisco para acostumar os meus olhos com a claridade do
local que é discrepante da sala onde a festa se concentra. Duas
garotas estão escoradas contra o balcão da pia tirando fotos, elas
ignoram a nossa presença, assim como estamos fazendo com elas.
Emy puxa uma das banquetas e a arrasta para a frente de um dos
armários, então sobe e tira uma garrafa de vodca de dentro.

– Vamos esquentar as coisas! – avisa ao reparar no meu olhar


inquisidor. – Alguns shots e estamos bem.

Emy sempre preferiu os destilados a qualquer outro tipo de


bebida alcoólica, de algum jeito bem estranho, a garota possui uma
habilidade extraordinária de encher a cara com álcool e não ficar
embriagada.

– Eu nem falei nada. – Coloco as mãos para cima em sinal de


rendição. – Como a festa é na sua casa, estou de acordo em encher
a cara.
– Essa é a minha garota! – comemora, balançando a garrafa e
abrindo um sorriso deslumbrante.
Ela desce da banqueta e vai até outro armário onde retira dois
copos e vem até mim, estendendo um em minha direção.

– Vamos comemorar! – Morde a ponta da garrafa e retira a


tampa com os dentes, então enche os dois copos até o limite.

– Vamos comemorar o quê? – pergunto, encarando o copo


com o líquido transparente e cheiro forte.
– Ora, comemorar que você finalmente deu um pé na bunda
daquele idiota! – bufa, revirando os olhos.

Emy bate com o copo no meu e leva-o até os lábios, virando


todo o conteúdo em um único gole. Prendo a respiração e faço o
mesmo, sinto a vodca descer pelo meu esôfago queimando todo o
caminho percorrido. Balanço a cabeça, meus pelos corporais
arrepiados com a sensação.
– Mais um! – diz Emy, enchendo os nossos copos outra vez.
Ela abraça a garrafa com o cotovelo e segura o copo com a mão,
mantendo o ritmo de servir e beber em seguida. – Viva a você e sua
solteirice!

Solto uma risada com a felicidade que ela demonstra com o


término do meu namoro.

– Muito legal da sua parte comemorar o rompimento do meu


relacionamento – zombo, engolindo toda a vodca do meu copo e
franzindo rosto. – Eu poderia estar muito triste e depressiva e você
aí comemorando.

Emy me olha com ceticismo, as sobrancelhas loiras erguidas.

– É mesmo, você parece muito triste, me desculpe por isso –


refuta, em tom zombeteiro.
Comprimo os lábios e mordo as bochechas para suprir um
sorriso, mas acabo cedendo e caindo na gargalhada no momento
em que Emy franze o cenho com a minha seriedade.
– Idiota! – revida, rolando os olhos para cima.

Ela enche os nossos copos outra vez, as bochechas claras já


estão coradas por causa da bebida, mas ela não parece nem um
pouco embriagada.

– Espero que ele não tenha sido incluído na lista de


convidados – murmuro, encarando o líquido.
Emy estala a língua no céu da boca, desdenhosa.
– Ele jamais voltará a pisar na minha casa, não depois do que
fez com você.
Sorrio em agradecimento e viro outra vez toda a bebida do
meu copo. Uma dormência limita os meus sentidos e não preciso
pensar duas vezes para entender que estou ficando bêbada. Me
afasto de Emy e coloco o copo em cima do balcão de mármore,
dando fim aos nossos shots.

– Ei, já vai desistir? – Ela faz um bico perfeito com a boca,


entristecida. – Nós recém começamos.

Seguro a ponta do balcão com as mãos e mantenho a cabeça


para cima, me concentrando em não morrer bêbada justamente
agora e perder toda a festa. Pela visão periférica noto a proximidade
de alguém, um cheiro forte de perfume amadeirado e nicotina
preenche as minhas narinas.
– Ei, Aiden, quer um pouco de vodca? – pergunta Emy.

Fico rígida no exato instante em que ela fala o nome dele, não
consigo fazer nada além de me manter imóvel e fingir que é tudo
culpa da vodca e não da presença desse cara que mal chegou na
cidade e já parece me atormentar tanto.
– Pode encher – responde, a voz grave, grossa e... sexy como
o inferno.
Limpo a garganta e me viro, mantendo o quadril escorado
contra o balcão como uma garantia de que as minhas pernas não
irão falhar, mas, se acontecer, não irei de encontro ao chão e passar
vergonha.

– Olá! – cumprimento-o, sorrindo de boca fechada.

Céus!
Aiden é ainda mais arrebatador de perto. Ou é só o fato de que
ele parece misterioso e enigmático e eu, de uma maneira bem
estranha e psicologicamente instável, me sinta atraída por essas
qualidades.
Mesmo que eu esteja usando saltos, Aiden é alguns bons
centímetros mais alto que eu. Ele me encara em silêncio, os olhos
brilham com algo que não consigo descrever, mas parece quente
e... promíscuo.
Deus, estou bêbada!

– Olá – responde, por fim.

Emy enche o copo em que estava tomando vodca comigo e


entrega para Aiden que retira da sua mão e vira todo o conteúdo
mantendo o rosto sereno, sem nem mesmo fazer uma mísera careta
como eu estava fazendo nos últimos minutos.
– Quer mais? – Emy pergunta.

Aiden sorri de boca fechada, quebrando o nosso contato para


encarar a minha amiga.

– E posso saber por que não estamos bebendo direto da


garrafa? – Arqueia uma sobrancelha escura e bem delineada.
Emy olha para o copo, então para a garrafa que já está
parcialmente vazia e dá de ombros.
– Eu tinha esperanças de que essa sobrevivesse para a
próxima festa, mas acho que tem razão, não faz sentido guardar
agora que tem tão pouco.
Olho para a garrafa em que Emy está abraçada e sinto uma
careta deformar o meu rosto, porque não tem nada de pouco na
garrafa, ainda tem pouco menos da metade da bebida e depois de
tudo o que tomamos, pensei que Emy fosse me acompanhar na
cerveja. Emy coloca o copo no balcão e leva o gargalo da garrafa
até os lábios, engolindo a vodca como se fosse água, ao terminar
ela estende para mim.

Faço um sinal negativo.

– Vou beber cerveja a partir de agora. – Ela faz uma careta de


desdém, então eu continuo. – Nem todo mundo tem fígado de aço.

Aiden ri, o som rouco e gostoso faz com que os meus olhos
voem em sua direção em um piscar como se fosse música para os
meus ouvidos. Ainda sorrindo, ele retira a garrafa de Emy e volta a
beber.

– Bom... vou pegar cerveja – falo, assistindo a cena com inveja


da garrafa presa aos seus lábios...

Ok, eu preciso parar com essa coisa toda que está


acontecendo na minha mente. Ele é gostoso e muito gato, mas eu
mal o conheço.

Me afasto do balcão e vou até a geladeira, abro a porta e vejo


inúmeras latas de cerveja, recolho uma qualquer, desfaço o lacre e
tomo o conteúdo. Diferente de Emy, eu prefiro a cerveja e a maneira
agradável com a qual ela recebe o meu paladar.
– Meu Deus! – grita Emy me fazendo engasgar e encará-la de
imediato. – Eu amo essa música, preciso ir dançar!
Emy gruda a garrafa no peito de Aiden que a pega e então sai
correndo da cozinha, deixando nós dois para trás ainda encarando o
seu rastro, surpresos.
Suspiro. Aiden me encara.

– Ela realmente ama a música. – Aponto com a lata de cerveja


para a porta em que Emy saiu. – Eu já até enjoei de tanto que ela
escuta.

Aiden coloca uma mão no bolso da calça jeans, os dedos


longos também estão cobertos por tatuagens que não consigo
identificar. A mão livre segura a garrafa enquanto ele entra em um
ritmo constante, levando-a à boca e descansando no peito,
posteriormente.

Ele não me responde e não fala mais nada, mantendo um


silêncio um tanto constrangedor, sendo o ruído alto do som da sala
o único que quebra a mudez da cozinha.

Faço um movimento para me afastar e procurar Emy no meio


da multidão, mas paro ao ouvir a voz de Aiden:

– Você mudou muito desde a última vez que eu te vi.

Viro-me para ele, os olhos arregalados ao notar que ele se


lembra de mim quando eu mal consigo me lembrar dele.

Uma fisgada de culpa assola o meu peito.

– Faz muito tempo que você foi embora, todos nós mudamos.
– refuto.

Aiden comprime os lábios e franze os olhos com a minha


resposta direta.
– Sim, mudamos... para melhor – diz, enigmático.
Dou alguns passos em sua direção e paro em sua frente,
preciso erguer o maxilar para encarar os seus olhos.

– Por que você voltou depois de todo esse tempo? –


questiono, curiosa.

Emy não soube me dizer o motivo e sei que Aiden está no


último ano de faculdade, o que é meio estranho ele ter retornado
agora e não só ano que vem, depois de formado. Talvez ele tenha
se metido em problemas onde morava, e ainda que não seja da
minha conta, estou curiosa para saber o verdadeiro motivo.

Aiden bebe mais um gole do gargalo, uma gota de vodca


molha a boca, ele coloca a língua para fora e lambe os lábios, tudo
sem quebrar o nosso contato visual.
– Minha mãe precisava de mim – fala, desinteressado. – Como
um bom filho, retornei para fazer companhia a ela. – Pisca um olho,
o mesmo meio-sorriso zombeteiro de antes se espalhando pelos
seus lábios.

Por que tudo o que sai da boca dele parece mentira? Ou, pior
ainda, porque parece que Aiden está zombando de mim e adorando
isso?

– Hummm... – murmuro, deixando claro que não acredito em


uma única palavra que sai da sua boca.

Aiden ri.

– Qual curso está estudando? – pergunta, mudando de


assunto.

Me escoro de volta contra o balcão, os saltos-altos não


parecendo tão boa-ideia agora que estão dando cãibra nos meus
pés.

– Literatura inglesa, e você?


Aiden se acomoda à minha frente, nossos corpos a
centímetros de distância, sua presença se torna ainda mais
intimidante e seu cheiro me impregna com ainda mais força.
– Ciência da computação.

Ele retira um maço de cigarros do bolso e bate na palma da


mão até que um pule para fora, prendendo-o entre os lábios. Do
outro bolso, retira um isqueiro prata e acende o cigarro, tragando a
nicotina com praxe, sem nem mesmo tossir.
– Quer? – pergunta, erguendo o cigarro para mim, fumaça
escura desliza pelo seu nariz e lábios.

Faço um sinal negativo de cabeça.


– Por que ciência da computação?

Aiden ergue uma sobrancelha.

– Costuma ser tão questionadora assim com todos? –


contrapõe, segurando o cigarro por entre os dedos.

Coloco a lata em cima do balcão e cruzo os braços em frente


ao corpo. Não posso deixar de notar que, com o movimento, os
olhos de Aiden voaram para os meus seios.

– Faz parte da minha natureza – afirmo, fingindo que não vi o


brilho malicioso em seu rosto.

– Estou fazendo ciência da computação porque logo assumirei


o lugar que pertencia ao meu pai no Banco e quero ter uma boa
formação ao mexer nos sistemas – refuta, os olhos voltando de
encontro aos meus.

É um bom ponto! Se meus pais fossem herdeiros de alguma


empresa, eu também gostaria de me especializar para assumir o
meu lugar.
– E você, por que literatura inglesa? – Inclina o queixo em
minha direção parecendo bem interessado na minha resposta e não
só em puxar um assunto.

Bebo um gole da cerveja que já está quente, a lata meio-vazia


pende na palma da minha mão.

– Eu amo ler e gosto mais ainda de livros – Balanço o corpo


um pouco. – Estava com dificuldade em escolher o curso, então
decidi começar a cursar literatura inglesa e deu super certo porque
eu acabei me apaixonando.

Aiden faz um pequeno sinal, concordando. Ele leva o cigarro


de volta à boca e suga a nicotina com força, engolindo toda a
fumaça e prendendo-a nos pulmões por um momento antes de
expelir pelo nariz.

Não é incomum as pessoas me fazerem esse tipo de


questionamento. Meu pai é prefeito, é comum que achem que eu
gostaria de seguir os seus passos como sua única filha, mas nunca
me vi na carreira política, nem agora e nem em um futuro distante,
não que algum dia ele tenha me obrigado e é justamente por isso
que não tive pressão alguma para escolher o que eu queria cursar.
Eles aprovaram a minha escolha, mamãe porque ama livros e meu
pai porque não está preocupado com o meu futuro ou com a minha
carreira.

Aiden dá uma última tragada antes de apagar o cigarro no


mármore do balcão e jogá-lo na lata de lixo da cozinha.

Ele me encara em silêncio, a intensidade do nosso olhar me


faz trancar a respiração e meu coração bater tão
descompensadamente que parece querer sair pela boca. Há algo
em Aiden que me atrai, e muito.

Seus olhos descem até os meus lábios e suas narinas inflam


como se ele estivesse inspirando profundamente o cheiro adocicado
do meu perfume. Ele se inclina levemente, um movimento quase
imperceptível e eu me preparo, ansiosa para o que está prestes a
acontecer, mas então Aiden pisca, como se quebrando o transe que
nos une e nos mantém na bolha.
– Foi bom falar com você – diz, rompendo o silêncio e
esfregando uma mão nos cabelos revoltos – princesinha da divisão
– murmura, sorrindo e se afastando.

Sinto o meu cenho franzir com o apelido que ele acabou de me


chamar, vasculho no meu cérebro qualquer referência sobre, mas
não encontro nada.

Observo-o partir, admirando a forma como os músculos das


suas costas se movimentam de maneira agradável sob a jaqueta de
couro. Aiden ainda é um enigma para mim, um mistério muito
atraente e tentador.

Termino toda a cerveja da lata que estava na minha mão,


ainda encarando o mesmo ponto vazio em que Aiden desapareceu
minutos atrás. Ele pode ser um divertimento na noite de hoje, só
basta que ele colabore.
 
Quando Miles disse que faria uma grande festa para
comemorar o meu retorno ele não estava brincando. Com o passar
das horas, o número de pessoas só aumentou, tornando a casa
pequena para tanta gente. Os corredores que foram bloqueados
começaram a ser invadidos, mas meu amigo não poderia se
importar menos.

Percorro o local com os olhos em busca de Miles e o encontro


sentado em um dos sofás com os braços abertos, ao seu lado está
uma garota loira, as pernas descansam sobre as dele e ele acaricia
a coxa desnuda da garota.

– Ei, tem certeza de que os seus pais não vão comer o seu
fígado por essa festa? – pergunto, inclinando-me para que ele possa
me ouvir.
A garota em seu colo ergue a cabeça para me encarar, os
olhos brilham em minha direção e ela morde o lábio inferior de
maneira sexy.
– Bem provável – assente Miles, encolhendo os ombros –
Vamos supor que as coisas saíram um pouco de controle.

A garota se curva e sussurra algo no ouvido de Miles, antes de


se afastar e voltar à posição inicial. Miles abre um enorme sorriso e
balança a cabeça.
Ele faz um sinal com a mão pedindo para que eu me aproxime.

– Ela quer um trisal, – aponta com o queixo para a loira – disse


que quer sentir o pau de nós dois.

Balanço a cabeça em negativa.

– Sem clima – aviso, me afastando deles e do sofá.


Eu até poderia concordar com o trisal, não seria a primeira vez,
mas estou aqui para mostrar a todos que eu retornei e quero me
concentrar na vingança, não em sexo.

Um dos corredores que Miles havia colocado umas poltronas,


improvisando um bloqueio para ele, está aberto e com algumas
pessoas percorrendo. Se bem me lembro, o lugar leva até um
banheiro e uma biblioteca pessoal da senhora Portman. Avanço
para a escuridão, preciso de um local silencioso para aliviar a minha
mente agitada.

Umas garotas passam ao meu lado, rindo e cochichando sobre


alguém, alheias a minha presença. Elas acabaram de sair do
banheiro – do banheiro que Miles disse que ninguém poderia usar –,
acredito que a senhora Portman vá matar o filho quando retornar
para casa amanhã.

Me escoro contra a parede, a escuridão do corredor me


abraça, inundando o meu corpo e me mantendo longe da vista das
pessoas.

Madelyn é uma coisinha muito atraente e extremamente


perigosa para a minha sanidade. A garota não é tão inocente e
ingênua quanto parece, ela é muito determinada e não tem medo de
falar o que pensa. E para piorar ainda mais a minha situação, meu
lado dominador entrou em êxtase todas as vezes que ela tentava
me desafiar com suas perguntas curiosas e invasivas, louco para
possuí-la e subjugá-la.

Eu desejo a desgraçada, mas preciso lembrar que não posso


ter tudo o que eu quero, muito menos a filha do inimigo.

Um riso feminino me tira dos devaneios, espremo os olhos e


forço a visão pela escuridão, não consigo ver nada além da silhueta
pequena que se esgueira pelo corredor.

– Nossa, Madelyn, muito inteligente da sua parte, tantos


homens por aí e querer justo o que está cagando pra você –
murmura Madelyn. – Bem, só me resta ir para casa e seguir a vida.
– continua e ri feito uma louca.

Mas o que diabos essa garota está fazendo e falando? Ela


está sozinha, não vejo ninguém além dela no corredor. Começo a
me perguntar se Madelyn é um pouco insana, mas chego à
conclusão que o fodido sou eu que estava tentando evitá-la e ela
aparece justamente no lugar em que eu estou me escondendo.

Ouço um barulho e então mãos pequenas e delicadas tocam


em meu peito, mas não para me agarrar e sim em uma tentativa de
se manter no lugar.

Madelyn grita e tenta se desvencilhar de mim.

Digamos que ela tenha achado que tocaria na parede e não


em uma pessoa.
– Porra, quer me deixar surdo? – esbravejo, segurando-a
contra mim.

Madelyn está tão bêbada que tropeçou nos próprios pés.

– Oh, merda, justo você! – cicia, lamentando-se.


Posso sentir o cheiro do álcool em seu hálito quente, ela me
encara com os olhos grandes e expressivos e parece assustada ao
invés de enojada com a minha presença.
Sorrio.

– Acredite, princesinha, estou tão feliz em encontrar você


quanto você está em me encontrar – zombo, em desdém.

Que ousadia! Se não fosse por mim, essa garota estaria


estatelada no chão e, ainda assim, reclama que foi eu o seu
salvador.
– O que você está fazendo aqui? – refuta, as mãos ainda estão
contra o meu peito e as minhas sobre as dela e nenhum de nós
parece querer mudar isso.
– Acredito que o mesmo que você! – contraponho, arqueando
uma sobrancelha, sugestiva.

Madelyn pigarreia e se afasta, desfazendo o nosso toque. Ela


cruza os braços em frente ao corpo, o movimento espreme os seios
firmes, tornando-os mais evidentes.
Por que infernos ela precisa ser tão bonita e gostosa?

– Tudo bem, eu... hã... vou embora – fala, olhando para os


lados em busca da saída.

Embora esteja escuro ao nosso redor, com a nossa


proximidade eu consigo identificar cada reação fugaz do seu rosto
delicado e bonito, assim como o movimento que faz com o corpo.
– Tudo bem.

Os olhos de Madelyn voam em minha direção com a minha


resposta desinteressada, ela parece um pouco ofendida e eu não
poderia compreender menos essa garota ou entender o que se
passa na mente dela.

Sem falar mais nada, Madelyn gira nos calcanhares e sai


caminhando em passos duros e cambaleantes pelo corredor.
Fecho os olhos e encosto a cabeça contra a parede gelada,
inspiro o ar com força e ainda sinto o cheiro adocicado do seu
perfume. Duelo comigo mesmo e a minha vontade de ir atrás dela e
garantir que chegue em casa com segurança, afinal, embora seja
conhecida na cidade e praticamente intocável, o mal está à espreita
e em todos os lugares.
Eu não me importo com ela...
Merda!

Solto um grunhido e me afasto da parede, indo atrás da garota


desgraçada.
Eu odeio o pai dela e quero o fim dele, mas isso não significa
que desejo o mesmo para ela. Madelyn não tem culpa de ser filha
do desgraçado e muito menos merece pagar pelos pecados do pai.
Espicho o pescoço e procuro por entre a multidão algum sinal
dela. Não vejo nada, nem rastro. Empurro algumas pessoas para
liberar passagem para mim, recebo alguns xingamentos e uns
olhares fugaz e não poderia me importar menos com eles ou com a
opinião alheia.

Madelyn disse que estava indo embora então ela só pode ter
ido para a rua. Que garota inconsequente!

Depois do que pareceu um século, enfim consigo chegar na


porta da frente, saio na rua e estremeço com o clima gelado que
contrasta com o calor de dentro da casa. Desço os degraus da
varanda e caminho pela grama até a calçada, sempre procurando
Madelyn com o olhar afiado. Vejo-a parada na beira da rua com as
mãos enroladas no corpo para conter o frio.

– Madelyn! – chamo, aproximando-me.

Madelyn me encara, o rosto parece cansado e o olhar perdido


pela embriaguez. Ela segura os sapatos em uma mão e os pés
estão descalços contra o piso gelado da calçada.

– O que foi? – diz, inclinando levemente o maxilar e voltando a


olhar para frente.
Suspiro, esfregando os meus cabelos com força.

Essa garota me tira do sério e me deixa frustrado por isso!

Retiro a minha jaqueta de couro e coloco-a sobre os seus


ombros desnudos. Ela me olha com a testa franzida.
– Vou te levar para casa – aviso, me aproximando ainda mais.
Passo um braço em suas pernas e outro em suas costas,
levantando-a no colo. Madelyn se assusta e tapa a boca para conter
um grito. – Não vou deixar que ande nesse piso gelado com os pés
descalços e antes que pense que eu me importo, só estou fazendo
isso porque não quero me sentir culpado caso apareça doente.
Madelyn segura o meu pescoço com a mão, os dedos gelados
me fazem estremecer. Percorro o gramado escuro com ela em meus
braços. Deixei o meu carro um pouco longe da casa para evitar
trânsito quando fosse embora, mas isso não é um problema já que
Madelyn é extremamente leve.

– Nossa, quanto cavalheirismo – zomba, bufando.

Um sorriso atravessa o meu rosto.


– Não se apegue a isso, cavalheirismo não faz parte de mim.
Um vento forte nos atinge e Madelyn se acomoda mais em
meu peito, escondendo-se da friagem.
– E o que faz parte de você, Aiden Thorne? – Ela me encara
sobre os cílios espessos e escuros, aguardando a minha resposta.

– Escuridão – revelo, mantendo o seu olhar.

A luz da lua bate contra o seu rosto e ela não poderia estar
mais linda do que nesse momento, aconchegada em meus braços e
confortável onde está. Madelyn não se encolhe ou estremece com a
minha resposta, ela parece não acreditar ou não se importar.

– Todos nós temos alguma escuridão na alma – fala, por fim.


Ergo a cabeça para encarar o caminho, evitando me perder
outra vez na profundidade dos olhos dela. Madelyn tem o dom de
fazer com que eu me abra para ela e revele tudo o que escondo
debaixo do manto grosso.

Suspiro.
– Sim, mas a minha escuridão é profunda, Maddie, você não
gostaria de entrar nela.

Madelyn fica em silêncio. Mantenho o ritmo da caminhada,


ainda evitando olhá-la. Estamos sozinhos, os postes de luz mal
iluminam a rua deserta, as casas que cobrem o bairro estão
apagadas, embebecidas na escuridão enquanto seus residentes
descansam.

– Você não pode deduzir isso por mim – murmura, quebrando


o silêncio.

Meus olhos correm em direção aos dela, Madelyn me encara


com firmeza, o maxilar travado e uma determinação resoluta em sua
face.
Paro em frente ao meu carro, o volvo esportivo modelo XC60
de cor preta, foi um presente de boas-vindas da minha mãe. Ela
ficou muito feliz com o meu retorno e estava ansiosa por esse
momento, o que foi muito bom, já que por nem um momento
desconfiou da minha volta repentina. Acontece que, eu só retornaria
quando estivesse pronto e apto para a vingança, foi a promessa que
eu fiz pra mim mesmo no dia em que fui embora.

Abro a porta e acomodo Madelyn no banco.

– Uau, eu gostei desse carro... – comenta, alisando o couro


com a ponta dos dedos.

Balanço a cabeça e solto uma risada. Faço a volta no carro e


me acomodo no banco do motorista. Ligo o ar-condicionado no
quente, pois Madelyn está gelada feito um cadáver.

– Hum... – geme e fecha os olhos – não sabia que precisava


do ar quente até senti-lo contra a minha pele.

Ligo o carro e acelero.

– E ainda assim estava descalça e com pouca roupa no meio


da calçada.

Ela bufa.
– Vamos, me conte um segredo – muda de assunto, abrindo os
olhos para me encarar.

Pisco a seta para à esquerda ao pararmos em um sinal


vermelho, embora as ruas estejam parcialmente vazias, há carros
perambulando pela noite.

Tamborilo os dedos na direção, pensativo. Viro o rosto


levemente para Madelyn, ela está com a cabeça escorada contra o
banco, o olhar pesado pelo sono se concentra em mim.
– Uma vez eu fui em um bar que tinha um estúdio de tatuagem
e piercing, e bebi tanto que acordei no outro dia com um piercing no
pau.

Madelyn se levanta em um só movimento, a boca forma um “o”


perfeito.

– Meu Deus, e o que você fez? – Todo o sono que ela parecia
sentir, esvaiu-se do corpo com a minha confissão.
O sinal fica verde e eu coloco o carro em movimento,
mantendo meu rosto fixo na estrada à nossa frente.

Encolho os ombros.
– Eu voltei no lugar e perguntei se podia tirar.

– E conseguiu?

Lanço-lhe um olhar enviesado, um dos cantos da minha boca


se curva em um sorriso presunçoso.

– Ele me disse que o apadravya[2] é o piercing mais prazeroso


para a mulher durante o sexo, então eu resolvi manter.

Madelyn arregala tanto os olhos que eu preciso morder as


bochechas para suprimir um sorriso. Ela fica sem palavras,
avaliando a situação com a cabecinha curiosa.

E não é mentira, o apadravya é bom tanto para sexo anal


quanto o sexo vaginal, ele estimula os pontos A e G em uma
relação. Já conheci mulheres que quiseram transar comigo só por
causa do bendito piercing.
– Então... – ela engole em seco – você ainda tem o piercing? –
Seus olhos voam para o meu colo, mais especificamente para o
meio das minhas pernas.
– Sim – confirmo, segurando a direção com tanta força que os
vincos das minhas mãos começam a embranquecer.

Eu fiquei excitado pra caralho com essa conversa e com a


curiosidade palpável de Maddie com o meu pau e o piercing que
habita nele. Se ela não fosse a porra da filha do inimigo, eu estaria
fodendo-a aqui e agora.

Ela se acomoda no banco e pigarreia, as bochechas estão um


pouco coradas, não sei se é pelo calor do carro ou pela conversa
que estamos tendo.

– Eu com certeza nunca transei com ninguém que tem um


piercing no pênis.
Uma gargalhada separa os meus lábios.

– Isso não é uma revelação – contesto, encarando-a pela visão


periférica.

– É claro que sim! – contrapõe.

– Não, não é. Na verdade, é lamentável.

– Lamentável? – grita, a voz esganiçada.

– É claro! Significa que você nunca teve um sexo bom de


verdade.

Madelyn cora tanto que até o pescoço claro começa a ficar


vermelho, o nariz arrebitado franze e uma veia salta em sua testa.

Estaciono o carro em frente a sua casa, as luzes estão


apagadas, exceto pelo jardim que está bem iluminado. Tiro as mãos
do volante e pouso-as em meu colo.

– Em casa – digo, evidenciando um tom de alívio na minha


voz.
Ela segura a maçaneta, mas não faz menção de abrir a porta
do carro, seus músculos estão rígidos sob a minha jaqueta.
– Você não sabe nada sobre mim, não pode presumir como
foram as minhas relações sexuais.

Ergo uma sobrancelha e abro a boca em um meio-sorriso.

– Está tão irritada com o fato que não consegue nem mesmo
negar a verdade?
Vejo o músculo da sua mandíbula trabalhar pelos dentes
semicerrados.

– Bom, independentemente, você nunca saberá. – sorri,


sarcástica e maliciosa.

Inclino a cabeça em sua direção, um brilho ferino pisca em


meus olhos.
– Não me desafie, Madelyn.

A maldita abre ainda mais o sorriso antes de empurrar a porta


e descer do carro, Madelyn faz a volta e bate no meu vidro fechado.
Abro-o, então ela retira a minha jaqueta dos seus ombros e joga na
minha cara.

– Obrigada pela carona – diz, virando-se e correndo para a


casa.

Seguro o tecido rente ao meu rosto, o cheiro adocicado dela


ficou impregnado, inspiro-o com força. Meu pau pulsa na calça.

– Sutherland’s desgraçados! – Jogo a jaqueta no banco e ligo


o motor do carro, enterrando o pé no acelerador.
 
O boné branco com um A em vermelho estampado na frente
do Alabama Rugby[3] cobre a minha cabeça do sol quente enquanto
eu percorro o gramado verde e aparado da universidade. Alguns
alunos descansam sobre a sombra das árvores aguardando a hora
da próxima aula.
Quando eu era criança, imaginava como seria a minha vida na
universidade, na época, o auge era entrar para a faculdade do
Alabama. Hoje só estou aqui para conseguir o diploma, nada mais.

Aprendi minhas habilidades com a informática ao longo dos


anos, mas só quando fiz dezesseis anos que me arrisquei e acessei
a Deep Web[4] e foi neste acesso que conheci um garoto, ao menos
eu acredito que era um, nunca soube sua identificação ou o seu
nome. Começamos a conversar pelo chat do servidor e acabamos
criando um vínculo de amizade obscuro. Ele me ensinou tudo o que
sei, inclusive, como acessar a Dark Web.
Eu vi muitas coisas horríveis desde que me tornei um hacker
habilidoso. A Dark Web contém o pior da humanidade e faz jus a
tudo o que dizem sobre essa parte obscura da internet. A diferença
entre mim e os outros hackers, é que eu estou usando os meus
conhecimentos para fazer justiça e não aumentar os casos de
maldade na sociedade.

Arrumo a alça da minha mochila no ombro, ignorando alguns


olhares curiosos que sinto ao meu redor. Empurro as portas duplas
da entrada e atravesso o corredor claro e pouco movimentado em
direção a porta da esquerda que tem acesso aos vestiários do time
de Rugby.
A porta é aberta abruptamente assim que eu me aproximo.
Miles sai do vestiário, os cabelos estão bagunçados e ele veste o
uniforme do time que consiste em uma bermuda vermelha e uma
camiseta branca com a numeração do jogador. Ao me ver, seus
olhos se franzem em um sorriso.

– Não acredito que você vai mesmo entrar pro time – diz,
empurrando ainda mais a porta.

Faço um sinal de desdém com a mão livre.

– Vai ajudar a manter a minha mente ocupada e a gastar


energia.

Miles inclina levemente a cabeça para mim.

– Hum... só não quebre nenhum dos meus homens, preciso


deles para ganhar os jogos.

Ele é capitão do time de Rugby, o melhor que tiveram nos


últimos anos. Miles realmente gosta do jogo, ele usa isso como um
esporte e não um passatempo, como eu pretendo fazer.
– Seus homens? – inclino uma sobrancelha, um sorriso se
espalha pelo meu rosto.

Ele bufa.

– Só entre e coloque a porra do uniforme, você está atrasado!

Faço do meu simples sorriso uma gargalhada e o rosto de


Miles se deforma em uma carranca. Ele está tentando ser pulso
firme comigo e me mostrar que quem manda aqui é ele e que eu
preciso aderir às suas regras, mas Miles sabe que não sou fã delas,
regras nunca foram o meu ponto forte.

O vestiário segue a mesma linha do uniforme, paredes tingidas


de branco, armários vermelhos no canto direito, bancos ao fundo e
um corredor que leva para os chuveiros. Encaro os armários e noto
que eles possuem a mesma numeração da camisa, a maioria deles
está fechado e com a identificação dos atletas, exceto pelos três
últimos que estão abertos e vazios. Empurro a mochila para dentro
do armário e bato a tampa com força.
– Ei, cara, você é o Aiden? – Uma voz masculina soa atrás de
mim.

Me viro e encontro um homem alto e moreno, ele me encara


com curiosidade e um pouco de receio, o que me faz questionar
qual é a minha fama nessa faculdade.

– Sim – confirmo, levando as mãos aos bolsos da calça.

Outros três surgem atrás dele, todos eles me encaram, me


tornando o centro das atenções.

– Sou Robert – apresenta-se.

Fico em silêncio, encarando-os. Robert leva a mão a nuca, um


pouco sem jeito com a minha indiferença, então se vira e volta a
conversar com os outros como se nada tivesse acontecido. Retiro o
celular do bolso e mexo nos aplicativos, conferindo a segurança de
todos eles. Faço isso direto desde que descobri a facilidade que é
para invadir alguns aplicativos importantes que costumamos manter
no celular.
– Então ela te deu mesmo um pé na bunda? – Ouço um deles
falar.

Alguém suspira.
– Sim, ela descobriu tudo sobre o meu caso com a Gretha.
– Porra, não acredito que você deu essa mancada. – Outro
comenta.
– Eu não sabia que ela estava me seguindo, Madelyn nunca
nem mesmo demonstrou estar desconfiada – responde, irritado.

Ergo os olhos para encará-los assim que o nome de Madelyn


surge na conversa. O idiota que está respondendo é o mais alto
deles, ele tem os cabelos escuros, olhos castanhos e músculos
definidos. E não poderia ter mais cara de mauricinho babaca.

– Madelyn nunca vai te perdoar por isso, as garotas não


esquecem uma traição – diz Robert, encolhendo os ombros.
O idiota do suposto ex-namorado de Maddie passa uma mão
nos cabelos.

– Ela vai, nós vamos nos casar um dia, devemos ficar juntos.

Aperto o celular com força, meu temperamento prestes a


explodir para fora.

Os babacas riem da declaração dele.

– Lennon, esquece a Madelyn, não tem mais volta – murmura


o ruivo.
– E já que ela está solteira... – alfineta Robert, um sorriso
sacana em seu rosto.
Lennon soca o ombro do amigo, rindo, como se sua sugestão
em ficar com Madelyn nem mesmo lhe incomodasse.
Como Maddie conseguiu namorar um cara tão absurdamente
idiota quanto esse?

Eles cessam a conversa, Lennon me encara ao perceber que


eu estive prestando atenção esse tempo todo, ouvindo cada merda
que saía das suas bocas. O filho da puta inclina o queixo, um aviso
subliminar para que eu me mantenha de canto, alheio ao que ouvi.

– Conhece Madelyn? – pergunta com arrogância.


Um dos cantos da minha boca se curva em um meio sorriso
incisivo, desafiando-o a continuar tentando me intimidar.

Já sei que não preciso ficar nem um segundo a mais na


companhia de Lennon para saber que eu já o odeio. E não é ciúmes
de Madelyn, é só o fato de que ele parece desrespeitar a garota,
gostar disso, ainda achar incrível e motivo para zombar com os
amiguinhos idiotas.

– Cara, ele acabou de chegar na cidade, para com esse


temperamento territorialista – Robert pousa uma mão em seu
ombro, instigando-o a parar.

– Eu escutaria o seu amigo se fosse você. – Ergo uma


sobrancelha.
Eu poderia socar a cara desse babaca até ele implorar, mas
acho que Miles não iria gostar nada disso, muito menos que um dos
seus jogadores fosse lesionado tão pouco tempo antes de um jogo
importante. E como sou uma pessoa muito piedosa, me contentarei
em invadir cada canto da porcaria do seu celular, descobrir todos os
seus segredos e decidir o que farei com a informação.

– Acha que eu tenho medo de você? – Lennon avança, mas é


contido por Robert e os outros idiotas.
Uma risada nociva separa os meus lábios.

A cena é tão ridícula que eu pisco para descobrir se o que está


se desenrolando a minha frente é mesmo real.

A porta do vestiário é aberta, então Miles surge, mas para ao


perceber que tem algo errado.

– Que porra é essa?


Lennon se desfaz do aperto de Robert e dos outros com
brusquidão, seu rosto está franzido de raiva.

– Não é nada – diz, sem desviar os olhos dos meus – Fique


longe dela – aponta um dedo em riste para mim, antes de girar nos
calcanhares e sair para o campo com os outros ao seu encalce.

Miles para na minha frente, bloqueando a minha linha de visão.

– O que você fez? – Cruza os braços, irritado.


– Quem é o idiota?

– Ele é filho do xerife – cicia, inclinando a cabeça para mim – E


ex-namorado da Madelyn, mas suponho que você já saiba quem é
ela. – Faz um sinal com a mão.
– Inacreditável que Madelyn tenha namorado alguém tão
imprestável – comento, balançando a cabeça em descrença.
– E namorou um tempão... – Desfaz o enlace dos braços. –
Enfim, sei que tá interessado na garota, só saiba que Lennon é um
filho da puta que vai fazer da tua vida um inferno por isso.

Meus olhos ganham contornos de diversão.


– Afirmação errada, meu amigo, eu farei da vida dele um
inferno.

Miles arregala os olhos.


– Não pode hackear o filho do xerife, ficou maluco? – diminui o
tom de voz para que ninguém possa nos ouvir – Quer mesmo
colocar todo o plano a perder?
Espalmo uma mão no peito, muito ofendido com a sua falta de
credibilidade nas minhas habilidades.

– Só observe e aprenda. – Empurro-o para sair da minha frente


e avanço em direção ao campo. Miles me segue de perto. – E pare
de duvidar das minhas capacidades, já fiz coisas muito piores.

– Você me assusta às vezes.

Se ele soubesse os planos que eu tenho para o pai de Lennon,


entenderia que o que farei com o engomadinho do filho não passa
de uma brincadeirinha.
Miles recolhe uma camisa vermelha de um dos bancos e
segura o meu braço, impedindo que eu continue caminhando em
direção ao campo.

– Precisa se trocar, tem bermudas limpas nos chuveiros e essa


aqui é a sua camisa, vai ser um loose-head[5], já que tá cheio de
energia para gastar – zomba, jogando a camiseta no meu peito.

– Valeu, capitão – respondo com o mesmo deboche,


segurando a camiseta.
Miles se vira e volta a caminhar para o gramado. Estico o
tecido e vejo que serei o novo número um do time de Rugby da
universidade do Alabamas.

Muito bom, eu quero mesmo derrubar umas pessoas, entre


elas, Lennon e toda a sua arrogância de merda.
 
Meus olhos estão arregalados com o que estou lendo no
celular, a cada link que eu entro, minha respiração oscila. Eu não
deveria estar pesquisando sobre isso, nem deveria estar tão
interessada, mas acontece que eu não consigo evitar.

Deitada de bruços na grama sob a sombra de uma árvore,


balanço os meus pés que pendem no ar pelas pernas dobradas,
enquanto aproveito o intervalo entre as aulas pesquisando algo que
não deveria.

Estou evitando olhar para as pessoas, na verdade, evitando


qualquer tipo de contato. Já se espalhou pelo campus que eu e
Lennon terminamos o namoro e como éramos um casal conhecido,
está todo mundo comentando. Recebi mais cedo alguns olhares
condescendentes, assim como alguns curiosos. Eles querem saber
se estou me afogando em lágrimas e enchendo a cara de sorvete na
calada da noite, triste e magoada pelo fim do relacionamento. Bufo
com o pensamento. Mal eles sabem que estou ocupadíssima
pesquisando sobre outro cara.
– Madelyn, porque diabos você está pesquisando sobre
piercing no pau? – A voz de Emy soa ao pé do meu ouvido e eu
engulo um grito pelo susto que levo.

– Que merda, Emy! – Me sento com um único movimento, meu


coração bate com tanta força que me deixa zonza. – Quer que eu
morra do coração?
Emy joga a mochila aos nossos pés e se senta de frente para
mim, ocupando um lugar à sombra. Ela parece muito bem para
quem passou o final de semana inteiro tomando sermão dos pais
pela festa que saiu de controle.

– Então, vai me explicar? – pergunta, abrindo a mochila e


tirando um pote de dentro.

Emy balança os cabelos loiros que estão presos no alto da


cabeça, brincando com a brisa leve que nos atinge.

– Eu é... – Não preciso de um espelho para saber que estou


corada, eu sinto o calor se concentrar nas minhas bochechas e
pescoço. – Promete que não vai surtar ou sair por aí criando mil
teorias?

Ela abre o pote e retira um sanduíche de dentro. Vejo um ar de


deboche franzir o seu rosto e me odeio por ter sigo pega em
flagrante.

– Diga logo e pare de enrolar. – Emy ergue o sanduíche para


mim. – Quer? – Faço um sinal negativo. – Ótimo, então aproveite a
boca vazia para me explicar que tipo de fetiche é esse seu, porque,
se bem me lembro, o idiota do seu ex não tinha nenhum piercing.
Inspiro uma profunda lufada de ar, me preparando para
explicar para ela que, não é um fetiche, é só uma curiosidade e...
uma vontade absurda de testar, mas com uma pessoa em
específico.

Coço a cabeça, olhando para todos os lados menos para ela.

– Eu tive uma conversa bem legal com Aiden no sábado – atiro


como se não fosse nada demais – e nessa conversa nós decidimos
revelar alguns segredos, então Aiden me revelou que tem um
piercing no pau – concluo, diminuindo drasticamente o meu tom
para não ser ouvida por mais ninguém.

Emy se engasga com o sanduíche e eu preciso me levantar e


ir até ela para bater em suas costas.

– Está tudo bem? – indago, preocupada com a saúde dela.

Ela guarda o que sobrou do sanduíche no pote e recolhe uma


garrafa de água, engolindo o líquido como se estivesse desidratada.

– Que tipo de conversa mais aleatória é essa, Madelyn? – diz,


a voz rouca pelo incidente.

Me acomodo de volta no lugar e entrelaço as mãos uma na


outra, o olhar inquisidor de Emy só está servindo para me deixar
nervosa e muito envergonhada. Não parecia uma conversa tão
absurda, quer dizer, não quando eu estava bêbada, mas agora...
pensando nisso... Deus!

– Não se apegue a isso! – afirmo, fazendo um gesto com a


mão. – O fato é que a conversa existiu e Aiden me contou que tem o
tal piercing, então eu fiquei curiosa e estava pesquisando sobre.

Emy semicerra tanto os olhos que eles mal passam de frestas


abertas.

– Você está interessada no Aiden?


Abro a boca para negar a absurdidade que é essa pergunta,
mas, Emy nunca mais me deixará em paz se perceber qualquer tom
de mentira. E, bem, seria uma mentira, afinal de contas, estou sim
interessada no garoto.

– Teria algum problema? – Escapo da resposta fazendo outra


pergunta. – Quer dizer, se você estiver a fim dele...

– Eca! – grita, tapando a boca para dar ênfase – Aiden é como


se fosse um irmão de tanto que eu ouvi Miles falar dele nos últimos
anos. Acho ele gato e sexy pra caramba, mas só isso.

Afasto umas mechas de cabelo do meu rosto, prendendo-as


atrás da orelha, antes de responder:
– Bom... sim, estou interessada, mas acho que ele não
corresponde – confesso, em um murmúrio.
Emy franze o nariz, descrente.

– Vamos descobrir, então – comenta, deitando-se de costas na


grama. Me deito ao seu lado e coloco as mãos em cima da barriga.
– Não sei qual é o tipo de Aiden, para falar a verdade, acho que ele
nem ficou com ninguém na festa, então não sei com o que estamos
lidando.

Uma onda de vergonha me deixa inquieta, talvez Aiden não


tenha tido tempo de ficar com alguém porque precisou me levar
bêbada para casa. Nossa, que ótima boa primeira impressão que eu
passei para ele.

Emy se deita de lado, virando-se para mim e apoiando a


cabeça com a mão.

– Sabe que ele é sócio de Miles no clube, não é? – sussurra,


inclinando-se mais para falar bem baixo. – Então já temos uma
noção do que ele curte.
Todo o meu sistema nervoso entra em alerta com a menção do
clube. Emy me confidenciou há algum tempo que Miles e o melhor
amigo estavam abrindo um clube na cidade de prática BDSM,
parece que Aiden entrou com o dinheiro e Miles ficou de administrar
o local. Emy descobriu por que fez Miles confessar para ela
enquanto estava bêbado, depois ele implorou por sigilo. Como era
segredo de estado e ela me contou, eu nunca falei para ninguém,
por isso acabei esquecendo do clube, embora na época tenha
ficado com vontade de ir conhecer o lugar.

Lennon jamais me acompanharia, ele acharia um absurdo eu


até mesmo cogitar ir em um lugar desses. Ao menos, Emy me
contou todas as experiências que teve no local e matou um pouco
da minha curiosidade.

– Você já o viu lá? – pergunto, interesse se contorcendo no


meu peito.
Emy balança a cabeça.

– Nunca, mas foi ele quem apresentou a Miles esse mundo,


então eu suponho que ele tinha algum lugar que frequentava antes
de vir para a cidade e que em breve ele estará no clube.

Algo se aquece em mim, talvez a curiosidade aguçada com o


que eles fazem no clube ou a imagem de um Aiden em um sexo
bem depravado, fazendo jus ao piercing que tem no pênis.

– Agora que estou solteira, quero ir conhecer o clube.

O queixo de Emy cai.


– Sério? – refuta, curiosa e muito desconfiada. – Quer mesmo
ir ou só quer ir porque está interessada em Aiden?

Reviro os olhos e volto a encarar os galhos da árvore que


fazem contraste com o sol, impedindo que os raios cheguem até
nós.
– Eu sempre tive vontade, você sabe... – respondo, por fim,
ainda sem encará-la. – E agora nada mais pode me impedir.
Emy tem alguém nesse clube, um homem que ela fica e já faz
alguns meses. Ela não sabe nada dele, nome, idade, ou qualquer
coisa que possa identificar quem é, mas diz que é isso que faz com
que o relacionamento proibido entre dominador e submissa seja
ainda mais emocionante.

– Tudo bem, mas saiba que vai encontrar muitas coisas que
podem, ou não, te apavorar – avisa, levantando-se do chão – E eu
digo isso porque talvez você acabe gostando e vire uma
frequentadora, como eu.
A sorte dela é que Miles não é um irmão ciumento, pelo
contrário, ele e Emy são super parceiros e colocam a amizade
acima de tudo.
Me impulsiono para cima com as palmas das mãos,
levantando-me também. Sei que nosso horário de intervalo está
quase acabando e precisamos sair antes que o sinal toque, ou
ficaremos presas nos corredores no meio de tanto tumulto e
chegaremos atrasadas na próxima aula.

– Ei, vamos ao Rollin’ Hops no sábado? – pergunta, inclinando-


se para juntar a mochila do chão.

O Rollin’ Hops é o bar mais badalado pelos universitários da


cidade, ir até o local significa ver toda essa gente que eu estou
tentando evitar, mas, ao mesmo tempo, não sair de casa dará a eles
uma impressão errada sobre como estou me sentindo com o fim do
meu relacionamento. Talvez seja mesmo legal tomar algumas
cervejas e espairecer um pouco.

– Tá, mas você dirige! – comunico, limpando as palmas das


mãos na minha calça jeans.
Emy revira os olhos.
– Só prometa que não vai vomitar no meu carro no final da
noite – brinca, mordendo a boca para conter um sorriso.
– Se bem me lembro, quem costuma vomitar no carro dos
outros é você! – aponto o dedo em riste para ela.

As últimas vezes em que eu saí com Emy para algum lugar e


fiquei de largar ela em casa, a bonita vomitou em todo o banco e o
tapete do meu carro, me forçando a largar o automóvel na lavagem
e ficar a pé por dois dias seguidos, já que limpar um carro vomitado
e tirar todo o cheiro azedo demora um pouco.
– Vamos logo, gata, não quero me atrasar! – Emy passa o
braço por cima dos meus ombros e me puxa em direção ao campus.

Atravessamos o jardim com passos sincronizados, Emy, assim


como eu, nota os olhares enviesados dos outros alunos, mas ela
sabe ignorá-los tão bem quanto eu. Algumas pessoas arrumam os
materiais, preparando-se para entrar e tentar não se atrasar.
Ao virarmos no corredor que tem vista para o campo de treino
do time de Rugby, me preparo para virar o rosto e ignorar porque sei
que Lennon está lá em algum lugar, mas uma forte intuição me faz
permanecer com os olhos imóveis e então eu vejo ninguém menos
que Aiden percorrendo o gramado.

Tranco a respiração com a visão.

Ele está caminhando sozinho, bem à frente dos outros


meninos do time. Aiden segura uma toalha atrás do pescoço para
enxugar o suor, o peitoral definido e tatuado está totalmente visível
pela falta da camiseta. Como se sentisse a minha presença, ele vira
a cabeça para o lado e os olhos bicolores se fixam nos meus.
Se não fosse por Emy me segurando, eu teria tropeçado, pois
meu passo seguinte oscila sob o peso do seu olhar que me mantém
cativa.
Meu olhar vaga sobre ele, desde os músculos enrolados do
seu estômago, tingidos pela tinta preta até as reentrâncias de cada
lado dos seus quadris. Subo para o seu rosto outra vez e reparo no
leve sorriso que cobre a sua boca, diferente do apertado e
calculista, Aiden está achando graça porque percebeu que eu o
estive encarando nos últimos segundos de maneira direta e
descarada.

Um calor insidioso se infiltra nos meus músculos e minha pele,


a vergonha por ter sido pega no flagra duelando com o desejo que
queima as minhas entranhas.

Viro a cabeça para o lado, quebrando o nosso contato e


fingindo que nada aconteceu. E se Aiden perguntar, mentirei até o
fim que eu não o reconheci, que estava admirando a... paisagem.
Queria entender o que ele tem de tão especial que faz com
que eu me sinta tão atraída, mas é uma questão irrelevante, só de
olhar para Aiden fica claro que, qualquer ser vivo que possa
enxergar, irá se sentir atraído por ele e seu puro magnetismo.
Acontece que ele é quente, não quente como brasa, mas tão quente
quanto o próprio inferno deve ser.
– Está tudo bem aí? – pergunta Emy, quebrando o silêncio e
me assustando.

– Sim, por quê? – contraponho, olhando para todos os lados


menos para ela.

– Não sei, você parece meio ofegante – Seu tom goteja


desconfiança.

– O dia está quente e estamos caminhando sob o sol – minto,


mantendo o rosto uma máscara impassível.
Funciona, Emy não faz mais perguntas, ela começa a
cantarolar uma música baixinho, alheia a explosão que se concentra
na melhor amiga.
Puta merda, estou mesmo ofegante!

Efeito Aiden Thorne.


 
Lennon, por um milagre de Deus, me evitou durante toda a
semana. Espero que ele esteja se sentindo envergonhado por ter
sido um maldito traidor.

Às vezes imaginava como seria o nosso término, comecei a


idealizar isso quando senti que a química entre nós simplesmente
sumiu sem deixar rastro, sobrando só dois corpos presos em um
relacionamento fracassado, só nunca pensei que eu odiaria tanto
um cara que um dia jurei ter sido meu amigo e confidente.

Termino de passar a máscara de rímel e observo o meu reflexo


no espelho. Minha boca está tingida em vermelho e meus olhos
estão bem-marcados pelo delineado. Estou usando um vestido
preto, colado ao corpo, com decote em U e mangas curtas. Nós pés
um tênis branco.
– Tudo certo, nem rastro do maldito no bar – murmura Emy,
entrando no meu quarto.
Minha melhor amiga está com uma roupa muito parecida com
a minha, exceto pelos cabelos que estão presos no alto da cabeça.
Ela mastiga um chiclete e digita em uma velocidade vertiginosa em
seu aparelho celular.

– Bom – pontuo, recolhendo a bolsa transversal de cima da


cama. – Então vamos logo.
Emy mandou mensagem para um garçom de quem é amiga
perguntando se Lennon foi visto por lá. Pela graça de Deus, não. Eu
não deixaria de ir, mas me prepararia melhor para controlar o meu
temperamento e não socar a cara dele.

Arrumo a bolsa, dou uma última espiadinha no meu look e


deixo o quarto. Emy me segue de perto, a concentração ainda
voltada para o celular.

Meus pais estão sentados no sofá assistindo a um


documentário alienígena. Eles bebem vinho tinto e mastigam alguns
petiscos.

– Ei, estamos saindo – aviso, beijando o topo da cabeça da


minha mãe. – Talvez eu vá para a casa da Emy no final da noite.

– Se cuida, querida, e tenha modos! – fala mamãe,


bebericando um pequeno gole da taça quase vazia.

Meu pai me fita, receio transformando o seu rosto bonito em


uma carranca. Embora tenha uma idade avançada, ele é um homem
muito charmoso e elegante. Os cabelos castanhos estão grisalhos e
os olhos claros possuem um brilho astuto. Ele é alto e robusto. Um
coroa muito bonito.

– Não faça nada que vá manchar a sua reputação, Madelyn,


ou que me obrigue a tomar medidas severas – avisa, em tom sério –
se comporte.

Mordo as bochechas para conter a resposta que está na ponta


da língua. Raiva queima em minhas veias.

Desde que eu era criança ouço sobre o quanto eu preciso


manter a minha dignidade intacta por ser a filha do prefeito, por ser
uma figura pública. Acontece que eu evito dar motivos para que
desconfiem de mim ou se sintam desapontados com os meus atos.
Sempre cuidei e zelei a porcaria da minha reputação. A cobrança
melhorou assim que comecei a namorar Lennon, já que eles sempre
acharam Lennon maduro e certinho. E, claro, que ele conseguia me
manter na linha.

– Não se preocupe, prometo que vou zelar pela sua reputação


com a sociedade. – Pisco e não posso deixar de conter a ironia que
goteja em meu tom.

– Maddie, seu pai não está falando por mal! – adverte mamãe,
franzindo o rosto em uma careta.
– Estou indo! – falo, girando nos calcanhares e puxando Emy
comigo para fora de casa. Bato a porta com força, deixando claro
que já estou ficando puta com todo esse sermão idiota. – Eu odeio
essas regras ridículas – reclamo.

Emy solta uma risada trêmula.

– Não é só você. – Aciona o alarme para destravar o carro e


abre a porta do motorista. – Talvez um dia isso mude. – Encolhe os
ombros.

Abro a boca, indignada.

– Ah, que ótimo! E se não mudar?

– Bom, então você vai embora de casa e busca a sua


liberdade.
Emy entra no veículo e eu fico parada mais alguns segundos
no meio da calçada com a mão na maçaneta, absorvendo as suas
palavras.
– Entra logo, garota, eu quero beber! – grita, abrindo a porta
para mim.

Dane-se os meus pais e as idiotices deles, eu só quero me


divertir.

O bar está lotado de universitários, como já era de se imaginar.


As mesas redondas de madeira estão todas ocupadas e as
banquetas do balcão seguem a mesma linha.

– E agora? O que quer fazer? – me inclino para sussurrar no


ouvido de Emy.

A música eletrônica toca a todo vapor fazendo as janelas


tremeluzirem quando alcança algum grave. A maioria das pessoas
estão conversando e bebendo, outras poucas dançam na pista de
dança improvisada mais ao canto.
– Vamos beber alguma coisa e circular por aí, alguma hora
uma mesa vai vagar – responde Emy, me puxando pelo braço em
direção ao balcão. Ela se inclina sobre o tampo de madeira e pede
algo para o jovem garçom que é amigo dela. Os dois riem, então ele
a entrega dois canecos de cerveja. – Aqui está! – Me passa uma
delas.
Bebo um longo gole e aprecio o gosto.
Emy continua conversando com o garoto de cabelos claros e
olhos azuis. Observo melhor a cumplicidade deles, não posso ouvir
o que estão falando, mas eles parecem se divertir muito, seja lá qual
for o assunto.

Eu já o vi algumas vezes na faculdade, mas nunca se quer


troquei uma palavra com ele. Agora só me resta descobrir onde foi
que Emy Portman conheceu o garçom.

Eles cessam a conversa quando outro grupo o chama do outro


lado do balcão. Emy se vira para mim e suas bochechas coram
quando ela se depara com a minha sobrancelha franzida.
– Desde quando você está pegando esse carinha que eu não
conheço e nunca nem ouvi falar?

Ela leva a caneca aos lábios e vira a metade do conteúdo em


poucos e longos goles, postergando o momento da resposta.
– Faz um tempo, mas o meu dominador não pode saber –
avisa, olhando ao redor.

Ah, esqueci por completo do “dominador” dela, o homem com


quem simplesmente transa no clube. E, embora não tenha contato
nenhum com o cara fora das paredes do Dominators e nem mesmo
saiba a verdadeira identidade, Emy se limita a este relacionamento
discrepante. Talvez seja justamente o enigma que ronda esse
“relacionamento” que a faz gostar tanto.
– Emy, não é como se você não pudesse ter uma vida. –
Reviro os olhos, longe de compreender tudo isso. – Você nem sabe
quem ele é.
– Justamente por isso, ele pode ser qualquer um – diz, me
puxando para um canto –, ele pode ser até mesmo o Joshua, o
garçom com que eu fico de vez em quando.

Pendo a cabeça para o lado, irônica.


– Ah, é mesmo? E você por um acaso não saberia se Joshua e
o tal do dominador fossem o mesmo homem?
Ela pondera por um momento, pensativa.

– Bem... sim, eu saberia! – Abro a boca para falar o óbvio, mas


Emy continua, me calando. – Ele não é o dominador, mas isso não
significa que algum outro que esteja aqui não possa ser.
Sim, ela tem razão, mas, ainda assim, nunca vou entender
essa relação e tudo o que isso significa para ela.

– Vamos dar uma volta por aí! – diz, dando a nossa conversa
por encerrada.
Percorro o local ao lado de Emy, recebo alguns olhares
sugestivos de alguns garotos da faculdade e tantos outros
depreciativos das garotas. Lennon é jogador de Rugby, o esporte
principal do Alabama, é claro que todo mundo o conhece e que ele é
desejado, por isso tenho certeza de que não faltou comemorações
entre os grupinhos quando o fim do nosso namoro virou fofoca.

Ignoro todos eles.


Corro os olhos para todos os lados, procurando duas pessoas
em específico e não as encontrando. Não posso deixar de me sentir
um pouco triste ao não ver Miles e Aiden aqui, porque tinha
esperanças para essa noite. Mas, vida que segue, talvez eu
conheça alguém legal.

– Olha! – Emy aponta com a mão para o canto do bar – Vagou


uma mesa, chegou o nosso momento, graças a Deus.

Sem esperar, ela me puxa com brusquidão até a mesa e se


senta em um dos bancos, ignorando a sujeira de cima e dando o
lugar por ocupado.

– Eu já estava ficando cansada e entediada – comenta,


erguendo o braço e solicitando um garçom.
– Não posso dizer que estava me divertindo. – Termino a
minha cerveja e junto o copo vazio com os outros.
Pela visão periférica, noto a aproximação de alguém, viro-me e
encontro Gretha ao nosso lado.

– Pra vocês? – pergunta, um caderno nas mãos.

Eu não consigo reagir, não consigo fazer nada além de encarar


a garota que era amante do meu namorado. Eu conhecia Gretha, a
vi algumas vezes quando estive aqui com Lennon ou Emy, mas
nunca reparei, de fato, nela. Nem mesmo me lembrei que ela
trabalha aqui quando Emy sugeriu a ideia.

Gretha parece cansada, há manchas escuras debaixo dos


olhos castanhos. Os cabelos negros estão presos em um coque por
baixo da touca de proteção, e ela até mesmo parece mais magra, as
maçãs do rosto estão delineadas pela perda de peso.

Com o meu silêncio e o de Emy, Gretha pigarreia, parecendo


desconfortável.

– É... pode limpar a mesa, por favor? – fala Emy, sem jeito.

Gretha se inclina sobre a mesa para recolher as canecas, o


movimento faz com que sua barriga fique totalmente visível e eu
sinto o meu mundo parar de girar ao notar no ventre arredondado e
inchado.

Uma fisgada de raiva e tristeza assola o meu peito, me


deixando instável por uns segundos. Vários cenários passam pela
minha cabeça, atordoando a minha mente, mas nenhum deles
parece fazer sentido porque tudo isso é ilógico demais.

– Você está grávida? – pergunta Emy, a voz esganiçada, os


olhos arregalados.

Gretha suspira e ajeita a postura, seus olhos encontram os


meus, decididos e abalados.
– E antes que me perguntem quem é o pai, acho que vocês já
sabem a resposta – diz, ignorando Emy, voltada totalmente para
mim.
Eu já estava imaginando isso, mas obter a convicção é
diferente de criar teorias. Lennon não foi só um traidor de marca
maior, ele ainda engravidou a garota e manteve isso escondido
pelos últimos meses. Não sou nenhuma profissional em gestação,
mas pelo tamanho da barriga de Gretha, diria que ela já está com
uns cinco meses de gravidez.

Me recosto contra o banco, abalada e atordoada demais com


tudo isso. A música que toca no local se tornou nada além de um
mero burburinho perto do turbilhão que é a minha mente.

Isso dói!

Descobrir a traição já tinha sido doloroso, mas agora... uma


criança... um bebê que ele escondeu de mim, que ele vem
escondendo de todos, inclusive dos pais dele, do mundo!

Os olhos de Emy faíscam em raiva pura, ela poderia matar


Lennon nesse exato momento se ele estivesse aqui. E os meus
refletem a mesma coisa.

Gretha percebe a mudança brusca no ar, a densidade, a raiva


que evapora por cada centímetro dos nossos corpos.

– Olha, se faz com que se sinta melhor, Lennon é um imbecil –


murmura, acomodando a bandeja com os copos vazios nas mãos –
E ele terminou tudo comigo assim que você descobriu e ainda me
culpou pelo ocorrido.
– E a criança? – pergunto, apontando com o queixo em direção
a sua barriga protuberante.

Ela encolhe os ombros.


– Ele não quer saber da filha e eu também não quero, então
vou doá-la assim que nascer, já tem uma família interessada.

A indiferença com a qual ela fala do bebê faz com que eu me


sinta desconfortável e um pouco abalada.

– Vou pegar as cervejas – avisa, virando-se e desaparecendo


no meio das pessoas.

– Aquele filho da puta! – esbraveja Emy, os lábios franzidos de


raiva. – Ele ia simplesmente se livrar da amante e da criança e
continuar a vida com você, como se nada nunca tivesse acontecido.

Comprimo os lábios, pensativa.


É inacreditável, parece que eu estive vivendo vidas duplas nos
últimos anos. Lennon sempre falou comigo sobre casamento e
filhos, ele sempre pareceu ser um homem legal e muito família.
Nunca, nem por um momento, passou pela minha cabeça que ele
pudesse ser assim e fazer tudo isso.

– Eu... eu quero ir embora daqui – aviso, esfregando os


cabelos.

Ainda sinto os olhares em cima de mim e estou me


questionando se Lennon só tinha Gretha como amante ou mantinha
uma em cada esquina dessa cidade. Quantas vezes as pessoas
riram de mim pelas minhas costas? Debochando da pobre e
ingênua namorada.

– Eu acho que sei aonde podemos ir... – cicia Emy, inclinando-


se para falar mais baixo. – um lugar aonde ninguém te conhece e
não precisará desviar dessa gente fofoqueira.

Trinco a mandíbula, minha respiração acelera.


– E qual lugar é esse? – pergunto, embora eu já saiba a
resposta.
Emy abre um sorriso malicioso, uma sobrancelha inclinada.

– Vamos para o Dominators, Maddie, lá você pode ser quem


quiser, sem se preocupar com os seus pais ou com o que estão
falando às suas costas.

Oscilo, em dúvida do que responder.

– E, além do mais, acho que Aiden e Miles estão por lá, já que
eu não os vi aqui – continua, um brilho em seus olhos.

Céus, e eu quero descobrir o que tem por trás das paredes


daquele clube? E se nessa nossa aventura, eu encontrar muito mais
do que o Dominators carrega, assim como aconteceu com Emy? Se,
eu descobrir um lado meu que não conheço? Bom... eu quero a
resposta.

– Tudo bem – confirmo, mantendo as mãos rente ao corpo


para conter o tremular nelas.

Emy amplia o sorriso.

– Essa é a minha garota! – comemora, levantando-se.

Talvez eu me encontre nessa experiência. Ou, talvez, eu me


perca de uma vez por todas.
 
Emy não precisa fazer nada além de parar de frente para
longos e robustos portões de ferro escuro, que são abertos assim
que alguém identifica o seu carro. Um manobrista, com uma
máscara tapando o rosto, orienta Emy para a direita. Há um vasto
jardim com inúmeros carros estacionados ao redor de uma fonte de
pedestal com um casal nu.

– Tudo aqui remete a sexo? – questiono, encarando o pênis do


homem muito bem esculpido.

Emy ri.

– Estamos em um clube de sexo, amiga, você queria o quê?


Corações e cupidos?
Não respondo, mantendo minha atenção nos detalhes de
apresentação do local.
– Aqui, cubra o rosto com isso. – Emy retira uma máscara do
banco de trás e me entrega e pega outra para si mesma.
– Uau... – murmuro, admirando os detalhes em pedras
douradas. A máscara cobre grande parte do meu rosto, deixando
somente a boca e o queixo de fora.

– Eu usei uma vez só, então ninguém vai te confundir comigo –


afirma, deixando claro que não serei agarrada por aí pelo tal
dominador dela.
Olho o meu reflexo no espelho retrovisor, admirando a
máscara que me manterá no anonimato ao longo da noite, mas a
parca iluminação me impede de ter detalhes melhores.

– E, não abaixe a cabeça e nem olhe para baixo, em momento


nenhum, entendeu? – Agarra os meus pulsos, forçando-me a
encará-la. – Isso só servirá para alertar os dominadores de que você
é uma submissa.

Arregalo os olhos, minha pulsação acelera.

– E como é que eu vou saber o que eu sou?

Emy solta uma gargalhada exagerada.

– É meio que instintivo, você vai ver e vai decidir do que gosta
– explica, enrolando os cabelos nos dedos. – Mas, enfim, ninguém
vai fazer nada com você, nem mesmo tocar, eles só podem fazer
isso com a sua permissão.

– Então eu preciso sempre manter a cabeça erguida?

Emy balança a cabeça.

– Não, isso dirá a eles que é uma dominadora. Só aja de modo


natural, Maddie, seja você mesma. E depois que descobrir do que
gosta, aí sim pode entrar lá e mostrar o que quer.
Mas que porra de lugar é esse? Agir de modo natural?  Eu
estou quase tendo uma síncope nervosa, não consigo nem mesmo
respirar direito e controlar a respiração.

– Tudo bem, vamos nos divertir. – Ela abre a porta, mas para
antes de sair do carro. – Não se assuste, talvez você veja Miles
transando com alguém por aí, só ignore e passe reto.

Engulo em seco.

– Então o sexo é sempre... explícito?

Emy discorda.

– Claro que não, tem as salas para o voyeurismo para quem


quer e gosta de observar outras pessoas transando, assim como
tem as salas privativas – esclarece  – eu nunca transei nas salas
abertas, uma porque Miles morreria e outra porque não gosto de ser
observada, mas aí vai do que você realmente gosta.

Emy desce do carro e eu a sigo, trêmula. Forço as minhas


pernas a manter um ritmo lento e constante, concentrada para não
cair estatelada no meio do chão.

Ao passarmos pela fonte, noto a residência que Miles e Aiden


transformaram em uma casa de BDSM. O local é enorme, as
paredes tingidas de vermelho e as aberturas de preto. Há uns
degraus em frente a uma porta de madeira dupla, onde um
segurança, que também cobre o rosto com uma máscara, aguarda.

Subimos os poucos degraus e paramos de frente para ele, o


homem não fala nada, nem mesmo um cumprimento. Emy abre a
bolsa e retira um cartão vermelho de dentro dela, entregando-o a
ele. O homem pega uma lanterna de luz negra e aponta para o
cartão.

– Só há uma entrada aqui – fala, a voz grave e grossa parece


entediada.
– Não precisamos ser inocentes e fingir que você não sabe
quem eu sou, e é justamente por isso que deixará nós duas passar
– contrapõe Emy, incisiva.
Ele ergue o rosto para encará-la, então entrega o cartão para
ela, guarda a lanterna e aperta no botão do comunicador.

– Preciso falar com o Big Dog – anuncia, sem quebrar o


contato com Emy.
Engasgo uma risada, sem conseguir controlar o apelido idiota
com o qual ele acabou de se referir a alguém. Fala sério, quem é
que se chama “cachorrão”?
Emy me cutuca com o cotovelo, me fazendo parar de imediato.
Ok, não pensei que fosse tão sério, não com um apelido tão idiota
quanto esse.
– O que seria? – Alguém fala através do comunicador.

– Uma entrada sem cartão exclusivo – profere, perdendo a


paciência.

– Já sabe que não precisa falar com ele, sem cartão não entra.
– É a irmã dele.

Oh. Meu. Deus! Puta merda! Miles é quem se denomina


“cachorrão”? Porra, que bosta!

– Diga que a irmã dele trouxe uma amiga. – Emy cruza os


braços e encara o segurança com raiva e petulância – Ele sabe
quem é a amiga, mas não direi o nome dela para ninguém.

É bom mesmo, que desonra seria para os meus pais se eles


descobrirem que a filhinha deles está em um clube de sexo, o que
será que a sociedade pensaria? E os eleitores?! Reviro os olhos
com os meus pensamentos.
Permanecemos os três em silêncio por segundos intermináveis
e muito desconfortáveis, até que a voz do outro lado do
comunicador interrompe:
– Pode deixar passar – diz, silenciando-se de novo.

O segurança coloca uma chave na porta, destrancando-a e


liberando a nossa passagem. Emy vai na frente e eu vou logo atrás,
agarrando o seu braço como se a minha vida dependesse do toque
dela. Assim que atravessamos a porta, o homem a fecha sob as
nossas costas.

– Lembre-se, cabeça para frente – sussurra Emy por sob o


ombro.
O rol de entrada não é nada mais do que uma sala escura e
vazia com outra porta na nossa frente. Emy avança, liberando a
segunda passagem, assim que seus dedos tocam à maçaneta e a
porta é aberta, o barulho alto da música e o cheiro forte de cigarro e
perfume nos atinge.

Há inúmeras pessoas circulando pelo lugar, a maioria vestida,


mas algumas estão totalmente nuas, exceto pelas máscaras, que
todos usam. Um casal passa ao nosso lado, o homem vestido só
com calças jeans, caminha com uma mulher nua ao seu lado,
segurando uma coleira que ela está usando enrolada ao redor do
seu pescoço.

Do outro lado vejo uma mulher com um chicote na mão e aos


seus pés está um homem ajoelhado, implorando por alguma coisa.

A sala é grande e espaçosa, no canto direito vejo um bar com


muitas bebidas e garçons seminus enchendo os copos. Ao fundo
algumas portas e um único elevador.

– Vamos pelo corredor, é nele que tem as salas para observar


– diz Emy, fazendo-se ser ouvida por cima da música alta – E antes
que eu me esqueça, aqui todo mundo usa algum tipo de apelido
para vedar a sua identificação, então já vai pensando em um.
Todo o sangue se esvai do meu rosto. Não acredito que ela
está me dizendo isso justamente agora, quando estamos dentro do
clube e eu não consigo pensar sob pressão.

– Qual é o seu?
– Imperatriz – responde e me puxa em direção ao corredor.
Uma luz vermelha permeia o local confundindo a minha visão.
Pessoas percorrem o lugar com olhares afiados em busca de uma
nova conquista. Ao nosso lado direito tem uma sala ampla com uma
cama de dossel ao meio, cordas e algemas caem do teto e
inúmeros equipamentos bem estranhos estão dispostos em cima de
uma mesa de canto. Uma mulher está deitada de bruços no
colchão, as mãos estão amarradas junto com as pernas e ela está
aberta e virada para o público.

– Céus... eu consigo ver até o útero dela – comento no ouvido


de Emy, meus olhos estão fixos e arregalados na cena.

Um homem se aproxima dela e esfrega um vibrador em seu


clitóris, a mulher geme, mas a bola que tampa a sua boca impede
que faça mais do que isso. Ela se balança e as cordas que prendem
suas mãos e pernas parecem aumentar o aperto, tornando os
movimentos quase impossíveis.
Um grupo de muitas pessoas assistem a cena ao redor da
sala. Um homem próximo a nós está com o pênis para fora,
masturbando-se enquanto observa a cena. Outro casal se acaricia,
a mulher está com uma mão dentro da calça do companheiro,
enquanto ele faz o mesmo com ela.

– Eles são telespectadores – sussurra Emy, observando o


mesmo que eu – assistem para que as coisas esquentem e depois
vão para um lugar mais privado ou transam por aqui mesmo.
– Então pode transar em qualquer lugar aqui dentro? Não tem
tipo alguma regra? – questiono, me sentindo animada com tudo o
que estou descobrindo.
Ela balança a cabeça e franze uma sobrancelha.

– Estamos em um clube de sexo, Maddie, as pessoas vêm


aqui para transar, o que estava pensando?
Um rubor cobre o meu rosto.

– Sei lá, achei que quando o casal principal estivesse em cena,


os outros deveriam respeitar – digo, analisando tudo ao redor.

Emy ri.

– Quanto mais gente transando, mais as pessoas irão gostar –


Emy me puxa, nos tirando de frente da porta da primeira sala,
avançando corredor adentro – Você vai ver gente transando em
todos os lugares, sem exceção. A última vez que estive aqui, um
cara estava chupando uma mulher no balcão do bar e já tinha gente
ao redor assistindo.

A segunda porta contém uma sala muito parecida com a


primeira, a diferença é que nessa há uma mulher e três homens na
volta dela, todos a fodendo ao mesmo tempo.

– Nossa senhora... – murmuro, estarrecida.

Um homem está deitado na cama de costas para cima e a


mulher está em seu colo, movimentando-se para cima e para baixo.
Outro homem está na sua frente, o pau dele enfiado na garganta
dela, enquanto ela o chupa e é fodida ao mesmo tempo. E o terceiro
homem fode a bunda dela com força. Os três transam em uma
sintonia extraordinária, como se estivessem muito acostumados a
fazer isso.

– Essa é a Afrodite – cicia Emy, inclinando-se para falar em


meu ouvido – Ela é uma dominadora, mas gosta de ser fodida
sempre por três ou mais homens.

Arquejo.

– E os outros vão aonde se esses daí já estão ocupando todos


os buracos?

Emy se engasga com uma risada.

– A última vez que vi ela com cinco homens, três estavam


fodendo-a como agora, e o quarto massageava o seio dela
enquanto era fodido pelo quinto.

Bom, isso explica muito bem como funciona essa matemática


sexual.

– Afrodite é famosa no clube, ela vem todos os finais de


semana, sem faltar nem uma única vez. Dizem por aí que ela é
ninfomaníaca. – Emy segura o meu braço, me induzindo a continuar
– Tem uns bem mais divertidos.
Sinto uma mão em minha cintura e fico rígida
instantaneamente, sem saber o que fazer. Aperto o braço de Emy
com força, sinalizando que estou desesperada em busca de ajuda.
Um corpo grande se acomoda às minhas costas no mesmo
momento em que Emy se vira.
– Ei, cai fora que ela não está disponível – fala, em tom sério.

– Podemos fazer um trisal, gatinhas, o que acham? – o


desconhecido pergunta, mantendo o braço firme em minha barriga.
– Eu já disse que não! – Emy me puxa com brusquidão, me
tirando do aperto do desconhecido. – E se continuar tocando nela
sem permissão, vou chamar a segurança.
Me viro para encará-lo, ele é alto e possui cabelos loiros
claros. Seus olhos se fixam nos meus, então ele levanta as mãos
em sinal de rendição e dá alguns passos para trás.
– Sempre tem um idiota, mas é só ameaçar chamar a
segurança que eles fogem igual crianças medrosas.

– Por quê? – pergunto, curiosa.

– Não existe duas infrações no clube, se violar qualquer regra


na primeira vez, nunca mais coloca os pés aqui.

É uma ótima forma de manter todas essas pessoas em rédeas


curtas. Imagino que frequentar o clube seja importante para eles e
que eles não querem, de maneira alguma, ser expulsos do local.

Percorremos mais alguns metros e paramos de frente para


outra porta. Nesta sala há duas mulheres, uma delas está amarrada
no ar com as pernas arregaçadas e os braços presos atrás do
corpo. A outra está em pé de frente para ela enfiando uma vela
grossa acesa em sua boceta, invadindo-a até o fundo e retornando,
sucessivamente. A cera quente pinga em sua pele, queimando-a e
deixando um rastro vermelho de dor. A mulher geme alto, o som de
seu prazer entoando pelo corredor. A que está sendo fodida parece
sentir prazer com a dor enquanto a que ministra a vela, parece
sentir prazer em infringir a dor.
– Porra! – Minha voz morre e meu queixo cai.

Emy passa o braço nos meus ombros.

– Sadomasoquismo, Maddie, a junção de sadismo e


masoquismo, em que, o primeiro se refere ao ato de infringir dor, e o
segundo ao ato de sentir a dor. Aqui no BDSM esses conceitos são
levados ao erotismo e interpretados no âmbito sexual – explica,
estalando a língua no céu da boca – A garota com a vela é a
submissa e a outra a dominadora, ambas têm a mesma predileção
sexual só que de maneiras diferentes, e aqui no clube elas
conseguem suprir isso. – Emy solta uma risada com a expressão
que eu apresento. – Vem, tem muitas outras salas ainda.
A próxima sala contém três homens, um deles está amarrado
enquanto outro fode a sua boca e o outro a sua bunda, os ritmos
constantes se assemelham ao da primeira sala, como se fossem
acostumados a isso. E na outra há mais um casal, e assim se segue
sucessivamente, até a última porta.

– Terminamos a seção de voyeurismo, nos outros andares


possuem quartos, mas são privados.

De fato, nunca pensei que assistiria a tantas cenas atípicas


como hoje. Emy já havia me contado algumas coisas sobre o clube,
mas suas descrições não chegaram nem perto da verdade, do que
foi presenciado.
Nessa última sala, uma mulher amordaçada está chupando um
homem que segura os seus cabelos com força. E há menos
telespectadores aqui, o que significa que o pessoal gosta mesmo é
de assistir o sexo mais pesado.

Um homem se aproxima de nós duas e agarra Emy com força,


colando o corpo dela ao dele, então ele se inclina e sussurra algo
em seu ouvido. Me preparo para intervir, assim como ela fez comigo
mais cedo, mas Emy parece confortável demais.
Ela se vira para mim e puxa o meu pulso para que eu me
aproxime.

– É ele... – sussurra, e eu não preciso mais do que poucos


segundos para entender a quem ela se refere – Eu vou subir, se
importa de ficar um pouco sozinha? Vou deixar as chaves do meu
carro para você, caso queira ir embora.
Eu nunca fui uma empata foda e não vai ser agora que eu
serei uma, Emy, de uma forma bizarra, gosta desse cara misterioso.

Volto os meus olhos para observá-lo com mais atenção. Ele é


alto, talvez uns trinta ou quarenta centímetros maior que Emy, seus
cabelos são escuros e encaracolados. Ele também tem um corpo
bonito, magro e ombros largos. Não consigo ver nada do seu rosto,
além dos olhos castanhos que me fitam com curiosidade e precisão.
Não sei como Emy consegue viver esse caso amoroso há
tanto tempo e não se incomodar em não ver o rosto dele, eu acabei
de conhecê-lo e a curiosidade já está corroendo as minhas veias.

– Não se preocupe comigo, vá se divertir – digo, desviando os


meus olhos dos dele e dando fim a minha inspeção.
Emy mexe na bolsa, retira as chaves do carro e joga-as no ar
para mim que as pego com as duas mãos.

– Até amanhã, gata! – Pisca um olho, enlaçando a mão com o


seu dominador e se afastando pelo corredor.

Cruzo os braços em frente ao corpo e me volto para a sala


onde o casal continua na mesma posição. Observo a cena com
calma, removendo qualquer tipo de preconceito, me libertando das
amarras.

Encaro o pênis dele saindo e entrando da boca dela, baba


escorrendo pelo seu queixo. Ele movimenta os quadris, fodendo os
lábios da mulher com tesão, e ela corresponde, mamando-o
enquanto encara o parceiro, feliz e satisfeita por estar lhe
propiciando prazer. Os gemidos dele reverberam por toda a sala,
aumentando cada vez que o pau dele some dentro da boca dela.
Um calor insidioso se infiltra nas minhas entranhas, me
fazendo morder as bochechas para conter um gemido. Desejo
molha a minha calcinha.
Minha respiração acelera, se tornando densa, pesada,
forçando meus pulmões a trabalharem mais e meu peito a subir e
descer em rápidas sucessões.

Céus, isso é quente e insano!


Uma palma quente, áspera e grande enrola o meu pescoço e
um corpo se junta a mim, colando as minhas costas contra o peito
definido e duro.
– Está gostando da cena? – sussurra contra o meu ouvido, o
hálito quente me arrepia, a voz ríspida e rouca me deixa ainda mais
excitada.

– Você está, Aiden Thorne? – respondo a sua pergunta com


outra, um sorriso se espalha pelo meu rosto e eu não poderia me
sentir mais quente.
 
A risada de Aiden chega aos meus ouvidos e um gemido
escapa dos meus lábios, meu corpo tomando vida própria ao estar
tão próximo do dele.

– Eu perguntei primeiro, princesinha – retruca, a boca ainda


próxima demais da minha pele.

Estou uma mistura de sensações e sentimentos controversos,


meu coração está acelerado e as minhas pernas bambas. Me sinto
excitada, quente e... morrendo de desejo, desejo por ele, por Aiden
Thorne.

– O que você acha? – atiro, me forçando ainda mais contra ele.


Sinto o pau duro de Aiden cutucar a minha lombar e outro
gemido escapa pela minha garganta.
– Eu acho que essa boceta tá encharcada – murmura, os
dedos pressionando ainda mais a minha garganta.
Fecho os olhos, a sensação de ter Aiden tão próximo a mim,
os barulhos de sexo ao nosso redor e a aura de tesão que nos cerca
me fazendo querer subir pelas paredes.

– Acho que você deveria descobrir isso por conta própria –


Esfrego a língua nos meus lábios ressecados e viro a cabeça para o
lado, a boca de Aiden fica a centímetros da minha – Ou posso
encontrar outra pessoa para conferir, se quiser.
Óbvio que eu não vou procurar ninguém, meu interesse hoje é
único e exclusivamente nele, mas não custa nada provocar Aiden e
ver até onde vai a sua paciência e limite.

Aiden me deseja tanto quanto eu o desejo, somos adultos,


solteiros e livres, nada para impedir que um sexo casual ocorra.

Ele se inclina e planta um beijo na minha bochecha, perto o


suficiente da boca para que a minha mente fértil imagine como seria
ter a língua contra a minha. Então ele se afasta alguns centímetros
e ri.

– Eu duvido, princesinha – zomba, mantendo as mãos em


mim.

Meu tesão se esvai como em um passe de mágica, cedendo


lugar para a raiva. Não acredito que esse imbecil está mesmo
duvidando de mim, outra vez, como se eu não fosse capaz ou não
tivesse coragem de fazer isso.

Me desfaço do seu enlace e me viro em sua direção. Preciso


piscar para desvanecer a minha mente com a visão dele. Aiden está
vestindo uma camisa preta justa que se acomoda aos músculos, ela
está dobrada nos cotovelos, as tatuagens dos braços estão à
mostra, assim como os pulsos fortes e cobertos por veias. As calças
jeans tonificam ainda mais as coxas grossas e os mesmos coturnos
grandes e altos de sempre. Seu rosto está coberto por uma máscara
preta, deixando somente o nariz e boca de fora, mas eu consigo ver
perfeitamente a mancha bicolor que cobre o olho esquerdo, e seus
cabelos estão uma bagunça charmosa.

Que inferno de cara bonito e gostoso! Ele não podia ter


nenhum defeito, não?

Meus lábios se curvam em um sorriso incisivo.

– Dúvida? – induzo-o, ele concorda com um aceno de cabeça,


a mesma expressão zombeteira de sempre – Então, senhor,
aguarde e veja.

Me lembro de quando Emy me explicou como funcionavam as


coisas aqui dentro desse clube, Aiden não é submisso, nem um
pouco. Ele parece ser um dominador nato, o maxilar sempre erguido
e o nariz apontado para cima.
Amplio o meu sorriso e abaixo a minha cabeça, submetendo-
me a ele, provocando-o. E sinto uma estranha satisfação genuína
em me submeter a ele. Um grunhido escapa do seu peito e Aiden dá
um passo em minha direção, mas eu me afasto, pousando a mão
em seu peito duro para impedi-lo.

– Qual é o seu apelido? – pergunto, erguendo a cabeça de


novo.

O maxilar de Aiden está travado e seus ombros parecem


rígidos sob a camisa. Seus olhos me fuzilam com tanta intensidade
que eu preciso prender a respiração para manter os pensamentos
em ordem.

– Hades – responde, a voz rouca como cascalho.

O primeiro codinome verdadeiramente legal que eu escuto


nesse clube. Acho que Miles deveria ter pesquisado mais antes de
sair por aí se denominando o “cachorrão” do lugar. E, além do mais,
combina perfeitamente com a classificação dele no local, afinal,
Hades é o Deus do submundo, o Dominators é considerado como
um e Aiden é o dono do clube.
– E você? – replica, pigarreando.

Oh, merda!

Vasculho no meu cérebro qualquer coisa que seja coerente ou


não tão idiota ao ser pronunciado. Uma ideia bem absurda, mas
muito tentadora se ilumina na minha mente.

– Perséfone.
Mordo as bochechas para controlar um sorriso, preciso parecer
séria, como se isso fosse uma grande coincidência. Não posso ver o
rosto completo de Aiden, mas tenho certeza de que ele está
arqueando aquela sobrancelha idiota de sempre.

Ele solta uma risada enfastiante[6].

– Você acabou de inventar isso, não foi? – Coloca as mãos nos


bolsos da calça, o movimento me faz olhar para baixo e minhas
bochechas esquentam com a visão da protuberância no meio das
pernas.

– Claro que não, eu adoro a Perséfone, ela é a Deusa do


submundo – contraponho, mentindo descaradamente.

Ele balança a cabeça, rindo, bem descrente da minha resposta


esclarecedora.

– Então, princesinha, o que você vai fazer? – compele, em um


tom instigante e abre um sorrisinho cheio de insinuações.
– Aguarde, senhor do submundo.

Agora é questão de honra, vou esfregar na cara dele que não


sou tão ingênua e inocente quanto ele pensa. Aiden adora me tirar
do sério, mas dessa vez vou entrar na onda.

Perscruto o lugar com os olhos, analisando as pessoas,


procurando um alvo. Vejo um homem no canto, ele está escorado
contra a parede, uma perna dobrada e os braços cruzados. Ele
passa um ar de mistério e parece um pouco entediado.

É ele.
Não lanço um último olhar a Aiden, eu simplesmente saio
caminhando em direção ao misterioso, atravesso o corredor,
ignorando alguns olhares e me desfazendo de toques bobos. Paro
de frente para o sujeito, ele me encara com a mesma expressão
entediada de antes.
Fico em silêncio, sem saber o que falar ou como reagir.

Será que eu já chego chamando para transar ou eu vou no


velho e bom cumprimento de sempre?

Vou de segunda opção mesmo.

– É... oi! – Passo uma mão nos cabelos e abro um sorriso


amarelo. – Tudo bem?
Ele continua me encarando em silêncio, e eu me pergunto se
fiz algo muito absurdo.

Nossa, muito esperto da minha parte ter ido atrás do mais


recluso, tenho certeza de que se eu fosse em qualquer outro que
está excitado e se masturbando pelo corredor, já teria a minha
resposta.

– O que você é? – pergunta enfim, apontando com o queixo


levemente em minha direção.
Preciso de uns segundos para entender o que ele está falando
e dou graças a Deus que a máscara cobre a maioria das minhas
expressões.
A palavra submissa fica presa na minha garganta, ela parece
tão absurda de ser proferida. Não consigo expressá-la, não para
alguém que não conheço, não para alguém que não é Aiden.
– Submissa? – induz, impaciente com a falta de resposta.

Isso foi uma péssima, terrível ideia.

Sinto o peso do olhar de Aiden na minha nuca, e é justamente


a força dele que me faz balançar a cabeça em um sinal positivo.
O homem sorri amplamente.

– Saiba que eu gosto de infringir dor – avisa, deslocando-se da


parede e vindo até mim – Mas tenho certeza de que você vai adorar
o resultado.

Oh, puta merda!

O que eu faço? Isso não estava no plano.


Limpo a garganta.

– Nossa, uau... – falo, concordando veemente com a cabeça.

Ele pressiona a minha cintura com força, unindo os nossos


corpos.
– Eu vou queimar o seu clitóris com a chama de uma vela –
inclina-se para sussurrar no meu ouvido –, no início vai estranhar,
mas depois vai gozar de tanto prazer.

Ele não é tão duro e confortável quanto Aiden, mas ainda


assim não é de se jogar fora, se não fosse o fato de ser um
psicopata sadomasoquista. Agora eu entendi o porquê ele estava
sozinho e entediado no canto.
Estou hiperventilando, mas não de desejo e sim de pavor.
Me queimar? Ele ficou maluco? Não sou contra testar
brinquedinhos sexuais, mas fogo já é demais pra mim.
– Vamos para o quarto – fala, me puxando com ele.

Será que tem alguma palavra de segurança nesse lugar? Tipo


um pedido de socorro, mas que não chame tanto a atenção das
pessoas?
Braços fortes me puxam com força do aperto do esquisitão, me
colocando longe o suficiente dele. Aiden se coloca à minha frente,
bloqueando a minha visão do homem e me fazendo suspirar de
alívio.

– Essa é a minha submissa – fala, avançando.

– Se quiser manter a cabeça no lugar, sugiro que fique onde


está e mantenha-se longe dela. – A voz de Aiden se torna
ameaçadora.

O sujeito para, encarando-o com desdém.


– E quem é você para impedir?

Aiden solta uma risada mórbida, os punhos estão cerrados,


prontos para a briga.

– Ela é a minha submissa, então dê o fora daqui – contrapõe


Aiden.

O homem me encara por cima do ombro de Aiden, seu nariz se


franze e seus olhos pegam fogo, ele está furioso.

– Foda-se! – diz, virando-se e sumindo pelo corredor.

Inalo o ar com força e só então percebo que estive prendendo


a respiração esse tempo todo. A verdade é que os últimos
momentos foram aterrorizantes, óbvio que eu iria pará-lo assim que
sumíssemos das vistas de Aiden, mas, ainda assim, foi esquisito
demais.

Aiden se vira para mim, seus lábios estão franzidos em um


esgar.

– Você iria mesmo para o quarto com ele? – indaga, me


puxando para o canto e colando os nossos corpos de novo.

Inspiro o seu cheiro com calma, a sensação de comodidade


me assolando com força, de novo. É incrível como eu consigo me
sentir confortável com ele, como eu me torno desinibida.

– É claro – minto –, ele parecia bem interessante.

Aiden solta um grunhido, raivoso, a mão voa para o meu


pescoço, me mantendo no lugar.

– Sabe quais são as regras do clube? – Faço um sinal


negativo. Ele continua. – Uma submissa só pode ter UM dominador
– avisa, a voz baixa e ameaçadora.

– E daí? – indago, rouca, minha boceta pingando de novo com


toda a sua dominação sobre mim.
– E daí que se a submissa for atrás de outro dominador, ela
será expulsa do clube.

– Eu não tenho um dominador, então não quebrei nenhuma


regra – revido, entredentes.

Um meio-sorriso se espalha pelos seus lábios.


– Outra regra, princesinha, é que quando uma submissa
abaixa a cabeça na frente de um dominador, é porque ela quer
pertencer a ele... – Ele se curva e lambe o meu maxilar, me fazendo
gemer – O que significa que você se curvou a mim, e,
consequentemente, é minha dentro desse clube.
A ficha cai e eu entendo qual o ponto da jogada dele.

Uma onda de fúria irrompe dentro de mim. Empurro Aiden, mas


ele não move um único músculo.

– Seu cretino de merda! – grito, ignorando os olhares que


recebemos. – Você não pode me expulsar por algo que você mesmo
provocou.

Aiden dá uma risada debochada e nivela o rosto com o meu,


poucos centímetros nos separam.

– Sim, eu posso! Você é a minha submissa e foi atrás de


outro, ou seja, quebrou as regras.
O polegar dele acaricia a minha pele, enviando arrepios pelo
meu corpo, diluindo a minha raiva, transformando-a em um tesão
louco e arrebatador.

– Então me expulse, eu tenho outros métodos de encontrar


um dominador. – Arqueio uma sobrancelha, desafiando-o.
Ele se inclina ainda mais, nossas respirações se misturam,
tornando-se uma só. Sinto o seu peito contra o meu, seu ritmo
cardíaco igualmente acelerado, volúvel.
– Eu sou o seu dominador, Madelyn, e não sou adepto a
divisão.

– Saiba que eu também não sou, Aiden, não me importo


quais são as regras idiotas desse clube, se eu serei obrigada a ficar
só com você, também exijo exclusividade.

– O dominador faz o que bem entende. – Inclina a virilha


contra a minha, o pau duro me faz estremecer de tesão.

– Sinto muito, mas não temos um acordo – digo, tentando me


desfazer do seu toque sem êxito.
– Exceto quando a submissa discorda de outro par no sexo –
acrescenta, a mão se fecha em punho contra o meu vestido – A
primeira submissa precisa aceitar os outros parceiros, caso
contrário, o acordo pode ser desfeito ou o dominador precisa
concordar em manter somente uma.

Engulo em seco.

– E quem é a sua primeira submissa? – pergunto, não


querendo saber a resposta.
Aiden esfrega o pau contra mim, um gemido escapa pelos
meus lábios entreabertos.

– Eu não peguei ninguém pra ser minha submissa, até agora


– confessa, a respiração ruidosa, pesada – Nunca tinha vindo no
clube, é o meu primeiro dia aqui.

Meu coração infla em contentamento e meu estômago se


embrulha.

– E o que isso significa? – refuto, passando a língua pelo seu


pescoço e sentindo o gosto do seu perfume.
– Significa que você é a minha primeira, única e exclusiva
submissa, Madelyn.

Porra!

– Então faça a porra do seu trabalho, Aiden – revido,


grunhindo.
Seus olhos faíscam, uma centelha de indecisão pisca, mas
ela se apaga com a mesma intensidade com a qual apareceu.

Nossas bocas se chocam em um beijo irregular, Aiden me


cola contra a parede. Prendo minhas pernas ao redor da sua
cintura, as mãos dele voam para as minhas coxas, subindo o meu
vestido, me marcando. Sua língua entra na minha boca, explorando,
se deliciando, provando. Agarro o seu pescoço e finco as unhas na
pele pintada. Solto um gemido assim que ele segura o meu lábio
inferior entre os dentes.

O beijo é quente, explosivo. O mundo ao redor se torna um


nada, o barulho some, os gemidos são desfeitos, restando apenas
nós dois.

Aiden agarra a minha bunda com força e me acomoda sobre


o seu pau, esfregando-se contra a minha boceta.

– Porra, Maddie... – geme, os olhos fechados, a boca inchada


e vermelha do beijo.
Meu vestido está preso na cintura, estou só de calcinha no
meio desse clube, na frente de várias pessoas. Mas não sinto
vergonha, só Aiden importa, só nós dois.
Arrasto minhas mãos pelo seu peitoral definido, apalpando
cada gominho até chegar ao cós das calças jeans. Abro o botão e
abaixo o zíper, enfiando a mão dentro da boxer.

Sinto a cabeça do pau e então sinto o piercing gelado na


ponta dos meus dedos. Outro gemido me escapa. Desço pelo
comprimento, sentindo as veias, a pele lisa e quente, a dureza dele.
Retorno para a ponta, esfrego-a e uma gota molha o meu dedo,
retiro-o e coloco na boca, experimentando o seu gosto.
Os olhos de Aiden brilham com fogo puro e ardente.

– Puta merda! – geme, trincando a mandíbula.

Sorrio, lambendo a ponta do meu dedo cheia de provocação e


luxúria.

– Eu vou te foder tanto, Madelyn, por essa provocação que


não vai conseguir andar por uma semana.

– Você é cheio de promessas, não é mesmo?


Aiden solta um urro, então retira a mão da minha bunda e
leva até a minha boceta, ele coloca a calcinha para o lado e enterra
os dedos em mim, forte, fundo e bruto.
Arqueio as costas e me agarro contra os seus ombros,
jogando a cabeça para cima.

– Está encharcada, princesinha – morde o meu pescoço com


força –, a boceta toda molhadinha pra mim.

Aiden enfia dois dedos dentro de mim, metendo fundo, me


fodendo com força. O polegar brinca com o meu clitóris,
acariciando-o em movimentos circulares.

Em um movimento voluntário, abro mais as pernas. Aiden ri.

Não há nada de dominação ou submissão no que estamos


fazendo. Nesse momento, é só nós dois nos entregando ao prazer,
ao desejo que nos consumiu até que nos fizesse sucumbir e ceder.

– Aiden... – Seu nome sai dos meus lábios como uma súplica,
um pedido involuntário para que continue.

Ele gira os dedos dentro de mim e atinge um ponto que me


arrepia por inteira todas as vezes em que soca até o fundo.
Fisgadas se espalham pelo meu abdômen e uma sucessão de
gemidos e palavrões atravessam pela minha boca.
– Tá gostoso, Maddie?

Não consigo dar uma resposta verbal, me limito a acenar.


– Aiden, pelo amor de Deus! – choramingo quando ele puxa
os dedos para fora. Abro os olhos e vejo-o colocando-os na boca,
experimentando o meu gosto assim como eu havia feito com ele.
– Serei o seu Deus aqui dentro, Madelyn. Espero que não fuja
quando as coisas ficarem sombrias.
– Eu não tenho medo do escuro! – respondo, convicta.

Aiden abre um meio-sorriso, a mão livre arruma uma mecha


do meu cabelo atrás da orelha.

– Bom... – comenta, lambendo o meu maxilar.

Puxo o seu rosto para o meu e colo as nossas bocas de novo,


minha mão desce para o meio das suas pernas e toca no pau que
está duro feito uma pedra e molhado de tanta excitação. Mesmo
com o tecido atrapalhando, consigo arrastá-lo para cima e para
baixo, masturbando-o enquanto ele geme contra os meus lábios.

Aiden coloca a mão de volta no meio das minhas pernas, os


dedos longos e duros se arrastam pela minha pele exposta até
chegar ao meu clitóris. Ele brinca com o nervo, apertando-o e
massageando-o, intercalando entre movimentos circulares e vaivém.
Passo o polegar na cabeça do pau, brincando com a gota que
molha o membro, até o piercing que atravessa a ponta, sentindo a
textura metálica da joia.

Depois de tudo o que eu estudei e descobri sobre o tal


apadravya, só sei me sentir ansiosa em descobrir a veracidade de
cada uma das sensações que eu li na internet.

Aiden enterra os dedos dentro de mim, curvando-os para


acertar o mesmo ponto de antes, então ele acelera os movimentos,
metendo e tirando com rápidas sucessões.
Mordo os lábios para conter um grito de prazer.

– Goza na minha mão, princesinha – ordena, empurrando


mais e mais.
Finco as unhas em seu ombro com uma mão, a outra eu
continuo masturbando-o, aumentando os movimentos conforme me
aproximo de gozar.
– Só se você me acompanhar – atiro, a voz entrecortada pelo
prazer.
Aiden ri.

– Hoje você pode ordenar, princesinha, mas a partir da


próxima vez saiba que só vai obedecer – Segura o meu lábio inferior
entre os dentes – Eu sou o seu dom.
Um calor se concentra no centro da minha barriga e meu
corpo começa a estremecer com as primeiras fisgadas do orgasmo.
Aiden continua metendo os dedos, invadindo a minha boceta com
brutalidade.
– Ohhhh... – grito, jogando a cabeça para o alto.
Aperto a mão ainda mais ao redor do seu pau,
movimentando-o com rapidez. Aiden solta um gemido estrangulado,
sua lubrificação se intensifica espalhando-se ao redor da minha
palma.

– Puta merda, Maddie! – rosna, travando a mandíbula.


Meu corpo convulsiona contra a parede assim que eu chego
ao orgasmo. Entro em um estado letárgico de torpor e todos os
meus músculos se tornam como gelatina, desfazendo-se aos
poucos na mão de Aiden.

– Isso, Maddie, que orgasmo delicioso... – Ouço-o murmurar,


mas ainda me encontro nas nuvens e não tenho condição alguma
de responder.

Aiden solta um gemido e mais alguns palavrões, então se


desfaz na minha mão, seu gozo lambuza toda a minha palma,
espalhando-se pela boxer.
Ficamos na mesma posição por alguns segundos, as testas
coladas uma contra a outra, a respiração densa misturando-se,
conectadas. Aiden abre os olhos bicolores e foca-os em mim.
Meu coração erra uma batida.
– Eu vou te levar para casa, Maddie – sussurra, o hálito
quente contra o meu nariz e boca –, por hoje, deu pra nós – avisa,
deixando que as minhas pernas deslizem pelas suas até que eu
fique de pé.

Retiro a mão lambuzada do meio das pernas dele e coloco-a


na boca. Lambo dedo por dedo, limpando a minha palma do gozo
com a língua, sentindo o rosto.
Aiden segura o meu queixo com o indicador e o polegar, fogo
crepita em seus olhos.
– Se continuar fazendo isso, vou te levar para algum dos
quartos e te foder durante o final de semana inteiro – adverte,
passando a língua no meu lábio inferior –, estou te dando uma
chance, Madelyn.
Afasto-o, rindo e debochando da sua falta de controle. Arrumo
a minha calcinha e puxo o vestido para baixo.

– Eu só estava limpando a minha mão, não vi nenhum


banheiro por perto para fazer isso, então precisei improvisar –
provoco, encolhendo os ombros.

Aiden grunhe um palavrão desconexo e arruma a calça,


fechando-a.

– Vamos pra casa, princesinha, tenho muitos outros planos


para você em um futuro bem próximo – Ele beija a minha têmpora e
entrelaça a mão na minha.

Ao nos deslocarmos do canto da parede, percebo que


tivemos alguns telespectadores durante a nossa pegação. Não me
sinto envergonhada, pelo contrário, a hipótese de ninguém saber
que eu sou a filha do prefeito, que a minha identidade está a salvo,
que aqui dentro eu sou somente a Perséfone, me deixa excitada.
– Eu preciso entregar a chave da Emy – aviso, retirando-a de
dentro da bolsa transversal – E preciso de um cartão de acesso,
Emy precisou brigar com o segurança para que eu conseguisse
entrar.

– Vou providenciar os dois – avisa Aiden.

Ao sairmos do Dominators, a friagem da rua me faz


estremecer. Eu não percebi o quão quente é lá dentro até estar aqui
fora. Aiden entrega as chaves para o segurança da porta e fala
alguma coisa para ele, então me puxa para um abraço e nos
direciona até o seu carro.
– Amanhã você terá o seu cartão de acesso – murmura
contra o topo da minha cabeça – E quero que esteja aqui todas as
vezes em que eu te mandar uma mensagem – Para de caminhar e
me vira de frente para ele para que eu possa encarar os seus olhos
– O BDSM é importante pra mim, Maddie, e irei frequentar o clube
com certa frequência, se for a minha única submissa, precisará me
acompanhar.
– Eu estarei aqui – confirmo.

A minha curiosidade de conhecer o clube foi aguçada essa


noite, e depois do que eu e Aiden compartilhamos lá dentro, eu
quero mais, muito mais. Eu adorei a adrenalina, a excitação, o
êxtase.

Nós temos um acordo dentro do clube, nós só podemos tocar


um no outro e em mais ninguém. E estou muito feliz com esse
acordo, porque era justamente ele quem eu queria.
 
As coisas saíram do controle no momento em que Madelyn
chegou na festa do Miles no meu primeiro dia na cidade.

Eu tentei me manter longe da garota, tentei mantê-la fora,


evitando-a, mas todas as vezes em que eu trocava algum olhar e via
a maneira como me encarava, com o mesmo desejo que eu sinto
por ela, tudo caía por ladeira abaixo, até terminar de vez no clube.

Tenho sentimentos conturbados por ela, enquanto minha


mente ordena que eu fique longe, meu corpo pensa e faz o
contrário.

Nem nos meus melhores e piores sonhos imaginei que


encontraria Madelyn parada no corredor de voyeurismo do
Dominators, encarando fixamente um boquete, com as bochechas
coradas e o rosto de quem estava pegando fogo de tesão. Óbvio
que não me controlei e precisei ir até ela. Meu corpo ganhou vida
própria, me puxando em sua direção antes mesmo que eu pudesse
pensar com coerência no que estava fazendo.
Eu recém tinha saído de uma reunião com Miles onde
analisamos as finanças do clube. Minha cabeça estava explodindo e
eu só queria alguém para foder e relaxar.

Madelyn é filha do maldito assassino do meu pai, e, mesmo


assim, mesmo manchando a memória dele fodendo com ela, não
consigo parar, não consigo me controlar quando estou perto dela. E
agora temos um maldito acordo de sexo exclusivo dentro do clube.
Era isso ou aceitar vê-la com outros no Dominators. E essa
nunca foi nem mesmo uma mera hipótese.

Puta merda!

Madelyn nunca vai me perdoar quando descobrir que eu


pretendo acabar com o pai dela. Esse acordo sexual já começou
com prazo de validade, não que ela saiba.

– Cara, você tá pensando muito de novo – fala Miles, socando


o meu ombro.

Estamos com o carro estacionado na frente da casa do juiz,


meu notebook está no meu colo e estou tentando hackear a rede
Wi-Fi do filho da puta para ter acesso aos seus aparelhos.

Miles tem razão, é um trabalho fácil, mas eu estou aqui na


frente há alguns longos minutos porque simplesmente não consigo
tirar Madelyn e tudo o que aconteceu da minha cabeça.

– Inferno! – esbravejo, socando a direção.

– Cara, se concentre nessa merda e depois a gente conversa


sobre a Maddie – orienta Miles, bufando.
Assim como ele, Emy também sabe que Madelyn e eu estamos
oficialmente nos pegando. E, com isso, as duas estão nos
esperando no maldito bar, só que pra irmos até lá preciso terminar o
trabalho aqui.

Digito no notebook em uma velocidade vertiginosa, agredindo


as teclas para descontar a minha raiva. Em pouco mais de dez
minutos consigo o endereço de IP do desgraçado e assim o acesso
a sua rede. Avanço mais um pouco, detectando todos os
dispositivos que estão conectados na rede. Eu só preciso do
computador que ele usa para o trabalho.

– Encontrou? – pergunta Miles, os olhos vidrados na minha


tela.

Não o respondo, estou concentrado demais na minha tarefa.


Sem uma proteção adequada, as redes Wi-Fi se tornam vulneráveis
nas mãos de hackers como eu. E é justamente por esse motivo que
os frequentadores da Dark Web não costumam estar conectados a
uma quando acessam essa parte do ecossistema da internet.

Encontro três dispositivos celulares e dois computadores.


– Merda! – Agarro os meus cabelos com força, suspirando.

– O que foi? – Miles arregala os olhos, a cor esvaindo-se do


rosto.

Miles está comigo de teimoso, ele sabe os riscos que estamos


correndo ao invadir o provedor de internet de um juiz, mesmo assim,
fez questão de vir comigo.

– Não precisa morrer, não fomos pegos – debocho e ele


suaviza a expressão –, ele tem dois computadores conectados, vou
atirar na sorte e entrar em um deles primeiro.

Seria muito mais fácil se o maldito não tivesse mais do que um,
assim me pouparia trabalho e nós poderíamos ir de uma vez para o
bar beber com Emy e Maddie.
Miles fica em silêncio, a respiração voltando ao normal depois
do susto.

Volto para a tarefa e acesso o IP do primeiro computador


invadindo-o sem dificuldades. Entro em vários arquivos de Word,
fotos e aplicativos. Procuro em todas as pastas, mas não encontro
nada relativo ao trabalho do homem.
– Alvo errado – aviso, respirando fundo.

Tento invadir o segundo IP, mas um código de segurança


dificulta a minha vida.
– É esse, o outro estava fácil demais – murmuro, clicando e
digitando sem parar.

– Ele é mais esperto do que imaginávamos – comenta Miles,


os olhos vidrados na tela.
– Era de se esperar, já que é um instrumento de trabalho da
justiça – respondo.
Continuo mexendo, testando o código de segurança e a sua
força, tudo leva questão de cinco minutos até que eu consiga invadir
o computador.

– Cara, você é foda! – comemora Miles, limpando o suor da


testa.
Faço a mesma coisa que fiz com o primeiro, entro nas pastas,
arquivos e fotos. Não vejo nada demais, somente coisas sobre o
trabalho, algumas sentenças e números de protocolos processuais.
Então encontro uma pasta codificada.
– Que desgraçado! – resmungo, abrindo uma garrafa de água
e molhando a garganta seca antes de começar a decodificá-la. – Ele
com certeza esconde muitas coisas, está protegido demais para
quem não tem um pé na sujeira.
– Isso nós já sabíamos, agora resta descobrir no que ele está
metido – Miles tamborila os dedos na porta do carro, ansioso e
nervoso.

Eu nunca consegui descobrir o segredo que permeia a vida do


juiz, embora saiba que ele é corrupto como todos os outros. Invadir
o seu computador foi a conclusão que Miles e eu chegamos para
tentar encontrar algum podre.

Levo pouco mais do que dez minutos para liberar a pasta e


acessar os arquivos que contém.
– Estamos chegando no ouro... – Sorrio sombriamente.

Os arquivos estão criptografados com a tecnologia da Deep


Web, o que significa que, seja lá o que tenha neles, o juiz os
recebeu de alguém que acessa a Deep Web, ou seja, todas as
transações que ele faz são através do provedor a fim de evitar ser
descoberto.

– Ele tem alguém na Deep Web – aviso, estalando o pescoço e


relaxando para a próxima fase – Alguém que trabalha pra ele ou
alguém para quem ele trabalha.

Por que um juiz esconderia arquivos tão bem protegidos em


um computador? Segredo de justiça? Improvável! Já acessei sites
da justiça o suficiente para descobrir e aprender que eles não se
importam em privar os documentos, não quando se trata de um
cidadão qualquer, mesmo que tenha cometido crimes atrozes.
Acessar os arquivos leva mais tempo do que eu imaginava,
mas nada exagerado, não para um hacker da Dark Web. Assim que
consigo o acesso, levo alguns segundos para compreender sobre o
que se trata.
– São extratos bancários – cicia Miles, os olhos correndo de
uma linha para a outra sem piscar.
Se trata de transações feitas de pessoas físicas para o juiz,
alguns valores mais altos que os outros e todos são feitos com um
pequeno espaço de tempo.

– Estranho, por que ele esconderia esses extratos? – pergunto,


explanando os meus pensamentos.
Passo as outras páginas e não há nada além de números e os
nomes dá conta que fez a transferência dos valores.
– Ei, a conta não é do País – Miles aponta para a tela onde
mostra o número IBAN[7]. – Não é a conta oficial dele.
Tamborilo o indicador no notebook, pensativo, vasculhando na
minha mente alguma conclusão que faça sentido para esses
extratos bancários.

– Porra! – Miles soca o painel do carro. – Ele vende sentença!


– Agarra os cabelos loiros e se vira para mim, os olhos
semicerrados. – Por isso os extratos estão criptografados e o
dinheiro é depositado em outra conta.

Copio o nome de uma das pessoas que fez transferência para


o maldito e saio da pasta dos extratos para entrar na dos arquivos
que ele guarda do trabalho. Coloco na busca e encontro vários,
dentre eles, algumas sentenças. E todas elas foram favoráveis para
o homem.
O maldito vende todos os tipos de sentença. Nesse caso em
específico, se tratava de uma indenização que foi desfavorável para
o autor e muito favorável para o réu.

– Ele cobra metade do que ele teria que pagar no processo –


observo, analisando os valores que foram cobrados na ação e o que
foi depositado para ele.
Entro em uma outra ação e sinto o meu coração se encolher
com o que eu leio. Nesse caso em específico, a mãe denunciou o
marido de estupro, alegando que ele se embebedava e abusava da
filha dela, que tinha na época do crime apenas cinco anos de idade.

O homem é um empresário muito rico.

Uma quantia foi depositada para o juiz.


Ele foi inocentado.

– Filho da puta do caralho! – grunhi Miles, rangendo os dentes.


O maldito vendeu muitas sentenças, tantas quantas possíveis
para todo mundo que queria se ver livre da justiça e tinha dinheiro
para conseguir esse feito.

Copio toda a pasta do trabalho dele, assim como a prova dos


extratos bancários. Acesso a Deep Web e procuro o site que eu sei
que pertence ao FBI. Eles usam para camuflar a presença e
desvendar alguns crimes, também para enviar mensagens que não
querem que caia nas mãos de hackers.

Abro a aba do chat e fecho a mão em punho. Adrenalina, raiva


e uma sensação de alívio corre pelas minhas veias. A partir do
momento em que eu anexar os arquivos, a carreira do juiz corrupto
chegará ao fim, mas não é somente isso, eu farei justiça para todas
as pessoas que foram prejudicadas por ele.

Eu farei justiça pelo meu pai.

Depois de todos esses anos aguardando por esse momento, a


queda do primeiro membro da máfia, chegou.

Sem pensar mais, anexo todos os arquivos, sem falar


absolutamente nada porque não é preciso. Assim que
inspecionarem melhor o que tem nas pastas, o FBI chegará a
mesma conclusão que Miles e eu. Em menos de uma semana o juiz
estará atrás das grades.
– Feito! – murmuro, esfregando o rosto, exausto.

– Como você se sente? – Miles pousa a mão em meu ombro e


dá um aperto de leve.

Escoro minha cabeça no encosto do banco e mantenho os


meus olhos fixos na rua à nossa frente.
A cena do enterro do meu pai me alveja. O caixão fechado
para o último adeus, os rostos de todos os envolvidos. Todos eles
que estiveram presentes para dar suas condolências, mas que
foram os verdadeiros culpados.

Meu pai foi no mercado porque ele sabia que Miles dormiria
àquela noite na nossa casa. Ele foi porque ele era, acima de um
bom homem, um ótimo pai. Só que ele nunca mais retornou.

Pisco para afastar a dor que cobre os meus olhos, que


comprime o meu peito, que me faz estremecer.

– Pronto para a próxima – falo, fechando o notebook e


jogando-o para o banco de trás –, não vou parar até que eu veja
todos eles no chão.

Miles suspira.

– Quem será o próximo?

Viro-me para ele, um sorriso traiçoeiro curva os meus lábios.

– O xerife.

O maldito que foi até a nossa casa para anunciar o ocorrido,


que fingiu se compadecer com a dor da minha mãe, com a MINHA
dor. O desgraçado que sabia de tudo desde o início, o homem que
deveria prender e fazer justiça, mas que se corrompeu pela máfia e
que hoje não passa de um verme mentiroso.

– E depois? – insiste Miles.


Ligo o motor e acelero, deixando a rua do juiz para trás, nos
colocando em movimento em direção ao bar onde as meninas nos
aguardam.

– O prefeito.

Seguro a direção com força ao pronunciar o nome do pai da


Maddie. Eu odeio esse homem com todas as minhas forças, o
sentimento é tão profundo que eu não sei onde começa.
Os outros estão envolvidos e merecem pagar, mas Sutherland
foi o mandante, ele é a cabeça de tudo.

– E quanto a Maddie?
Cerro os dentes com tanta força que o músculo da minha
mandíbula estala. Não quero pensar em Madelyn. Não quero
analisar a nossa situação. Não quero reflexionar sobre como ela vai
ficar, sobre como ela vai reagir.

– Isso tudo é muito maior do que nós dois – respondo, em tom


baixo.

Embora eu não queira me envolver ou sentir, sei que vai me


quebrar em inúmeros pedaços quanto Madelyn descobrir tudo, e é
justamente por isso que não queria envolvê-la. Os filhos não
merecem pagar pelos erros dos pais.

Mas o sentimento foi maior e mais forte que nós dois.

No momento, só consigo lamentar pelo futuro fracassado que


teremos e apreciar enquanto ela ainda não me detesta.
 
Estaciono o carro em frente ao Rollin’ Hops e desço com Miles
ao meu encalce. O lugar está lotado de universitários e de idiotas
como Lennon.

Ao passarmos pelo lado do estacionamento, vejo o Jeep do


babaca e o vejo escorado contra o veículo com um baseado no
meio dos dedos e os olhos vermelhos. Seus amigos estão
inclinados sobre o capô cheirando uma carreira de cocaína que se
espalha pela lataria. Lennon está tão chapado que olha para mim e
para Miles, mas parece não nos reconhecer.

Ignorando-o, entramos no bar e nos direcionamos até a mesa


onde as meninas nos aguardam. Vejo Maddie de costas para nós,
ela parece estar se divertindo com Emy enquanto seca um copo de
chopp.
Deslizo pelo banco ao seu lado e retiro o copo das suas mãos,
esvaziando o restante do líquido. Madelyn me encara com um esgar
nos lábios e uma sobrancelha arqueada.
– Vai pagar o próximo, esse recém tinha chegado – avisa,
fazendo um bico perfeito com a boca.

Desço os meus olhos pelo seu corpo e reparo no vestido verde


que está usando. O decote dos seios é profundo, deixando-os bem
empinados e visíveis. Uma tiara da mesma cor puxa sua franja para
trás da cabeça.
– Estava na metade – contraponho, colocando o copo vazio de
volta à mesa.

Se eu continuar analisando Madelyn, vou agarrá-la pelo braço


e levá-la até um canto para fodê-la. A garota parece bem ingênua e
inocente aos olhos da maioria, mas a verdade é que ela é uma
safada. Ainda não consigo diluir a imagem dela colocando o dedo
sujo da minha lubrificação na boca e chupando-o como se fosse o
doce mais delicioso do mundo. Foi a cena mais sexy que eu já
assisti.
Madelyn se recosta na cadeira, o ombro nu toca em meu
braço.

– E daí? Eu pedi para beber, não importa que estivesse pela


metade, eu quero outro – retruca, empinando o nariz.

A inclinação do seu rosto me faz suprimir um sorriso, ela


parece bem durona, mas não pensou duas vezes antes de se
declarar minha submissa no Dominators ontem à noite.

– Vocês demoraram, o que estavam fazendo? – Emy coloca


um canudo rosa entre os lábios e chupa a bebida de morango,
intercalando olhares entre Miles e eu. – Quase que Maddie e eu
fomos para um lugar mais animado – provoca, sorrindo para mim.
Eles sabem que Madelyn é minha submissa, assim como
sabem que somos exclusivos um do outro dentro do clube. E Emy
como uma submissa, sabe que um dominador é muito categórico e
ciumento quanto ao seu cônjuge.

Emy tem um dominador, eu não conheço o cara, mas sei que


eles estão sempre juntos.

– Uma ligação e a entrada de vocês seria proibida – Sou


incisivo ao responder ao seu sorriso.

Estendo o meu braço e o descanso atrás do encosto de


Madelyn, uma atitude involuntária do meu corpo para se aproximar
mais da garota.

– Idiota! – grunhi Emy, revirando os olhos.


– Lennon não veio te incomodar? – indaga Miles, apontando
com o queixo para Maddie.

A garota fica rígida ao meu lado, os músculos relaxados se


tornam densos e pesados.
– Ele está aqui? – sussurra a pergunta com um fio de voz.

Miles confirma com a cabeça.

– Na rua com os amigos – avisa, pegando o copo da mão da


irmã, removendo o canudo e virando tudo em alguns goles –, mas
não tem com o que se preocupar, se ele não veio incomodar, agora
que estamos aqui é que ele não virá mesmo. – Devolve o copo para
uma Emy que o fuzila com o olhar.

– Definitivamente, precisamos de mais bebidas – bufa Emy.

Estendo o braço e solicito a presença de algum garçom.

– Boa sorte, vai levar no mínimo uns dez minutos para que
alguém apareça – murmura Madelyn, cruzando os braços –, tem
muito público para a pouca gente que trabalha, eles estão
sobrecarregados.

– Então por que mesmo que vocês vêm pra cá? – Encaro-a.

– Diga algo produtivo que tenha para fazer nessa cidade,


Aiden – provoca Emy.

Lanço um olhar enviesado para ela no exato instante em que


uma garota se aproxima. A garçonete segura uma prancheta entre
as mãos e aguarda os pedidos. Ela é jovem, grávida e parece
cansada ou abalada.

Peço cerveja para mim, Maddie e Miles, e o mesmo drink que


Emy estava bebendo. A garçonete anota tudo e se afasta, percebo
que ela evita encarar o restante da mesa e que as meninas estão
muito silenciosas.
– Qual foi a merda que aconteceu? – Miles se antecipa e
pergunta antes de mim.

Emy e Maddie trocam um olhar e as duas parecem ter uma


conversa mental. Então Maddie faz um leve sinal de aprovação para
a amiga.
– O bebê que está na barriga dela pertence a Lennon –
sussurra, olhando para os lados.
Começo a me questionar se Maddie se sente incomodada com
isso porque ainda gosta do idiota do ex-namorado quando ela trata
logo de se explicar ao notar minha expressão enfezada:

– Ele me traiu com Gretha durante todo o nosso


relacionamento, eu descobri e foi por isso que nós terminamos. E
depois do fim, também descobri que ele manteve a gravidez
escondida, ou seja, eu nunca saberia de nada disso, já que os dois
vão se livrar da criança assim que ela nascer.
Ouvir o que Madelyn está me dizendo faz com que uma veia
de irritação pulse no meu pescoço. Eu não sabia quais as causas do
término deles ou quando isso aconteceu, só que ele era o ex-
namorado idiota dela.

– Nossa, que babaca! – crispa Miles, irritado – Eu não sabia


que ele tinha uma amante, ele e os caras do time sempre
mantiveram os segredinhos longe de mim por causa da sua relação
com a Emy – explica-se.

Miles gosta de Maddie, talvez pelo fato de ter visto a garota


crescer, já que ela e Emy sempre foram grudadas. Ou ele só se
sente como um irmão mais velho, assim como eu me sinto com
Emy. E se ele já desgostava de Lennon antes, agora é que o
detesta de vez.

– Quando vocês descobriram? – pergunto, me escorando


ainda mais em Maddie em uma tentativa de consolá-la, embora ela
não pareça nem um pouco abalada.

– Ontem à noite, antes de irmos para o clube. – Madelyn fala a


última parte diminuindo a voz em alguns tons para que ninguém
possa ouvir. – Eu só posso lamentar por ter perdido tanto tempo
com um cara idiota, de resto, não me sinto triste ou algo parecido,
só arrependida mesmo – confessa, dando de ombros.
Silêncio recai em nossa mesa, ninguém fala mais nada por um
longo momento. O burburinho de conversas paralelas é o único som
extraído pelos nossos ouvidos.

– Vamos ficar aqui a noite toda ou vocês têm alguma ideia


melhor do que fazer? – Miles finalmente fala.
Eu adoraria levar Madelyn para o clube e fodê-la do jeito que
estou ansiando, mas não quero que a nossa primeira transa seja em
um clube de sexo somente para suprir os meus desejos. Eu quero
comê-la com calma, aproveitando cada centímetro do corpo que me
deixa alucinado e da boceta apertada e gostosa. E só então, dividir
com ela as minhas perversidades.
– O que vocês acham de pegarmos algumas bebidas e irmos
dar uma volta? – sugere Emy, animando-se.

– Uma volta para onde? – questiona Maddie.

– Não sei, não podemos ir para a nossa casa porque mamãe


nos proibiu de fazer qualquer coisa lá desde a festa sem controle de
Miles. – Ela olha para a amiga. – E para a sua também é impossível
– Então olha para mim. – Podemos ir para a sua casa, Aiden?
Comprimo os lábios, pensativo.
Não sei onde minha mãe está, não a vejo com muita
frequência, embora estejamos morando na mesma casa. Ela passa
uma boa parte do tempo na promotoria, às vezes dorme no lugar.

– Esquece isso, só vamos dar uma volta e ponto – intervém


Miles.

– Tá, tudo bem! – concorda Emy.


Retiro uma nota da carteira e jogo em cima da mesa.

– Ei, não bebemos tanto assim! – informa Maddie, segurando o


meu braço ao ver o dinheiro.

– Fica pra gorjeta, a garota grávida está precisando mais do


que eu – respondo, levantando-me.
Eu não gosto dela por ter sido amante de um cara que ela
sabia que tinha uma namorada, mas, ainda assim, não posso
condená-la, acredito que estar grávida de um bosta como Lennon já
é castigo o suficiente.

– Maddie, vai com Aiden ou comigo? – pergunta Emy.


Madelyn me encara, os olhos grandes e expressivos estão
cheios de dúvidas e oscilação.
– Ela vai comigo – informo, depositando o braço em seus
ombros e puxando-a para mim –, vocês ditam o local que nós
vamos segui-los.

É incrível como eu faço justamente o contrário de tudo o que


eu quero quando estou perto de Madelyn. Passei o dia todo me
condenando por ter assumido a garota como a minha submissa no
clube e, ainda assim, aqui estou eu, tomando-a como minha na
frente de todos.
Argh!

– Encontramos vocês no carro! – informa Emy, puxando Miles


pelo braço para ir junto com ela e sumindo no meio da multidão.

– Eles poderiam simplesmente ter nos esperado – murmura


Maddie, a testa franzida enquanto observa o rastro da amiga.

Solto uma risada zombeteira.

– Acho que ela está tentando nos dar um momento a sós. –


Balanço a cabeça.
Atravesso o local sem perder o contato com Madelyn,
mantendo-a sobre o meu braço até a saída. Empurro a porta e
somos atingidos por um vento forte e refrescante, Madelyn
estremece e eu a abraço com mais força.

Caminhamos em sincronia pelo estacionamento, Madelyn


encara as estrelas em silêncio, admirando o céu noturno. Derivando
com o público que tinha dentro do bar, a rua está relativamente
vazia.
– Maddie? – Uma voz masculina soou à nossa esquerda.
Madelyn para de caminhar e arregala os olhos, sinto os
músculos das suas costas trabalhar pela rigidez. Ela está
desconfortável.
Corro os meus olhos em direção a voz que nos interrompeu e
bufo.

– Olá, Lennon, como vai? – fala, empinando o nariz e


assumindo um tom de voz neutro, seco.

O babaca está em um estado deplorável, os olhos estão


avermelhados e vidrados, as roupas amassadas e os cabelos
bagunçados. Claramente, bêbado e drogado.

– Você tá mesmo ficando com esse cara? – Ele se aproxima


em um passo oscilante, mas se contém com o olhar assassino que
eu lanço em sua direção. – Nós precisamos conversar, sei que me
bloqueou, mas eu preciso me explicar.
Madelyn arqueia uma sobrancelha.

– Não temos mais nada para conversar, você fez as suas


escolhas e eu fiz as minhas, agora é vida que segue – retruca,
entediada.

– Por favor, Maddie, nós temos um futuro juntos, vamos nos


casar e construir uma família – implora o babaca, as palavras saem
atropeladas pela língua pesada, arrastada pelo torpor do uso das
drogas.
Madelyn solta uma gargalhada assustadora, ela curva
levemente o corpo para conter o riso que ultrapassa os seus lábios.

– Céus, você é mesmo um lunático! Como é que eu nunca


percebi isso antes? – diz, concisa – Lennon, eu já queria o fim do
relacionamento muito antes de descobrir a traição, o sentimento já
era inexistente, embora eu esperasse que continuássemos amigos
antes de desvendar a verdade sobre o seu caráter.
– Madelyn, não seja idiota, sabe que não podemos nos separar
– cicia, e eu sinto uma ameaça em seu tom.

Um grunhido profundo atravessa o meu peito.

– Sugiro que cale a porra da sua boca! – Dou um passo na


direção dele, mas Madelyn me contém. – Se continuar ofendendo-a,
vai descobrir como é que se fica sóbrio rapidinho.

Lennon mostra os dentes para mim, ele tenta se aproximar,


mas as pernas estão bambas demais para que consiga executar os
passos.

– Vamos embora, Aiden, não vale a pena, já perdi tempo


demais com esse idiota – pede Maddie, puxando-me para longe.

Lanço um último olhar para o babaca antes de ceder ao aperto


de Madelyn e me afastar com ela. Cruzamos o restante do caminho
até o meu carro em silêncio.

Sinto a raiva queimar na boca do meu estômago e corroer as


minhas veias. Se não fosse por Madelyn, Lennon estaria no chão
nesse momento. Como ele ousa ofendê-la e ainda ameaçá-la?

Destravo o carro e nós entramos, levo alguns segundos


inspirando o ar com força para absorver e engolir bem fundo tudo o
que estou sentindo. Madelyn se mantém imóvel ao meu lado, ainda
em silêncio, pensativa, a mente a quilômetros de distância.
– Para onde você quer ir? – pergunto, finalmente, quebrando a
mudez.

Madelyn se vira para mim, os olhos faíscam em desprezo e


raiva, e eu me sinto um pouco mais aliviado por saber que ela sente
pelo idiota o mesmo que eu.
– Me surpreenda, Aiden. – Encosta a cabeça contra o banco e
fecha os olhos. – Só me tire daqui.
Faço como ela ordena.
 
Eu nunca tive certeza sobre o vício de Lennon em drogas, mas
desconfiava. Ele sempre foi muito cuidadoso quanto a isso quando
estava comigo e foi justamente por esse detalhe que eu nunca tive
uma resposta, até hoje.

Aiden dirige o carro em uma velocidade tranquila, mas vejo a


raiva através dos vincos esbranquiçados das mãos que estão
fechadas em punho ao redor do volante.

Observo as luzes dos postes conforme percorremos as ruas,


minha mente ainda está distante, distraída, mas a raiva predomina e
resume tudo o que estou sentindo.

Como o imbecil ousa me ameaçar? Eu entendi muito bem qual


foi o teor da ameaça. Lennon sabe o quanto meu pai é rude e
desprezível quando se trata da sua carreira política e do status de
bom moço da sociedade. Assim como sabe que nosso namoro
funcionava como uma espécie de liberdade para mim, uma que
estou prestes a perder caso eu saia da linha.
Eu prefiro passar o resto dos meus dias presa dentro de casa
do que voltar com ele só para suprir a necessidade de ter liberdade.

– Abre as pernas – ordena Aiden, grunhindo, os olhos fixos na


estrada à nossa frente.
Sinto a minha testa franzir em desentendimento.

– O quê? – pergunto.

Aiden tira os olhos da estrada por apenas um momento para


me encarar, fogo e um desejo intenso e profundo crepita neles.

– Eu quero tocar nessa boceta, então abra essas pernas – diz,


franzindo os lábios em um esgar.
Olho para os lados, os vidros do carro não são escuros ou
protegidos por uma película, eles são claros e qualquer um pode ver
o que está acontecendo aqui dentro.

– Ficou maluco? – questiono, apertando os lados do banco


para conter a onda de adrenalina e tesão que me assola.

Aiden remove uma mão do volante e coloca-a entre as minhas


pernas fechadas. Ele empurra uma coxa para o lado, ordenando
passagem.

– Ninguém consegue ver isso Madelyn, você está segura –


sussurra, puxando o meu vestido para cima e revelando minha
calcinha branca de renda. – Preciso tocar nessa boceta para me
acalmar – confessa.
Aiden coloca o tecido para o lado, deixando minha boceta
exposta. Um dos dedos passeia pela pele, abrindo os lábios
vaginais.
– Sua safada, já estava toda molhadinha pra mim.

Mordo o lábio inferior, meus olhos estão fixos nos movimentos


dos seus dedos. Aiden circula o meu clitóris com o indicador e o
dedo médio, espalhando minha lubrificação.

– Escora a perna na porta – orienta.

Faço como ele instruiu, minhas pernas estão bem divididas e a


minha boceta totalmente exposta e molhada. Aiden continua
brincando com o nervo, pressionando com mais força e acelerando
os movimentos.

Fecho os olhos e começo a gemer alto, qualquer insegurança


e medo que eu tinha se esvaindo conforme o orgasmo se aproxima.

– Aiden... – choramingo, agarrando o seu braço e tentando


ditar os movimentos.

Sinto o carro desacelerar e vejo que estamos parados em um


sinal vermelho. Meu coração bate tão forte com a hipótese de ser
pega que eu sinto o sangue latejar nos meus ouvidos. Aiden
percebe a minha hesitação, então intensifica os movimentos.

– Aiden... Deus... – ronrono, mexendo os meus quadris,


rebolando na sua mão.

Olho para o lado, um homem nos observa com o cenho


franzido. Ele está desconfiado, mas não tem certeza do que está
acontecendo pela escuridão dentro do carro. Abro um sorriso
trêmulo, cumprimentando-o e fingindo inocência no exato instante
em que Aiden enfia um dedo dentro de mim.

– Aiden, pelo amor de Deus! – brado, com dificuldade de


respirar e raciocinar.

O desgraçado ri e continua me bombeando com a mão,


ignorando que estamos no centro da cidade e ele está me
masturbando.
– Não se faça de inocente, Maddie, estou sentindo você mais
excitada ainda com a hipótese de ser pega.

Arqueio levemente as costas para fora do banco ao sentir outro


dedo invadir a minha boceta, penetrando-a até o fundo.

Aiden tem razão, talvez eu tenha me tornado insana com tudo


o que aconteceu, ou eu só seja uma doente de merda. Mas fazer
isso significa enfrentar o meu pai e as regras ridículas. E, ao invés
de me amedrontar, me deixa excitada, faz com que eu me sinta viva,
faz com que eu me sinta livre.

O sinal abre e Aiden coloca o carro em movimento de novo, ele


dirige perfeitamente com uma mão e encara a estrada como se
nada estivesse acontecendo.

Os dedos me fodem, o polegar massageia o meu clitóris, a rua


passa ao nosso lado em uma velocidade vertiginosa. Não aguento,
todo o meu corpo começa a tremer em um orgasmo forte e eu grito
o nome dele e alguns palavrões, perdida no torpor, na névoa do
tesão.
Mantenho os olhos fechados por mais alguns segundos,
aproveitando a letargia do orgasmo com um sorriso bobo espalhado
pelo rosto.

Aiden retira a mão do meio das minhas pernas e leva os dedos


até a boca, ele os lambe com tanta vontade que um suspiro se
desprende dos meus lábios.

– Eu preciso provar essa boceta gostosa – avisa, lançando-me


um olhar lúbrico.
Minha respiração se eleva, meu peito se mexe em rápidas
sucessões.

Aiden não só é quente como o inferno, ele queima como o


diabo.
Ele faz com que meu corpo entre em sintonia comigo, com que
eu me sinta leve, plena e feliz. Aiden não tem amarras, ele age e faz
o que bem entende. E acho que essa liberdade que ele deixa bem
claro que possui, foi o que me cativou e me puxou em sua direção.

Ou talvez seja mais do que isso.

Eu não sei a resposta, só sei que estou gostando do que


estamos vivendo, que estou curtindo os nossos momentos juntos.
Assim como sei que com Aiden eu posso ser eu mesma, eu
posso ser quem eu quiser.
Sufoco o medo de ser pega, a hesitação de viver a vida ao
máximo sem me preocupar com o que os outros vão pensar. Eu
simplesmente sucumbo aos meus desejos e as minhas vontades.

E que se dane todo o resto!

Me agacho no tapete do carro e me inclino em direção a ele,


preparada para quebrar mais uma regra essa noite.

– O que você pensa que está fazendo? – pergunta, confuso,


sem saber como agir.
Encaro-o por cima dos cílios volumosos, sorrindo com
depravação.

– Eu vou te chupar, Aiden Thorne.


Por um momento eu esqueço que ainda estou dirigindo e que
preciso me concentrar para não bater o carro. E tudo isso é culpa de
Madelyn e seu jeito depravado que me deixa alucinado.
Dou uma freada brusca ao notar o carro da frente. Maddie
solta uma gargalhada, a safada percebe que conseguiu me deixar
atordoado.

Ela se esconde na frente do banco e se inclina para cima de


mim, as mãos voam para o botão da minha calça jeans,
desfazendo-se do tecido com calma. Maddie enfia a mão dentro da
minha boxer e puxa o pau duro para fora.
– Nossa senhora, Aiden, você é grande – murmura, me
fazendo rir.

Maddie passa a ponta do dedo na cabeça do pau, uma gota de


líquido pré-ejaculatório brilha e ela trata de espalhá-la pelo
comprimento.

– Alguém já conseguiu te engolir todo? – pergunta, curiosa.

Sinto a respiração quente na cabeça do meu pau, pressiono


minhas pernas contra o banco pelos arrepios que a sensação me
causa.

– Não que eu lembre – revelo, mantendo minha atenção à


frente, tentando me concentrar.
Maddie se inclina mais, coloca a língua para fora e lambe,
devagar, a virilha, as bolas e a base do pau. Ela trabalha com a
língua de cima para baixo, com calma, me excitando, provocando,
sempre deixando a glande de fora.

Trinco a mandíbula com força e fecho as mãos em punho na


direção, estremecendo com a sensação dos lábios quentes
envolvendo o meu pau.
– Você vai me matar, princesinha... – Mordo os lábios,
contendo um gemido.
Madelyn segura a base do pênis e gira a mão de um lado para
o outro, de cima pra baixo, torcendo-o em movimentos controlados e
calculados. Ela mantém as lambidas e os movimentos, unindo os
dois para o meu prazer.

A filha da mãe sabe fazer um boquete como se fosse uma


profissional.

Sinto sua língua finalmente passear pela glande, com leveza,


fazendo massagem de um lado para o outro. Então, ela endurece a
língua e acerta um ponto na cabeça que é mais sensível.

Não consigo me controlar, jogo o rosto para cima e pisco com


lentidão.

Essa garota é uma gostosa desgraçada!

– Porra, Maddie! – gemo, meus músculos se contraindo.


Madelyn engole o meu pênis até perto da base, retira-o da
boca e repete o movimento, sempre sugando, mamando.

O apadravya aumenta a estimulação da glande todas as vezes


que ela enfia o meu pau na boca, me fazendo gemer e suspirar de
prazer.

Madelyn lambe o piercing, passando a língua ao redor dele.

– Dói? – pergunta, mantendo o ritmo da masturbação com a


mão.

– É prazeroso – revelo, piscando a seta para dobrar à direita.

Ela se inclina e toma todo o meu pau na boca de novo,


engolindo-o, retirando e repetindo os movimentos. Solto uma mão
da direção e agarro os seus cabelos, ditando o ritmo.
Meu lado dominador começa a assumir o controle, finco as
unhas no couro cabeludo dela e empurro a cabeça até o fundo,
fazendo-a se engasgar com o meu pau na boca.
– Ohhhh... isso, Maddie, bem assim – murmuro, gemendo,
arrepiado.

Esse é o primeiro boquete que eu ganho na vida enquanto


estou dirigindo e eu nunca tinha parado para analisar o quão
maravilhoso poderia ser.
– Cacete! – Minha voz não passa de um bramido.

Estou prestes a gozar, mas não quero fazer isso agora e nem
na boca dela, eu preciso experimentar de uma vez a boceta
apertada ou eu vou entrar em colapso. Viro o carro bruscamente
para o lado e entro em uma rua deserta. Madelyn continua
mamando, alheia ao que eu estou fazendo. Desligo o veículo e a
puxo para cima.

– O que foi? – pergunta, o queixo molhado pela minha


lubrificação, as bochechas coradas e as pupilas dilatadas.

Linda!

– Eu vou te foder! – aviso, retirando uma camisinha do porta-


luvas e cobrindo o meu pau – Coloca essa calcinha pro lado e senta
no meu pau – ordeno, rosnando.

Jogo o banco para trás e espero por Madelyn. Ela sobe em


cima de mim, coloca uma perna de cada lado e afasta a calcinha,
liberando a boceta lisinha, pequena e delicada. Então direciona o
meu pau até a entrada e se senta até a base, me engolindo por
inteiro.

– Puta merda! – exclamo, fechando os olhos.


Madelyn é quente e apertada como eu imaginava, ela é como
estar no paraíso e eu poderia morrer agora que me sentiria feliz por
isso.

– Agora eu entendo o que quis dizer quando falou que o


apadravya é prazeroso... – Arqueia as costas, agarrando-se na
porta.

Seguro as coxas grossas e a levanto para que ela sente de


novo, repetindo as estocadas. Abro a sua boceta apertada com o
meu pau, enfiando cada centímetro, cada vez mais fundo, mais
duro.

Sou grande, mas Madelyn me recebe por inteiro, e ainda faz


isso com o maior deleite.
Puxo o seu pescoço para mim e beijo os seus lábios com
vontade, sugando a língua, provando o meu gosto na boca dela.

Nada mais importa nesse momento. Aqui e agora só existe nós


dois, sem problemas, sem preocupações.

Sem vingança.
Só eu e ela.

Só eu e a filha do inimigo.

Sugo o lábio inferior, prendendo-o entre os meus dentes.


Maddie geme o meu nome, os olhos estão fechados. Impulsiono o
quadril para cima, estocando-a com toda a força, com brutalidade,
com necessidade.
Eu tinha planos melhores para essa noite, queria fodê-la com
calma, mas, preciso aprender que as coisas não funcionam com
lentidão para nós dois.
Nós somos intensos.

Somos como fogo e gasolina.


Ela se enterra até o fundo de uma forma deliciosa, os gemidos
reverberando pelo carro, unidos e conectados como se fossem uma
melodia, os quadris roçando contra os meus, encaixando-se com
perfeição.

Puxo o decote do vestido para baixo e desnudo um seio


pesado, o bico grande e rosado me deixa ainda mais duro, coloco a
boca nele, chupando-o e experimentando o gosto da pele perfeita e
delicada. Ela tem um sabor adocicado que abraça a minha língua
com suavidade.

Madelyn se contorce.

– Aiden... – Meu nome sai da sua boca como uma súplica,


como se ela estivesse saudando um Deus, implorando por
misericórdia.

Solto um gemido.
Desço a mão livre até a bocetinha e massageio o clitóris
inchado e molhada, circulando o nervo redondo. Ela está tão
lubrificada, tão excitada e molhada que meus dedos resvalam pela
pele com facilidade.

A respiração de Madelyn se torna mais ofegante e eu sinto sua


boceta me sufocar.

– Me engole todo, Madelyn, toma todo o meu pau para você –


rosno contra a pele fina, enfiando-me centímetro a centímetro, mais
e mais, como se nenhum espaço entre nós dois pudesse passar,
como se pudéssemos nos tornar um só.

Solto o seio para encará-la, para ver cada reação fugaz do


rosto enquanto chega ao ápice do prazer. Madelyn revida o meu
olhar, a névoa cobre as vistas escuras, as bochechas estão rosadas
e o suor escorre pela testa.
Ela é maravilhosa. Uma mulher para ser reverenciada de todas
as formas. Perfeita.
Seguro o seu pescoço, limitando a passagem de ar, sem
quebrar o contato visual, inclinando o meu quadril com força,
metendo todo o pau na boceta, fodendo-a até a base.

Sinto cada centímetro de pele que ela engole, cada sensação


conforme meu pau entra e sai da boceta, movimentando a pele para
cima e para baixo.

Madelyn começa a tremer, o orgasmo chega, dominando o


corpo frágil, diluindo-a como se fosse água. Então ela se desfaz,
gozando forte.

A sensação de dormência queima na base do meu estômago,


aumentando drasticamente e enviando arrepios para todo o corpo
com tanta intensidade que eu espremo os dedos dos pés dentro dos
coturnos e trinco a mandíbula para conter um urro.

A boceta me sufoca tanto que eu não consigo me conter e


ejaculo com tanta força que eu vejo estrelas por um segundo.

Solto o pescoço e libero a passagem de ar, mas mantenho os


meus olhos nos dela.

O silêncio é cheio de significados. Nosso olhar diz muito mais


do que palavras poderiam expressar.
Madelyn Sutherland e eu temos uma conexão.

É estranho, mas eu sinto que nós temos algo em comum, que


nós dois somos pedaços das escolhas dos outros.

Ela se deita contra o meu peito e eu beijo o topo da sua


cabeça, inspirando fundo o cheiro de flores dos cabelos castanhos.
Ela é pequena perto de mim, muito menor e mais delicada do que
eu.
– Nós esquecemos de Emy e Miles – sussurra, a voz abafada
pela minha camiseta.

Mantenho as carícias com as pontas dos meus dedos no seu


couro cabeludo. Meu peito treme em uma risada quando me lembro
do mesmo que ela.

– Eles já devem imaginar o que estamos fazendo.


– Precisamos enviar uma mensagem – diz, a voz sonolenta,
trôpega pelos orgasmos –, Emy deve querer nos matar.

– Ela vai superar, não se preocupe. – Planto outro beijo no


topo da sua cabeça. – Mas, vamos comunicar a eles que tivemos
um desvio de rota.

Ela ri.

– Vamos, mas podemos fazer isso daqui a pouco, agora nós


podemos só ficar aqui – murmura, me abraçando mais e se
aconchegando.

Não falo nada, mas estou tão confortável que apenas


concordo com ela, mantendo-a em meus braços, sentindo o seu
cheiro e aproveitando o momento.
 
Emy não quis sair para correr hoje, então resolvi fazer isso
sozinha. Precisava respirar e espairecer, e é meio difícil quando
estou em casa sob o olhar cuidadoso de mamãe.

Eles estão desconfiados de mim, à espreita de algum


escândalo que envolva o meu nome, qualquer coisa para me enfiar
dentro de casa, e me colocar de volta na bolha social que nos cerca.

Era muito mais fácil viver assim quando eu era mais nova,
afinal, quando se é criança, as pessoas tendem a ser menos
maliciosas e procuram menos algo para que possam te julgar.

Meu relacionamento com os meus pais nunca foi, ao todo,


ruim. Eu e mamãe sempre tivemos uma conexão, ela sempre foi
presente para mim, sempre amorosa e pronta para me defender de
tudo e todos, uma mãe carinhosa e perfeita. Já com o meu pai as
coisas sempre foram mais distantes, o que só piorou depois que ele
entrou para a política e começou a impor controle sobre mim, me
fazendo ceder às suas vontades, abafando a minha personalidade
para que não houvesse brigas ou castigos. O relacionamento que já
era desgastado na infância se tornou um caos quando cheguei na
adolescência e só queria sair para me divertir, ser uma pessoa
normal, agir como qualquer um, mas quando descobri que a minha
vida jamais seria assim, as coisas mudaram, principalmente quando
ele percebeu que seria ainda mais difícil me controlar.
Quando comecei a namorar Lennon tudo se tornou mais fácil,
eles começaram a ceder e pararam de questionar quando eu iria
sair, aonde eu iria ou a que horas eu voltaria para casa. Eles não
estão fazendo isso, ainda, porque estão me dando um tempo para
respirar, afinal, eu recém acabei um relacionamento e eles
acreditam que eu esteja me martirizando e com o coração em
pedaços, por isso estão me cedendo um pouco de liberdade. Mas
eu também sei que essa liberdade está com os dias contados.

Fecho os olhos e aprecio o vento que bate contra o meu rosto,


bagunçando os meus cabelos presos. Minha respiração está
pesada, mas, ainda assim, eu não cedo ao cansaço, mantendo o
ritmo.

O sol está fraco no céu e o calor insidioso dos seus raios é


levemente reconfortante ao permear a minha pele.
Noto um grande acúmulo de pessoas a alguns metros à minha
frente, elas estão em círculos, conversando e olhando para uma
casa em específico. Estacionados ao longo da rua, carros com o
símbolo do FBI e muitos agentes ao redor.

Me aproximo, tornando o meu ritmo acelerado em pequenas


passadas. Retiro um fone do ouvido e paro ao lado de um dos
grupinhos.
Cutuco a moça com a ponta do dedo. Ela me encara, os
braços cruzados, o rosto sereno.

– Olá, sabe o que está acontecendo aqui? – pergunto,


observando bem ao nosso redor.

Dependendo da sua resposta, essa merda pode afetar toda a


minha vida. Por exemplo, se um assassino insano estiver à solta,
meus pais vão me prender em casa. Se for algum escândalo,
envolvendo alguém do time de trabalho do meu pai, eles também
vão me trancar dentro de casa.

Minhas mãos começam a tremer e eu pouso os braços ao lado


do corpo para conter o nervosismo e não deixar evidente como me
sinto.

A mulher balança a cabeça e aponta para a casa.

– Olá, Madelyn, como vai? – cumprimenta, e não é nenhuma


novidade que ela me conheça ou saiba quem eu sou. – O doutor
Charlie Wild está sendo preso.

Tudo bem, essa não era bem a resposta que eu estava


esperando.
Arregalo os olhos e deixo o meu queixo cair.

– O juiz? – refuto, em uma voz esganiçada.

– Sim, o próprio.

– Mas, por quê?

Ela encolhe os ombros e volta a olhar para a residência do


homem, uma veia pulsa em sua testa.

– Parece que ele estava envolvido com coisas ilícitas, mas eu


não vou saber te dizer direito o que era – avisa, abrindo um sorriso
amarelo – são só boatos, a única certeza que temos até agora é que
ele fez algo ruim e por isso está sendo preso.

Nossa senhora!

Eu conheço o senhor Wild, já conversei com ele algumas


vezes, ele ia na casa de Lennon com frequência, ele e o xerife eram
muito próximos. Também sempre ouvi as pessoas falarem bem dele,
dizendo que era um bom juiz e um homem muito prestativo. O
senhor Wild sempre foi muito simpático comigo e com o restante da
população, ele era querido por muita gente.

– Obrigada – agradeço, me afastando.


Volto a caminhar, minha mente está um turbilhão e meu corpo
está assombrado por inúmeros sentimentos, todos eles
conturbados, duelando entre si.
O que pode ter acontecido de tão grave que culminou na
prisão do homem?

Independentemente, irei descobrir mais tarde, tenho certeza de


que os meus pais saberão as respostas e os motivos do porquê isso
aconteceu e a minha curiosidade será suprida.
Me distancio ainda mais do lugar e de toda a confusão, o
burburinho de vozes começa a sumir, tornando-se meramente um
ruído perto do barulho dos galhos das árvores que balançam com o
vento e dos passarinhos que se acomodam para descansar.
Eu gosto de morar em Tuscaloosa por causa da comodidade,
todo mundo se conhece e é bem tranquilo sair para caminhar já que
não tem um acúmulo de pessoas nas calçadas e pouca correria no
trânsito. Mas isso não significa que eu não vá embora na primeira
oportunidade, afinal de contas, não pretendo viver para sempre na
bolha social que me cerca.
Estou distraída quando um carro freia bruscamente ao meu
lado, me fazendo pular para trás e meu coração quase sair pela
garganta. Espalmo a mão no peito, tentando conter o susto.
Lennon desce do Jeep e bate à porta com força. Ele faz a volta
no veículo e para à minha frente. Seu rosto está transformado em
uma carranca, há manchas escuras embaixo dos olhos e ele não
parece estar nos seus melhores dias.

– Eu preciso falar com você! – diz, aproximando-se um passo.

Meu pai do céu!


Reviro os olhos.
– Eu já disse que não temos mais nada para conversar, vai
seguir a sua vida que eu estou seguindo a minha – retruco,
apertando as mãos em punho para controlar a raiva.

Como eu nunca percebi como Lennon era tóxico? O


sentimento nos deixa cegos, alheios ao que está acontecendo à
nossa volta. Depois que nós terminamos, eu comecei a analisar
melhor o nosso relacionamento e percebi que eu deixei passar
tantos detalhes, tantas atitudes que eu pensei serem normais.
Lennon nunca deixou o celular perto de mim, ele nem mesmo
o tirava do bolso quando estávamos juntos. E quando eu dormia na
casa dele ou ele na minha, o telefone ficava sempre com a tela para
baixo para que eu não pudesse ver as notificações. Ele também
sumia por horas e mais horas algumas vezes, e quando retornava,
era sempre com a desculpa de que estava dormindo.
Também reparei que Lennon sempre deu palpite em tudo o
que eu vestia, a saia estava curta demais ou a blusa muito
decotada. E que todas as vezes que eu ia para a casa de Emy, ele
pedia fotos, um comprovante de que eu estava falando a verdade.
Ele também tinha acesso ao meu celular e ficava o tempo todo
olhando tudo o que eu fazia, cada foto que eu curtia ou comentava,
quem eu seguia nas redes sociais.
Nunca dei bola para essas coisas, eu não tinha nada para
esconder e, para ser bem sincera, não me importava com nada
disso, estava feliz no nosso relacionamento e acreditava cegamente
que tudo estava certo ou normal. E quando eu percebi que o
sentimento já era inexistente e pensava em terminar, ainda não me
importava, porque pensava que Lennon era meu amigo e se
preocupava comigo, ele sempre soube dos meus pais e da
imposição sobre ser a filha perfeita.

Fui uma tola.

Lennon semicerra os olhos e se aproxima ainda mais de mim.


– E eu disse que ainda precisamos conversar, então você vai
calar a boca e me ouvir – revida, os dentes trincados e as mãos
fechadas.
Ah, mas que abusado!

– Então fique falando sozinho, eu não quero nem olhar pra sua
cara, quem dirá perder o meu tempo conversando com você!

Faço menção de passar ao lado dele para seguir o meu


caminho, mas Lennon agarra o meu braço com força, apertando-o
até doer.

– Nós precisamos ficar juntos, Madelyn, nossos pais querem


isso e nós também queremos.

Puxo o meu braço com brusquidão, ele abre a mão e me


libera, mas eu sinto as marcas na pele e sei que em breve ficará
roxo.

Lennon nunca foi agressivo comigo, mas agora, vendo como


ele está agindo e me tratando, acredito que o medo do meu pai era
maior do que o instinto violento dele.

Meu pai até podia, além de apoiar, torcer pelo relacionamento,


mas se Lennon ao menos aumentasse a voz pra mim, ele estaria
ferrado.

– Vai se ferrar, seu idiota! – grito, perdendo o controle – Se


continuar me importunando vou contar tudo o que fez, acha mesmo
que meus pais vão ficar felizes com você? – ameaço.
O xerife respeita muito o prefeito, e Lennon respeita o xerife,
ou seja, é uma via de mão única. Lennon não tem escolha, se eu
abrir a boca para contar o que ele fez, as coisas não ficarão boas
para o lado dele.

Lennon avança de novo e segura os meus braços, apertando-


os.

– Eu estou tentando ser paciente com você, Madelyn, mas se


continuar agindo dessa maneira vou tomar providências mais
bruscas.

Há um buraco no meu peito que aumenta cada vez mais,


arrependimento, raiva e ódio dominando tudo o que eu sinto.
Arrependimento por ter perdido tanto tempo com ele. Raiva por ter
sido tão ingênua e burra. E ódio dele e de quem ele se tornou.
– Você está me machucando... – murmuro, entredentes.

Os olhos de Lennon estão vidrados, duas poças profundas de


puro desdém e indiferença. Ele me encara com repulsa e
dominação, não com amor ou carinho.

– Vai entrar no carro comigo, Madelyn, e nós vamos dar uma


volta – Ele se inclina e beija o meu pescoço, o toque me faz
estremecer de ânsia – Então nós vamos fazer as pazes e tudo vai
voltar como era antes.
Meus olhos pinicam pelas lágrimas, mas eu me nego a deixar
com que qualquer rastro delas manche o meu rosto. Me recuso dar
esse gostinho a ele.
Não estou triste, estou possessa de fúria.

– Nossa, que linda a sua equação, e onde seu filho e a sua


amante entram nesse cálculo? – Cuspo as palavras com zombaria.

Lennon ergue o rosto para me encarar, seu semblante está


franzido em desgosto.
– Não seja ridícula, eu já disse que eles são um erro e fazem
parte do passado. – Planta um beijo no canto da minha boca. –
Seremos só nós dois e o nosso amor.
Quero rir, mas o jeito como ele me encara me deixa estagnada,
o medo se esgueirando pelas minhas entranhas. Lennon está
descontrolado e, talvez, até mesmo drogado. Eu poderia tentar
gritar, mas ele seria mais rápido e tamparia a minha boca com um
só movimento. Eu poderia zombar e debochar, mas só Deus sabe o
que ele pode fazer se perder o controle e a paciência. Mas, o pior de
tudo, se eu entrar nesse carro... céus, não quero nem pensar no que
vai acontecer.

Preciso me livrar dele. E rápido.

– Está pensando nisso, não é mesmo? – ronrona, esfregando


os lábios na minha bochecha.
Prendo a respiração e tento acalmar as batidas erráticas do
meu coração.

Não tem ninguém para me salvar ou me ajudar, nesse


momento, só tenho a mim mesma para recorrer. E eu não irei ceder.

– Vamos, Maddie, eu te amo... – Passa a língua pelo meu


maxilar.
Me viro totalmente de frente para ele. Lennon se afasta alguns
centímetros, as sobrancelhas erguidas, um sorriso idiota no rosto.
Ele pensa que estou me acomodando, que estou cedendo às suas
investidas. Ele mantém as mãos firmes em meus braços, mas me
afasta um pouco mais.

– Você também quer isso não, quer? – pergunta, brilhando em


satisfação.

Antes que ele possa me puxar de volta para si ou fazer


qualquer outra coisa, dobro o joelho e acerto o meio das suas
pernas com toda a força que eu tenho, esmagando o seu pau,
impulsionada pela raiva e repulsa. Lennon me larga e se joga no
chão, as mãos seguram o pênis, lágrimas correm pelos lados dos
olhos.

– Enfie todo esse amor que diz sentir tanto na bunda, eu não
quero mais você! Eu tenho nojo de você! – Me curvo para falar,
ignorando os zumbidos que ele faz por causa da dor. – E saiba que
isso não ficará assim, se tocar em mim de novo, prepare as malas e
suma da cidade. – Cuspo nele.
Faço a volta no corpo estendido e começo a correr sem olhar
para trás. Não espero que ele tenha a chance de se recuperar e
venha atrás de mim, não espero pela ajuda de ninguém. Eu avanço
pela rua e dobro a esquina, mas não perco o ritmo, nem mesmo
quando avisto algumas pessoas, nem quando eu me aproximo de
um bairro mais agitado, nem quando os meus pulmões queimam e
imploram por ar. Eu só continuo correndo e correndo.

Nunca pensei que sentiria tanto pânico de alguém que um dia


eu amei, mas é exatamente assim como me sinto agora. Lennon
não fez só o favor de me magoar, ele fez questão com que eu
dissolvesse qualquer sentimento bom que ainda nutria por ele,
restando nada além de cólera e nojo.
Mãos fortes e pesadas agarram os meus ombros, me fazendo
parar. Um grito estrangulado fica preso na minha garganta quando
sou bruscamente girada, dando de cara com um peitoral largo, duro,
suado e... tatuado.

– Que porra aconteceu? – pergunta Aiden, arfando.


 
Solto um suspiro misturado com um soluço, o alívio por vê-lo
faz com que minhas pernas virem gelatina. Aiden passa um braço
ao redor da minha cintura, me segurando e evitando que eu
despenque no chão.

Seguro em seus braços fortes e deito a cabeça em seu peito,


inspirando fundo o cheiro masculino que é uma mistura de nicotina
com algo amadeirado.

– Maddie, o que foi que aconteceu? – insiste, colocando a mão


na minha nuca e beijando o topo da minha cabeça.

Ergo a cabeça para encará-lo, Aiden está com os cabelos


bagunçados, gotas de suor marcam a testa e escorrem pelos lados
do rosto. Ele está usando bermuda preta, tênis de corrida e uma
regata, os braços tatuados e torneados estão em evidência pela
falta de tecido.
– O que você estava fazendo? – pergunto, pigarreando para
limpar a voz e desobstruir a garganta seca.

Ele solta uma risada rouca, a mão ainda descansa na minha


nuca e ele afaga os meus cabelos com as pontas dos dedos.
– Você sempre teve essa tendência a responder uma pergunta
fazendo outra? – Arqueia uma sobrancelha escura.

Bufo, revirando os olhos.

Espalmo as mãos em seu peito, necessitando de contato


físico, carecendo da companhia de alguém com quem eu me sinta
segura e estável, como ele.

– Na maioria das vezes, só você é quem consegue aflorar esse


lado meu – respondo, piscando um olho.
Os lábios de Aiden se franzem em um sorriso.

– Bom, então nós precisamos mudar isso.

Mexo as mãos, sentindo a textura da pele, inocentemente,


claro.

– Pensei que gostasse – Faço um bico com a boca, triste.


Aiden franze a sobrancelha para mim, claramente debochado.
Então me puxa para mais perto, nossos rostos a centímetros de
distância.

– Vamos, princesinha, conta logo o que aconteceu – fala, mais


incisivo –, eu vi você correndo e não estava só se exercitando,
parecia aterrorizada.

Fico em silêncio, a respiração de Aiden fica mais pesada e ele


se aproxima mais, colando as nossas testas suadas.
– Quem fez isso com você? – frisa, apertando a minha nuca.

Suspiro, resignada.

Pensar em Lennon e no idiota que foi, é como levar um soco


no estômago. Sinto raiva, mas na mesma proporção em que quero
vingança pelo que fez. Me escoro ainda mais contra Aiden,
procurando o calor, o cheiro reconfortante.

– Eu encontrei com Lennon – murmuro, desviando os meus


olhos do seu, estarrecida demais com a intensidade que ele me
encara – E ele foi muito babaca.

Aiden fica em silêncio por um momento e quando volto a


encará-lo, percebo que os seus olhos vagueiam pelo meu corpo,
procurando por algo que esteja errado ou só garantindo de que
estou completamente segura. Vejo o exato instante em que ele
repara nas marcas dos meus braços.
Aiden fecha os olhos com força e respira fundo. Noto pelo
movimento no pomo-de-adão que engole em seco, o maxilar está
travado a ponto de quebrar os dentes.

– Aiden... – chamo-o, tocando em seu braço.


Ele se mantém assim por mais alguns segundos e quando
volta a abrir os olhos vejo raiva, ódio, fúria cobrindo as vistas
bicolores. Aiden está queimando tanto que poderia colocar fogo na
cidade inteira só com esse olhar.

– Eu vou matá-lo! – afirma, desvencilhando-se de mim e se


afastando.

Pisco, atônita, meu corpo leva um momento para voltar ao


normal, minha mente vaga e dá tantas voltas que eu fico tonta por
alguns segundos. Saio do transe e seguro o seu braço, forçando-o a
parar de caminhar.
– Aiden, eu... meio que resolvi a situação – exprimo, mordendo
as bochechas.

Ele se vira para mim, os olhos ainda pegam fogo, mas há um


tom de curiosidade em sua expressão.

– Como assim?

Sinto-o ficar rígido sobre os meus dedos, os músculos do


braço endurecem como pedra. Ele ainda está morrendo de raiva,
embora esteja curioso.

– Eu meio que chutei ele... – balbucio, esfregando os cabelos,


sem jeito.
– Madelyn, se não contar agora o que aconteceu...

Ah, céus!

– Tá bom! Eu esmaguei o pau dele com o meu joelho, deixei


ele caído no meio da calçada e saí correndo de lá – confesso,
cuspindo as palavras, atropelando as letras.

Embora Lennon merecesse muito mais, é um pouco


vergonhoso confessar que eu fiz isso. Imagina o escândalo que
daria caso descobrissem que a filha do prefeito está chutando
pessoas na rua? Óbvio que se eu tivesse outra oportunidade,
chutaria Lennon de novo, mas isso não exprime a minha vergonha.

Aiden ergue as sobrancelhas e descola os lábios, surpreso. Ele


me olha por longos e intermináveis segundos antes de explodir em
uma gargalhada que o faz pousar a mão no estômago e curvar o
corpo para conter.

– Eu não sei qual é a graça – retruco, cruzando os braços.


Aiden continua rindo, lágrimas escorrem pelos cantos dos seus
olhos. Eu o espero se recuperar, fuzilando-o.
– Qual é a graça? – arfa, arrumando a postura, recuperando-se
do ataque. Ele enlaça a minha cintura de novo e me puxa para si,
aproximando a boca da minha. – A graça, princesinha, é que eu
adoraria ver a cena, embora ela fosse doer até mesmo em mim.

Ele esfrega a boca contra a minha e eu me derreto por inteira


em seus braços, desfazendo-me das amarras e dos protestos.

– E o que você faria se estivesse lá? – sussurro, fincando as


unhas em seus ombros nus.

Aiden ergue uma sobrancelha, ponderando.


– Primeiro eu a deixaria chutá-lo e ainda aplaudiria – A mão
que segura a minha nuca se enrosca nos meus cabelos –, depois eu
mesmo faria questão de acabar com o serviço.

O toque possessivo me deixa excitada e praticamente


necessitada por ele. Minha mente não ajuda nada, vagando para o
sábado à noite, dentro do carro estacionado em uma rua escura.
Relembrando do pau duro, grande e robusto. Do piercing que
atravessa a ponta e que me fez gozar como nunca.

Suspiro, mordendo os lábios para conter um gemido.


– Não faça isso, Madelyn – avisa, os olhos estão cheios de
labaredas flamejantes.
– Por quê? – provoco, atiçando-o ainda mais.

Aiden solta um grunhido do fundo da garganta, uma veia pulsa


em seu pescoço e eu não preciso me aproximar mais para saber
que ele está duro.
– Porque você não quer ser fodida em um canto qualquer –
cicia, a voz rouca, fria e latente –, não quer correr o risco de alguém
descobrir como é depravada e extremamente safada, contestando
com a cara de inocente que tem.
Lanço-lhe um olhar enviesado.

– E qual graça teria se descobrissem a minha verdadeira


identidade? – Me inclino até ficar na ponta dos pés e sussurrar no
seu ouvido. – Você não gostaria que os outros conhecessem esse
lado meu, não depois de ser o primeiro, único e exclusivo a ter ele.

Os dedos de Aiden colocam mais pressão na minha cintura e


ele beija o meu pescoço, me arrepiando por inteira. Sinto o seu
sorriso contra a minha pele e a respiração densa contra os meus
cabelos.

– Ah, Maddie, continue me provocando... sábado eu te quero


pronta pra mim no Dominators, e então entenderá por que jamais
deve provocar um homem como eu.

Calor escorre pelo meio das minhas pernas e meu coração


palpita de animação e ansiedade.
Faço menção de falar mais alguma coisa, mas Aiden me vira
em um único movimento e cola o peito nas minhas costas. Sinto o
pau duro na minha bunda, o que torna tudo ainda mais difícil.

– Vamos tomar um sorvete, você está muito quente e precisa


de um refresco – fala, me empurrando para frente.

Solto uma risada.


– Eu é quem estou quente? – Desço a mão até o pau duro que
estica o tecido da bermuda que veste. – Parece que você é quem
está fervendo.

Aiden retira a minha mão do meio das pernas e continua a nos


movimentar para frente, os corpos ainda colados e os passos
sincronizados.

– Não se faça de boba, sei que essa boceta está encharcada e


pronta pra me receber.
E não é mentira, na real, é a mais pura verdade. Mas Aiden
jamais vai saber disso, ao menos que decida tirar a prova por conta
própria.
– Só tocando pra descobrir – objeto, abrindo um sorriso
quando o sinto enrijecer nas minhas costas.

– Porra, Maddie, estou tentando me acalmar, mas se continuar


falando esse tipo de coisa pra mim, não me comprometo se formos
pegos fodendo em um canto qualquer – ameaça, e eu sinto a
verdade em seu tom de voz.
Aiden não é alguém de quem se deve duvidar, então eu
simplesmente forço a minha boca a se manter fechada enquanto
percorremos algumas quadras até o carro do sorvete.
– Está me usando para acobertar a sua safadeza? – zombo,
ao perceber que ele me usa como escudo para disfarçar o pau duro
no meio da rua.
Aiden espalma a mão na minha barriga e sinto-o estremecer
em uma risada.

– É a culpada por isso, precisava se redimir de alguma forma.


Ele me puxa para o lado e entrelaça as nossas mãos, parando
de me usar como cobertura. Dou uma olhadinha para baixo e vejo
que ele já desarmou a barraca e não precisa mais de mim.

Paramos de frente para o carro do sorvete e Aiden faz os


pedidos. Um de morango pra mim e outro de chocolate pra ele. Me
sento na sombra de um banco que tem perto e o espero.

– Aqui! – Me entrega a casquinha e ocupa o espaço do banco


ao meu lado. – Costuma fazer esse mesmo percurso todo dia?
– Eu e Emy gostamos de sair para correr juntas, mas hoje ela
não estava se sentindo muito disposta, então eu resolvi fazer isso
sozinha. – Solto um suspiro quando o gosto adocicado e gelado
desce pela minha garganta. – E você?

Aiden faz um sinal negativo com a cabeça.

– Foi a primeira vez – confessa, descansando o braço nas


minhas costas.
– E por que escolheu logo esse percurso? – questiono,
curiosa.

Ele encolhe os ombros.

– Eu queria ver uma coisa.

Limpo a boca com o dorso da mão e dou outra lambida no


sorvete.
– Que coisa?

Aiden solta uma risada e balança a cabeça.

– Você é uma coisinha muito curiosa, não é mesmo?


Faço um movimento com os ombros e enfio mais um pouco de
sorvete na boca.

– Já disse que não consigo evitar – respondo, suprimindo um


suspiro de prazer quando o gosto adocicado escorre pela minha
garganta.

Aiden encara a rua à nossa frente, concentrado na rotina trivial


das pessoas. Ficamos em silêncio, apreciando o momento, a
companhia um do outro enquanto terminamos o nosso sorvete. E,
meu Deus, preciso fazer isso mais vezes, não sabia que precisava
tanto do doce até ele oferecer.

Arregalo os olhos e viro a cabeça na direção dele com tanta


intensidade que me sinto levemente tonta.
– Céus... como eu pude esquecer disso – Aiden me encara, o
rosto franzido em curiosidade. –, você sabe por que o juiz foi preso?

Os olhos de Aiden brilham, fervilhando com algo que ele sente,


mas que eu não consigo identificar. Então um meio-sorriso curva os
seus lábios.

– Parece que ele vendia sentença – diz, tentando soar


indiferente.
Vender sentença? Meu Deus, como ele pode fazer uma coisa
dessas? Quantas pessoas não saíram prejudicadas por causa
dessa sua atitude deplorável?
– Você viu a confusão do FBI na frente da casa dele?

Aiden concorda com um simples sinal.

– Nossa, achei que ele fosse uma boa pessoa – comento,


limpando as mãos melecadas com o guardanapo de papel.

– Todo mundo possui máscaras, Madelyn, algumas mais que


as outras.

Estudo o seu rosto contraído e jogo os cabelos por cima do


ombro.

– E quais são as suas máscaras, Aiden? – pergunto, soando


direta e ao mesmo tempo casual.

Por um momento, apenas nos encaramos em silêncio, então


Aiden finalmente fala:

– Mostrarei as minhas quando você me mostrar as suas –


refuta, fazendo uma bola com o guardanapo de papel e jogando-a
no lixo.

– Justo – concordo, levantando-me e batendo as mãos nas


pernas –, gosta de insistir que a sua escuridão é pior que a minha,
talvez fique surpreso quando obtiver as respostas.

Aiden ergue uma sobrancelha e me puxa em sua direção.

– Ficará surpresa, princesinha, quando descobrir que não tem


como ganhar essa batalha.

Eu não vou entrar nesse embate agora, Aiden já perdeu o pai e


isso pode tê-lo machucado profundamente, então talvez ele tenha
razão, eu não sei como é isso e qual a dor que causa.

– Eu vou para casa, amanhã nós temos aula – falo, olhando ao


redor para ir pelas ruas mais movimentadas.
– Vou te fazer companhia – diz, plantando um beijo rápido nos
meus lábios e se afastando.

Caminhamos um ao lado do outro pela calçada, os passos


sincronizados em um ritmo lento.

– Como era a sua vida fora da cidade? – pergunto, quebrando


o silêncio depois de um tempo.

Aiden me lança um olhar enviesado.

– Era tranquila, não tinha nada de relevante ou muito


emocionante. – Nossas mãos roçam uma na outra e ele entrelaça
os nossos dedos, parece um movimento involuntário, como se o
fizesse sem nem mesmo perceber enquanto fala. – Morava com a
minha avó, que é uma senhora de idade, então imagina que eu
nunca pude fazer festa em casa ou até mesmo sair sem avisar,
corria o risco de infartá-la.

Solto uma gargalhada alta, tampo a boca com a mão para me


controlar.
– Ela não deixava você sair?
Aiden me puxa ainda mais para o seu lado, nossos braços se
roçam enquanto caminhamos.
– Ela me deixava sair quando eu quisesse, eu só precisava
avisar para que não ficasse preocupada.

Comprimo os lábios, me questionando mentalmente se faço ou


não a próxima pergunta.

– Por que você foi embora? – Cedo ao meu instinto curioso.


Aiden me encara. – Quer dizer, falaram muitas coisas na época,
mas nada se confirmou.

Ele franze a testa.


– Você se lembra? – Concordo com a cabeça. – E o que você
acredita que seja a verdade?

Solto a respiração com calma e arrasto os meus olhos para a


frente, observando a rua.

– Para ser bem sincera, não sei. Diziam que você começou a
criar problemas para a sua mãe, então ela te mandou para morar
com a avó e esfriar a cabeça.

Aiden solta uma risada insípida e fervilha de raiva.

– Eu tinha treze anos quando o meu pai foi assassinado,


quando eu recebi a notícia de que ele tinha sido brutalmente morto
com um tiro na cabeça e que ninguém tinha sido pego ou acusado
como o culpado. – Cada palavra sai mais trincada que a anterior. –
Criar problemas deveria ser a menor das preocupações da minha
mãe.

Meu peito se contrai com a raiva e dor que sinto em sua voz e
eu adoraria poder voltar no tempo e abraçar aquele Aiden que, de
alguma forma, se partiu naquele dia.
– Eu sinto muito, Aiden – sussurro, as lágrimas pinicando atrás
dos meus olhos.

– Não sinta, Maddie, a culpa não é sua. – Ele me aperta contra


o seu corpo e beija o topo da minha cabeça. – Então, a verdade é
que eu fui embora porque minha mãe ficou com medo de não
conseguir me controlar, ela temia que eu pudesse mesmo me meter
em problemas nos quais ela não poderia me proteger, por isso me
afastou da cidade.

– Você sente algum receio dela por isso?

Ele nega com um sinal.

– A mudança me fez evoluir muito e eu só retornei quando


achei que estava preparado para isso – revela – Tenho muitas
ressalvas em relação a minha mãe, mas essa não é uma delas.

Aiden retira um maço de cigarro do bolso da bermuda e prende


um na boca, acendendo-o com um isqueiro e dando uma tragada
profunda. Ele o segura entre os dedos, sem perder o descompasso
do ritmo da nossa caminhada.

– Preparado para o quê?

Aiden oscila por um momento, mas em um piscar de olhos,


determinação toma conta da sua face novamente.
– Você vai descobrir em algum momento, princesinha, de uma
forma ou outra – murmura, enigmático, expelindo fumaça escura
pelo nariz.

Fico triste pela infância de Aiden, embora a minha não tenha


sido um conto de fadas, ainda assim, parece ter sido melhor que a
dele.

– Você era mesmo apegado ao seu pai, não é? – indago.

Ele abre um sorriso que não chega aos olhos.


– Ele era o meu melhor amigo.

Sinto um bolo obstruir a minha garganta e um peso em cima do


meu peito. Aiden é um cara incrível, é injusto que tenha sofrido tanto
assim.

– Eu... sinto muito – repito, inconformada.

Aiden parece relaxar ao meu lado, a densidade do assunto


esvanecendo-se.
– Eu sei que sim.

– Por quê?

Ele me encara com franqueza.


– Porque, tirando a família do Miles, você foi a única dessa
cidade inteira que falou isso desde a primeira vez com sinceridade.

Encaramo-nos, mantendo o olhar um do outro, e eu sinto uma


conexão, uma sintonia com ele, uma congruência que nunca senti
com mais ninguém. E percebo que Aiden sente o mesmo, vejo pelo
semicerrar dos olhos, pelo brilho que assumem e pela palma da
mão que parece se encaixar melhor contra a minha.

Não sei o que está acontecendo entre nós dois, mas tenho a
certeza de que é especial e... certo.
 
Madelyn é, com toda a certeza, a garota mais incrível que eu já
conheci. Ela tem um jeito único de ser direta sem ser invasiva,
assim como de se compadecer com a dor dos outros mesmo que
não entenda o que eles estão sentindo.

Como pode uma pessoa tão maravilhosa ser filha de alguém


tão sem escrúpulos? Uma pergunta na qual eu não tenho a
resposta.

Bebo alguns goles da minha água e observo o time no


gramado. Estamos em um jogo de treinamento, uma preparação
para o jogo oficial da próxima semana. E Miles como capitão do time
está fazendo a vida de todo mundo um inferno por isso, sendo até
mesmo pior que o próprio treinador.
Retiro o celular do bolso da minha mochila e envio uma
mensagem para Maddie.
 

Eu: Amanhã temos um encontro no Dominators, não se


esqueça.

Minha mensagem mal é enviada e a resposta já apita no meu


celular em poucos segundos:

Maddie: Esquecer? Eu já até comprei um conjunto de lingerie


novo para o evento.
 

Essa garota é uma maldita provocadora, a sorte dela é que


estou treinando e posso gastar as minhas energias no treino, ou ela
receberia uma intimação para me encontrar em alguma sala escura
e vazia da faculdade depois de ter me respondido isso.

Sorrio com a resposta e jogo o celular de volta para dentro da


mochila.

Quem olha para Madelyn não imagina a grande e verdadeira


safada que habita aquele corpo. Ela é toda carismática, simpática e
quietinha, e assim engana todo mundo com a verdadeira identidade
que faz questão de esconder por debaixo de muitas camadas.

Encaro o time, meus olhos se fixam em Lennon e eu fecho as


mãos em punho, sentindo de novo o ápice de raiva que senti
quando Maddie me contou o ocorrido. O babaca conversa com
amigos e ri de alguma coisa que eles falam, ele não comentou com
ninguém sobre o encontro com a ex-namorada, não abriu a boca
para contar que levou um belo chute no saco.
Eu fiquei muito orgulhoso de Maddie quando ela me contou, e
adoraria ter presenciado a cena. Mas isso não diminui o fato de que
estou queimando de ódio dele por tê-la machucado. Muito menos
significa que eu não farei algo.

Miles caminha com calma pelo gramado e se coloca na frente


do desgraçado, removendo-o da minha linha de visão. Ele vem até
mim e para ao meu lado, esgueirando-se na sombra, fugindo do sol
quente.

– Se tivesse poderes, Lennon estaria em chamas agora só


pela forma como olha para ele. – Miles pega uma garrafa de água
do cooler ao lado, remove o lacre e engole o conteúdo com uma
sede assustadora.

Cruzo os braços e abro um sorriso depreciativo.

– Minha mente está planejando muitas coisas legais para o


idiota.

Miles joga a garrafa vazia no canto e me lança um olhar


enviesado.

– Cara, o que tá acontecendo entre você e Maddie, afinal? –


pergunta, virando-se de frente para mim.

Eu venho me desviando de todas as perguntas nesse sentido


que ele vem me fazendo, mas está na hora de dar a ele uma
resposta, mesmo que ela seja superficial.

– Não sei... – confesso, esfregando os cabelos molhados pelo


suor – nós temos uma conexão muito louca, e é isso.

Não chega nem perto da verdade, embora eu ainda não saiba


qual é ela, sei que é muito mais do que uma simples conexão. As
coisas com Maddie tendem a ser intensas e profundas, a garota me
completa de um jeito muito louco e incomum. Mas ainda não estou
pronto para revelar, nem sei bem o que fazer diante de toda a
situação em que nos encontramos.

– E quanto ao pai dela? – indaga, desviando os olhos para os


lados, garantindo de que não há ninguém perto o suficiente para nos
ouvir.

– Vou deixá-lo por último – murmuro, indeciso.


Eu não tinha uma lista com a ordem de quem eu me vingaria,
mas também não pensei que eu me relacionaria com a filha de um
dos envolvidos.

– Mesmo assim, um dia ele vai chegar, já sabe o que pretende


falar para ela? – insiste.

Não sei como é a relação de Maddie com o pai, ela nunca


falou nada e eu nunca perguntei. É estranho conversar sobre o
homem, porque, embora nós estejamos tendo essa relação
inconcluída, ele ainda é o homem que matou o meu pai e ainda é o
pai dela. Ignorar esses fatos foi o jeito que encontrei de afastar da
minha mente a voz que me condena.

– Não quero pensar nisso agora – assinalo, perdendo a


paciência. –, não importa o que esteja acontecendo, os dias dele
estão contados, mesmo que isso signifique que Madelyn nunca mais
olhe pra minha cara.
Miles suspira.
– E vale a pena trocar, seja lá o que estejam tendo, por
vingança?

A pergunta me acerta como um soco na boca do estômago.


Eu fui moldado pela morte, formado pela dor e adaptado para a
vingança.
Desde os meus treze anos, não conheço nada além do
sentimento determinante de que eu faria justiça com minhas
próprias mãos.
– Não importa, eu não vou parar – respondo, a voz falhando,
não passando de um sussurro.

Eu gosto de Maddie, sinto algo único com ela, mas isso tudo é
maior do que nós dois, é maior do que estamos tendo. Tom
Sutherland tirou de mim o meu melhor amigo, quem eu mais amei
na vida, mas não foi só isso. Ele me tirou de mim mesmo, foi por
causa dele que o antigo Aiden não existe mais. E ele precisa pagar
por isso.
– Cara... – Miles balança a cabeça – só não faça nada com
que vá se arrepender, sei que essa vingança é muito importante,
mas não tinha Maddie no planejamento, e não quero que perca algo
que faz bem para você.
Concordo com um aceno, sem condições de lhe dar uma
resposta verbal.
– Quem será o próximo? – continua, o semblante carregado,
fazendo a mesma pergunta pela segunda vez.

Arrasto os meus olhos até o filho do xerife e sinto uma faísca


de felicidade e satisfação inflar no meu peito. Se antes eu já estava
determinado em tornar o maldito a segunda vítima, agora é que eu
tenho a certeza absoluta.

– O xerife! – Sorrio, respondendo, desta vez, com mais


convicção e ansiedade.
Lennon assobia, chamando a nossa atenção.

– Vamos voltar agora? – pergunta, e meu maxilar range ao


som da sua voz.
Eu poderia dizer que eu detesto tanto esse cara quanto odeio
os membros da quadrilha, embora ele não esteja envolvido na
sujeira.
– Sim, podem assumir a posição. – Miles gesticula para eles.
Então se vira para mim e pousa a mão no meu ombro. – Vai fazer
alguma coisa com ele por ter machucado Maddie?

Solto uma risada pragmática.


– O que você acha? – indago, de forma retórica, pois Miles e
eu sabemos bem qual é a resposta.
– Não o machuque muito, por favor, precisamos dele para o
jogo que se aproxima – orienta, afastando-se.

– Não se preocupe, serei bem delicado com esse pau no cu.

Miles não controla o riso e uma risada estrangulada atravessa


os lábios.
Assumo a minha posição no jogo, à frente do time no lado
esquerdo. Minha tarefa é garantir a posse de bola no nosso time,
derrubando qualquer adversário que surgir na minha frente.
O maldito do Lennon está no time contrário ao meu, ele é
Hooker, também faz parte da linha de frente, mas sua missão é
puxar a bola com o pé após o início da partida e jogar a bola para a
posse dele no time.

O treinador Wynne assopra forte no apito e dá início a partida.


Avanço, ignorando todos os outros jogadores, deixando que eles
passem por mim e que o meu time consiga dar conta. Um dos
pilares se joga em cima de mim, mas eu desvio para o lado e o
deixo cair sobre o chão. Lennon, ao perceber a minha aproximação,
arremessa a bola para um lateral, livrando-se dela.

O problema é que eu nunca quis a porcaria da bola.


No exato instante em que a bola voa por cima das cabeças,
me jogo contra o corpo de Lennon, arremessando-o ao chão com
força. A partida continua, nossos colegas estão concentrados
demais na bola para reparar em nós dois. Lennon solta um gemido
e franze os olhos pela dor. Piso em suas mãos, amassando-as
contra o gramado e ele solta um grito.
– Seu filho da puta psicopata! – arqueja, apertando as mãos
machucadas contra a barriga, sangue escorre pela pele rompida. –
A porra da bola não está aqui.

Me inclino sobre o seu corpo, tampando os raios de sol que se


infiltravam em seu rosto.

– E quem disse que eu queria a bola? – pergunto, a raiva


escorrendo pelo meu tom de voz.

Lennon abre os olhos e me encara.

– Qual é a porra do seu problema? – grunhi, estremecendo de


dor ao apertar um pouco mais as mãos, as manchas vermelhas
marcando o branco do uniforme.

– Se tocar em Madelyn de novo, eu vou quebrar cada maldito


osso que tem nas suas mãos, então nunca mais vai poder machucar
outra mulher na vida – ameaço, entredentes.
Ele arregala os olhos, a cor some de seu rosto.

– Ela mentiu, eu não fiz nada... – cicia, estrangulando as


palavras pelo desespero.

Estalo a língua no céu da boca e balanço a cabeça.

– Eu odeio que digam que a minha garota é mentirosa –


murmuro.
Me levanto e dou alguns passos, fingindo voltar à posição
inicial do jogo. Piso nos pés do maldito, girando a perna para o lado
e fazendo um osso estalar. Lennon berra tão alto que eu me encolho
com o som.

– Foi só um aviso – respondo, por sobre o ombro – Droga, me


desculpe, não vi você – grito, me fazendo ser ouvido pelo restante
do time.

Somos rodeados por todos os jogadores e pelo treinador, eles


se inclinam sobre Lennon e conferem o ocorrido, verificando a perna
e as mãos.
– Ele teve uma lesão, precisamos levá-lo ao médico – anuncia
o treinador, levantando-se e gesticulando. – Levantem ele e o
carreguem até o vestiário, mas cuidem da perna lesionada, foi uma
contusão grave.

Quatro homens erguem um Lennon choroso e o carregam em


direção aos vestiários. O restante do time segue eles de perto,
atentos e preocupados.

Permaneço imóvel no lugar, fingindo estar muito chateado com


toda essa situação.

Sinto a presença de Miles ao meu lado, ele fervilha de raiva.

– Eu disse pra não lesionar porque temos uma partida em


breve – bufa, cuspindo no chão –, agora não temos nem chance de
ganhar a porra do jogo.

Encaro-o, erguendo um dos cantos da boca em um sorriso.

– Se ele não tivesse a língua tão grande, nada disso teria


acontecido – contraponho, encolhendo os ombros.

Miles profere uma sucessão de palavrões ininteligíveis.


– Que inferno, Aiden, não consegue se controlar?
– Eu não ia fazer nada, mas ele, além de ter agredido Maddie,
estava dizendo que ela é uma mentirosa – vocifero –, ele é um
maldito sem escrúpulos, Miles, e se acha que isso o que eu fiz é
pela minha falta de controle, espere para ver o que eu farei caso ele
chegue perto dela de novo.

Não fico para obter uma resposta, saio andando em passos


duros até as arquibancadas.

Ouço o suspiro de Miles.

– Aiden, espere... você tem razão.

Ignoro-o.
Recolho a minha mochila de uma das pilastras e deixo o
gramado pelo portão dos fundos, evitando os vestiários e todo o
alvoroço que deve estar no local.

Estou pouco me fodendo para Lennon e a sua lesão. Eu ainda


fiz é pouco perto de tudo o que ele já fez para Madelyn. Lennon é
um maldito, arrogante e machista que só sabe levantar a voz
quando está diante de uma mulher, mas se mija todo quando vê que
a coisa aperta para o lado dele.
Covarde do caralho!

Ele tem medo do que pode acontecer caso as pessoas saibam


o que fez a Maddie, por isso nem hesitou antes de mentir para mim,
embora tivesse quase certeza de que eu sabia de tudo.

Sempre penso que os filhos não merecem responder pelos


erros dos pais, como é o caso de Maddie, mas, nesta situação em
específico, Lennon puxou aos genes ruins do pai. É tão hipócrita e
dissimulado quanto o homem.

E eu farei da vida dele um inferno se continuar aborrecendo


Madelyn. Assim como eu planejo para o seu pai. Ambos terão o
mesmo caminho, mas serão vingados por pessoas diferentes.
 
Durante toda a semana, só o que se ouvia pelos corredores da
universidade, era sobre a lesão que Lennon sofreu em um dos
treinos do time. Com a aproximação de um jogo importante dentro
de um campeonato, o alvoroço se tornou ainda maior.

Os burburinhos foram tão claros que eles começaram a falar


que Lennon e Aiden brigaram por minha causa, já que estão
comentando por aí que Aiden e eu estamos juntos.

Eu não posso culpá-los por pensar o contrário, nós andamos


de mãos dadas na rua, ficamos abraçados no bar e estamos sempre
juntos na faculdade no nosso tempo livre. Não nos beijamos ou
trocamos qualquer tipo de carícia que leve a entender um
relacionamento, mas acredito que o fato de vivermos abraçados e
sempre nos tocando já é prova o suficiente.
Acontece que funcionamos como um ímã, sempre que
estamos perto, é como se fosse uma necessidade nos tocarmos.
Meu corpo vai de encontro ao de Aiden por conta própria. E eu já
reparei que o dele faz o mesmo. É inevitável e não-intencional.
Mas, ignorando toda a fofoca que está rolando, eu sei qual é a
verdade. Aiden não engoliu o fato de Lennon ter me machucado,
então o feriu da mesma forma que ele fez comigo.

Aiden é protetor, leal e extremamente vingativo. Já consegui


perceber que ele não suporta que machuquem alguém com quem
se importa e por isso age na defensiva, usando de agressividade.
Acredito que seja somente um reflexo do que aconteceu com o
pai dele no passado. O pai foi morto por alguém que nunca foi pego,
Aiden não pode defendê-lo na época, pois não passava de um
garoto, mas hoje as coisas são diferentes, ele já é um homem feito e
se pode defender os seus, ele o fará, não importa as
consequências.

– Você está muito quieta – comenta Emy, parando o carro no


estacionamento do Dominators.
Pego a máscara de cima do meu colo e a posiciono no meu
rosto. Minha roupa não é como a do primeiro dia, eu sei o que vai
acontecer hoje, sei o que me espera assim que eu atravessar
aquela porta. Aiden e eu teremos a nossa primeira sessão de
BDSM, e me sinto tão ansiosa quanto curiosa para isso.

Estou usando um vestido vermelho justo que vai até os pés e


possui uma fenda enorme que chega próximo a minha virilha. Um
conjunto novinho de lingerie branca de renda, assim como eu havia
comunicado a Aiden, e saltos altos.

– Só pensando... – comento, prendendo a máscara atrás da


minha cabeça.
A máscara não é a mesma também, eu comprei uma nova
essa semana. Ela é dourada cintilante e cobre metade do meu
rosto. É muito bonita e combina perfeitamente com a minha roupa.

– Pensando o que, Maddie? – insiste Emy, em um suspiro.

– Não estou chateada com Aiden pelo que ele fez, se é isso
que está achando – argumento, na defensiva –, só estou pensando
em tudo, no que estamos tendo, no que eu estou sentindo...

Emy arregala os olhos e arqueia as sobrancelhas.

– Você está gostando dele? – pergunta, embora não precise de


uma resposta.
– E tem como não gostar? – objeto, rindo.

Aiden é perfeito!
Ele é querido, carinhoso, cuidadoso, fode bem pra caramba,
protetor e ainda é gato demais. Uma combinação perfeita do que
pode ser fatal para qualquer coração... e calcinhas.

Emy puxa a minha mão e entrelaça os nossos dedos.

– Certo, só tente ao máximo manter o seu coração guardado,


ao menos até a hora em que acreditar que é a certa para entregá-lo
a ele.

Confirmo com um sinal.

– Não se preocupe com isso, Emy, eu já sou blindada.

Emy concorda e abre a porta do carro, ela não insiste porque


sabe que essa é a mais pura verdade. Embora eu não gostasse
mais de Lennon quando terminamos, sofri com toda a traição e as
descobertas. E, como dizem, nada melhor do que uma desilusão
amorosa para manter os sentimentos em cárcere privado.
Caminho ao seu lado, meus saltos batem contra o chão
acimentado, entoando em sintonia com os de Emy. Abraço o meu
corpo quando uma rajada de vento nos atinge.
O mesmo segurança da última vez guarda a porta, ele coloca
os olhos em nós e, diferente de antes, não pede nem mesmo
nossos cartões para tirar a chave do bolso e abrir a porta do clube.

– Isso sim que é ser exclusiva – murmura Emy, inclinando-se


para sussurrar no meu ouvido.
– O que você quer dizer?

Ela ri, empurrando a segunda porta. A música chega aos


nossos ouvidos, assim como o cheiro de perfume e cigarro. Pessoas
circulam pelo local.

– Eu sou a única irmã de Miles e mesmo assim nunca pude


passar sem mostrar o meu cartão. – Me puxa até o balcão de
bebidas e faz um sinal para o garçom. – E você recém está no
segundo dia e já tem entrada privilegiada, ou seja, Aiden declarou
mesmo você como dele.

Ignoro a fisgada de felicidade que assola o meu peito,


engolindo-a fundo o suficiente para que não perturbe a minha forma
de pensar e ver a situação com Aiden.

Emy pede dois shots de tequila, o garçom deposita em cima do


balcão uma bandeja com o conteúdo, ela recolhe um dos copos e
me entrega, um sorriso enorme cobrindo o rosto.

– Você vai precisar disso – fala, piscando um olho.

Encaro-a, apavorada, o que a faz cair em uma gargalhada


antes de engolir todo o líquido branco do pequeno copo. Repito o
seu movimento e não consigo conter a careta quando sinto o
amargor e a quentura no esôfago.
– O que você quer dizer com isso? – pergunto, mantendo as
mãos rente ao corpo para controlar a tremedeira.
Emy revira os olhos e faz um gesto de desdém com a mão.

– Era só brincadeira, Maddie, você está mesmo surtando com


isso, não é?

Encolho os ombros e me aproximo para sussurrar.


– Estou muito curiosa e excitada, mas não posso evitar o
nervosismo.

Ela coloca uma mão em meu ombro e me encara com


franqueza.

– Esse é um caminho sem volta, gata, depois que você


começa, o sexo comum se torna tão sem graça e trivial que você
não consegue mais ficar sem – revela, estalando a língua no céu da
boca.
Emy se vira novamente para o garçom e pede outra rodada de
bebidas. Estou distraída olhando ao redor, mas com a mente a
quilômetros de distância quando sinto mãos fortes e grandes
enrolando a minha cintura. O cheiro de Aiden chega ao meu olfato
antes mesmo que o meu corpo detecte totalmente a sua presença.

– Vamos subir? – indaga, sussurrando no meu ouvido.

O hálito quente me faz estremecer, me deixando excitada,


servindo uma injeção de animação pelo que está por vir. Sinto seu
peito largo e duro contra as minhas costas. Seguro os seus
antebraços e me jogo ainda mais contra o seu corpo.
– Não sei, estava me divertindo bebendo com a minha amiga –
provoco, erguendo o rosto para falar.

Aiden beija a curva do meu pescoço, a risada rouca contra a


minha pele me arrepia por inteira.
– Eu vou te divertir muito mais, acredite – retruca, passando a
língua áspera no ponto onde beijou.
Mordo as bochechas para suprimir um sorriso de satisfação.

– Hum... você e seu piercing me convenceram – murmuro,


virando-me e ficando de frente para ele – Sou toda sua por essa
noite, Aiden Thorne.
A máscara escura que ele usa cobre quase todo o rosto, mas
eu ainda consigo ver em seus olhos o brilho de pura satisfação
masculina com as minhas palavras. Aiden me puxa para si e beija
os meus lábios com fervor.
– Venha. – Me arrasta consigo, me levando para longe de Emy
e do salão principal.
Ele nos conduz até um dos elevadores e pressiona o último
botão. Ficamos em silêncio durante os poucos segundos que
estamos dentro dele. As portas se abrem e vejo um corredor vazio.
O vermelho vívido que cobre as paredes reflete com pouca
iluminação dos lustres. Aiden me puxa até uma das portas pretas,
retira uma chave do bolso e abre.

– Uau... – comento, girando nos calcanhares para ver tudo


com mais afinco.

O quarto se assemelha aos do primeiro andar, mas privativo.


Uma cama redonda no centro coberta com lençóis pretos, assim
como as paredes e o restante da decoração. A iluminação é ainda
mais precária aqui dentro. Há cordas penduradas no teto que caem
em direção a cama. Nos cantos, balcões com algemas, chicotes,
vibradores e muitas outras coisas parecidas. Algumas das quais eu
já ouvi falar e outras que eu nem conheço

Aiden fecha a porta atrás de nós e a tranca.


– Você já esteve aqui? – pergunto, encarando-o por sobre o
ombro.
Ele se aproxima, silencioso e relativamente quieto.

– Não.

Suas roupas escuras se assemelham ao ambiente,


camuflando-o com o lugar. Ele está perfeito e sexy, o que me excita
ainda mais.

Viro-me em sua direção.


– Então, como isso funciona?

Ele se aproxima alguns passos e se inclina para alinhar os


nossos rostos.

– Você precisa de uma palavra de segurança – fala, e sinto a


minha testa franzir, o que o faz continuar a explicação –, algumas
coisas podem ser muito pesadas ou fazê-la se sentir desconfortável,
caso isso aconteça, precisa de uma palavra de segurança para que
eu saiba a hora de parar.

Nossa, se isso era pra me deixar menos tensa, só está


servindo para me trazer o efeito contrário.

Pigarreio.

– Que tipo de palavra?

Ele envolve a minha cintura com as mãos grandes, uma


tentativa de me passar algum conforto ao me ver ficar rígida.

– O que quiser, princesinha – beija a minha testa e inspira o


meu cheiro –, não vou fazer nada com que precise se preocupar,
muito menos instigá-la a usar a palavra, isso é só como uma
garantia.
Solto um suspiro, relaxando em seus braços.
– Certo... hum... que tal... fogo?

Aiden solta uma risada, as sobrancelhas erguidas.

– Uma palavra bem atípica, mas pode ser – me dá outro beijo


–, só não se esqueça dela, tá bom?

Faço um sinal positivo, concordando.

– Agora, tire a roupa – comanda, seu tom de voz muda e a


aura do clima que lhe circundava se altera, tornando-se densa,
perigosa.

Meu núcleo se contrai com o comando direto e sexy. Meu


corpo reage de forma questionável diante do domínio de Aiden, feliz
e aguçado, cheio de expectativas e tesão. Se submetendo a ele
sem delongas, totalmente voluntário, como se fosse certo, como se
pertencesse a ele.

Me afasto e arrasto as mãos até o zíper transversal do vestido,


abrindo-o sem desviar os olhos dos dele. Deixo o tecido cair aos
meus pés, deixando-me somente com o conjunto branco de lingerie
que comprei especificamente para essa ocasião.

Aiden range o maxilar, os olhos se iluminam como brasas.

– Vá até a cama e se senta na ponta dela – instrui, apontando


com o queixo para o local.

Abro um meio-sorriso antes de me virar e fazer como ele


ordenou. Me sento sobre o colchão duro e espero. Ele se aproxima
de mim, em passos lentos e precisos, como um predador
espreitando a sua presa. Então ele se agacha e esfrega a ponta dos
dedos nas minhas coxas, alisando a pele macia.
– Não sabe quantas vezes eu imaginei essa semana como
seria o maldito conjunto – confessa, arrastando os dedos pela renda
fina e muito reveladora –, quantas vezes me perguntei qual cor
seria...
O conjunto não é nada mais do que uma calcinha que mal
cobre a minha boceta e um sutiã que deixa parte dos meus mamilos
de fora. É uma lingerie bem específica para um momento como
este, não para se usar no dia a dia.
Aiden segura os lados da minha calcinha fio dental e em um
único puxão arrebenta o tecido, desfazendo-se dele como se não
fosse nada.

– Ei, ela era nova – murmuro, semicerrando os olhos.

Ele abre um sorriso incisivo.

– Nova e adquirida somente para me agradar, portanto, faço o


que bem entender com ela – Remove a calcinha do meu quadril,
jogando-a no chão – Agora abra bem essas pernas e pare de
reclamar.

Me inclino para trás e pouso as duas mãos em cima do


colchão, afastando as pernas como ele instruiu. Minha boceta fica
completamente exposta, o líquido quente da minha excitação
escorre pelas minhas pernas.

Aiden enfia dois dedos e os chupa enquanto me encara. Então


ele os move até a minha boceta e a esfrega de cima a baixo, sem
desviar o clitóris e a entrada. Solto um gemido, minha respiração se
torna densa.

– Tão gostosa, princesinha... – comenta, passando os dedos


ao redor do clitóris –, chega a ser como a própria perdição de um
homem.

Jogo a cabeça para cima e solto um gemido alto, a pressão


dos seus dedos me faz estremecer e o prazer se fundir ao meu
corpo.

Aiden remove a mão e eu choramingo.


– Vem aqui – me puxa em sua direção, uma mão toca em
minhas costas, os dedos resvalam na presilha do sutiã, soltando-a e
liberando os meus seios –, agora sim – fala, descendo o tecido
pelos meus braços e me deixando completamente nua, exceto a
máscara que cobre parte do meu rosto.

Aiden se curva e segura um mamilo com a boca, a língua dura


circula a aréola com precisão e me faz arquejar, choramingando por
mais.

– Aiden... – agarro os seus cabelos, fechando minha mão em


punho nas madeixas lisas e sedosas.

Se a prática do BDSM é me provocar até me ver surtar, ele


está fazendo isso com maestria, pois eu já não estou mais quente,
estou é pegando fogo, quase entrando em combustão espontânea.

Ele se afasta, segura as cordas e puxa elas até as minhas


pernas.

– Abre mais as pernas – avisa, uma ordem, um comando de


um dominador com a sua submissa.

Dobro os joelhos com as pernas abertas e aguardo, Aiden


passa a corda ao redor de cada coxa, várias e várias vezes, até
amarrá-las de forma precisa. Estou completamente exposta, com a
boceta bem aberta e as pernas presas. Ele faz a volta na cama e
realiza o mesmo movimento com os meus braços, prendendo-os
atrás das minhas costas.

Imóvel. É assim que me encontro.

– Perfeita – comenta, beijando os meus lábios e se afastando.

Aiden puxa uma alavanca e as cordas começam a me


sustentar para cima, me fazendo ficar pendente no ar. Sinto uma
forte pressão nos braços e nas pernas, mas nada que beire a dor.
Ele se aproxima, o rosto está na altura da minha boceta, os
olhos brilham e um sorriso cobre o rosto.
– Não sabe que visão privilegiada que eu tenho – cicia,
desfazendo-se dos botões da camisa e removendo-a, então vai para
as calças, abaixando-as completamente e revelando o pau duro e
robusto. Ele se toca, circulando a cabeça com o polegar,
espalhando a gota de excitação que brilha na ponta, o piercing reluz
–, que boceta linda, princesinha.

Aiden move a mão para cima e para baixo, soltando um


gemido, os olhos fixos em mim. A cena é tão excitante que me faz
estremecer e me deixa louca de tesão, mas não consigo fazer nada
além de observá-lo.
– Você já transou sem camisinha? – pergunta, a voz rouca não
passa de um sussurro.

Concordo com um aceno.

– Mas não tenho doenças, se é isso que quer saber, fui em


uma ginecologista trocar o meu anticoncepcional há pouco tempo e
fiz os exames para confirmar que estava limpa – afirmo.

Eu e Lennon transamos algumas vezes sem camisinha,


quando as coisas esquentavam e ele não estava carregando
nenhuma consigo. Depois de um relacionamento de três anos e do
meu uso recorrente de remédio contraceptivo, acabei cedendo. Mas,
pouco antes de terminarmos, fui em uma médica para fazer a troca
da pílula, já que a antiga estava me deixando um pouco enjoada
pela manhã, aproveitei para fazer a bateria de exames e descobri
que estava limpa. Desde então, não tive mais contato sexual com
Lennon.

Aiden se aproxima, a mão ainda cobrindo o pau grande,


grosso, com a ponta rosada e coberto por veias.
– Eu também estou limpo e adoraria te foder sem camisinha,
mas só se você se sentir confortável com isso.

– Tudo bem – concordo, engolindo para molhar a garganta


seca.

Aiden vai até um dos armários e retira um vibrador,


caminhando em minha direção, ele sobe na cama e para na minha
frente.

– Agora eu vou te torturar, princesinha, para o seu e o meu


prazer.
Ele liga o vibrador e o coloca no meu clitóris, fazendo eu me
remexer como uma louca no ar. Uma mão agarra o meu pé, me
mantendo no lugar.

– Céus... Aiden... – murmuro débil, fechando os olhos.

Minhas pernas estão tão abertas que torna fácil o acesso até o
meu clitóris inchado. Sinto o líquido quente da minha lubrificação
escorrer pela minha bunda, enquanto eu suspiro, gemendo com o
orgasmo beirando.
Aiden continua pressionando o vibrador e eu solto um grunhido
quando sinto a sensação arrebatadora na boca do estômago, os
espasmos se espalhando pelo corpo inteiro, me deixando arrepiada
e alucinada.

– Aiden... – grito, mordendo os lábios com tanta força que o


gosto de cobre escorre pela minha língua.

– Ainda não – fala e retira o vibrador do meu clitóris.

Uma frustração absurda me faz quase chorar, as lágrimas


embaçam a minha visão e eu me sinto devastada, como se algo
muito importante tivesse sido privado de mim.

– Seu maldito! – esbravejo, enfezada.


Aiden solta uma risada zombeteira e joga o vibrador em cima
da cama.
– Eu faço o que quiser com você, princesinha, você está a
minha mercê – zomba, estalando um tapa forte na minha boceta
que me faz prender a respiração –, e só irá gozar quando eu
mandar.

Aiden passa o dedo pela minha lubrificação, espalhando-a até


a outra entrada, circulando o local com o indicador.

– Já foi fodida aqui? – pergunta, os olhos acesos.

Revelo, com um balançar de cabeça, minha virgindade anal.


Ele sorri abertamente, mostrando-se orgulhoso da resposta.

– Em breve não será mais e fico feliz que o meu pau seja o
primeiro a abrir esse cuzinho apertado.

Embora sexo anal seja um tabu, eu sempre fui curiosa quanto


a ele, e me sinto ansiosa e excitada por isso, mesmo que no fundo
há uma pontada de medo e hesitação.

Aiden ergue o quadril, a ponta do pau toca na minha boceta,


me fazendo murmurar palavras ininteligíveis de ansiedade para ser
fodida.

– Me come... – rogo, remexendo-me no ar.

– Olha que princesinha mais safada, implorando para ser


fodida. – Agarra a minha bunda, fechando as mãos com força e me
puxando para si. – Vou realizar o teu desejo, porque pretendo te
comer a noite inteirinha, até que fique assada e mal consiga
caminhar amanhã.
Aiden cutuca a minha entrada com a cabeça do pau, então se
move para a frente, metendo em mim com calma e lentidão
exagerada. Ele enfia metade do pau e continua empurrando até que
eu o receba por inteiro. Suspiramos juntos, gemendo quando ele me
preenche por completo.
Nossos corpos se unem como se tivessem sido feitos um para
o outro.

Ele se movimenta para trás, retirando-se para se inclinar de


novo e me penetrar. O piercing acerta um ponto específico que me
faz estremecer de tão absurdo prazer.
– Aiden... Deus... – falo, mas não passa de um gorgolejar de
palavras misturadas.
– Sim, Madelyn, sou o Deus que te satisfaz neste momento –
retruca, metendo fundo e bruto.
Aiden cessa os movimentos lentos, tomando um rumo
atordoado e lunático. Ele enfia todo o pau na minha boceta, até as
bolas, para se retirar por inteiro e repetir os movimentos. As mãos
agarram as minhas coxas amarradas, enquanto eu pendo no ar e
fico totalmente arregaçada nessa posição, dando-lhe inteira
passagem. O piercing raspa em um local que me faz gritar e
sacolejar em desespero e ânsia de tanta luxúria.

– Porra, Madelyn, você está me sufocando – grunhi, metendo e


abrindo a minha boceta com o pau grande.
Sinto o roçar das nossas peles, o barulho que os nossos
corpos fazem com a junção, a conexão dos nossos quadris. Minhas
pernas ficam dormentes pela posição, mas nada é suficiente para
me fazer parar de sentir absurdo prazer.
Aiden não está transando comigo, ele está me fodendo com
brutalidade, me fazendo ver estrelas e flutuar.

Ele retira uma mão das minhas pernas e a leva até a minha
boceta, tocando no clitóris pegajoso pela lubrificação e inchado pelo
desejo. Com o polegar, Aiden circula o nervo redondo e sensível,
induzindo-me ainda mais ao orgasmo arrebatador.

Sinto o orgasmo.

Então ele arrebenta, me fazendo subir ao céu e ver as estrelas


de perto. Gozo em seu pau, melando-o todo e contraindo os
músculos até que ele mal consiga se mexer dentro de mim,
sufocando-o, estrangulando-o.
Aiden sai de dentro de mim com rapidez.

– Caralho, Maddie, eu ainda não quero gozar, mas você estava


tão apertadinha, tão gostosa... – Se inclina para beijar a minha testa
suada.

Continuo tremendo no ar, os espasmos ainda espalhando-se


pelo meu corpo e uma sensação gostosa de alívio e torpor. Através
da inércia em que me encontro, sinto Aiden se afastar, então
percebo que eu estou descendo até sentir minhas costas contra o
colchão.

Embora a posição inicial de ser amarrada e totalmente


imobilizada tenha me deixado receosa, eu faria tudo de novo só
para sentir o pau de Aiden me preencher completamente, porque
agora eu entendo qual é a moral da posição e cordas.
Aiden solta as minhas pernas e os meus braços, movimento-
me sentindo os músculos latejando pela privação da circulação
sanguínea.
Inclino-me por sobre os cotovelos na cama e o encaro, ele está
de pé à minha frente, o pau arrebitado bate acima do umbigo,
brilhando encharcado pelo meu orgasmo.

– E agora? – pergunto, minha voz rouca pelos gritos.


Aiden sorri lindamente, parecendo um Deus grego suado,
excitado, duro e bagunçado. As tatuagens que cobrem o peitoral
definido e os braços lhe deixam aterrorizantemente magnífico. O
corpo torneado por músculos bem-trabalhados me deixa salivando
de vontade de lamber cada canto de pele exposta.

– Agora nós vamos continuar as brincadeiras, Maddie, ou


pensou que eu pararia em um único orgasmo? – Arqueia uma
sobrancelha escura.

– E quantos você pretende me dar essa noite? – questiono,


pressionando as pernas uma contra a outra.

– Quantos o seu corpo frágil aguentar – revela, inclinando-se


por cima de mim.
 
Cubro o corpo pequeno de Madelyn com o meu. Removo a
máscara do meu rosto e faço o mesmo com a dela, revelando a
bagunça deliciosa e linda que ela se encontra. Maddie está com os
cabelos embaraçados, rosto corado e suado, olhos pesados pela
satisfação de alguém que recém gozou.

Eu frequento clubes de BDSM há anos e nunca cheguei ao


ponto de precisar sair de uma boceta para não gozar. Madelyn tem
um jeito único de me fazer perder o controle.

Esfrego a ponta do meu pau na boceta lambuzada, para cima


e para baixo, instigando-a. Quero comer o cuzinho apertado, mas
antes preciso trabalhar em lubrificar bem essa parte virgem do seu
corpo.
– O que vai fazer? – questiona, esfregando as mãos pequenas
e macias nas minhas costas, arregaçando ainda mais as pernas
para mim.
– Eu vou foder o seu cuzinho – murmuro, beijando o seu
queixo e maxilar.

Sugo os seus lábios com a boca e enfio a minha língua,


beijando-a com calor e vontade. Nosso encaixe é perfeito e o beijo é
ébrio, como se fosse a coisa mais sublime e certa do mundo. Chupo
a língua de Maddie com força, engolindo um gemido seu, tomando-o
para mim. Ela acorda para a vida, rebolando os quadris contra o
meu pau, masturbando-se em mim.
Desço os meus beijos pelo seu pescoço, dorso e curva do
seio. Tomo um mamilo na boca, chupando-o e babando, esfregando
a língua dura ao redor da aréola rosinha e pequena. Maddie finca as
unhas nos meus ombros, gemidos e palavrões escapam da sua
boca.

Ela está lambuzada pra caralho, tão melada que eu nem vou
precisar de lubrificante para fodê-la.
Desço uma mão pelo abdômen liso e massageio o clitóris
inchado, brincando com o nervo sensível e prazeroso. Maddie
estremece debaixo de mim, deleitando-se com as novas investidas,
rendida ao prazer. Com a outra mão, espalho a lubrificação pelo
cuzinho apertado e enfio um dedo no buraco, suspirando,
antecipando o as sensações de ter o meu pau sufocado por ele.

– Aiden... – Madelyn arranha os meus ombros, indecisa e


rígida, embora esteja gostando, parece receosa.

– Você vai gostar, princesinha, mas eu posso parar se você


quiser – aviso, penetrando-a com o meu indicador. Ergo a cabeça
para encará-la, pronto para remover o dedo e voltar a investir em
sua boceta, mas Madelyn faz um leve sinal de cabeça, rendendo-se
a nova experiência – Quando for totalmente preenchida, vai
descobrir o que é prazer – murmuro, voltando a me concentrar.

Coloco mais pressão no clitóris, Maddie começa a relaxar,


fechando os olhos e mordendo os lábios, aproveito esse momento
para acrescentar mais um dedo, abrindo-o mais.

– Está confortável? – pergunto, garantindo que ela esteja


gostando.

– Uhum... – sussurra, os olhos fechados, a respiração pesada.

Suor escorre pela minha testa, enquanto eu me mantenho


concentrado em lhe dar prazer.
Retiro a mão do clitóris e recolho o vibrador de cima da cama,
ele serve tanto para a penetração quanto para a estimulação do
nervo. Sem dificuldades por conta da sua lubrificação natural,
penetro-a com o brinquedo.

Madelyn fecha as mãos em punho nos lençóis.

Ligo o brinquedinho e ao mesmo tempo em que fodo a boceta


com ele, o vibrador estimula o clitóris.

– Isso, Maddie, você está tão molhadinha – murmuro,


admirando a forma como ela se mexe enlouquecida nos lençóis.

Os gemidos de Madelyn se transformam em gritos e grunhidos,


ela está tão entregue, tão absorta que não percebe o momento em
que eu removo os meus dedos e penetro-a com o meu pau.

– Porra... – suspiro, entredentes.

Enfio meu pau até o fundo, sendo sugado pelo cuzinho


apertado e lubrificado. Duplamente preenchida, Madelyn me
enforca.
Saio para meter de novo, entrando em um ritmo preciso com o
vibrador que meto em sua boceta. Com a mão livre, ergo um pouco
os quadris de Maddie, deixando sua lombar pender no ar em uma
posição que eu consigo ir até o fundo.

– Aiden... meu Deus... – choraminga, suando e revirando os


olhos.

Penetro-a, me enfiando por inteiro, até ás bolas, então eu saio


e repito os movimentos, sempre no mesmo ritmo que o vibrador.
Sinto a boceta de Madelyn encharcar, o barulho da sucção aumenta,
reverberando pelo cômodo juntamente com os seus gemidos e
grunhidos.
– Que cuzinho gostoso... – cicio, jogando a cabeça para o alto
e fechando os olhos.

Madelyn se contorce e começa a estremecer, aumento as


investidas, inclinando mais o vibrador para encontrar o seu ponto G.
Ela goza violentamente, trepidando contra a cama e gritando
palavras ininteligíveis, murmuradas em conjunto com o meu nome.
Invisto em seu cuzinho, entrando e saindo. O gozo de Maddie
escorre pela boceta, lambuzando ainda mais o meu pau. Não paro
de fodê-la, nem mesmo quando ela se recupera do orgasmo e
começa a choramingar pelo próximo que se aproxima.

– Aiden... – resmunga, debatendo-se contra os lençóis.


Ela finca os pés na cama e ergue os quadris para cima, um
movimento involuntário do corpo que está embebecido pelo prazer.
Meto uma, duas, três vezes...

Minhas bolas batem em sua bunda, os gemidos se


intensificam, reverberando pelo ar como uma melodia alucinante.

Olho para baixo, observando o meu pau entrar e sair do


cuzinho, duro, bruto, fundo.
– Cacete... – urro, estalando o maxilar pelos dentes cravados.

A onda de prazer se concentra no meu abdômen, espalhando-


se pelo meu corpo. Estou prestes a gozar, pronto para encher
Madelyn com o meu esperma. Aumento as investidas na boceta,
tornando-as mais agressivas e severas.

Madelyn grita alto, gozando com tanta força que eu não


consigo me controlar por nem mais um segundo e acabo
acompanhando-a, desfazendo-me, me desmanchando no sexo mais
intenso que eu já tive em toda a minha vida.

Estoco mais algumas vezes, antes de sair com o pau


amolecido e o corpo suado, exausto e satisfeito. Madelyn ainda
estremece, os espasmos pequenos em seu corpo. Retiro o vibrador,
desligo e o jogo para o lado.
– Aiden... acho que eu tive orgasmos múltiplos – fala, a voz
rouca, baixa de tanto gritar.

Embora os lençóis sejam pretos, consigo ver a mancha


redonda e brilhante, um comprovante de que Madelyn acabou de se
desmanchar, de fato, em prazer.

– De nada, princesinha – zombo, deitando-me ao seu lado e


puxando-a para mim.

Beijo o topo da sua cabeça e inspiro o cheiro adocicado,


encaixando-me contra o seu corpo.

– E acho que eu estou mesmo assada – confessa, virando-se


de lado e ficando de frente para mim, os olhos castanhos me fitam,
pesados e cansados –, tipo, sério.

Beijo a ponta do seu nariz, um sorriso de satisfação cobre o


meu rosto.

– Isso é maravilhoso, não é sempre que uma mulher fica tão


satisfeita ao ponto de ficar assada depois de uma noite de sexo –
brinco, rindo com o olhar de desdém que ela me lança.

– Você é um pervertido.

Meu sorriso se transforma em uma gargalhada.


– E você estava denominando esse pervertido em um Deus até
pouco tempo atrás.
Maddie revira os olhos e bufa.
– Nem todas as pessoas são perfeitas, alguns são românticos,
mas tem o pau pequeno, já você é pervertido do pau grande.

Belisco levemente a sua cintura. Madelyn ri.


– Ainda bem que você me encaixou na segunda parte, ficaria
muito, extremamente ofendido se dissesse que eu tenho um pau
pequeno.
Ela puxa o meu cabelo e se enrosca mais em mim.

– E de tudo o que eu falei você só reparou na parte do pênis?

Ergo as sobrancelhas.
– É claro, qual é a maior ofensa para um homem do que uma
mulher classificar o seu pau como pequeno? – retruco, contendo um
sorriso. – Existem formas menos dolorosas de ofender um homem,
Madelyn.

A risada rouca e quente bate contra a curva do meu pescoço,


me fazendo estremecer e relaxar por tê-la em meus braços.
Seguro a palma da mão pequena e delicada contra a minha
grande e rígida e sinto uma conexão mútua entre nós dois, como se
isso estivesse destinado a acontecer, como se fosse certo e
absoluto, como se Madelyn fosse feita pra ser minha.
Pigarreio, desvanecendo a minha mente desse tipo de situação
e pensamento.
– O que você achou? – pergunto, brincando com os dedinhos
pequenos.

Madelyn solta um suspiro, ela parece feliz e relaxada.

– Eu achei incrível, extraordinário – revela, diminuindo o tom


de voz ao continuar –, sempre tive um pouco de dificuldade em
gozar – encolhe os ombros diante do meu olhar questionador –, pra
mulher não é tão fácil assim, tem um conjunto de fatores que leva
ao orgasmo.

Estalo a língua no céu da boca.

Embora eu saiba a resposta, resolvo perguntar como garantia.

– Tipo o que?

– Uma boa masturbação, uma boa chupada – cicia, piscando


com lentidão, encaixando as unhas nas pontas dos meus dedos –,
não só uma simples penetração.

Coloco a mão atrás da sua cabeça, na curva do pescoço e


puxo-a para mim, plantando um vasto beijo nos lábios inchados.

– Comigo é pré-requisito a mulher gozar durante o sexo,


Maddie, nunca terminarei o meu trabalho enquanto eu não souber
que está totalmente satisfeita.

Ela sorri em um suspiro.

– Eu tive orgasmos múltiplos hoje, Aiden, e eu nunca tinha tido


ou sentido nada nem meramente parecido, então, acredite, eu sei
bem do que você é capaz, senhor pau grande e bom de cama.

Sugo o lábio inferior entre os meus dentes e cutuco a sua


cintura, fazendo-a rir e tentar se afastar.
– Eu gosto disso, pode me chamar assim sempre que quiser,
faz bem para o meu orgulho masculino.

– Bom saber, jamais vou repetir isso novamente, então –


zomba, afagando a curva do meu braço –, você já tem ego o
suficiente para que eu precise alimentá-lo ainda mais.

– Não ouse, princesinha – contraponho, encarando-a com


fervor.

Madelyn sustenta o meu olhar, o semblante muda e o ar se


torna mais denso, pesado. Meu coração erra uma batida,
descompensado sob o peso dos olhos castanhos. Ela coloca a mão
no meu rosto e acaricia a minha bochecha com a ponta dos dedos.
Fico rígido, há anos não sei o que é receber um carinho
verdadeiro, um toque sincero e recíproco. Mas Madelyn não para
diante do meu desconforto, mantendo as carícias, a ponta do
indicador desenhando os contornos da minha face.

– Você é um cara incrível, Aiden, gostaria de ter te conhecido


antes.

Uma fisgada de culpa me faz prender a respiração e uma dor


aguda penetra em meu peito.
Depois que o meu pai morreu eu me fechei para o mundo,
erguendo muros e barreiras difíceis de serem penetradas. Nunca
mais troquei afetos sinceros com ninguém.
Até agora.

Até Madelyn.

A constatação do que estamos fazendo me acerta


precisamente, parecendo tão errado, mas tão certo ao mesmo
tempo.
Tudo o que vivenciei com Madelyn até agora foi o mais perto
de parecer algo humano e real do que eu tive nos últimos anos. É
como se ela estivesse acendendo algo dentro de mim há muito
tempo adormecido.
Mas, porra, isso podia estar acontecendo?

NÃO!

A resposta é curta e clara.


Eu tenho uma vingança há muito tempo premeditada para
exercer, um plano deliberado, um sentimento infiltrado e corrosivo
de revanche.
Mas, porque logo agora, diante de Madelyn, tudo isso se torna
nada além de um sentimento pequeno e curto?

Eu quero acabar com o pai dela.

Mas eu a quero para mim.

E eu não posso ter os dois.

Como pode, de todas as pessoas no mundo, ser ela a luz que


afasta a minha escuridão?

Logo ela, a filha do homem que me empurrou para o desastre.


Logo ela, que conseguiu remendar o que ele quebrou.

– Estou longe de ser incrível, Maddie – confesso, em um


sussurro, me sentindo mal, pela primeira vez na vida, por isso.
 
Se Aiden não tivesse lesionado Lennon, eu mesma faria isso
nesse momento.

Ainda não consigo acreditar que eu fiquei três anos com


aquele infeliz e não me atinei aos pequenos detalhes da
personalidade machista e tóxica.

Primeiro, ele tentou me forçar na rua, por consequência desses


atos, Aiden se vingou por mim. Depois, espalhou um boato na
faculdade toda de que eu o havia traído. Então, ainda não
convencido da merda que estava fazendo, o babaca espalhou que
Aiden só fez aquilo porque pegou nós dois transando no
estacionamento do Rollin’ Hops, o que deixou Aiden com ciúmes e,
consequentemente, agressivo.
Para piorar ainda mais, ele falou com os meus pais, suplicando
para que eles me induzissem a voltar com ele, mentindo
descaradamente que nós terminamos por causa de Aiden e que ele
é um cara problemático que só servirá para me envolver em
escândalos.
Agora, eu preciso ignorar os olhares idiotas de toda a
faculdade, porque todo mundo me encara com curiosidade e certa
satisfação por ver o meu nome envolvido nisso. E ainda preciso me
desfazer das investidas dos meus pais quanto a Lennon.

Ou seja, estou ferrada.


Minha liberdade está mais perto de acabar do que eu pensava.

– Você está fazendo de novo – comenta Emy, dando um tapa


no meu braço.

Bufo.

– Fazendo o quê? – questiono, mantendo os meus olhos nas


minhas mãos e ignorando todo o resto do mundo.
– Se tremendo e rangendo os dentes, posso ouvir o músculo
da sua mandíbula daqui.

Estamos em horário de intervalo, sentadas sobre a sombra de


uma das árvores que cobre o gramado da universidade. Estudantes
permeiam pelo local, nos encarando, cochichando e rindo.

Eu odeio todos eles.

Na real, eu odeio essa maldita cidade.


Desde que eu era criança e meu pai resolveu se tornar
prefeito, as coisas mudaram drasticamente, o que era leve e fácil, se
tornou pesado e difícil.
Eu precisei me moldar por causa dele, me moldar para o que a
sociedade julga ser o certo, para o jeito que eles acham que a
princesinha precisa agir.

– Estou tentando me controlar para não procurar Lennon e


voar na jugular dele – revelo, mordendo as bochechas.

Queimar de raiva seria uma boa forma de descrever como eu


me sinto no momento, porque se um dia eu já odiei alguém com
tanta intensidade e profundidade, eu não me lembro.

– Ele é um babaca arrogante e está com raiva porque você


não quer voltar para ele – diz Emy, deitando-se e apoiando a cabeça
na mochila. – Além do mais, ele está com o ego ferido porque sabe
que você e Aiden estão transando.

Eu não preciso nem tentar negar esse fato, logo que Aiden e
eu fomos vistos juntos, o burburinho sobre um possível romance se
espalhou, o que foi consolidado, já que todas as vezes em que
estamos em público não fazemos questão nenhuma de disfarçar
que tem algo acontecendo.

– Eu vou contar para os meus pais tudo o que ele fez, se ele
acha que vai sair de vítima de toda essa situação, está muito
enganado – ameaço, entredentes.

Tentei ser condizente com Lennon porque sei como o xerife é


um pai rigoroso, tentei, de verdade, ser uma pessoa sem rancor e
ignorar a traição dele, deixando-o viver a vida e continuar sendo
uma boa pessoa aos olhos dos meus pais.
Mas ele passou dos limites e a minha bondade foi extrapolada.

Vou desmascarar Lennon e fazê-lo responder pelos seus atos.

– Já deveria ter feito isso, mas antes tarde do que nunca –


responde Emy, digitando em seu aparelho celular.
– Eu sei, só pensei que as coisas não chegariam a esse
extremo.

Emy me lança um olhar sagaz.

– Jura? Eu sempre disse que Lennon não era flor que se


cheire, mas você nunca me deu ouvidos – retruca, enfezada.

Pela visão periférica, noto a aproximação de Aiden e Miles.


Meu coração acelera, ansioso e feliz por estar perto dele. Os dois se
jogam ao nosso lado na sombra.

– Qual foi o problema? – pergunta Miles, espiando o celular da


irmã para ver o que ela está fazendo.
Emy bufa, irritada com a intromissão.

– Lennon está dando problema de novo – revela, revirando os


olhos.
– O que ele fez agora? – refuta Miles, deitando-se ao lado de
Emy.

Olho para Aiden, ele me encara com a testa franzida e um


brilho predatório nos olhos. Noto pela contração da mandíbula e a
veia que pulsa em seu pescoço que ele se controla, mantendo o
temperamento acalentado, mesmo diante da conversa que o irrita.

– Nada demais, ele só é um idiota – Esfrego os meus cabelos,


tentando soar indiferente e mudar de assunto.
Aiden se inclina em minha direção e coloca uma mão em meu
braço, os olhos estão fixos e diretos.

– O que ele fez? – insiste, refazendo a mesma pergunta de


Miles.

Não quero que ele se envolva em mais problemas por minha


causa, afinal de contas, uma coisa é certa, Lennon é filho do xerife,
mas... Aiden é filho da promotora, então...

– Ele espalhou pra faculdade inteira que foi agredido porque


você ficou com ciúmes depois que nos viu “transando” – respondo,
fazendo aspas com os dedos para enaltecer o fato que nunca
aconteceu – no estacionamento do Rollin’ Hops.

Diferente de Aiden, Lennon sempre tentou ser o cara ideal, o


homem perfeito aos olhos do meu pai, então nunca, absolutamente
sob hipótese alguma, transamos em lugares públicos ou que
pudéssemos ser vistos, muito menos no Rollin’ Hops que é um bar
muito frequentado pela maioria da classe estudantil da cidade.
– Filho da mãe! – cospe Miles, irritado, levantando-se em um
único movimento. – E agora? – Olha para Aiden, uma pergunta
explícita, mas com um significado silencioso e enigmático.
– Acho que, além do ciúmes, ele ficou com raiva porque não
vai poder participar do próximo jogo – falo, me aproximando de
Aiden como se ele estivesse me puxando como um ímã.

Me escoro contra o ombro dele e inspiro o cheiro com força, a


mistura de nicotina e madeira tem um efeito gradativo de me
acalmar. Aiden coloca a mão em meus cabelos, uma carícia suave e
rítmica em meu couro cabeludo.

– Ele não poderia de qualquer forma... – murmura Miles.


Sinto a minha testa franzir.

– Como assim? – indago, confusa.

Miles comprime os lábios, pensativo, então lança um olhar


questionador para Aiden que confirma com um leve aceno de
cabeça a pergunta silenciosa.
– Nós precisamos passar por exame toxicológico antes de um
jogo de campeonato – revela, inclinando-se e abaixando o tom de
voz –, e Lennon não passou no exame.
Meu queixo cai, chocada, encaro-o abismada.

– Ele reprovou no exame de drogas? – Minha voz sai


esganiçada pelo choque. Miles confirma. – E como diabos isso
nunca aconteceu antes?

Faz uns dois anos que Lennon está no time de Rugby da


universidade, ou seja, ele já deve ter passado por testes assim
como antes, mas eu nunca o vi fora de jogos por causa de drogas. E
esse era um dos motivos que me levava a acreditar que ele não
fizesse uso, mesmo estando desconfiada.

Miles retesa-se, cruzando os braços e recostando-se contra o


tronco grosso da árvore.

– Eu pensei a mesma coisa que você – confessa –, mas


cheguei à conclusão de que ele controlava mais o uso quando
vocês namoravam, talvez na tentativa de manter uma boa aparência
para a sua família – mexe os ombros –, não sei...

Isso faria algum sentido, de alguma forma, os campeonatos


costumam ocorrer em meados de outubro, o que leva Lennon a
conseguir suprir o uso pelos três meses que antecedem ao exame.

– Então ele foi expulso do time? – pergunta Emy, mordendo os


lábios para conter um sorriso de satisfação.

– Sim, Lennon está fora do time – confirma Miles.


– Nossa, bem-feito pra ele – comenta Emy, fazendo um gesto
de desdém com a mão –, lembro que o xerife era todo orgulhoso de
ver o filho no time, quero só ver o que vai falar para o pai. – Solta
uma risada maléfica.

Também não posso dizer que me sinto triste por isso, na


verdade, tem uma certa satisfação rondando os meus pensamentos.
Lennon tentou me prejudicar, indo direto ao centro do que mais me
afeta – os meus pais –, e no final das contas, quem saiu mais
afetado foi ele.
– Com certeza a verdade é que não vai ser – acrescenta Miles,
rindo em conjunto com a irmã.

Um grupo de cinco garotas passa ao nosso lado, três delas


murmuram alguma coisa e entoam risadas altas o suficiente para
que possamos ouvir.
Reviro os meus olhos.

– Idiotas – sibilo, bufando.

Emy levanta a mão e faz um gesto obsceno para elas, abrindo


um sorriso incisivo, desafiando-as a retrucar. O que elas certamente
não fazem, ninguém gosta de ter Emy como inimiga, não quando ela
é louca e o irmão é o capitão do time de Rugby, ou seja, figura
desejada e muito cobiçada.

– Elas estão fazendo isso por causa do idiota? – pergunta


Aiden, apontando com o queixo em direção ao grupo.

Uma respiração ruidosa separa os meus lábios.

– Infelizmente algumas pessoas acham Lennon incrível,


popular e gostoso, então entram no joguinho dele – replico com um
esgar nos lábios –, agora junta isso com o status de que ele é filho
do xerife...

Aiden faz um barulho com a garganta, desdém e ódio piscam


em seus olhos.
– Não vou deixar que tratem você assim – afirma, levantando-
se e me puxando com ele –, se eles querem algo para falar, então
daremos a eles fatos e não boatos.
Minha pulsação acelera e meus ouvidos pinicam pelo bater
acelerado do meu coração. Encaro-o, ansiosa e ao mesmo tempo
nervosa. Aiden abre um meio-sorriso sexy, os olhos brilham em
antecipação.

– O que você vai fazer? – pergunto, aproximando-me lento e


precisamente.

Aiden amplia o sorriso, estende a mão e enlaça a minha


cintura, puxando-me contra o seu peito.

– Vamos dar a essa plateia o show que eles querem – fala,


antes de colar os lábios nos meus.
A mão que segura a minha cintura se arrasta pelas minhas
costas e a outra enrosca os meus cabelos em punho, o beijo é
urgente, quente e profundo. Minha língua encontra a sua, nossas
cabeças viram de um lado para o outro, e de olhos fechados, não
vejo nada além de sentir as labaredas que me incendeiam de estar
em seus braços.
Ouço o suspiro de Emy, a risada zombeteira de Miles e um urro
de murmúrios ao redor, mas tudo não passa de burburinhos através
do torpor em que eu me encontro.

Alguém assobia, outros batem palmas, outros gritam.

Somos o centro das atenções, o palco do show da faculdade,


os nomes que estarão nas línguas das pessoas de agora em diante.

Mas nada disso é relevante. Não agora. Não quando estou


com Aiden.

Então, mais cedo do que eu gostaria, ele se afasta


milimetricamente, os olhos bicolores estão fixos nos meus,
brilhantes e cheios de uma luxúria que só nós dois conhecemos e
compreendemos. Os lábios estão inchados e úmidos. Ele se inclina
e esfrega a boca na minha bochecha, arrastando-a até a minha
orelha.
– Agora sim eles podem falar o que quiserem – murmura, me
arrepiando por inteira, me fazendo encolher os dedos dos pés –,
porque agora eles sabem a verdade.

– Qual verdade? – Consigo perguntar, embora com a voz ébria


e arrastada.

Aiden beija a ponta da minha orelha, o riso quente colidindo


contra a minha pele.
– Que você é minha – diz, enroscando o braço nos meus
ombros e me puxando para si –, agora vamos entrar que nossas
aulas estão prestes a começar.
Ele acomoda a mochila no outro braço e lança um olhar para
Miles e Emy, para que se movam e que, enfim, possamos entrar.
Ergo a cabeça, minhas bochechas estão um pouco coradas pelo
calor e pela vergonha, as pessoas ainda nos encaram, comentando
e sussurrando, há alguns telefones apontados para nós de forma
descarada.

Caminhamos em sincronia para a entrada, ignorando todos.


Aiden mantém o braço ao meu redor, mostrando a todos que
estamos, de fato, juntos.

Sei que ele está fazendo isso para me proteger, me


defendendo de fofocas traiçoeiras e maliciosas. E, de um jeito
diferente, mandando Lennon se foder.

Mesmo assim, não posso evitar o sorriso que insiste em


permear o meu rosto.
 
Empurro as portas do Rollin’ Hops com ainda mais ódio dessa
cidade e dessa gente. Eu odeio o fato de todo mundo sempre focar
em mim, esperando por uma oportunidade para me julgar.

Coloco as mãos nos joelhos e inspiro profundamente o vento


gélido noturno. O céu está limpo, sem estrelas ou uma lua para se
admirar. A brisa balança os meus cabelos e refresca a pele quente.

Minha visão está um pouco embaçada pelo excesso de álcool


no sangue, tornando-se turva e me forçando a piscar repetidas
vezes.

Estive nesse maldito bar pela última hora, engolindo um copo


de cerveja atrás do outro, me divertindo com Emy, tentando
esquecer o fato de que o meu pai está prestes a me impedir de sair
de casa. Aiden e Miles não vieram, ainda, com a desculpa de que
precisavam resolver alguma coisa antes de nos encontrar. E estava
tudo tão perfeito e tranquilo, nós realmente estávamos felizes, até
um dos amigos de Lennon se aproximar da mesa e me chamar de
vadia na frente de todo mundo, fazendo o local inteiro rir e debochar
da filhinha do prefeito.
Então a diversão se tornou o pior caos.

Emy jogou o copo no rosto dele, acertando o nariz e fazendo o


osso estalar contra o vidro e voar sangue por cima da mesa. Os
outros amigos vieram para cima, então eu joguei o meu copo e
acertei a testa de um deles, o que criou um hematoma
instantaneamente, abrindo um machucado de cinco centímetros e o
sangue começar a escorrer por cima do seu olho direito. Depois
disso, os seguranças nos carregaram para fora, como se fôssemos
as erradas dessa história toda.
– Seu bando de machista filho da puta! – Emy chuta a porta do
estabelecimento, gritando, o segurança apenas lhe lança um olhar
ameaçador, ignorando-a.

– Esquece, ele não vai mudar o pensamento – murmuro,


arrumando a postura.

Eu estou com tanta raiva que seria capaz de incendiar o bar


inteiro com todo mundo dentro, enviando-os diretamente para o
inferno de onde nunca deveriam ter saído.

O desgraçado do Lennon está por aqui em algum lugar, espero


com todas as minhas forças que ele não apareça na minha frente,
caso contrário, eu vou matá-lo.

Emy coloca as mãos na cintura e se vira para mim, o


semblante está vermelho de ódio.

– E agora? – pergunta, bufando.


E agora está tudo acabado. Quero responder, mas há um bolo
na minha garganta que impede a passagem da voz.

Esse escândalo vai se espalhar por aí, vai flutuar feito fumaça
ao vento, esgueirando-se em cada canto da cidade, tornando-se,
em breve, o assunto mais falado e mais comentado.

Já posso até imaginar as manchetes dos sites de fofocas:


“Filha de Prefeito se envolve em briga de bar”. Antes mesmo da
noite ir embora, meu pai saberá, seu assessor de carreira vai ligar
para ele, então irá comunicá-lo do escândalo envolvendo o meu
nome. E esse será o fim da minha liberdade.

Pelos próximos meses, ficarei presa dentro de casa, saindo


somente para ir à faculdade ou em eventos e jantares políticos. Sem
festas, sem dormir na casa de Emy e sem eventos que meus pais
não estejam presentes para que possam me controlar.

Coloco as mãos na cabeça e engulo o choro, piscando para


afastar as lágrimas que insistem em se espalhar pelos meus olhos.
Meu peito está comprimido, dolorido e enfezado.

Era isso que Lennon queria, foi por isso que ele veio lutando o
tempo todo. Me prender de volta na gaiola social, na jaula que me
cerca. Assim, a oportunidade de me fazer ceder às suas investidas
se tornaria gradativa, ao seu ver.

Mas isso nunca, repito, NUNCA vai acontecer.

Emy dá um passo em minha direção, o rosto desvanecendo-se


da carranca, tornando-se sereno e condescendente.

– Oh, me desculpa, Maddie, eu não consegui me controlar... –


choraminga –, deveria ter ignorado.

Ela sabe o que vai acontecer de agora em diante, a mesma


coisa que aconteceu antes do meu namoro com Lennon, quando
fomos em uma festa na qual a polícia bateu porque estava cheia de
menores de idade, inclusive, nós duas.

Balanço a cabeça.

– Isso aconteceria uma hora ou outra – Aperto o canto do olho


com o indicador para secar uma lágrima –, meu pai já estava dando
indícios de que me trancaria em casa.
– Mesmo assim, eu não deveria...
– Se você não tivesse feito, então eu teria – interrompo-a,
cerrando o maxilar –, é injusto que Lennon tenha sido um péssimo
namorado, que tenha me traído e tenha sido tóxico, e, ainda assim,
que só eu seja julgada por essa sociedade retrógrada.

Por um tempo, pensei que ninguém soubesse sobre a


verdadeira faceta de Lennon, que todos pensassem que ele era um
playboyzinho idiota, mas percebi que a única cega dessa história
toda sempre foi eu. Lennon não faz questão de esconder o uso
contínuo de drogas, pelo menos agora que não estamos mais
juntos. E, além de tudo, se Gretha era uma amante fixa, com
quantas outras ele não dormiu ao longo dos anos?

Durante todo esse tempo, fui taxada por tantas coisas que eu
nem sei enumerar.

Lennon é o errado, as pessoas sabem disso, mas é mais fácil


rir e julgar o membro mais frágil dessa história. Nesse caso, eu.
– O que você quer fazer? Quer ir para casa e tentar resolver as
coisas? – indaga, parando na minha frente.

Sim, eu poderia tentar isso, mas eu sei que não vai adiantar de
nada, não quando se trata sobre a carreira política do meu pai, não
quando é o nome da nossa família envolvida em algum escândalo.

– Vamos fazer alguma coisa, quero aproveitar o resquício de


liberdade que ainda me resta – afirmo, girando nos calcanhares e
me afastando do bar. Emy me segue. – Só vamos em algum lugar e
esquecer da vida pelas próximas horas.
O estacionamento está vazio, mesmo com todas as vagas
preenchidas por veículos. Com a gritaria e algazarra da briga, todos
os curiosos entraram no bar para ver o que estava acontecendo.

Atravessamos, em silêncio, todo o estacionamento até a


calçada.
– Sabe o que vai falar para Aiden? – murmura, entristecida.

Encaro-a com a testa franzida, o teor da pergunta não fazendo


sentido algum para mim.
– Não entendi.

Emy franze os lábios para baixo, chateada.

– A submissa fixa precisa estar sempre no clube quando o


dominador quiser, Maddie, é um dos mandamentos do Dominators –
sussurra, desviando os olhos para um ponto qualquer no chão –,
sabemos o que vai acontecer com você de agora em diante...
Ela não termina a frase, não precisa, eu compreendo bem o
significado.

Aiden é meu dominador, se eu não estiver à sua disposição,


ele pode procurar por outra, esse é o acordo entre os membros do
lugar.
Engulo para molhar a garganta seca.

Não era para doer tanto essa constatação, meu acordo com
Aiden não passou de algo carnal e meramente sexual. Era para ser
leve e divertido para nós dois.

Mas porque parece que eu estou prestes a morrer de tanta dor


no peito ao imaginá-lo com outra?
Céus... como foi que a minha vida saiu tanto do controle?

Em um dia eu tinha tudo planejado, mas no outro nada mais


fazia sentido, como agora.

Tento me controlar, anestesiar o meu corpo de tudo o que


estou sentindo, afastar os sentimentos agonizantes e os
pensamentos de que estou perdendo alguma coisa.
Não se pode perder o que nunca se teve.
Aiden e eu tivemos bons momentos, mas tudo não passou de
diversão, de algo passageiro e... intenso. Ele não sabe como a
minha vida é, como a minha família é, então não tem obrigação
alguma de entrar nessa furada comigo, nesse pandemônio. E seria
injusto arrastá-lo para isso, ainda mais quando só o que ele fez nas
últimas semanas foi me trazer algum conforto nesse período
turbulento.
Solto o ar pelo nariz, engolindo cada vez mais fundo,
reprimindo a dor, até que ela não passe de uma onda bramindo no
abismo negro que há dentro de mim.

– Eu sei – confirmo, minha voz soa aguda –, só vamos


aproveitar o resto da noite, por favor.

Ela concorda com um sorriso que não chega aos olhos.


Direcionamo-nos até o carro de Emy que está estacionado na
última vaga, mais próximo da rua do que da entrada do bar. A
iluminação cobre parcialmente o local, o breu se arrasta através das
fileiras de veículos.

Paro ao lado da porta do passageiro, mas um gemido me deixa


rígida, me fazendo retesar e virar em uma velocidade vertiginosa
para trás. Franzo os olhos, perscrutando a escuridão em busca da
origem do som.
– Quem é? – grita Emy, espichando o pescoço e girando a
cabeça.
Um vulto surge em nossa linha de visão, mordo os lábios para
conter o grito estrangulado pelo susto. Reconheço Gretha, ela
manca em nossa direção, uma mão está na barriga arredondada.

– Céus, o que aconteceu com você? – pergunta Emy, tapando


a boca com as mãos.
A garota está... um caos. Os cabelos bagunçados, o lábio
inferior cortado com sangue escorrendo por ele. Manchas vermelhas
nas lapelas brancas do uniforme. O olho esquerdo está
parcialmente fechado por conta de uma contusão que o está
inchando e escurecendo a coloração ao redor.
– Estou bem... – murmura, sentando-se na calçada ao nosso
lado –, só preciso de um pouco de descanso.

Me aproximo em passos precisos e calculados, nenhuma


palavra sai pela minha boca em decorrência do horror que é a visão.
Gretha está grávida, quem teria a coragem de agredir uma mulher
de forma tão brutal e desumana?

– Gretha... – sussurro o seu nome, sem saber ao certo o que


falar ou como agir – Você precisa de ajuda?
Ela ergue a cabeça para me encarar através do único olho que
não foi lesionado, raiva transparece em seu rosto.

– Isso é culpa sua! – acusa, irritada, mas retesa-se ao sentir


dor.

– Do que você está falando? – Emy faz a volta no carro e para


ao meu lado, encarando Gretha com as mãos na cintura. – Venha,
vamos te levar para o hospital.

Gretha balança a cabeça, recusando-se. Ela esfrega o


indicador no lábio cortado, tentando conter o sangue que escorre.
– Eu não vou a lugar algum – retruca, estremecendo –, já disse
que estou bem, só me deixem em paz.

– Bem, sua louca? Você está grávida e foi agredida, como


pode pensar que está tudo certo? E o seu bebê?

Gretha solta uma risada insípida.


– Eu não estou nem aí para essa criança – diz com tanta
convicção que eu dou um passo para trás, abalada –, essa gravidez
foi um erro, nunca deveria ter acontecido.
– Céus, e se você perder o seu bebê? – sibila Emy.

– Bom... talvez assim eu consiga me redimir com Lennon... –


suspira, pensativa.

Emy bufa e retira o celular do bolso.

– Não estou nem aí para o que acha, estou ligando agora


mesmo para a emergência.
Gretha se levanta em um só movimento, um gemido
escapando dos lábios.

– Não ouse, garota! – esbraveja, encarando ameaçadoramente


Emy.

– E por que não? – refuta Emy.

Gretha solta um suspiro pesado e esfrega os cabelos,


arrumando as mechas bagunçadas.

– Se eu contar, precisam me prometer que não vão falar para


ninguém.

Emy e eu nos entreolhamos, voltando nossa atenção para


Gretha e concordando, por fim.
– Isso aqui não é nada demais, não precisam se preocupar –
replica, afastando-se –, nada pode ser feito.

– Não é nem de longe uma explicação, Gretha! – respondo,


elevando o meu tom de voz – Emy vai ligar para a polícia.

Gretha se vira com tanta rapidez que acaba tropeçando nos


próprios pés e leva um segundo para se equilibrar.

– Liguem! – Aponta a mão em nossa direção. – E vão falar o


que para o xerife? Vão dizer que foi o maldito do filho dele que fez
isso comigo? – Explode, gritando, lágrimas escorrem pelos olhos e
molham as bochechas magras.
Todo o sangue se esvai do meu rosto.

Dou uns passos para trás, uma dor aguda acerta o meu peito,
meu coração comprime tanto que se transforma em nada. Balanço a
cabeça, incrédula, triste, com raiva.

Como ele pôde fazer uma coisa dessas? Como ele pôde
espancar a mulher que espera um filho dele? Como ele pôde bater
em uma mulher?

– Deus... – Ouço Emy sussurrar, tão chocada e abalada quanto


eu estou.

– Não podem falar para ninguém – acrescenta Gretha diante


do nosso silêncio –, o xerife jamais iria contra o filho.

– Mas nós podemos ir até a promotora – propõe Emy.

– Não! Eu não quero isso, eu amo Lennon e se eu o denunciar,


ele nunca mais ficará comigo – chora copiosamente –, ele nunca me
perdoaria.

– Gretha... – balbucio.
Percebo que estou chorando, que tudo isso parece anormal,
fora do comum. Não consigo sentir nada além de ódio puro e
profundo de Lennon, e um pesar enorme por Gretha e pela criança
que ela espera.

– Eu já disse que não! – revida, limpando o rosto com o dorso


da mão. – Amo ele, não quero perdê-lo e, além do mais, sei que ele
não fez por mal, ele só está irritado com tudo o que vem
acontecendo... – encolhe os ombros, como se isso fosse uma
desculpa plausível para as atitudes grotescas dele –, vocês
terminaram, ele perdeu o posto que tinha no time, enfim, ele só está
irritado e precisava descontar em alguma coisa.

Um soluço se desprende de mim, agudo e dolorido. Não


consigo controlar o choro, as lágrimas.

Eu já ouvi falar em dependência emocional, mas nunca


cheguei nem perto de presenciar nada parecido.

É horrível! Me sinto incapaz, travada. Não sei como agir, o que


fazer, como salvá-la disso.
– Gretha, por favor, pense no seu bebê, Lennon é um escroto,
ele não presta e nem te ama... – Emy dá um passo em direção a
garota, mas ela se afasta, dando outro para trás –, por favor, só
deixe que a gente tente te ajudar a resolver isso.

Gretha me encara com raiva.


– Querem resolver isso? Que tal se Madelyn decidir voltar para
Lennon? Isso sim melhoraria as coisas, já que é por culpa dela que
ele está assim.
– Eu nunca mais voltarei com ele e te aconselho a fazer o
mesmo – respondo, fungando.

– Você nunca o amou de verdade, por isso diz essas coisas.


– Talvez... – confirmo – Ainda assim, amor deve trazer
felicidade e prazer, não dor e violência, Gretha.
Dói ver como Lennon tem poder sobre ela, como consegue
manipulá-la ao ponto dela se culpar pelas agressões dele. Eu
gostaria de ajudá-la de alguma forma, de fazê-la ver que isso está
errado, que amor não é sobre dor, mas sobre felicidade e prazer.

Gretha está machucada, não só fisicamente como


mentalmente também. Meu coração sangra com a imagem, me
entristece ver uma garota tão jovem e bonita estar tendo o brilho
apagado por alguém que não presta.
Eu lamento essa situação. Lamento por Gretha e lamento pelo
bebê inocente que carrega em seu ventre.

– Não quero os seus conselhos, agora deem o fora daqui e me


deixem em paz – gira nos calcanhares e se afasta –, e não ousem
falar para ele, eu acabo com a vida de vocês se me privarem do
meu amor – acrescenta, gritando.

Por uma sucessão de longos segundos, Emy e eu


permanecemos imóveis, estarrecidas e abaladas demais para
pensar qualquer coisa, para fazer alguma coisa que fosse.
Encaramos o caminho por onde Gretha mancou até sumir de vista,
absorvendo as palavras que cuspiu antes de ir embora.

– O que vamos fazer? – pigarreio, forçando a minha garganta a


voltar a funcionar.

Emy solta um suspiro estrangulado.

– Eu vou denunciar para o canal de apoio à mulher[8] – fala,


desbloqueando o celular e digitando no aparelho –, pouco me
importa com o que ela acha ou pensa dessa relação, Lennon é
tóxico e está fazendo mal pra ela, não vou deixar que continue
servindo como o saco de pancadas dele.
Sim, não importa o que ela tenha dito, infelizmente, Gretha
está cega de amor por Lennon e acha que tudo o que ele está
fazendo com ela é por um motivo.
Mas agressão não é e nunca será motivo para nada.

Lennon não tem esse direito. Gretha não merece isso.

Nada do que dissermos fará com que ela veja a verdade ou


mude de ideia, Emy tem razão, procurar pela ajuda necessária é o
certo a se fazer, assim Gretha receberá o apoio certo e o tratamento
adequado.
Coloco a mão na boca no estômago, me sentindo muito triste e
abalada, me sentindo um lixo por não ter percebido os sinais de que
ele é um homem tóxico.

Talvez, no fim das contas, eu tenha sido tão cega e ingênua


quanto Gretha porque um dia realmente acreditei que Lennon era
um príncipe encantado. Era, o meu príncipe encantado.

Percorro o pequeno caminho até o carro de Emy, mas vejo


pela visão periférica o carro de Lennon estacionado no outro lado.
Fecho as mãos em punho, toda a raiva que eu estava sentindo
voltando com tudo.

Emy guarda o celular no bolso e me olha com o cenho


franzido.

– O que foi?

Ouço o ranger dos meus dentes, as imagens de Gretha me


atingem, assim como as risadinhas das pessoas da faculdade e o
deboche dos amigos idiotas.
– Eu vou quebrar o carro dele – aviso, atravessando o
estacionamento em passos duros.
– Ficou maluca? Nós vamos ser presas! – interpela Emy,
correndo atrás de mim.
– Eu serei presa de qualquer maneira, Emy, e tudo por culpa
dele, tudo porque ele é um babaca de marca maior. – Sorrio
sombriamente. – Além do mais, mostrarei para ele do que essa
vadia aqui, que ele e os amiguinhos gostam tanto de enaltecer, é
capaz.

Paro ao lado do JEEP, a única coisa no mundo que eu sei que


ele realmente gosta, além, claro, dele mesmo.

– Isso sim vai atingi-lo de verdade – sussurro, encarando o


carro.

Lennon tem uma fissuração por esse veículo, algo fora do


normal.
Tento a maçaneta e quando a porta se abre, encaro Emy com
um brilho vingativo nos olhos.

– Deus... o que você vai fazer? – objeta, abrindo a boca em


espanto.

Me inclino sobre o banco e vejo que a chave está na ignição.


Um sorriso mordaz se espalha pelo meu rosto, em meus olhos há
apenas a vingança fulgurante e fria.
– Vamos dar uma volta? – pergunto, subindo no banco do
motorista.

Lennon é arrogante o suficiente para deixar o carro aberto e


com a chave, ele acha que só porque é filho do xerife ninguém
ousaria furtar o carro. Bem... ele tem um pouco de razão, mas eu
sou um caso à parte.

Fecho a porta com força, Emy fica alguns segundos parada no


mesmo lugar, apavorada. Abaixo o vidro.
– Entra logo, daqui a pouco o idiota aparece – aviso, girando a
chave e ligando o motor – e serei obrigada a atropelá-lo.
Ela faz a volta e sobe no banco do carona, o rosto está branco
feito um papel, como se todo o sangue tivesse sido drenado da
região.

– Tem certeza de que vamos fazer isso? – retumba, em um


sussurro rouco.
Piso fundo no acelerador e dobro para entrar na rodovia,
nossos corpos dão um solavanco para o lado. Recebo algumas
buzinas e gritos de outros motoristas pela entrada brusca na rua
movimentada.

– Ele é um babaca, nada o afetará mais do que acabar com a


única coisa com a qual se importa. – Ligo o som e coloco em uma
rádio qualquer, aumentando o volume. – Isso é por Gretha, por mim
e por todas as mulheres com que Lennon já fez sofrer.

– Mas..., Maddie, quem vai se ferrar seremos nós.

Encaro-a com sinceridade.

– Minha liberdade chegou ao fim, Emy, tenho certeza absoluta,


inclusive, que neste momento o meu celular está abarrotado de
notificação dos meus pais – pisco a seta para à esquerda e entro
em uma estrada qualquer, nos colocando para fora da cidade, longe
do radar de câmeras e da polícia –, nada vai acontecer conosco,
acredite.
E é verdade, meu pai vai me matar por isso, mas ainda assim
vai fazer com que o xerife fique calado, ele jamais permitiria que um
escândalo dessa magnitude – furto de veículo – envolvesse o meu
nome. Ou seja, vou ficar de castigo de qualquer forma, fazer Lennon
arrancar os cabelos de desespero e sair ilesa.
– Você é insana – retruca, balançando a cabeça –, e eu sou
mais ainda por estar aqui concordando com isso.

Solto uma gargalhada.

– Só relaxa e aproveita a música, pensa no quanto apavorado


Lennon vai ficar, isso já serve para fazer com que se divirta, não?

Ela não responde, ainda absorvendo o fato de que estamos


cometendo um crime de verdade.

Muitas coisas aconteceram esta noite, eu só quero extravasar


toda a raiva e ódio que estou sentindo.

Quero ser eu mesma. Quero ser uma jovem impulsiva e livre.


Mesmo que seja a primeira e última vez.
 
Miles joga o telefone contra o banco traseiro do meu carro e
esfrega os cabelos. Ele está irritado e muito preocupado com a irmã.

Por um tempo, ficamos estacionados em frente à delegacia


enquanto eu tentava hackear o Wi-Fi para conseguir invadir o
computador do xerife e descobrir algum podre que o envolva, mas a
maldita rede tem uma proteção difícil de derrubar, então desistimos
e viemos até o Rollin’ Hops atrás das meninas que, em tese,
estariam nos esperando aqui.

Acontece que elas só não estavam, como ficamos sabendo de


toda a confusão que ocorreu. E eu juro que se elas não tivessem
quebrado o nariz do idiota, eu mesmo teria feito isso.

O carro de Emy está no estacionamento, o que torna tudo


ainda mais preocupante. No entanto, Lennon e os babacas dos
amigos estão no bar, o que significa que eles não estão com elas ou
as levaram para algum lugar.
E isso aumenta a estimativa de vida deles, porque se eles
estivessem com as mãos sujas em Madelyn, eu colocaria essa
cidade abaixo.

– Essa garota ainda vai me matar – murmura Miles, puxando


os cabelos com força –, todo mundo sempre disse que era muito
bom ter uma irmã, que as garotas são mais calmas – inclina a
cabeça e me encara –, agora me diz por que diabos minha irmã não
está dentro desses padrões?
Seria cômico se não fosse uma situação trágica.

– Eu posso localizar o telefone delas – aviso, tamborilando os


dedos na direção.

Estamos sentados dentro do meu carro no estacionamento


vazio do bar, esperando por algum sinal delas, qualquer resquício
de onde possam estar.

– Quanto tempo demoraria? – pergunta em um suspiro


preocupado.

Encolho os ombros.

– Depende de muitos fatores – revelo, controlado.

Eu quero matar Lennon e os amiguinhos e a única coisa que


me mantém nesse carro, no momento, é o sumiço delas e a
preocupação que está mais elevada do que a raiva.

– O que você acha que aconteceu? – indaga.

Antes que eu responda, os babacas surgem em nosso campo


de visão, bebendo, rindo e conversando. Eles atravessam o
estacionamento brincando entre si, alheios à nossa presença.
Lennon arrasta a perna que eu pisei, mancando.
Agarro a direção com força, me controlando para não descer e
socar a cara dele até que peça desculpas à Madelyn, lamentando
tudo que fez pra ela.

Eles param de caminhar abruptamente e a garrafa de cerveja


que Lennon mantinha em mãos cai no chão, espatifando-se em
vários pedaços.

– Cara, o que foi? – pergunta um dos amigos, apoiando a mão


no ombro dele.

– Meu Deus... porra... meu Deus... – murmura, apavorado e


muito, digo, muito desesperado.

– Lennon? – chama outro, aproximando-se.

Lennon coloca as mãos do lado da cabeça e começa a virar de


um lado para o outro, em crise, exaltado e aflito.

– Meu carro – grita, girando o corpo, olhando todo o


estacionamento, procurando algo em aflição –, meu carro – repete.

– Ficou maluco? Quanto de cocaína cheirou hoje? – pergunta


outro, franzindo o rosto.

Lennon cospe no chão aos pés do amigo.

– Deixa de ser um idiota! – Desfere um tapa na nuca do garoto.


– Roubaram o meu carro, porra!

Uma ideia absurda e nem um pouco fora do comum, se ilumina


na minha mente. Viro o rosto para Miles que observa a cena com
afinco.

– Eu acho que elas ficaram loucas – sussurro para que os


babacas não possam nos ouvir.

Miles me encara, os olhos arregalados, o rosto iluminando-se


em compreensão, a mente trabalhando na mesma linha de
raciocínio que a minha.
– Não... – Balança a cabeça, incrédulo.

– Sim... – confirmo, suprimindo um sorriso.


Madelyn e Emy possivelmente perderam a cabeça, mas, ainda
assim, é engraçado pra caralho ver o babaca desesperado e
sofrendo de verdade pela primeira vez na vida.
– Você deixou o carro aberto? – Um dos amigos grita.

Lennon retira o celular do bolso e digita nele, enquanto


responde:

– Claro que sim, quem seria maluco pra roubar o meu carro? –
retruca, ainda com a atenção no aparelho – Esse filho da puta não
sabe com quem se meteu – grunhi.

Sinto vontade de rir, mas me controlo, contendo-me e


engolindo a gargalhada por conta de toda a situação.
Maddie é mesmo louca e travessa, a garota que parece ser
ingênua e toda certinha, esconde por debaixo dessas camadas uma
personalidade invejável.

Meu peito se expande cheio de orgulho, mal consigo conter o


brilho em meus olhos ao pensar nela.

– Como nós vamos achar essas loucas? – sussurra Miles,


entredentes.
Duvido muito que elas estejam passeando com o carro do
babaca, Maddie não seria tão ingênua para isso, ela sabe que
ficaria bem à vista dos radares, tanto da polícia quanto das câmeras
e das pessoas.

– Tem alguma ideia de onde elas possam ter ido com o carro?
– interpelo, mantendo os meus olhos fixos no bando de panacas.
Miles se remexe no banco, inquieto.

– Não faço ideia, nem sabia que elas teriam coragem de fazer
uma coisa dessas para começo de conversa – estala a língua no
céu da boca, inconformado –, o que você acha que elas vão fazer
com o carro?

Essa é uma ótima pergunta, pois eu venho me questionando


justamente isso desde o momento em que liguei os pontos e conclui
que Madelyn é a autora do crime.

Já entendi que ela é meio insana, só não sei ainda qual é o


nível, assim, não tenho a resposta.
– Tratando-se delas, só Deus sabe – exprimo, balançando a
cabeça.

Lennon termina a ligação e caminha em direção ao bar com os


amigos. Aproveito o afastamento para ligar o carro e sair, entro na
rodovia sem dar sinal, pouco me importando para as leis de trânsito.

Ainda não sei bem o que eu vou fazer, nem aonde ir, só sei
que agora que o xerife sabe do furto, nós precisamos dar um jeito
de encontrá-las e abandonar o carro em algum lugar antes que elas
sejam pegas.

No fundo, sei que não acontecerá nada com Maddie, o xerife


jamais faria algo contra a filha do prefeito, mas ainda assim não é
um motivo para me deixar menos preocupado do que estou.

Percorro as ruas da cidade com a mente a quilômetros de


distância, sem me ater ao local exato. Miles está muito quieto ao
meu lado, os olhos aguçados em todas as direções, uma veia de
preocupação irrompendo na testa.

O telefone dele toca. Freio com brusquidão, forçando os


nossos corpos para frente e então para trás, batendo com força
contra o banco.
– Alô? – atende, clicando no botão do viva-voz.

– Miles... nós temos um problema... – murmura Emy.

– Não, vocês têm dois problemas – contesta ele, irritado.


Emy bufa.

– Só cale a boca e nos escute – retruca, e posso vê-la


revirando os olhos do outro lado da linha –, nós meio que
cometemos um crime e agora ouvimos na rádio que a polícia está
atrás da gente.

Miles solta um grunhido.

– Meio que cometemos? – grita, exasperado – Qual é a porra


do problema de vocês?

– O problema é o babaca do Lennon, mas, enfim, só nos deem


alguma dica do que podemos fazer para melhorar a situação.
O pescoço de Miles começa a ficar vermelho e duas veias
saltam de cada lado, assim como nas têmporas. Eu diria que ele
pode infartar a qualquer momento, mas me contenho em apenas
morder as bochechas para não rir.

– Vocês duas... – cicia com o maxilar cerrado.

– Onde vocês estão? – pergunto, me inclinando e me


intrometendo na ligação.
Miles me lança um olhar hostil.

– Estamos todos na mesma merda, se elas estão com


problemas, então nós também estamos – contesto, encolhendo os
ombros –, precisamos encontrar um jeito de resolver isso logo.
– Nós estamos na estrada que sai de Tuscaloosa,
estacionadas em uma entrada no acostamento – responde Emy,
ignorando o irmão –, é fácil de nos encontrar.
O rosto de Miles se deforma em uma carranca, ele deve estar
pensando a mesma coisa que eu: “quem diabos está tentando se
esconder da polícia, mas fica em um lugar de fácil acesso?”, enfim,
não podemos julgá-las, elas já devem estar nervosas o suficiente,
ainda mais agora que a adrenalina do que fizeram deve estar
passando.
– Tudo bem, estamos chegando – informo, pisando no
acelerador.

Extrapolo alguns sinais vermelhos e excedo o limite de


velocidade permitido. Miles se agarra na porta, silencioso e muito
preocupado.

Deixamos a cidade para trás, a estrada está escura e sem


movimento, deserta se não fosse pelo nosso carro. As árvores
parcamente iluminadas pelo céu noturno que cobrem os lados da
rodovia não passam de um borrão pela velocidade vertiginosa em
que percorremos.

Olho para os lados procurando algum acostamento,


removendo o pé do acelerador. Os faroletes do carro se chocam
contra algo e fazem um contraste luminoso. Empurro o carro para o
lado com brusquidão, saindo do asfalto e fazendo que os pneus
esmaguem a terra seca.

Paro ao lado do Jeep do idiota e desço, Miles pula para fora do


carro, mal esperando o veículo parar completamente. Maddie e Emy
fazem o mesmo.

– Só me digam que porra que passou na cabeça de vocês? –


cospe as palavras com raiva.
Emy cruza os braços e ergue o maxilar, desafiando o irmão.

– Não te chamamos aqui para um sermão, só queremos ajuda,


mas se estiver indisposto, pode dar a volta e se mandar – retruca,
sorrindo.
Encaro Madelyn, ela parece abatida, mas não arrependida. Os
olhos brilham no escuro, uma tristeza profunda e amargurada se
espalha pela face bonita.
– O que aconteceu? – pergunto, fitando o fundo dos seus
olhos.

Ela faz um movimento de dar de ombros e aperta os dedos uns


contra os outros, desviando o olhar para um ponto qualquer no
chão.
– Lennon agrediu Gretha – sussurra, me forçando a dar um
passo para frente para que eu consiga escutá-la –, então eu fiquei
com ódio da covardia e furtei o carro.
Miles faz um barulho com o fundo da garganta.

– Nossa, que ideia genial! – zomba, erguendo os braços,


exasperado.

– Eu não ficaria tão inconformado se fosse você – objeta Emy.

– E por que não? – contrapõe Miles.

Emy abre um sorriso traiçoeiro.

– Era isso ou atropelar o idiota, ou seja, seria muito mais difícil


de nos ajudar se tivéssemos escolhido a segunda opção.
Coloco as mãos nos bolsos, meus ombros tremem pela risada
que mantenho escondida e silenciosa.

Sempre quis saber como seria ter uma irmã mais nova e Emy
está suprindo todas as minhas perguntas. Ela é divertida e insana, o
que deixa Miles em desespero. E isso é muito bom de se assistir.

– Certo, deixamos isso para depois – Maddie interrompe a


briga dos irmãos –, o que nós podemos fazer?

– Devolver o carro? – pergunta Miles como se fosse o óbvio.


Madelyn bufa.

– E dizer o que para o xerife, cabeção? – replica Emy.

Considerando como as coisas funcionam nessa maldita


cidade, nada aconteceria comigo ou com Madelyn, não com ela
tendo o pai como comparsa de crimes do xerife e eu com uma mãe
que é amiga e colega de trabalho dele..., mas isso não inclui Miles e
Emy e seu pai que é proprietário do banco.
O xerife vai querer culpar alguém pelo transtorno e a merda vai
estourar no lado mais fraco.

– Vai com o meu carro de volta para o bar, assim Emy pode
pegar o carro dela – aviso, encarando Miles –, eu vou com Madelyn
para a cidade, vamos abandonar o veículo em um lugar qualquer.

Miles segura o meu olhar por um momento, o vinco no meio da


testa desfazendo-se ao analisar melhor a situação e chegar na
mesma conclusão que eu.

Emy coloca as mãos na cintura, furiosa.

– Não vou abandonar Maddie – afirma.

Miles caminha até a irmã e segura o pulso fino, puxando-a


para si.

– Não vai abandoná-la, é só uma troca de companhias, Aiden


vai assumir o seu lugar no crime.
– Parceiros de crime não se abandonam – revida.

Faço um sinal discreto para Madelyn, torcendo para que ela


compreenda e induza Emy a ir com o irmão.

– Ele tem razão, Emy – expressa Maddie, concordando –, vá


com Miles buscar o seu carro e deixa que Aiden e eu resolvemos
isso de agora em diante.
Emy nega.

– Já disse que não vou te abandonar.

Maddie suspira.
– Não é um abandono – aproxima-se e segura as mãos da
amiga –, sabemos como as coisas funcionam, assim como sabemos
que nada acontecerá comigo, então, por favor, vá com Miles.
Emy pondera por uns segundos, a constatação óbvia dos fatos
apontando em sua face, conforme vai dissolvendo a carranca.

– Tudo bem, mas mandem mensagem assim que


abandonarem o carro, vamos buscá-los – avisa, puxando Maddie
para um abraço.

Miles passa por mim, me lançando um último olhar, antes de


ocupar o volante e ligar o carro. Emy se junta a ele, e, mais rápido
do que um piscar de olhos, Miles engata a ré e entra de novo na
rodovia, sumindo.

A noite fica escura como breu sem os faroletes para iluminar, o


único som que nos recebe é o do vento contra os galhos das
árvores e o das corujas que sobrevoam nossas cabeças.

– E agora? – fala Maddie depois de um tempo.

– Vamos entrar – aponto com o queixo para o Jeep.

Madelyn faz a volta e se senta no banco do carona, me


deixando responsável pela direção. Bato a porta com força
exagerada, sentindo plena satisfação ao fazer isso depois de ter
visto o desespero do idiota.

– Por que você fez isso? – pergunto, fechando as mãos em


punho no volante.
– Ele mereceu – responde com sinceridade –, Lennon bateu
em Gretha e ela está grávida, ela não merecia isso. Além do mais,
faz com que os amigos sejam idiotas comigo e com que Gretha me
culpe pelas agressões. – Soca o painel, grunhindo.
– E por que o carro?

Ela se recosta contra o banco e revira os olhos, fazendo um


gesto de desdém com as mãos.
– Porque Lennon é apaixonado por ele, sempre foi muito
cuidadoso, nunca me deixou comer ou beber nada aqui dentro,
nunca nem mesmo quis transar para não sujar o carro, usando a
desculpa de que poderíamos ser vistos. Ele é um babaca de merda,
Aiden, ama ele acima de tudo e o carro abaixo dele. Nenhuma
agressão física ou verbal iria atingi-lo tanto quanto furtar o carro.

Solto uma risada irônica.

– Sexo oral não suja nada – zombo, balançando a cabeça.

Eu mal ganhei o meu carro de presente e já fodi Maddie dentro


dele, pouco me importando para a sujeira. Esse Lennon é um
playboyzinho idiota mesmo.
Madelyn solta uma risada alta.

– Sexo oral? – ri, zombeteiramente, titubeando – Nós nunca


fizemos isso, Lennon tem nojo de chupar uma mulher, então eu
também me negava a fazer nele.

Todo o ar parece ser sugado, rarefeito, o clima pesa, tornando-


se denso. Encaro Madelyn. Ela cessa a risada, me observando com
seriedade ao notar o olhar em meu rosto.

– O que foi? – murmura, engolindo em seco.

– Desce do carro – aviso, me inclinando para abrir a porta dela


e, posteriormente, fazendo o mesmo com a minha e pulando para
fora.

– Aiden... o quê? – pergunta, mas eu a ignoro.

Paro na frente do carro e a espero. Madelyn se aproxima em


passos limitados, nervosa e desconfiada. O vestido solto que está
vestindo flutua para cima por conta do vento forte que bate contra os
nossos corpos, os cabelos tremeluzem no ar.
Seguro a sua cintura e a coloco sentada no capô.

– O que você vai fazer? – pergunta, ao notar que levanto o seu


vestido.
Beijo os seus lábios e seguro os cabelos em punho.

– Eu vou te chupar, Madelyn, e vou te mostrar como um


homem de verdade deve tratar uma mulher. E vou fazer isso em
cima do carro do idiota com quem namorou e nunca soube te
valorizar.
Empurro-a pelo peito para que se deite, ela faz, estarrecida e
sem reação. Dobro os seus joelhos e posiciono os pés em cima do
capô. Me inclino sobre o corpo e arrasto beijos molhados pelas
coxas lisas, até chegar à calcinha preta de renda.

Com o indicador, coloco o tecido para o lado, exibindo a


bocetinha rosinha. Ela tem uma boceta bonita, sem pelos e toda
fechadinha e delicada. Arrasto o dedo pela fenda, abrindo-a. Maddie
solta um suspiro profundo e espalma as mãos no capô do carro,
tateando a superfície plana em busca de algo para que possa se
firmar.

Me inclino e respiro contra a pele, arrepiando-a.


– Aiden... – suspira, cerrando a mandíbula.

Beijo o dorso de uma coxa, então passo para outra, arrastando


os meus lábios para cima. O cheiro da sua intimidade me atinge, me
deixando faminto e desesperado para fodê-la com a língua.

– Esse será o melhor banquete da minha vida – sussurro,


sorrindo com malícia ao sentir os pelos das pernas arrepiados sobre
a ponta dos meus dedos.

Lambo a boceta, passando a língua em cada centímetro de


pele, a excitação pinica a minha língua e me faz soltar um urro de
prazer por estar finalmente sentindo o gosto dela. Sugo o clitóris
entre os lábios, puxando-o com força. Maddie se engasga, soltando
palavras desconexas.

– Aiden... por Deus... – ronrona, arqueando as costas.


Endureço a ponta da língua e esfrego o clitóris, misturando
movimentos circulares e vaivém. Madelyn agarra os meus cabelos e
finca as unhas no meu couro cabeludo.
Babo em sua boceta, molhando e chupando. Esfrego o meu
rosto, balançando-o de um lado para o outro, me deleitando.

Os gemidos de Maddie reverberam no ar, misturando-se com o


assobio baixo do vento. Ela abre bem as pernas, arregaçando-se
toda, implorando por mais.
Enfio um dedo no buraco apertado, deslizando-o para dentro e
para fora com facilidade.
– Aiden... por favor... – súplica, cuspindo, entredentes.

Junto outro dedo, arregaçando a bocetinha apertada, abrindo-a


para mim. Acelero os movimentos da minha mão, unindo ao ritmo
das chupadas e lambidas no clitóris. Curvo os dedos, acertando o
ponto G. Sinto a lubrificação de Madelyn aumentar, os gemidos se
tornam gritos.

Ela bate com as palmas das mãos no capô, tateando toda a


lataria envernizada.
Chupo, lambo, esfrego e estoco, tudo ao mesmo tempo,
aumentando a intensidade, aprofundando as coisas.
Os músculos dela se apertam ao redor dos meus dedos,
enforcando ainda mais a passagem apertada. A lubrificação escorre
pela minha mão, descendo pela palma e pulso.

– Goza, Maddie, goza na minha boca – induzo, enfiando os


meus dedos até o fundo e puxando-os de volta.
O clitóris incha na minha boca, sensível e distendido. Seguro o
pequeno volume entre os dentes, sugando-o. Madelyn se contorce e
eu preciso espalmar a mão livre sobre a barriga para mantê-la no
lugar.

– Aiden... Aiden... – implora.


Mordisco os lábios vaginais, fazendo-a se arrepiar, antes de
arrastar a língua em toda a extensão, limpando cada resquício de
lubrificação, trocando-a pela minha saliva.

Mordo um dos lábios externos da boceta com força, afundando


os dentes na carne macia até ela se romper e eu sentir o gosto de
cobre na ponta da língua, marcando-a como minha. O gosto de
sangue se mistura com o da sua excitação e faz com o meu pau
pulse em frenesi contra o jeans.
Sujo, grosseiro e indecente.
Maddie suspira, trêmula.

Volto para o clitóris, fodendo-o com a boca, chupando-o e


masturbando-o com a língua, bruto e com raiva.
Minha.

Ela balbucia o meu nome com âmago.


Sorrio contra a boceta, adorando vê-la implorar para ser fodida,
mas gosto mais ainda de vê-la se derreter. Quero sentir seu gosto
direto da fonte, engolir cada gota que seu corpo expele, sentir sua
excitação escorrer pela minha garganta.
Estalo a língua no clitóris, esfregando-o com movimentos
frenéticos de vaivém e meto os meus dedos curvados, acertando o
ponto G em cada estocada.

A passagem se torna limitada, sufocada, tornando o acesso


dos meus dedos mais difíceis, forço-os a deslizarem pela boceta
apertada, estocando-os até o fundo e removendo-os até a ponta
antes de repetir o mesmo movimento em uma velocidade
vertiginosa.
O barulho da sucção dos meus dedos entrando e saindo da
sua boceta entoa, unindo aos seus gemidos. Sinto a sua lubrificação
quente em minha pele, escorrendo pela palma, molhando toda a
mão.
Maddie solta um urro no momento em que goza, rebolando na
minha cara e lambuzando todo o meu rosto. Ela convulsiona em um
orgasmo potente, esguichando jatos nos meus antebraços, sujando
o capô e um pouco das minhas roupas.
O vento uiva, soprando os meus cabelos, mas nem ele é capaz
de gelar o meu corpo que pega fogo no momento. Meu pau está
esmagado contra a minha calça, implorando, suplicando para se
enterrar nela, mas eu o ignoro. Esse momento não é meu, é de
Madelyn e sua pouca experiência em ser muito bem chupada.

Me levanto, sorrindo.
Madelyn está com os olhos fechados, suor escorre pelas
têmporas e pescoço, as bochechas possuem um tom bonito e os
cabelos estão bagunçados. Ela está linda e relaxada com a
aparência de alguém que acabou de gozar.
– Você me sujou todo, princesinha – murmuro, removendo o
meu casaco e esfregando os meus braços.
Maddie abre os olhos nebulosos, o rosto muda de cor,
envergonhada.

– Eu... é... sinto muito – sussurra, a voz rouca pelos gritos –,


não sei bem como tudo isso aconteceu – revela, correndo os olhos
pelos meus braços.

Amplio o meu sorriso, a sensação fervorosa de triunfo e honra


se esgueirando pelas minhas veias.

– Isso se chama ejaculação feminina, também conhecido como


squirting – comento, terminando de me limpar e esfregando o
casaco na boceta lambuzada, antes de colocar a calcinha de volta
no lugar. Ela estremece, dolorida. – Poucas mulheres chegam ao
ápice, ainda é um tabu entre a maioria.
– Isso foi... intenso – sibila, soltando o ar com calma.

Arqueio uma sobrancelha, um sorriso zombeteiro curvando os


meus lábios.
– Intenso? – Passo a língua nos dentes, ofendido. – Pensei
que diria incrível, perfeito, inesquecível, memorável...
Madelyn apenas ri.

– Ok, senhor arrogante, foi incrível, mas memorável... –


retruca, me lançando um olhar semicerrado que brilha em ironia.
Abro a boca, estupefato.

– Sua malcriada... – replico com sagacidade –, nunca pensei


que faria tão pouco de um feito tão importante e histórico.

As roupas de Maddie farfalham contra a lataria enquanto ela


mexe os ombros, rindo em silêncio da ofensa proferida contra a
honra da minha masculinidade.
– Você é insano! – redargue – E me mordeu– ri, descrente.

Encolho os ombros.

– Essa boceta é minha e precisava ser marcada por mim –


replico.

Madelyn franze as sobrancelhas, um brilho de satisfação pisca


em seus olhos, mas ainda assim ela não dá o braço a torcer.
– Totalmente insano – retruca, rindo.

Acabo caindo no riso com ela, admirando a beleza estonteante


de Madelyn, deitada contra o capô amarelo, os cabelos
esparramados pela lataria, um enorme sorriso no rosto.

Perfeita.
Jogo o casaco no carro e puxo-a pela mão. Maddie está
trêmula, o corpo bambo, fraco, recompondo-se da onda de prazer.
Beijo a testa suada, antes de me afastar.

– Você é incrível, princesinha, e merece o mundo – falo,


segurando a cabeça por entre as mãos, esfregando os cabelos
sedosos –, nunca se submeta a menos que isso, seria injusto com
você, injusto que alguém tão maravilhosa não ter um homem aos
seus pés.
Maddie faz um barulho com a garganta, os olhos brilham.
– Obrigada, Aiden, por ser tão incrível quanto diz que eu sou.

Sinto uma fincada no fundo do peito, uma fisgada de culpa e


emoção.
O fardo do peso que eu carrego, da mentira e dos planos,
nunca me pareceu tão pesado, tão difícil de carregar.
Quando vim para a cidade com o intuito de me vingar, prometi
a mim mesmo que não deixaria nada e nem ninguém me atrapalhar,
mas a vida é uma filha da puta que não segue o rumo dos nossos
planos.
Eu entrei no caminho de Maddie como um furacão, só não
poderia imaginar que ela adora tempestade e ama tomar banho de
chuva. E que eu me apaixonaria por isso.

Porra, estou na merda!


Miles tem razão, as coisas perderam o controle, tudo saiu de
rumo, entrou em colapso.
Comprimo os lábios, meu coração acelera, minha respiração
se torna densa, como se o ar ao nosso redor tivesse sido sugado.
Em pânico. E, literalmente, fodido.

Estradas distintas. Uma única escolha. Um rumo a ser seguido.


– Aiden... – ouço a voz de Maddie ecoar através do torpor em
que me encontro. Pisco, saindo do transe, afastando os
pensamentos, me livrando da culpa e do carma. Encaro Maddie, a
testa franzida. Ela segura o meu braço com força, as unhas fincadas
na minha pele. – Aiden, está ouvindo? – insiste, e só então percebo
que ela parece apavorada, os olhos esbugalhados, a cor bonita que
mantinha no rosto esvaiu-se.

Aguço a minha audição, prestando atenção com mais afinco ao


nosso redor. Só então percebo o leve barulho de motor, seguido por
uma sirene e luzes que refletem pelas folhas há poucos metros de
distância.

– Você precisa se esconder – aviso, retirando-a de cima do


carro com rapidez, o vestido balança –, vá para algum lugar e
chame Emy e Miles para buscá-la.
Embora eu saiba que é bem provável que nada acontecerá a
ela, Maddie tem um status a zelar e parece gostar de preservá-lo,
afinal de contas, ela é a princesinha intocável da cidade.

Ela balança a cabeça, um esgar nos lábios.

– Eu não vou a lugar nenhum, eu que peguei esse maldito


carro, é injusto que leve a culpa por mim – refuta, retesando-se e se
desfazendo do aperto das minhas mãos.
Que garota teimosa do caralho!

– Madelyn, minha mãe é a promotora, o xerife não vai me


prender – levanto um ombro –, não de fato, ao menos.

– E meu pai é o prefeito, nada vai acontecer comigo também.

– Eu só estou tentando proteger você – contraponho,


grunhindo pela mandíbula cerrada.

Ela franze o nariz, irritada e muito fofa.


– E quem disse que eu preciso de proteção? – Arqueia uma
sobrancelha, cruzando os braços em frente ao corpo. – Já estou
farta de tudo isso, não quero ser protegida. Vou ficar aqui e relatar a
minha culpa.

Bufo e esfrego os cabelos com a mão, puxando-os para trás e,


posteriormente, para a frente.
Madelyn não move um único músculo, nem mesmo parece
meramente preocupada ou decidida a dar o fora daqui e deixar que
eu leve a culpa, pelo contrário, ela parece determinada a ser pega
comigo.
– Maddie... – imploro, sussurrando o seu nome.

Ela faz um gesto negativo.


– Não me interessa o que tem a falar, não vou deixar que faça
isso sozinho – insiste, elevando o maxilar, determinação cintilando
em seu tom de voz.

Suspiro, inconformado com a decisão, mas ao mesmo tempo


orgulhoso com a determinação e afoiteza dela.

Minha garota.

As luzes se aproximam, iluminando o chão acimentado da


rodovia com os faróis. O barulho estridente das sirenes fica mais
alto, tornando-se chato, fazendo os ouvidos coçar.

– Vem, vamos aguardar a nossa prisão – brinco.


Puxo Madelyn para mim, firmando-a, mas percebo que ela não
consegue ficar nem dois segundos sozinha sem o meu amparo.
Lanço-lhe um olhar inquisitivo.

– Meu corpo ainda está se acostumando, voltando para a terra


depois do orgasmo – declara, revirando os olhos.

O carro do xerife faz uma curva arriscada, içando o carro para


o lado com força, os pneus faíscam no chão, lançando pedaços de
cascalho para todos os lados. Ele para o veículo a centímetros de
nós.
– O que vocês pensam que estão fazendo? – pergunta,
pulando para fora e nos encarando com raiva, as mãos descansam
na cintura.

Madelyn e eu não respondemos.


 
Eu poderia ter aceitado a proposta de Aiden e ter me
escondido, mas não faria sentido nenhum, não depois da briga no
bar.

Estamos sentados no banco traseiro da viatura do xerife, em


completo silêncio, enquanto o carro voa pelas ruas da cidade em
direção à delegacia.

Meu ex-sogro está possesso de raiva, noto pela contração das


veias que vão do pulso aos cotovelos e pela coloração que sobe no
pescoço em direção às bochechas. Diria que os níveis de raiva dele,
nesse momento, são estratosféricos.

– Seu pai vai ficar decepcionado, Madelyn, nunca esperamos


isso de você – esbraveja, lançando um olhar em direção à Aiden
pelo espelho retrovisor.
Aiden está ao meu lado, a mão entrelaçada à minha, os
ombros erguidos e o maxilar inclinado, um meio-sorriso zombeteiro
no rosto enquanto devolve o olhar do xerife com depreciação.
Nós contamos parte da verdade para ele na beira da estrada,
no entanto, o xerife é um homem astuto e muito inteligente, ele
percebeu imediatamente o que Aiden e eu estivemos fazendo ao
notar o estado deplorável que eu me encontrava. E de nada ajudou
o fato de que as minhas pernas estavam bambas, mal suportando o
peso do meu corpo sozinhas.

Aiden e eu declaramos que pegamos o carro de Lennon para


dar um susto nele depois que foi um babaca comigo no Rollin’ Hops.
Não foi uma mentira, afinal de contas, Lennon vem mesmo sendo
um babaca por completo.
Eu só não queria que a minha atitude impensada recaísse
sobre os ombros de Aiden, não que ele pareça preocupado.

– Vocês jovens delinquentes... – cospe, arrastando os olhos


para as ruas, balançando a cabeça, repreensivo.

Viro a tela do meu celular para cima e arrasto as notificações


com a ponta do dedo, visualizando-as. Há inúmeras ligações do
meu pai, da minha mãe e da assessora dele. Assim como
mensagens com ameaças explícitas à minha liberdade.

Como se eu me importasse, já sei que não são mais ameaças,


são promessas. Penso, me contendo para não revirar os olhos.

O carro estaciona em frente à delegacia e consigo ver a


comitiva do meu pai ocupando as últimas vagas do estacionamento.
O xerife desce e abre a porta para nós, segurando-a para trás.

– Desçam, vocês têm muitas coisas para resolver – comenta,


exasperando.
Deixo o carro com Aiden colado em mim, ele não solta a minha
mão por nem um momento, um conforto, um toque acolhedor de
que está ao meu lado, que não estou sozinha.

O xerife se inclina, aproximando-se de mim.

– Não vou contar para o seu pai a situação em que eu te


encontrei em respeito a memória que tenho de você, Maddie, mas
saiba que estou imensamente desapontado – sussurra.

O músculo da minha mandíbula range e eu preciso me


controlar para não gritar e extrapolar toda a raiva que eu sinto,
colocando-a para fora. O filho dele é um babaca, machista, traidor,
manipulador e agressor de mulheres, mas o desapontamento é
comigo porque eu estava transando com Aiden e não por que eu
furtei um veículo?

Cidade de merda. Pessoas de merda.


A porta do sedan preto do meu pai é aberta e ele surge, os
olhos estão vermelhos, faiscando de ódio. O terno que normalmente
é impecável está bagunçado e com a camisa amassada.

– Você! – Ele aponta o dedo para mim, cuspindo e destilando


ódio por cada poro. – Vem comigo agora! – Puxa o meu braço com
força, desfazendo o enlace da minha mão com a de Aiden.
Não falo nada, apenas mantenho o meu silêncio com a cabeça
erguida.

O prefeito se vira para o xerife.

– Obrigado por encontrá-la, não esquecerei o favor que está


fazendo por nós – diz, apertando tanto o meu braço que eu sinto a
lesão se formar.

O xerife acena com a cabeça.


– Não se preocupe, ninguém ficará sabendo do ocorrido e
nada disso contará na ficha criminal dela – avisa, olhando para
Aiden –, de nenhum dos dois – acrescenta.
Meu pai lança um olhar acusatório para o garoto atrás de mim,
não consigo ver Aiden, mas pela rigidez dos músculos do prefeito,
Aiden está sendo tão debochado com ele quanto foi com o xerife.

– Vamos para casa – impõe, me puxando em direção ao carro.


Dou uma última olhada em Aiden ao ocupar o banco traseiro
do sedan. Ele não olha para mim, os olhos estão fixos no meu pai e
há tanta raiva incontida que transfigura o rosto bonito.
Aiden detesta o meu pai. Constato.

Só posso desejar a ele boas-vindas ao time, porque eu


também não nutro um afeto positivo pelo homem que me deu a vida.

O carro se movimenta e a última coisa que eu vejo antes dele


virar a esquina é o xerife empurrando Aiden para dentro da
delegacia.

O barulho oco da porta da frente sendo batida com força bruta


me faz estremecer e me encolher levemente, mas consigo me
conter, sem deixar transparecer o meu desconforto.

– Maddie, o que você fez? – mamãe desce as escadas


correndo, descabelada, descalça e com o rosto vermelho e inchado
de tanto chorar. – Céus, menina tola – murmura, me puxando para
um abraço.
Não me abalo, apenas mantenho a máscara impassível, os
sentimentos guardados o mais fundo que consigo.
Agora eu permaneço forte, depois eu choro sozinha no quarto.

Ouço o tilintar do copo de whisky, então as passadas pesadas


dele e a presença constante às minhas costas.

Nunca cheguei ao ápice de irritá-lo tanto, não desde a festa


clandestina, e ainda assim, na época, ele não pareceu tão
consternado quanto parece estar hoje.

– Madelyn, já é adulta e esperta o suficiente para compreender


o que vai acontecer a partir de agora, não é mesmo? – sibila com
uma voz estranhamente calma que me causa arrepios.

Me desfaço do abraço de mamãe e giro nos calcanhares com


lentidão, encarando-o.

– Eu vou ficar presa pelo resto da vida para que assim possa
manter as boas aparências de uma família perfeita para os
eleitores? – retruco, sorrindo zombeteiramente.

Ele semicerra os olhos, o copo de whisky gira em uma mão.


– Pode ser uma garota tola, mas ao menos é esperta – mostra
os dentes em um sorriso acometido –, puxou isso da minha família,
preciso revelar. – Leva o copo com o líquido âmbar aos lábios e
sorve um longo gole.

Talvez, se não fosse o peso do cargo político, tivéssemos sido


uma boa família com uma relação bonita entre pai e filha, com
amizade verdadeira e companheirismo. Mas as coisas não
funcionam assim e nunca funcionaram. E por causa disso, hoje
somos desconhecidos vivendo sob o mesmo teto, pai e filha com
convergências gigantes que impedem uma aproximação.

Eu não sinto mais arrependimento por isso, já sofri demais e


aprendi a conviver com a situação. Hoje eu só sei sentir pena de
nós e do que nos tornamos, nada além.

– Sabe que não pode me controlar? – respondo, franzindo os


lábios em um esgar.

Ele encolhe os ombros.

– Controlar, não, mas posso mantê-la sob rédeas firmes e


curtas, assim como ocorrerá a partir de hoje. – Se inclina para falar
mais perto, o cheiro de álcool me atinge. – Sem saídas com Emy,
sem festinhas e sem encontros com ninguém.

Fico em silêncio, absorvendo o teor das palavras, digerindo os


fatos.
Não é nada que eu já não estivesse esperando, mas ouvi-lo
falar tão abertamente e de forma sincera e direta, torna tudo ainda
mais doloroso, mais verdadeiro. Nada do que eu fizer ou disser vai
fazê-lo mudar de ideia. Ele quer me castigar, me fazer pagar por tê-
lo ignorado, por ter batido de frente com as ordens que regem nossa
família. Quer me mostrar que se eu tivesse seguido os conselhos,
eu estaria bem, estaria livre.

Não vou implorar, tão pouco me mostrar abalada com a


decisão.

Inspiro fundo, engolindo toda a raiva, mágoa, desgosto e


tristeza. Ergo o maxilar beligerantemente e fixo os seus olhos.
– Tudo bem – falo, agradecendo aos céus pelo meu tom de
voz sair firme.

Ele sorri, pendendo a cabeça para o lado, um vinco profundo


no centro da testa.
– Gosto da sua força, minha filha, mas não deve medi-la
comigo.
– Tom... – interrompe mamãe, aproximando-se um passo.
Ele ergue uma mão, ordenando que ela fique onde está e não
se meta mais na conversa. E assim ela o faz, acatando as ordens
do marido.
Se eu pudesse gritar com todos, eu faria com o maior prazer.
Odeio o fato da minha mãe não ter voz perto dele, de ceder todas as
vezes que ele ordena. Detesto o jeito com o qual ele nos trata, como
se não passássemos de peças em seu jogo.

Mas, nem sempre as coisas foram assim, no passado, muito


antes da política, ele não era um pai ao todo ruim, era distante, mas
nem meramente parecido como hoje. Não sei o que fez com que
mudasse tanto, se foi a necessidade de se moldar para a vida que
leva agora ou o acúmulo de coisas que presenciou com o passar do
tempo.

– E para que não se sinta tão decepcionada comigo, tenho


outra opção para lhe oferecer, além do castigo – conclui, me
encarando com afinco.

Meu coração acelera, bombeando sangue pelo meu corpo com


força total. Sinto as gotículas de suor se empapando nas palmas
das minhas mãos.

– Qual? – pergunto, pigarreando para desobstruir a garganta


seca.

Não parece bom, nada bom. Ele não ofereceria tal acordo se
não fosse benéfico para ele ou para a política.
– Eu retiro o castigo se você aceitar reatar o relacionamento
com Lennon – avisa, afastando-se para pegar mais whisky –, não
me interessa quais foram as causas do término, só sei que o garoto
está arrependido e sofrendo, ele gosta mesmo de você. Além do
mais, nunca se meteu em problemas ou em escândalos enquanto
estiveram juntos.
Não consigo conter o bufo que separa os meus lábios, a
indignação que transforma o meu rosto em uma carranca.

– Eu não vou voltar com ele – contesto, firmemente.

– Hum... uma lástima, mas já que prefere ficar presa...

Dou um passo à frente, irritada e incontida.

– Ele me traiu com outra garota durante todo o nosso


relacionamento, e não sendo suficiente, ainda a engravidou e
escondeu não só de mim como de todos que teria um filho com a
amante – revelo, entredentes.

Mamãe solta um suspiro entrecortado e leva as mãos à boca,


os olhos chorosos se arregalam de horror. O prefeito me encara por
longos segundos, sério e impassível, pensativo.

– Eu não vou voltar com Lennon, mesmo que isso signifique


ficar de castigo pelo resto da minha vida – exprimo, finalizando essa
opção absurda.

Abraço o meu corpo tentando disfarçar o tremor em minhas


mãos. O dia foi uma merda e essa conversa está sendo pior ainda,
me sinto esgotada.

– Se essa é a sua decisão, está dispensada, nossa conversa


acabou.

Solto uma risada ríspida.

– Mesmo depois de tudo o que eu falei, Lennon ainda é uma


opção?

Ele balança a cabeça.

– As pessoas se arrependem, Maddie, precisa aprender a


perdoar e ser menos rancorosa. Quando estava com Lennon, era
uma boa menina.
Não quero ouvir mais nada do que ele tem a falar, quero
esquecer que o meu próprio pai está fazendo isso comigo.

– Um dia eu vou embora dessa cidade para nunca mais voltar,


então foda-se você e seus joguinhos morais – cuspo, girando nos
calcanhares e indo em direção as escadas.

– Maddie... – ouço o soluço de mamãe. Ignoro-a.

Subo os degraus de dois em dois, diminuindo a distância até o


meu quarto com rapidez. Bato a porta com força e tranco.

– Malditos! – grito, sentindo as primeiras lágrimas escorrendo


nas minhas bochechas.
Dane-se que Lennon seja um traidor.

Dane-se que Lennon tenha sido um idiota tóxico.

Ele era bom pelo simples fato de me manter na linha e por isso
recebeu o perdão do meu pai.

Ardiloso! Grita a minha mente, berrando e fazendo retumbar


todo o ódio que sinto.

“As pessoas se arrependem, Maddie, precisa aprender a


perdoar e ser menos rancorosa.”
Me escoro contra a madeira fina, agarro os cabelos e deslizo
até o chão. O que era um mero choramingo, se transforma em um
choro profundo e doloroso. As lágrimas se transformam em poças.

E eu perco a noção do tempo, enquanto observo o mundo


com os olhos embaçados, deitada no chão gelado, sozinha,
confusa, magoada e perdida.
 
O xerife me empurra para dentro da delegacia vazia. As
paredes de cor terrosa estão descascadas e desbotadas.

Passamos pela entrada onde há um balcão amadeirado que


parece já ter visto dias melhores. Sherwood me conduz até a sala
de trás, onde tem uma mesa com um computador e um telefone
antigo, um quadro com vários pôsteres de homens desaparecidos
pregados, uma máquina de café, uma geladeira e uma cela no canto
direito.

Eu diria que essa é a sala particular dele, considerando que


para que acessássemos a sala, Sherwood precisou retirar um molho
de chaves do bolso do uniforme e destrancar a porta.

– Precisa pedir mais verba para a prefeitura – zombo, olhando


ao redor.
A sala é precária, assim como quase toda a delegacia. O
prédio evidentemente precisa de uma boa reforma e repaginada, já
está antigo e atirado. Além do mais, o cheiro do mofo que exala das
paredes velhas é repugnante.
– A delegacia não precisa de uma reforma, as coisas estão
bem como estão – retruca, jogando as chaves em cima da mesa e
removendo a arma do bolso.

Não sei por qual motivo ele não se importa em trabalhar em um


ambiente como este, mas descobrirei isso logo.
– Vá para a cela – instrui, apontando para o pequeno quadrado
fechado por grades de aço –, vou ligar para a sua mãe.

Ignorando-o, caminho até o local e me sento na borda da cama


que fica ao fundo. As molas velhas rangem sob o meu peso.

O xerife fecha a porta, me prendendo na cela. Ele parece um


pouco contente de fazer isso, posso notar pelo brilho nos olhos e a
contração nos lábios.

– Vocês garotos idiotas... – comenta, balançando a cabeça –


tantas mulheres por aí e vão brigar justamente por Madelyn.

Trinco o maxilar e fecho as mãos em punho.

– Não fale de Maddie – ameaço.

Ele ri e cruza os braços em frente ao corpo.

– Eu realmente não consigo entender, Madelyn é bonitinha,


mas precisa de tudo isso pra ficar com a garota?
Não respondo, mantenho a mandíbula cerrada, os dentes
trincados ao ponto de estalar.

– Sabe, Maddie e Lennon namoraram por muitos anos,


entende que não tem chance contra isso? – pergunta, em tom
irônico.

Solto uma gargalhada.

– Madelyn odeia Lennon – falo, sorrindo.

– É no ódio que se descobre o amor – refuta.

Me levanto em um pulo e caminho até as grades, ficando a


centímetros de distância dele. Quando eu era garoto, a altura do
xerife me abismava, mas hoje não o vejo além de um crápula
corrupto.
– É mesmo? E será que Maddie vai gostar de ter a amante e o
filho dele sempre por perto?

A cor do rosto do xerife muda, o branco cedendo lugar ao rosa.


Ele perde a postura inabalável, o rosto franze em confusão.
– Do que você está falando? – Fecha as mãos em punho ao
redor das grades, aproximando-se o máximo que pode.

Lennon é um imbecil, mas não um tolo. Ele sabe que o prefeito


é muito importante, por isso escondeu até mesmo do pai dele as
traições.

Que pena que eu serei o responsável pela notícia da


infidelidade e tolice do idiota.

– Lennon traiu Madelyn com uma das garçonetes do Rollin’


Hops, a menina engravidou, Maddie descobriu tudo e... – Faço um
gesto de desdém com a mão –, você já sabe, ela o odeia com todas
as forças.

Sherwood dá um passo para trás, abalado, como se tivesse


sido atingido por uma bomba pela expressão de raiva e cólera no
rosto.

– Sutherland sabe? – pergunta em um sussurro baixo e rouco.


Estalo a língua no céu da boca e esfrego os cabelos.
– Bom... não sei se Maddie preferiu manter a honra de Lennon
intacta..., mas acredito que depois de tudo o que ele fez pra ela nos
últimos dias... – murmuro, ponderando de um jeito debochado.

Ele engole em seco, a garganta tão obstruída em terror e raiva


que a deglutição é audível.
– Eu vou matá-lo – avisa, girando nos calcanhares e indo até a
sua mesa.

Meu sorriso se amplia, adoraria ver o teor da conversa que ele


vai ter com o filho. Espero que eles façam isso por ligação ou
mensagem, assim nada me impedirá de ler e rir da cara do babaca.

Retiro o celular do bolso e olho as notificações.

Em breve minha mãe estará aqui para me liberar, o que


significa que não tenho tanto tempo para fazer o que preciso.
– Tem Wi-Fi aqui? – pergunto, balançando o celular no ar.

Sherwood arrasta os olhos em minha direção, ele ainda parece


furioso pelo que descobriu, é visível pelas veias que saltam ao lado
do pescoço longo.

– Sim.

– Pode me passar a senha? Estou sem internet e quero


contatar minha mãe – minto, mantendo o seu olhar.
Ele pondera por um momento, então bufa, desistindo, e cospe
as letras que compõe a senha da rede de internet. Me sento de volta
na ponta da cama dura, envio uma mensagem rápida para Grace e,
em seguida, não perco mais tempo, começo a trabalhar no que vim
fazer aqui.
Sherwood não sabe, mas a primeira pior coisa que fez foi ter
me prendido. E a segunda, foi ter me passado a senha do Wi-Fi.

Meus dedos se movem sobre a tela do celular em uma


velocidade vertiginosa. Sherwood está concentrado demais em seu
próprio telefone para me importunar, parece que está tendo uma
discussão acirrada com o filho babaca.

Entro no recurso Sniffer[9] e procuro todos os endereços IP na


sub-rede local, aguardando enquanto o software faz o seu trabalho.
Por sorte, nesse lixo de delegacia, aparece um único IP cadastrado
e uma máquina impressora, o que facilita ainda mais a minha vida.
Utilizo o Prompt [10] e aciono os comandos e vejo que ele está
logado na rede. Insiro o restante dos comandos e tento invadir a
área de trabalho.
Prendo a respiração enquanto carrega, rezando para que dê
certo e, se não der, para que Grace não chegue antes de eu concluir
a tarefa.
Uma mensagem surge na tela.

“O comando foi concluído com sucesso.”


Solto o ar pelo nariz no exato momento em que a porta da
delegacia é aberta em um estouro.
Grace surge em meu campo de visão, os saltos altos ecoando
no piso, a bolsa apoiada no ombro direito, os cabelos presos em um
coque impecável. Ela me lança um olhar furioso, os lábios franzidos
para baixo.
– O que aconteceu? – pergunta, apontando com o queixo para
o xerife.
O homem joga o celular em cima da mesa e escora o maxilar
no punho fechado.

– Ele e a filha do prefeito se envolveram em problemas –


revela, a voz arrastada pela exaustão.
O ódio que nutriu pelo filho nos últimos minutos se dissolveu
em cansaço e desgosto.

Grace solta uma respiração ruidosa e gesticula com as mãos.


– Seja mais específico, Sherwood – ordena, assumindo o
papel de promotora de justiça.

Sherwood comprime os lábios.

– Eles furtaram o carro do meu filho – diz, revirando os olhos –,


peguei os dois em uma situação um pouco... comprometedora.

Mentiroso do caralho! Maddie só estava um pouco ofegante e


bagunçada, mas isso não é nem de perto uma situação
comprometedora.

Grace me lança um olhar mortal.

– Não acredito que tudo isso é por causa de uma briguinha


idiota de dois marmanjos por uma garota – bufa, franzindo o
pequeno nariz arrebitado.
– Pois acredite, parece que Lennon e Aiden estão disputando o
coração da pequena Madelyn – debocha o xerife.

Só absorvo cada palavra depravada que deixa a sua boca,


cada frase zombeteira, cada insinuação irônica e machista sobre
Maddie. E então, quando eu acabar com a vida dele, vou me
lembrar de todas elas e vou rir muito, sentindo o doce gosto da
vitória na ponta da língua.
Grace segura a bolsa com firmeza, os vincos da mão
embranquecendo.

– Solte-o – ordena, apontando em minha direção.

– Nada de relatório, nenhuma ficha criminal – avisa o xerife,


levantando-se da cadeira giratória e vindo até mim.

– Não esperava menos de você, Sherwood – replica a


promotora.

O xerife escolhe uma das chaves do molho que carrega


consigo e destranca a porta da cela, puxando-a para trás, liberando
a minha saída.

– Espero que tenha aprendido a lição, que você e Lennon


coloquem a cabeça no lugar e parem de me arrumar problemas por
causa de uma garota.
Não respondo, apenas passo ao seu lado com um ar altruísta,
sorrindo e zombando. Espero que ele e o imbecil do filho queimem
no inferno e parem de atormentar Maddie, mas como sei que isso
não vai acontecer, serei o responsável de incendiá-los até que
estejam fora do meu caminho.

– Vamos para casa – diz Grace, assim que eu passo ao seu


lado –, obrigado, Sherwood, tentarei mantê-lo longe de problemas.

Ouço um barulho vindo do xerife, algo como um gorgolejar.


– Esses garotos não vão nos deixar em paz, Grace, eu já
desisti da ideia, ainda mais quando estão apaixonados – suspira –,
jovens tendem a ser idiotas quando se trata de uma mulher.
Não fico para ouvir a conversa deles, pouco me importa o
sermão ou as acusações. Sherwood é mais sujo do que pau de
galinheiro, ele não tem moral alguma para falar tanto de mim,
quanto de qualquer outra pessoa.

Empurro as portas que dão acesso à rua com um chute,


irritado. O vento sopra os meus cabelos, me fazendo estremecer
levemente. Encaro o ponto onde vi Maddie pela última vez e um
desejo absurdo de descobrir como ela está me atinge. Retiro o
celular do bolso e envio uma mensagem para Miles, informando que
passarei para pegar o meu carro mais tarde na casa dele, antes
disso preciso confirmar se Madelyn se está bem.

Eu odeio àquele maldito Sutherland com todas as minhas


forças e embora ele seja o pai de Maddie, não confio nele nem
mesmo com a filha. Um homem que é solúvel a encomendar a
morte de outro, pode-se esperar qualquer coisa.
Ouço o barulho das portas atrás de mim e em seguida os
saltos de Grace ecoam no vazio absoluto do estacionamento.

– Por favor, me diga que isso não será um problema recorrente


– murmura.

Giro nos calcanhares ficando de frente para ela que me


observa com os olhos cheios de preocupação materna, as mãos nos
bolsos e um esgar nos lábios tingidos.

– Não será – afirmo com um balançar de cabeça.

Tão logo eu me livrar do xerife, farei o mesmo com o imbecil do


filho, portanto, nada com que Grace precise se preocupar.

Ela suspira e dá um passo à frente.

– Tudo isso por causa da garota? – pergunta, erguendo


levemente o maxilar – Por causa da filha de Sutherland?

Rolo os ombros para cima.

– Lennon é um babaca.
Ela me observa, os olhos correndo em direção a todos os
cantos da minha face, analisando cada reação fugaz que expresso.

– Você gosta mesmo da garota – diz, em tom de pergunta,


embora seja retórica.

É bom, assim me abstenho de responder algo que não tenho


interesse nenhum de proferir em voz alta.

Não rotulo o que Madelyn e eu temos, porque nem nós


mesmos sabemos o que é. Sei que é importante e profundo, mas
ainda não consigo discernir qual o grau. E ainda me culpo pelos
sentimentos.
Grace retira as chaves do carro de dentro da bolsa e se
encaminha em direção ao veículo estacionado no acostamento.

– Vamos para casa, Aiden, chega de problemas por hoje.

Eu não a sigo, girando e indo em direção contrária. Ouço o


estalo dos seus saltos parar e sei que ela me encara, sinto o peso
do seu olhar em minha nuca.

– Aiden... aonde você vai?

– Eu volto para casa, não se preocupe – aviso, afastando-me


cada vez mais.

Ela veio me socorrer assim que eu enviei uma mensagem, e


talvez eu esteja sendo um filho da mãe indo em direção contrária e
nem mesmo agradecendo a ajuda, mas, neste momento, o mais
importante de tudo é ir ver como está a minha garota, o resto fica
para depois e o mundo que se exploda.
Deitada de costas na cama e com as mãos na barriga, encaro
o teto do meu quarto enquanto as lágrimas escorrem pelos cantos
dos olhos.
Enviei uma mensagem para Emy há poucos minutos e informei
sobre tudo o que aconteceu e que já estou em casa, trancafiada na
minha torre.

Mas como uma bela de uma covarde, não tive coragem de


fazer o mesmo com Aiden. Não consigo nem perguntar como ele
está ou se já saiu daquela delegacia nojenta.

Não fiz porque se eu o fizer, preciso terminar o que temos, dar


um basta em tudo. E eu não me sinto pronta pra isso.

A ardência no meio das minhas pernas, as lembranças do que


fizemos esta noite, serve como uma recordação do quão incrível
Aiden é e de como eu sentirei falta dele.
De todas as coisas absurdas que o meu pai já me fez fazer por
política, me tirar a liberdade justamente agora que estou feliz e bem
com Aiden e com meus amigos, com certeza absoluta será a mais
dolorosa delas.

Um suspiro pesaroso se desprende dos meus lábios.

Essa vida de merda!


Meu celular apita ao meu lado, a luz vibrante da tela de iniciar
se acende, piscando e chamando a minha atenção. Recolho e
encaro a notificação.

Por um momento, apenas encaro com pesar a tela, sem me


mover, sem saber ao certo se eu atendo ou não a ligação de Aiden,
clamando por postergar esse momento. Mas a voz da razão grita,
dizendo que eu seria uma cadela mal-agradecida se fizesse isso,
afinal de contas, ele foi preso para me proteger.

Aperto no botão verde e acomodo o aparelho no ouvido.

– Qual das janelas pertence ao seu quarto? – pergunta, me


fazendo franzir as sobrancelhas.

– O quê?

– O primeiro ao lado da porta ou o segundo?

Me levanto em um só movimento, o coração bombeando o


sangue com toda a força. Empurro levemente as cortinas de voal
para o lado e espio através do vidro. Aiden está parado no meio do
meu jardim com o celular no ouvido, os olhos se fixam nos meus e
as irises bicolores brilham ao me ver.
Encerro a ligação e jogo o aparelho em cima da cama, abrindo
as cortinas e, posteriormente, a janela, cuidando para não fazer
barulho e nem mesmo um ruído. Me penduro no parapeito,
pendendo a cabeça para a rua.

– O que você tá fazendo aqui? – sussurro, olhando para a


janela ao lado que pertence ao quarto dos meus pais.

– Sai daí que eu vou subir – avisa, guardando o celular e se


preparando para pular.
Minha janela é alta e fica no segundo andar, no entanto, as
videiras de mamãe que enfeitam o meio entre as janelas dos
quartos e o parapeito da janela debaixo, servem como suporte para
uma suposta escalada.

Aiden se pendura nas videiras e as puxa com força, garantindo


que estejam bem fixadas à parede. Então pula na primeira janela e
se agarra no parapeito da minha com uma mão e a outra se fixa nas
plantas. Ele se impulsiona e prende o pé em uma videira, subindo
facilmente até a minha janela. Me afasto assim que ele passa a
perna para dentro do meu quarto, batendo sem querer em um dos
vidros.

Prendo a respiração e fecho os olhos, aguardando qualquer


movimento que seja do quarto dos meus pais. Nada acontece, o
silêncio absoluto reina.

Aiden entra e fecha o vidro atrás de si, ele limpa as mãos nas
calças.
– Você ficou maluco? – murmuro, encarando-o estupefata.

Ele lança olhares pelo meu quarto, observando cada mínimo


detalhe da decoração minimalista. Seus cabelos estão bagunçados
e as roupas um pouco amassadas, mas não há nenhuma pista
externa do que possa ter acontecido com ele nas últimas horas, do
que o xerife disse ou fez desde que o vi pela última vez na porta da
delegacia.

– Eu precisava saber como você está – diz, aproximando-se e


enlaçando a minha cintura.

Toda a surpresa que eu sentia ao vê-lo aqui se esvai, cedendo


lugar para uma sensação prazerosa de aconchego, algo que estava
precisando e não sabia até este momento. Agarro os ombros dele e
escondo o meu rosto em seu peito, inspirando o cheiro que eu tanto
aprecio.
– Por quê? – sussurro, em um pingo de voz.
– Porque eu me importo com você, princesinha – sibila,
beijando os meus cabelos e afagando a minha cabeça.
Não consigo conter o soluço que escapa dos meus lábios e
toda a tristeza que assola o meu peito. Afundo os dedos na pele de
Aiden e choro, recebendo seu toque acolhedor em minhas costas.

Choro pelo que poderíamos ter.

Choro pelo que tivemos.


Choro pela vida de merda que eu preciso levar.

E choro por tudo o que preciso aguentar e ouvir dessa família.

Aiden não me larga por nenhum momento, o queixo descansa


no topo da minha cabeça, as mãos passeiam pelas minhas costas e
o peito sobe e desce em respirações rítmicas.

E sobre o abrigo dos seus braços, eu me desfaço e me refaço,


obtendo o seu apoio, mesmo sem que saiba o motivo do meu
sofrimento e desalento.
 
Preciso de cada migalha do meu controle para não afastar
Madelyn e atear fogo nessa casa, mantendo dentro o maldito do
prefeito. Eu não sei o que aconteceu, mas sei que Madelyn está
triste e muito abatida. E pela boa fama do homem, só posso supor
que esse desalento todo vem por conta dele.

Puxo-a para a cama enquanto ouço o seu soluçar, sempre


mantendo-a comigo, as mãos afagando os cabelos, tentando
acalmá-la de alguma forma.

Maddie funga, acalmando as lágrimas que jorram pelos olhos


feito cascata. Passo um dedo pela bochecha borrada de rímel,
limpando a maquiagem preta e espessa da pele branca.

– O que aconteceu? – pergunto, erguendo o rosto com o


polegar e o indicador.
Os olhos castanhos se fixam nos meus como piscinas
profundas e acolhedoras. Uma fisgada atinge o meu coração ao ver
o brilho de tristeza que emana deles, dos olhos que um dia foram os
mais sinceros comigo e quando eu mais precisei.
– Nós precisamos conversar – pigarreia, os lábios tremem em
um soluço.

Eu odeio vê-la chorar, detesto mais ainda sentir toda a


angústia dela. Passo o polegar em sua boca, desenhando a pele,
acariciando-a em uma falha tentativa de acalmá-la.
– Estou ouvindo, princesinha.

Mais lágrimas brilham nas piscinas castanhas e ela franze o


nariz como se estivesse sentindo uma dor aguda e profunda por
conta disso.

– Nós precisamos romper o acordo do clube, não poderei mais


ficar disponível para você.

Um vinco aprofunda o centro da minha testa e meus músculos


ficam rígidos. Esperava ouvir qualquer coisa, menos isso.

Madelyn está terminando comigo?

Em algum momento dessa nossa história, eu me sentiria


aliviado, mas não hoje, não mais. Só em pensar em ter Madelyn
longe de mim me causa um reboliço na boca do estômago e o ar
parece faltar nos meus pulmões, tornando-se rarefeito.

– Por quê? – Ouço-me perguntar, embora a voz soe longe e


distante.

Madelyn corre os olhos para baixo, evitando olhar diretamente


para mim. Um tremor percorre o corpo e mais lágrimas molham as
bochechas, deixando um rastro até a curva do pescoço.
Mil e uma ideias passam pela minha cabeça, a hipótese de que
o pai dela possa ter descoberto o meu plano, embora improvável,
me aterroriza, mas não mais do que pensar em não a ter mais em
minha vida.

Ela confina a respiração, antes de falar.

– Tem coisas na minha vida que você... não tem como


entender – confessa, entrelaçando os dedos em um gesto nervoso
–, ninguém pode, na verdade, por isso estou sendo sincera com
você neste momento. Não posso prometer algo que não irei cumprir,
e quando digo isso, quero dizer que não poderei mais ir ao clube,
não estarei mais disponível, eu nem mesmo poderei sair, então... –
Ela espreme os olhos, engolindo em seco antes de continuar. –
Preciso te libertar para que siga a vida. Nosso acordo no
Dominators chegou ao fim Aiden, não serei mais sua submissa, está
livre para procurar por outra.

Meus músculos se retesam, encaro-a, observando-a com


minúcia, procurando o que tem de errado ou o motivo do porquê
está me falando isso.

Uma veia pulsa na minha testa e eu sinto um calor insidioso


subir pelo meu pescoço. A raiva corre pelas minhas veias, me
fazendo ranger a mandíbula.

Não estou com ódio dela, estou com ódio dele. Madelyn é
claramente uma pessoa oprimida, alguém que precisa seguir ordens
que não gosta e não está de acordo, alguém que precisa seguir
padrões.

Fui um tolo.
Sempre pensei que a vida dela fosse perfeita, que Madelyn
fosse a legítima princesinha, a garotinha perfeita do papai, um ícone
na nossa sociedade.
Mas, neste tempo todo, a verdade sempre esteve à frente dos
meus olhos.

– Quando você quebrou? – sibilo, abrindo e fechando as mãos


em punho.

Madelyn franze o cenho, levando alguns segundos para


compreender a minha pergunta. Seus olhos se iluminam e dor os
atravessa, expondo a verdade.
– Eu quebrei quando tinha nove anos e percebi que a minha
vida nunca mais seria minha, que eu nunca mais seria a mesma
porque precisaria me moldar e me transformar em um objeto político
– revela em um bramido.
Então a verdade me atinge com tanta força que eu preciso
conter o ar nos meus pulmões.
Madelyn é oprimida pelo pai. Obrigada a ser a filha perfeita, um
modelo de ser humano ideal.

De todas as maldades que Sutherland já fez em sua vida,


oprimir a filha, talvez, seja a pior delas. Maddie era só uma criança
quando eu a conheci, pensava que fosse tímida, uma garotinha
acanhada, jamais imaginei que ela precisava impelir a verdadeira
personalidade para estar nos padrões aceitáveis pelo pai.

– E você... – sussurra, trazendo os olhos aos meus – quando


quebrou?
Se ela soubesse que nós dois fomos quebrados pelo mesmo
maldito homem. A diferença é que enquanto Sutherland aspirou a
personalidade da filha para benefício próprio, ele tirou alguém muito
importante de mim. E ambas as situações não possuem conserto.

– Quando percebi que eu nunca mais veria o meu pai, quando


descobri que a morte dele tinha sido em vão porque ele se envolveu
nos problemas dos outros – falo, sem piscar, encarando-a no fundo
dos olhos.
Maddie exprime os lábios e balança a cabeça em
concordância.

– Eu sinto muito... – murmura, e eu ainda sinto verdade nela e


em suas palavras, assim como senti quando ela proferiu a mesma
coisa há tantos anos.
Agarro a mão dela, entrelaçando os nossos dedos, unindo as
palmas tão distintas. Madelyn é delicada, a pequena mão some no
meio da minha que é o dobro do tamanho.
Ela pode ser a filha do assassino, mas não pertence a esse
mundo, ela caiu nele assim como eu. Maddie não é nem meramente
parecida com o pai, ela é boa, sincera e verdadeira. Ela sente a dor
dos outros, tomando para ela mesmo quando não deveria. Ela se
compadece com a situação.

Ela é incrível.

– O que vai acontecer com você de agora em diante? –


pergunto, encarando a distinção do tamanho de nossas palmas.
Maddie funga e esfrega a ponta do dedo na bochecha para
limpar uma lágrima.
– Eu tinha duas opções – revela, a voz trêmula, dolorosa.

Ergo os meus olhos, a testa franzida, a raiva mais uma vez me


atingindo com força.

– E quais eram?
Madelyn parece ainda mais triste do que estava antes, como
se as opções a magoassem em um patamar estratosférico.
– Aceitar a minha nova realidade que é viver enclausurada
para não me envolver em mais problemas, ou reatar meu
relacionamento com o Lennon, já que ele era um bom namorado,
embora tenha me traído, mentido e engravidado a amante, pois me
mantinha na linha.

Minha mandíbula range com tanta força que o músculo do


maxilar estala.

– E qual delas você escolheu? – sibilo, tentando me conter.

Ela suspira e revira os olhos.


– A prisão, é claro! – afirma, convicta. – Nem se Lennon
aparecer pintado de ouro na minha porta eu o quero de volta.

Se eu já não tivesse visto tanta coisa absurda na vida, estaria


espantado com a hipocrisia de Sutherland e em como ele destrata a
filha de uma maneira horrorosa.

Madelyn não merece isso.

Ela prende os lábios entre os dentes.


– Eu sei, é injusto, mas essa é a minha realidade e eu não
posso mudar ela – murmura, bufando –, assim como seria injusto te
arrastar para isso e te prender.

Me levanto e viro de costas para Madelyn, esfrego o rosto e


bagunço os meus cabelos, exausto.
Sutherland tirou tanto de mim, não posso acreditar que ele vai
me tirar também a filha, a única pessoa que foi capaz, até então, de
me fazer abrir sorrisos sinceros e esquentar o meu peito,
reacendendo um coração a muito tempo apagado.
Esse maldito!

– Aiden... eu... eu sinto muito – cicia, a voz rouca e baixa.


Preciso falar com ela, dizer que de alguma maneira tudo vai
ficar bem, mas eu não consigo, eu simplesmente quero ignorar o
fato de que esse desgraçado irá se colocar entre nós.
Eu vim para a cidade com o único intuito de me vingar e
acabar com essa quadrilha maldita que só traz sofrimento para a
vida das pessoas. Depois da vingança, eu iria embora sem olhar
para trás.

Mas Madelyn...

Madelyn é luz em um mundo sombrio, é sol em um dia


chuvoso, flores em um inverno tenebroso.

Eu a quero para mim. Simples.

Não suporto a ideia de ver outro cara tocando-a ou de alguém


lhe machucando. Maddie é pura, ela não precisa sofrer como eu
sofri, ela não deve ser ferida pela maldade humana. Porque, nesse
mundo em que eu vivo, ela é a única coisa inteira e sincera que
ainda me resta.

Me viro em sua direção, decidido a dar um basta nisso tudo.

– E se você namorar outra pessoa que não seja o babaca?


Ela franze o cenho, pensativa e desconfiada.

– Eu não sei... ele foi metódico quanto a Lennon, mas talvez


me ver namorando alguém faça com que me deixe sair, afinal,
menos festas e essas coisas. – Revira os olhos inchados e
avermelhados pelo choro.
– Então vai namorar comigo – afirmo, aproximando-me um
passo.

Madelyn arqueia as sobrancelhas.

– O quê? – replica, boquiaberta.


Volto para a minha posição, sento-me à sua frente na beira da
cama, o colchão macio afunda sob o meu peso.

– Simples, nós vamos entrar em um relacionamento –


contraponho, encolhendo os ombros –, nós já estamos em um, se
parar para pensar. Eu só fico com você, você só fica comigo.

– Aiden... ficou maluco?

– Não, estou muito ciente do que estou fazendo. – Passo o


dorso da mão contra o seu braço desnudo. – Eu te quero, Madelyn,
assim como imagino que também me queira. Nós já meio que
estamos juntos, só vamos oficializar.

Ela balança a cabeça, soltando um riso enfezado.


– Olha, fico feliz que esteja tentando encontrar uma solução,
mas... – morde os lábios, ruborizando –, acho que você não é bem o
genro que o meu pai espera, ainda mais depois de ter sido pego
pelo xerife comigo.

Passo a língua nos dentes, gargalhando baixo para não


acordar o maldito no quarto ao lado.

– Eu não esperava mesmo ser aceito nos padrões do seu pai,


Madelyn, afinal, não sou um babaca drogado e traidor. – Amplio o
sorriso. Ela cora ainda mais. – Mas eu acho que podemos resolver
essa questão.

Não vou falar para ela que é uma honra não estar nos padrões
do maldito do pai, pois acho que seria uma grosseria.

– Como?

– Minha mãe – respondo, somente.


– Não sei bem se estou entendendo o seu raciocínio, Aiden.
Seguro a curva do pescoço e a puxo para plantar um casto
beijo em seus lábios gelados.

– Minha mãe é importante na cidade, Maddie, ela tem um


cargo de renome, se o seu pai se importa mesmo com as
aparências, embora não goste de mim, vai aprovar a união por
causa de Grace Thorne.

Seus olhos se iluminam com a ideia e um sorriso genuíno


curva os lábios.

– Acha que vai dar certo? – indaga, esperançosa.

Afirmo com um sinal.


– Confia em mim? – Passo o polegar contra a bochecha,
acariciando a pele macia.

– Com tudo o que eu tenho.

– Então deixa comigo, vou resolver a situação.

Trago-a para mim, fundindo as nossas bocas em um beijo


ardente e desesperado, a conversa dos últimos minutos, a hipótese
de sermos separados vindo à tona, nos fazendo suprir através do
toque toda a necessidade que sentimos em permanecer juntos.
Nossas línguas brincam, acariciando-se enquanto eu agarro os
cabelos dela em punho, puxando-a ainda mais como se fosse
possível nos fundirmos.

Maddie se afasta, mas mantém a testa colada à minha, a


respiração está densa e acelerada.

– Esse foi o pedido de namoro menos romântico de todos os


tempos – zomba, rindo.

– Prometo recompensá-la com um bom sexo.

Seu sorriso aumenta.


– Isso eu sei que pode cumprir.

Ficamos em silêncio por um momento, apenas aproveitando a


companhia um do outro, as mentes em uma confusão, mas os
corações mais calmos.

– Dorme comigo? – pergunta, sussurrando.

– E essa é a sua forma romântica de me pedir para passar a


noite com você? – questiono, arqueando uma sobrancelha.

Madelyn se afasta, bufando e rindo.

– Certamente é mais romântico do que “então vai namorar


comigo”. – Imita a minha voz, fazendo aspas com os dedos – Céus,
você nem pediu, simplesmente ordenou.

– Meu eu dominador sempre fala mais alto quando se trata de


você.

Ela se levanta, fazendo um gesto de desdém com a mão.


– Ah, tá bom! Mas eu perdoo você, afinal, eu não negaria o
pedido de qualquer forma.

– E isso ao menos passou pela sua cabeça? – Espalmo a mão


no peito, fingindo estar ofendido.

Madelyn vai até o roupeiro e abre uma porta, recolhendo duas


toalhas de dentro, antes de se virar para mim.
– Então, namorado, vamos tomar um banho antes de ir dormir?

Um sorriso sacana se espalha pelo meu rosto.


– Isso com certeza é romântico.

Ela rola os olhos para cima, abrindo uma porta ao lado e me


chamando com o indicador.
– Venha logo ou vou começar sozinha.

Me levanto em um pulo, seguindo-a para dentro do banheiro.

Eu nunca tive uma namorada antes, mas também nunca estive


tão ansioso e feliz como me sinto agora.
Madelyn é minha e Sutherland não vai mudar isso, nem se
tentar.

Sinto o corpo de Aiden contra o meu, o pau duro bate nas


minhas costas revelando uma bela de uma ereção matinal. A
respiração dele é rítmica e tranquila contra o topo da minha cabeça.

Me sinto confortável estando em seus braços e meu coração


não poderia estar mais feliz nas últimas horas.

Eu queria Aiden antes, mas depois de tudo o que ele fez por
mim, eu o quero ainda mais. E não posso acreditar ainda que
estamos oficialmente namorando.

Sei que o meu pai não será totalmente adepto ao


relacionamento, mas tenho esperanças de que Aiden consiga a
proeza que disse que faria, afinal de contas, de uma coisa ele tem
razão, a mãe é muito influente o que significa que o fará cair nas
graças do meu pai rapidinho.
Mexo o meu braço que está adormecido embaixo do meu
corpo, fazendo o possível para não acordá-lo. Ele suspira e me puxa
ainda mais, me abraçando, as pontas dos dedos roçam no meu
ventre.

– Bom dia, namorada – murmura, a voz arrastada e sonolenta.

Um sorriso sincero surge em meu rosto.


– Bom dia, namorado.

Aiden desce a mão ainda mais, esfregando o dedo contra o


elástico da minha calcinha. Ele está sem roupa, vestindo somente
uma boxer. Me empurro contra o seu corpo, esmagando o pau com
a minha bunda, o que o faz gemer.

– Se não parar de me provocar, Madelyn, eu vou te comer


agora mesmo – ameaça.

Ah, se ele soubesse que é justamente esse o meu objetivo.


Balanço o quadril, esfregando o pau contra a minha bunda.
Aiden afunda os dedos na minha cintura e ouço a sua mandíbula
trincar.
– Tudo bem..., vou degustar de um bom café da manhã,
princesinha.

Em um movimento, as mãos resvalam as laterais da minha


calcinha, arrancando-a do meu corpo com um só puxão,
arrebentando as alças finas.
– Ei, eu gostava dessa – sibilo, a umidade escorrendo pelo
meio das minhas pernas.

– Oh, que pena – zomba.

Ele desce um dedo pela minha boceta, esfregando o meio


entre os lábios vaginais, sentindo a lubrificação molhar a ponta do
dedo antes de retornar até chegar ao meu clitóris e circundá-lo.

Arquejo, agarrando o travesseiro em punho.

Abro mais as pernas, dando passagem livre para ele. Com a


outra mão, Aiden agarra o meu mamilo por baixo da camisa larga
que visto para dormir, massageando a ponta do bico com força.

– Aiden... – Viro o rosto contra os lençóis, suprimindo um


gemido.
Aiden é muito habilidoso com os dedos... e com o pau... e com
a língua. Céus, ele sabe muito bem como satisfazer uma mulher.

Ele brinca com o nervo, acariciando-o com os dedos firmes e


precisos, alternando os movimentos a cada suspirar meu. O líquido
escorre pelo meio das minhas pernas, molhando as minhas coxas.

Estou tão excitada e molhada, prestes a ter um orgasmo.


Tateio a mão para trás, procurando entre os nossos corpos o
pau duro e robusto, enfio-me por debaixo da boxer e brinco com a
ponta da cabeça, sentindo-a molhada. O piercing gelado toca em
minha pele, me fazendo arrepiar só de lembrar de como ele é
maravilhoso ao tocar no meu ponto G.

Brinco com a cabeça grande e molhada, esfregando a glande


com o polegar, sentindo-o endurecer mais e mais sobre o meu
toque. Aiden solta um suspiro misturado com um gemido, os quadris
se movem para cima, buscando o contato.

– Nossa, preciso te comer agora – avisa, removendo a mão do


meio das minhas pernas e baixando a boxer só o suficiente para
soltar o pau –, vira bem essa bunda pra mim.
A lembrança de quando ele me fodeu duplamente me atinge,
eriçando os meus pelos e me deixando ainda mais molhada. Sentir
meus dois buracos sendo possuídos foi, com toda a certeza, a
melhor aventura sexual que eu tive.
Aiden segura o pau e o dirige para a minha entrada,
esfregando a ponta pela minha boceta até encontrar o buraco.
Então desliza para dentro de mim com facilidade, enfiando-se até a
base.
– Porra de boceta gostosa! – exclama, afundando o rosto em
meus cabelos.

Ele me penetra com calma, entrando e saindo, indo fundo e


voltando, um sexo tranquilo. O maldito piercing toca no meu ponto G
e me faz delirar, soltando respirações ruidosas pelo nariz.

– Oh, Aiden... – Fecho os olhos e solto um gemido ao senti-lo


me esticar, afundando todo o pau em mim.

Ele segura os meus ombros com as mãos e se afasta,


movimentando os quadris para trás antes de movê-los para a frente
e me penetrar com força, aumentando o ritmo, acelerando a
brutalidade.

– Eu queria muito brincar com essa bocetinha, Madelyn, mas


na posição em que estamos eu preciso te segurar para meter com
força, então brinca com o clitóris, se toca pra mim – orienta.

Faço como disse, coloco a mão no meio das minhas pernas e


mexo no clitóris inchado, circulando-o com rapidez. Aiden me
mantém imóvel enquanto se afunda em mim, fazendo o meu corpo
chacoalhar com a força em que investe.

Mordo o dorso da mão livre, abafando um gemido e os ruídos


que se desprendem da minha boca sem que eu tenha controle.
Estou perdida em prazer, enquanto masturbo a minha boceta e
Aiden me fode com força, o piercing acertando o ponto G.

Uma batida soa na minha porta, desvanecendo a nuvem que


mantinha a minha mente longe, me fazendo enrijecer.
– Madelyn, está na hora de levantar – fala o meu pai, girando a
maçaneta, mas, graças aos céus, sendo impedido de entrar por
conta da fechadura.
Engulo a saliva para molhar a garganta seca, meus pelos se
arrepiam quando o orgasmo se aproxima. Aiden não para de
estocar, mantendo o ritmo, sorrindo com a situação.

– Madelyn! – Insiste, batendo com mais força.


Pigarreio.

– Eu... eu já vou – falo, a voz trêmula e fraca.


Silêncio se desenrola do outro lado, mas não ouço os passos
se afastando, então me mantenho na maior mudez do mundo, com
medo de que ele esteja tentando ouvir através da madeira fina.

A cama não faz barulho, somente o ruído dos nossos corpos


contra os lençóis, mas nada que faça parecer que a filha dele está
sendo fodida neste momento enquanto conversa com o pai.
– Tudo bem – fala, por fim – Tem dez minutos para descer ou
eu vou subir e arrombar a porta, não me interessa que esteja
chateada com os acontecimentos de ontem, precisa seguir a vida e
ser uma boa filha – ameaça, e eu finalmente ouço o barulho dos
sapatos caros e sempre bem lustrados contra o piso.
– Seu desgraçado! – sussurro, furiosa com Aiden.

– Goza bem gostoso e lambuza todo o meu pau – retruca,


gemendo.
Ele se inclina para cima, fazendo o piercing roçar ainda mais
forte no ponto G.
– Hum... esse bendito piercing – sibilo.

Sinto o sorriso de Aiden contra os meus cabelos.


– E não é que eu te dei um sexo bom de verdade – comenta,
penetrando-me.
– Do que você está falando? – indago, tremendo de prazer.

– Na primeira vez em que conversamos nós trocamos


segredos, e você lamentavelmente me disse que nunca tinha
transado com ninguém que tivesse um piercing no pau, ou seja,
nunca tinha tido um sexo bom, de fato.

– Ah, mas você é muito convencido se acha que... – engasgo a


minha voz quando ele inclina mais os quadris, afundando-se por
completo com força e brutalidade – Ohhhhh!
O calor insidioso se concentra no meu ventre, crescendo até
explodir em um gozo gostoso que me faz subir nas nuvens e
aterrissar. Aiden se desfaz dentro de mim, me acompanhando no
torpor de prazer.
Mordo a mão até sentir o gosto do sangue, tremendo em
espasmos enquanto o orgasmo se espalha pelo meu corpo. Suor
escorre pelo meio dos meus seios.

Suspiro, satisfeita.
– Ainda assim eu quero matar você por quase ter entregado de
bandeja ao meu pai o nosso segredinho – refuto, sorrindo.
Aiden beija o topo da minha cabeça.

– Qual graça seria eu estar escondido em seu quarto se não


fossemos quase pegos? – graceja, acariciando os meus cabelos.
Esse garoto é mesmo terrível!
Me aconchego de volta contra os travesseiros, sonolenta pós-
orgasmo alucinante.
– Acho que ele falava sério quando disse que arrombaria a
porta – comenta, esfregando os cabelos salpicados de suor.
Suspiro.

– Infelizmente, sim! – Me levanto, sentindo ainda mais ódio do


meu pai por atrapalhar a minha manhã deliciosa. – Vou descer para
tomar o café e você vai fugir pela janela, tente não cair ou ser pego,
por favor, isso certamente contará como ponto negativo se for visto
saindo do meu quarto.

Ele descansa um braço embaixo da cabeça, sorrindo


ironicamente, a sobrancelha arqueada.

– Depois de ter me deliciado com um bom café da manhã,


estou mais do que disposto a fazer bem o meu trabalho.
Coloco as mãos na cintura e afasto levemente as pernas, sinto
o gozo dele escorrer pelas minhas coxas.

– Ótimo, vou tomar um banho e, claro, o meu anticoncepcional


– aviso, retirando um comprimido da cartela –, não queremos uma
gravidez indesejada neste momento.
Engulo o remédio com a saliva. Aiden me puxa pelo braço e
beija os meus lábios.

– Te vejo mais tarde, namorada?

Me direciono para o banheiro e paro no batente da porta,


encarando-o por sobre o ombro.

– Sim, namorado – confirmo, e ele abre o sorriso mais


luminoso desta manhã.
 
Afundo os dedos no teclado do meu computador com rapidez
enquanto acesso outra vez o IP do computador do xerife com
facilidade.

A delegacia da cidade é antiquada, assim como o provedor de


internet que eles usam, o que veio me dando uma bendita dor de
cabeça nas últimas semanas, já que eu estava tentando hackear de
todas as formas e todas elas foram frustradas. Até que ele me deu a
senha do Wi-Fi, me entregando de bandeja o que estive tentando
nos últimos dias.

O lado positivo de hoje é que eu finalmente conseguirei


descobrir cada segredo que o xerife esconde; o negativo, terei que
acessar minha rede Wi-Fi de casa, já que a internet do celular não
está funcionando. E como hacker experiente sei que esse é um
grande risco a correr, mas não aguento mais esperar.
– Então..., já pensou como vai contar para a sua “namorada”
que foi o pai dela quem mandou matar o seu? – pergunta Miles,
sentado ao meu lado, esfregando o maxilar.
Solto um suspiro sem tirar os olhos da tela do computador que
acende e pisca a cada aba que eu acesso.

– Eu vou contar para ela... um dia.


Miles bufa, irritado.

– Que ideia maravilhosa, ela com certeza vai te perdoar por


esconder isso dela – zomba.

Coloco uma senha e finalmente consigo acessar o computador


de Sherwood, vendo todas as pastas que possui e cada arquivo que
tem.

Exalo uma respiração.


– Eu não quero marcá-la, entendeu? – Encaro-o e recebo um
olhar condescendente – Maddie é pura e boa, não quero que seja
atingida pelo mal que o pai fez, não quero que ela se machuque
assim como eu me machuquei.

Sutherland já foi um desgraçado com a filha, oprimindo-a e


fazendo-a sofrer, mas se ela descobrir que ele esconde muito mais
do que demonstra... Balanço a cabeça, não querendo pensar em
como Maddie ficaria se soubesse a verdade.

Miles comprime os lábios, com pesar.

– E já pensou que talvez faça uma marca ainda mais profunda


nela se mentir e enganar? Maddie confia em você.

Esfrego as têmporas com o indicador e o polegar, sentindo as


primeiras fisgadas de uma bela dor de cabeça me atingir.
– Eu sei – confirmo, espremendo os olhos –, só preciso de um
pouco de tempo, preciso pensar como vou contar essa merda pra
ela.

Como eu havia dito que daria certo, assim que cheguei em


casa eu conversei com a minha mãe sobre Madelyn, contei que
estamos juntos e que o prefeito é um pouco reticente com a filha,
por isso precisava da sua ajuda para que eu fosse um genro
irrefutavelmente aceito. Como mãe, ela se sentiu ofendida com
Sutherland e a negação comigo, então de imediato ligou para o
homem e o felicitou pela junção entre as famílias. Ele não entendeu
nada no início, já que Madelyn não havia comunicado, mas em
poucos segundos de conversa com a Promotora de Justiça, ele
ficou imensamente feliz e satisfeito com a relação.

Madelyn saiu do castigo e agora nós estamos oficialmente


juntos.

Volto minha atenção para a tela do computador, abstendo a


minha mente dos problemas futuros que tenho. Preciso me
concentrar nessa tarefa para que tudo dê certo e saia nos
conformes planejados.

Acesso todas as pastas de Sherwood, vejo arquivos da


delegacia, jogos idiotas para passar o tempo e fotos da família. Até
então, nada que seja relevante.
– Ele vai matar o Lennon quando descobrir que ele foi expulso
do time – comenta.

A tela de bloqueio do xerife é uma foto do filho dele vestido


com o uniforme do time de Rugby da Universidade. O retrato foi
batido dentro do campo e nele o babaca está sorrindo e apontando
para a camiseta, mostrando o número que carrega – ou, nesse
caso, o que carregava – isso por si só já diz o quanto Sherwood é
orgulhoso por ter o herdeiro no time.
– Certamente... – murmuro.
Encontro uma pasta que contém outra dentro, o nome do
arquivo está como: Fotos em família. Porém, não há fotos, mas sim
mais uma pasta.
– Suspeito – murmura Miles, segurando o queixo com a mão
em punho, os olhos fixos na minha tarefa.

Diferente do juiz, as pastas do xerife não possuem código e


são de fácil acesso, o que mostra que ele não é bom em informática
e sabe pouco sobre o sistema de um computador.
Clico em todas as pastas, sempre há uma dentro da outra, até
finalmente chegar na última. Nesta contém vídeos com a tela preta.
Entro em um deles e espero a filmagem começar.
Sinto o gosto da bile no estômago.

Miles retesa-se, arquejando.

– Puta merda! – exclama, os olhos arregalados em puro horror.


Uma forte náusea com o que estou vendo me atinge, revirando
o meu estômago e me fazendo encolher.
À nossa frente, passando sobre os nossos olhos, meninas com
pouco mais de oito anos são abusadas sexualmente, obrigadas a
usarem brinquedos sexuais, assim como tocar em suas partes
íntimas com as pernas abertas em direção a câmera, enquanto
algum imbecil grava o vídeo.

– Ele é pedófilo – diz Miles, constatando o óbvio.


As meninas parecem bonecas, o olhar perdido, o semblante
plácido, como se fossem só corpos sem almas, quebradas.
Não tenho estômago para assistir tamanha crueldade, fecho o
vídeo e respiro lentamente, soltando o ar pelo nariz para me
acalmar.
Eu já vi muitas merdas, mas sempre fiz questão de me abster
sobre qualquer coisa que envolva pedofilia, estupro ou tráfico
humano.
Agarro os meus cabelos, toda a cor se esvaiu do meu rosto.

Imaginava que encontraria bosta nas coisas do xerife, mas em


nenhum momento pensei que seria a maior delas.
– Eu... eu estou passando mal – avisa, levantando-se e
caminhando de um lado para o outro.

– Porra! Porra! – Soco a mesa, puxando os cabelos até o


couro cabeludo doer.
Elas são apenas crianças inocentes, como um maldito deste
tem coragem de assistir uma coisa dessas? Como ele pode ser tão
podre assim?

– E agora? – pergunta, estarrecido.


Balanço a cabeça, inconformado.

– Eu vou enviar tudo para o contato do FBI, eles vão saber


como proceder – cicio, a voz rouca –, aparece o rosto das crianças,
assim é fácil de identificar e descobrir como solucionar a situação.

– Acha que elas foram traficadas? – indaga, ainda caminhando


de um lado para o outro no meio do quarto.
Minha pele está fria feito gelo e meu coração bate com força.
– Eu não sei..., mas espero que não, espero que descubram
quem é o maldito que obrigou essas crianças a isso e que ele seja
morto.

Fui uma criança que tive a inocência roubada por um motivo,


mas minha dor não se compara ao que essas meninas estão
sentindo, nem meramente. Elas foram brutalizadas, jogadas em um
mundo doentio e repugnante, expostas ao horror da humanidade
sem nem mesmo ter a chance de se defender.
A humanidade é uma merda.

Meus dedos estão trêmulos enquanto acesso a Deep Web


para entrar em contato com o FBI, acesso tudo em modo
automático, a mente a quilômetros de distância, anestesiada com os
fatos que acabei de descobrir. De início, iria esperar a internet do
celular voltar para entregar os supostos podres que pudesse
encontrar do xerife, mas não tenho estômago para esperar, não
conseguirei ficar calado quando sei que há crianças sofrendo em
algum lugar neste momento. Então ignoro o fato de que posso ser
rastreado facilmente e faço o que meu coração comanda.

Como esse maldito conseguiu esconder tão bem os crimes


bárbaros que comete?
Envio todos os vídeos, o número do IP e o acesso para o
contato, comunicando o nome do xerife e a delegacia em que
trabalha. Ao finalizar, desligo as abas e deixo o computador de lado.
Não espero uma resposta, não tenho cabeça para isso, tão pouco
para continuar na internet depois de toda essa brutalidade.

Esfrego as mãos uma contra a outra.

– Acha que ele faz isso pessoalmente? – sibila Miles, tão


absorto em pensamentos quanto eu. – Quero dizer, ele assiste aos
vídeos na calada ou ele... faz o ato.

Miles não consegue dizer o que acontece, não tem forças e


nem estômago para isso. Eu também não.
– Só me pergunto como ele nunca foi pego esse tempo todo...
– murmuro, perdido em pensamentos.

Ele suspira e esfrega os olhos.


– Independentemente, você está ajudando essas meninas,
Aiden, e está ajudando a derrubar um monstro.
De todo o grupo de vespeiros que estou mexendo, achava que
Sutherland era o pior deles, mas acabei de descobrir que cada
membro dessa máfia esconde segredos mais sórdidos que o outro.

Estou cansado, abalado emocionalmente e mentalmente, mas


eu não vou parar, não agora e nem enquanto não os derrubar um
por um. Eles são a escória da nossa sociedade e merecem cair.

Aiden e Miles estão relativamente quietos hoje, perdidos em


pensamentos desde o momento em que chegaram para nos fazer
companhia na sombra durante o intervalo das aulas.

Emy perguntou o que aconteceu, mas eles foram


monossilábicos com as respostas, então acabei deduzindo que
estão preocupados com o jogo de hoje à noite contra o Kennesaw
State Rugby[11].

– Isso tudo é medo de perder? Pensei que se garantissem em


campo – zomba Emy.
Acaricio o ombro de Aiden, tentando lhe passar algum
conforto, seja lá o que lhe atinge. Ele me lança um sorriso simples
que não chega aos olhos.

– Nós vamos ganhar – retruca Miles, convicto.


Aiden continua distante, brincando com a grama, sentindo a
textura sobre as pontas dos dedos, alheio a conversa que se sucede
ao seu redor.
Limpo a garganta, tentando controlar a vontade insana de
perguntar a verdade, de saber o que está acontecendo, o que lhe
preocupa tanto ao ponto de ocupar a mente, mas me contenho.

– Vocês têm notícias de Lennon? – pergunto, recebendo


olhares dos três. – Eu não o vi e ninguém comentou nada sobre o
carro, nem mesmo os amigos babacas dele.

Eu sei que meu pai encobriu o caso, assim como o xerife fez
questão de manter tudo no anonimato, mas esperava alguma
retaliação dos idiotas ou algum comentário irrelevante.

– Vocês não ficaram sabendo? – replica Miles, a testa franzida.

Emy e eu trocamos um olhar confuso, antes de negar com um


sinal de cabeça.

Aiden suspira ao meu lado.

– Minha mãe atendeu o caso de Lennon, parece que ele foi


denunciado por agressão física contra a mulher, então foi levado
para uma delegacia vizinha, já que o pai é xerife daqui e daria
conflito de interesses – explica Aiden.

Abro e fecho a boca, mas nenhum som sai.

– Não acredito que deu certo! – comemora Emy.


Miles semicerra os olhos.

– O que vocês fizeram? – pergunta, desconfiado e em alerta.

Emy encolhe os ombros.


– Ele agrediu Gretha de forma covarde, bateu em uma grávida
sem nem mesmo pensar que ela carregava o filho dele, assim como
fez isso porque sabia que Gretha jamais o denunciaria, o que
aumenta o seu patamar de covardia, então ele mereceu a denúncia
e merece ainda mais sofrer pelos atos – contrapõe.

Minha deglutição é audível ao lembrar da cena de Gretha


machucada e, ainda assim, magoada comigo por ter rompido com
Lennon. Me culpando pelas agressões físicas e psicológicas que
vem sofrendo.

Odeio ter visto uma mulher naquela situação. Me machucou.


Doeu no fundo do meu ímpeto. Mas serve como um refresco para a
minha alma saber que Lennon foi preso e pagará por tudo o que fez
com ela. Só espero que ela se liberte e se ame, acima de tudo.

– E quanto a Gretha, alguém tem notícia? – pergunto,


erguendo a cabeça e olhando entre Miles e Aiden, aguardando uma
resposta.

Aiden confirma.
– Ela foi encaminhada para um abrigo de proteção a mulheres
vítimas de maus-tratos e violência doméstica. Gretha receberá ajuda
médica e psicológica, assim como um auxílio durante o restante da
gestação – avisa Aiden, se escorando contra mim.

– E o bebê, o que será que vão fazer com ele? – murmuro,


enrouquecida.

– Parece que ela já tinha contato com um casal que tem


interesse em adotá-lo ao nascer, então vão manter isso ao menos
que Gretha mude de ideia e resolva ficar com ele.

Silêncio recai.

– Que bom que deu tudo certo e que ela vai receber a devida
ajuda, fico feliz em ver que conseguimos ajudar uma vítima em
situação de violência doméstica e abuso psicológico de alguma
forma – comenta Emy, suspirando aliviada.
Me sinto igual a ela, fico feliz e satisfeita que Gretha esteja
bem e acolhida. Espero que o bebê encontre uma família que o ame
de verdade e que seja feliz, se ela continuar com a ideia da adoção.
Assim como espero que Lennon apodreça na cadeia por ser um
babaca de merda.

– O xerife sabe do que está acontecendo? – indago,


acariciando os cabelos sedosos de Aiden por entre os meus dedos.

– Não sei, só sei o que a minha mãe me contou porque ela


esteve ciente do caso e foi a responsável por levar Gretha até o
abrigo.

– Foi tudo abafado? Por que ninguém está fofocando sobre


isso? – replica Emy, olhando ao redor.

– Para proteger a imagem de Gretha e do bebê, preferiram


manter em segredo de justiça a situação.
Por mais que eu adorasse ver a máscara de Lennon ruir e
desvanecer, acredito que seja mesmo melhor o silêncio. Talvez
Gretha resolva voltar para a sua vida na cidade depois de tudo
afinal, e seria péssimo ter que lembrar de tudo cada vez que alguém
olhasse para ela com condescendência.

O sinal toca alto e forte, reverberando através do pátio. Os


alunos começam a se erguer, arrumando-se para a próxima aula.

– Bem, vamos para a aula e vocês – diz Emy, apontando um


dedo em riste para os meninos – vão se aprontar para o jogo,
pretendo festejar hoje e só poderemos fazer isso se vocês levarem
a melhor na partida.
Miles espalma a mão no peito.

– Nossa, que honra ter a minha irmãzinha torcendo tão


fervorosamente por nós – zomba, sorrindo maliciosamente.
Me levanto do chão e limpo as mãos na calça, recolhendo a
bolsa que Aiden me estende voluntariamente.
– Te vejo mais tarde? – pergunto, inclinando-me na ponta dos
pés para plantar um beijo em seus lábios.

Ele ri, confirmando com um sinal.

– Até mais. – Me beija, antes de se afastar e seguir com Miles


em direção ao campo.
Meu pai não ficou muito feliz ao saber do relacionamento
através de Grace Thorne, mas também não ficou insatisfeito. Ele
comemorou e me parabenizou, embora tenha sido enfático ao falar
que ainda não confia totalmente em Aiden porque ele cheira a um
garoto problema, mas daria um voto de confiança em nome da mãe
dele e da amizade que tinham. Depois disso, as coisas mudaram
em casa, ele parou de me atormentar e me liberou do castigo.

– Vamos para a aula, Maddie, não queremos receber


advertência no dia do jogo – Emy pousa o braço em meus ombros e
me puxa em direção à entrada.

Ela tem razão, como alguém que namorou por muito tempo
um jogador, sei bem como as coisas funcionam nesse patamar.
 
As torcidas gritam em suas arquibancadas o nome dos times
para quem estão torcendo, mas a rival perde drasticamente em
número de torcedores, já que estão jogando fora de casa. Os
meninos ainda não entraram em campo, e ainda assim isso não
impede o fervoroso que os alunos estão fazendo.

Emy e eu estamos sentadas na primeira arquibancada, perto


do time reserva, onde sempre ficamos todas as vezes em que têm
jogo.

As luzes que iluminam o campo refletem as sombras das


arquibancadas, escurecendo levemente a beirada do gramado bem
aparado.

Emy estende o braço para mim, me entregando um copo


vermelho com cerveja.
– Até hoje não sei como consegue gostar do senhor Plec –
murmuro, sorvendo um pequeno gole.
A cerveja está quente, mas isso não é nenhuma novidade. Os
freezers do bar da cantina estão velhos e praticamente inutilizáveis,
no entanto, a Universidade não está nem um pouco preocupada
com isso ou tentada a melhorar as coisas, embora todos os jogos
sejam importantes para a sociedade, trazendo sempre inúmeros
telespectadores e familiares às arquibancadas.

– Ele é legal... – fala, calando-se ao ver o olhar cético que


lanço. – Só precisa compreender ele, então ele se torna gente fina –
complementa, encolhendo os ombros.
O senhor Plec é um homem insuportável, extremamente mal-
educado e ranzinza, ele odeia o mundo e todos que estão nele.
Além de cuidar da cantina em dias de jogos, é zelador da faculdade,
atingindo a todos com o humor nada agradável todo o santo dia.

– Uhum... – retruco, zombeteiramente.

Me sento para aguardar o início da partida. Tampo os lábios


com o copo, brincando com o plástico entre os dentes, os olhos
fixos na entrada do vestiário. É a primeira vez que assistirei Aiden
em um jogo e me sinto ansiosa por isso.

– Ele não sabe ainda? – pergunta Emy, lançando um olhar


para a camiseta que eu visto.

Nego com um sinal de cabeça, sorrindo.

– Ele é um pouco territorialista, acho que vai gostar da


surpresa.

Mais cedo pedi para que Miles me emprestasse uma das


camisas reservas do time, em específico a de Aiden. Neste
momento, estou estampando seu número e o seu nome na camiseta
que é muito maior do que eu e fica nadando no meu corpo pequeno,
mas ainda assim é reconfortante.

O juiz apita e os times começam a aparecer, um por um dos


jogadores vão deixando os vestiários. O vermelho vívido da
camiseta do Alabamas Rugby brilha contra as luzes, um contraste
bonito e eletrizante que faz com que a plateia entre em alvoroço.

Me levanto, erguendo os braços para cima, gritando e sorrindo.

O time rival entra em campo, as cores pretas e amarelas do


uniforme preenchem o restante do gramado.

Aiden ocupa a posição de pilar esquerdo do time, as tatuagens


que cobrem os braços refletem, chamando a atenção para elas.
Miles conversa com o árbitro, a faixa de capitão cobre a testa e ele
parece orgulhoso ostentando-a.

– Seus pais não vieram hoje? – pergunto, os olhos fixos na


partida que vai se iniciar.

– Eles tinham uma janta com alguns acionistas do banco –


fala, descascando com os dentes o esmalte preto da unha do
polegar.
Miles avança e se posiciona em seu lugar, a bola fica com o
time deles. O juiz apita e o jogo começa.

A bola voa, caindo nas mãos de um jogador, antes de passar


imediatamente ao outro antes que ele seja empurrado para o chão.
Eles só podem repassar a bola para jogadores que estejam na
mesma linha, caso contrário, serão penalizados.

Os meninos estão indo bem, embora a marcação em cima de


alguns jogadores específicos esteja acirrada. Desde que Miles
assumiu como capitão do time, as coisas começaram a fluir melhor
e eles começaram a ganhar vários jogos.

O jogo tem dois tempos de quarenta minutos cada.


Um jogador avança para a linha do gol final, mas é derrubado
no meio do caminho e perde a posse de bola.

As coisas se desenrolam em uma velocidade vertiginosa,


mudando em um piscar de olhos.

Os meninos recuperam a bola que é passada para Aiden, ele


corre pelo gramado, desviando uma das barreiras humanas e
empurrando outro jogador com o ombro, levando-o ao chão. Ele
corre sem parar, as pernas se movimentando em frenesi. Alguém
grita, mas Aiden não para, continua correndo e derrubando qualquer
um que surgir em sua frente. E então ele se joga no chão, a mão
atravessa a linha enquanto mantém a bola presa com os dedos,
marcando um Try[12].

A plateia vai à loucura, pulando e gritando enquanto


comemoram a maior pontuação do jogo.
Aiden se levanta, Miles corre até ele e lhe dá tapas nas costas,
rindo e festejando.
Agora eles têm direito a uma conversão. Miles acomoda a bola
em uma das linhas laterais e se prepara para chutar. Eles
conquistaram cinco pontos com o Try, mas ainda podem ampliar a
vantagem se Miles conseguir acertar.

Ele se impulsiona para trás e então para a frente e chuta a


bola, forte e certeiro. Ela voa pelo gramado. A plateia faz silêncio
enquanto os olhos correm seguindo cada centímetro que o objeto
percorre. E mostrando a todos o porquê é o capitão do time, a bola
passa entre as travas e acima do travessão “H”, acrescentando mais
dois pontos à equipe.

A plateia vai à loucura mais uma vez, gritando o nome de Miles


e batendo os pés com força nas arquibancadas, entonando um
zumbido como um tambor.
As equipes retornam à posição inicial e o jogo recomeça.
Um jogador do Alabamas é atingido em cheio e se revira no
gramado segurando o braço com dor. Ele é recolhido e
encaminhado ao médico de plantão, enquanto um do banco reserva
ocupa o seu lugar em campo.

– Esse daí não volta a jogar tão cedo – comenta Emy, a boca
com películas do esmalte que roeu.

A partida avança e os primeiros quarenta minutos fluem em um


piscar de olhos. Sem mais pontos de nenhum dos lados. O intervalo
de dez minutos se inicia e uma música soa pelos alto falantes do
estádio. Os times voltam para os vestiários, deixando o campo
vazio.
– Se ganharmos, o que acha que iremos fazer hoje? –
pergunto, tamborilando os dedos no copo de cerveja vazio.
– Dominators – sussurra Emy, baixo o suficiente para que
ninguém além de mim possa ouvir.

Meu estômago se revira em ansiedade, é como Emy havia


dito, o Dominators é um caminho sem volta, depois que entra para
esse mundo e começa a fazer parte dele, nada mais nos tira de lá. E
isso que só tive poucos vislumbres até agora.

O jogo recomeça.

O time adversário sai com a posse de bola. Um dos jogadores


chuta a bola a partir de suas mãos e ela passa entre os postes do
Alabama, marcando um droap goal e levando três pontos.

Dessa vez, os gritos vêm das arquibancadas à frente com


cornetas, palmas e assobios.

– Espero que Miles dê um jeito e não deixe o placar virar, eu


quero sair para comemorar – sibila Emy, bufando.

Eu adoro o fato de que ela está pouco se importando para o


placar do jogo, ela não está aqui porque é torcedora assídua do
time, mas sim porque quer sair para comemorar após a vitória.

– Nossa, com uma torcedora como você, quem é que precisa


de inimigos – debocho.

Ela faz um gesto de desdém com as mãos.

– Até parece que você também se importa com isso, vamos ser
sinceras, estamos aqui por causa dos meninos, não porque
amamos Rugby.
Solto uma risada enfezada, mas me calo quando o apito do juiz
soa.
Mais uma vez a partida se reinicia e o jogo acontece, tornando
o segundo tempo uma fluidez absurda. Ninguém nota os quarenta
minutos, os olhos sempre focados em cada acontecimento, o
coração bombeando com força todas as vezes em que o time
avança, prestes a fazer uma pontuação.

O jogo termina, dando vitória ao nosso time.

– Graças aos céus, pensei que infartaria – comenta Emy,


levantando-se e seguindo em direção ao campo.
– As coisas não foram mesmo muito vantajosas para o time
nesse segundo tempo – refuto, agarrando a sua mão para não lhe
perder no meio da multidão –, mas pensa pelo lado bom, a
pontuação foi feita por Aiden e Miles, ou seja, eles estarão muito
felizes e nós vamos, de fato, ir comemorar.

Paramos no centro do gramado, esperando que eles venham


nos encontrar assim que forem liberados pelo técnico e os outros
jogadores. A multidão se dissipa, indo embora com o fim da partida.
Aiden vem em minha direção, um sorriso espalhado pelo rosto,
os cabelos brilhando de suor e a pele vermelha pelo esforço físico.
Ele me agarra e me gira no ar, plantando um casto beijo em meus
lábios.
– Oi... – murmuro, agarrando a nuca tatuada, respondendo o
seu sorriso.
Ele olha para a camiseta que estou vestindo e quando volta a
me encarar, um brilho de puro orgulho masculino transparece em
seus olhos bicolores e o sorriso que abre seria capaz de compelir
com o sol.

– Você está perfeita, princesinha – cicia, lambendo a curva do


meu maxilar –, e me deixou duro em saber que está estampando o
meu nome, declarando-se minha.
Estremeço com o tom de suas palavras, ansiosa.

– E o que você vai fazer quanto a isso?

Ele sorri contra a minha pele.

– Eu vou te foder, é claro – sussurra.

– Será que nós podemos ir? – retruco, fazendo-o gargalhar.

Aiden me solta, colocando-me de volta ao chão e se afasta,


fazendo um sinal para Miles.

– Vou tomar um banho rápido – avisa, girando nos calcanhares


e retornando para o campo.
Umidade molha a minha calcinha enquanto espero
ansiosamente a comemoração.
Ver Madelyn estampando o meu nome e o meu número na
camiseta me deixou satisfeito e muito orgulhoso. A minha garota
tem um jeito único e diferente de me surpreender.

No momento, minha maior preocupação é lidar com a mentira


que carrego, com a verdade que preciso esconder dela, a sombra
de que a qualquer momento esse relacionamento pode acabar, o
medo de que Madelyn nunca me perdoe e me odeie para sempre.

E não sei se conseguirei viver com o desprezo dela.


Por hoje, só quero esquecer de tudo e me perder naquela
boceta gostosa, aproveitar cada segundo, apagar os problemas da
minha mente.

Recolho o meu celular de um dos bancos reservas e paro em


um lugar mais privado ao lado das arquibancadas. Preciso enviar
uma mensagem para James, um dos seguranças do Dominators, e
pedir que deixe a suíte principal reservada para mim.

– Eu adorava assistir essas partidas, elas sempre foram a


garantia de um bom passatempo. – A voz soa da direita, no escuro
entre os vãos das arquibancadas.

A figura alta e corpulenta se aproxima, revelando a face,


aproximando-se.

Trinco o maxilar e aperto o celular com a mão em punho.

–  Bom para você – sibilo, engolindo a raiva que queima em


minhas veias.

Desde que descobri o segredo desse maldito, não consigo


olhar para ele com os mesmos olhos, mal posso suportar estar perto
dele, não sem lembrar as atrocidades e quão podre ele é.
– Meu filho era um bom jogador, pena que se deixou levar pelo
temperamento e acabou atrás das grades. – Ele se recosta contra
um pilar e cruza os braços, a estrela que carrega no peito brilha na
escuridão. –  Moleque idiota, sempre falei para esconder a
verdadeira face de Madelyn, sempre deixei claro como ela era
importante. – Suspira, balançando a cabeça.

– O que você quer? – pergunto, erguendo o maxilar cerrado.

– Por que você voltou para a cidade, Aiden? – objeta,


encarando-me com o cenho franzido.

Encolho os ombros.
– Minha mãe precisava de mim.

– Não, eu quero a verdade, não a desculpa que fala para


todos.

Prendo a respiração e preciso controlar o meu corpo para não


se retesar, mantendo a calma, a máscara impassível.
Ele não tem como saber a verdade, além do mais, não é
inteligente o suficiente para juntar os fatos.

– Não sei do que está falando... – murmuro, esfregando os


cabelos molhados –, se for só isso, tenho uma vitória para
comemorar.

Giro nos calcanhares e faço menção de me afastar quando ele


fala de novo.

– Estranho que tudo começou a dar errado quando você


chegou – comenta, me fazendo parar –, Charlie foi preso, Lennon foi
desmascarado e eu fui descoberto.

– Ainda não sei do que está falando, xerife – contraponho,


mantendo a voz calma e baixa. – Lamento que esteja sofrendo pela
prisão do filho, mas não tenho nada a ver com isso, ele só está
pagando pelos seus atos.

– Sim, compreendo – confirma, balançando a cabeça


irrefutavelmente –, mas ainda é estranho que as coisas começaram
a desandar desde que você chegou.

Inspiro o ar com calma pelo nariz e me viro, encarando-o com


firmeza. Ele está falando merda, só palavras jogadas ao vento, um
predador tentando suprimir sua presa.
– Por exemplo? – replico, comprimindo os lábios em
desinteresse.

– Você ouviu a minha conversa com Grace, soube tudo sobre a


causa da morte de Paul, então retornou para a cidade em busca de
vingança, quer acabar com todo mundo que foi responsável por
isso.
Meu maxilar começa a doer por cerrar os dentes com tanta
força ao ouvi-lo tocar no nome do meu pai.

– Pensei que não pudesse beber em serviço – argumento, com


a expressão sombria.

Um sorriso incisivo curva a boca do xerife.

– Não se preocupe, rapaz, sei que estou acabado, sei que o


meu... problema, chegou até as autoridades – Estala a língua, o
gesto fazendo uma veia de preocupação surgir em meu pescoço.

Não deixo de notar a forma como ele trata a covardia dele


como se não fosse nada, como se ele não fosse um pedófilo nojento
e depravado.
Cruzo os braços.

– E em qual tipo de problema você se meteu, xerife?


Ele ri.

– Eu sei o que está fazendo, Aiden, está se vingando de um


por um, até dizimar de vez o grupo, até se sentir satisfeito e
vingado.

– É mesmo? – retruco, firme e afiado.

– Não sei como conseguiu as provas contra mim, e, para ser


sincero, nem tenho interesse em saber, sei que estou acabado
mesmo, sei que estão procurando por mim neste momento. –
Suspira, encarando o gramado vazio. – Só queria vir e assistir a
última partida da minha vida.
Pigarreio.

– Se já terminou as divagações, preciso ir, tenho compromisso


– aviso, esquivando-me para o lado.

– Você não vai conseguir controlar o mundo, Aiden, sempre


haverá alguém como eu à espreita em algum lugar por aí, as
crianças nunca estarão seguras.

Cada músculo das minhas costas se enrijece com as palavras,


com a ameaça velada. Os vídeos das crianças tão maltratadas,
acuadas e abusadas atinge a minha mente, me fazendo sentir o
gosto da bile na boca.

– E para todo o ser nojento e asqueroso como você, sempre


haverá alguém bom e disposto a combatê-lo.

Ele ri e esfrega a nuca.

– A pedofilia é uma prática normal, meu rapaz, todos estamos


suscetíveis a sentir tesão por alguma coisa... se nem os animais
estão imunes, imagina nós – comenta, pensativo.

Viro-me abruptamente em sua direção e avanço, a raiva cega e


crua corre pelas minhas veias, meu estômago está embrulhado de
tanto nojo desse homem doente de merda. O xerife dá um passo
para trás ao perceber a minha aproximação, um sorriso doentio
curvando os lábios para cima.
Fecho os olhos e inspiro o ar para me acalmar.

Ele está fodido, o FBI estará aqui a qualquer momento e ele


será encaminhado para a cadeia de onde nunca mais vai sair.
Sherwood é podre, a escória, mas seu legado de crimes abruptos
chegou ao fim. E essa será, com toda a certeza, uma das maiores
satisfações da minha vida.

– Eu não vou contar para os outros o que você está fazendo,


se eu caí, nada mais justo do que todos eles caiam também –
acrescenta, levando uma mão ao queixo, pensativo. – Só me
pergunto como contará para Madelyn que está tentando derrubar o
pai dela, ou você não se importa?
– Meu relacionamento com Madelyn não é da sua conta –
respondo, entredentes, as veias de irritação pulsando ao lado do
meu pescoço.
Ele coloca as mãos para cima, fingindo rendição.

– Certo, não se estresse. – Continua rindo como um maldito


lunático e doente. – Só quero te alertar que até o final desse seu
plano de vingança, vai se surpreender, nada é o que parece.

– O que você está falando?

– Oh, rapaz, qual seria a graça se eu lhe desse a cereja antes


do bolo, hein? – Faz um sinal de despedida para mim. – Estarei no
inferno esperando pelos outros. Boa sorte no seu plano. E não se
esqueça, não pode mudar um mundo tão corrompido.

– Mas posso ao menos fazer a diferença.

Ignorando-me, ele caminha em passos leves por baixo das


arquibancadas até sumir de novo no escuro. Meu coração bate com
tanta força contra a minha caixa torácica que eu posso escutar o
zumbido nos meus ouvidos.
Me escoro contra um dos pilares e fecho os olhos, inspirando o
ar com calma pelo nariz e expirando pela boca, tentando abrandar
os meus nervos.

A hipótese de que os outros possam estar me associando com


o que está acontecendo me assusta, mas não o suficiente para me
fazer parar. Preciso recalcular o meu plano e terminar com os dois
que ainda restam de uma só vez.

Infelizmente, não poderei deixar o prefeito por último, não


posso correr o risco que desconfie ou ligue os pontos, assim como o
xerife fez, e anule qualquer prova que eu possa vir a ter contra ele.

Só espero que o coração de Madelyn sobreviva ao que está


por vir.

E o meu também.
 
Aiden parecia tenso quando retornou do vestiário, de banho
tomado e com roupas limpas, assim como durante todo o percurso
até o Dominators. Ele nem mesmo pareceu notar que eu mudei de
roupa no banco da frente do seu carro.

Sabia que sairíamos para comemorar, assim como imaginava


que pudéssemos ir ao clube, já que fazia um tempo que não
frequentávamos. Então separei um vestido preto, saltos altos e a
minha máscara.

Ele estaciona o carro em frente ao Dominators, ainda perdido


em pensamentos, azafamado por uma mente sobrecarregada.

– Ei, o que aconteceu? – pergunto, quebrando o silêncio.


Aiden desliga o motor e encara a paisagem de árvores à nossa
frente, os lábios comprimidos e uma veia de preocupação no centro
da testa.
– Não é nada, princesinha, vamos nos divertir – fala, por fim,
me lançando um sorriso que não chega aos olhos.

Percorro o caminho até a entrada ao seu lado, as mãos


entrelaçadas. O segurança nem mesmo pede os cartões ao nos ver,
ele simplesmente retira as chaves do bolso e libera a entrada.
A casa está cheia, como sempre, submissos e dominadores
desfilando pelo local. Aiden me leva até o balcão e pede duas
bebidas para nós, antes de se virar para mim e me puxar pela
cintura.

– Vamos beber um pouco, depois vamos para o nosso quarto,


Perséfone – fala, arqueando uma sobrancelha.

Coloco uma mão na boca para abafar uma gargalhada.

– Você sabe? – pergunto, ruborizando.


Achei que eu tivesse arrasado quando escolhi o apelido de
última hora, que Aiden pensasse que era a mais pura coincidência.

Ele se inclina para sussurrar no meu ouvido.

– Quando você mente, costuma franzir esse narizinho


arrebitado, eu sempre soube a verdade, sua mentirosa – sussurra,
prendendo o lóbulo da minha orelha entre os dentes.

Estremeço, arrepiando-me por inteira, calor escorre pelo meio


das minhas pernas. Finco as unhas nos braços dele.

– E por que não desmentiu?

As bebidas chegam e Aiden entrega um copo para mim, a cor


cobre do Whisky puro me faz franzir o rosto antes mesmo de sentir
o gosto forte do álcool.

– Você parecia fofinha demais tentando se convencer.


Reviro os olhos e engulo dois longos goles da bebida que
desce queimando pelo meu esôfago.

– Eu não fazia ideia de como as coisas funcionavam aqui,


fiquei sabendo que precisava de um apelido quando já estava no
clube e eu não consigo pensar sobre pressão, então eu inventei a
primeira coisa que me veio em mente quando me disse o nome que
costumava usar – explico, rindo ao lembrar da cena.

Aiden pousa a mão na curva do meu pescoço e acaricia a


minha pele com o polegar, os olhos fixos nos meus.

– Você foi uma das coisas mais importantes que já me


aconteceu, Madelyn – murmura, inclinando-se para encostar nos
meus lábios –, não se esqueça que isso é verdade e muito real.

Sinto a minha testa franzir e meu coração errar algumas


batidas.
– Aiden, o que está acontecendo? – pergunto, a voz
esganiçada pelo nervosismo.

Ele balança a cabeça e passa a ponta do nariz na minha


bochecha.
– Só me prometa que não vai esquecer que isso aqui é real,
que o que estamos vivendo é a coisa mais sincera que eu tive nos
últimos anos – implora, exprimindo os olhos.

Engulo em seco, angustiada.

– Eu prometo, Aiden, prometo porque sinto a mesma coisa que


você – aviso, pousando a mão em seu peito, sentindo o coração
bater acelerado contra a minha palma.

– Dane-se Miles e Emy, vamos subir – diz, me puxando pelo


braço em direção aos elevadores.

Sorrio, concordando com um aceno.


Aiden e eu somos explosivos, temos um jeito único de
demonstrar afeto, nós precisamos nos conectar, unir os nossos
corpos até sentir que somos um só.
Somos intensos. E temos uma sintonia perfeita.

Ele me agarra dentro do elevador, colando os lábios aos meus,


a boca me sugando, me possuindo em desespero. Demonstrando
em gesto o que não conseguiu proferir em palavras. As mãos voam
para a minha cintura, afundando em minha pele, me puxando para
si.

Pulo em seu colo, encaixo minhas pernas em seus quadris.


Sinto quando o elevador abre, chegando em nosso andar, mas não
é o suficiente para nos fazer parar.

Aiden me gruda contra uma parede, a boca deixando a minha


para descer ao meu pescoço, as mãos apertam minha bunda, me
movimentando, me esfregando contra o pau duro.

Sinto a porta em minhas costas. Ele retira o cartão de acesso


do bolso e a destranca, nos colocando para dentro do quarto
erótico.

Somos uma mistura de sentimentos, dois corpos cheios de


desejo e tesão, duas pessoas que não conseguem falar, mas sabem
demonstrar.
Ele me coloca no chão, a boca vermelha e inchada pelo beijo,
os olhos brilhando em desejo.

– Agora você é minha submissa, Madelyn, e vai fazer tudo o


que eu ordenar.

É irônico que eu tenha odiado a vida toda a submissão que


meu pai sempre impôs sobre mim, que eu tenha tentado me
desfazer das amarras dele, e, sem querer, nesse processo, tenha
caído nas amarras de outro homem. A diferença é que, neste caso,
eu quero ser submissa, eu quero me submeter para Aiden. Meu
corpo não sente repulsa, ele queima como o inferno. E eu sinto o
mais puro e genuíno prazer em fazer exatamente o contrário do que
sempre estive lutando.

Aiden aprendeu a dominar; eu gosto de ser dominada por ele.

Abaixo a cabeça, um calor insidioso corando as minhas


bochechas, uma onda de deleite expandindo em meu peito.
Concordo com um aceno.

– Sim, senhor.
Minha boceta pinga, calor se infiltra pelas minhas veias.

– Se ajoelha – ordena.

Removo os saltos e faço como ele ordenou, descansando as


mãos em cima das pernas dobradas, os olhos fixos nos seus.
– Agora chupa o meu pau!

Ele se aproxima, a virilha expondo o pau duro contra o tecido


da calça na altura do meu rosto. Com as mãos trêmulas, me
desfaço do botão e do zíper, abaixando o jeans pelas pernas
torneadas. A boxer preta está úmida pela lubrificação que escorre
pela ponta do pau. Me desfaço da última camada, liberando-o para
mim, o comprimento bate acima do umbigo.
Seguro o pau com a mão em punho, sentindo a textura da
pele, delineando as veias com a ponta do dedo, os pelos estão bem
aparados. Aperto as bolas pesadas, brincando com a sensibilidade.
Arrasto o dedo até o piercing que atravessa a glande, sentindo a joia
gelada.
– Se lembra da palavra de segurança? – pergunta, encarando-
me fixamente, observando cada toque meu.
Afirmo com um sinal.

Me inclino e chupo a ponta da cabeça, lambendo-o, sentindo o


gosto salgado da sua excitação pinicar a minha língua. Aiden
estremece e solta uma exalação. Salivo, umidificando o pau, antes
de engoli-lo em minha boca até uma parte.

Aiden é grande demais e eu muito inexperiente ainda para


conseguir fazer uma garganta profunda.
Deslizo o membro duro pela minha garganta, fodendo a minha
boca até o fundo. Retorno, chupando com força a glande, minha
saliva se mistura com o líquido pré-ejaculatório.
Ele agarra os meus cabelos, segurando-os com a mão em
punho e joga a cabeça para cima, gemendo.
– Porra, Madelyn, que boca gostosa – sibila, trêmulo.

Passo uma mão nas bolas macias, massageando-as enquanto


mantenho o ritmo das estocadas em minha boca, sempre
esfregando a língua na ponta que é mais sensível antes de engoli-
lo.
Chupo Aiden com vontade, o barulho da sucção ressoa pelo
quarto vazio, misturando-se com os sons dos seus gemidos. Minha
boceta pulsa, molhada e ansiosa para ganhar atenção.
Aiden começa a tremer, as pernas se retesam, fincando os pés
no chão com força, os músculos se contraem contra os meus dedos.

Aumento o ritmo, deslizando-o para dentro e para fora,


mamando em seu pau. O piercing toca no céu da minha boca e me
faz cócegas, me fazendo estremecer.
Ele me puxa pelos cabelos, removendo o pau da minha boca.

– Chega, eu quero gozar na sua boceta hoje – avisa,


empurrando as pernas para os lados, desfazendo-se das calças. –
Tira a porra das roupas que eu vou te foder, Madelyn.

Me levanto e removo o vestido pelos ombros, deslizando-o


pelo meu corpo até o chão. Meu conjunto vermelho de lingerie
rendado é novo e serve para essa ocasião em específico.

– Olhe só para você... – murmura Aiden, os olhos vagueando


pelo meu corpo, a mão masturbando o pau duro e molhado pela
minha saliva – gostosa.
Ele solta o membro e vem até mim, uma mão voa para as
minhas costas e abre o sutiã, liberando os meus seios pesados. Ele
se inclina e segura um na boca, chupando o bico duro e arrebitado.
Solto um gemido, segurando em seus ombros.

– Aiden... – choramingo.
Ele passa a boca para o outro, a língua dura rodeando a
aréola, antes de chupar o seio com tanta pressão que um gemido
alto se desprende dos meus lábios.

– Vamos para a cama, Maddie.

Aiden me conduz até o colchão duro, meu corpo desliza pelos


lençóis pretos. Ele me vira de quatro e começa a amarrar as minhas
mãos nas algemas que tem ao lado.

– Por que nós nunca nos chamamos de apelidos? – pergunto,


me lembrando dos codinomes idiotas enquanto ele fecha uma
algema em meu pulso esquerdo.

– Porque as pessoas que usam apelido estão aqui para se


divertir e usam o clube como uma válvula de escape, não é real, é
só prazer. – Ele vai até o meu braço direito e prende o pulso, antes
de fazer a volta e prender os meus pés na mesma posição dos
braços. – E o que nós temos é real, sempre foi, desde a primeira
vez. Não precisamos nos esconder por trás de codinomes.
Ele puxa a minha calcinha com força, arrebentando o tecido
fino. Suspiro.

– Outra calcinha nova, desse jeito vou precisar abrir uma conta
em seu nome em uma loja de lingerie para cobrir os gastos –
murmuro.

– E eu vou pagar cada maldita calcinha, desde que eu possa


arrebentá-las todas as vezes e ficar com elas para mim.

Não consigo vê-lo, mas sinto-o se afastar e ouço o barulho de


uma gaveta ser aberta. A lembrança da primeira vez em que
estivemos aqui me atinge em cheio, me deixando ainda mais
molhada.
– Tudo bem, acordo fechado.

Ele se aproxima de novo e se acomoda atrás de mim, a cama


afunda sob o seu peso.

– Só vai gozar quando eu disser – avisa.

Não tenho tempo de perguntar, ele liga um vibrador forte e o


coloca em cima do meu clitóris, pressionando-o. Solto um grito forte
e me remexo, mas sou impedida pelas correntes que pinicam os
meus pulsos.
– Aiden... por Deus... – balbucio, inclinando a bunda para cima.

Meus pelos se arrepiam assim que ele começa a mexer o


vibrador para cima e para baixo no meu clitóris.
Sinto o orgasmo se aproximando, minha boceta contrai.

Então Aiden remove o vibrador no momento em que eu estava


quase.

– Seu filho da mãe! – urro, tremendo pelo orgasmo rompido.


– Eu disse que só vai gozar quando eu disser – contrapõe,
rindo feito um maldito.

Minha respiração está densa e suor escorre pelas minhas


costas, meu corpo começa a se acalmar. Aiden coloca a porra do
vibrador de novo, meu clitóris está inchado e muito pronto para me
dar um bom orgasmo.

– Não serei bonzinho com você, Madelyn, sou o dominador e


faço o que quiser com esse corpo – avisa, mexendo o vibrador em
círculos.

Rebolo contra o aparelho, gemendo e trincando a mandíbula


pela nova onda de prazer que se instala na boca do meu estômago.
Queria que ele estivesse me fodendo, ao menos com os dedos,
sentir o contato da sua pele.

As correntes rangem quando, mais uma vez, tento me mexer.

Jogo a cabeça para cima e fecho os olhos, o orgasmo prestes


a explodir.

Aiden remove o aparelho.

– Que inferno, Aiden, qual é o seu problema? – esbravejo,


respirando com dificuldade, o peito subindo e descendo em rápidas
sucessões.

A risada rouca dele chega aos meus ouvidos.

– Calma, princesinha, você está muito impaciente.

Desgraçado!

Aiden desliga o vibrador e se posiciona atrás de mim, sinto a


ponta dos seus dedos na minha boceta, esfregando-a.

– Está encharcada – sussurra, brincando com o líquido.


– É claro seu maldito, você está me... – Não termino de falar,
as palavras não passam de um gorgolejar assim que ele desliza
para dentro de mim, enfiando-se até a base – Puta merda!
Aiden estoca com força, rebolando os quadris em um círculo
perfeito, o piercing acertando o maldito ponto dentro de mim. Ele me
fode duro, entrando e saindo.

Explodo em um orgasmo, tremendo e gritando até ficar rouca.

– Você está me esmagando, Maddie – diz, as mãos seguram


os meus quadris para me manter no lugar enquanto me fode –, e
agora entendeu por que a privação do orgasmo? Deixei esse clitóris
gostoso bem estimulado.
Saliva escorre pelos cantos da minha boca quando Aiden mete
com brutalidade, me fodendo em uma velocidade vertiginosa. Na
posição em que estamos, o pau entra até o fundo.
– Aiden...

Afasto um pouco mais as pernas e agarro os lençóis com as


mãos em punho até os vincos embranquecerem pela força. Outra
onda de prazer me faz urrar e estremecer, apoderando-se de mim
com tanta potência que tudo ao redor começa a girar.
– Madelyn, essa boceta tá me esmagando, eu vou gozar,
caralho! – grunhi, apertando as mãos com mais força em minha
pele.
Gozo com tanta intensidade que minha cabeça cai no colchão,
trepidando de prazer, os músculos parecem ter se tornado
gelatinosos. Aiden ruge, gozando comigo, sinto o seu corpo tremer
contra o meu.

Mantenho os meus olhos fechados, apreciando o torpor, os


espasmos se desfazendo aos poucos, diminuindo com o passar dos
segundos.
Ele beija as minhas costas.

– Você é perfeita, Maddie, feita pra mim – murmura contra a


minha pele.

Sorrio, ainda com os olhos fechados.


Aiden remove as algemas dos meus pulsos e dos meus pés e
me acomoda na cama, meu corpo ainda grogue, sem forças para
fazer nada. Ele se deita ao meu lado e me puxa para o seu peito,
ouço o retumbar do seu coração.

Eu amo Aiden Thorne.

Estou completamente rendida e apaixonada por ele.

Só espero que ele corresponda o que sinto.

– Temos uma sintonia, Aiden – comento, sentindo o calor da


sua pele, a respiração rítmica.
– Sim, princesinha – confirma, beijando o topo da minha
cabeça.

Fecho os olhos, sentindo a conexão dos nossos corpos,


apreciando a química que temos, a afinidade que compartilhamos.

– Obrigada por ser incrível – sussurro, sonolenta.

Aiden enrijece embaixo de mim e me aperta ainda mais em


seus braços.

– Obrigado por me tirar da escuridão. – Ouço-o, antes de cair


no mundo dos sonhos.
 
A prisão do xerife e a confissão dos crimes se tornou o
principal assunto da cidade. Foi uma confusão e tanto, sendo
narrado pela boca de cada pessoa dessa sociedade.

Ao que tudo indica, a polícia conseguiu descobrir a identidade


das meninas dos vídeos e chegar até elas. Parece que elas
estavam em um orfanato e que o diretor as obrigava a gravar o
conteúdo adulto para que pudesse vender na Dark Web. Ele foi
preso e as meninas recolhidas para que pudessem ser ajudadas.

No entanto, algo me incomoda muito nesse assunto.

Como foi que Sherwood conseguiu os vídeos, sendo que ele


mal soube escondê-los no computador? Alguém experiente, como a
pessoa que o juiz pagava, teria criptografado os vídeos. Mas não o
xerife, ele só simplesmente saiu enfiando uma pasta dentro da outra
como um idiota tentando camuflar as merdas que costuma fazer.
Encaro o teto do meu quarto, a mente vagando a distância,
pensando sem nunca parar.

Preciso me livrar dos dois últimos, mas como fazer isso quando
ainda tem o fator mais importante de todos?
Madelyn.

Esfrego o rosto, esgotado de toda essa merda, exausto de


tudo isso.

Não me arrependo de ter ficado com Maddie, ela foi a coisa


mais incrível que me aconteceu. Nosso relacionamento foi a
situação mais extraordinária na minha vida, em uma vida marcada
pela morte, corrupção e todas as merdas que a sociedade carrega
ao começar a acessar a Dark Web.

Eu me apaixonei.
Eu me apaixonei pela filha do assassino do meu pai. Pela filha
do inimigo. E não poderia estar me fodendo menos para isso.

Madelyn não é que nem ele. Nem meramente parecida.

E é justamente por isso que eu preciso contar toda a verdade


para ela, embora não queira manchar a sua alma com essa sujeira.

Ou eu a deixo viver em paz, livre de mim, sem saber o que


aconteceu. Ou eu conto a verdade. E a primeira opção nem está
mesmo em pauta.
Meu computador apita, me assustando e me fazendo levantar
da cama em um pulo. A tela pisca em preto e branco.

– Que porra é essa? – pergunto, aproximando-me com calma


como se a máquina fosse explodir.
O alerta faz cócegas nos meus ouvidos, soando alto no quarto
vazio.

Letras começam a aparecer, alguém está digitando.

Invadiram a porra do meu computador.

Olá, Aiden Thorne.


Para um hacker tão brilhante e experiente como você, acessar
os sites proibidos direto da rede Wi-Fi é um pouco ingênuo... a não
ser que tenha feito de propósito... o que não me surpreenderia, não
vindo de uma mente tão genial.

Encaro a tela com a testa franzida, o coração na boca, as


mãos trêmulas em punho e empapadas de suor.

Entrar nesses sites com a rede Wi-Fi é, de fato, um risco, mas


estava tão anojado com tudo o que havia visto nas pastas do xerife
que pouco me importei com as consequências.

Inferno!

Não posso acreditar que fui pego.

Outra mensagem surge na tela.

Enfim, quero dizer que conheci o seu pai... ele entrou em


contato porque tentava descobrir os crimes cometidos por essa
quadrilha, assim como você está fazendo, embora eu acredite que
por motivos diferentes do dele.

 
Não consigo respirar, o ar se torna rarefeito, com o coração
descompensado, encaro o computador.

Sou o contato do FBI, é comigo com quem você vem se


comunicando este tempo todo. Fui o encarregado de repassar as
provas, de presidir com a prisão dos indivíduos.
O fato é, Aiden, você sabe que tudo isso é muito maior do que
uma vingança, meu caro? O juiz e o xerife não passaram de peças
pequenas no tabuleiro de xadrez.

Preciso da sua ajuda. Chegarei na cidade em breve e estarei


disfarçado como o suposto novo xerife. Haverá um baile beneficente
de máscaras em pouco mais de um mês, não posso hackear as
câmeras sem autorização judicial, assim como não receberei uma
sem que tenha provas. Como eu disse, as coisas são muito maiores
do que você pensa e estou atrás dessa gente há muito, muito
tempo.

Quero prender os culpados. Você quer a vingança pela morte


do seu pai, eu quero encerrar esse caso que mancha a minha
carreira. Juntos, seremos uma dupla incrível.

Conto com você para isso.

Nos vemos em breve.


 

BEBN TDPUU

 
O computador para de apitar e a tela para de piscar, ficando
pausado na mensagem que eu recebi.
Encaro a assinatura, lendo e relendo as letras, vasculhando
em minha mente uma explicação óbvia para isso.
Me sento na cadeira e puxo uma folha, retiro um lápis e
começo a escrever. Ele assinou em criptograma, um método de
código avançado. Neste método, o código geralmente é feito pela
letra seguinte de cada letra do alfabeto tradicional na direção
padrão.

Decodifico letra por letra, não levando mais do que poucos


minutos.

 
ADAM SCOTT

Ele fez de propósito, é claro, poderia dificultar mais, mas fez


uso do criptograma mais simplório para ser identificado.
Agarro os lados da cabeça e encaro o nome por minutos
intermináveis, perdido e absorto em pensamentos.
Ele conhecia o meu pai? Como?

Sabia que ele estava investigando o que não deveria, mas


nunca tive conhecimento de que havia entrado em contato com o
FBI.
Me levanto, a cadeira range com a falta do meu peso. Caminho
de um lado para o outro, pensando, refletindo.

Céus... e se o meu pai soubesse muito mais do que eu


achava?

Suspiro, uma angústia comprime o meu peito, me fazendo


exalar uma respiração ruidosa. A dor, minha velha companheira,
retorna com força total.
Esfrego a pele em cima da área do coração, afundando os
dedos em uma falha tentativa de tentar diminuir o que sinto, mas
não funciona, nada adianta.
As lágrimas embaçam a minha visão e eu preciso inspirar o ar
lentamente para afastá-las.

Não é hora de surtar. É hora de descobrir o que posso. Estou


chegando perto do meu objetivo, perto de remover o fardo que
encobre a minha alma, que mancha o meu coração.

A vingança não trará o meu pai de volta, eu sei, mas trará um


pouco de acalento para uma alma tão denegrida pela podridão
humana.

Esfrego o rosto, afastando a dor, inflando meu coração de ódio,


pois é ele que faz com que eu veja as coisas com clareza, é ele que
me move.
Retorno para o computador decidido a decifrar cada enigma da
mensagem de Adam Scott.

Miles e eu encaramos em silêncio a ficha técnica do policial


que estampa a tela do computador à nossa frente.
Ele não mentiu o nome, nem o cargo no FBI, muito menos
tentou esconder a verdadeira identidade. Adam Scott é real.

– Parece fácil demais – comenta Miles, tamborilando a ponta


da caneta nos lábios.
– Concordo, mas se ele queria a minha confiança, não seria
idiota para me dar um nome falso, sabe que eu descobriria.
Há umas semanas ouvi Grace comentar sobre o tal baile
beneficente de máscaras do prefeito. A festa ocorrerá em uma casa
de campo da família e só as pessoas mais renomadas da alta
sociedade estarão presentes, o objetivo é acumular fundos para
doar ao orfanato local.

– E você vai fazer o que ele disse? – Me lança um olhar


enviesado, preocupação franzindo os lábios.
Escoro a cabeça contra o encosto da cadeira e encaro o teto,
cansado de toda essa merda. Se eu não tivesse visto tanto, me
sentiria jovem demais para acumular um cargo tão pesado, mas
depois que uma alma é manchada, nada se torna difícil demais para
se carregar.

– Ele pareceu falar a verdade – murmuro em um suspiro –,


também tocou no nome do meu pai, Miles.

Ouço o roçar das roupas dele contra a cadeira e sei que está
inquieto, tão preocupado e sobrecarregado quanto eu.

Não queria envolvê-lo nisso, mas Miles é o meu melhor amigo


desde que eu lembro que o mundo é, de fato, mundo. Mesmo que
tentasse, não conseguiria esconder tudo dele. Me culpo um pouco
por tê-lo trazido para o meio de toda essa merda, mas há coisas que
não podem ser alteradas depois que foram feitas.
– Certo, mas como vamos saber que não é uma emboscada
ou algo do tipo? – questiona, comprimindo os lábios.

– Em um baile de máscaras? – Solto uma risada enfezada. –


Se ele quisesse me atrair para uma emboscada, não acha que seria
algo mais eloquente como um galpão abandonado?

Ele revira os olhos.


– Seu pai foi morto à luz do dia em um estacionamento, Aiden
– contrapõe –, não quero arriscar e perder o meu melhor amigo.

A sombra de um sorriso de orgulho delineia os meus lábios.

– Obrigado por isso, mas eu coloquei minha cabeça em jogo


no momento em que voltei para a cidade e comecei a mexer no
ninho das vespas.

– Cara, você é teimoso pra caralho! – brada, levantando-se,


irritado. – Tudo bem, mas eu vou ficar cuidando cada uma das
câmeras, qualquer sinal de que é uma cilada, coloco a porra da
polícia, CIA, FBI, tanto faz... para dentro daquela casa.

Confirmo com um sinal.


– Não vai ao baile? – indago, cruzando os braços.

– Precisa de alguém de confiança para deixar por trás das


provas, serei essa pessoa.
Ele tem razão, não confiaria em ninguém mais para assumir
este cargo. Além de tudo, se alguma merda acontecer, não quero
Miles dentro do salão, quero-o longe e protegido.
Se eu cair, ninguém pode chegar até ele, não podem nem
mesmo cogitar que ele sabe de alguma coisa. Precisam pensar que
eu trabalho sozinho e que sempre foi assim.

– Tem mais alguma coisa em mente, não é? – sibila,


encarando-me com intensidade.
Eu disse que não teria como esconder as coisas de Miles, ele
me conhece bem demais para que consiga manter algum segredo
desse desgraçado.
– Tenho que invadir o celular do prefeito e do irmão – afirmo,
movendo a cadeira para os lados –, ele disse que precisava de mais
provas, então preciso conseguir cada uma delas.
Miles abre a boca, as sobrancelhas erguidas em indignação.

– Porra, você é um fodido mesmo! – ataca, a pele do pescoço


ficando vermelha. – E como acha que vai conseguir invadir o celular
deles?

Dou de ombros.

– Como eu invadi os computadores do juiz e do xerife, talvez


com um pouco mais de dificuldade, mas preciso conseguir,
independentemente.

– Isso é arriscado...

Aceno.

– Provavelmente, mas para terminar de derrubar o grupo,


preciso acabar com esses dois. – Me levanto da cadeira e pego um
cigarro, retirando-o do maço e prendendo entre os lábios. Acendo e
dou uma tragada na nicotina, acalmando os nervos aflorados. –
Arrumar um juiz e um xerife que se corrompa é fácil, por isso preciso
derrubar o pilar para dar fim de vez a essa quadrilha.

– Então o plano é invadir os celulares e depois as câmeras?

– Sim. As câmeras é tarefa fácil, talvez a mais acessível delas.


Só precisamos descobrir a empresa encarregada por essas
câmeras e então a coisa é feita em pouco tempo. Já os celulares é
um pouco difícil, se ao menos eu tivesse acesso aos aparelhos... –
comento, pensativo.

– Uma hipótese, claro, a ser desconsiderada, já que nunca terá


acesso a estes aparelhos – refuta.

Eu poderia ter acesso fácil ao celular do prefeito agora que


tenho entrada privilegiada em sua casa, mas jamais usaria o meu
relacionamento com Madelyn para conseguir isso. Já me sinto um
desgraçado por estar omitindo a verdade dela, não quero e não irei
acrescentar mais uma culpa para carregar. O que Maddie e eu
temos é verdadeiro, e a única coisa sincera e real no meio de tudo
isso.

– E você sabe no que eles estão envolvidos ou tem pelo


menos uma ideia? – continua.

Assopro a fumaça e seguro o cigarro entre os dedos.

– Não, mas sei que todos eles tinham um esquema, embora o


juiz e o xerife tenham caído por crimes que cometiam e não
estavam interligados a este esquema.

Eu não sei qual é o envolvimento entre eles, onde começa e


onde termina. Mas preciso descobrir.

– E quanto a Madelyn? – indaga, mudando de assunto.

– Ainda estou pensando no que fazer.

Miles solta uma risada desprovida de humor. Ele desaprova o


fato de que estou tentando manter Madelyn longe dessa sujeira
toda, mesmo que seja praticamente impossível.

– Pensando no que fazer? Como acha que ela vai ficar quando
descobrir que foi o pai dela que mandou matar o seu e que você só
está aqui por vingança, para acabar com a família dela?

Cerro a mandíbula, trincando os dentes com tanta força que


sinto uma dor aguda na gengiva.

– Nunca mais fale isso em voz alta... – ameaço, bramindo


entredentes.

A porta do quarto é empurrada com força e Madelyn surge com


os olhos cheios de mágoa e raiva.

– Ele não precisa mesmo, eu já ouvi tudo – diz, em tom de voz


sério.
Não consigo me mexer, estou em pânico, em desespero com a
situação.
– Maddie... – Seu nome resvala pelos meus lábios como um
sussurro, um choramingo.

Sinto uma dor absurda na boca do estômago como se tivesse


levado um soco. Meus músculos pesam e ardem.

A constatação de que estou prestes a perder Madelyn faz com


que um buraco se abra em meu peito, tornando difícil até mesmo
respirar. Embora eu tente, o ar parece ignorar os meus pulmões.

Estou apavorado.
Tento sufocar a angústia crescente, engolindo-a fundo para
que consiga, de alguma forma, me explicar e me redimir, mas a dor
progressiva me sufoca tanto que não consigo nem mesmo mexer a
língua, não consigo fazer nada além de ficar horrorizado, me
transformando em um completo inútil.

Ela foi a única coisa boa que me aconteceu nos últimos


tempos, por favor... Imploro mentalmente para ninguém em
específico. Para um Deus que não acredito. Para o céu que não
responde aos pedidos.

Eu não posso perdê-la. Não posso.

Madelyn. A garota dos olhos sinceros e sorriso genuíno. A filha


do inimigo. A garota que me tirou da escuridão. A garota por quem
eu me apaixonei de forma profunda e crua. A garota que cavou em
meu peito, abrindo passagem até chegar a um coração a muito
tempo adormecido.

Pensei que estivesse quebrado demais para me importar,


danificado o suficiente para sentir.

Mas eu estava enganado.


Até o homem mais sofrido é capaz de ser restaurado. É capaz
de sentir de novo. É capaz de encontrar a luz. É capaz de amar
outra vez.
Dou um passo para frente, mas cesso quando Madelyn dá um
para trás, afastando-se, querendo manter distância de mim.

Balanço a cabeça, as lágrimas turvam a cena.


Nada parece importar agora. Nada além dela.

Eu não queria manchá-la, não queria torná-la como eu. E


agora eu vou perdê-la por isso.
Não!

Os olhos castanhos transparecem toda a indignação que


sente, Madelyn me encara com raiva e nojo. Uma lágrima solitária
rola pela bochecha direita, o único indício de que está sofrendo
quando mantém o maxilar erguido beligerantemente.
Ela é forte e determinada, por isso, embora possa estar se
sentindo tão destruída como eu estou me sentindo neste momento,
tentará ao máximo não deixar transparecer.
– Por favor... – imploro, erguendo o braço em sua direção.

Quero implorar que me ouça, que fique e escute o que tenho a


dizer, que não termine de destroçar os restos que ainda me restam.
Em qual momento Madelyn se tornou tão importante ao ponto
de ter o que restou do meu coração em suas mãos?

Nossa intensidade é natural e nossa ligação é avassaladora. E


é por isso que não tenho a resposta para a pergunta, porque de
alguma maneira tudo aconteceu nos últimos meses sem que
nenhum de nós percebesse.

Ela remendou o que foi quebrado.


Mas está prestes a destroçar sem que haja um novo conserto.
 
Eu não cheguei a tocar a campainha, a senhora Wild estava
aparando o jardim e disse que eu poderia entrar.

Mas, se pudesse voltar no tempo, jamais teria feito isso.

Encaro Aiden com o coração sangrando. Nada do que já tenha


me acontecido se compara ao que estou sentindo agora, a dor
resoluta e agoniante.

Eu quero gritar.
Mas a minha voz já foi gasta.

Eu quero chorar.
Mas as minhas lágrimas secaram.
Era para ser apenas uma corrida rotineira e uma visita
surpresa na casa do namorado. Não isso. Longe desse desastre.
Sem os vislumbres da verdade consternante.
Eu não consigo respirar direito diante de tudo o que acabei de
ouvir.

Meu pai é o responsável pela morte do pai do Aiden?


Céus!

Não acho que ele seja a melhor pessoa do mundo, nem


mesmo colocaria a mão no fogo por ele, embora seja sua filha. Mas
assassino? Isso sim é difícil de engolir.

E quanto a Aiden? E quanto ao que vivemos?

Eu me apaixonei por um mentiroso?


Fui alvo de vingança?

Então tudo o que tivemos não foi real?

Um soluço se desprende dos meus lábios conforme eu vou me


desfazendo, perdendo a postura ereta e altiva.

Dói.
– Foi tudo mentira? – sussurro em um fio de voz.

Aiden balança a cabeça, o rosto bonito deformado,


transtornado em dor e ressentimento.

Eu quero ir embora, mas não consigo.

Preciso entender se eu fiz parte do jogo dele, do plano de


acabar com a minha família. Preciso entender por qual motivo ele
fez isso comigo, fez isso conosco, quando eu não passava de uma
inocente no meio disso tudo.
– Não é nada do que está pensando, eu juro – responde, tão
abalado quanto eu.

Miles se mantém imóvel e silencioso no canto do quarto,


apavorado, entreolhando de um para o outro, sem saber o que fazer
ou como agir.

– Então explica, porra! – grito, tirando forças de onde nem


sabia que tinha.

Aiden joga o cigarro que mantinha entre os dedos em um


cinzeiro ao lado da cama e esfrega os cabelos, bagunçando-os. Os
olhos estão tristes e expressivos.

– Eu retornei para a cidade em busca de vingança, mas nunca


te coloquei no meio disso, eu nem mesmo queria me aproximar de
você justamente por este motivo.

Comprimo os lábios, afastando algumas lágrimas com o dorso


da mão.

– E ainda assim se aproximou, então qual era o plano, Aiden?


Não pensou onde eu entraria nessa história?

– Eu me culpei por todos esses meses em que estivemos


juntos, Maddie, nunca pense que eu segui a vida ou que não me
importava. De tudo o que aconteceu comigo, você foi a melhor coisa
delas.

Dou um passo para trás, letárgica, como se tivesse sido


atingida por um soco.

– Mentiroso! – sibilo, as novas lágrimas embaçando a minha


visão.

– Não, não é mentira! É a verdade, por favor, você precisa


acreditar em mim. – Ele tenta se aproximar, mas eu me esquivo do
seu toque. – Maddie, por favor.
– Eu não acredito em você! Qual era o plano, Aiden? Seduzir e
depois me abandonar? Destroçar o meu coração? Era isso que
pretendia fazer? Pensou que assim poderia atingir o meu pai de
alguma maneira?

Tudo parece tão irreal que eu mal consigo respirar, o meu


coração está na boca, batendo descompensado e
descontroladamente. Minhas mãos e minhas pernas tremem tanto
que preciso me esforçar para não cair estatelada no chão.

– Não! Eu nunca te culpei por nada, nunca nem mesmo cogitei


induzi-la à culpa pelos erros do seu pai. – Ele se retesa, franzindo a
testa. – O que aconteceu entre nós dois foi involuntário, natural. Por
mais que eu tenha tentado ficar longe de você, eu não consegui, era
como se me sugasse como um ímã, como se pertencesse a mim
assim como eu pertenço a você.
– Então porque mentiu, Aiden? Por quê?
– Porque você é pura, Maddie, é linda e cheia de luz, eu não
queria manchar a sua alma, não queria que abraçasse a mesma
escuridão que me consome.
Deus!

Uma conversa de quando nos conhecemos me alveja. Aiden


disse que tinha uma escuridão profunda e que eu não gostaria de
entrar nela.
Agarro os meus cabelos com força, puxando-os até o couro
cabeludo queimar. Isso não é real. Não pode ser. Tudo é ilógico.
Tudo.
– O juiz... o xerife... – Engulo em seco, sem conseguir terminar
a frase.

Aiden acena.
– Eles fizeram parte do esquema.
– Foi você – murmuro, fechando os olhos com força.

Não é uma pergunta, mesmo assim ele responde:

– Sim. Eu fiz isso.


O juiz foi preso por vender sentença, por ser corrupto. Já o
xerife foi preso por ser um pedófilo de merda. Ambos os homens
com quem eu convivi.
Então meu pai é um assassino? E quanto ao meu tio, qual
culpa ele carrega?

Sinto o gosto da bile na boca e preciso controlar a respiração


para não colocar o almoço pra fora.

– O seu... seu pai? – gaguejo.

– Ele estava investigando o grupo, por isso foi morto.


Não! Deus!

Deixo o choro desandar, desabrochar pelos meus olhos e


correr pelas minhas bochechas. Não consigo controlar a onda de
dor, a angústia profunda e desalenta.
Sinto como se estivesse morrendo.
E, talvez eu realmente esteja, talvez uma parte minha que
nunca mais poderá ser restaurada. Talvez eu esteja me perdendo
para sempre.

– Maddie... – Ouço a voz de Aiden soar através do torpor em


que me encontro.

Eu não quero ouvir mais nada. Eu não quero pensar em mais


nada. Eu nem mesmo queria ter ouvido uma parte da conversa
deles através da porta entreaberta.
– Você nunca me contaria a verdade – constato, engolindo o
choro.
Recebo outra lembrança. Quando me conheceu, Aiden me
chamou de “princesinha da divisão”, na ocasião eu não entendi o
que isso significava. Mas agora eu entendo a ambiguidade das
palavras proferidas.

Ele pode não me culpar pelas atitudes do meu pai, mas omitiu
a verdade, não confiou suficientemente em mim.

– Eu teria que falar em algum momento, só não sabia quando.


– Não! Você mentiu durante todos esses meses, me fez
acreditar em você, fez com que me apaixonasse por você! – acuso,
erguendo um dedo em riste em sua direção. – Eu confiei em você,
Aiden, mas o sentimento não foi mútuo.
Se eu ainda tinha um coração, depois de hoje haverá um
espaço vazio em meu peito porque ele acabou de ser destruído de
uma forma que nunca mais haverá conserto.

– Eu confiei sim, Maddie, por favor você precisa me ouvir –


grita, desesperado, tentando conseguir a minha atenção, tentando
me fazer engolir a sua verdade. – Juro que não queria me
aproximar, mas como eu disse, foi tudo tão natural, tão certo... eu
me apaixonei por você. E eu pretendia contar, mas tive medo da sua
reação, tive medo de te quebrar, medo de te perder.
Mais uma vez, tenta se aproximar e eu me afasto.

– Fique longe de mim – cuspo.

– Eu te amo, Madelyn, e não estou confessando isso somente


para convencê-la a ficar comigo ou para me perdoar, estou falando
isso porque é a mais pura verdade. Eu te amo profundamente. Te
amo tanto que chega a ser irracional. Você foi a única pessoa que
conseguiu me tirar da escuridão, a única que fez com que meu
coração voltasse a sentir, a única que me trouxe de volta à vida.
Tudo queima dentro de mim, arde como se o inferno estivesse
fazendo uma festa em meu peito, saltitando acima do meu coração.

– Eu vim sim para a cidade em busca de vingança, mas jamais


imaginei que encontraria além dela. Acha que não me culpei por ter
me apaixonado por você? Por estar, de alguma forma, traindo o meu
pai? Desonrando a sua morte! Você é a filha do homem que o tirou
de mim. Mas... de alguma maneira sarcástica, é a única que
conseguiu me tirar do penhasco no qual o seu pai me empurrou. –
Ri sem humor, a voz rouca, enfraquecida. – Eu me culpei pelo que
sentia por você, mas nunca a culpei pelos erros do seu pai. E,
depois de muito tempo, entendi que nós só somos consequências
dos atos deles. Não há culpa para nós, mas há uma segunda
chance.

Me agarro contra o marco da porta e giro nos calcanhares,


trêmula, cansada, exausta.

– Madelyn, por favor... – suplica.


Arrasto as pernas para fora do quarto, os pés pesados.

– Eu juro que não queria isso, que só não falei nada porque
não queria te envolver.

Uma risada trêmula separa os meus lábios.

– E não pensou que eu sempre estive envolvida? Se o meu pai


é culpado, acha que eu ficaria de fora de que jeito? – pergunto,
encarando-o por sobre o ombro.

– Eu nunca te comparei com ele, Madelyn, nunca! Eu só... não


queria te ver sofrendo.

– E como acha que estou me sentindo agora? – grito.


– Sinto muito, eu só... sinto muito.

– Lamentar não vai mudar as coisas.

– Eu sei, só quero que me entenda, que veja o meu lado.


– Assim como espero que você veja o meu, Aiden. – Desço o
primeiro lance de escada. – Preciso de tempo, preciso espairecer,
ouvi e descobri muitas coisas hoje.

– Nós dois fomos a única coisa real que aconteceu no meio do


caos que é as nossas vidas, Maddie – fala, suspirando às minhas
costas – Eu te amo, e isso, nem você e nem eu, poderemos mudar,
não importa o que aconteça de agora em diante.

Saio da casa sem olhar para trás, correndo para fora como se
ela estivesse pegando fogo e a minha vida dependesse só de mim
para fugir.

Minha mente está um turbilhão, uma mistura de lembranças e


sensações.

Eu não tinha como imaginar tudo isso que se sucedeu, nem


por um momento passou pela minha cabeça uma hipótese dessas.
Doeria de qualquer forma ouvir a verdade, mas eu preferiria
que Aiden tivesse sido sincero comigo, ao menos desde o momento
em que começamos a nos envolver, ou quando me pediu em
namoro há alguns dias.

Eu contei tudo para ele, falei a verdade sobre a minha vida,


sobre a opressão que vivo em relação ao meu pai e sua carreira. No
fundo, entendo que o seu segredo era muito maior, muito mais
doído e profundo. Mas eu precisava saber.
Engulo em seco, perambulando pelas ruas sem me ater ao que
acontece ao meu redor.
Meu pai tem muitos defeitos, inúmeros, incontáveis, mas
associá-lo a um assassinato é brutal, quase inimaginável.

Nunca culpei o meu pai e sua personalidade por ser como é,


sempre preferi pensar que foi a carreira que mudou ele, que fez com
que precisasse se dispersar do seu verdadeiro eu. Sempre preferi
imaginar assim ao invés de aceitar o fato de que ele ama o dinheiro
e o status acima de tudo, até mesmo de mim, sua única filha.

Mas as descobertas de hoje mudam totalmente a situação,


desvanecendo-se das esperanças de uma jovem ingênua que só
queria ser amada pelo progenitor.

Ele não é um bom homem. Ele nunca foi.

Tapo a boca com uma mão, engolindo outro soluço que insiste
em vazar pelos meus lábios trêmulos. Não importa o que eu ache,
não deixa de doer menos.

Eu não era totalmente ingênua, não vivia rodeada por uma


bola de cristal. Desconfiava de algumas atitudes do meu pai, mas
ignorava porque pensava que fosse implicância minha com ele.
Preferia acreditar que ele era um homem de caráter límpido, já que
sempre cobrou de mim a perfeição, sempre zelou pela boa-fama da
família.

Maldito hipócrita!

Como Aiden conseguiu ficar comigo depois de tudo o que ele


fez? Como Aiden teve tanta maturidade para não estender esta
culpa a mim?

“Eu te amo”, ele disse com tanta convicção, tanto medo, tanta
dor. As palavras dele entoam na minha mente a cada retumbar
rítmico do meu coração.

Minha vida é uma teia de mentiras.


Pensei que Aiden fosse daquele jeito porque sofria até hoje
pela morte do pai, o que não deixa de ser verdade, mas ele só é
assim tão quebrado, não pela morte em si, mas por como ela se
sucedeu. O pai dele foi assassinado, teve a vida ceifada, foi roubado
de Aiden de maneira abrupta, enquanto o mandante continuou como
se nada tivesse acontecido, seguindo a vida sem nunca ter sido
declarado culpado.

Aiden não é cheio de luto. Ele é um poço de ódio absoluto.

E eu sou uma montanha de mentiras.

Pisco, reparando que acabei de entrar na rua da minha casa,


mesmo que tenha mantido passos sem um rumo exato nos últimos
minutos.

Meu relacionamento com Lennon foi uma mentira.

A imagem que lapidei do meu pai era uma mentira.

A vida que eu vivi até agora foi uma mentira.

Mentiras e mais mentiras.

“Nós dois fomos a única coisa real que aconteceu no meio do


caos que é as nossas vidas”.

Eu não consigo suportar.

Dói tanto.
Esfrego os olhos com as pontas dos dedos, antes de parar na
porta da entrada de casa e inspirar uma grande lufada de ar. Preciso
me acalmar, entrar e correr para o meu quarto.

Giro a maçaneta e entro na ponta dos pés.

A casa está silenciosa, mas as janelas estão abertas, o que


significa que minha mãe está aqui. Atravesso a sala e me direciono
para as escadas, pisando no primeiro degrau quando uma voz me
para.
– Madelyn – a voz do meu pai soa logo atrás de mim.

Fico rígida, meus músculos se contraem. Tudo o que descobri


e ouvi até agora me atinge, me fazendo estremecer e unir os braços
ao corpo para disfarçar o nervosismo.

– Sim? – pergunto, mantendo-me de costas, espremendo os


olhos, chorando em silêncio.

Gostaria de gritar com ele, perguntar como pôde fazer isso,


como pôde ser uma pessoa horrível. Questionar o porquê.
Mas não consigo.

Eu estou... com medo. Estou temendo o meu próprio pai.

– Vire-se, quero falar com você – diz, engrossando a voz.


Sempre fui amedrontada pela sua presença, pelo seu
temperamento. Sempre me mantive na linha para evitar problemas.
Sempre fui uma filha exemplar. A filha perfeita de um monstro.

Com lentidão, giro nos calcanhares e o encaro.

Ele ainda parece o mesmo sob os meus olhos, ainda se


apresenta como o homem que sempre achei bonito, com o pai que
sempre tentei entender.

– O que aconteceu? – questiona, franzindo a testa.

Eu fui uma tola. Uma idiota.

Pensei que ele me protegeria, que o seu jeito se dava para que
pudesse me defender da maldade das pessoas, evitar fofocas e
mentiras espalhadas. Cheguei a pensar que ele me defenderia de
Lennon, que daria a moral com o término do relacionamento a mim,
não ao babaca. Eu ameacei Lennon com isso, ameacei com a
proteção e um amor paterno que nunca existiu.

– Nada – minto, pigarreando para desobstruir a voz.

Ele dá um passo à frente, um esgar nos lábios.

– Lamentos adolescentes idiotas ou brigou com o namorado? –


insiste, cruzando os braços em frente ao peito. Com o meu silêncio,
ele revira os olhos. – Tanto faz, mas não ouse terminar o namoro
com Aiden Thorne, está me ouvindo? Grace e eu temos um acordo
muito benéfico para a minha candidatura, não podemos esquecer
que as eleições ocorrerão ano que vem.

Fecho as mãos em punho, fincando as unhas na minha pele


até sentir a dor alucinante do corte.

– E se eu terminar com ele? – revido, rangendo os dentes.

Ele me lança um olhar ameaçador.


– Você não ousaria! – acusa, erguendo uma mão em riste em
minha direção. – Sabe o que eu acho, querida? Você é uma mulher
muito complicada, ficará sozinha se continuar agindo dessa
maneira, deixando esse gênio forte dominá-la. Rompeu com Lennon
porque o acusou de traição, agora está com Aiden, mas parece
infeliz, tem certeza de que o problema está nos garotos e não em
você?

Não suporto ouvir mais as asneiras que ele fala. Não hoje. Não
quando estou abarrotada de informações e desolada por dentro com
todas elas.

– Eu vou subir – aviso, girando nos calcanhares.


– Estou falando sério com você, Madelyn, não ouse romper
com este rapaz.
– Deixa eu adivinhar, se eu fizer isso eu nunca mais vou sair
de casa e blá blá blá – desdenho.
Ele solta uma gargalhada assustadora.

– Não se atreveria, caso me desobedeça mais uma vez, saiba


que eu tiro Lennon da cadeia e forço um casamento entre os dois.
Se for fazer da minha vida um inferno, garota ingênua e malcriada,
farei da sua também.
Respiro fundo para me acalmar.

– Em algum momento da sua vida você se importou de


verdade comigo? – questiono, engolindo o choro, antecipando a
resposta.

A risada que ressoa pelo seu peito me faz ofegar.

– Você é a única herdeira dos negócios da família, Madelyn, e,


infelizmente, é fraca demais para assumi-los, justamente por este
motivo é que precisa de um marido pulso firme, alguém que possa
controlá-la ao mesmo tempo que continue trazendo dinheiro para
dentro de casa

– E quanto ao que eu sinto? – Me viro, incontrolada,


encarando-o com os olhos semicerrados pela raiva. – Se eu não
quiser assumir os negócios da família, se eu simplesmente preferir
seguir um caminho diferente?
Ele leva as mãos aos bolsos da calça de terno, dando um
passo à frente. Seu rosto não revela nada que sente, apenas o
franzir do nariz demonstra que se sente apático com a conversa.

– Não interessa o que sente, Madelyn, sua mãe não conseguiu


me trazer outro herdeiro ao mundo, assim como o seu tio não se
importou em ter filhos, restando, infelizmente, só você. – Encolhe os
ombros. – Nem por cima do meu cadáver vai fugir das suas
responsabilidades, eu ainda estou sendo bonzinho e te dando a
oportunidade de escolher com quem quer ficar. Portanto, escolha:
Lennon ou Aiden.
A raiva vai desvanecendo, dando lugar a uma sensação de
triunfo.

– Por que eles? Acha que são mais fáceis de controlar e


manipular?
– São filhos de amigos próximos da família e... – Se cala,
ponderando por um segundo. – Pertencem ao nosso vínculo social,
logo, aprovados e aceitos. E, sim, jovens idiotas e apaixonados que
serão fáceis de manipular.
Controlo o meu temperamento para não deixar transparecer
absolutamente nada. Ele não poderia estar mais errado, talvez
Lennon, de fato, se enquadrasse em seus pré-requisitos, mas ele
jamais, sob hipótese alguma, conseguiria manipular Aiden.

A arrogância precede a ruína.

Volto a subir os degraus, afastando-me dele e de toda a sua


prepotência nojenta e doentia.

– Aiden e eu não terminamos, só vim em casa pegar algumas


roupas, vou dormir na casa dele hoje – minto, segurando o corrimão
com força.

– Isso aí, garota! – parabeniza, e ouço o barulho dos sapatos


caros contra o piso se afastar em direção ao escritório.

Corro para o meu quarto e fecho a porta, passando a chave na


fechadura. Me jogo na cama e cubro o rosto contra o travesseiro,
abafando os meus gritos de desespero.
Choro até as lágrimas secarem.

Choro até a minha alma implorar para que termine.


Choro até o meu coração comprimir e não passar de um grão
de poeira.

Choro por mim. Choro por Aiden. Choro por nós.

Quando termino, me levanto com os olhos inchados e a visão


embaçada. Meu nariz está vermelho e olheiras escuras marcam o
meu rosto.
Encaro o meu reflexo, o resquício que sobrou de mim se
decompondo a cada segundo, se desfazendo com toda a verdade
que aniquilou todas as mentiras que compuseram a minha vida até
aqui.
Aiden disse que não queria me machucar, que não queria me
arrastar para a escuridão, não queria que eu quebrasse como ele
quebrou.

O que ele não sabe, é que não tem como despedaçar quem já
está fragmentado.
 
As coisas nunca funcionaram direito para mim e Maddie.

Nós ficamos juntos no Dominators pela primeira vez porque


não conseguíamos controlar a atração que nos contaminava. Então,
através de um acordo dentro de um clube de sexo, começamos a
nossa relação.

Eu não a pedi em namoro como deveria, simplesmente


declarei que iríamos namorar para que pudéssemos resolver a sua
situação com o pai e o rigor que impunha em cima dela.

Também não esperava ter a minha primeira declaração


cuspida como se fosse uma tentativa desesperada de conseguir o
seu perdão.
Mas quando é com a gente, tudo acontece no extremo, na
intensidade. Nada é com leveza.
E, por mais que tenha parecido que eu disse aquilo só para
que ficasse, não foi assim que eu me senti, porque eu a amo de
verdade.
Não sei desde quando, só sei que amo.

Deveria ser difícil para mim assumir os meus sentimentos,


proferir as três palavrinhas que estavam presas em minha garganta
há tanto tempo que eu nem posso mais lembrar, mas não foi,
porque eu queria dizer aquilo, eu queria deixar claro que o que sinto
é verdadeiro, que eu me apaixonei.
Somos duas pessoas fodidas. Vítimas dessa cidade e da
sociedade que habita nela.

– Eu sinto muito, cara – comenta Miles, me lançando um olhar


condescendente.

Encaro a porta desde o momento em que ela se foi, sentindo


uma dor profunda no centro do peito ao ver seu rosto se partir em
angústia e sofrimento.

Eu não procurava amor, não tinha interesse nele, tão pouco


vontade de encontrá-lo. Mas a questão é que eu o encontrei e não
quero perdê-lo.

Eu preciso de Madelyn. Se ela não me quiser mais como um


amante, que me deixe ao menos ser seu amigo, mas não me afaste
da sua vida.

– Isso dói pra caralho – comento, escorando o queixo com a


mão em punho.

Nunca deixei ninguém entrar ou cavar o suficiente desde a


morte do meu pai. Não estava tentando me proteger, só pensava
que não tinha mais um coração. Mas Madelyn apareceu e mostrou
que eu estava completamente equivocado.
E agora, ela partiu, levando consigo o restante do resquício
que ainda havia sobrado de mim.

– Eu sabia que estava apaixonado – murmura, me fazendo


encará-lo pela primeira vez desde que Maddie foi embora. Ele
encolhe os ombros diante do meu olhar inquisidor. – A função de um
melhor amigo é reconhecer quando o outro corre perigo.

– Perigo? – indago, franzindo a testa.

– Sim, perigo de ter o coração partido. – Reviro os olhos, então


ele continua. – Qual é? Você já estava caidinho por ela quando
lesionou Lennon, acha que eu não percebi? Sou seu melhor amigo,
porra! Por isso estava insistindo para que contasse a verdade, mas
só fui perceber que ia dar muita merda quando começaram a
namorar oficialmente.

Suspiro, esfregando a nuca.


– É você avisou, mas eu tive medo e aconteceu agora
justamente o que estive tentando evitar.

Maddie entendeu tudo errado e da pior maneira de todas.


Nunca, em hipótese alguma, pensei em usá-la como método de
vingança. O negócio era entre o seu pai e eu, ela não fazia parte
disso.
Eu deveria ter cedido quando descobri que ela não era
apegada a ele, que ele era tão ruim com ela quanto é com o
restante das pessoas, mas nós recém tínhamos iniciado um
relacionamento, estávamos felizes e satisfeitos. Parecia injusto
romper a nossa felicidade por causa do nosso passado, por um erro
do seu pai.

– Ela vai te entender, ela também está apaixonada, e Maddie


não é boba, ela sabe que o pai não presta. – Ele se aproxima de
mim e pousa uma mão em meu ombro, apertando-o de leve. – Dê
um tempo para ela, Aiden, nós somos jovens demais para carregar
toda essa carga, Maddie está desolada e muito confusa.

Não respondo, retornando minha mente para os pensamentos


confusos e conflitantes.

De uma coisa Miles tem razão, jovens demais para acumular


tudo isso, mas não é como se tivéssemos controle. Fomos jogados
nesse mundo com as mãos atadas e sem saber o que fazer.
Quem garante que eu seria um hacker se as coisas tivessem
sido diferentes? Se meu pai nunca tivesse sido assassinado e eu ter
sido dominado por um sentimento excessivo de vingança.
Mas não importa agora, nem nunca.

As coisas são como são e nós não podemos mudá-las.

Maddie me odeia, me culpa por ter lhe omitido a verdade, me


acusa de ter tentado defendê-la desse mundo quando estava
envolvida nele mesmo sem saber. E eu vou me lamentar por isso
para sempre. E talvez jamais me perdoe, mas não posso mudar o
passado, e sim, o futuro.
– Acha que Madelyn vai contar alguma coisa? – pergunta
Miles, quebrando o silêncio.

Mordo os lábios, segurando-o entre os dentes.

– Não – refuto, convicto –, ela está confusa, magoada e talvez


perdida, mas ela jamais contaria alguma coisa, não me entregaria.
Madelyn é muito fiel ao que acha que é certo, ela jamais iria contra
algo que sabe e sente verdade.

Minha garota é justa, além do mais, confio em Madelyn, nem


por um momento passou pela minha cabeça que ela pudesse me
entregar e revelar o meu plano. Ela jamais faria isso.
Me levanto, interrompendo o olhar para as escadas, desistindo
de idealizar o retorno de Madelyn como se fosse se tornar real e ela
fosse se materializar em carne e osso na minha porta de novo.
Ela me pediu um tempo, e eu darei isso a ela, embora meu
coração sangre.

– O que você vai fazer agora? – Miles se afasta.


– Eu vou seguir com o plano, então vou tentar reconquistar
Madelyn depois que toda essa merda desaparecer de nossas vidas
e essa página for virada.
– E acha que ela vai te querer de volta depois que fizer isso?
Depois que acabar com o pai dela? – questiona, franzindo o nariz.

Abro a boca para responder, não tão convencido, mas


tentando me apegar a um átimo de esperanças de alguma forma.

– Se ele me contar a verdade e nada além dela, sim! – A voz


soa do corredor.

Miles dá um pulo, assustando-se e eu esfrego os olhos


tentando decidir se é uma miragem ou é real. Madelyn está
escorada contra o batente, os olhos vermelhos e inchados, os
braços cruzados e uma mochila no ombro direito.

– Maddie... – sussurro, entoando o seu nome como um mantra.

– Eu quero saber tudo, Aiden, cada porra de segredo que


esconde, tudo o que fez até agora e que está prestes a fazer. Essa
é a sua segunda chance, e a última – diz, erguendo o maxilar.

Dou um passo instável à frente.


– E você vai aguentar a verdade?

Ela abre um sorriso depreciativo que não chega aos olhos e


pende a cabeça levemente para o lado.
– Disse que não queria manchar a minha alma, Aiden, mas a
verdade é que não se pode corromper o que já foi deturpado. Passei
a vida inteira vivendo sobre a sombra do meu pai, seguindo as
regras, tentando ser perfeita e trazer orgulho para dentro de casa de
alguma forma. Mas isso nunca aconteceu e nem vai acontecer.
Então, não venha com esse assunto de que está tentando me
proteger, você não sabe o que eu passei e não sabe o que eu sinto.
Engulo em seco, admirando-a de cima a baixo.

– E está pronta para entregar o seu próprio pai? – pergunta


Miles, a voz esganiçada.
Uma faísca de determinação transparece nos olhos dela.

– Ele é um hipócrita arrogante, não ama ninguém além dele


mesmo e da política. Ele me fez crescer oprimindo o meu verdadeiro
eu para não manchar a sua reputação. Quando ele nunca nem
mesmo teve uma. Se ele é o culpado pela morte de Paul Thorne,
então precisa pagar – responde, sem dar margem para mais
perguntas.
Madelyn caminha até a cama e joga a mochila em cima do
colchão, antes de me encarar e falar.

– Eu vou dormir aqui, era isso ou aguentar as asneiras do meu


querido pai – avisa, olhando ao redor do quarto. – Agora, comecem
a me contar o plano e tudo o que sabem.
– Maddie, tem certeza de que quer isso? – persiste Miles,
suspirando.
Madelyn se joga contra a cadeira do computador que range e
oscila para trás diante do seu peso. Ela ainda parece magoada, mas
há uma determinação absoluta em seu semblante que não deixa
margem para uma hesitação.
– O juiz era um corrupto de merda; o xerife um pedófilo doente,
asqueroso e nojento; o meu pai um assassino e possivelmente um
corrupto... o que me leva a uma questão, onde meu tio se enquadra
nessa quadrilha? – Passa a ponta do indicador contra o couro da
cadeira. – Posso ser filha de um monstro, Miles, mas garanto que
não sou um. Acha mesmo que eu vou engolir todos esses crimes e
seguir a vida sem fazer absolutamente nada? – Sorri, arqueando
uma sobrancelha, sarcástica. – Meu querido pai me criou e moldou
para ser perfeita, como eu posso seguir os seus padrões se deixar
com que esse mal continue crescendo sendo que posso cortá-lo
pela raiz?

Madelyn está magoada. Não completamente comigo, mas com


o pai e com todos os padrões que a obrigou a seguir, enquanto ele
mesmo nunca foi íntegro.

Ela está sofrendo, sim. Talvez pelo castelo de mentiras no qual


cresceu. Talvez por ter visto toda a imagem que possuía do pai
desmoronar de uma hora para outra. Talvez por ela mesma.
– Não precisa fazer isso – falo, me aproximando aos poucos,
temendo que fuja de mim outra vez.

Maddie pisca, os olhos cheios de um ódio puro e crescente.

– Eu quero fazer, e eu vou. – pontua.

Eu reconheço o seu olhar, eles resplandecem o mesmo que o


meu possui.
Madelyn foi contaminada. E não há mais nada que eu possa
fazer. Não há mais salvação. Agora somos iguais.

Abro a boca e começo a falar tudo o que sei, tudo o que fiz e
quais os planos para o futuro. Conto como descobri que foi o pai
dela quem mandou matar o meu há muitos anos, assim como o já
descobri sobre o grupo nos últimos tempos. Não deixo nada passar,
exprimo a verdade que ela tanto quer.
Madelyn ouve tudo em completo silêncio, o rosto uma máscara
impassível, mostrando que eu tinha razão, a garota doce se foi,
restando uma jovem quebrada pelas atrocidades do pai.
– Eu posso conseguir os celulares – diz, a voz gélida e
completamente calma.

– O quê? – Miles e eu questionamos em uníssono.

Ela revira os olhos, bufando.

– Disse que seria mais fácil se tivesse acesso aos celulares, eu


posso conseguir isso, só me diga como fazer – admite, exasperada.

Balanço a cabeça.

– Não vou arriscar você – contesto.


– Não é um risco, eles nunca desconfiariam de mim.

– E se for pega? – insisto, repudiando a ideia.

– Fala sério, Aiden, eles podem ser o que forem, mas ainda
são minha família, não fariam nada comigo.

– E é por este motivo que eu me pergunto se você quer


mesmo insistir nesta ideia absurda – objeta Miles, caminhando de
um lado para o outro, pensativo. – Sei que está magoada, mas não
se importa nem um pouco com isso?

Maddie bufa, cruzando as pernas.

– Sim, Miles, isso dói e me desolou descobrir a verdade. Só


que eu não quero e não serei igual a ele. E, além de tudo, ele nunca
foi um bom pai, não foi só pela opressão, mas pelas merdas que
precisei ouvir, pelas mágoas que precisei engolir e resguardar. – Ela
me encara deixando transparecer pela primeira vez um pouco de
tristeza desde que retornou. – Eu sinto muito que meu pai tenha
ceifado a vida do seu, sinto muito que ele tenha sido o responsável
pela sua dor. E lamento que um bom pai tenha morrido quando
ainda tinha tanto para dar ao filho.

Ela não precisa falar mais nada, eu entendo perfeitamente o


que quer explicar. Maddie lamenta que o pai dela, além de ser
péssimo, tenha me privado de viver uma vida feliz ao lado do meu
que era o reverso do dela.

Me ajoelho em sua frente e puxo a sua nuca para mim,


selando os nossos lábios, beijando-a com intensidade. Todo o
desespero das últimas horas desanuviando, me fazendo colapsar
por tê-la de novo em meus braços.

– Eu te amo, nada vai mudar isso – murmuro contra a sua


boca, os olhos fechados.
Madelyn descansa as mãos nos meus ombros, os polegares
acariciam a minha pele.

– Eu também te amo, Aiden – revela, me fazendo abrir um


sorriso sincero –, lamento que tenhamos que carregar tudo isso.

– Não importa, nós somos reais, e no meio de todas essas


mentiras, isso é o que mais importa – insisto, trazendo-a mais uma
vez para mim.

Ela acena, concordando.

Eu só quero acabar com isso de uma vez e viver dignamente


ao lado de Madelyn, seguir a vida e deixar essa página para trás.
Alimentei a vingança por longos anos, mas agora está na hora de
me desfazer dela, finalizando esta etapa da minha vida.

Eu amo Madelyn e nada vai mudar isso.

Amo com a minha alma e com o meu coração.


 
Passei o final de semana inteiro com Aiden, não consegui
retornar para casa, não sabia como encarar o meu pai depois de ter
descoberto toda a verdade.

Miles tinha razão de uma coisa, eu ainda o amo, embora ele


seja uma pessoa ruim. Porque, no fim das contas, eu sou humana,
eu tenho sentimentos por mais que sejam conturbados. Tom
Sutherland pode ser quem for, mas ele ainda é o meu pai, ainda é o
homem que a Madelyn pequena via como o príncipe das suas
histórias, o herói da sua vida.

Contudo, isso não significa que eu concorde com o que ele fez
ou que eu me abstenha da verdade.

Enquanto eu sonhava com o pai perfeito, ele ceifou os mesmos


sonhos de uma outra criança, arrancando o pai de suas histórias,
tornando-o um fantasma. E isso não tem perdão.
Aiden não merecia o sofrimento. Paul não merecia ter morrido.
Ambos deveriam ter sido felizes, ter desenvolvido por um longo
tempo essa relação de pai e filho, mas foram impedidos.

E é por esses e muitos outros motivos que eu vou ajudar Aiden


e Miles a dar fim em toda essa trajetória. Tom fez e precisa pagar
pelos erros. Assim como xerife pagou. Assim como o juiz pagou.
Assim como o meu tio, Quinn, pagará.
Miles implorou para que eu não envolvesse Emy nisso tudo,
mas precisei explicar para ele que, assim como Aiden é seu melhor
amigo e eles não escondem segredos um do outro, Emy é a minha
e nós temos um pacto de sempre falar a verdade e nada além dela.
Então, mesmo contra a vontade de Miles, eu contei absolutamente
tudo para Emy. Primeiro ela ficou em choque, depois ficou revoltada
com Miles e Aiden por esconderem a verdade e, por fim, se tornou
condescendente com a nossa realidade, unindo-se a nós.

Aiden entrou em contato com o agente do FBI para verificar a


identidade do homem e confirmou que ele realmente vem disfarçado
como o próximo candidato a xerife da cidade. Usando uma metódica
muito boa para enganar o meu pai e o meu tio, Adam vem como
indicação de alguns amigos próximos, então eles se encontrarão
para conversar sobre os termos antes que o meu pai, como prefeito,
lhe dê apoio durante as eleições para que consiga angariar votos o
suficiente e, consequentemente, levar o cargo.

Encaro meu reflexo no espelho do meu quarto. Embora eu


tente aceitar a realidade dos fatos de forma tênue, não consigo
suprimir tão profundamente a dor que marca o meu coração.

Nunca fui ingênua de embasar minha família em um conto de


fadas, sabia que havia defeitos, rachaduras espessas em cada
personalidade. No entanto, nem nos meus piores pesadelos,
imaginei que as fissuras fossem tão profundas e sem limites.
As manchas arroxeadas debaixo dos meus olhos e as maçãs
do rosto ressaltadas são somente alguns dos poucos resquícios que
o meu corpo vem demonstrando da exaustão física e psicológica.

Meu coração ainda sangra com o que pode acontecer com o


meu pai em breve, mas, acima de tudo, sinto mesmo é pela minha
mãe. Ela ama o marido, e ainda não sei em qual posição ela se
enquadra nesta história toda, se sabe de tudo ou é tão inocente
quanto eu era. Tenho medo de como pode reagir quando souber a
verdade, assim como tenho medo de perdê-la também.

Suspiro, arrumando uma mecha de cabelo atrás da orelha.

Tenho medo de ficar sozinha depois que tudo isso acontecer,


eu vou declarar a ruína da minha família, levar meu sobrenome aos
escombros.

Mas como ignorar uma verdade dolorosa, mesmo que ela me


leve a devastação?

Não farei isso só por Aiden e por Paul Thorne, farei isso por
mim e por tudo o que já precisei aguentar e ouvir. Farei isso pelas
pessoas que foram prejudicadas pelas sentenças do juiz. Pelas
crianças que foram exploradas para que o xerife se sentisse
satisfeito.

Farei isso porque o mundo merece pessoas boas que


denunciam pessoas ruins, mesmo que elas façam parte de suas
vidas.

Farei isso porque é a coisa certa a se fazer.

Com o indicador, limpo o resquício de uma lágrima na ponta do


olho esquerdo. Fungo, engolindo uma extensa lufada de ar para me
acalmar.

Neste momento, meu tio e meu pai estão em seu escritório em


mais uma de suas reuniões rotineiras. É a chance de pegar os
celulares, acessar o link que Aiden enviará por SMS e depois
apagar os rastros.

Contudo, depois disso, não haverá mais volta.

Arrumo a postura e encaro pela última vez os olhos da


Madelyn antes de tudo, pois sei que depois de hoje outra parte de
mim morrerá. E, apesar disso, não me importo que ela se vá. Cada
parte minha que morre cede lugar para que uma nova possa
ressurgir das cinzas, mais forte, independente e indestrutível.
Meu celular apita, viro a tela para mim e leio a mensagem de
Aiden.
 

Assim que estiver pronta, princesinha, mas lembre-se, não


precisa fazer isso se não se sentir pronta ou ficar desconfortável.
Podemos encontrar outro jeito.

Não respondo.
Ele ainda tem esperanças de me salvar. Mas não há
esperanças para quem já sucumbiu.

Deixo o meu quarto para trás, desço as escadas com calma, as


pernas um pouco trêmulas, os passos incertos. A casa está
silenciosa, ouço somente o ruído baixo da TV delatando que mamãe
está na sala.

Suspiro uma última lufada.


Pigarreio.
– Ei, mãe – grito, surgindo em seu campo de visão.
Mamãe está em sua poltrona assistindo o noticiário com uma
xícara de chá em mãos. Seus olhos, iguaizinhos aos meus, correm
até mim.
– Sim, Maddie, algum problema?

Faço um sinal negativo com a cabeça.

– Acha que seria ruim eu bater no escritório? – pergunto,


forçando a máscara serena a permanecer no meu olhar.
Ela franze a testa e sorve um gole da bebida quente, o vapor
da xícara embaçando o seu rosto.
– Algum problema, Madelyn? – insiste, me lançando um olhar
enviesado.

– Eu só preciso falar com o tio Quinn a respeito do baile –


comento, sorrindo que nem uma idiota para fingir uma animação
que não existe.
O baile ocorrerá na antiga casa de campo dos meus avós,
onde ele reside atualmente. Todo o ano esse evento acontece, a
cidade se une em prol para angariar fundos para o orfanato e
somente a alta sociedade recebe o convite para comparecer.

É um jogo político, meu querido pai custeia toda a festa para


que as pessoas se divirtam e assim façam doações ao mesmo
tempo em que elogiam o prefeito por sua postura com os órfãos. E
ninguém percebe que ele ajudaria ainda mais se não gastasse tanto
dinheiro com essa besteira, ou percebem e não se importam.

– Bata antes de entrar, talvez eles estejam ocupados – avisa,


retornando sua atenção para a televisão.
Giro nos calcanhares e saltito pelo corredor, animada demais
com o evento que se aproxima. A porta do escritório está fechada,
mas ouço o sussurrar deles através da madeira fina. Fecho a mão
em punho e bato, aguardando.
Conhecendo o meu pai, sei que pode me ignorar e continuar a
reunião ou ele vai me atender e me fuzilar, furioso com a minha
intromissão. Bem, eu prefiro a segunda parte, já que preciso ter
acesso aos celulares e não poderei fazer isso se for ignorada.

Meu coração martela com tanta força que eu sinto o zumbido


em meus ouvidos.

A porta é aberta.
Entreolho entre meu tio e meu pai, e preciso de toda a minha
força para não desistir desse maldito plano. Sinto que me desfaço, a
raiva se torna dor pura e profunda.
Tio Quinn está ocupando a cadeira de frente para a mesa, os
olhos azuis me encaram com felicidade e os lábios estampam um
sorriso sereno. Os poucos cabelos grisalhos estão penteados para
trás, o terno azul-marinho cai perfeitamente em seu corpo alto.
Meu pai está em minha frente, ele segura a maçaneta,
mantendo a porta aberta. Como eu imaginava, me fuzilando com
raiva.

Pisco, afastando as lágrimas dos meus olhos.


– O que você quer, Madelyn? – fala o prefeito com desdém.

Eu quero gritar, arrancar os cabelos, questioná-los, perguntar


como puderam fazer isso, como conseguem dormir à noite sem que
a consciência pese.

Eu só quero que tudo isso passe, que acabe antes que termine
comigo de vez.
Engulo em seco.
– Queria falar com o tio Quinn sobre o baile – comento, a voz
rouca não passa de um sussurro.
– Não acredito que nos interrompeu para isso, Madelyn –
retruca o meu pai.
– Ora, Tom, não seja tão duro com a garota, ela está animada
para o evento do ano, deixe-a entrar – objeta tio Quinn, fazendo um
sinal com a mão para que eu me aproxime.

Meus olhos voam para todo o escritório e percebo os telefones


deles em cima da mesa. Meu plano parecia perfeito, até o momento,
quando percebo que não faço a menor ideia como mexer nos
celulares sem que eles vejam.
Merda.

Ouço o bufar raivoso do prefeito.

– Nós já estávamos terminando mesmo, além do mais, gostaria


de um café – acrescenta, ignorando os surtos de raiva do irmão.

Me aproximo, sorrindo.

– Obrigada – agradeço, entrelaçando as mãos em frente ao


corpo. – Quero saber qual seria a cor certa para o meu vestido este
ano.

As festas nunca são iguais, cada ano uma cor predomina o


ambiente. Ano passado, era o azul celeste. Ano retrasado, o
dourado. Estar combinando adequadamente é um dos meus
deveres como filha do prefeito, assim como da minha mãe como sua
esposa e primeira-dama. Portanto, a pergunta não soa tão absurda
assim.

– Ah, claro, querida, pensei que Tiffany tivesse entrado em


contato com você – murmura, franzindo a testa.

Tiffany é a secretária do tio Quinn, e é óbvio que ela me enviou


um e-mail que eu me desfiz assim que chegou em minha caixa de
entrada.
– Não – minto, mordendo as bochechas.

Ele confirma com um aceno.

– A cor deste ano será a vermelha, mas você já está atrasada


para conseguir um vestido, espero que encontre um a altura da sua
beleza.
Ruborizo, sorrindo com a boca fechada.

– Obrigada, tio Quinn, vou fazer isso agora mesmo.

– Às ordens, princesinha.

Lanço um olhar depreciativo para meu pai antes de fazer


menção para sair do escritório.

Meus passos são lentos, enquanto vasculho em minha mente


como pegar os celulares, já que meu plano foi uma porcaria sem
planejamento algum.

– Vamos tomar um café? Preciso espairecer um pouco, nossos


problemas estão sugando a minha energia – comenta tio Quinn.

– Claro.

Eu entendo quais são os problemas que tanto falam, eles


perderam dois membros importantes do grupo, agora buscam um
jeito de reduzir esse prejuízo.

No corredor, mantenho os passos lentos, enquanto brinco com


o celular, fingindo estar muito ocupada conversando com alguém
para prestar atenção à minha volta.

Eles passam ao meu lado, conversando e sumindo em direção


a cozinha. Paro, ignorando os efeitos do terror e da adrenalina que
correm pelas minhas veias. As vozes diminuem, cedendo lugar para
o barulho de louça.
Corro de volta para o escritório, os celulares ainda estão no
mesmo lugar. Envio uma notificação para Aiden e um piscar de
olhos depois os aparelhos vibram.

É agora, não tem mais volta.

Faço a volta na mesa e pego o celular do meu pai, a senha


dele não é nada mais do que a data de nascimento. Acesso a
mensagem e clico no link que abre uma aba em branco e fica
carregando sem que nada mais aconteça.

Aguardo.

Meu celular apita e eu sei que é Aiden informando que já


posso fechar. Excluo a mensagem e fecho a aba, apagando-a.

Minha respiração acelera, e sinto minha pulsação muito além


da zona anaeróbica.

Coloco o celular de volta e vou para o outro lado da mesa onde


descansa o aparelho do meu tio. Meus ouvidos atentos em qualquer
ruído que eles façam, qualquer sinal de que estão retornando e se
aproximando.

O aparelho dele não é diferente, a senha é tão ridícula quanto


a do irmão, uma junção de um, dois, três e quatro. O celular é
desbloqueado. Faço o mesmo esquema, acesso o link e espero
uma notificação de Aiden. Ao terminar, coloco tudo no lugar e saio
do escritório correndo.

Vejo a sombra deles virar o corredor. Rapidamente, retiro o


celular do bolso e começo a sorrir para a tela. Sinto-os se aproximar,
o cheiro de café impregna o ar.

– Madelyn, vá para o seu quarto e pare de ficar perambulando


por aqui, não quero mais interrupções – avisa meu pai com rispidez,
passando por mim e batendo a porta do escritório com força.
Só então percebo que estava prendendo a respiração. Solto
uma exalação pelo nariz, minhas mãos tremem tanto que mal
consigo manter o celular travado em meus dedos.
Espremo os olhos e me escoro contra a parede, a culpa
ameaçando me soterrar por inteira.

Talvez não encontrem nada, talvez eles não sejam culpados.


Entoo mentalmente, tentando, de alguma maneira, consolar o meu
coração partido.
 
Meu vestido vermelho longo de um ombro só se cola ao meu
corpo conforme subo os degraus da casa do meu tio. Meus cabelos
estão presos em um coque solto e meus olhos tingidos de vermelho,
a fim de me deixar com um aspecto de mais velha e inabalável. Em
outras palavras, disfarçar a tristeza que vem assolando o meu
semblante.

A enorme fenda na perna esquerda revela o brilho intenso dos


meus saltos, que combina com a máscara que cobre parcialmente o
meu rosto, e que refletem a cada passo dado.

Aiden está usando um terno preto que cai perfeitamente em


seu corpo, emoldurando os ombros largos e abraçando os braços
fortes e pernas torneadas. A gravata borboleta é da mesma cor que
a minha roupa.
Nossas mãos estão entrelaçadas, seu polegar faz um círculo
em minha palma suada, tentando acalmar o nervosismo que estou
sentindo.
Encaro-o, meu coração errando uma batida quando recebo o
seu olhar.

Aiden está lindo. Os cabelos estão bem aparados, a máscara


escura mantém o nariz e metade do rosto coberto, mas os olhos
brilham com uma intensidade única esta noite, ressaltando a
mancha castanha no olho direito. E suas tatuagens do pescoço e
braços vazam pelas lapelas da camisa branca.
– Você está maravilhosa, princesinha – murmura, beijando os
meus lábios.

– Nós estamos arrasando – respondo, sorrindo.

As portas duplas são abertas para nós.

Pessoas desfilam pelo grande salão, mulheres vestindo longo


e homens usando terno. Vermelho reveste as paredes, assim como
a maior parte da decoração. Uma música clássica ecoa pelo local,
baixa e lenta. Ao fundo, uma mesa de aperitivos e ao lado outra
contendo as bebidas. Garçons perambulam com copos de uísque e
espumante.

Aiden me puxa para dentro.

– Todo ano é assim? – pergunta, inclinando-se para sussurrar


em meu ouvido.

– Sempre a mesma coisa – aviso, apontando com o queixo


disfarçadamente para o telão –, lá aparecem as doações, o valor e o
nome de quem doou, é uma forma de induzir as pessoas, já que a
maioria gosta de estar na mídia, quanto maior a doação, mais as
pessoas comentam.
Recolho uma taça de espumante de um garçom que passa ao
meu lado. Engulo o líquido borbulhante que faz cosquinhas em
minha língua de uma só vez.

– Vai com calma, a noite será longa – avisa, os olhos correndo


de um lado para o outro em busca do agente do FBI.

– Sim, mas isso não significa que eu não precise de álcool no


meu organismo – contraponho, me sentindo cada vez mais nervosa.

Nos últimos dias eu evitei ao máximo a minha casa. Não queria


contato com o meu pai e nem com a minha mãe. Senti vergonha
pelo que fiz, tristeza pelo que vai acontecer e raiva por conta do
turbilhão de sentimentos, então fiquei com Aiden. Grace é muito
querida, também muito ocupada. Aiden e eu praticamente tivemos a
casa para nós. E ele foi incrível, sempre tentando me animar
quando percebia que estava triste, sempre carinhoso e prestativo,
sempre por perto para me proteger dos meus próprios sentimentos.

– Só assim para eu ver a minha filha... – A voz soa à direita.


Aiden fica rígida instantaneamente. Meu pai se aproxima com minha
mãe ao seu lado. – Como vai o meu genro? – pergunta, sorrindo
abertamente para Aiden.

Meu estômago se revira, a espumante que bebi momentos


antes ameaçando retornar.

Como ele pode tratar Aiden assim, como se nunca tivesse feito
nada?

– Muito bem – responde Aiden, ignorando-o o máximo


possível.

Mamãe me olha de cima a baixo, sorrindo e aprovando a


minha escolha de vestimenta. Ela também usa vermelho, mas o tom
do seu é bem mais escuro que o meu.
Alguém se aproxima e cumprimenta o prefeito, tirando-nos da
tormenta de precisar manter contato. Aiden aproveita a deixa para
nos puxar em direção a mesa de petiscos.
– Está tudo bem? – pergunto, olhando para os canapés e
fingindo escolher algum, mas sob hipótese alguma colocarei um em
minha boca, não quando estou prestes a vomitar.

– Sim – replica, dando o assunto por encerrado.


Pela visão periférica, vejo que tio Quinn conversa
animadamente com Grace enquanto dividem um copo de whisky.
Correndo um pouco mais os olhos para o canto, vejo um único
homem em pé nos encarando. Ele tem os cabelos loiros, olhos
verdes e uma musculatura invejável para a idade que aparenta. A
máscara preta cobre verticalmente metade do rosto.

Continuo minha sondagem, olhando ao redor da sala e fingindo


que eu não fiquei encarando-o pelos últimos segundos. Aiden está
concentrado nos canapés, para via das dúvidas, mas eu sei que
está ouvindo o que Miles sussurra em seu ouvido através do
aparelho.
Puxo-o para mim e beijo o seu pescoço, sorrindo, aproximando
os lábios da orelha direita.

– Eu acho que eu sei quem é o agente – sussurro, brincando


contra a sua pele, seduzindo o meu namorado – Ele está usando
um terno cinza chumbo e está parado ao lado das portas com um
copo de whisky nas mãos.

Aiden agarra a minha cintura e beija os meus lábios, entrando


no jogo. Ele gira o meu corpo, deixando-me de costas e ele de
frente para o homem.

– Pode ser, ele está olhando fixamente para nós, parece que
quer ser identificado – comenta.
– E agora?

– Vamos seguir o plano, Miles já está acompanhando tudo


através das câmeras e ouvindo conversas que não são abafadas
pela música.

– E como vamos confirmar que é ele?

Na foto que Aiden conseguiu dos dados do FBI, Adam Scott é


um homem de cabelos pretos e olhos escuros, mas nós já
estávamos imaginando que ele viria disfarçado.

– Assim que o seu pai, Quinn e ele sumirem por alguma porta
nós teremos a confirmação – Beija a curva do meu pescoço. – Em
algum momento eles precisarão ter a reunião.

Confirmo com um sinal.

Emy está com Miles na casa de Aiden cuidando das câmeras,


ainda não sabemos que merda vai acontecer aqui, então preferimos
deixá-los de fora. Até então, o único que corre algum risco é Aiden,
eu prefiro pensar que não importa o que o meu pai e o meu tio
fizeram, eles não me causariam nenhum dano.
Aiden fica rígido, então fecha os olhos e solta um suspiro, um
sorriso de satisfação curva os seus lábios.

– O que foi? – questiono.

Ele balança a cabeça.


– Ainda não, princesinha, na hora certa você ficará sabendo.

Não gosto de ser excluída das coisas, mas seja lá o que Miles
disse para ele, parece ser importante e lhe deixa feliz, então me
abstenho de fazer mais perguntas, não estamos em um local
apropriado para isso, independentemente.
– Vamos dar uma volta? – pergunta Aiden com a voz animada
demais.
Franzindo o cenho, concordo.

É isso ou morrer de curiosidade.

Converso com Donald Portman, pai de Miles e Emy, em um


canto do salão. Ele fala sobre os dados crescentes do banco e
como os negócios estão se expandindo nos últimos anos. Donald
me quer na presidência assim que eu me formar.

Maddie está um pouco mais à frente falando com um idiota


engomadinho que se aproximou dela há alguns minutos. Ele é mais
alto que ela, tem olhos verdes, cabelos loiros ridiculamente
penteados para trás e está vestindo um terno azul-escuro, enquanto
a encara com um sorriso galanteador, sempre tocando em seu
ombro quando possível.
– Quem é? – pergunto para Donald, apontando com o queixo
para o babaca.
– É filho do senador Harry, se chama Peter, ele está aqui
representando o pai – comenta, engolindo uma dose da sua bebida.

Peter toca no cotovelo de Madelyn e ri de alguma coisa que ela


acabou de falar. Trinco a mandíbula com força, cerrando os dentes.
– Se acalme, filho, você está fuzilando o rapaz – brinca
Donald, rindo do ciúme evidente que estou sentindo.
Não me importo com o que ele ou qualquer outro está
pensando ou sussurrando, mantenho os meus olhos fixos no
babaca que está aliciando a MINHA namorada. Conheço um
homem de longe e sei quando ele está tentando encantar uma
garota, e Peter, com certeza, está fazendo isso com Maddie. Mas o
problema é que ela é a MINHA garota.

Ele se inclina ainda mais e sussurra algo no ouvido dela.


Eu vou acabar com a porra da vida dele.

Deixo o copo no mezanino em que Donald e eu estávamos


conversando e caminho até Madelyn em passos duros. Enrosco a
sua cintura e colo seu corpo ao meu. Ela se assusta, mas
imediatamente relaxa em meus braços.

– Aiden, este é Peter, filho de um amigo do meu pai. Peter,


este é o meu namorado – Apresenta-nos.

Ele estende a mão para me cumprimentar, encaro-a antes de


correr os olhos até os seus e arquear uma sobrancelha. Peter
recolhe o braço, pigarreando.

– Como eu disse, Madelyn, seu pai foi enfático para que eu


viesse te cumprimentar..., fazia um tempo que não nos víamos –
comenta, um pouco sem jeito.

Ah, claro que isso tem dedo do imbecil de Tom Sutherland, ele
quer casar a filha de qualquer forma para mantê-la na linha, assim
poderá controlar o genro e o genro controlará os negócios da
família. O que Tom ainda não sabe é que os seus negócios
acabaram de chegar ao fim e que ele está prestes a ser preso.

– Sim, acho que uns três anos – comenta Maddie, escorando a


cabeça em meu peito.
Peter olha para todos os lados, a postura altiva foi embora
assim que eu marquei o meu território.

– Bom..., tenho alguns assuntos para tratar com outras


pessoas – graceja, se afastando aos poucos – Foi um prazer, até
mais.

Madelyn espera que ele se afaste o suficiente antes de virar a


cabeça para mim, sorrindo e arqueando as sobrancelhas.

– Você poderia ter sido mais educado, ele só estava sendo


gentil.

Solto uma risada.

– Ele estava tentando fodê-la.

Madelyn cora, virando-se de frente para mim e espalmando as


mãos em meu peitoral.

– Você é um obcecado – replica, revirando os olhos.


Agarro a sua nuca e beijo o seu maxilar, esfregando a língua
pela pele macia e sedosa.

– E você é minha!
Ela ri contra o meu rosto, a risada rouca fazendo cócegas.

– Bem... isso eu não posso contestar.

– E nem ousaria. – Estreito os olhos em sua direção,


desafiando-a a discordar.

Madelyn está linda, os lábios vermelhos e os olhos escuros lhe


trouxeram um ar de mulher fatal. E o vestido que emoldura o seu
corpo seria, facilmente, o objeto da minha perdição.

Acaricio os cabelos da sua nuca, encarando os olhos escuros


que tanto aprecio e que fazem com que o meu coração bata
acelerado.

– Eu te amo, Maddie – murmuro, inspirando uma profunda


lufada de ar, sentindo o seu cheiro.

– Eu também te amo, Aiden – responde, inclinando-se para


esfregar a ponta do nariz na minha bochecha.

A festa ao nosso redor não significa nada, parece irrelevante


perto da bolha em que estamos enquanto nos encaramos.
Madelyn é como uma distensão da minha alma, como o meu
coração fora do peito. E não importa que sejamos jovens demais, o
que sentimos é profundo e importante. Não é uma relação
momentânea. São sentimentos consistentes, fortes e invencíveis.
Nós nos amamos mesmo quando não deveríamos. Nós nos
amamos mesmo quando tudo dizia ser o contrário. Deveríamos nos
odiar, carregando as feridas das nossas famílias, mas sempre
remamos ao contrário porque deveríamos ser um casal, porque
somos perfeitos juntos.

– Eles estão na sala. – A voz de Miles zumbe no meu ouvido. –


E aquele era mesmo o cara.

Suspiro, me preparando para o fim de uma longa jornada de


vingança.

– Está na hora, Maddie – informo, apertando-a com mais força,


beijando-lhe uma última vez.

Madelyn me encara, determinação faiscando em cada canto do


seu semblante.

– Então vamos resolver isso de uma vez e seguir as nossas


vidas – diz com tenacidade.
Concordo com um aceno.
Talvez Adam ainda não saiba que já temos provas o suficiente
contra o prefeito e seu irmão, que não precisamos mais de todo
esse circo. Mas eu ainda quero que Tom Sutherland seja
responsabilizado pelo homicídio, quero que seus eleitores
descubram quem ele é de verdade.

– Miles, assim que entrarmos você deve conectar as câmeras


com o telão – aviso, atravessando o salão com Madelyn ao meu
lado.

– O que você vai fazer? – sussurra, as mãos tremem


levemente ao lado do corpo.

– Um show – respondo, erguendo um sorriso.


 
A música se torna apenas um zumbido assim que deixamos o
salão principal para entrar em uma das portas do corredor. Pelo que
Miles disse à Aiden, eles estão conversando na biblioteca que
pertencia à minha avó e fica no primeiro andar.

Emma Sutherland era uma mulher astuta para a sua época,


passava a maior parte do tempo ao redor de pilhas de livros, sempre
lendo e com um interesse divino em aprender coisas novas.

O corredor está escuro, os candelabros das paredes iluminam


parcialmente o local, unindo-se à decoração antiga e trazendo uma
identidade fantasmagórica.

– O que você vai fazer? – pergunto para Aiden, em um


sussurro.
– Nós vamos entrar e fazer com que confessem.
Céus, eu pensei que a minha ideia no dia do escritório havia
sido péssima, mas essa com toda a certeza é muito pior que a
minha. Aiden pareceu se preparar tanto para simplesmente chegar e
fazê-los falar como se fosse fácil?
Limpo a garganta.

– Acho que... está faltando alguns pontos nessa ideia –


comento, fazendo-o rir e me lançar um olhar de esguelha.
– Relaxa, Maddie, eu já tenho tudo sob controle.

Paramos em frente as portas duplas da biblioteca, as vozes


por detrás da madeira se sobressaem quanto ao zumbido da
música, embora não seja possível identificar quem está falando
neste momento.

Aiden respira uma última vez antes de girar a maçaneta e


entrar, empurrando a madeira com força.

No conjunto de quatro poltronas de couro marrom, uma de


frente para a outra, meu tio se levanta em um só movimento,
assustado. Meu pai está ao seu lado, mas permanece intacto,
somente os olhos correndo até nós. Contudo, o que faz com que o
meu queixo caia, não são eles em si, mas o fato de ao lado de
Adam Scott está Grace Thorne.

Começo a tremer e percebo que Aiden perdeu um pouco da


postura altiva, encarando a mãe com o cenho franzido, a mente
dando voltas.

– Maddie, o que estão fazendo aqui? Estamos em reunião,


querida – comenta tio Quinn, fechando o botão do blazer.

Grace se vira para encarar o filho por sobre o ombro, alheia ao


que está acontecendo.

Porra!
Não é possível que ela esteja envolvida, ou é?

Céus... isso só pode ser um pesadelo terrível.

– Gosta de números, Quinn? – indaga Aiden, mudando de


assunto.

Ele parece calmo, mas sei que está frio e distante, diferente do
homem que esteve ao meu lado durante todo este tempo.

Espero que isso seja um engano, que Grace esteja aqui


porque está sendo convidada a participar do grupo e não porque
fazia parte dele. Anseio, do fundo do meu coração, que eu esteja
errada, porque isso seria demais para Aiden aguentar.
– O quê? – fala, franzindo o cenho.

O policial disfarçado permanece de costas para nós,


ignorando-nos, mas vejo a pequena rigidez em seus músculos e a
postura ereta demais para alguém que está relaxado.
Aiden sorri, soltando a minha mão e caminhando ao redor
deles.

– 33.15875,87.67033 – soletra, encolhendo os ombros.

– O que é isso? – sibila o meu pai, levantando-se.

Aiden arrasta um dedo pelas costas da poltrona em que a mãe


está sentada, desenhando a costura com a ponta do indicador.

– É o aeroporto particular da família, não? – insiste, fazendo


com que meu pai e meu tio se entreolhem.

– Sim, qual o problema? – questiona tio Quinn.


– O problema, Sutherland, é em como explicarão para a polícia
as drogas que foram apreendidas na sua propriedade há alguns
minutos – cicia Aiden, ampliando o sorriso diante do rosto pálido
deles.
Grace se levanta, girando nos calcanhares para ficar de frente
para o filho.

– O que você está fazendo? – questiona, colocando as mãos


na cintura fina.

– O que eu estou fazendo, mamãe? A pergunta certa não seria


o que você está fazendo aqui? – Aponta o queixo para todos eles. –
Uma promotora de justiça em reunião com uma quadrilha.
A mulher fica vermelha, arregalando os olhos em completo
horror.

– Mas, deixa eu adivinhar... – continua Aiden, aproveitando o


silêncio perturbador –, faz parte do esquema, não é? – Aiden solta
uma risada sem humor e balança a cabeça. – Quem diria, isso com
certeza foi uma triste surpresa. – Olha para a mãe com tanto
desdém que eu dou um passo para trás, me sentindo atingida. –
Esperava de todos eles, menos de você, contudo, faz todo o sentido
pensando agora... todas as principais autoridades da cidade.

– Saia daqui e pare de falar asneiras – grita o prefeito,


apontando com o dedo em riste para a porta –, se continuar
vomitando mentiras, considere seu enlace com a minha filha
desfeito.

Aiden me olha, antes de voltar para eles, sorrindo.


– Eu ainda não sei em qual situação o esquema se deu... –
murmura, coçando o maxilar –, o juiz vendia sentenças e o xerife
era pedófilo, no entanto, estavam no esquema. – Ele coloca as duas
mãos nas costas da poltrona e se inclina para a frente. – Então, vão
me contar ou precisarei descobrir tudo?
Tio Quinn está relativamente quieto, assim como Adam. Meu
pai dá um passo intimidador à frente, fuzilando Aiden com tanta
raiva que poderia queimá-lo neste momento.
– Último aviso – ameaça.

Aiden ri.

– Por que está fazendo isso? – pergunta Grace, abalada.


– Ainda tem a cara de pau de perguntar? – Aumenta o tom de
voz, apertando a poltrona com tanta força que os vincos das mãos
começam a embranquecer. – Eu é quem deveria perguntar por que
você está fazendo isso, já que eles foram os responsáveis por matar
o seu marido.

Grace cai na cadeira, como se as pernas tivessem perdido as


forças, cedendo.
– Passei os últimos anos da minha vida estudando maneiras
de chegar a cada um de vocês, seus malditos desgraçados – urra
Aiden, cuspindo ódio puro –, e finalmente consegui cada maldita
prova. Primeiro o juiz, depois o xerife, e agora vocês.

Grace exala, enfiando uma mão na boca para conter o suspiro


de pavor.

– O que está falando? – pergunta o meu pai, a máscara de


desdém desvanecendo-se aos poucos.

Aiden arqueia uma sobrancelha.

– O juiz foi difícil, o hacker dele era bom em criptografar


pastas, mas nada que fosse impossível, não para mim. – Tio Quinn
arregala os olhos, enquanto todo o sangue se esvai do rosto do meu
pai. Aiden continua. – Já o xerife era um tonto, um idiota que
guardava vídeos íntimos de crianças abusadas dentro de várias
pastas.
– Deus... Aiden! – chora Grace, esfregando os olhos, a
maquiagem borrando o rosto.
– Então foi a vez de vocês – acrescenta, ignorando a mãe,
apontando para os dois homens de pé à sua frente. –, celulares não
são tão seguros quanto imaginam, mas confesso que achei
interessante enviarem o endereço através de coordenadas, embora
não sirva para nada.

– E fez tudo isso por vingança? – objeta tio Quinn, falando


depois de um bom tempo em silêncio.

– É claro, qual o maior incentivo de um homem se não for por


vingança? – contrapõe Aiden, estalando a língua. – Eu prometi
acabar com você – encara o meu pai – no dia em que matou Paul
Thorne a dez anos atrás.
Por um segundo, há apenas o silêncio, mas então a risada
estrondosa de Quinn exala pela biblioteca. Ele bate palmas e se
encolhe, lágrimas saem dos cantos dos olhos, enquanto a risada
ríspida ecoa.

– E eu aqui pensando que você era um gênio – comenta, entre


uma lufada e outra de ar – confesso que estava realmente
encantado, orgulhoso de Madelyn por ter encontrado um gênio
como você.

– Quinn – adverte Grace, balançando a cabeça.

– Como um lobo velho e experiente, sei que estamos


acabados, querida, não há mais nada para fazer – avisa, os olhos
suavizando quando pousa na mulher –, então vamos falar a verdade
para este rapaz, já que ele passou a vida toda usando os seus
esforços e alvejando se vingar do homem errado.
Meu cérebro começa a fervilhar ao mesmo tempo em que uma
sensação de desespero cresce dentro de mim.

Os olhos de Aiden se estreitam de raiva, mas ele não faz uma


pergunta sequer, deixando que Quinn continue.
– Não foi Tom quem mandou matar o seu pai, foi eu –
murmura, torcendo a boca amargamente.
Sinto o calor das lágrimas por trás das pálpebras com a
afirmação absurda. Incapaz de conter as minhas emoções por mais
tempo, enterro uma mão na boca e solto um soluço.

Aiden apenas o encara com puro ódio, assimilando a


revelação.
– Quinn... por favor... – implora Grace.

– Eu o matei porque era um incompetente que só servia para


atrapalhar as nossas vidas. – Tio Quinn se aproxima de Grace e
segura a mão trêmula da mulher na sua. – Além de ter como esposa
o amor da minha vida, Paul estava investigando o que não deveria.
Minhas pernas falham e eu sinto os meus joelhos dobrarem,
sem condições de me manter em pé.

Não! Não! Não!


Balanço a cabeça, implorando a Deus para que tudo isso se
dissipe, se desfaça em pedaços como um pesadelo.

Mas nada acontece.

Nada acontece porque é real.

Porque Grace Thorne, mãe de Aiden, é amante do homem que


matou o pai dele, amante do homem que assassinou o seu marido.
– Então, meu rapaz, esteve jogando sua raiva para a pessoa
errada este tempo todo. – O maldito psicopata sorri como se não
fosse nada. – Agora me fale o que descobriu, vamos ver se houve
mais equívocos?

Engulo saliva com dificuldade, prestes a vomitar no piso.


– GSQCT... Grupo Secreto que Comanda Tuscaloosa... –
murmura Aiden, sussurrando, a voz fraca, a primeira evidência de
que está abalado.
Quinn faz um sinal com a mão, rindo debochadamente.

– Ah, eu nunca tinha pensado em utilizar a sigla desta forma,


mas confesso que achei muito criativo, Aiden, parabéns por tanta
imaginação fértil. – Amplia a risada, fazendo-a ecoar pela biblioteca.
– Ora, essa era uma das mais fáceis, outra decepção com você,
infelizmente.

– Fala logo, porra! – grunhi Aiden, chutando a poltrona com


tanta força que o objeto vai para frente. Grace soluça.
Quinn faz um barulho de desdém com a garganta.

– Grace, Sherwood, Quinn, Charlie e Tom – responde,


somente.

Deus!

Grace – Promotora de Justiça.

Sherwood – O Xerife.

Quinn – Ele.

Charlie – O Juiz.

Tom – O Prefeito.

– E qual é o seu papel nisso tudo? – questiona Aiden.

Quinn bate palmas.

– Eu sou o cabeça, sou o principal traficante de drogas da


cidade – assume com tanto orgulho que eu me encolho e estremeço
– E dos outros? – Aiden se move, parando ao lado do agente
que, até então, eu nem lembrava mais que estava aqui.

– Quinn, cale a porra da sua boca – esbraveja o meu pai.

– Eu trago as drogas, Sherwood era o encarregado de


distribuí-las, Tom lava o dinheiro com as obras inacabadas da
prefeitura, Charlie inocentava os nossos homens quando eram
pegos, e a minha adorável Grace aliviava as acusações. – Me lança
um olhar. – Não era um negócio de família, surgiu a oportunidade
quando conheci o representante de uma das maiores máfias do
mundo em Los Angeles, então ele explicou como deveria se tornar o
esquema e como as coisas deveriam ser feitas para que dessem
certo. Desde então, coloquei Tom na política e comprei todos os
outros. E deu realmente certo por longos e longos anos... – Arrasta
os olhos de volta para Aiden. – Até agora.

– Meu pai sabia de vocês dois? – pergunta Aiden, apontando


de um para o outro.

– Parece que ele desconfiava, mas só começou a incomodar


quando passou a investigar uma saída de dinheiro de uma das
contas da prefeitura – suspira – fizemos uma reunião para decidir
qual seria o destino dele, e antes que faça um mal julgamento da
sua mãe, ela discordou da morte, assim como não sabia quando eu
ordenei que matassem. E depois, ficou anos sem chegar perto de
mim, magoada por conta disso.
Me levanto do chão, fraca, arrastando as pernas até Aiden,
tocando em seus ombros, tentando lhe passar algum conforto de
alguma maneira.

Quinn arrasta os olhos até os meus.

– Oh! – Seu semblante se ilumina. – Deixa eu adivinhar outra


vez, se aproximou da minha sobrinha para se vingar do meu irmão
usando a filha dele quando ainda pensava que ele fosse o
responsável pela morte do seu pai? – pergunta, sorrindo
amplamente.

– Minha relação com Madelyn não é da sua conta! – sibila


Aiden, me abraçando – Por qual porra de motivo você participou
disso? Como pode ser uma vadia sem coração? – grita, encarando
a mãe com asco.

Grace se encolhe, cascatas jorram dos olhos.

– Eles recebiam parte do pagamento das drogas, o que dava


muito mais da metade do que costumavam ganhar – diz Quinn. –
Além do mais, eles não tinham uma escolha, era isso ou deixar o
cargo.
– Juro que não queria que Paul morresse, eu tentei fazer com
que parasse as investigações, implorei para que Quinn deixasse ele
comigo, mas nenhum dos dois me ouviu – chora Grace –, fiquei
sabendo da morte dele no mesmo dia que você, eu não premeditei
nada disso, Aiden, sabia o quanto eram próximos.

– E mesmo assim protegeu o homem que o matou... – cospe


Aiden.

– Não podia entregá-lo, se o fizesse, estaria acabada como


ele.

– MAS CONTINUAR FODENDO COM ELE DEPOIS DA


MORTE DO MARIDO PODIA? – Aiden grita tão alto e com tanta
força que todos na sala se encolhem diante do tom de voz.

– Eu o amo... – revela Grace, soluçando, desesperada.

– Vocês são dois lixos que se merecem – Aiden se vira,


esfregando o rosto com força.

– Madelyn, o que está fazendo aqui? – pergunta o meu pai.

Minha deglutição é audível.


– Estou aqui porque ajudei Aiden a conseguir as provas –
confesso, erguendo o maxilar.
– Como você ousou?

Ele voa em minha direção com a mão estendida, preparado


para me bater quando é interceptado por Aiden.

– Se tocar em um fio de cabelo dela, eu mato você! – sibila,


empurrando-o para trás.
– Vocês são podres e merecem morrer na cadeia – dispara
Aiden, aproximando-se de mim –, desprezíveis! – Encara a mãe. –
Nunca mais eu quero olhar pra sua cara, nem ouvir o seu nome, que
apodreça com eles.

– Aiden, meu filho, por favor! – Se joga no chão, implorando.

– E você, Madelyn, esqueça que é minha filha, vou limpar


todas as contas da família, deixar que sofra na míngua, depois que
ver como vai continuar usufruindo da sua vidinha.

– Foda-se você e o seu dinheiro sujo! – berro, franzindo os


olhos em raiva e nojo. – Nunca foi um bom pai, sempre me manteve
presa, nunca deixou que eu vivesse a minha vida, e ainda queria me
obrigar a ficar com um cara escroto, um idiota que sabia como era
assim como sabia do pai nojento e pedófilo.

– Pode parando! – intercede tio Quinn – Não temos nada com


os interesses sexuais de Sherwood, ele tinha gostos peculiares e
ninguém intervinha nisso.

Encaro-o com tanto ódio que poderia esfaqueá-lo neste


momento.

– Gostos peculiares, seu escroto? Estamos falando de


crianças, meninas com pouco mais de oito anos de idade!

Ele ergue os braços para cima.


– Tanto faz, chame como quiser, eu só conseguia os vídeos
com uns contatos e passava para ele – cicia, escorando-se contra a
poltrona. – E antes que continue me olhando com nojo, Maddie,
Sherwood só não abusava pessoalmente destas crianças porque eu
o proibi expressamente, alegando que ele correria risco de perder a
carreira e eu o mataria por isso.
Não consigo controlar a bile, giro a cabeça para o lado e
vômito no chão. Aiden segura os meus cabelos e mantém o meu
corpo firme, me impedindo de cair.

– Fraca, como eu sempre disse – comenta o meu pai.

Uma das poltronas range e o policial disfarçado finalmente se


levanta, removendo uma peruca da cabeça e a máscara do rosto.

– Tom Sutherland, Grace Thorne e Quinn Sutherland, vocês


estão presos! – Ele retira o distintivo do FBI do bolso e apresenta a
eles. – Vocês têm o direito de ficarem calados. Tudo o que disserem
pode e será usado contra vocês no tribunal.

Os olhos de Quinn se iluminam.

– Isso sim que é um feito e tanto, finalmente conseguiu o que


tentou por muitos anos, não é mesmo Adam Scott?

Adam abre um sorriso depreciativo.


– Não se exceda muito, não conseguiria sem a ajuda de um
hacker jovem e muito brilhante. – Pisca um olho para Aiden.

– Bom, ao menos eu consegui aproveitar a vida ao máximo e


vivi na maior e melhor mordomia que o dinheiro pode prover, não
me arrependo de nenhum feito. – Quinn bate nas pernas, sorrindo
insanamente.

– E embora tenha declarado minha vingança ao homem errado


durante a vida toda, eu ainda assim consegui o que queria, acabei
com todos vocês, fiz justiça pelo meu pai. – Aiden faz um sinal de
despedida com a mão. – Que queimem no inferno, seus bostas!
A porta é aberta e um número gradativo de homens vestindo o
uniforme do FBI entra na sala. Grace grita o nome de Aiden,
chorando e implorando para que ele fale com ela, para que o filho
lhe profira alguma palavra, qualquer coisa que seja.

Mas Aiden não fala absolutamente nada, ignorando a mãe com


desdém.

Meu pai me lança um último olhar antes de passar ao meu


lado.
– Preferiria que tivesse nascido morta como os natimortos que
sua mãe teve antes de finalmente ter você – Cospe aos meus pés.

Aiden levanta o braço e soca o rosto dele com força, sangue


expele no piso claro, escorrendo pelo nariz, manchando os lábios,
queixo e pescoço.

– Vá para o inferno, desgraçado – retruca, me puxando para


longe.

Meu corpo inteiro treme diante de todas as notícias, diante de


tudo o que aconteceu. Imaginei que não seria fácil, mas não
esperava que os acontecimentos se sucedessem dessa forma.
Acaricio a bochecha de Aiden.

– Você está bem? – murmuro, as lágrimas pinicando os meus


olhos.
Aiden confirma.

– Uma parte dentro de mim sofre por causa dela e do que


descobri, mas a parte predominante, a parte morta e adormecida,
simplesmente ignora as descobertas e se sente aliviada por ter
vingado a morte do pai – confessa, enrolando uma mecha dos meus
cabelos com o dedo –, só espero que possamos viver em paz agora
e seguir as nossas vidas com dignidade.
– Mas agora está sozinho... – lamento.

– Eu tenho você, Maddie, você é a única coisa que eu preciso.


– Cola a testa na minha, encarando-me com o semblante taciturno.
– Você é o meu lar. Eu te amo.
– Aiden... – rogo – eu também te amo.

– Não está chateada com o que aconteceu, com o seu pai?


Balanço a cabeça.

– Nada do que ele já não tenha dito, em outras palavras, antes.


Ele nunca me amou, nunca se importou comigo, e nunca foi um pai.
Só lamento por você, por sua mãe e pelo tio Quinn.

– Só vamos seguir a vida, Maddie – insiste, embora eu ainda


pense que ele está anestesiado com tudo o que descobriu ou esteja
em negação. – Passei os últimos dez anos planejando uma
vingança, e eu finalmente a tive, não quero me preocupar com mais
nada, não quero sentir mais nada, só quero viver em paz.
– Tudo bem, vamos viver um dia de cada vez, portanto.

– Juntos.
– Juntos!

Alguém pigarreia atrás de nós. Adam nos espera com as mãos


nos bolsos, o disfarce desfeito.

– Posso falar com você? – pergunta, olhando fixamente para


Aiden.
Suspiro, me desfazendo do enlace das mãos dele.

– Tenho que falar com a minha mãe, nos vemos mais tarde.
Cumprimento Adam com um aceno ao passar ao seu lado,
enquanto me movo para enfrentar a última batalha desta noite.

Observando Adam melhor, noto as marcas de expressão ao


redor dos olhos, assim como o olhar de um homem cansado. Adam
parece ter a mesma idade que meu pai teria se ainda estivesse vivo.
E, estranhamente, eu gosto dele, sinto que é verdadeiro.

– Uma noite e tanto – murmura, arqueando uma sobrancelha.


Ele mantém as mãos nos bolsos e se aproxima em passos
curtos e precisos, como se estivesse tentando não me assustar de
alguma forma.

– Sim – respondo, somente.

Adam me observa, os lábios comprimidos.


– Seu pai estaria orgulhoso, garoto.

Meu coração erra uma batida com a menção do meu pai, e eu


preciso cruzar os braços para conter o estremecimento, o arrepio na
espinha.

– Vocês se conheceram? – pergunto, limpando a garganta


para conter a angústia.
Ele confirma com um sinal.
– Não pessoalmente, mas nos tornamos bons amigos virtuais
durante o pouco tempo em que mantivemos contato.
Inspiro o ar com força, me acalmando.

Não me sinto completamente pronto para ter esta conversa,


não depois de descobrir que a minha própria mãe é uma
desgraçada traidora. Mas eu quero saber tudo o que ele sabe sobre
o meu pai, quero ouvir sobre os seus últimos momentos de vida,
sobre o que eu não fazia ideia na época em que o perdi. E sinto que
se não for agora, não será nunca mais.
Engulo saliva para desobstruir a garganta embargada.
– O que aconteceu? – indago.

Adam suspira e me lança um olhar condescendente. Pelo


visto, não estou conseguindo disfarçar tão bem as minhas emoções
como estava imaginando.

– Estive investigando esse grupo pelos últimos anos da minha


vida, tentei achar provas para derrubá-los, mas com todas as
principais autoridades trabalhando junto no esquema, se tornou
inviável. Quinn me conhecia de outras tentativas frustradas em
tentar incriminá-lo, somos inimigos há anos, enquanto eu tentava
fazer justiça, ele denegria a lei. – Esfrega os cabelos com uma mão,
o semblante denotando cansaço. – Mas, quando já não tinha mais
esperanças, em um dia qualquer recebi a notícia de que um cidadão
havia entrado em contato para denunciar o prefeito de Tuscaloosa,
alegando que ele estava desviando dinheiro público. Como meus
colegas sabiam que eu estava investigando essa cidade em
específico, me passaram a ligação. Eu e Paul conversamos por
horas, mas ele não sabia que se tratava de uma quadrilha bem
articulada de tráfico de drogas e não de um caso isolado de
corrupção.
– Se ele não sabia... – comento, pensando em voz alta.
Paul acena.
– Ele iria me passar as contas em que percebeu o desvio, isso
seria prova o suficiente para que eu pudesse ao menos conseguir
um mandado de interceptação telefônica, mas, infelizmente, foi
morto antes de tudo.

Dou um passo para trás, letárgico.


– Minha mãe... – sibilo, a voz não passa de um murmúrio.
– Sinto muito, Aiden..., acho que ela comentou com a quadrilha
sobre o que estava acontecendo ao mesmo tempo em que tentou
interceptar o seu pai, mas como Quinn disse mais cedo, ele não
quis esperar e mandou matá-lo. – Adam estende a mão e dá um
passo à frente. – Me senti culpado por todos esses anos, me culpei
por ter envolvido Paul nessa merda toda, me culpei quando vi você
no velório dele, apenas um garoto que padecia com a dor de ter
perdido o pai.
Coloco as mãos na nuca e solto um suspiro, meus pés ganham
vida própria e se movimentam de um lado para o outro na biblioteca.
Ouço o burburinho das pessoas no corredor, mas nada parece
importar agora, nada além do que estou descobrindo.

Então foi por culpa de Grace, no final das contas, que meu pai
morreu?

Afasto a gravata com a ponta do dedo, sentindo-me sufocar.


Espalmo as mãos no encosto da poltrona em que ela estava
sentada e fecho os olhos com força, engolindo todo o ódio que
ameaça me corromper ainda mais.

– Aiden... – Sinto a mão de Adam no meu ombro direito, um


toque silencioso, uma forma de conforto. – Não acredito que Grace
tenha feito isso com o intuito de ver Paul ser morto, acredito que
tenha feito para tentar defender o grupo que fazia parte. Não estou
fazendo isso para tornar as coisas melhores para você, falo porque
sinto que é essa a verdade, Grace não deveria saber como o
amante era um psicopata de merda.
– Isso não isola o fato de que ela o traiu – sibilo, trincando a
mandíbula para não gritar ou quebrar alguma coisa –, ele confiou o
segredo a ela, e se ela nunca tivesse contado para o maldito, ele
ainda poderia estar vivo.

– Não vá por este caminho, rapaz, ele só levará ainda mais


para a dor. – Aperta o meu ombro. – Não podemos saber, Grace já
fazia parte e se Paul tivesse me passado os dados, ela estaria
acabada. De uma forma ou outra, você teria perdido um dos dois,
pois, sem querer, estavam jogando de lados opostos.
Isso não a redime da culpa, não faz com que eu a odeie
menos. Nós, por consequência da morte do meu pai, acabamos nos
afastando, contudo, ela ainda era a minha mãe e eu ainda me
importava com ela. Hoje, ela morreu para mim.
Nada do que diga ou faça será capaz de reivindicar o meu
perdão. Grace acabou com a nossa família, acabou comigo. Ela
carrega a mesma culpa que o amante pela morte dele. Ela poderia
ter evitado ou ao menos se afastado do desgraçado, qualquer coisa,
mas ela não fez nada disso, ela simplesmente seguiu a vida como
se não fosse nada, como se não importasse.

– Como você conheceu Quinn? – pergunto, franzindo os lábios


em uma careta ao mencionar o nome do desgraçado.

Ele disse para Maddie que não era um negócio de família, que
entrou nessa depois de conhecer um mafioso, mas não especificou
quando. E ainda comemorou os últimos anos vividos e aproveitados
através do dinheiro sujo.
Adam solta uma respiração forte pelo nariz.
– Sou o responsável pelo setor de drogas, ouvi falar no nome
de Quinn quando um caminhão foi apreendido na Interstate 20[13]
com destino a Tuscaloosa, pois o condutor deu o nome dele, então
comecei a investigação e descobri que era muito maior do que
apenas tráfico de drogas, que Quinn havia construído uma muralha
ao seu redor, sendo praticamente impossível de chegar até ele.
Quinn me conheceu em uma das inúmeras tentativas frustradas de
conseguir uma prova que fosse contra ele, e quando debochou da
situação e disse que era imbatível, fez com que derrubá-lo se
tornasse uma obsessão para mim, uma meta na minha carreira.

Bom, isso explica o quão impressionado o desgraçado ficou ao


reconhecer Adam.

Massageio as têmporas com o indicador e o polegar.

– Eu tenho mais uma coisa para contar – cicia, me fazendo


virar a cabeça em sua direção –, fui eu quem ensinei tudo o que
sabe, fui o hacker que lhe ofereceu ajuda há tantos anos.

Arregalo os olhos e giro o corpo em sua direção, pensei que


nada mais pudesse me abalar esta noite, mas estava equivocado.

– O quê? – Franzo a testa, encarando-o com afinco.

– Como eu disse, me senti culpado pela morte de Paul, fiquei


arrasado quando vi você no velório dele, tão jovem e tão debilitado.
Então fiquei meio que de olho em você, e quando rastreei seu IP
naquele dia na Deep Web, percebi que precisava de ajuda, assim
como qual era o intuito das pesquisas. E soube que nada e nem
ninguém o faria parar, não até que conseguisse a tão almejada
vingança. Não queria que tivesse o mesmo destino que o seu pai,
embora já soubesse do envolvimento de Grace, assim pensava que
seria protegido por ela, que ela não deixaria que fizessem algum
mal para o filho. – Ele abre um sorriso triunfante, o sorriso que um
pai daria de orgulho para um filho. – E então você sumiu, aprendeu
direitinho tudo o que eu ensinei, o aprendiz se tornou melhor que o
professor. Só voltei a detectar você há alguns meses quando me
enviou as provas do juiz, e tive certeza quando mandou os vídeos
do xerife. Ali eu soube que estava conseguindo.
– E por que nunca me falou nada?

Ele encolhe os ombros.


– Tinha esperanças de que não sucumbisse ao ódio e à
vingança. E, além do mais, fiquei de olho em você durante o tempo
em que vivia com a sua avó, já que tinha se tornado um hacker tão
bom que nem mesmo eu conseguia mais detectar os seus passos.
Mas quando começou a me enviar as provas... fiquei tão orgulhoso,
soube que eu tinha feito um bom trabalho com você.

Coloco as mãos nos bolsos e ajeito a postura.


– Eu fiz o trabalho que você não podia... – comento.

– Sim, mas eu não o ensinei como um instrumento para chegar


ao meu objetivo, ensinei porque se eu não fizesse, você encontraria
alguma outra maneira. E era nada além de um jovem inexperiente
envolvido em um dos piores lugares, onde os seres mais
abomináveis da humanidade se encontram. Precisava protegê-lo de
alguma forma, já que falhei com o seu pai.
Eu não sinto raiva de Adam, tão pouco me sinto enganado por
ele. Adam foi, de certa forma, alguém importante na minha vida.
Sem ele, eu não teria as minhas habilidades e não seria quem me
tornei.
– Você não tem culpa pela morte dele, os únicos culpados são
Grace e Quinn, e agora estão pagando por isso. – Estendo a mão
para ele, mas Adam me surpreende e me puxa para um abraço. –
Obrigado por ter sido um excelente professor, de todos que meu pai
poderia ter encontrado na polícia, fico feliz que tenha encontrado
justamente você.
Adam não tinha dever algum comigo, mas ainda assim ele me
ajudou. Se fosse qualquer outro, teria esquecido a minha existência,
assim como a do meu pai. Mas não Adam Scott.
– Fico feliz que esteja bem, rapaz. – Bate nas minhas costas
antes de me soltar. – Espero que agora viva a sua vida em paz, por
mais que seja difícil depois de tudo o que passou. Você merece e a
garota também.

Concordo com um aceno.

Vejo Madelyn escorada contra o marco da porta. Ela está


mexendo no celular enquanto me espera, o rosto borrado de
maquiagem pelo choro e os cabelos bagunçados.

Adam olha para o mesmo lugar que eu ao perceber onde está


a minha atenção.

– Ela é uma boa garota, Aiden, espero que sejam felizes –


afirma, sorrindo, cansado –, já sabe o que vai fazer depois de hoje?

– Vou fazer o que ela quiser, ela é o meu lar – afirmo, sentindo
o que restou do meu coração bater com mais intensidade ao olhar
para ela.
– Seja livre e feliz.

– Obrigado, Adam, nós nos vemos por aí? – pergunto, ansioso


para que ele dê uma resposta positiva.

– Sim, eu não vou deixá-lo se safar de mim com tanta


facilidade, eu ainda serei seu protetor, a sombra que espreita em
sua vida, não importa a idade que tenha, até o meu último suspiro.
– E eu sou o seu melhor aprendiz, não esqueça que também
não será fácil se livrar de mim.
Pisco um olho e Adam sorri.
Começo a me afastar, mas paro ao seu lado e giro a cabeça
em sua direção ao lembrar de uma coisa.

– Já sabe o que vai fazer quanto às informações que Quinn


revelou, quanto ao tal mafioso? – pergunto, curioso.

Adam solta um suspiro resoluto.


– Infelizmente, não podemos combater ou controlar toda a
criminalidade. O que aconteceu hoje foi somente a ponta do iceberg,
o início de algo muito maior. Tentar combater a máfia é.... – Deixa as
palavras morrerem, cabisbaixo. – Se apegue ao que foi feito aqui, a
justiça pela morte do seu pai, a justiça pelas crianças nos vídeos do
xerife e pelas pessoas que foram prejudicadas pelas sentenças do
juiz, você foi grande, Aiden. – Seu olhar encontra o meu, cheio de
orgulho. – Siga a vida. – Repete, somente, dando o assunto por
encerrado.
Maneio a cabeça, concordando, antes de arrastar meus olhos
de volta para a minha garota, removendo das minhas costas o peso
do passado.
Passei a vida toda sendo corroído pela raiva, dominado pela
vingança. E, embora não tenha sido como eu imaginava e eu tenha
perdido mais alguém importante no meio do caminho, Adam tem
razão, chegou a hora de viver.

Meu coração arde quando penso em Grace e na família que


tínhamos, dói porque a traição dela foi a pior de todas, foi a mais
profunda, a que sangrou mais.

Mas ao olhar para Maddie, ela é como a luz no fim do túnel.


Madelyn sofreu a vida toda com a indiferença do pai, agora ela
merece ser feliz, assim como eu. Maddie merece um casamento
feliz, uma família que seja completa, não a que teve pela metade.
Nós merecemos isso. Portanto, por mais que a vontade de sucumbir
de novo ao ódio para me desfazer do sentimento angustiante seja
grande. Eu não permitirei dessa vez. Por mim. Por Madelyn.

Quero ser para ela o que ela não teve. Quero oferecer a ela, o
amor que não recebeu. Quero ser o lar dela, assim como ela é o
meu.

Nós dois merecemos uma segunda chance.

Nós dois precisamos remendar os cacos que foram partidos.


Nós dois devemos seguir a vida.
Porque, juntos, nós conseguimos colar os cacos e ser
completos outra vez.

Vejo mamãe sentada em um dos sofás da sala de estar, ela


está com os olhos vidrados na lareira escura, o rosto marcado pela
angústia e pelas lágrimas. A maquiagem foi desfeita, assim como o
penteado que tão impecavelmente prendia as madeixas ruivas no
topo da cabeça. O vestido parece amassado, e os saltos foram
removidos dos pés.

Me dói no fundo da alma ver como ela está desolada.


Ela, assim como o restante dos convidados, assistiu a tudo o
que aconteceu na biblioteca através do telão que era destinado a
apresentar os valores doados ao orfanato. Aiden não estava
brincando quando disse que daria um show.
Me aproximo lentamente, as mãos entrelaçadas e o coração
prestes a saltar pela boca.

– Mãe... – sussurro, chamando-a, incerta do que fazer ou o


que falar.

Ela ergue a cabeça, pousando os olhos castanhos em mim.


– Maddie... – roga, soluçando ao me ver. – Você está bem?

Me ajoelho em sua frente e seguro as mãos trêmulas e


geladas contra as minhas. Assim, neste estado, ela parece tão
delicada e frágil.

– Mãe – engulo a saliva para molhar a garganta –, eu sinto


muito.
Ela nega, removendo uma mão das minhas e pousando-a em
meus cabelos, um toque maternal e amoroso.
– Oh, meu amor – Chora, os dedos afagam o meu couro
cabeludo com carinho –, está tudo bem – confirma, balançando a
cabeça com veemência, tentando se convencer das suas próprias
palavras.

Fecho os olhos, me preparando para a conversa que talvez me


faça sangrar ainda mais esta noite. Abro-os de volta, encarando-a
com determinação e uma centelha de esperança.
– Você sabe o que eu fiz? – pergunto, a voz não passa de um
sussurro trêmulo. Ela acena. – Não sei o que acha da minha traição,
mas eu precisava, mãe, era injusto o que fizeram com o pai de
Aiden, o que fizeram com ele. Era injusto que eu tivesse sido
sempre moldada para a perfeição, quando ele não era perfeito. Não
sei como a senhora se sente em relação a isso, mas preciso que
saiba que eu não me arrependo, que fiz o que achei que fosse o
certo, e estou com a consciência limpa.
Lágrimas rolam pelos meus olhos e escorrem pelas minhas
bochechas, e embora eu esteja prestes a perder outra parte de mim,
não poderia viver com a culpa de enganar a minha mãe. Só
expressei a verdade que sinto.

Ela funga, esfregando o nariz com o dorso da mão.


– Seu pai é o meu grande amor, Maddie, mas o verdadeiro
amor da minha vida é você!
Exaspero, soltando uma respiração ruidosa pelo nariz.
– Então não está brava? – pergunto, semicerrando os olhos.

Ela nega.

– Estou magoada com ele, me sentindo traída e chateada. Me


sentindo destruída depois do que ouvi ele falar para você, querendo
que jamais tivesse vingado, como os outros bebês... – Soluça tão
alto, tão profundo e tão dolorido, que eu me encolho. Funga,
respirando lentamente para se acalmar e continuar. – Eu sabia que
tinha algo errado, sabia que ele escondia algo com o seu tio, eram
muitas reuniões recorrentes, mas não fazia ideia de toda essa
maldade. – Levanta-se, afastando-se e caminhando ao redor, como
se o espaço tivesse se tornado pequeno para acumular todo o fardo
desta conversa. – Eu não gostava do jeito que ele tratava você, mas
como uma idiota apaixonada, pensava que fosse para o seu bem,
para preservar a sua identidade, já que era a princesa da cidade e
todos os inimigos políticos dele estariam à espreita, esperando a
hora certa de atacar. Por muito tempo fiquei calada, submissa a
personalidade dele e tudo o que fazia, embora não concordasse,
pensando que ele estava certo, que era um homem inteligente. – Me
lança um olhar permissivo. – Achei que fosse uma forma de
proteção. Só percebi que seu pai não se importava no dia em que
queria lhe obrigar a voltar para Lennon, mesmo depois de tudo o
que contou. Eu quebrei naquele momento, Maddie. E jurei a mim
mesma que iria embora com você se ele insistisse mais naquela
história, mas logo começou a namorar Aiden e parecia tão feliz que
eu deixei as coisas fluírem como estavam.
– Então a senhora não me culpa por ter acabado com a nossa
família?

– A culpa não é sua, nem de Aiden e nem minha, a culpa é de


Tom, ele só está colhendo os frutos que plantou. – Esfrega o rosto
com as pontas dos dedos, removendo as lágrimas e a maquiagem
borrada. – Eu jamais odiaria você, minha filha. Sofri muito para tê-la,
você foi muito aguardada e esperada. Foi a melhor coisa que me
ocorreu. Eu queria ser mãe, e você me concedeu esse título. Eu te
amo acima de tudo e qualquer coisa.

Me levanto do chão e corro em sua direção, me jogando em


seus braços e inspirando o seu cheiro.

– Obrigada, mãe, eu te amo muito.


Ela acaricia os meus cabelos e beija o topo da minha cabeça,
me apertando com força contra o seu corpo, como se estivesse
tentando me proteger de tudo o que aconteceu, de alguma forma.

– Nós precisamos seguir nossas vidas, Maddie, vai ser


doloroso, vai ser difícil, mas não podemos mudar o passado e nem
as pessoas. – Me afasta para me encarar nos olhos. – Sei que gosta
do garoto, assim como sei que ele precisa de você, de nós! Aiden
perdeu o pai e hoje perdeu a mãe. E por mais que não tenhamos
culpa, ainda assim é culpa da nossa família, pois foi ela que lhe
causou tanto sofrimento. Então vamos seguir em frente, vamos nos
apoiar, assim será mais fácil.

– Não sente remorso pelo que Aiden fez? – questiono, o cenho


franzido.
– Ele era só uma criança quando viu a família ruir, que tipo de
pessoa eu seria se o culpasse por ter corrido atrás do que
acreditava, Maddie? Quero me redimir de algum jeito com ele, quero
me redimir pelo sobrenome que nós carregamos e pelo sangue que
você carrega.
– Mas nós não temos culpa... – rebato, entrando na defensiva.

– É lógico que não, mas eu ainda faço questão de me redimir,


não por mim, mas por vocês dois que, mesmo tudo indo contra,
escolheram se amar e seguir em frente.

Entendo sua linha de raciocínio, embora não sejamos


culpadas, eu ainda carrego o sangue e o sobrenome de tio Quinn, o
verdadeiro responsável pela morte da pessoa mais importante da
vida de Aiden. E, assim, nós quebramos os paradigmas, nós
lutamos contra tudo o que dizia que não daria certo, e fizemos dar.
Nós nos apaixonamos quando não deveria.

Nós nos entregamos um ao outro quando não podíamos.

– Agora, querida, vá ver como Aiden está. – Arruma uma


mecha do meu cabelo atrás da orelha. – Eu preciso fazer o meu
papel de primeira-dama e dar uma resposta para a sociedade.
– A senhora vai ficar bem?
Ela abre um sorriso acolhedor, embora não chegue aos olhos.

– Eu tenho você, Madelyn, meu doce e adorável presente, e


desde que eu a tenha ao meu lado, sempre ficarei bem.

– Eu te amo, mãe.
– E eu amo você, Maddie, vamos reunir os cacos, vamos nos
reerguer das cinzas e seremos felizes de novo em algum momento.
Ela está sofrendo, posso perceber pelo tom de voz e pelos
olhos que brilham a cada vez que tenta evitar tocar no nome do
marido. Eu não a culpo por ainda amá-lo, eu mesma ainda o amo
depois de tudo o que fez.
Mas nós temos uma à outra. E eu tenho Aiden.

Sim, nós vamos conseguir nos reconstruir depois dessa ruína


que assolou nossas famílias e nossas vidas.
Me afasto, caminhando de volta para a biblioteca onde deixei
Aiden conversando com Adam.
Ter o apoio de mamãe foi a coisa mais importante que me
aconteceu nos últimos tempos. Temia que ela ficasse contra, que
me odiasse assim que soubesse o que fiz. Mas ela não fez nada
disso. Ela está sofrendo pelos erros do marido, pelo amor que foi
corrompido, pelo casamento que foi arruinado. Mas, ainda assim, é
minha mãe e me ama e me apoia acima de tudo.
Eu consegui salvar uma parte da minha família, também
consegui salvar uma parte minha que quase se desfez hoje.

Porém, será que eu ainda conseguirei salvar Aiden depois do


que Grace fez?

Paro no batente da porta e o encaro, ele conversa com Adam,


não parece com o semblante tão carregado como antes, na
verdade, parece um pouco mais relaxado. E isso me assola,
atingindo meu peito, reacendendo as esperanças.

Aiden Thorne é meu, e espero conseguir retirá-lo da escuridão


uma segunda vez.
 
Três meses depois

Nossa casa está coberta por luzes de Natal, uma guirlanda


enfeita a porta da frente, assim como trenós e renas os jardins. Uma
árvore enorme pisca ao lado da lareira da sala, os enfeites refletem
fotos nossas que foram tiradas nos últimos meses em momentos
felizes.

Depois que as coisas foram reveladas no baile, nossas vidas


se tornaram um caos. As pessoas circundaram nossa casa,
acusando-nos de fazer parte da quadrilha, jogando indiretas e
fazendo das nossas vidas um inferno. Na faculdade, Aiden entrou
em algumas brigas para me defender, até quase ser expulso.

Mas isso não durou mais do que poucas semanas. Com o


tempo, a fumaça foi baixando até se dissipar totalmente.
Então outro escândalo veio à tona, aliviando o nosso lado,
quando descobriram o motivo do porquê Lennon sumiu
completamente da cidade. Pelo que ficamos sabendo, Gretha doou
o bebê e se mudou para uma cidade próxima, decidindo não
retornar para Tuscaloosa. Já Lennon ainda cumpre pena de prisão,
mas será solto dentro de alguns anos, parece que a sua mãe
colocou a casa à venda e está organizando as coisas em alguma
cidade longe daqui para quando o filho for solto.
Independentemente, eles ficaram enterrados no passado junto com
os outros.
O vice de papai assumiu o cargo na prefeitura e declarou total
apoio a mim e mamãe porque, no final das contas, todos nós fomos
vítimas. Já Aiden não quis visitar Grace, nem abriu nenhuma das
inúmeras cartas que ela lhe enviou, queimando todas no minuto em
que chegaram.

A família de Emy também foi fundamental nesse processo de


reconstrução, eles ficaram por perto, declarando apoio, nos
abraçando.
Tio Quinn e papai não entraram em contato. Mamãe foi até a
cadeia há algumas semanas conversar com ele e contar que estava
pedindo o divórcio, ela retornou com ainda mais raiva do marido.
O que ficamos sabendo através de notícias foi que tio Quinn e
Sherwood foram condenados à morte, enquanto papai, Grace e
Charlie à prisão perpétua.

Arrumo um dos enfeites da mesa de jantar, ajeitando os


guardanapos de tecido de forma correta.

Braços fortes rodeiam a minha cintura e lábios quentes se


chocam contra a pele do meu pescoço, me fazendo arrepiar.

– Oi, amor – sussurra Aiden, me apertando contra si.


Inspiro o cheiro que eu tanto amo, um sorriso curva os meus
lábios e meu coração acelera, correspondendo aos efeitos que
Aiden Thorne causa em meu corpo.

– Preciso terminar de arrumar a mesa, logo os convidados


estarão chegando – aviso, escorando a cabeça contra o peito duro.
– Sabe se Adam vem?

Ele e o agente estão mantendo contato, Aiden adquiriu um


carinho pelo policial, assim como ele tem um apego por Aiden, eo
considera como o filho que não teve. De certa forma, Adam viu
Aiden crescer e sempre esteve à espreita como um protetor, um
anjo da guarda que Aiden não sabia que tinha.

– Ele tem muito trabalho, mas mandou eu desejar um feliz


Natal a todos – comenta, beijando a curva do meu pescoço.

Aiden se mudou para a minha casa uma noite depois do que


aconteceu e colocou a casa que pertencia aos pais à venda. Disse
que não tinha interesse em continuar morando em um lar que foi
construído sob mentiras. Ele também nunca mais tocou no nome de
Grace, apenas disse que quer esquecer tudo e quer seguir à vida ao
meu lado, quer ser um homem completo para mim, por isso não faz
questão que as coisas com a mãe abalem o nosso relacionamento
ou a nossa vida. Então eu o respeitei e deixei tudo isso de lado.

As contas de todos eles foram bloqueadas, inclusive a do meu


pai, contudo, diferente do que ele falou antes de ir preso, minha mãe
sempre teve dinheiro, talvez até mais que ele quando se casaram.
Então nós jamais precisaremos do dinheiro sujo que adquiriu
vendendo o seu caráter ao longo dos anos. Assim como Aiden, que
ainda tem o Banco que pertencia ao pai e se desfez de qualquer
coisa que pertencesse a Grace.

– Adam trabalha demais, deveria descansar às vezes –


murmuro, ajeitando uma faca que estava fora da linha dos outros
talheres.
– Ele é feliz com o trabalho, ainda mais agora que foi
promovido por causa do caso.

Reviro os olhos, rindo.

– E você aceitou a proposta dele? – pergunto, mudando de


assunto.

Adam ofereceu um cargo a Aiden no FBI, disse que as


habilidades dele são boas demais para serem desperdiçadas, mas
Aiden não ficou muito tentado a confirmar, já que se for entrar para o
órgão não poderá invadir computadores e celulares de forma ilegal
como tem feito nos últimos anos.
– Acho que somos melhores assim, ele seguindo as leis e eu
seguindo o que acho que devo fazer – responde, afastando-se.

– De qualquer forma, vocês fazem uma equipe e tanto.

E é verdade, enquanto Aiden pode invadir qualquer coisa que


sinta vontade sem precisar responder ao governo ou a polícia pelos
seus atos, desde que não seja pego, Adam precisa se conter.
Assim, Aiden consegue as provas e Adam os meios formais de
prender os culpados.
A campainha toca e Aiden se dirige até a porta. Emy, Miles e
os pais aguardam na entrada com pratos de comida nas mãos,
sorrindo, vestidos com as cores natalinas.
De um jeito diferente, construímos uma família, um círculo
social advindo de apoio e amizades verdadeiras. Com tudo,
descobrimos que família não é sobre o sangue que carregamos, é
sobre suporte, sobre quem está ao seu lado quando precisa, sobre
quem gosta verdadeiramente de você.

Emy arruma um dos pratos na mesa e me abraça apertado.

– Nós já podemos começar a beber ou ainda é muito cedo? –


questiona, fazendo um bico perfeito com a boca.
Mordo as bochechas para conter uma gargalhada.

– Tenho algo para você na cozinha.

Cumprimento o senhor e a senhora Portman antes de me


afastar em direção à cozinha com ela.

Mamãe está em um evento natalino no orfanato local e


chegará em breve para a nossa ceia.
Abro um dos armários e recolho um whisky de dentro,
entregando-o à uma Emy sorridente e muito animada.

– Sempre quis experimentar um de vinte e cinco anos – diz,


abrindo a garrafa e virando um gole direto do gargalo.

– Estava no escritório, será melhor aproveitado por alguém que


gosta de destilados do que esquecido em um armário. – Encolho os
ombros.
Emy suspira.
– Está tudo bem?

Confirmo.
– Ainda é um pouco estranho, mas estamos seguindo a vida
da nossa maneira e dentro do nosso fluxo.

Ela estende a garrafa, faço um brinde silencioso antes de


beber alguns goles, o líquido desce queimando pelo meu esôfago e
me forçando a fazer uma careta de reprovação pela sensação.

– E quanto a faculdade? – pergunta, cruzando os braços.

Aiden e eu estamos pensando em ir embora da cidade, nunca


gostamos desse lugar e agora que o escândalo veio à tona,
decidimos que seria o melhor a se fazer. Contudo, enquanto Aiden
terminou o curso e aguarda somente a formatura, para mim ainda
faltam dois anos. Então comecei a tentar transferência para outras
universidades.
Solto uma profunda lufada de ar.

– Minha transferência foi aceita na universidade da Columbia –


confesso, sussurrando para que ninguém mais possa ouvir –, recebi
ontem a carta de admissão.
Em decorrência das minhas boas notas e de ter cumprido o
prazo mínimo de seis meses, minha transferência foi admitida.

O queixo de Emy cai.


– Isso é em Nova York? – pergunta. Eu confirmo com um sinal.
– Porra, Maddie, fica a mais de quinze horas de viagem –
choraminga, virando vários goles do whisky para suprir a tristeza.

– Eu sei, ainda não decidi – Me escoro contra o balcão e solto


outro suspiro –, tem a minha mãe, vocês e tudo mais, estou
pensando, embora seja uma boa oportunidade.

Emy balança a cabeça.


– Por mais que eu sinta vontade de chorar em falar isso, como
melhor amiga, preciso dizer que você deve ir, Maddie, não é uma
boa oportunidade, é uma oportunidade maravilhosa. – Ela encosta a
cabeça em meu ombro. – E, além de tudo, eu quero muito saber
como são as festas em Nova York, vai ser bom ter uma amiga
vivendo por lá.

Solto uma risada zombeteira.

– Claro que você estaria interessada nas festas – brinco.


Emy me encara solenemente.

– É uma oportunidade incrível, você deveria pensar melhor. Eu


amo você e vou sentir muito a sua falta, mas tenho certeza de que
será muito feliz nesta nova etapa da sua vida.

– Obrigada, Emy – Abraço-a. – Não conte para ninguém, nem


mesmo Aiden sabe.

– Segredo guardado com sucesso – zomba, retornando para a


sala com a garrafa nas mãos.

Uma música natalina toca, reverberando pelo cômodo,


enquanto todos riem e conversam, felizes e confortáveis. Mamãe
chegou em algum momento em que estava com Emy na cozinha, e
embora devesse estar infeliz por passar o primeiro natal sem o
marido, ela não parece nada além do que alegre. Daniel, o vice-
prefeito e agora prefeito da cidade, está ao lado dela.

Aproveitamos a noite ao máximo, desfrutando da ceia,


bebendo, conversando e nos divertindo. Uma família torta, mas
completa.

– Aqui está o seu – murmura Aiden, me entregando uma


pequena caixa embrulhada com um laço vermelho.

Me desfaço do papel de presente, abrindo-o com certo


desespero. Dentro há um colar com um coração partido ao meio.
Encaro-o sem entender. Aiden sorri.

– Nossos corações se tornaram um só, Maddie, você carrega


metade dele e eu a outra – avisa, abaixando um pouco a camisa
para me mostrar uma nova tatuagem que foi acrescentada em seu
peito, onde um coração do tamanho da joia e com os mesmos riscos
partidos está tatuado, no meio há as iniciais dos nossos nomes. –
Feliz Natal, princesinha.

Me emociono com o presente, lágrimas embaçam a minha


visão. Me jogo em seu colo, beijando os seus lábios com fervor.

– Eu te amo, Aiden – balbucio contra a sua pele, fechando os


olhos, sentindo tanto amor e tanta felicidade que chega a
transbordar.

– Eu também te amo, princesinha, você me torna completo –


Beija os meus cabelos.

Aiden coloca a joia em meu pescoço, completando o ritual,


enquanto ele carrega metade tatuado na pele, eu carrego a outra
parte logo acima do coração.

– Eu também tenho um presente para você – aviso,


entregando-lhe o envelope.
Aiden recolhe e abre com tanta rapidez que eu fico com medo
que vá rasgar os papéis, os olhos correm de uma linha para a outra
e um sorriso vai surgindo em seus lábios.
– Você já aceitou? – pergunto, os olhos brilhando em
animação.

– Pensei em falar com você primeiro – confesso, dando de


ombros.

Ele franze a testa.

– Por quê?

– Não sei se essa é a sua vontade, Nova York é um pouco


longe.
Aiden ri e balança a cabeça.

– Tá brincando? Tenho certeza de que seremos muito felizes


morando em Nova York.

– Então você aceita ir morar comigo? – indago, arqueando


uma sobrancelha.

– Isso é um pedido de casamento, Madelyn? – zomba.


– Querido, sou leitora de romances, acha mesmo que aceitaria
algo tão não romântico para me casar? – refuto, rindo.

Aiden me puxa pela cintura e beija a minha testa.

– Eu quero ir embora, Madelyn, quero ficar com você para


sempre, mas só iremos embora se você se sentir pronta para isso.

– Bom, então não temos um problema porque eu sinto o


mesmo – aviso, minha voz apenas um ruído por conta da emoção –,
mas antes preciso ter certeza de que minha mãe ficará bem.

Aiden concorda, as pontas dos dedos longos massageando a


minha bochecha.
– Você é meu lar, Maddie, não importa para onde vá, eu estarei
junto de você.

– E você é o meu, Aiden Thorne.

Acredito que precisamos disso, que merecemos essa segunda


chance, que mudar dessa cidade fará com que tudo melhore ainda
mais. Se mamãe ficar bem sozinha ou até mesmo quiser ir conosco,
ficarei imensamente feliz. Enquanto estivermos aqui, sempre haverá
dedos para serem apontados e fofocas para serem espalhadas. A
única coisa que Tuscaloosa trouxe de bom para a minha vida foi
Aiden, Emy e Miles, nada além disso.

Mas, como Aiden fala, ele é o meu lar e não importa onde eu
esteja, se eu estiver ao lado dele, sei que ficarei bem.

Aiden Thorne é meu e eu sou dele.

Inesperadamente, a minha vida virou do avesso e eu descobri


que o avesso é o meu lado certo, pois é nele que Aiden está.
 
Cinco anos depois

Grudo a testa na mesa e solto um pesado suspiro, as ideias


fervilhando na minha mente, mas não fluindo no papel. Eu odeio
quando isso acontece. Simplesmente detesto.

Desde que li o e-mail enviado pelo laboratório há alguns


minutos, não consigo me concentrar em nada.

A porta do meu escritório é aberta, me fazendo erguer os


olhos, meu marido entra me encarando de soslaio, a testa franzida
em preocupação.
– O que foi? – pergunto, pendendo a cabeça para o lado.

Aiden para de frente para a minha mesa e retira um pote de


sorvete de dentro da sacola do supermercado, colocando-o ao lado
do computador.
– Quando você começa a me encarar desse jeito – Aponta um
dedo em riste para mim. – Significa que a sua menstruação está
para descer e eu me torno a pessoa mais detestável da face Terra,
então resolvi me antecipar e comprar a sua sobremesa favorita.

Solto uma gargalhada.


Aiden já era um namorado perfeito, mas como marido se
tornou ainda melhor. Nos casamos há alguns meses em uma festa
privada para familiares e amigos próximos, dessa vez, do jeito mais
romântico possível como sempre sonhei.

Ele dobra as mangas da camisa preta, exibindo a pele tatuada


dos antebraços, os olhos fixos em mim, a aliança que cobre seu
dedo anelar brilha a cada movimento que faz com as mãos.

– Estou falando sério, Madelyn, não vou dormir na sala dessa


vez, o sofá é uma merda – retruca, franzindo os lábios em um esgar.

Prendo a respiração e empurro o pote de sorvete para longe,


fazendo-o semicerrar os olhos.

– Eu não preciso disso dessa vez...

– E posso saber por quê?

Mordo as bochechas, nervosa.

– Porque a minha menstruação não vai descer nesse mês... –


sussurro, a voz não passa de um fio –, e nem nos próximos.

Aiden me encara com o cenho franzido, então a carranca vai


se desfazendo até se tornar serena, até que as minhas palavras
começam a fazer sentido e ele percebe o real significado delas.

– Você... você... – gagueja, abrindo os primeiros botões da


camisa em busca de ar. – Está grávida? – pergunta, a voz
esganiçada.

Confirmo com um aceno, sem condições de lhe dar uma


resposta verbal.

– Porra! – Aiden puxa os cabelos com força, os olhos brilham


em emoção. – Porra, Maddie!

Ele corre em minha direção e se ajoelha à minha frente, me


puxando com força para si e plantando um vasto beijo em meus
lábios.

– Eu te amo, mulher, não acredito que vamos ser pais! –


sussurra, engolindo em seco.
– Nem eu acredito, mas é melhor começarmos a nos
acostumar com a ideia porque dentro de sete meses haverá um
bebê entre nós – exclamo, exasperada de emoção.

Não estávamos tentando um bebê por agora, mas com a troca


do meu anticoncepcional, a gravidez acabou acontecendo, e eu não
poderia estar mais feliz.
– Carrie vai surtar, ela já estava doida para ser avó, lembra de
como ela nos infernizou com isso no Dia de Ação de Graças?

Sorrio.

– Sim, ela vai ser a primeira a espalhar para todos.

Mamãe, que agora está casada com Daniel e vivendo feliz em


Tuscaloosa, está há uns dois anos implorando por um neto.

– Não podemos esquecer de Emy que resolveu que também


queria um sobrinho – brinco.

– Não acredito que vou ser pai, princesinha – Aiden espalha


beijos pelo meu rosto, enroscando os dedos nos meus cabelos –,
prometo que serei o melhor de todos.
– Não precisa prometer isso, sei que será incrível.
Aiden trabalha em casa, assim como eu, ele ajuda Adam com
o FBI e administra algumas coisas do Banco ao lado do seu sócio,
Miles, que assumiu a presidência assim que se formou e seu pai se
aposentou.

Eu me formei em literatura inglesa, mas descobri uma aptidão


para a escrita, então me transformei em escritora de romances
eróticos. Uma carreira que amo e me deixa feliz.
– Eu te amo, Aiden.

– Eu também te amo, princesinha. Obrigado por ser a minha


luz, obrigado por ser o amor da minha vida, por ser uma esposa
incrível e pelo nosso bebê. – Esfrega o meu rosto em uma carícia
lenta. – Era você quem invadia os meus sonhos quando a saudade
sufocava o meu peito e ajudava a aliviar a minha dor, mesmo antes
de nos conhecermos, Maddie, você foi feita pra ser minha, já era a
minha luz sem que eu percebesse.

As sombras do nosso passado ficaram, de fato, para trás. A


dor se dissipou com o passar dos anos e com a vida que se seguiu.
Não soubemos de notícias sobre Grace ou Tom, deixamos que
qualquer ligação se apagasse. Só soubemos da morte de Quinn e
de Sherwood quando elas foram divulgadas em sites de notícias. De
resto, deixamos o passado exatamente no lugar que deve ficar; no
passado.

Quando nos mudamos para Nova York, mamãe deu total


apoio, mas preferiu permanecer em Tuscaloosa já que tinha um
dever com a sociedade, compromissos que tinha marcado quando
ainda era a primeira-dama, e ela usou isso para atarefar a mente e
seguir adiante. Foi então que com a proximidade se apaixonou por
Daniel e recebeu os ares que um relacionamento saudável pode
propiciar a uma mulher.
Emy se mudou para cá logo após a formatura, ela nunca quis
administrar o Banco, ainda mais quando sabia que o encargo
recairia sobre as costas de Miles, como acabou acontecendo. Hoje,
trabalha em uma rede multinacional e viaja para vários lugares, o
trabalho é corrido, mas ela ainda aproveita a vida ao máximo, e
ainda mantém contato com o seu dominador – que hoje já sabe
quem é, mas nunca contou para ninguém, nem mesmo para mim –,
e está feliz dessa maneira.

Miles ficou em Tuscaloosa, ele cuida do Banco e do


Dominators, e foge de um relacionamento como o diabo foge da
cruz.

Aiden e eu conhecemos um clube legal de BDSM aqui em


Nova York, o qual visitamos com frequência para suprir nossas
necessidades, a dele de dominar; e a minha de me submeter.
– Eu preciso reformar o quarto de hóspedes – comenta Aiden,
levantando-se em um movimento –, também precisamos marcar um
médico e ver o que pode fazer e comer. – Ele anda de um lado para
o outro, coçando o maxilar, pensativo. – E nomes, o bebê precisará
de um nome, você já tem algum em mente?
Céus!

– Aiden, nem sabemos o sexo ainda, pare de pirar.

Ele me encara como se eu o tivesse ofendido.


– Maddie, ele vai nascer em algum momento, precisamos
deixar tudo pronto.
– Claro, e nós teremos, no mínimo, uns sete meses para isso...
– Finjo ponderar. – Nossa, é verdade, precisamos correr ou não
teremos tempo de fazer tudo.

Ele bufa, caminhando para fora do escritório.


– Aonde você vai? – grito.
– Eu vou pesquisar livros para ler sobre bebês.

Solto uma gargalhada. Ele me ignora, decidido a descobrir


tudo o que quer neste momento.

Aiden é o meu coração e tenho certeza de que será um pai


incrível, tão maravilhoso quanto é como marido e ser humano.

Madelyn dorme de lado por conta do ventre inchado, as mãos


descansam ao lado da cabeça, a barriga de fora aponta para mim,
arredondada e deslumbrante.

Mesmo de longe, o cheiro do seu perfume adocicado permeia


o ar e flutua até o meu nariz, me fazendo suspirar de satisfação por
senti-lo, por saber que pertence a ela.

Ela ficou mais cansada nos últimos meses, parando até


mesmo com a escrita. As pernas começaram a inchar e as juntas do
corpo a doer. Mas a médica disse que é tudo normal, que são só os
eventos do crescimento da nossa bebê.

Sob a luz da lua que vaza ao redor da cortina, observo o rosto


sereno. Linda. Deslumbrante. Às vezes não consigo acreditar que
ela está aqui e que é inteiramente minha.

A muitos anos atrás, quando pensei que meu coração tivesse


sido completamente destruído, imaginava que uma felicidade assim
não passava de sonhos, que pessoas quebradas como eu nunca
poderiam viver isso aqui. Mas Madelyn veio para mostrar como eu
estava enganado.
Minha doce esposa me trouxe muito orgulho nos últimos anos.
Ela se tornou uma escritora de renome, fazendo tudo sozinha,
colhendo os frutos dos seus esforços e bom trabalho.

É claro que eu teria hackeado o sistema das editoras se eles


não tivessem aceitado a minha garota, porque, de qualquer forma,
eles precisariam fazer isso, não é como se tivessem uma escolha,
não quando se trata de Madelyn e dos seus sonhos. Mas, me
provando ser ainda mais incrível do que já acho, Maddie conseguiu
publicar os livros sozinha, sem a minha interferência.

E agora me trará em breve outro orgulho. A minha filha. A


nossa primogênita.

Assim como prometi deixar todo o ódio para trás para que
pudesse tornar Madelyn completa, fazê-la feliz, prometo que serei
um pai incrível para Anne. Tão incrível quanto Paul Thorne foi para
mim.

Maddie me mostrou o que é felicidade depois de tudo. Ela


curou o meu coração machucado, curando-o por completo até que
nem um único resquício de dor o assolasse. Ela me trouxe a
felicidade mesmo quando eu não estava procurando por uma. Me
mostrou esperanças mesmo quando eu acreditei que ela não
existisse mais, não para mim.

Tudo pelo que lutei, a vingança ou justiça, tudo o que fiz e


meus caminhos tortuosos me trouxeram até ela, até aqui, sou uma
pessoa diferente, a dor nos amadurece, mas o amor nos dá sentido,
rumo e vontade de continuar.

Ela é o amor da minha vida.

E, ao lado dela, nada mais importa, nem mesmo o passado.


 

FIM.
 
 
Ei, você chegou até aqui! Espero que tenha gostado do livro e
que Aiden e Maddie tenham lhe conquistado, arrancando muitos
suspiros, assim como fizeram comigo.

Se você gostou do livro, é muito importante que deixe uma


avaliação na Amazon, pois elas, além de servirem como inspiração
para os autores, também importam para que outros vejam e se
interessem pelo livro.

Se não gostou, sinto muito, espero que algum dos meus outros
livros faça mais o seu estilo. Desejo que possamos nos conectar
com algum dos meus trabalhos, no futuro.

 
Com carinho,
Entre no meu grupo de surto coletivo: Leitores do WhatsApp

 
 
Agradeço às minhas leitoras maravilhosas que vibraram
comigo a cada postagem do livro, sempre me dando apoio e
inspiração. Vocês são incríveis, sou muito grata por tê-las na minha
vida! Espero ter suprido suas expectativas com o livro.

A minha família, por me amparar e vibrar por mim, mesmo


quando eu corro todo mundo da minha casa porque preciso finalizar
um livro.

Ao Kevinn, meu parceiro, por estar sempre acompanhando,


estar sempre por perto, sempre disposto a me ajudar, até mesmo
quando estou pirando por conta do prazo esgotado.

A Mari Vieira, que aguenta os meus surtos e que está sempre


disponível, mesmo quando eu atraso para entregar um trabalho.
Obrigada por ser uma assessora e uma amiga incrível.
A Andréia, minha assessora de parceiras, por me amparar e
me ajudar em todos os lançamentos.
Às minhas parceiras literárias por serem tão incríveis, sempre
engajando e me ajudando em cada lançamento.

Gratidão!

[1] Protagonista do livro “O Conde de Monte Cristo” de Alexandre Dumas.


[2] O piercing apadravya é um piercing genital que atravessa a glande. Ao contrário do

piercing ampallang, o apadravya é feito verticalmente.


[3] Time oficial de Rugby da Universidade do Alabama.
[4] Se imaginar um iceberg, a parte visível do bloco de gelo é a internet como a

conhecemos, denominada de Surface Web, com os domínios populares como o “.com”,


“.br”, “.net”, entre outros. É nela que serviços de busca como o Google encontram links e
informações que batem com o seu interesse e procura. A Deep Web seria o corpo
submerso deste iceberg. Nela estão reunidos serviços ilegais, considerados errados pela
legislação, mas também estão bancos de dados sigilosos, redes de computadores de
universidades, empresas e organizações públicas, arquivos jurídicos, mensagens de redes
sociais, entre outros dados que precisam de proteção e devem estar longe do alcance de
hackers. Já a Dark Web é uma camada mais profunda da deep web, de difícil acesso, já
que os sites não possuem URLs e carecem de um Sistema de Nomes de Domínio Público
(DNS). Geralmente esses sites carregam números próprios para identificação na rede.
Para manter a analogia, a Dark Web seria a parte mais baixa do iceberg, a sua base. É
nessa região da rede que ficam as atividades realmente ilegais e que “dão cadeia”, no
jargão popular. Na camada mais profunda da internet, os hackers trocam informações
sobre como criar novos vírus, e formas de burlar sistemas de segurança. Além disso, é na
dark web que circulam pornografia infantil, drogas, tráfico humano, entre outras coisas.
[5] A principal função de um pilar num jogo de râguebi é participar na formação ordenada

("scrum", "melé"). Além disso, o pilar também tem de levantar os saltadores aquando dos
alinhamentos e lutar pela posse da bola nas formações espontâneas ("rucks").
[6] Que não é engraçado.
[7] O International Bank Account Number é um código-padrão internacional para a

identificação de contas bancárias.


[8] Nos Estados Unidos da América existe a Violence Against Women Act (VAWA). Essa lei

federal foi aprovada pelo Congresso americano em 1994, sob o governo do então
presidente Bill Clinton. A VAWA prevê exames gratuitos para vítimas de abuso sexual,
gratuidade nos processos ou requerimento de ordens de proteção para casos de violência
doméstica, assistência legal, serviços para crianças e adolescentes em situação de
violência familiar e abrigos para mulheres agredidas.
[9] O sniffer é um software que monitora e analisa o tráfego dentro de uma rede.
[10] prompt de comando é um programa que emula o campo de entrada em uma tela de

interface
[11] É o time de Rugby da Universidade de Kennesaw, um instituto que faz parte do

Sistema de Universidade da Geórgia e localiza-se em Kennesaw, perto de Atlanta.


[12] Try ou ensaio é uma forma de marcar pontos no rugby, o try é marcado quando o

jogador encosta a bola no chão na área do in-goal adversário


[13] A Interstate 20 é uma importante rodovia interestadual leste-oeste no sul dos Estados

Unidos.

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