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Currais hiperinflacionários - Guilherme Bandeira https://guilhermebandeira.substack.com/p/currais-hiperinfl...

A política dos bancos centrais para quebrar e concentrar

Há quatro meses, usei a falência da FTX como pretexto para re�etir sobre a
natureza das corridas bancárias e por quais motivos, em casos como esses, o
Bitcoin em auto-custódia é a único jeito de não ser forçado a pagar conta da
fraude que é o sistema de reservas fracionadas, seja ela feita por bancos ou por
corretoras.

Quando escrevi o texto, lá no longínquo mês de novembro de 2022, já dava


para sentir o cheiro de instabilidade no ar, uma vez que Jerome Powell seguia
�rme em sua política de reduzir o balanço do FED ao mesmo tempo em que
subia os juros rápida e agressivamente “até que algo quebre”. De fato, foi a
subida de juros mais rápida da história recente, como mostra o grá�co abaixo:

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“Move fast and break things”, dizem os empreendedores do Vale do


Silício. Só que isso foi feito pelo próprio banco central americano.
Fonte: Visual Capitalist

Este “algo” que supostamente deveria quebrar com a subida dos juros poderia
ser muitas coisas. Por exemplo, Larry Summers, um alto apóstolo do sistema
�at, seguindo a lógica doa-a-quem-doer keynesiana, achava que o que deveria
quebrar era o emprego de muita gente, pois só um desemprego elevado
poderia jogar a in�ação para baixo e assim permitir que o FED parasse de
aumentar os juros. Outro forte candidato à quebra em potencial era a atividade
econômica em si, já que muitos esperavam uma recessão para que os preços
parassem de subir.

Então entramos em 2023 segurando a respiração e atentos para conseguir


identi�car o primeiro corpo que cedo ou tarde iria aparecer boiando nas águas
turvas deste estrangulamento monetário. Porém, o que tem aos poucos
aparecido não se parece nada com um náufrago azarado que se afogou
alavancado em dívidas dolarizadas, mas sim com um cenário terra arrasada que
atingiu o centro do sistema �nanceiro mundial.

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“Algo” de fato emergiu boiando à deriva e por meio de uma palavrinha contábil
mágica chamada "perdas não realizadas" (unrealized losses) nos balanços de
diversos bancos americanos. Um termo um tanto quanto cifrado em relatórios
internos e notas de rodapé dos balanços dos bancos, então poucos
conseguiriam perceber que ele representava a insolvência de facto de centenas
de instituições �nanceiras americanas.

Vejamos por exemplo este relatório do FED de Kansas City casualmente


falando já em setembro de 2022 que mais de 300 bancos pequenos (ou seja,
com até USD 10 bilhões em ativos) já tinham sido vaporizados pela alta do
juros. Já era um cenário muito grave, inclusive indicado por vários relatórios do
FDIC (o Fundo Garantidor de Crédito americano) nos meses subsequentes (veja
aqui e aqui.)

O que esses relatórios mostravam em linguagem oculta e aparentemente banal


era extremamente grave: se todos os clientes desses bancos fossem sacar seus
depósitos, não haveria patrimônio para cobrir os saldos dos correntistas, e
talvez por isso mesmo os próprios correntistas não foram diretamente
noti�cados da situação. A questão é que pouca gente estava prestando atenção
ou sequer conseguiria entender esta obscura linguagem contábil além dos
próprios bancos e dos seus reguladores.

Estávamos até então como naquela cena cômica onde o Coiote persegue o
Papa-Léguas para além de um penhasco, a perseguição continua normalmente
em pleno ar até que um deles resolve olhar para baixo e só quando os dois
decidem encarar o abismo começam a cair.

Eis que um desses blogueiros-que-todo-mundo lê no Vale do Silício chamado


Byrne Hobart, versado em balanços de instituições �nanceiras, decidiu sim
olhar para baixo e disparou um míssil que chegou na caixa de emails dos
maiores gestores dos fundos de venture capital do mundo: O Silicon Valley
Bank (SVB), um banco com mais de USD 209 bilhões de ativos, USD 175 bilhões

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