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ESTUDOS

SE
O

DE
L
CAPÍTU

claudia bitencour t e colaboradores CASO

gestão contemporânea de pessoas


novas práticas, conceitos tradicionais
2ª edição
G393 Gestão contemporânea de pessoas [recurso eletrônico]: novas
práticas, conceitos tradicionais / Claudia Bitencourt e
colaboradores. – 2. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre :
Bookman, 2010.

Editado também como livro impresso em 2010.


ISBN 978-85-7780-622-5

1. Organização do trabalho – Administração de recursos humanos.


I. Bitencourt, Claudia.

CDU 331.101.262

Catalogação na publicação: Renata de Souza Borges CRB-10/1922


2
o AutoDeseNVoLVimeNto
e A perspectiVA DA
ApreNDiZAGem orGANiZAcioNAL

O
Claudia Simone Antonello

Objetivos de
aprendizagem
 compreender e analisar a noção e o processo de autodesenvolvimento.
 Abordar algumas das dimensões que constituem o processo de autodesenvolvimento
e sua relação com a aprendizagem organizacional.
 Analisar a importância do autodesenvolvimento no desenvolvimento de competências.
 identificar algumas tendências e iniciativas das organizações para facilitar o
autodesenvolvimento.

O PaSSadO E O PrESEnTE dO dESEnVOLViMEnTO gErEnCiaL


E SUaS rEPErCUSSõES na nOÇãO dE aUTOdESEnVOLViMEnTO

Ao retomarmos a história do desenvolvimento gerencial, observamos que


até a década de 1960 houve uma aceleração na economia seguida, na década
de 1970, de um declínio acentuado. Se antes tudo era crescimento e prospe-
ridade, a situação que os gerentes enfrentaram nas décadas de 1970 e 1980,
em contrapartida, foi delicada, quando então fez-se presente o desemprego,
a competição financeira, as rápidas mudanças tecnológicas, o aumento das
divisões sociais, a globalização, etc. O autodesenvolvimento gerencial ganha
impulso nestes tempos difíceis, em contraste com duas ideias que cedo domi-
naram os anos 1960 e 1970.
Os anos 1960 foram a era do treinamento sistemático, marcada pela es-
cassez de pessoas capacitadas em uma economia que trabalhava quase a pleno
emprego, quando, então, encorajou-se o treinamento industrial. Era um tipo
de treinamento dirigido externamente ao indivíduo, pois suas necessidades
de treinamento originavam-se de metas organizacionais. Os responsáveis pelo
32 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

treinamento e pelo desenvolvimento diagnosticavam as necessidades indi-


viduais, definiam objetivos mensuráveis, programas e assim por diante. Os
indivíduos eram treinados em turmas partindo-se do princípio de que todos
tinham as mesmas necessidades. O treinamento sistemático fazia-se efetivo
para o treinamento de habilidades manuais, mas, quando esta abordagem
foi utilizada para o desenvolvimento gerencial, emergiu um problema crítico
conhecido como “transferência de treinamento”, ou seja, os programas eram
considerados excelentes, aprendia-se muito de acordo com as avaliações após
a conclusão do curso, porém as ações e o comportamento dos indivíduos no
trabalho não mudavam, não havia transferência do que era aprendido nos
cursos para o ambiente de trabalho.
Este problema forçou um reposicionamento do foco para a aprendiza-
gem. Em vez de concentrar-se no que o treinador faz, começa-se a observar
o que acontece quando as pessoas aprendem. Nos anos 1970 e posteriores,
inicia-se a ampla utilização do ciclo de aprendizagem de Kolb (1984) – ver
Figura 2.2 – e passa-se a perseguir a arte de “aprender com o aprender”. Carl
Rogers (1971) forneceu uma inspiração para o movimento da aprendizagem
com sua abordagem não diretiva e centrada na pessoa, em observações como:
o que pode ser ensinado diretamente ao outro é relativamente trivial, en-
quanto coisas significativas apenas podem ser aprendidas. A aprendizagem
era direcionada para dentro, coerente com os sentimentos e pensamentos do
indivíduo, pouco relacionava-se aos objetivos organizacionais e era tida como
bem-sucedida se a pessoa verbalizasse que havia aprendido (Pedler, 1994).
Por outro lado, o desenvolvimento de pessoas, como ideia, abarca tanto
a realidade do ambiente externo e os objetivos organizacionais quanto a reali-
dade interna da pessoa. Cada indivíduo é um ser sem igual no processo de for-
mação – como Rogers (1971) e Maslow (2000) propõem –, mas só pode fazer
progressos interagindo com outras pessoas e exercitando suas habilidades de
fazer escolhas pessoais tão construtivamente quanto possível. Fazendo o me-
lhor que puder, o indivíduo pode gerar oportunidades em ambos os aspectos
(interagir e fazer escolhas), o que alimenta o ímpeto para o autodesenvolvi-
mento (ver Figura 2.1).
Métodos como a aprendizagem pela ação (action learning) e a aprendi-
zagem autogerenciada (self-managed) reforçam a interação entre o interior e
o exterior do indivíduo, onde a aquisição de competências gerenciais requer
tanto uma escolha e uma transformação interior quanto uma performance ex-
terna modificada. O autodesenvolvimento enquanto conceito é, então, uma
síntese dessas ideias, em que o desenvolvimento envolve uma contínua pas-
sagem de ações externas (experiencial) para processos internos (reflexão), de
volta para a ação e assim por diante (Pedler, 1994). O autodesenvolvimento
clarifica como as competências individuais e a vontade para aprender podem
atuar como capacitadores no contínuo desenvolvimento do indivíduo (Mu-
mford, 1993; Pedler, 1994).
Para Eric From (1979), o aprendizado do homem, seja ele um estudante
de escola formal ou um profissional consciente, é um processo ativo, no sentido
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 33

Figura 2.1
Interação entre o mundo interno e o mundo externo no processo de desenvolvimento do indivíduo.
Fonte: adaptado de Pedler (1994, p. 157).

de receber e reagir de modo produtivo. Desse modo, o ser humano que aprende
é aquele que desenvolve a atenção como um processo vivo, quer dizer, aquele
exercita plenamente o seu modo de ser. No modo ter, quem aprende conserva o
conteúdo do aprendizado na memória e nas anotações. No modo ser, o indiví-
duo produz ou cria sempre algo novo, apropriando-se do que é aprendido.
A transformação orientada para a aprendizagem organizacional só é
possível na medida em que se inicia a transformação contínua do indivíduo,
sujeito do processo educativo. O autodesenvolvimento, na aprendizagem or-
ganizacional, possibilita ao funcionário da empresa, independente de sua po-
sição hierárquica, a conquista de sua autonomia como ser, permitindo-lhe o
pleno uso de sua liberdade de escolher alternativas, de fazer opções durante o
aprendizado, o qual, na verdade, é constante. Se a autonomia do funcionário
na organização for incentivada, necessariamente seu pensamento crítico será
estimulado, o que é base da expressão humana.
Apesar da diversidade de princípios que embasam o desenvolvimento de
gerentes, dois salientam-se entre eles: o autodesenvolvimento e a aprendiza-
gem autodirigida. Ambos os princípios enfatizam que o desenvolvimento de
gerentes deve ser dirigido por eles mesmos, ao reconhecerem a necessidade de
desenvolver a si próprios e ao estarem dispostos a aprender (Antonacopoulou,
2000). Esses princípios também sugerem que os gerentes, enquanto indiví-
duos, tenham o “poder” para escolher o que aprender e como se desenvolver.
Esta perspectiva é corroborada por pesquisas realizadas já há muito tempo
(Boydell, 1982; Sutcliffe, 1988), as quais sugerem que os indivíduos não po-
dem ser forçados a aprender ou a se desenvolverem sem seu consentimento.
Baseado nos princípios de formação para adultos (Knowles et al., 1984), o
autodesenvolvimento enfatiza a escolha e a autodireção, e alinhado a prin-
cípios da área de desenvolvimento de pessoas, em um primeiro momento,
concentra-se mais no desenvolvimento do indivíduo do que no do coletivo.
34 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

Diferente dos métodos tradicionais de desenvolvimento, baseados em


instrução e intervenções de treinamento sistemáticas, outros métodos compar-
tilham, e muito, a aprendizagem na ação (action learning) e a aprendizagem
experiencial, teorias estas que enfatizam reflexão, experimentação e um nível
de metacompreensão, incentivando o autodesenvolvimento (Revans, 1983;
Mumford, 1993; Garavan; Barnicle; O’Suilleabhain, 1999). Storey, Mabey e
Thomson (1997) comentam que o desenvolvimento gerencial está prosperan-
do e que muitas organizações investem em atividades projetadas para aumen-
tar as competências de seus gerentes em todos os níveis. Assim:

O autodesenvolvimento é um processo autoiniciado de aprendizagem, cujos elementos-


chave no processo são autoconsciência, reflexão e experimentação, e cujas dimensões são
o desenvolvimento, a pessoa vista no seu todo e a responsabilidade pessoal.

Reflexão e experimentação
Todos os seres humanos – não apenas os profissionais – necessitam tor-
nar-se competentes em tomar uma ação (agir) e simultaneamente refletir
sobre esta ação e aprender a partir dela. (Argyris; Schon, 1974, p. 4)

Este pensamento é cada vez mais pertinente se considerarmos as mudanças


que estão atingindo grupos profissionais e ambientes de trabalho. As mudanças,
tais como o avanço da tecnologia, as novas formas de administração e de estrutu-
ras e a competição global, têm um impacto profundo na natureza do conhecimen-
to profissional. Exige-se dos trabalhadores que pensem diferentemente e mais
profundamente o seu trabalho e a sua relação com a organização. Em termos de
aprendizagem no ambiente de trabalho, estas demandas causaram uma troca de
“ensinar as pessoas” por uma ênfase em “auxiliar as pessoas a aprender”.
Rigano e Edwards (1998) desenvolveram um estudo sobre a incorpora-
ção da reflexão na prática do ambiente de trabalho e no desempenho profis-
sional. Os resultados do estudo de caso revelaram como a compreensão do
trabalhador desenvolveu-se com o tempo, como ele incorporou isto à prática
de seu trabalho, como melhorou aspectos do seu desempenho profissional e
como aprendeu sobre sua própria aprendizagem.
De acordo com esses autores, a reflexão é amplamente reconhecida como
um elemento crucial no processo de aprendizagem dos indivíduos (Schön,
1983; Mezirow, 1990). Daudelin (1996) comenta que o indivíduo que utiliza
uma hora para refletir sobre um aspecto de uma situação desafiadora pode
aumentar a aprendizagem significativamente sobre aquela situação. Algumas
empresas empregam esforços, tais como PepsiCo., Motorola e General Motors,
para utilizar a reflexão como uma ferramenta deliberada de aprendizagem,
tornando a necessidade de práticas reflexivas formais no ambiente de trabalho
uma tendência significativa. Diversos programas de aprendizagem em am-
biente de trabalho estão emergindo nas empresas, com abordagens variadas
e utilização da reflexão para facilitar a aprendizagem dos indivíduos. Assim,
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 35

é necessário que se discuta a natureza e a prática da reflexão no ambiente de


trabalho.
A evolução de estrutura de aprendizagem do adulto está envolvida pela
conexão e pela sobreposição de teorias e práticas. Rigano e Edwards sele-
cionaram alguns teóricos que influenciaram e moldaram a compreensão da
reflexão e do seu papel na aprendizagem de adultos. O termo reflexão é geral-
mente usado como um sinônimo para processos mentais de ordem mais alta
(Mezirow, 1990). Os estudos de John Dewey em educação enfatizaram a im-
portância do pensamento reflexivo na aprendizagem advinda da experiência.
Os conceitos de Dewey sobre pensamento reflexivo embasaram as ideias
de muitos teóricos da aprendizagem de adultos. A característica comum da
maioria das teorias de aprendizagem de adultos a partir da experiência é o
destaque atribuído à integração da nova experiência com a experiência passa-
da pelo processo de reflexão. Kolb (1984) utilizou o trabalho de Dewey, como
também Lewin e Piaget, desenvolvendo o modelo experiencial de aprendiza-
gem (ver Figura 2.2). Kolb sugeriu que os adultos aprendem passando por um
ciclo de experiência concreta (fazer), refletir (observar e refletir), conectar
(formação de conceitos abstratos e generalizações), testar as implicações dos
conceitos em novas situações, e fazer novamente. Quando os adultos estão
comprometidos com este ciclo de aprendizagem, a ação sempre será cuidado-
sa, porque a reflexão está incorporada.
Schön (1983) apresenta uma visão adicional de como os adultos apren-
dem pela experiência em sua análise de reflexão-na-ação. Ele identificou o
cenário do problema como uma conversação reflexiva na qual o profissional
recorre à sua experiência para entender a situação, tenta estruturar o pro-
blema, sugere uma ação e, então, reinterpreta a situação levando em conta
as consequências da mesma. Reflexão-na-ação envolve verificar experiências
pessoais passadas para avaliar as práticas e a construção das teorias pessoais
de ação.
O trabalho de Schön e Argyris no campo de melhorias da prática profis-
sional desenvolveu a noção de aprendizagem de single e double-loop (Argyris;
Schön, 1974) para explicar o que acontece quando o desempenho desejado
não é alcançado. Na aprendizagem de single-loop, uma pessoa continua uti-
lizando a mesma estratégia ou variações dela. As falhas em produzir os re-
sultados desejados neste modo de trabalhar frequentemente ocorrem porque
as soluções são baseadas num conjunto de valores governantes que frustram
o sucesso. Já na aprendizagem de double-loop, uma pessoa torna-se extre-
mamente reflexiva e busca ir além da superfície para questionar os valores,
convicções e comportamentos governantes adotados. Conjuntamente, Argyris
e Schön desenvolveram o processo de ciência da ação1 como uma base para a
mudança organizacional.
Marsick (1988) descreveu um novo paradigma para o entendimento e
a facilitação da aprendizagem no ambiente de trabalho baseado na teoria de
aprendizagem desenvolvida por Mezirow (1990), com algumas semelhanças
em relação ao programa de ciência da ação de Argyris e Schön. Ele descreve
três domínios de aprendizagem: instrumental, dialógico e autorreflexivo. A
36 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

Figura 2.2
Ciclo de aprendizagem vivencial.
Fonte: adaptado de Kolb (1984).

aprendizagem instrumental refere-se à solução de problemas orientada para


a tarefa. A aprendizagem dialógica refere-se ao modo pelo qual as pessoas
entendem as normas consensuais na sociedade. A aprendizagem autorreflexi-
va refere-se à forma pela qual nós aprendemos a entender a nós mesmos. Da
mesma forma que a aprendizagem de double-loop, sua ênfase é a autorreflexão
crítica como meio para alcançar a automudança. Essa mudança normalmente
envolve uma transformação nas perspectivas de significado: uma esquemati-
zação que fornece os princípios da interpretação.
A autorreflexão crítica tem muito em comum com a abordagem de apren-
dizagem pela ação de Revans (1983). A aprendizagem pela ação foi projetada
para ajudar a gerar soluções aos problemas da vida real com uma ênfase na
experiência concreta dos indivíduos que estão tomando parte na atividade de
aprendizagem. O trabalho de Revans tem similaridades com a ciência da ação,
assim como com o ciclo de aprendizagem vivencial de Kolb. Porém, segundo
Marsick (1990), a aprendizagem pela ação é um processo mais flexível, me-
nos codificado, deixado para a habilidade do indivíduo se comparado com o
método altamente definido e rigoroso da ciência da ação, sendo menos formal
do que o ciclo de aprendizagem vivencial Kolb.
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 37

Essas teorias sobre reflexão-ação perpassam o entendimento do conceito


de autodesenvolvimento e aprendizagem nas organizações. Uma das suposi-
ções básicas é a de que o autodesenvolvimento baseado no modelo reflexão-
ação (Argyris; Schön,1974; Dewey, 1959; Kalb, 1984; Marsick, 1988; Revans,
1983) facilita os processos de aprendizagem organizacional.

Autoconhecimento e autoconsciência

Para Bourner (1996), não é difícil visualizar uma cadeia de causas e


efeitos partindo da autoconsciência, passando pela autoaceitação e chegando
até o autodesenvolvimento e o crescimento pessoal. Ainda de acordo com este
autor, muitas pessoas concordam que o “conhece-te a ti mesmo” da Antiga
Grécia é consoante com seus valores e apreciam a visão do filósofo Emanuel
Kant de que o autoconhecimento é o início de toda a sabedoria. Para Bourner,
desta forma, quando se fala em autodesenvolvimento é impossível dissociar
a ideia de autoconhecimento. O indivíduo poderá direcionar seu desenvolvi-
mento se, dentre outros aspectos, conhecer a si próprio, suas necessidades,
sua forma de ser, identificar habilidades, comportamentos, atitudes e valores.
Consequentemente, esse processo repercutirá em seu potencial de aprendiza-
gem (Swieringa; Wierdsma, 1995).
A aprendizagem nas organizações está orientada para o desenvolvimen-
to do potencial para aprender a aprender, o qual Swieringa denomina meta-
aprendizagem. A base deste potencial é o autoconhecimento; em particular, o
saber como e por que se aprende e se deseja aprender. Para este autor, o fato
das pessoas conhecerem muito pouco de si mesmas constitui uma das princi-
pais razões pelas quais as organizações, em período de crise, permitem a eva-
são dos problemas. As pessoas não se questionam quanto à sua competência
ou incompetência coletiva e carecem de valor ou vontade para examiná-la.
Para Swieringa e Wierdsma (1995, p. 27) uma organização voltada para
os processos de aprendizagem baseia-se numa filosofia em que seus membros
consideram que eles mesmos e os demais são adultos: “[...] gente que tem
vontade e valor para assumir a responsabilidade de seu próprio funcionamen-
to com relação aos outros e que espera o mesmo dos demais.”
Ainda conforme os autores, o autoconhecimento é pré-requisito para o
desenvolvimento do potencial de aprendizagem. Quanto maior o autoconhe-
cimento, maior o potencial de aprendizagem do indivíduo. O incremento do
autoconhecimento requer feedback quanto à competência demonstrada pelo
indivíduo. A competência é determinada pela imagem que a pessoa tem de si
(autoimagem) e pela imagem que os outros formam dela. Assim, a forma como
suas ações são percebidas e recebidas pelos outros proporciona um feedback que
lhe possibilitará corrigir e complementar sua autoimagem. Portanto, embora
paradoxal, assim como o autodesenvolvimento, somente é possível aprender e
adquirir autoconhecimento por intermédio da interação. Dentro dessa ideia, os
autores propõem três níveis de autoconhecimento (ver Figura 2.3):
38 parte i – estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

conhecimento do que posso fazer: refere-se ao que o indivíduo sabe que é pos-
sível fazer, caso ele queira ter possibilidades razoáveis de êxito, e ao que é melhor
evitar. É uma forma de autoconhecimento que impede a sub/superestimação das
próprias capacidades.
conhecimento do que sei: em particular, do que entendo.
conhecimento de quem sou e de quem desejo ser: desenha a base da personalida-
de e da identidade do indivíduo.

Para Bourner (1996), a autoconsciência, entre outras questões, abrange as


forças e as fraquezas do indivíduo. Segundo o autor, esta forma de autoconheci-
mento contribui para a eficiência da administração de vários modos. Por exem-
plo, gerentes que têm uma percepção de quais são suas fraquezas estão numa
posição que lhes possibilita repará-las com forças compensatórias. Quando um
gerente compreende suas próprias forças e fraquezas, consegue compreender as
dos outros e, consequentemente, escutá-los empaticamente. O gerente com alto
grau de autoconsciência, de acordo com Thoreau (1995), conhece a si próprio,
seus valores, capacidades e propósito de vida, revela elevada autoestima e auto-
confiança e é flexível aos desafios que se apresentam.
Bourner ressalta que, se por um lado, em situações onde o gerenciamento
é rotineiro e repetitivo, a autoconsciência é menos importante, por outro, em
ambientes de mudanças aceleradas, o gerenciamento baseado no desenvolvi-
mento pessoal e no incremento do autoconhecimento são fundamentais. Isto
ocorre porque quem está impossibilitado de mudar a si mesmo dificilmente
conseguirá mudar o que está à sua volta – o princípio do “mandato insuficien-
te” de Revans (1983). O indivíduo não muda aquilo do qual não está ciente.
Sob uma visão processual, Bourner adiciona à proposta de Revans o princípio
do “mandato da consciência insuficiente”: aquele que não se conhece está
impossibilitado de mudar a si mesmo.

FigUra 2.3
Os três níveis de autoconhecimento.
fonte: adaptado de swieringa e Wierdsma (1995, p. 28).
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 39

Complementando a ideia de autoconhecimento, Bitencourt e Gonçalo


(1999) comentam que
[...] apesar da mudança de atitude ser um pressuposto básico que as orga-
nizações e as pessoas devem buscar desenvolver e de ser desejável em um
ambiente de mudança independente do programa ou “modelo” gerencial
adotado, a consciência para essa necessidade é um processo interno ao
indivíduo que deve buscar conhecer seus próprios limites, necessidades,
formas de contribuição em relação ao processo de mudança individual (ati-
tude) e organizacional (atividades desenvolvidas pelas empresas). Portan-
to, trata-se de um processo de descoberta, de questionamento, de reflexão,
onde o autoconhecimento torna-se ponto central para essa análise.

Ainda segundo estes autores, é importante uma reflexão sobre o próprio


papel que as pessoas representam na organização e sobre a consciência que
deve surgir do próprio indivíduo. Se o indivíduo estiver consciente de seu
papel na organização e de sua contribuição no processo de mudança organi-
zacional, ele estará mais aberto à aprendizagem, gerando melhores resultados
em suas atividades e nos processos da organização.
Além disso, a singularidade do autodesenvolvimento como um proces-
so de crescimento está na síntese de três dimensões importantes: o conceito
de desenvolvimento, a noção da pessoa no seu todo e a de responsabilidade
pessoal (Pedler et al., 1990; Pedler, 1986, 1994). Cada uma destas dimensões
será discutida brevemente para que se estabeleça o significado do autodesen-
volvimento para o indivíduo e para a organização.

Desenvolvimento

A primeira dimensão subjacente ao significado de autodesenvolvimento é a


associação com o conceito mais amplo de desenvolvimento das pessoas, isto é, as
mudanças nas estruturas sociais que afetam a extensão dos horizontes de vida do
indivíduo. Conforme Pedler (1994), pesquisadores que exploram a estrutura do
processo de desenvolvimento argumentam que o desenvolvimento é um processo
vitalício que envolve aperfeiçoamento gradual, incremental, com etapas revolu-
cionárias abruptas, sendo que cada uma influencia o modo como os indivíduos
constroem o significado sobre eles e suas experiências. Fisher, Merron e Corlert
(1987, p. 259) confirmam essa ideia: “Conforme cada passo é dado, um novo
ser emerge com uma nova forma de construir o mundo, e as novas experiências
internas do mundo resultam num novo modo de expressar ideias, sentimentos e
propósitos. A cada etapa a visão correspondente do mundo influencia profunda-
mente o que a pessoa escolhe ver e como ela interpreta e reage ao que é visto.”
De acordo com Pedler e colaboradores (1990), se as experiências vão
apresentar resultados desenvolventes, o indivíduo deve ser capaz de empregar
as habilidades e recursos necessários para buscar tais experiências e transfor-
má-las em eventos de aprendizagem significativos (Kolb, 1984). Então, o foco
de de­senvolvimento dentro do processo de autodesenvolvimento é a mudan-
ça, a inovação e a aprendizagem que acontecem, e não só a aquisição quanti-
tativa e incremental de conhecimento e habilidades.
40 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

A pessoa no seu todo

A segunda dimensão do autodesenvolvimento é, em geral, a ênfase na


pessoa em seu todo (por inteiro, total) e sugere que o desenvolvimento é
significativo ao indivíduo quando estão sendo almejadas metas pessoalmente
importantes. Pedler (1986) sinaliza especificamente que:

[...] autodesenvolvimento acontece quando o indivíduo encontra o significado e o sentido


pessoal provindos de eventos particulares ou experiências resultantes de sua interação
real ou simbólica com alguma parte de seu ambiente. Então, quando estabelece metas de
autodesenvolvimento, o indivíduo não pode estar divorciado do que ele está fazendo.

O autodesenvolvimento é a integração da pessoa com seu papel de traba-


lho. O processo de desenvolvimento adquire significado a partir da integração
do conhecimento específico e das habilidades pertinentes ao papel particular e
aos sentimentos, intenções e ações do indivíduo. Essa perspectiva relaciona-se
sobremaneira com a terceira dimensão de autodesenvolvimento, a responsa-
bilidade pessoal.

Responsabilidade pessoal

Uma característica central de autodesenvolvimento é a escolha por parte


do indivíduo. Diferente do processo de desenvolvimento convencional, que
trata os indivíduos como recipientes passivos, o autodesenvolvimento coloca o
indivíduo à frente do processo de desenvolvimento. O argumento subjacente é
que o desenvolvimento não é apenas um assunto para expert, pois trata-se de
uma questão que envolve vontade e determinação pessoal para comprometer
a si mesmo com um processo que o indivíduo valoriza e acredita (Burgoyne
et al.,1996; Pedler, 1994). O indivíduo é, então, livre para escolher as metas,
decidir como alcançá-las, iniciar a ação para realizá-las e avaliar seu sucesso
(Megginson, 1993; Pedler et al., 1990 ). Nessa dimensão de desenvolvimento,
o lugar do indivíduo é o controle (teoricamente, pelo menos) do processo de
autodesenvolvimento.

Outras dimensões

Outras dimensões importantes da ideia de autodesenvolvimento, de


acordo com Pedler (1994), são:

a) nós temos que criar condições primeiro em nós mesmos antes que pos-
samos fazer isto com os outros – princípios de “gerenciar-me primeiro”
e “gerenciar de dentro para fora” (em contradição com o treinamento
convencional, que exalta as virtudes e busca passar a ideia de “super-
homem”).
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 41

b) desenvolvimento é a transformação da pessoa inteira e não só o treinamen-


to do indivíduo como “trabalhador”. Portanto, há muitos pontos a consi-
derar no desenvolvimento da pessoa – vida familiar, relações importantes,
crises de vida, saúde, idade e assim por diante, como também habilidades
gerenciais, estilo e competência. Trabalho e vida dentro da organização são
parte importante e crítica da vida do gerente, mas não o seu todo.
c) o “auto” (self) em autodesenvolvimento significa duas coisas, pelo menos:
primeiro, que este é um processo de “by-self” (por si mesmo), onde o ge-
rente é o responsável principal por iniciar e gerenciar seu próprio desen-
volvimento; segundo, que este é um processo de “of-self” (de si mesmo),
no qual o gerente, como pessoa, cresce em habilidade e vontade para obter
controle e responsabilidade a respeito de eventos e particularmente sobre
si mesmo e seu próprio desenvolvimento.
d) o papel do desenvolvimento gerencial e do treinamento das pessoas torna-
se menos provedor, direcionador e iniciador para ser mais facilitador, gera-
dor de recursos, conselheiro e de suporte.

Autodesenvolvimento: Diferentes Perspectivas e Abordagens

Além das dimensões até aqui apresentadas, pode-se também inserir a visão
de Senge. Este autor propõe cinco disciplinas inter-relacionadas para construir
as learning organizations: a visão compartilhada que estimula o compromisso
com o longo prazo; os modelos mentais que focam a necessidade de se retirar os
bloqueios para a resolução dos problemas correntes; o aprendizado em equipe
que permite superar os limites da visão individual; o domínio pessoal que con-
fere aos indivíduos a automotivação necessária para aprender continuamente;
e o pensamento sistêmico que integra as demais disciplinas. Senge (1990, p. 16)
refere-se à disciplina domínio pessoal como o conhecimento de si mesmo “[...]
pelo domínio pessoal aprendemos a esclarecer e a aprofundar continuamente
nosso objetivo pessoal, a concentrar nossas energias, a desenvolver a paciência
e a ver a realidade de maneira objetiva”.
Ter domínio pessoal significa ter a capacidade de continuamente tornar
mais clara a visão pessoal de futuro e de ver a realidade objetivamente, gerando
uma tensão criativa que leva em direção à própria visão. O domínio pessoal é a
capacidade fundamental para que um indivíduo possa perseguir seus próprios
valores, em vez de ser levado pelas circunstâncias. Os elementos fundamentais
do domínio pessoal são a percepção clara da realidade e a consciência firme dos
próprios propósitos. Apresentar domínio pessoal é sentir-se parte do processo
criativo e ampliar o espaço pessoal de influência, criando um sentido especial
de vida. O domínio pessoal cresce a partir da postura inquisitiva, que amplia o
autoconhecimento e o estabelecimento de objetivos pessoais. Domínio pessoal
significa aprender a expandir as capacidades pessoais para obter os resultados
desejados e criar um ambiente empresarial que estimule todos os participantes
a alcançar as metas escolhidas (Senge, 1990).
O constante aprendizado só é possível por meio do domínio pessoal e
está baseado na competência e no crescimento enquanto pessoa. Significa vi-
42 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

ver a vida de um ponto de vista criativo, em vez de reativo. Para desenvolvê-lo,


é necessário estabelecer um objetivo de vida importante e aprender continua-
mente a enxergar com mais clareza a realidade do momento. A apreensão dos
dois fatores gera a tensão criativa, que leva o indivíduo a realizar seu objetivo.
A tensão criativa é uma força resultante da tendência natural dos indivíduos
de buscar uma solução para as tensões encontradas, as quais surgem em fun-
ção da discrepância entre a realidade percebida e a realidade desejada.
Neste sentido, o autor acredita que os indivíduos podem escolher dois ca-
minhos para resolver a tensão criativa: um deles é reduzir o gap percebido em
função da incapacidade dos indivíduos em resolver sua tensão emocional, que
normalmente está associada à tensão criativa; o outro é resolver a tensão criativa
através da persistência, da paciência, do compromisso com a verdade e da utiliza-
ção da força do subconsciente desenvolvida pelo esforço consciente em se visuali-
zar e caminhar até o resultado esperado. O segundo caminho é, pois, o que levaria
ao aprendizado individual ou, nas palavras de Senge, ao domínio pessoal.
De fato, Senge preconiza a manutenção de um permanente estado de
tensão criativa como forma de alavancar o crescimento e o aprendizado por
meio da criação de um intenso rapport entre o consciente, a intuição e o sub-
consciente. Segundo este autor, o aprendizado consciente e intencional re-
presenta apenas uma pequena parte do processo de criação e de domínio de
coisas complexas. O aprendizado, entretanto, através do subconsciente, só se
torna eficaz na medida em que houver uma clara visão de onde se quer chegar
e, também, uma real percepção da realidade.
A tensão entre a realidade percebida e a visão do ideal desejado é a fonte
de energia transformadora que permite à pessoa agir, e não apenas reagir. O
domínio pessoal trata de clarear a autopercepção, que é o que gera a tensão
criativa, à medida que a pessoa tem clareza sobre a realidade atual e sobre
onde deseja chegar. O indivíduo que possui o domínio pessoal assume um
profundo compromisso com a verdade, ou seja, elimina mecanismos pelos
quais limita ou engana a si mesmo, os quais o impedem de ver as coisas como
realmente são, expandir sua consciência e aprofundar seu conhecimento sobre
as estruturas que estão por trás dos eventos.
Uma capacidade fundamental para o domínio pessoal é a reflexão. As
teorias e os modelos das próprias pessoas em relação ao mundo são partes da
sua realidade presente. O domínio pessoal dá ao indivíduo uma razão para
refletir sobre como seus pressupostos básicos podem lhe bloquear, impedindo
que realize sua visão. Ele pode ser capaz de desenvolver e de provar novos
modelos mentais, possibilitando direcionar seu próprio aprendizado e desen-
volvimento de modo mais eficaz (Senge, 1990). Enfim, o domínio pessoal
é uma disciplina de aspiração, que envolve a formulação de uma imagem
coerente dos resultados que a pessoa mais deseja alcançar como indivíduo
(visão pessoal) juntamente com uma avaliação realista do atual estado de sua
vida (sua realidade naquele momento). O indivíduo, ao aprender a cultivar a
tensão entre a visão e a realidade, pode ampliar sua capacidade de escolha e
alcançar resultados mais próximos aos escolhidos (Senge, 2000).
Seagal (1996) pesquisa desde 1979 o tema “dinâmica humana”, que se
concentra em averiguar a interação de três princípios universais: o mental, o
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 43

emocional (ou de relacionamento) e o físico (ou prático). Para a pesquisadora,


todos os aspectos do estudo da dinâmica humana dizem respeito ao domínio
pessoal, o qual Senge aborda nas cinco disciplinas, a começar pelo requisito
mais necessário: o conhecimento de si mesmo. Os programas de capacitação
sobre a dinâmica humana contêm um percurso de descoberta – de si mesmo,
dos outros e dos diferentes processos de comunicação –, solução de problemas,
aprendizado e desenvolvimento, além do que pode ser feito à luz dessas desco-
bertas para otimizar nosso modo de viver, aprender e trabalhar em conjunto.
McGill e Slocum (1995), a exemplo de Senge, atribuem destaque às mu-
danças necessárias no comportamento pessoal como premissas para a apren-
dizagem nas organizações. Para estes autores, os cinco comportamentos apre-
sentados no Quadro 2.1 seriam essenciais.
Segundo estes autores, a aprendizagem implica, necessariamente, uma
preocupação em melhorar a condição humana ao longo do tempo. Assim, os
comportamentos acima estão diretamente relacionados a este esforço perma-
nente.
Na mesma linha comportamental de Senge e de McGill e Slocum, mas
baseando-se em elementos da filosofia existencial, Steiner (1995) associou
o processo de inovação à capacidade dos indivíduos serem autênticos. Esta
autora relaciona o exercício da individualidade, da mesma forma que Sen-
ge relaciona o conceito de domínio pessoal à autencidade, contrapondo-o ao
exercício do individualismo. As organizações mais inovadoras seriam, então,
aquelas que permitem que as pessoas sejam autênticas. Dessa maneira, as
prescrições são aquelas usualmente pertinentes, na literatura, a empresas ino-
vadoras: poucos níveis hierárquicos, reduzidos símbolos de poder, integração
funcional, estímulo à tomada de riscos, entre outros.
Schein (1996), por sua vez, apresenta uma alternativa analítica, seme-
lhante à de Steiner, utilizando-se de conceitos antropológicos. Segundo este
autor, em concordância com a literatura anteriormente citada, em organiza-
ções que estimulam contínuo autodesenvolvimento de seus membros os prin-

Quadro 2.1
Comportamentos essenciais à aprendizagem nas organizações

Abertura Significa que as pessoas têm de ter a capacidade de reexaminar constantemente suas
premissas e crenças e, no caso dos gerentes, a consciência de que não precisam
saber de tudo e de todas as atividades de seus funcionários.
Pensamento Traduz-se através da capacidade de ver conexões entre eventos, assuntos e detalhes de
sistêmico dados e de pensar no todo ao invés de pensar nas partes de forma isolada.
Criatividade Trata-se da liberação do medo do fracasso e das consequências organizacionais, assim
como da flexibilidade para deixar de lado rotinas e hábitos enraizados, traduzindo um
comportamento criativo.
Eficácia pessoal Estaria associada à capacidade de ver a si próprio com precisão.
Empatia Traduz-se na capacidade de estabelecer relacionamentos na organização e, com isso,
de considerar diferentes dimensões para a mesma questão.
44 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

cipais valores incluiriam: visão para o futuro; comunicação intensa em todas


as direções; ser humano proativo e mutável em contato com o ambiente e com
o pensamento sistêmico; busca da verdade em diferentes fontes; relações de
trabalho pautadas pela participação, qualificação e comprometimento de seus
membros.
Mais recentemente, Schein (1996) passou a enfatizar o relacionamento
entre a capacidade de aprendizado organizacional e o conceito e a prática do
diálogo. Apenas por meio deste, argumenta o autor, pode haver comunicação
entre as diferentes subculturas e culturas dentro de uma organização (por
exemplo, finanças versus produção e nível executivo versus nível operacional).
O diálogo surgiria apenas a partir do momento em que as pessoas se preocu-
passem, antes de se engajarem em qualquer tipo de discussão ou debate, em
refletir sobre como seus próprios paradigmas culturais influenciam e distor-
cem seus processos cognitivos. Dessa maneira, o foco, diferentemente de Stei-
ner, não está na autenticidade, mas no autoconhecimento. O aprendizado or-
ganizacional, por sua vez, ocorreria na medida em que diferentes subculturas
pudessem se comunicar (dialogar) por meio do estabelecimento de ambientes
psicologicamente seguros e de modelos mentais compartilhados.

A Organização e o Autodesenvolvimento: Críticas e Reflexões

Embora os parágrafos anteriores evidenciem que o indivíduo é o prota-


gonista no processo de autodesenvolvimento, alguns pesquisadores discuti-
ram se este teria aplicabilidade mais ampla no nível coletivo das organizações.
Por exemplo, Herriot (1992) indica que o autodesenvolvimento pode envolver
todos os funcionários em todos os níveis da organização e que o processo de
ajudar um ao outro é uma das estratégias mais significativas que o favorecem.
Atividades adicionais, como centros de desenvolvimento, locais de aprendi-
zagem aberta, autodesenvolvimento planejado e contratos de aprendizagem,
reforçariam o compromisso da organização com o autodesenvolvimento e
contribuiriam com o desenvolvimento mútuo do indivíduo e da organização.
Como Smith (1993, p. 22) sugere: “Indivíduos precisarão criar e usar oportu-
nidades de autodesenvolvimento como um elemento integrante do seu desen-
volvimento e da organização.”
O autodesenvolvimento é, então, promovido como uma estratégia, a
qual é benéfica para o indivíduo e para a organização. Alguns pesquisadores
acreditam que muitos dos benefícios percebidos, provindos do autodesenvol-
vimento, destacam a integração entre desenvolvimento individual e desenvol-
vimento organizacional. Stewart e Hamlin (1994), por exemplo, argumentam
que, ao contrário de outros métodos, o autodesenvolvimento permite a flexi-
bilidade necessária e facilita uma resposta mais imediata às necessidades de
indivíduos e organizações em constante mudança.
Então, o autodesenvolvimento e a autodireção em aprendizagem são
promovidos como mutuamente benéficos para o indivíduo e para a organi-
zação. De acordo com Temporal (apud Antonacopoulou, 2000), do ponto de
vista do indivíduo, o autodesenvolvimento pode aumentar a autoconfiança e
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 45

ajudar a desenvolver habilidades latentes, as quais melhorariam a iniciativa e


o desempenho de trabalho. Ele poderia auxiliar os indivíduos a estarem mais
disponíveis e mais preparados para expressar suas opiniões, e isso poderia de-
senvolver suas habilidades para resolver problemas e lhes proporcionar uma
perspectiva mais ampla. O autodesenvolvimento pode encorajar os indivíduos
a serem mais construtivos em suas relações e motivá-los ao aperfeiçoamento.
Desta forma, o autodesenvolvimento pode ser visto pelas empresas como
uma estratégia apropriada para o desenvolvimento de pessoas à luz das in-
certezas presentes porque permite a flexibilidade necessária e a autodireção
no processo de desenvolvimento, facilitando uma resposta mais imediata às
variações das necessidades dos indivíduos e das organizações (Pedler, 1986;
Stewart; Hamlin, 1994).
Quando Moscovici (1995) aborda a questão do desenvolvimento geren-
cial, comenta que este é, acima de tudo, autodesenvolvimento. Na sua visão
isto significa que o gerente assume a responsabilidade pelo seu próprio desen-
volvimento. A organização é responsável pelo provimento de condições que
propiciem o desenvolvimento de cada gerente, mas a este cabe o esforço extra
pessoal para aproveitar e buscar oportunidades de desenvolvimento. Este en-
foque aponta o plano das atitudes como prioritário na competência gerencial:
o autodesenvolvimento é uma atitude adquirida, de interesse e de esforço com
relação a dificuldades, desafios e oportunidades.
Já para Stickland (1996) há duas abordagens para o autodesenvolvi-
mento. O argumento empresarial apoia-se na ideia de que a sobrevivência da
empresa num ambiente de rápidas mudanças econômicas requer funcionários
flexíveis e orientados para a mudança. O processo de autodesenvolvimento
gera uma mentalidade de mudança por encorajar os indivíduos a buscarem e a
alimentarem mudanças dentro deles mesmos. Isto leva ao hábito de aprender
a aprender, e este processo, conduzido no ambiente organizacional, é assimi-
lado dentro do papel do trabalho. Assim, as pessoas aprendem a ser flexíveis e
adaptáveis ao se depararem com novos desafios nos negócios.
Segundo o autor, a outra visão é a de que existe um argumento para o
autodesenvolvimento como um conceito puramente de automotivação, dentro
ou fora da organização: um grande plano pessoal que se coloca entre o trabalho
e a organização, enquanto o indivíduo busca um senso de realização na vida
mais do que simplesmente um papel em particular no trabalho. Esta é a visão
pessoal. Tal ideia não é fortemente conectada a um papel imediato no trabalho
como na visão organizacional, portanto sua força para promover a consciência
de mudança não é facilmente reconhecida por gerentes. Infelizmente, de acor-
do com Stickland, esta é uma visão que muitos administradores preferem não
considerar.
Na definição de uma estratégia organizacional para o autodesenvolvi-
mento existe, portanto, uma necessidade de se considerar duas abordagens
distintas. Uma abordagem que vê o indivíduo como um “recurso” para a orga-
nização atingir seus fins, e outra, que vê a organização como um veículo para
o crescimento pessoal.
Iniciativas individuais precisam ser projetadas e implementadas tendo
como referência um plano estratégico. Sem isto, elas podem tornar-se efême-
46 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

ras ou intimidar a busca de uma visão do todo. Cada ação deve ser analisada
para estabelecer uma articulação com a visão estratégica, fazendo avançar a
visão e se relacionando com outras iniciativas. Esforços e investimentos em
autodesenvolvimento não irão progredir se a cultura da organização não per-
mitir enganos, não aceitar a necessidade de crescimento e de ascensão do
indivíduo profissionalmente e não criar o espaço para iniciativa. Além disso,
se há oportunidades limitadas para a promoção e o indivíduo não vê o espaço
para crescer na organização, também será provável que isto limite o autode-
senvolvimento. (Pedler et al. 1990)
Temporal (1984) também comenta que, para a organização, o autode-
senvolvimento permite-lhe continuar com a dinâmica de mudança, bem como
encoraja os gerentes a pensar positivamente em mudança e melhoria. Além
disso, estimula a participação e pode aumentar o compromisso dos indivídu-
os para com a organização. Como parte da estratégia de Gestão de Pessoas,
pode simplificar o gerenciamento de carreiras e planejamento de sucessão,
pois clarifica as forças e fraquezas de indivíduos, expectativas, ambições, pre-
ferências e experiências. Os processos de captação e decisões de promoção
também podem melhorar e serem mais prontamente compreendidos pelos in-
divíduos que contribuíram para avaliar suas próprias realizações. Além disso,
autodesenvolvimento para Recursos Humanos pode ser um caminho de maior
eficiência com menor custo (cost-effective) em desenvolvimento. Finalmente,
de acordo com Antonacopoulou (1999), o autodesenvolvimento proporciona
à organização gerentes que aprendem.
Os benefícios percebidos pela organização ao introduzir o autodesenvol-
vimento são afetados pela forma como ele é implantado e integrado a outras
atividades de Gestão de Pessoas. Desta forma, a maneira como o Desenvolvi-
mento de Pessoas terá que buscar equilibrar as prioridades organizacionais
com o desenvolvimento individual e com a interação entre fatores individuais
e organizacionais é questão central no tema autodesenvolvimento.
Novas políticas e ações de treinamento, desenvolvimento e educação são
orientados para uma abordagem mais centrada no indivíduo, com ênfase na res-
ponsabilidade pessoal com seu próprio desenvolvimento (Pedler et al., 1990). É
muito comum que as empresas que introduzem o autodesenvolvimento o façam
pensando em prioridades adicionais a ele. Por exemplo, a prioridade ao utilizar
o autodesenvolvimento poderá estar na redução de custos com treinamento e
desenvolvimento ou em querer tornar-se uma organização de aprendizagem ou,
ainda, no fornecimento de maior flexibilidade ao processo de desenvolvimento,
revelando assim, algumas das características de sua cultura e de sua ética em
relação ao desenvolvimento de pessoal.

Formas de Propiciar o Autodesenvolvimento

A importância

De acordo com London e Smither (1999), um modelo motivacional de


autodesenvolvimento pode ser traçado a partir de algumas considerações. As
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 47

mudanças organizacionais conduzem à necessidade de um ambiente de traba-


lho de maior autonomia e delegação – que fornece feedback de informações,
oportuniza escolhas com consequências claras, reconhece os problemas que os
indivíduos enfrentam e provê uma razão para agir. Características como uma
maior autorização, autonomia, e uma cultura de aprendizagem contínua dão
suporte ao autodesenvolvimento (busca de feedback, fixação de metas e dire-
cionamento ao progresso), especialmente para as pessoas cujas características
predispõem à autodeterminação. A receptividade para o autodesenvolvimento
é incrementada quando há uma preocupação em ensinar às pessoas processos
de pensamento construtivos e valorização do comportamento de autodetermi-
nação. Desta forma, o autor propõe um modelo motivacional de autodesenvol-
vimento conforme Figura 2.4.
Como já mencionado anteriormente, a natureza do trabalho é continu-
amente variável. Nos dias de hoje, por exemplo, o trabalho é cada vez mais
realizado por equipes/grupos sendo organizado em torno de projetos. Desa-
parecem cargos/funções, novas tecnologias são integradas às organizações
e são demandados padrões de desempenho mais complexos. O que se tem
propagado é que “os indivíduos têm de se preparar hoje para o amanhã”. Isto
sugere que os funcionários precisam buscar informação para identificar lacu-
nas de competências, reconhecer áreas para melhorar o desempenho atual,
manter-se atentos ao ritmo de avanços na sua profissão e antecipar-se a como
as mudanças no ambiente e na sua organização podem afetar as demandas de
trabalho e as exigências de competências.
Em contrapartida, as organizações precisam comunicar as diferentes
oportunidades de aprendizagem e de desenvolvimento de carreira; avaliar a
mudança de competências requeridas para tipos diferentes de funções e em
diferentes níveis da organização; revisar currículos de treinamento, desenvol-
vimento e educação, buscando desenhar novos programas de desenvolvimen-
to baseados nas mudanças das necessidades organizacionais.
Conforme London e Smither (1999) em organizações de pequeno porte
e em organizações que necessitam mudar rapidamente em resposta ao am-

Autodeterminação para aprendizagem

Mudanças Ambiente de Autodesenvolvimento


organizacionais autonomia

Características individuais

Figura 2.4
Modelo motivacional de autodesenvolvimento.
Fonte: adaptado de London e Smither (1999).
48 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

biente variável, uma superestrutura de funcionários, planos e programas de


desenvolvimento gerencial tornam-se caros e quase impraticáveis. Essas or-
ganizações podem prover os recursos que propiciam a aprendizagem, mas
exige-se dos indivíduos cada vez mais responsabilidade pelo seu próprio de-
senvolvimento.
Em suma, conforme os autores, o autodesenvolvimento é importante
para indivíduos que estão em empresas financeiramente restritas, orientadas
para a qualidade e rapidamente mutáveis. Por conseguinte, os funcionários
precisam conhecer as metas organizacionais, as exigências de desempenho
e as suas competências para satisfazer às expectativas organizacionais de
hoje. Também necessitam de informação sobre os possíveis direcionamentos
organizacionais, as implicações para exigências futuras de desempenho e
o que é necessário fazer para satisfazer a estas expectativas mutáveis. Ne-
cessitam considerar se podem ser melhores na sua ou noutra organização,
encontrando e preparando-se para outras direções de carreira. Eles precisam
engajar-se na aprendizagem contínua para manter-se no mesmo nível e rit-
mo das mudanças organizacionais e assegurar seu desenvolvimento e sua
contribuição para a organização. Nesta perspectiva, London e Smither pro-
põem que os componentes para o autodesenvolvimento sejam os mostrados
no Quadro 2.2.
No Quadro 2.2 estão resumidos os aspectos fundamentais requeridos
para a capacitação via o autodesenvolvimento e aprendizagem contínua. Nas
organizações de hoje os funcionários são levados a reconhecer que a apren-
dizagem é um processo que ocorre ao longo da carreira. Isto requer que sai-
bam buscar feedback, comparar feedback para expectativas de performance
presentes e futuras, estabelecendo metas de desenvolvimento e identificando
progressos. Para isso, a organização deve provê-los com recursos tais como
feedback, coaching e experiências de desenvolvimento para dar suporte ao au-
todesenvolvimento e à aprendizagem contínua. Esses mecanismos de apoio
precisam ser projetados de forma que encorajem a autodeterminação. Este
encorajamento acontece quando o feedback é informativo, e não, ameaçador,
quando o contexto e as competências dos funcionários são levados em conta
e quando os indivíduos têm escolhas de comportamento e compreendem as
consequências destas escolhas.
Terra (2000), examinando a vasta literatura existente sobre as principais
condições que favorecem o aprendizado organizacional em grupo, identifi-
cou que diversos autores apontam como aspectos facilitadores a existência de
oportunidades para o autodesenvolvimento e o incentivo à autenticidade e à
explicitação de modelos mentais. Os autores são Argyris (1999); McGill e Slo-
cum (1995); Nonaka e Takeuchi (1997); Senge (1990); Schein (1986, 1996);
Ülrich, Jick e VanClinow (1993); Zarifian (1992).
Já Senge sugere outras formas de propiciar domínio pessoal, conforme
apresenta o Quadro 2.3 (p. 50).
As pessoas envolvidas em relações de tutoriamento aumentam a reflexão
e a qualidade das conversas, criando uma cultura de se pensar a respeito de
aspectos significativos. Algumas considerações sobre o tutoriamento:
o autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 49

QUadrO 2.2
COMPOnEnTES dO aUTOdESEnVOLViMEnTO

a organização/gerência oportuniza aos funcionários:


1. Feedback informacional (não ameaçador, sem controle) que foca a atenção no funcionário e destaca
comportamentos específicos que precisam ser diferentes.
2. Avaliação 360 graus.
3. clareza das metas organizacionais, prováveis direcionamentos organizacionais e implicações para exi-
gências de desempenho futuros.
4. escolhas de comportamento com consequências claras (i.e., os funcionários não são pressionados a pen-
sar e a se comportar de certos modos).
5. solicitações que minimizam pressão e permitem autonomia.
6. uma razão para ação que tenha significado pessoal.
7. Autoridade para tomar decisões que afetam resultados importantes.
8. recursos (incluindo treinamento) para possibilitar o desenvolvimento.
9. Autogestão do treinamento e desenvolvimento.
10. pacote de ferramentas de métodos de self-paced (para plano de desenvolvimento).
11. plano de remuneração baseado em competências.
12. um processo de captação que identifica os candidatos abertos para experiência, consciência, controle
interno, incerteza e autoeficácia.
a organização/gerência cria um clima em que:
1. funcionários podem interagir diretamente com todos os outros (independentemente de nível, função/
cargo ou departamento).
2. objetivos são fixados pelos indivíduos que têm a responsabilidade de atingi-los.
3. os indivíduos e grupos (equipes) são responsáveis pelas decisões.
4. o uso de novas competências no trabalho é recompensado.
5. espera-se que os gerentes sejam coaches, fomentadores e treinadores.
6. Assegura-se aos gerentes e funcionários aprendizagem contínua (mensurando e recompensando pela
aprendizagem).
Funcionário:
1. É, em última instância, responsável por reconhecer suas necessidades de desenvolvimento.
2. Assume responsabilidade pela sua própria aprendizagem.
3. Busca ativamente feedback de desempenho.
4. compara competências atuais e futuras a partir da autoavaliação.
5. investiga e busca oportunidades para o desenvolvimento.
6. estabelece e desenvolve metas, avalia seu progresso e ajusta seus objetivos.

praticamente qualquer um pode ser um tutor eficaz.


uma relação de tutoriamento deve ser voluntária de ambas as partes:
um tutoriamento proveitoso requer confiançaer espeito mútuos.
tutores não fornecem soluções, mas facilitam a aprendizagem.
tutores só podem existir em uma organização imbuída de integridade: quando
se é tutor ou orientador de alguém, dá-se conselhos em relação ao seu futuro e
representa-se a empresa para eles.
relações de tutoriamento não são permanentes.
tutoriamento de pessoas “de rápido crescimento” é uma estratégia de alta
alavancagem.
Deve-se evitar o pseudotutoriamento: é importante não confundir tutoriamento
com contatos políticos, pois esses tipos de relacionamentos podem ser
desagradáveis.
50 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

Quadro 2.3
Formas de propiciar domínio pessoal

Departamento de O “domínio pessoal” não deve ser responsabilidade atribuída ao departamento de


“Transformação e T treinamento e Desenvolvimento de rH da organização. este departamento deve
Descoberta” apenas assumir o papel de supridor da aprendizagem para as pessoas que buscam
suas visões, oferecendo um suporte através de mais cursos, de treinadores externos,
e de aprendizado auxiliado por computador, avaliando seus sucessos na real
“transformação” dos aprendizes. Da mesma forma, “descoberta” não significa ensinar
as pessoas a descobrir, mas empenhar-se ativamente em descobrir a “si próprio”,
antecipando-se continuamente às necessidades e aos interesses das pessoas (senge, 1990).
Novos sistemas A avaliação de desempenho deve ser um diálogo interativo. A visão pessoal e a
de avaliação realidade presente proporcionam um veículo apropriado para redesenhar as
avaliações de desempenho.
Sistema de Disponibilizar um quadro claro do que está ocorrendo na realidade presente aos
informação funcionários, para que possam desenvolver sua visão pessoal (senge, 1990).
antecipada
Promoção promover reuniões semanais, por exemplo, para conversar sobre a visão e a realidade
de reuniões presente dá às pessoas uma estrutura na qual elas podem estabelecer e revisitar a
regulares tensão criativa. As pessoas podem se utilizar mutuamente como um recurso.
E elas podem orientar umas às outras na articulação e no enriquecimento da sua visão
com base no que lhes importa. elas podem aprender mais acerca de si mesmas e da
realidade presente com experiências recentes e desenvolver pequenos projetos
experimentais que revelem os pontos fortes e os limites de suas próprias habilidades
criativas (senge, 1990).
Coaching “A essência do coaching é ouvir. um bom orientador faz perguntas. oitenta por cento
do trabalho envolve ajudar as pessoas a esclarecer suas mentes a respeito das coisas
que devem dizer”. “[...]devem combinar conhecimento em relações humanas
(comunicação e trabalho em equipe) e conhecimento técnico e financeiro.”[...] “deve
se relacionar às questões práticas do negócio, que estão levando a equipe a aprender.
[...] em grupos, atuam mais como facilitadores, ajudando a criar uma atmosfera de
segurança”. o coaching bem-conduzido depende de feedback adequado – o orientador
(coach) deve fornecer críticas honestas, sinceras, convincentes e úteis sobre o
comportamento das pessoas, avaliando e aprendendo eficazmente com as coisas que
as pessoas dizem a seu respeito” (senge, 2000).
Tutores De acordo com Bill o’Brien, “uma relação de tutoriamento envolve duas pessoas – que
podem ou não se reportar uma à outra – que dão atenção especial ao
desenvolvimento de ambas. frequentemente alguém com maior experiência
incentivará o crescimento de uma pessoa mais jovem, mas as grandes relações de
tutoriamento são recíprocas. De qualquer forma, é um ativo de valor extraordinário.”
(senge, 2000, p. 159).

Conforme Pedler (1994), existem quatro grandes tendências para a apli-


cação do autodesenvolvimento nas organizações, as quais se encontram no
Quadro 2.4 (p. 51).
Não se tem a pretensão de abranger, aqui, e esgotar todas as práticas ou
iniciativas para o autodesenvolvimento existentes nas organizações, mas
sim sinalizar algumas direções e abordagens que vêm sendo adotadas, na
maioria dos casos, isoladas ou sem intencionalidade.
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 51

Quadro 2.4
Tendências Para a Aplicação do Autodesenvolvimento

Gerenciamento P programas como ensino a distância, aprendendo a aprender, comunidades de


da própria aprendizagem e autogerenciamento da aprendizagem.
aprendizagem
Igualdade de Grupos com mulheres, negros, minorias étnicas.
oportunidade
no trabalho
Desenvolvimento Sessões de autoavaliação, planejamento de carreira, atividades com biografia, etc.
de carreira
Learning company Expressão que causa polêmicas, mas tenta dar uma noção mais holística ao
autodesenvolvimento. Utiliza-se de programas tais como Avaliação dos
Efeitos Organizacionais dos Grupos de Autodesenvolvimento, Qualidade na
Organização, Desenvolvendo Pequenos Negócios via Autodesenvolvimento.

Fonte: Pedler (1994).

Oriente-se: estudo sobre o tema

De acordo com pesquisa desenvolvida por Mayo e Lank (1994), algu-


mas empresas implementam grupos de desenvolvimento associado à ideia de
autodesenvolvimento. Reúne-se por um período, um grupo de gerentes de
distintas áreas da organização (denominado evento de diagnóstico). A direção
compartilha os objetivos da empresa, são realizadas sessões de trabalho para o
autodiagnóstico de estilos de aprendizagem e competências e os participantes
desenvolvem um plano pessoal de desenvolvimento. Após, grupos de quatro
a seis gerentes reúnem-se regularmente durante um ano – ou, se desejarem,
por mais tempo – para fomentar o desenvolvimento de cada pessoa. As em-
presas têm concluído que a pressão dos pares de trabalho é um agente moti-
vador eficaz para que se sucedam os planos de desenvolvimento acordados.
Os membros dos grupos são selecionados com base em competências com-
plementares para desenvolverem-se uns aos outros e contribuir, assim, para a
aprendizagem de cada um. Os grupos têm se mostrado uma boa oportunidade
para os gerentes aprenderem a ser mais eficazes no trabalho com grupos de
homólogos de outros limites funcionais e organizacionais.
Estes grupos facilitam o trabalho, fomentam a mentalidade aberta e a
franqueza, ajudam a construir a confiança e aconselham acerca das possibi-
lidades opcionais de desenvolvimento em vista das necessidades individuais.
Nesse enfoque estão presentes tanto benefícios como alguns inconvenientes,
conforme o Quadro 2.5.

Considerações Finais

Ao finalizar este capítulo, constata-se na literatura referenciada a exis-


tência de, no mínimo, duas grandes abordagens para o autodesenvolvimento.
52 Parte I – Estratégias para o desenvolvimento organizacional e individual

Quadro 2.5
Vantagens e Benefícios de um Programa de
Autodesenvolvimento em Nível Gerencial

PONTOS FORTES
• As pessoas chegam a uma compreensão compartilhada da direção global do negócio.
• A responsabilidade de desenvolvimento se situa nos indivíduos com apoio da empresa.
• Os planos de desenvolvimento são baseados no alto nível de conhecimento de si mesmo e numa esco-
lha própria, aumentando a probabilidade de que sejam implementados com entusiasmo.
• O processo ajuda às pessoas a aprenderem a aprender: além do desenvolvimento em curto prazo das
competências vai-se construindo, a longo prazo, uma capacidade de adaptação constante.

PONTOS FRACOS
• O processo é extremamente escasso de recursos, tanto em relação ao tempo da alta direção quanto a
facilitadores.
• O processo diagnóstico não obtém mudanças de competências por si só; deve-se investir posteriormente
em atividades de desenvolvimento para que as competências sejam uma realidade.
• Quando é essencial fazê-lo, tem-se pouco tempo e já se tenha identificado relativamente bem a
necessidade das competências, um programa de Aprendizagem Autogestionada provavelmente não é a
solução adequada.
• O custo para programas de um evento de diagnóstico não é necessariamente um investimento provei-
toso para cada pessoa; alguns determinados grupos amortizarão o investimento, porém outros poderão
utilizar métodos com menos custos, como questionários de autoavaliação baseados em software.
• Quando é utilizado apenas para redução de custos em programas de TD&E.

Fonte: Mayo e Lank (1994).

Uma abordagem de perspectiva mais processual, cujo eixo de análise é o indi-


víduo e seu autodesenvolvimento a partir das dimensões de desenvolvimento,
da noção da pessoa no seu todo e de responsabilidade pessoal, considerando
ainda como elementos-chave para este processo a autoconsciência, o auto-
conhecimento, a reflexão e a experimentação, o que implicaria fundamen-
talmente na busca de emancipação do indivíduo. Cabe ainda sinalizar que,
resgatando a bagagem de conhecimentos/experiências do indivíduo em seu
cotidiano, possibilitando-lhe apropriar-se da mesma, contribui-se para o seu
autodesenvolvimento, ou seja, o indivíduo estará ampliando seu repertório de
respostas às situações que se apresentam em seu dia a dia. Ao reapropriar sua
experiência profissional/pessoal, espera-se que o indivíduo possa redimensio-
nar situações com as quais se depara a partir de uma perspectiva diferente.
Como se pode observar, trata-se da aplicação da dinâmica abordada no início
do capítulo: a relação entre ação-reflexão e aprendizagem. Contudo, é impor-
tante que se pense acerca desta noção: as empresas modernas podem tornar-
se um espaço para o exercício da emancipação do indivíduo, voltado para a
liberdade de escolha do sujeito quanto ao seu processo de aprendizagem? Não
seria ingenuidade ter esta expectativa?
De acordo com estudo realizado por Antonacopoulou (2006), o contexto
organizacional e societal tem significativa importância para os indivíduos, que
“procuram ou não” aprender o “o que” e o “como” que são mais valorizados
O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organizacional 53

pela organização e pelo mercado de trabalho, seja para manutenção de seu


status quo ou para manutenção de uma identidade profissional. Enfim, são
limitados pela ideia dominante de aprendizagem para a empresa em que estão
inseridos; consequentemente, o impacto da sua aprendizagem na organização
também é limitado.
A segunda abordagem atribui ao autodesenvolvimento uma perspectiva de
estratégia a ser adotada pelas organizações no sentido de alavancar processos
de mudança e melhorias organizacionais; simplificar alguns processos de ges-
tão de pessoas; obter maior eficiência com um menor custo nos sistemas de
gestão de pessoas; desenvolver “gerentes que aprendem”; e “encurtar o tempo”
necessário para o desenvolvimento dos sujeitos. Esta vertente é a mais comu-
mente utilizada e, habitualmente, sua lógica é a de isenção de responsabilidades
e redução de custos na formação e desenvolvimento de seus profissionais.
Os estudos e as publicações sobre o tema autodesenvolvimento são es-
cassos no Brasil, bem como na literatura internacional. O objetivo deste texto
foi despertar o interesse do leitor e subsidiá-lo com algumas informações so-
bre a temática a partir da perspectiva da aprendizagem nas organizações – que
pode ser visualizada na Figura 2.5 – bem como instigar uma reflexão acerca
dos reais objetivos quando da criação e implantação de programas voltados
para o autodesenvolvimento.

Nota
1. A ciência da ação assume que há uma teoria-em-uso por trás de toda ação, um processo
lógico de argumentação dentro da mente. Esta teoria-em-uso pode ser muito diferente
das teorias adotadas por uma organização ou indivíduo. A aprendizagem de double-
loop questiona estas teorias-em-uso de forma a melhor articulá-las, entendê-las e, pos-
sivelmente, melhorá-las.

Em que:
Aprendizagem organizacional:
entendida de forma ampla, envolve
todas as formas de aprendizagem
no contexto da organização.
Aprendizagem grupal: à medida
que os indivíduos compartilham
experiências vivenciadas e
conhecimentos.
Aprendizagem individual:
ocorre no âmbito das organizações.
Autodesenvolvimento: um dos
sustentáculos da aprendizagem
organizacional.

Figura 2.5
Diagrama: autodesenvolvimento e aprendizagem nas organizações.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.

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