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O Martírio da Castidade (1)

Sermão do 11º. Domingo depois de Pentecostes (2019)


Dom Lourenço Fleichman OSB

Há um fato, algo de muito sério que acontece no mundo, hoje. No dia 1º de agosto eu
expliquei para as crianças do Colégio São Bernardo um aspecto desta nossa vida
meio enlouquecida, e eu gostaria de trazer para todos hoje. Dia 1º de agosto são
festejados os 7 Mártires Macabeus, aquelas crianças que junto com sua mãe, foram
martirizadas porque exigia o rei que comessem de carnes impuras, o que era uma
idolatria para eles. Eles se recusaram de comer e foram levados à morte por uma
tortura muito cruel. Começam a torturar o mais velho, achando que ele fraquejaria,
que ele cairia. Mas o jovem não caiu; ao contrário, fez um discurso ao rei dizendo
que o seu reinado seria destruído. Foi torturado, duramente torturado e morto na
frente da mãe e dos irmãos. Depois tomaram o segundo, e depois o terceiro. E cada
um deles deu um testemunho de fé diante do rei, sempre mostrando e incentivando
seus irmãos a que não caíssem eles também.
Até que chegaram no menorzinho e o rei se virou para a mãe e disse: “a senhora não
tem piedade? Não está vendo que eu posso salvar seu filho? Diga para ele, para
comer destas carnes, para fazer o que eu estou mandando”. E ela, ao contrário,
incentivava o caçula a seguir os passos dos irmãos mais velhos; e assim ele fez, e
assim foi morto, torturado e cruelmente morto. E depois eles mataram a mãe também.
É uma história extraordinária e difícil de se ler, tão duro é o castigo que aquele rei
impõe àquelas crianças e àquela senhora santa. Estamos no Antigo Testamento, mas a
Igreja os festeja como Santos Mártires.
Acontece que no nosso mundo moderno nós não veremos as pessoas exigindo que
nós comamos carnes impuras porque não existem carnes impuras. A Lei de Moisés
caducou. Nós vivemos sob a Lei do Evangelho e Nosso Senhor eliminou todas essas
prescrições que eram na verdade imagens, como que preparação para a única carne
verdadeiramente pura que nós temos a comer que é Nosso Senhor Jesus Cristo na
Eucaristia. Mas depois que Nosso Senhor veio, não faz mais sentido falar de carnes
impuras.
Também não vão pedir que nós queimemos incenso aos reis, aos imperadores, a
idolatria, porque os presidentes das repúblicas não estão muito interessados em
incenso. Eles acham que existe, sim, uma religião da democracia, mas eles próprios
não se consideram representando a imagem deste falso deus. Até mesmo porque a
própria democracia exige o rodízio de presidentes, então perdeu-se essa noção. O que
resta? Nós devemos nos perguntar: O mundo não é católico, o mundo nos ataca, o
mundo persegue a Igreja, e onde está o martírio que nós devemos praticar hoje? Dom
Galarreta, no sermão da Crisma, falou sobre isso: “Nós somos crismados, temos que
dar testemunho”. (A palavra 'mártir' significa 'testemunho') Qual o testemunho que
nós devemos dar?
Ora, o que o mundo exige de nós como idolatria é a impureza.
Eu expliquei isso para as crianças. Nós estamos, talvez, com os olhos tapados, não
estamos percebendo o que está acontecendo na nossa vida. Estamos achando que nós
somos 'católicos da Tradição' e que isso é suficiente e que nós vamos para o Céu e
que está tudo resolvido por que... Porque temos aqui uma bela igreja, e em cada canto
do Brasil, em cada canto do mundo, em todos os lugares, Nosso Senhor permite que
nós tenhamos a Missa. Há pouco tempo atrás não havia Missa. Hoje tem. Cada um
pode fazer uma pequena viagem e encontra um lugar onde um padre, nem que seja do
Motu Próprio, acaba celebrando a Missa. Então, o problema não é a Missa.
Em que ponto eles estão nos perseguindo? Seria na fé? Mas nós temos a internet não
temos? Temos todos os blogs possíveis e imaginários para defender a fé, para
escrever, para dar opiniões... Então, também não é na fé.
Mas a impureza é universal. Nesse ponto eles não abrem mão. Nesse ponto eles
apresentam todos os instrumentos para que aqueles 'católicos da Tradição', aqueles
católicos que são 'da Missa de São Pio V', que são soldados de Cristo e se apresentam
como grandes defensores da religião...” ah, dizem, eles vão cair também! Podem ter
certeza que eles vão cair também... e onde que eles vão cair? Na impureza”. E este é
o ponto onde nós temos que dar testemunho.
Nós não estamos percebendo que eles já são vencedores, que eles já conquistaram as
nossas almas, que eles já se riem de nós. “Querem missa? – dizem – Tenham a missa,
não tem problema... Querem ensinar a doutrina católica? O catecismo de São Pio X?
Catecismo do Concílio de Trento? Podem publicar seus livros... nós não nos
preocupamos com isso, desde que vocês sejam impuros”.
E nós não estamos entendendo! Não estamos ouvindo! Porque é sutil, e é por debaixo
dos panos, e é dentro de um ambiente que se vai apresentando para cada um no seu
celular, no seu computador, na sua televisão! E passa, então, uma impureza jamais
vista na face da Terra; jamais os homens puseram tão a nu, tão à claro, tão no meio da
rua, tão dentro de casa, um mundo completamente entregue à impureza. Vejam, nós
não estamos aqui fazendo um exercício de moral, não estamos fazendo uma
meditação sobre a virtude da Castidade, não estamos falando sobre o pudor e sobre as
roupas. Nós estamos mostrando que existe um combate da fé que se realiza na
Castidade, na Virgindade, mas nós não estamos vendo isso. Nós ainda não
acordamos.
Há algum tempo atrás, seis meses, oito meses atrás, eu apresentei a vocês a Confraria
dos Homens Castos. Eu já tinha falado sobre isso. Hoje, para nós vencermos esse
detestável vício da carne, precisamos puxar uma espada e partir para o combate.
Então eu chamei os homens: “Homens, cabe a vocês serem castos”. Por que? Porque
na hora que o homem for casto, como a mulher acompanha e completa o homem, se a
sociedade for uma sociedade de homens fortes, honestos, que sabem seu estado de
vida e a castidade que lhe é devida, as mulheres acompanharão. E vão ser castas elas
também. Não que elas não devam ser castas. Claro que devem ser,
independentemente dos homens! Mais ainda do que os homens, por causa da
grandeza do feminino, da beleza do feminino, por causa da delicadeza da rosa. Por
isso as mulheres devem ser mais castas do que os homens. Mas se os homens forem
na frente, elas seguirão! E elas agradecerão a eles! Mas os homens não pararam para
ouvir. A que chama o mundo? O mundo chama para a impureza, e todos caem.
Então, eu pergunto: Porque razão todos caem? O padre disse: “é preciso praticar a
virtude da Castidade”. Essa virtude consiste em mortificar seu próprio corpo, nos
seus prazeres, para não se entregar às delícias da carne, a não ser daqueles que tem o
dever de fazer isso. E ninguém consegue. É duro. É árduo. E volta-se a cair. E a
perplexidade está diante dos olhos, e eu fico me perguntando: “Muito bem, sabem
quantos membros tem na Confraria dos Homens Castos? Em seis meses, em oito
meses, o que vocês esperariam? Não sei, 80? Seria um bom número 80? 100? 150?
Pois nós temos hoje 570 membros na Confraria dos Homens Castos, pelo Brasil todo.
Não sei aqui na Capela, mas pelo Brasil todo, 570 homens que me escrevem dizendo
“muito obrigado”, “muito obrigado porque eu melhorei, eu consegui consertar”, “eu
mudei meu modo de ver”. Eu fico mandando alguns textos, são poucos é verdade! Eu
deveria fazer mais, mas eu tento fazer na medida do possível, para acordá-los, para
que eles entendam: Eles rezam a oração todos os dias, há uma oração própria da
Confraria. E com isso há uma esperança de que se conserte a vida, da impureza, e que
se traga de volta a virtude da Castidade; mas não é só de vez em quando.
O mundo exige de nós a impureza, e nós só vamos poder compreender que a virtude
da Castidade, a virtude da pureza é uma vitória, se nós ligarmos essa virtude com a
fé. Do mesmo modo que “um grãozinho de incenso!” Os algozes diziam: “mas minha
filha, é só um grãozinho de incenso, o que isso representa para você? Nada! E depois
você vai seguir sua vida...” E ela respondia “Não. Grãozinho de incenso é só para
Jesus Cristo que é meu Deus. Nem unzinho. Nem um pedacinho! Nada!” Por que?
Porque era a fé que estava em jogo. Aqui também é a fé. Basta uma queda na
impureza, e nós já estamos deixando a fé de lado. Já estamos esquecendo que é um
combate de fé porque o mundo do inferno, o mundo lá fora quer a nossa derrota, não
por causa da impureza propriamente dita. Eles não estão nem um pouco interessados
nisso. O que eles querem é ver o católico caído. Isso é um combate de fé. E é por isso
que nós temos que acordar. E é por isso que nós devemos nos perguntar: “muito bem,
praticar a virtude da castidade eu não estou conseguindo. Eu não consigo por que?
Por que de vez em quando eu caio”. Ah, de vez em quando eu caio? Então já não é
mais uma vitória da fé. Existe um problema sério, eu não posso cair nunca! Eu devo
ser casto, totalmente casto! Como? O que está faltando?
A virtude da Castidade não é suficiente, sabem porquê? Eu vou explicar. Porque a
virtude da Castidade reside no concupiscível. Ela reside justamente no mesmo foco
da impureza. Ela trabalha com as mesmas armas: é sim ou não. É positivo ou
negativo. A fé não está no concupiscível. Não está nas paixões. Não está na
sensibilidade. A fé reside na nossa inteligência. Ela está em um nível superior. Ela
está naquilo que nós temos de espiritual. Aquilo que nos torna semelhantes a Deus. E
é por isso que nós devemos levar o combate da pureza no nível da fé, para que seja
realmente por amor de Deus; é totalmente diante de Deus que nós vamos fazer esse
trabalho. Ora, existe uma virtude que São Tomás explica, que vem em ajuda da
castidade, que não está exatamente na inteligência, mas está na vontade. E Santo
Tomás explica: é a virtude da Continência. Continência, ser contido. É um ser que se
segura. Onde que está a virtude da Continência? Ele explica: não está no
concupiscível. Não está nos deleites da vida que eu devo diminuir. Esta virtude está
na vontade. Ora, a vontade é a companheira da inteligência, são as faculdades mais
elevadas do homem, que são propriamente racionais, que são propriamente humanas,
no sentido da racionalidade e da espiritualidade. Então, a virtude da Continência
significa: “eu vou trabalhar na minha vontade”. Como vou fazer isso? Muito simples:
Seja feita a Vossa Vontade assim na terra como no céu. A minha vontade deve ser a
mesma vontade de Nosso Senhor Jesus Cristo. E nós rezamos todos os dias no Pai-
Nosso, primeiro ao Pai, segundo que venha a nós o Seu Reino. O que significa termos
dentro de nós o seu Reino? Em primeiro lugar: a Igreja; mas também a graça
santificante. Quando nós estamos no estado de graça, o Reino de Deus está no nosso
coração. E seja feita a Vossa Vontade assim na Terra como no Céu. Assim na Terra
significa: nas coisas terrenas, nas coisas dos homens, nas coisas do mundo, na
Castidade.
Então, nós temos que juntar ao combate da Castidade, o combate da Continência
onde eu digo “a minha vontade é fazer a vontade de Deus”. “A minha vontade é dizer
não a tudo aquilo que os homens lá fora querem que eu diga sim, porque eles querem
me derrotar na fé. E da fé eu não abro mão, nem de um grãozinho”. E é por isso que
os homens castos e todos os homens, e todos os católicos, sobretudo todos os
católicos e muito mais os católicos ‘da Tradição’, que examinam essas coisas,
estudam essas coisas. Lá fora, eles não estão muito interessados, querem falar de
política, querem falar de social, mas nós estamos interessados em salvar nossas almas
e nos santificarmos. Então, temos que tratar dessas meditações. E devemos pensar:
muito bem, então vamos viver na continência, eu vou estabelecer um ato da minha
vontade, um ato firme da minha vontade, que significa: eu não contrario a vontade de
Deus em nada. Quando vamos começar a entender que o combate pela pureza está
realmente colocado diante da inteligência da fé e da santidade da nossa vontade? É
assim que nós venceremos. É necessário nos lembrarmos que quando nós cairmos,
que seja uma só queda, eles se riem de nós. E eles dizem “Aí está! Eles são da missa
de São Pio V, eles são da Tradição, eles vão lá no Dom Lourenço, e depois vão para o
inferno igualzinho aos outros. E eles se riem de nós! Aqueles homens mundanos, eles
não se riem de si mesmos porque eles já estão entregues. Mas de nós, que nos
levantamos dizendo: “Ah! nós vamos vencer o demônio, vamos vencer o mundo,
vamos vencer a carne!”. E não vencemos coisa nenhuma. Então eles se riem, por
causa do nosso orgulho, por causa da nossa vaidade, por causa do nosso nada.
E é por isso que eu quis trazer a lembrança deste combate, de um combate terrível. É
uma guerra muito pior do que qualquer guerra de tiro e de bomba. Essa guerra
espiritual que nós precisamos levar para dentro de casa, todos os dias e que começa
hoje. Ela precisa começar hoje. Ela precisa ser determinante hoje. Uma graça nesta
missa de hoje. A comunhão, a força da comunhão, e vejam como Nosso Senhor nos
armou com tudo aquilo que é necessário para sermos realmente vencedores. Nós
temos todo o necessário para vencer. Nós temos a oração, e o Pai-Nosso já nos
mostrou que nós podemos pedir essa vontade de Deus. Junto com a vontade de Deus,
a virtude da Continência, em que eu estabeleço o critério principal: eu não ofendo a
Deus na Sua Vontade. A minha vontade, que ela seja a Vontade Dele. Eu peço isso
todos os dias no Pai-Nosso. Como que eu posso rezar o Pai-Nosso e depois cair no
pecado? Sobretudo o pecado da carne? Se eu disse que quero que a minha vontade
seja a Dele, porque eu faço o contrário?
Está na hora de nós aprendermos a lidar conosco mesmos, cada um no seu estado de
vida. A criança, o jovem, o adolescente, o homem casado, os nossos velhos, todos
podemos praticar a virtude da Castidade, a virtude da Continência nesse sentido, de
iluminar a nossa inteligência, e a fé se abre. E a fé nos ilustra, nos mostra que não
podemos falhar nenhuma vez. Iluminar e fortalecer, aquecer o nosso coração na
faculdade da vontade para que a Vontade de Deus seja ela que prime nos meus atos, e
que meus atos sejam realmente um agir santo. E se nós falamos de um agir santo,
significa que as outras virtudes todas se aproximarão da virtude da Continência, da
virtude da Castidade, se aproximarão da virtude da Fé e da virtude da Caridade para
virem espreitar: “vejam! O que está acontecendo naquele coração? Vejam o que
aquele homem está fazendo, vejam o que aquela mulher está fazendo! Eles já não
caem mais, e o mundo já não pode mais se rir deles. Porque? Eu também quero estar
ali. Eu também quero reinar com Nosso Senhor Jesus Cristo naquele coração”. Então
a Prudência, que é a virtude do reto agir, chama as outras virtudes todas: a humildade,
a honestidade, a força, a penitência, a pobreza. Ah, a pobreza! Neste mundo de
enriquecimentos, todo mundo só pensa em ser rico. A pobreza... todas as virtudes vão
se chegando.
Sabem, aquele Auto de Gil Vicente em que Nossa Senhora chama todas as virtudes
para saber que palavra é essa que o Anjo está falando? Pois isso acontece dentro do
nosso coração e as virtudes todas se aproximam de nós para festejar, e a Fé nos
mostra que o combate é diferente do que nós imaginávamos, e a Caridade nos mostra
que o nosso amor de Deus significa unir a minha vontade a Ele para sempre. E daqui
para o Céu será apenas um passo.
Em Nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

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