O documento discute como a antropologia tem se definido cada vez mais como etnografia. A etnografia era vista como uma atividade auxiliar, mas ganhou importância como um trabalho complexo realizado pelo próprio antropólogo. As grandes teorias sobre o ser humano caíram em desuso, enquanto a etnografia prospera. Isso levou a antropologia a ser entendida principalmente como etnografia.
O documento discute como a antropologia tem se definido cada vez mais como etnografia. A etnografia era vista como uma atividade auxiliar, mas ganhou importância como um trabalho complexo realizado pelo próprio antropólogo. As grandes teorias sobre o ser humano caíram em desuso, enquanto a etnografia prospera. Isso levou a antropologia a ser entendida principalmente como etnografia.
O documento discute como a antropologia tem se definido cada vez mais como etnografia. A etnografia era vista como uma atividade auxiliar, mas ganhou importância como um trabalho complexo realizado pelo próprio antropólogo. As grandes teorias sobre o ser humano caíram em desuso, enquanto a etnografia prospera. Isso levou a antropologia a ser entendida principalmente como etnografia.
A antropologia tende atualmente a se definir como etnografia. Não em toda parte, certo. Mas sim no Brasil, por exemplo. Essa definição é uma condição notável da antropologia atual, que não deveríamos tomar como obvia. A antropologia nem sempre esteve disposta a se “reduzir” a etnografia. A etnografia tem uma longa história como atividade auxiliar. Inicialmente, era o nome de uma atividade quase invisível, e o que destacava nela não era tanto a etnografia quanto os dados etnográficos, sendo a etnografia uma atividade de coleta realizada por indivíduos mais ou menos preparados, que só secundariamente se definiam como etnógrafos (viajeiros-etnógrafos, missionários- etnógrafos, etc). Mais tarde, a etnografia ascendeu na consideração dos acadêmicos, por causa desse cuidado empirista que enfatiza a qualidade dos dados: a coleta é uma tarefa complexa que deve ser realizada por um sujeito especialmente treinado, e de preferência pelo mesmo sujeito que se ocupará depois da interpretação dos dados. Isso consagra o trabalho de campo como um dever do próprio antropólogo. Mesmo assim a etnografia continua estando na base de um esforço piramidal realizado pelo autor, e que tem, acima da etnografia, mais duas instancias superiores, a etnologia e a antropologia. Nesse quadro –que devemos a Mauss-, a etnografia se ocupa exclusivamente da coleta e organização dos dados; à etnologia cabe dar um sentido a eles, em termos comparativos, inserindo-os em séries históricas e geográficas; a antropologia, finalmente, é o esforço teórico que, com base nesses trabalhos anteriores, alcança a elaboração teórica, e com ela o conhecimento propriamente científico. Não pode estranhar que a antropologia tenha vindo a ser entendida como etnografia numa época em que esse refinamento em três patamares piramidais já não parece tão verossímil. Um conhecimento cientifico do ser humano, naquele sentido antigo de um conjunto de formulas verificáveis que dêem conta das incertezas humanas e permitam fazer previsões a seu respeito parece muito improvável e pouco tentador. Desconfiamos das grandes teorias a respeito do Ser Humano. As grandes classificações temporais ou geográficas que outrora davam corpo à etnologia caíram em desuso. Não mais –ou quase não mais- existe aquele mundo dividido entre o Ocidente e o Resto, onde cabia à etnologia se ocupar quase em exclusiva da historia, da sociologia, a arte e a filosofia do Resto. E enquanto o meio e o topo da pirâmide perdem altura e gás, a etnografia, outrora tão modesta, parece prosperar. Mesmo as criticas que a etnografia tem recebido em meio século tem-lha beneficiado, mostrando que ela em modo algum é, nem poderia ser, essa coleta de dados mais ou menos simples que antes se esperava. A etnografia é uma operação mais complexa, muito mais complexa, que na sua observação participante, nas suas entrevistas ou no diálogo entre o
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antropólogo e o nativo leva embutidas as teorias, as hipóteses, as
interpretações. Todo que há de mais essencial na antropologia está no momento da pesquisa etnográfica, e não espera a se manifestar até o momento em que o antropólogo se esconda a analisar suas notas e seus diários.
Há de se elucidar uma diferença. “A antropologia é etnografia”
significa mesmo “é etnografia” ou significa “é apenas etnografia”? Com o “apenas” continuaríamos ainda a preservar um projeto de antropologia determinado a alcançar outro patamar mais elaborado, e talvez incluído no âmbito das ciências naturais. Essa é uma possibilidade enunciada, há bastantes anos, por Dan Sperber, que reconhecia a legitimidade de uma tarefa descritiva, a Etnografia, destinada a satisfazer uma demanda de informação sobre modos de vida diferentes, mas que propugnava, acima desta, uma antropologia tendente à ciência natural. Se a antropologia, pelo contrário, é Etnografia com maiúscula e sem apenas, isso significaria, por exemplo, que há teoria suficiente na etnografia, e que a antropologia como etnografia é uma ciência completa. Disso teremos oportunidade de tratar mais tarde.