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A Respiração como Caminho de Cura – Parte 8

Inspiração e Expiração nos Contos de Fadas e nos Mitos

Leonard Orr reviveu seu próprio parto no contexto de uma experiência de


respiração, motivo pelo qual escolheu o nome de "Rebirthing" para sua
técnica respiratória.
O primeiro alento está em ligação simbólica direta com o nosso nascimento.
Por isso, acontece com frequência de as pessoas, com a respiração, viverem
experiências que se relacionam com o seu parto físico.
Se simbólico ou real, é o renascimento emocional que leva à elaboração e
solução de traumas, e aprendemos que o simbolismo dos processos
psíquicos tem no mínimo tanto significado quanto a realidade.
Trata-se unicamente do significado dessas vivências para a nossa vida
naquele momento, por isso as vivências interiores são mais significativas do
que os fatores externos.
No nosso caminho de vida passamos por muitos "partos difíceis".
Por isso queremos usar o simbolismo do nascimento na nossa vida concreta
e nos ocuparmos um pouco mais profundamente com o segundo plano
mitológico desses processos.
Em geral, o novo só pode surgir quando abandonamos o velho.
Somente depois que abandonamos a (antiga) unidade com a mãe no parto,
é que podemos deixar para trás o reino aquático do início e chegar ao reino
do ar.
Essa experiência da humanidade se expressa nos mitos e contos de fada de
todas as culturas.
Se analisamos o abandono do paraíso ou uma outra imagem da saída de
um aposento protegido, sempre constatamos que essas imagens são
parecidas no mundo todo.
A totalidade, o divino, ou seja como for que denominemos a unidade
primordial, lança nova vida.
Para que o primeiro nascimento e os outros possam acontecer, é necessário
um ventre que dê à luz.
Disso há muitas imagens, que mostram todas as mesmas características.
A mãe primordial, o uroboro, aquela serpente que morde a própria cauda,
ou o hermafrodita que tem a capacidade de ser fecundo a partir de si
mesmo, têm uma coisa em comum: eles formam uma unidade fechada em
si mesma.
Como a célula humana, eles podem reproduzir-se à vontade, porém não
conseguem criar algo que não seja eles mesmos.
Para que possa surgir algo totalmente novo, é preciso um impulso de fora.
No nascimento a partir de uma virgem, no Cristianismo, é o Espírito Santo
que representa esse poder mais elevado; na evolução, é o sêmen
masculino.
Além disso, é necessário um ambiente regular, seguro e, contudo, vivo para
possibilitar o surgimento de vida nova.
A imagem mais familiar dessa unidade primordial por certo é a do ventre
materno com sua função nutriente e protetora.
Para que possa acontecer o novo nascimento e a continuação do seu
desenvolvimento, esse sistema fechado tem de se abrir para novos
impulsos criativos.
Todas as culturas têm símbolos para esse movimentado equilíbrio e para
aqueles impulsos proximativos e fecundadores.
O símbolo do Tai Chi com o Yin e o Yang é um deles, o Yin representa a
parte feminina, fecunda, e o Yang o impulso masculino, agressivo.
Cada uma dessas imagens simbólicas vale em igual medida para os ãmbitos
físico, psíquico e espiritual.
Se uma pessoa alcançou uma espécie de totalidade num desses âmbitos de
vida, ela está madura para uma fecundação renovada e, assim sendo, para
continuar seu desenvolvimento.
Nesse contexto, a fecundação significa todo tipo de conhecimento que lança
novos impulsos.
Na mitologia de diferentes tradições e religiões encontramos uma descrição
desse processo.
A virgem inocente é perseguida e caçada.
Quer se trate do lobo que persegue Chapeuzinho Vermelho, ou de Pã, que
segue as ninfas e elfos, a mensagem arquetípica é a mesma em todas essas
histórias.
Para os perseguidores não se trata de violência e destruição sem sentido,
mas de reprodução e mudança.
A virgem imaculada recebe a encarnação divina, e os elfos são vítimas da
força motriz de Pã.
O pai dos deuses, Zeus, também considera a reprodução um processo
importante, pois ele passa bastante tempo nos campos da conquista sexual.
Essas imagens de fecundação imposta são símbolos do desenvolvimento, e
não devemos limitá-los ao âmbito físico e julgá-los aí.
Talvez a imagem do deflorador moderno seja uma tentativa horrorosa de
trazer algo fértil para o próprio mundo psíquico sem vida.
Enquanto esse impulso se restringir ao âmbito físico, ele levará a sofrimento
sem sentido.
Os mitos nos mostram imagens da fecundação exterior, que servem à
manutenção da espécie e à continuação do desenvolvimento; além disso,
há imagens da autofecundação e da continuação do desenvolvimento
psíquico interior dos homens.
Homem e mulher iniciam uma parceria e da união sexual nasce um filho.
Mas cada pessoa possui em si mesma partes feminina e masculina que
igualmente possibilitam fecundação e recomeço.
Tomemos como exemplo o âmbito profissional: no início da atividade de
conquista trata-se do controle do cotidiano e do autocontrole.
Uma pessoa jovem não pode mais — como as crianças — seguir livremente
seus impulsos e preferências.
A criança pode brincar ao sol, enquanto os pais cuidam do sustento.
O adulto é responsável por si mesmo e precisa ir trabalhar mesmo nos dias
bonitos.
Ele aprende a dominar o mundo exterior e a levar uma vida independente,
a dividir seu dinheiro, a arrumar sua casa e mais algumas coisas.
Somente quando se reconciliar realmente com todos esses temas, e não
mais brigar com as necessidades diárias, ele está maduro para encerrar
essa fase da vida e prosseguir.
Encerrar não significa necessariamente terminar, mas acrescentar algo
novo.
O velho fica como base necessária.
Cada um pode testar por si mesmo o quanto quer fugir dessas necessidades
e como anseia por proteção alheia.
Se achamos injusto ter de ir trabalhar diariamente e ainda não ter ganhado
na loteria, ou se sonharmos continuamente com o país da utopia, ainda não
alcançamos esse objetivo.
Os mitos sobre o país da utopia se referem claramente à unidade (do ventre
materno) onde tudo o que é necessário nos chega sem que precisemos
fazer nada.
Nas modernas cidades industriais muitas pessoas alcançam esse estágio,
mas só na assim chamada crise da meia-idade.
O estado social até tenta oferecer uma situação semelhante, que substitua
a do ventre materno e do país da utopia.
Na fase da mudança, na metade da vida, a pessoa não precisa mais provar
nada exteriormente.
Ela já encontrou algum reconhecimento na profissão, eventuais filhos já
cresceram e no mundo exterior não há mais novos desafios autênticos.
Esse é o momento em que muitos fazem a assim chamada pergunta sobre o
sentido da vida.
Que sentido tem a atividade profissional, que sentido tem a minha vida e o
lugar ao qual cheguei?
Visto de fora — e infelizmente, na maioria das vezes essa é a única maneira
para a qual tendem as culturas ocidentais — tudo está na mais perfeita
ordem.
No caso ideal somos bem-sucedidos, estamos financeiramente seguros,
talvez vivamos numa família intacta e, contudo, algo se tornou discordante
com o tempo.
Sentimos que falta algo essencial à própria vida.
Esse descontentamento interior pode ser comparado a Pá, o perturbador
indesejado da paz que agitou a nossa vida até então saudável.
O mundo protegido e contente consigo mesmo foi fecundado ou abalado por
ele, e a busca por nova orientação pode se iniciar.
Quando não cedemos a esses novos sons de flauta ou impulsos e nos
recusamos a abandonar o país conhecido, esse velho deus da natureza
precisa mostrar seu outro lado escuro e nos ensinar outros tons bem
diferentes, que finalmente podem até fazer surgir aquele pânico que tem o
seu nome.
Para as pessoas que nunca lidaram realmente com as tarefas impostas pela
vida, essas rupturas vêm de modo surpreendente e inesperado.
Elas não se limitam às transições clássicas da vida, mas podem atingir
todos os grandes temas da vida e todas as unilateralidades.
Por exemplo, quem leva uma vida satisfatória sem um parceiro, pode
tropeçar numa parceria na fase seguinte de ruptura.
Embora tenha parado de procurar o parceiro ideal e tenha se arranjado com
sua vida, pode nem se dar conta e entrar em contato com alguém que
destrói todo o seu conceito geral de uma vida feliz a sós.
Quando e sempre que nos reconciliamos com as circunstâncias existentes
de vida, sem chorar pelo passado ou sonhar com o futuro, preparamos o
solo nutritivo para uma nova fase de vida.
Essa harmonia é a base ideal para todo o crescimento futuro.
No entanto, ela não deve ser trocada com uma outra forma, não deve ser
salva de aparente equilíbrio, que tenta se segurar nas antigas fases da vida.
Essa fuga da responsabilidade pessoal, considerada regressão, é inimiga do
desenvolvimento.
Numa regressão como essa nos esforçamos por satisfazer ao mesmo tempo
nossas diferentes necessidades, e desejamos que essa satisfação dure
eternamente para nós.
Mas o regresso a esse estado paradisíaco nos é proibido, visto que a
proteção total e a liberdade absoluta são irrevogavelmente perdidas ao
abandonarmos o ventre materno.
O que não quer dizer que não possamos mais viver esses estados.
Isso é muito possível — e justamente por meio da respiração associada.
Para isso temos então de renunciar antes à percepção fixa no momento de
um recém-nascido e nos reconciliarmos com as leis do espaço e do tempo.
Ninguém é responsável pela perda da unidade, ela está encerrada no círculo
do modelo da vida.
É por isso que não tem sentido projetar qualquer responsabilidade nas
circunstâncias ou no deus Pã.
Ao nascermos ainda está claro que ninguém tem culpa de o paraíso da
cavidade uterina com o tempo ter ficado muito apertado.
Posteriormente, também não faz sentido atribuir culpas quando uma fase
da vida é encerrada e se inicia uma outra.
A unidade dos opostos pertence imprescindivelmente ao passado no
momento do nosso nascimento.
Damos nosso primeiro alento, e a partir desse momento precisamos inspirar
e expirar durante toda a vida.
No parto, todo o coração do recém-nascido é inundado por um amplo fluxo
de sangue, mas com a entrada no mundo exterior dividido a parede
divisória do coração se fecha e ele passa a se constituir de duas câmaras
separadas uma da outra.
O que antes foi um, divide-se em dois poios.
A unidade física do fluxo sanguíneo termina da mesma maneira que a união
física de mãe e filho.
Quando a parede divisória do coração não se fecha e não separa o que não
mais lhe pertence, falamos de uma cardiopatia e, conforme a gravidade do
defeito, a criança não pode viver ou conta com limitações na vida.
Quando mãe e filho não se separam fisicamente durante o parto, ambos
morrem.
Quando não se separam psiquicamente durante a puberdade, e os filhos
não rompem o cordão umbilical no máximo na adolescência, também
podemos falar de um defeito.
Somente quando aceitamos e vivemos ambos os polos da vida, chegamos a
um novo tipo de harmonia ao fim do caminho.
Temos de pagar o preço da polaridade para podermos reconquistar a
unidade num âmbito espiritual.
A primeira impressão que o recém-nascido recebe deste mundo já deixa
claro o que o espera como ser humano em crescimento em seu caminho
pela polaridade.
Depois de mais de vinte anos de experiências com a terapia da
reencarnação, podemos afirmar que o lactente sente o caminho pelo canal
do parto como extremamente apertado e ameaçador.
Além disso, a queda de temperatura e a amplidão de espaço do seu novo
ambiente lhe parecem frios e negativos.
Por isso a experiência da liberdade de início está ligada a um sentimento de
amplidão e frio, enquanto ele facilmente considera a proteção e a
proximidade exageradas apertadas e opressivas.
Vivemos a amplidão e o frio de todas as novas experiências ao inspirar.
Nós expandimos a nossa caixa torácica, e o ar frio jorra para dentro.
Também podemos com facilidade sentir o frio da inspiração no nariz.
Ao expirar a tensão se desfaz, e o nosso corpo volta à calma e ao vazio, ou
seja, à harmonia.
Enquanto a inspiração rompe a calma no final da expiração, esta solta a
tensão e a inspiração.
Para a fecundação poder chegar à nossa vida, precisamos do solo nutritivo
vivo da expiração e do impulso ativo da inspiração.
O impulso para a continuação do desenvolvimento pessoal pode provir da
vida exterior, por meio de novos contatos ou circunstâncias de vida; no
entanto, o caminho espiritual precisa surgir na própria pessoa.
O lampejo da iluminação, o raio espiritual e expressões semelhantes
descrevem essa penetração dos impulsos de desenvolvimento na nossa
consciência.
Tudo o que precisamos para o desenvolvimento está unido na respiração, e
ela não só é símbolo da sobrevivência dos opostos, mas mostra também a
sua reunificação.
Na maior parte do tempo, ela flui autônoma, mas nós estamos em
condições de modificá-la conscientemente a qualquer momento.
Quando queremos, podemos deixá-la ficar mais funda ou superficial ou
variar o seu ritmo.
Assim que não lhe dermos mais atenção, o centro da respiração do cérebro
assume novamente o controle.
A respiração é uma forma híbrida no âmbito das nossas funções corporais;
nela se misturam e se completam nossas partes conscientes e
inconscientes.
O jogo recíproco de forças conscientes e inconscientes é decisivo para o
bem-estar ou o mal-estar.
Se ambos os lados se apoiam, impera a harmonia entre a percepção
consciente e o mundo dos sentimentos.
Se estiverem em pé de guerra, impera a insatisfação em nós.
Uma pessoa na crise da meia-idade logo sente uma discrepância entre o
querer consciente e as necessidades inconscientes mais profundas.
Desde sua juventude essa pessoa esteve ocupada em controlar o mundo
exterior.
Suas forças inconscientes ficavam em segundo plano e tudo era feito com
facilidade.
Seu ser interior e exterior concordavam quanto à sua tarefa de vida.
Contudo, em algum momento, o seu lado inconsciente reconhece que algo
deve se modificar; começa o pensamento retroativo sobre os verdadeiros
valores da vida.
Mas essa mudança ainda está escondida da sua razão, e assim acontece de
o seu ser dividir-se em duas partes.
Conscientemente, essa pessoa vive segundo o lema "cada vez mais do
mesmo", mas as instâncias interiores já começaram a retirada.
Por exemplo, ela quer viajar para países estrangeiros e continuar ocupando-
se exclusivamente com o mundo exterior.
Seu interior já anseia por tranquilidade e reflexão e prefere ficar sentado
perto de um regato murmurante, a fim de pensar na sua vida até o
momento.
Enquanto isso sua consciência diária a apressa a seguir supostos impulsos
exteriores em caminhos já conhecidos.
A luta se agitará nela até que ambos os lados em guerra cheguem a um
acordo.
Nessa situação, uma sessão de respiração não só revelará o tema, mas
também canalizará as energias na direção correspondente.
Como diz Goethe, todo o visível é apenas uma imagem e dá uma indicação
daquelas esferas além do nosso mundo material exterior.
Como a respiração está tão à vontade no mundo exterior como no mundo
interior invisível, por meio dela temos a chance de entrar em contato com
esses outros âmbitos.
À medida que controlamos nosso padrão de respiração predominante ativa
e principalmente com consciência, a energia chega a esse âmbito limítrofe
entre subconsciente e consciência desperta.
Ambos os lados do nosso ser podem estabelecer contato e pode acontecer
uma espécie de diálogo entre eles.
A respiração nos liga às energias vitais elementares.
O oxigênio que chega ao nosso corpo com cada alento nos une a todo
momento com a vida propriamente dita.
Com o primeiro alento começa a nossa vida, e com o último ela termina.
Enquanto respiramos, sentimos continuamente como a energia vital nos
enche.
O oxigênio é o combustível primordial de todas as células e todo movimento
surge a partir das suas possibilidades de reação.
O fogo precisa dele para que as chamas tenham alimento; e todo motor
precisa da sua força de explosão.
O oxigênio participou em certa medida da introdução da era industrial.
A nossa sociedade vê a vida humana como um movimento linear singular.
Da mesma maneira a maioria das pessoas considera a sua respiração o
monótono sobe e desce de uma bomba de oxigênio.
Nós degradamos os maravilhosos processos do nosso corpo a um
movimento maquinal bidimensional.
E assim roubamos a nossa alegria de viver, bem como as chances decisivas
de desenvolvimento.
A vida nos parece um acontecimento singular, e quase não temos condições
de perceber a ligação entre expirar (soltar, morrer) e inspirar (recomeço,
renascimento, continuação).
A nossa ligação com a circulação eterna do princípio do morrer e tornar a
ser caiu no esquecimento.
Se quisermos abandonar a monotonia e a hostilidade da vida da linearidade,
precisamos reconhecer um todo harmônico, fluente no movimento da nossa
respiração.
Dizendo isso plasticamente, pode acontecer de nós formarmos um círculo
na medida em que existe o movimento do sobe e desce da respiração.
O círculo não tem começo nem fim, ele representa a roda da vida, que liga
a nossa existência humana com o rio e todos os processos da natureza.
Uma outra imagem bonita para esse movimento é a lemniscata, o sinal de
infinito na matemática.
Com isso chegamos à imagem da respiração associada.
Somente quando a nossa respiração se torna uma serpente que morde a
própria cauda (uroboro) ela se torna um ventre materno e a cavidade
uterina da alma.
Todos os caminhos de desenvolvimento interior visam a esse segundo
nascimento, e a palavra "desenvolvimento" no caso deve ser entendida
literalmente.
Desenvolver-se significa desembrulhar e desempacotar algo que já existia
desde o início.
Não precisamos acrescentar nada novo, mas temos "apenas" de eliminar da
nossa vida o que não é essencial.
A respiração associada pode — trabalhando contra o emaranhamento — pôr
em andamento o desenvolvimento. Muitas vezes o encontro com ela leva à
mais elementar das experiências interiores, e estas nos possibilitam
descobrir de novo os conteúdos essenciais da vida interior e colocá-los em
relação com os conteúdos exteriores.
Quando designamos a respiração associada como a cavidade do parto, essa
cavidade só não bastará para fazer surgir algo novo.
Num útero disposto a conceber só pode surgir crescimento quando houver a
fecundação.
O mais belo e rápido carro não anda se a centelha da ignição no interior do
motor não fizer a mistura de gás e ar explodir.
Algo semelhante acontece com a respiração.
Não basta forçá-la mecanicamente.
Só quando se acrescenta a consciência pode acontecer algo decisivo.
Consciência e atenção são as centelhas que acendem a energia que
acumulamos em nós e por meio dela dá-se a movimentação interior.
A medida de consciência é, em última análise, que decide se os processos
psíquicos se movimentam ou não.
Quanto mais estivermos em condições de criar consciência, tanto menos
temos de forçar a respiração.
O yogue que medita juntou tanta consciência que o tranquilo e quase
imperceptível fluxo da sua respiração suave o leva por fim à iluminação.
Mas esse caminho é longo, e em geral estamos a um bom trecho de
distância da iluminação.
Se desejarmos encurtar esse caminho, e, em última análise todos os
exercícios espirituais têm esse objetivo, temos de contar com alguns
incômodos físicos ou emocionais e sobreviver a eles em todos esses
processos.
O yogue também teve de trilhar um longo caminho de meditação, passar
por tudo isso e eliminar em seu caminho o que impedia sua iluminação.

Inspiração
Quando observamos cada uma das duas fases da respiração esse seu
caráter polar se destaca.
Isso não nos deve iludir sobre o fato de que ambos os poios na realidade
são inseparáveis.
Com quanto maior clareza reconhecermos os dois lados da respiração em
suas diferenças, com tanto maior significado eles podem se completar mais
tarde, sem que haja confusão nos âmbitos de suas tarefas.
Força de vontade e atividade são atributos da inspiração.
O movimento da inspiração surge da contração da musculatura da
respiração.
Esticar o diafragma causa uma pressão na região do peito, pelo que o ar da
inspiração por assim dizer é sugado para dentro.
Portanto, primeiro existe uma tensão muscular que provoca a inspiração.
Simbolicamente, ela representa a parte ativa e, desse modo, a parte
masculina da respiração.
Para nós a inspiração é a representante simbólica de todas as forças ativas
existentes no nosso ser, também aquelas que ainda não usamos.
Na nossa disposição de inspirar podemos, consequentemente, reconhecer o
quanto ousamos entrar em regiões novas, imprevisíveis da nossa vida.
A inspiração mostra até que ponto estamos dispostos a lutar pelos próprios
objetivos.
Na inspiração está o recomeço simbólico.
Com ela saímos para o mundo como o jovem herói, para dominá-lo e
enfrentar a nossa tarefa.
No momento de buscar ar nós deixamos o porto seguro do nosso ambiente
habitual.

Marte
Podemos equiparar a inspiração a todas aquelas figuras mitológicas que
saem para o mundo para buscar a sorte.
Quem sai para o mundo precisa de coragem, disposição de correr riscos e
vontade de lutar, pois ele não sabe o que o espera.
Em todos os contos de fadas e mitos que descrevem o caminho do herói
encontramos essa temática.
Marte (Ares), o deus da guerra, só vê o sentido da própria existência nas
lutas.
Ele viaja pelos países e busca o confronto.
Todas as circunstâncias (repugnantes) significam um desafio para ele.
Sua (ingênua) certeza de vitória o ajuda a superar os maiores perigos e os
mais fortes oponentes.
Inquebrantável, ele segue adiante e o ataque inevitável é a sua única
"estratégia" de luta.
Essa agressividade direta proporciona um mal-estar, pois não estamos
acostumados com alguém que vive abertamente sua agressividade.
Enquanto isso, na nossa sociedade a agressão quase só é equiparada à
atividade violenta sem sentido.
Já na infância aprendemos a reprimir a agressividade, a nos
envergonharmos dela e vivemos com medo de sermos considerados
insociáveis caso essas nossas tendências se tornem visíveis.
Com certeza é necessário controlar o nosso potencial agressivo para que
haja amadurecimento interior e cultura exterior.
Mas se banirmos toda a agressividade da nossa vida, perdemos a nossa
força vital mais elementar.
A fuga da agressividade nos leva à agressão e muitas vezes à falta de força.
Dessa maneira nos tornamos pessoas suaves e fracas que dizem sim.
Pessoas que têm medo de conflitos e pessoas fáceis de manipular são tão
perigosas para a comunidade humana como as pessoas destrutivas,
principalmente porque muitas vezes elas se juntam e, então, causam
grandes danos.
É difícil decidir o que é mais importante, a terra natal ou a semente que a
fertiliza.
A ideologia mais agressiva sem o solo de uma maioria silenciosa e que
caminha junto não é muito perigosa.
Mas não pode tratar-se de um sim ou não, mas de uma participação
significativa de nossa agressividade e energia vital.
O significado original da palavra agressão (do latim aggredi = atacar,
agredir) é atacar no sentido de agarrar sem vacilar.
Nisso é difícil reconhecer os dois polos.
Atacar alguém, segundo a palavra, significa tocá-lo.
Quando tocamos alguém estabelecemos um contato físico com essa pessoa.
No uso da língua austríaca a palavra "atacar" ainda tem esse significado
original e não é imprescindivelmente vista como negativa.
No modo de dizer "atacar a vida" fica claro o lado positivo da agressão.
Se evitamos basicamente todo contato com as nossas próprias agressões ou
as dos outros, isso nos protege de fato de experiências dolorosas, mas, ao
mesmo tempo, perdemos todas as oportunidades de entrar em contato com
a vivacidade.
Se quisermos viver os lados belos da vida, não será possível evitar
encontrar também os lados desagradáveis.
Para encontrar a nossa vivacidade, temos de sair para o mundo e fazer
experiências.
Não podemos poupar-nos de nada, e é impossível prever de modo concreto
o que iremos encontrar.
A força bélica de Marte pode nos emprestar coragem e força para ousarmos
fazer essa aventura.
A inspiração simboliza esse processo no âmbito físico.
À medida que o fortalecemos com a respiração associada, nos pomos a
caminho de agarrar o ferro em brasa da nossa vida.

O Bobo
Para que Marte e suas forças possam ser eficazes em nós, temos de levar
em consideração mais uma força interior.
Essa segunda energia está na frente de todo início.
No tarõ, é-lhe atribuído o número zero, e assim, ele encerra o círculo dos
22 assim chamados Arcanos Maiores, os marcos do caminho do
desenvolvimento.
O Bobo está tanto no início como no fim do desenvolvimento.
Ele representa a segunda posição de todos os processos vivos.
Suas capacidades são a base para as ações de Marte.
O Bobo traz em si a capacidade de transformar reflexões e intenções em
ações reais.
Ele é inocente como uma criança, e o fato de não precisar provar nada lhe
dá a liberdade de ser louco e nada convencional.
Para ele é indiferente se seus atos são bem-sucedidos ou não, ele
experimenta tudo e a possibilidade de um fracasso não tem nenhum
significado para ele.
Se algo não dá certo para ele, ele tenta outra vez até dar certo, ou perde o
interesse.
Marte, ao contrário, já tem uma direção certa e quer vencer a qualquer
custo.
Falta-lhe totalmente a ingenuidade do Bobo, e assim, pode ser que de tanta
vontade ele mesmo se bloqueie.
Só querer não basta, pois somente as forças infantis dão à vontade a
capacidade para encontrar um início.
A lúdica leveza do Bobo está ligada às forças inconscientes das pessoas.
Por isso ele tem êxito em estar na hora certa no lugar certo com a
segurança de um sonâmbulo e agir espontaneamente. Final-mente, ele é o
elo de ligação no círculo das etapas do desenvolvimento, pois no tarô ele
representa a menor e a maior carta ao mesmo tempo e cumpre a missão do
desenvolvimento humano de "tornar-se outra vez como as crianças".
Para ter uma imagem viva desses princípios primordiais, vamos analisar um
desses mitos.

Percival
Percival é uma figura mitológica que nos mostra com maravilhosa clareza o
lado ativo masculino do caminho do desenvolvimento humano e, ao mesmo
tempo, é a encarnação perfeita do Bobo lutador.
Como a inspiração representa esse tema no mundo corporal, de tempos em
tempos daremos um salto do âmbito mitológico para o nosso próprio mundo
interior.
Na inspiração, o caminho ativo dos homens está contido de maneira
semelhante ao da célula corporal isolada, que contém informações sobre o
organismo como um todo.
De acordo com Robert Johnson, o nome Percival significa "Bobo inocente".
Sua inocência e ingenuidade são justamente os despertadores do seu
caminho de herói.
Seu pai foi o famoso cavaleiro Gamuret.
Quando ele foi morto em batalha, a mãe de Percival decidiu preservar seu
amado filho de um destino semelhante.
Hercilóide escondeu-se com o filho e a criadagem na floresta.
Ali achou que Percival estaria a salvo das influências da vida cavalheiresca.
Ali ele é criado de modo muito feminino nas proximidades do seu lar.
Ela cuida dele com dedicação sentimental e o mima com canções e tocando
realejo.
Por segurança, ela o vestiu com trajes de menina.
Hoje acontece o mesmo com muitas meninas e meninos que depois da
separação dos pais são criados unicamente pela mãe.
A tentativa de estimular somente os lados sensíveis do ser humano, na
medida em que evitamos qualquer contato com a agressividade, muitas
vezes causa problemas.
O esforço de advertir e desvalorizar as sombrias características masculinas
do pai leva diretamente àquela catástrofe vivida também por Percival.
Ele devia ser o contrário exato do seu pai e justamente por isso se torna
igual a ele.
Pois cada polo abriga seu polo oposto.
Assim acontece o que tem de acontecer.
Percival se distancia em algum momento da cantoria e da música e volta o
seu interesse principal para uma espécie de atiradeira com a qual abatia os
animais, para consternação da mãe.
Quando certo dia encontrou alguns cavaleiros regiamente vestidos na
floresta, em seu desconhecimento os tomou por anjos.
Ele fica fascinado pelo brilho deles e resolve ser ele também um anjo
cavaleiro.
Os homens lhe dizem que ele precisa ir à corte do rei Artur para ali ser
sagrado cavaleiro.
A decisão dele é firme e nem todo o sofrimento e as queixas da mãe podem
impedi-lo de iniciar o caminho.
Percival tem três qualidades interiores essenciais: em primeiro lugar, ele
tem sua inocência juvenil.
Na verdade ele é protegido por ela, mas ela também lhe tira a capacidade
de perceber os perigos.
A segunda característica é simbolizada pela sua arma infantil, a atiradeira.
Essa arma parece ridícula. se a compararmos com os suntuosos escudos e
espadas dos cavaleiros, e, contudo. em suas mãos juvenis inocentes deve
se transformar numa arma milagrosa.
O terceiro atributo à primeira vista parece muito mais um impedimento.
Ele consiste na roupa de bobo que a mãe costurou para ele como
despedida.
A esperança dela por certo consiste em que essa roupa desperte
misericórdia e que os cavaleiros rivais o poupem assim que o reconheçam
como um bobo.
Mas isso fez com que o seu primeiro oponente não o levasse a sério e que
por isso Percival pudesse vencê-lo.
O sentimento de superioridade tornou seu adversário cego e descuidado.
Muitos jovens têm medo de não serem levados totalmente a sério pelos
homens adultos.
No entanto, se consideramos essa tolice como algo positivo, ela se
desmascara como uma ótima camuflagem, pois quem não é considerado
perfeito pode mover-se livremente em seu ambiente.
Ele pode ir a todos os lugares sem problemas, sem ser considerado um
concorrente ou um perigo.
Para poder suportar o estado de não ser considerado perfeito, é necessária
força de resistência.
Durante essa época da sua vida ele sente todas as capacidades e potenciais
que querem extravasar-se dele e, no entanto, é importante esperar pelo
momento certo.
Somente quando o tempo estiver maduro faz sentido tornar visíveis suas
próprias capacidades.
Robert Bly descreve esse aspecto como o tornar-se o cabelo dourado
visível.
Para Percival o momento certo surgiu pela primeira vez quando encontrou o
cavaleiro vermelho, Íter.
A cor vermelha simboliza Marte e, assim, a energia vital, a agressividade e
a coragem.
Percival se apodera dessas forças na medida em que vence o cavaleiro
vermelho e a partir desse momento usa a armadura dele.
Mas sob a armadura ele ainda usa sua roupa de bobo e só a tira aos
poucos.
Ele ainda precisa adaptar-se à armadura.
Quanto maior a clareza com que prova a sua valentia, tanto mais ele perde
sua loucura juvenil, transformando-a respectivamente em espontaneidade e
criatividade.
A nossa sociedade moderna inconscientemente tomou como tarefa quebrar
essa juvenilidade tola.
Cortam-se as asas das pessoas jovens em nosso sistema de formação, para
que eles se transformem em pessoas paralisadas, psiquicamente
incompletas.
Muitas formações tiram dos jovens mais do que eles precisam para serem
capazes de dominar a vida.
Nós precisamos de uma medida sadia de loucura para entrarmos em
contato com a nossa força primordial.
Há pessoas que se distanciaram tanto da sua infantilidade e loucura, que
lhes é impossível entrar em contato com essa força.
Elas estão tão desnorteadas e cheias de condicionamentos que ficam
detidas nos preparativos para a vida.
Quando alguém quer ousar algo, talvez um novo capítulo de vida ou um
processo terapêutico, ele faz questão de ter uma garantia de sucesso para
os atos que tem à sua frente.
Ele se questiona continuamente se o que pretende será bom ou ruim para
ele, e não está pronto a gastar energia enquanto persistir o risco de um
fracasso.
Por outro lado, justamente a sociedade moderna vive formas de desejo
juvenis cada vez mais tolas.
Percival ousa dar o salto idiota e isso o leva à própria energia vital.
O que segue é o seu caminho totalmente pessoal de herói, que o faz
amadurecer para tornar-se um ser humano verdadeiro.
Esse caminho indica sinais simbólicos de valor coletivo.
Cada um é Percival, ou seja, leva seu arquétipo dentro de si.
Seguem-se a solidão, lutas contra o dragão, desesperança, tentações e
muitos outros desafios, como cada pessoa tem de viver no âmbito psíquico.
O palco exterior da vida, onde se passam esses temas, é diferente para
cada pessoa.
A diferenciação dos âmbitos exteriores no nosso contexto é menos
interessante, para nós trata-se do essencial: a força de pôr algo em ação.
Em cada inspiração nós exercemos esse ritual de ativação da energia vital.
No processo da respiração associada precisamos da ousadia do Bobo, que
junto com nossa força de vontade nos torna guerreiros dispostos ao
conflito.
Na inspiração podemos aproximar-nos do próprio dragão e empreender a
luta contra ele.
Quando os demônios forem vencidos, obtemos acesso às águas da vida,
que na mitologia na maioria das vezes são simbolizadas por um poço ou
uma virgem delicada.

A passagem da inspiração para a expiração


Marte é considerado um destruidor e pessoa arrojada, por isso não é
especialmente suportado no céu dos deuses.
Ele precisa de uma força contrária, senão a sua arrogância o destrói.
Deixado por conta própria, ele ultrapassa o objetivo e se perde na auto
supervalorização.
Entre os espartanos os conquistadores simbolizam esse aspecto da força
marcial.
Os guerreiros de Odin e outras figuras mitológicas indicam os limites da
força masculina.
Eles são lutadores tão fortes e agressivos que, assim que a luta termina e
os oponentes estão mortos, eles logo têm de ser trancados outra vez, visto
que de outro modo se liquidariam mutuamente.
No nosso alento simbólico chegamos ao topo e no caso ideal usamos toda a
nossa capacidade.
Agora existe uma modificação, pois não dá para continuar no caminho
ativo, e as forças marciais precisam ser contidas outra vez.
O que pudemos fazer nós fizemos e, agora, segue-se o retorno.
Agora se trata de soltar outra vez tudo o que antes nós buscamos colocar
para dentro.
Nesse momento há muitas maneiras de reagir, e não há quase nada mais
difícil para as pessoas de culturas ocidentais do que soltar.
Estamos presos em tal medida à posse e ao apego, que ficamos de muitas
maneiras desamparados diante do desafio de soltar.
No momento em que não há mais nada a fazer, deveríamos deixar todo o
resto acontecer.
O camponês pode preparar o seu campo e ele ainda pode regar as plantas
depois que plantou as sementes, mas em essência tem de deixar o resto.
Ele precisa de tempo e paciência, humildade e dedicação para que o seu
trabalho possa dar frutos.
Se não parar de regar as plantas, ele as afogará, em vez de fazê-las
crescer.
Assim que nesse ponto decisivo ultrapassamos o limite e fazemos demais,
porque não conseguimos soltar, há consequências incalculáveis.
Com adubo artificial o camponês pode fortalecer o crescimento, mas a longo
prazo ele destrói o seu campo.
Talvez seja nessa fase que o mundo moderno sofra mais.
Em todos os âmbitos o nosso princípio de desempenho se modifica para a
autodestruição.
Os recursos chegam ao fim, e o gerente está ameaçado de enfarte cardíaco.
Quando fizemos todo o possível, devemos desistir de todo querer e deixar
as modificações acontecerem.
Essa mudança de posição representa um papel decisivo em todos os
âmbitos da vida.
Uma pesquisa da Universidade de Stanford mostra o significado da
passagem da postura ativa para a passiva.
Para a pesquisa de capacidades paranormais as pessoas que fizeram o teste
e que se sentiram capazes desses desempenhos de concentração foram
reunidas num grupo.
Com suas forças mentais elas tinham de tirar o ponteiro da bússola da linha
magnética Norte-Sul.
Elas não conseguiram e a tentativa estendida pelo dobro de tempo foi
interrompida depois de duas semanas.
Contudo, no momento em que cessaram todos os seus esforços e se
descontraíram visivelmente, pela primeira vez ocorreu uma movimentação
clara do ponteiro.
Existem muitas observações desse tipo que, em última análise,
apresentaram o mesmo resultado.
Por exemplo, num estudo sobre remissão espontânea em pessoas com
câncer constatou-se que aquele equilíbrio entre força de vontade e
humildade representava a única coisa em comum entre os diversos
caminhos de controle.
Ficaram totalmente sadias aquelas pessoas que contribuíram com tudo o
que estava em seu poder.
Elas se ocupavam com o segundo plano psicológico de sua doença,
prestavam atenção à alimentação e seguravam cada haste de palha que
oferecesse ajuda.
Ao mesmo tempo desenvolviam a humildade e no fundo do seu ser tinham
a certeza de que sua luta também poderia redundar num fracasso.
Elas reconheciam os próprios limites, o que no seu caso significava aceitar
também a própria morte.
Só acontecia uma remissão espontânea quando ambas as coisas
aconteciam, a vontade concentrada masculina de girar mais uma vez o
remo e a grande humildade feminina de aceitar finalmente o próprio
destino.
Descontração e abertura formam o peso contrário da adaptação e do
esforço metódico.
Esse polo oposto só se torna eficaz quando toda ação e desejo são
desligados.
Quanto mais estivermos dispostos a entregar-nos totalmente no momento
do desapego, tanto mais fundo entramos nesse mundo.
É o mundo de Vênus e de muitas outras divindades femininas que
simbolizam essas forças nos seres humanos.
Essas energias podem ser mais bem comparadas com a qualidade da água,
o mais feminino dos elementos.
A água é fluida, adaptável e repleta de sentimentos.
Sua pouca firmeza não permite que seja destruída, e ela desenvolve força
violenta mediante a perseverança e sua presença que tudo envolve.
Por si só Marte não pode sobreviver duradouramente, ele precisa de seu
polo oposto feminino para tornar-se inteiro.
Pois não reconhecemos o guerreiro perfeito como figura resolvida no
sentido do xamanismo somente pela sua agressão animada, isto é,
vitalidade, mas também por suas capacidades estratégicas.
Só aquele que entende como recolher-se no momento certo para deixar o
oponente correr no vazio, é um verdadeiro mestre da arte da luta.
Carlos Castañeda faz o mestre xamã Dom Genaro dizer sobre o guerreiro
que se realiza que ele é tão orgulhoso que não se dobra diante de ninguém
e tão humilde que não permite que ninguém se dobre diante dele.
Esse recolhimento da teimosia também se mostra na expiração.
Deixar as coisas seguirem seu rumo, recolher-se, ficar quieto se tornam as
possibilidades de justificar esse tema.
Quem sabe calar a boca no momento certo pode dizer muito mais do que as
palavras poderiam.
Essas partes femininas receptivas são representadas tanto nas mulheres
como nos homens e no curso de sua vida ambos entram em contato com
elas.
É indiferente se analisamos uma figura mitológica feminina ou masculina,
ambas vivem ambos os poios deste mundo, seja como for, em sequência
invertida.
O princípio feminino começa o seu caminho no desamparo e no curso do
tempo chega ao polo masculino ativo.
O princípio masculino começa ativo e no curso da vida descobre a
feminilidade na humildade e dedicação.
No início da vida como cavaleiro, Percival chega mais ou menos por acaso
àquele castelo do Graal, onde o rei pescador espera pela salvação.
No entanto, Percival é inconsciente demais para reconhecer a qual local
sagrado ele chegou.
Ele perde sua chance de salvar o país e o rei do sofrimento.
O rei é um símbolo do si mesmo.
No mito de Percival trata-se da salvação do herói, da sua auto realização.
No seu mundo interior ele sofre de uma maneira como hoje em dia muitas
pessoas sofrem.
Elas estão em busca de algo que acreditam conhecer muito bem, mas não
sabem aonde procurar.
Somente depois de deixar o palácio do Graal, Percival reconhece que havia
encontrado o objetivo da sua vida.
Ele jura não desistir da busca antes de encontrar outra vez esse palácio.
Do modo exterior, masculino, ele procura durante anos sem sucesso.
Só quando aceita o próprio fracasso, ele obtém um novo acesso ao lugar
sagrado.
Depois que desistiu da busca ativa, o milagre pôde acontecer.
Mas ele não é mais aquele guerreiro duro, inflexível, pois o fracasso da sua
busca ativa o tornou mole e sensível.
Agora ele tem condições de fazer a pergunta certa ("O que lhe falta,
Oheim?") para a sombra, por meio da qual o país e o rei seriam libertos do
sofrimento.
O rei é curado, o reino adquire nova vida e o povo dá uma festa.
O cavaleiro Percival integrou sua própria feminilidade e, com isso, tornou-se
um verdadeiro ser humano.
Na maioria dos mitos de heróis encontramos os anos de vagar à toa e
buscar, que ele vive entre sua primeira e segunda entrada no castelo.
No nosso mundo ativo, patriarcal, nós preferimos a parte exterior, bem-
sucedida desses relatos.
Por isso a outra parte essencial do herói encontra pouco lugar na nossa
consciência.
A segunda parte do Fausto, de Goethe, reflete esse tema assim como a
segunda parte da tragédia Rei Édipo, de Sófocles.
Depois de reconhecer o fracasso da sua própria vida, de cegar-se e retirar-
se para a solidão, Édipo também precisa viver a maldição dos anos de
vergonha e de busca de si mesmo.
Todos os heróis têm de trilhar esse caminho e superar o próprio orgulho. A
antiga personalidade morre, e eles renascem como seres mais perfeitos.
Só poucas pessoas estão na situação de lidar com a segunda parte da sua
missão de vida.
A falta de desapego tantas vezes observada na expiração pode servir como
metáfora disso.
Esse tema fica muito claro também na morte de Jesus e sua ressurreição
três dias depois.
Ele morre, para voltar como o Cristo.
Só aqueles heróis que desistem do seu poder exterior e passam pela solidão
interior e pelo desespero se tornam pessoas iluminadas, verdadeiras e auto
realizadas.
A parte ativa da realidade se compraz com extraordinária preferência.
A maioria dos aventureiros do cinema e da televisão segue esse caminho
arquetípico.
O herói solitário, amante da verdade, forte e corajoso precisa seguir seu
caminho por uma paisagem inóspita.
Ele precisa se afirmar contra policiais corruptos, está totalmente por conta
própria e luta por tanto tempo contra o mal, até este ser finalmente
vencido.
Então é o "casamento", ele é o imperador do mundo exterior e por
recompensa recebe sua parte oposta exterior, a "princesa", como esposa.
Com o fim da maioria dos filmes começa a aventura interior, que só é
mostrada nos filmes raras vezes, porque não dá para apresentá-la de modo
espetacular.
É o caminho de volta e de descida para o inferno.
É o momento em que, por exemplo, Musashi (um famoso lutador samurai)
não consegue encontrar mais nenhum competidor.
Ele decide ir para a solidão para aperfeiçoar a arte da espada no seu
interior.
Para que o casamento exterior possa seguir o casamento interior, o herói
precisa buscar o confronto com suas partes femininas interiores.
Como já mencionamos, o caminho de desenvolvimento feminino vai pela
sequência invertida.
Ele começa com a passividade e leva à atividade.
Na figura de um touro, Zeus captura Europa e a leva para outro país,
transpondo o mar.
O feminino, a figura de Europa, se vê arremessada num ambiente novo,
desconhecido.
A missão consiste em tornar esse mundo desconhecido compreensível e
tratável.
Também para o caminho feminino do desenvolvimento humano existem
imagens nos contos de fadas e nos mitos.
Nós tornaremos essas imagens o nosso tema em correlação com a
expiração.

A expiração
No fim do caminho através do mundo exterior, material, é necessário mudar
de estratégia.
A partir daí só progredimos quando nos desapegamos, deixamos acontecer
e permitimos que o mundo siga o seu curso sem tentar influir no que
acontece.
A voz do povo conhece a necessidade do polo feminino: "Dar é melhor do
que receber" — "Falar é prata, calar é ouro" — "O mais inteligente cede".
Somente quando conseguimos atravessar a ponte para o feminino estamos
em condições de salvar tanto o nosso mundo interior como o exterior.
Muitas doenças da civilização se relacionam diretamente com o fato de não
conseguirmos parar de agir.
Para onde olhamos ficamos tentados a controlar os nossos problemas por
meio da ação ativa.
A pessoa superalimentada toma remédios para diminuir as gorduras dos
alimentos e contra seus males do fígado.
Porém, como um organismo pode recuperar a saúde, quando exigimos
demais do trato digestivo sobrecarregado?
Uma saída para o dilema só existe quando compreendemos que menos
também pode ser mais.
Uma cura pelo jejum pode mostrar como as forças de auto cura do corpo
são fortes.
No entanto, elas só entram em ação quando damos calma e distância ao
nosso corpo.
Distância do excesso de comida e de todos os outros suplementos, por mais
bem-intencionados que sejam.
Mas não é somente no microcosmo do nosso corpo, mas também no
macrocosmo que a natureza reage negativamente no nosso programa ativo
de ajuda.
As águas se recuperariam dentro de alguns anos se fosse possível impedir o
abastecimento de tóxicos.
A maioria dos enfartes cardíacos poderia ser evitada se deslocássemos o
nosso estilo de vida mais para o polo feminino.
É surpreendente o número de pessoas que encontram a tão ansiada cura
assim que abandonam os medicamentos não obrigatoriamente necessários
e jejuam por um período mais longo de tempo.
Quando analisamos o nosso estilo de vida, vemos um número enorme de
exemplos da nossa autodestruição, mas também as chances contidas para
um retorno.
A expiração pode ajudar-nos a ter acesso ao mundo feminino e, com isso,
também encontrar a solução para os nossos maiores problemas.
Cada respiração consciente antes de pegarmos no telefone ou subirmos no
carro, pode transformar-se num ritual significativo de desapego, que com o
tempo pode aproximar-nos do nosso lado feminino e, desse modo, do nosso
equilíbrio interior.
Hoje um problema pode ser o fato de os exercícios e rituais
correspondentes ao polo feminino serem muito fáceis e nós, na maioria das
vezes, termos aprendido a lidar com nosso sofrimento somente pelo
caminho das medidas custosas e complicadas.
A expiração começa no auge da inspiração, quando pegamos tudo o que
podíamos pegar.
Para que a energia vital possa fluir temos de superar a nossa exigência de
posse.
Não há nada que devamos fazer para expirar com sucesso.
A caixa torácica está expandida, os músculos respiratórios estão contraídos
e assim que liberamos a tensão, a respiração flui por si só e para fora.
Quanto maior a consciência com que nos entregamos a esse momento do
acontecimento, tanto mais harmoniosa e completamente o nosso pulmão se
esvaziará.
Também podemos expelir ativamente a nossa respiração, mas isso gasta
muito mais energia e diminui a fase de sucesso em que podemos obter
força para a inspiração seguinte.
No âmbito fisiológico é a respiração que livra as células corporais dos seus
detritos.
Somente quando as substâncias usadas saem do nosso organismo, estamos
em condições de captar novas energias.
Tanto no âmbito psíquico como no corporal surgem problemas quando
cortamos o polo feminino.
Se nos apegarmos às energias gastas, bloqueamos a renovação da nossa
energia vital.
Na maioria das vezes não se trata de um impedimento da inspiração, pelo
qual surge a falta de ar dos asmáticos, mas de uma situação de exagero de
flato.
Ele não consegue mais soltar o ar que inspirou e por falta de espaço não
tem condições de captar novo oxigênio.
Inspirar não é o seu problema, mas como não expira mais durante o
acesso, a capacidade intacta da inspiração não lhe serve mais também.
Quando um polo está bloqueado, o outro também se quebra.
Os males psíquicos também surgem devido à retenção do passado e do já
sobrevivido.
Quando o desapego não dá certo, um relacionamento fracassado ou uma
outra vivência de perda torna-se um obstáculo para a continuação do
desenvolvimento.
Por isso, os contos de fadas e os mitos que descrevem o caminho feminino,
começam muitas vezes com uma experiência de perda.
Muitas vezes começam ali onde termina o caminho masculino do herói.
A bola dourada da princesa cai num poço durante o jogo, a Gata Borralheira
perde o sapato, e o conto de fadas da menina sem mãos começa com a
perda das suas mãos.

A menina sem mãos


A filha do moleiro perde as mãos por causa de um pacto do seu pai com o
diabo.
Poderíamos dizer que a feminilidade castiga sua capacidade de ação.
Também hoje o feminino sofre sob a funcionalidade do mundo moderno.
Todos nós pagamos o progresso material e a riqueza exterior com a perda
da vivacidade psíquica; portanto, com o lado feminino da nossa vida.
Eficiência e produtividade funcionam em detrimento do âmbito dos
sentimentos, e assim, simbolicamente analisado, é indiferente se
contemplamos a repressão social concreta das mulheres ou a devastação do
mundo dos sentimentos dos indivíduos.
Em ambos os casos trata-se do mesmo tema, somente o âmbito de
manifestação se diferencia.
O conteúdo simbólico e eterno desse processo é descrito nos contos de
fadas.
O diabo promete ao moleiro um "aumento de rendimento por meio da
otimização do processo de produção" do seu moinho.
Ele lhe oferece uma construção que lhe possibilite moer muito mais grãos
do que mói no momento.
O diabo pede o que está atrás do moinho como compensação pela sua
ajuda.
O moleiro sabe que atrás do moinho só há um pinheiro que está disposto a
sacrificar de boa vontade.
Ambos selam o acordo e o diabo substitui o moinho movido à mão do
moleiro para um moinho movido pela força da água.
Obviamente, aqui o processo da industrialização é tirado dos contos de
fadas e apresentado como obra do diabo que, em última análise torna o
feminino capaz de ação.
A partir desse momento o moleiro tem condição de moer muito mais grãos
do que antes e se transforma num homem rico.
Quando o diabo aparece certo dia e pede o que está atrás do moinho,
ambos vão até lá e, para desespero do moleiro, ele vê ali sua filha única.
O diabo leva as mãos da filha do moleiro com ele, e só então o moleiro se
conscientiza de como o preço pago na realidade é alto.
Sua filha, e com ela o feminino inocente, torna-se incapaz de viver.
Diariamente experimentamos a limitação do nosso mundo dos sentimentos
devido às nossas decisões racionais que visam unicamente a ainda mais
eficiência.
Um pacto como esse também se tornou o teste no Fausto de Goethe; e até
hoje os seres humanos sofrem por causa de pactos igualmente desastrosos.
Todo crédito que fazemos é uma dessas situações de pacto.
Queremos ter agora algo pelo qual iremos pagar depois.
Quanto maior a inconsciência com que fazemos esse negócio, tanto mais
ficamos com a sensação de receber algo de presente.
Quando buscam o seu carro novo muitas pessoas não pensam no preço que
terão de pagar por ele no futuro.
É um preço mais alto, pois há juros para o consumo precoce.
Estamos prontos, portanto, a gastar mais para o prazer imediato do que
esse prazer custaria depois de algum tempo.
Para podermos usufruir esse prazer antecipado, temos depois de trabalhar
mais para ganhar o dinheiro para esse preço maior.
Mas, quando trabalhamos mais, resta menos tempo para o prazer.
Assim, acontece de sempre pagarmos mais por esses pactos, e quem paga
esse preço é o lado feminino da nossa vida.
Um empresário que racionaliza a sua empresa celebra um desses pactos.
Ele demite empregados para que o seu negócio possa trabalhar com mais
eficiência e ele ganhar mais.
Mas ele paga o preço no âmbito social, ele demite mães e pais de família.
Para aumentar o próprio lucro, ele destrói a estrutura social.
Se analisarmos a situação do moleiro no conto de fadas, podemos dizer que
as mãos da sua filha, e com isso a capacidade de ação da sua feminilidade,
vão para o diabo.
Sua compaixão sofrerá, pois para dar força às suas decisões ele terá de
violar sua consciência.
A filha do moleiro passa muito tempo na solidão e no desespero.
Ela se esconde na floresta, e, para poder sobreviver, de vez em quando
rouba um pêssego do jardim do rei.
Ela vive sozinha e recolhida, pois sem as suas mãos ela teme qualquer
contato com as outras pessoas.
Muitas almas modernas vivem uma existência como essa; elas vivem
escondidas e não recebem mais "alimento" do que aquele de que precisam
para sobreviver.
Elas se sentem feias e deformadas.
O lamentável sofrimento do mundo dos sentimentos dos homens modernos
espera por salvação.
A pessoa extrovertida sente os incômodos psíquicos como uma falta de
vergonha.
Há os pesadelos perturbadores que roubam o sono, ou uma explosão
sentimental não controlada que influencia a vida funcional.
Em virtude da sua timidez, o lado feminino ferido precisa de muito tempo e
calma para poder aparecer de modo positivo.
Como a filha do moleiro, ele só se mostra quando isso é necessário para a
sua sobrevivência.
Assim que surge a atividade exterior, ele se afasta assustado.
Quando o rei percebeu a falta dos pêssegos, ele se pôs à espreita e depois
de algum tempo viu aquele ser que vivia na sua floresta.
Ele fica fascinado pela beleza da filha do moleiro.
Mas esta é tão tímida que ele tem de fazer muito esforço para atraí-la.
Primeiro o rei precisa convencer a menina de que ela não é feia e sem
valor.
Ele precisa dedicar-lhe tempo e ajudá-la a descobrir e aceitar outra vez a
própria beleza.
No conto de fadas, o rei faz isso tornando-a sua esposa e mandando
preparar mãos de prata para ela.
Prata é o metal do polo feminino, que reflete a luz.
Para nós, hoje, isso significa abrir um espaço na vida por meio da vontade,
no qual a nossa alma possa se mostrar.
Por exemplo, podem ser meditações incluídas no curso do dia.
A consciência desperta precisa se aquietar para que a própria feminilidade
tímida possa ousar aparecer.
Mas quando as partes suaves se revelam, isso nem de longe significa que
elas vão ficar conosco.
Precisamos oferecer-lhes algo que as retenha, por exemplo, mãos de prata.
As mãos artificiais representam uma ajuda para a feminilidade — portanto,
para o mundo dos sentimentos —, com as quais ela pode realizar algo
concreto no mundo real.
Na verdade, essa ação pode parecer um pouco desajeitada, mas uma ação
desajeitada ainda é melhor do que nenhuma.
Transposta para a nossa vida, uma ação como essa seria, por exemplo,
uma decisão na vida exterior que tomamos devido a um sonho.
As pessoas que confiam na própria intuição e agem de acordo,
plasticamente falando, usam suas mãos de prata.
Isso também vale para aquelas pessoas que organizam o seu tempo,
reservando algum talvez para uma sessão de meditação ou respiração.
Para elas é inusitado deixarem-se levar pelos seus sentimentos, e por isso
sua ação parece igualmente desajeitada, como as da filha do moleiro com
suas mãos de prata.
A manipulação com essas mãos é uma solução de emergência, mas para a
jovem rainha (a alma) trata-se da única oportunidade de participar da vida.
Durante muito tempo ela vive essa vida insatisfatória com as mãos de
prata.
Certo dia, no entanto, seu filho caiu no rio e corre o risco de se afogar.
Até então seu filho era cuidado e alimentado pela criadagem.
Mas, agora, não há ninguém a postos e ela se vê obrigada a agir por si
mesma.
Ela entra na água para salvar o filho, e, no momento em que mergulha as
mãos de prata na água, elas se transformam em mãos de carne e osso.
Agora a filha do moleiro se transforma numa verdadeira rainha.
A partir desse momento ela rege o reino junto com o rei.
Ela tem as mesmas aptidões e as forças do reino podem se desenvolver.
Entre o polo masculino e o polo feminino impera a harmonia e a igualdade
de direitos.
O rei, como representante do polo masculino, descobriu sua feminilidade, e
a filha do moleiro rege com ele o reino, o que significa que ela integrou a
sua parte masculina ativa.
Se transferirmos essa situação para a vida real, o momento em que a filha
do moleiro mergulha suas mãos de prata na água corresponde à "hora da
verdade".
Nesse momento trata-se de salvar o próprio "filho interior" do afogamento.
Muitas vezes essa é a chance da ruptura para a própria determinação da
vida.
O que o mergulho das mãos na água significa para os indivíduos só pode
tornar-se visível no seu padrão interior.
Em todo caso, trata-se de um tema muito central da vida: a fuga de um
confronto com uma figura de pai e/ou de mãe muito poderosa ou de uma
briga com outras figuras de autoridade.
Por exemplo, também pode ser o medo de tornar-se culpado diante da
própria mãe por abandonarmos aquela que nos criou e alimentou, para
vivermos finalmente a própria vida.
Em todo caso só podemos cumprir essa tarefa de libertação na medida em
que aceitamos a ajuda das nossas forças femininas.
Cada um tem de sentir por si mesmo qual é o obstáculo que impede o seu
caminho.
Muitas vezes trata-se de uma decisão ou discussão, que adiamos devido a
razões desconhecidas.
Para abordarmos os nossos maiores temas de vida precisamos, portanto, de
duas energias diferentes: as forças marciais ativas agressivas associadas
com a espontaneidade do Bobo e as qualidades femininas passivas da filha
do moleiro.
Para chegar realmente ao objetivo, temos de esperar pelo momento certo
de lutar ou nos recolher.
Sem dedicação, humildade e o apoio de forças superiores será difícil
progredir no caminho do desenvolvimento psíquico.
Por mais diferentes que ambas as forças possam ser, elas se pertencem, e
cada alento nos mostra sua combinação.
Podemos viver todas essas forças mitológicas, e por isso, simbólicas
fisicamente, a cada inspiração e expiração.
Quando nos damos ao trabalho de analisar as coisas pequenas do cotidiano
na nossa vida com mais exatidão, abre-se para nós o acesso para uma rica
vida interior.
Pela observação consciente mostra-se para nós um mundo cheio de
diversidade e profundeza.
A respiração de cada momento representa aqui uma possibilidade muito boa
de fazermos uma viagem de descoberta.
Não faz sentido colocar um polo acima do outro.
O processo da respiração não começa com a inspiração, pois isso já
pressupõe a expiração anterior.
Mas também não começa com a expiração, que por sua vez pressupõe a
inspiração.
Neste capítulo começamos com a inspiração seguindo um modelo
antiquíssimo, profundamente arraigado na sociedade patriarcal, mas isso
não corresponde à derradeira realidade.
O processo respiratório é como o círculo que não tem começo nem fim.
Escolas espirituais usam a observação consciente da respiração para obter
uma visão do mundo além dos fenômenos exteriores.
Em quase todas as culturas foram e são usados exercícios simples para
isso.
Nós contemplamos a flecha no momento em que ela sai do arco, ou o
movimento do chá na xícara durante a cerimônia do chá.
Deu-se e se dá à respiração um significado especial, e nas doutrinas de
sabedoria e nas tradições espirituais do mundo ela representa um papel
central, pois pode mostrar a todo praticante onde ele está no momento.
Quer se trate de artes marciais orientais ou da contemplação ocidental, o
caminho do desenvolvimento sempre foi e é acompanhado pela respiração.
Nós queremos nos juntar a essa tradição milenar e esperamos possibilitar
ao maior número possível de pessoas o acesso a esses meios de cura total.

Continua

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