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Abrindo Espaços inclusão social e educação para o século XXI

Apresentar o programa da UNESCO "Abrindo Espaços: Educação e Cultura Para a Paz" cujo
objetivo é a inclusão social de jovens pobres da periferia das grandes cidades.

O programa "Abrindo Espaços: Educação e Cultura Para a Paz", uma das políticas sociais e
educativas da UNESCO, foi implantado em 2000, durante as comemorações do Ano
Internacional da Cultura de Paz.

Para que se entenda melhor a relação da UNESCO com os temas que temos debatido até aqui,
cabe dizer que a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura foi criada
em 16 de novembro de 1945, em Londres, sob o impacto da Segunda Guerra Mundial,

a ignorância dos modos de vida uns dos outros tem sido uma causa comum, através da história
da humanidade, de suspeita e desconfiança entre os povos do mundo, causando guerras" e
que "a difusão da cultura, e a educação da humanidade para a justiça, a liberdade e a paz são
indispensáveis para a dignidade do homem e constitui um dever sagrado que todas as nações
devem preencher segundo o espírito de mútua assistência

((UNESCO, 1945:1))

Tendo em vista que as guerras começam pela cabeça dos homens, a UNESCO, em sua
Constituição, afirma que seria nas mentes desses homens que se deveria instituir a defesa da
paz (UNESCO, 1945: 1). Assim, fica claro que o propósito da organização era/é o alcance, por
meio de relações educacionais, científicas e culturais entre os povos do mundo, da paz
internacional e da compreensão mútua. Pretendia-se, portanto, acabar com a arrogância
etnocêntrica.

Em suas políticas, a UNESCO, no Brasil, via Ministério da Educação, objetivando a paz entre os
povos, instituiu em 2004 o programa "Abrindo Espaços: Educação e Cultura Para a Paz", que
tem por finalidade atingir aos jovens das escolas públicas, abrindo as escolas aos finais de
semana e combinando "elementos de inclusão social e educação" (Diskin, 2008).

Pesquisas realizadas pela UNESCO sobre a juventude no Brasil revelaram que os

jovens eram, como ainda são, o grupo que mais se envolve em situações de violência, tanto na
condição de agentes quanto de vítimas. A maior parte desses atos violentos acontece nos fins
de semana, nas periferias, envolvendo, sobretudo, jovens de classes empobrecidas e em
situação de vulnerabilidade.

((Diskin, 2008: 15))

Como se não bastasse, as pesquisas mostram que as escolas dos grandes centros urbanos
compunham o cenário de violência que envolvia os jovens e suas comunidades.

O programa foi pensado a partir desses dados, buscando abrir as escolas aos finais de semana,
de modo a propiciar a toda comunidade atividades de cultura, esporte, arte, lazer e formação
profissional. Seu foco é a superação da violência local e a construção de uma cultura de paz,
instituídas em guetos e gangs urbanas.

O programa se constitui por meio de parcerias com instituições não governamentais e outras
que estão no entorno das escolas por intermédio das estratégias utilizadas em programas
comunitários, conforme documentos,
[...] volta-se ainda para a construção de uma nova escola para o século XXI, caracterizada
muito mais como "escola-função", e não apenas como "escola-endereço", ou seja, uma escola
que, de fato, contribua para o desenvolvimento humano e integral dos seus alunos e da
comunidade.
O programa atua para ajudar a transformar as escolas em espaço de acolhimento e
pertencimento, de trocas e de encontros. O objetivo é que elas sejam capazes de incorporar na
programação oferecida no fim de semana as demandas do segmento jovem, bem como suas
expressões artísticas e culturais, fortalecendo a participação dos estudantes e jovens nas
atividades da escola.
Espera-se, ainda, que a abertura das escolas nos fins de semana contribua para uma reflexão
sobre a "escola da semana", sugerindo novas práticas capazes de interferir positivamente nas
relações entre alunos e professores. É verdade que, quando se sentem acolhidos, os
estudantes desenvolvem uma relação diferenciada com a escola e tornam-se menos
vulneráveis à evasão escolar.

((DISKIN, 2008:14- 15))

Dessa forma, o programa indica que os encontros aos finais de semana permitem não só uma
relação harmoniosa para a construção de atitudes de paz, mas também a revisão da função
social da escola.

Conforme Diskin (2008), entre 2000 e 2006, o programa foi implantado em cinco estados
(Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Bahia e São Paulo), sempre em parceria com
secretarias municipais e estaduais de educação. Aos finais de semana, cerca de 10 mil escolas
eram abertas e atendiam mais de 10 milhões de pessoas.

Cabe destacar que em São Paulo o programa foi implantado em praticamente toda a rede
estadual, atingindo 5.306 escolas de um total de 6 mil. Com o nome de Escola da Família,
contou com 30 mil voluntários e 35 mil universitários atuando diretamente nas escolas.

O programa possui uma coleção de sete publicações que sistematizam a metodologia do


programa "Abrindo Espaços" em todas as suas dimensões – bases conceituais, aplicações
práticas e recomendações, análise de especialistas, custos de implantação.

Há entre estas publicações duas cartilhas para professores, alunos e supervisores cujo
conteúdo ensina a vivenciar na prática a construção da cultura de paz.

A seguir, destacamos os principais encaminhamentos apresentados pelo guia para implantação


do "Abrindo Espaços":

1 – Etapa preliminar, de contatos entre representantes governamentais e da UNESCO.


2 – Estruturação do programa, compondo-se uma equipe de coordenação central com
representantes da Secretaria de Educação e, se for o caso, da UNESCO.
3 – Integração das escolas e das comunidades, quando a coordenação central discute o
programa com as escolas e identifica parceiros.
4 – Constituição de equipes, com a formação de equipes locais, contatos com artistas,
esportistas, professores e educadores para implantação.
5 – Realização de diagnósticos, quando uma equipe de pesquisa e avaliação inicia o
levantamento do universo sociocultural do entorno das escolas, necessidades dos jovens e
recursos e talentos existentes na escola e na comunidade.
6 – Capacitação de profissionais, isto é, professores, jovens, organizações não governamentais
parceiras e animadores (voluntários ou remunerados). A orientação e condução do processo
cabem à UNESCO.
7 – Avaliação que, utilizando métodos quantitativos e qualitativos, oferece informações para
redesenhar dimensões componentes do programa. Ademais, devem ser feitas avaliações de
impacto junto aos jovens, à equipe pedagógica e à comunidade.

((UNESCO, 2008))

Para que funcione, o programa segue normas de organização e de funcionamento


previamente estipuladas, entre elas:

 O foco nos jovens socialmente vulneráveis, concentrando-se com frequência nas


periferias urbanas e metropolitanas. O trabalho é progressivo, com o objetivo de
oferecer mais a quem tem menos, e não regressivo, isto é, oferecer mais a quem tem
mais. Assim, segue o oposto da realização de alguns programas sociais.

 A participação dos jovens e da comunidade, de modo que o programa seja adequado


às suas demandas, utilizando-se, inclusive, processos da democracia direta,
participativa. O grau de padronização é reduzido, a fim de garantir flexibilidade no
tempo e no espaço. Diferencia-se, assim, de programas relativamente uniformes que
só podem ser aplicados de acordo com regras estritas. Parte desta plasticidade se deve
ao planejamento local e à utilização de recursos comunitários.

 A perspectiva de que o aperfeiçoamento deve ser constante, com o redesenho do


programa, segundo pesquisas avaliativas, isto é, seguindo processos científicos.

 O processo de contínua mudança, ajustamento e participação, com a expansão


quantitativa em número cada vez maior de escolas, a partir de um projeto piloto,
progressivamente ampliado.

 A interação entre equipes central, regional (quando é o caso) e locais, de modo a


conciliar, de um lado, a centralização básica, com o objetivo de o programa não perder
as características comuns, e, de outro lado, a descentralização no nível das escolas.

Como se observa, existe coerência interna entre as diretivas do programa, de modo que não
seja mais uma solução que se transfira de um lugar para outro, sem a dinâmica da
transformação. Assinalam-se em particular o planejamento participativo e a mencionada
cientificidade do acompanhamento e avaliações.

Sabe-se que este e outros programas não darão conta de todos os dilemas de nosso tempo.
Não serão capazes de resolver os problemas de discriminação, racismo e xenofobismo, mas
por certo estarão contribuindo e muito para uma cultura de paz que abra espaço para
entendimentos e expressões diversas, em que a compreensão do outro esteja em pauta, ou
ainda, para que possamos fazer nossas as palavras de Boaventura Santos, em entrevista a
Gandin:

Eu penso que hoje o que é fundamental é distinguir entre a ação conformista e a ação rebelde.
Para mim a escola tem que ser uma escola de cidadania, cidadania crítica, a qual,
naturalmente, deve ensinar e instruir – não ensinar, instruir – coletivamente para a rebeldia,
quando ela se justifique, obviamente, e para o conformismo quando o conformismo for a
concordância com idéias que nós criticamente consideramos como sendo progressistas e
nossas e não porque são oficialmente ou porque somos objetos de uma doutrinação. O que é
preciso é retirar da escola todo o princípio de doutrinação e ela existe não só na maneira como
nós ensinamos, como na forma como nós avaliamos. E neste país em que nós nos
encontramos (Estados Unidos), eu penso que a doutrinação é talvez das mais graves e mais
duras que existe em todo o mundo.

()

Referências

DISKIN, Lia; ROIZMAN, Laura Gorresio. Como se Faz? Semeando cultura de paz nas escolas. 4.
ed. Brasília: UNESCO, Associação Palas Athena, Fundação Vale, 2008.108 p.

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