Princı́pio da Contração de Banach e

Teorema de Picard

Eduardo Teixeira de Oliveira

Orientador: Alexandre N. Oliveira Sousa

Departamento de Matemática
Universidade Federal de Santa Catarina

2023

Eduardo Teixeira de Oliveira (UFSC) Ponto fixo de Banach e Teorema de Picard 2023 1 / 19
Introdução

Ao estudarmos Equações Diferenciais Ordinárias (EDO’s) nos interessa a

princı́pio respondermos algumas perguntas, por exemplo: toda EDO tem
solução? Sob quais condições temos a existência e unicidade de soluções?
Para respondermos essas perguntas a nı́vel local, estudaremos o Princı́pio
da Contração de Banach e o Teorema de Picard. O primeiro é uma das
ferramentas mais importantes na matemática e o segundo um importante
resultado para o desenvolvimento da teoria qualitivativa em EDO’s, que por
sua vez é muito importante em aplicações a vida real.

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Introdução

Consideremos a seguinte EDO de primeira ordem:

x ′ = F (t, x), (1)

onde F : U → Rd é contı́nua em um aberto U ⊂ Rd+1 onde d é a di-

mensão da EDO. Veremos neste trabalho que, sob certas condições, para
cada condição inicial do tipo x(t0 ) = x0 , sempre existe uma solução para
essa EDO. Isso será verdade para qualquer ponto (t0 , x0 ) ∈ U.

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Princı́pio da Contração de Banach

Definição
Seja X um espaço métrico e T : X → X uma aplicação. T é dita uma
contração se, e somente se, existe λ < 1 tal que

d(T (x), T (y )) ≤ λd(x, y ), ∀x, y ∈ X .

Teorema do Ponto Fixo de Banach

Seja X um espaço métrico completo e T : X → X uma aplicação.
Se T é uma contração, então existe um único x0 ∈ X tal que T (x0 ) = x0 .
Além disso x0 é um atrator global, isto é, para qualquer x ∈ X , se
definirmos xn = T n x para todo n ∈ Z+ , obtemos que

lim d(T n x, x0 ) = 0.
n

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Demonstração do Teorema do Ponto Fixo de Banach
Seja x ∈ X um ponto arbitrário. Vamos definir a seguinte sequência:
x1 = T (x), x2 = T (x1 ) = T 2 (x), ..., xn = T (xn−1 ) = T n (x)
Mostremos que ela é de Cauchy. Dado n > 1 qualquer e p ∈ N, tome λ
como a taxa de contração de T, assim temos que
d(xn , xn+p ) = d(T n (x), T n+p (x))
n+p−1
X
≤ d(T i (x), T i+1 (x))
i=n
n+p−1
X
≤ λi d(x, T (x))
i=n
= (λn + · · · + λn+p−1 )d(x, T (x))
= λn (1 + λ + · · · + λp−1 )d(x, T (x))
λn
≤ d(x, T (x)).
1−λ
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Demonstração do Teorema do Ponto Fixo de Banach

Note então que quando n −→ ∞, d(xn , xn+p ) −→ 0, ou seja, (T n (x))n é

uma sequência de Cauchy e, por X ser completo, convergente.
Seja x0 = lim T n (x). Mostremos que ele é o ponto fixo de T.

x0 = lim T n (x) = T (lim T n−1 (x)) = T (x0 ).

n n

Por fim, verifiquemos a unicidade: Seja y0 ∈ X tal que y0 = T (y0 ) e

x0 ̸= y0 . Portanto

d(x0 , y0 ) = d(T (x0 ), T (y0 )) ≤ λd(x0 , y0 ) =⇒ 1 ≤ λ,

donde segue que x0 = y0 e a prova está concluı́da.

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Teorema de Picard

Teorema de Picard
Suponha F : U ⊂ Rd+1 → Rd contı́nua e localmente lipschitziana em x.
abt
Então
1 Para todo (t0 , x0 ) ∈ U existem algum intervalo aberto I e alguma
solução γ : I → Rd da equação diferencial, ou seja,

γ ′ (t) = F (t, γ(t)), e γ(t0 ) = x0 .

2 Se γ1 : I1 → Rd e γ2 : I2 → Rd são soluções e existe t0 ∈ I1 ∩ I2 tal

que γ1 (t0 ) = γ2 (t0 ) então γ1 (t) = γ2 (t) para todo t ∈ I1 ∩ I2 .

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Demonstração do Teorema de Picard

Observação
Note que, pelo Teorema Fundamental do Cálculo, γ é solução do PVI se, e
somente se, γ satisfaz
Z t
γ(t) = x0 + F (s, γ(s))ds;
t0

Logo, γ que buscamos é ponto fixo de L, conhecido como Operador de

Picard:
Z t
L(γ)(t) = x0 + F (s, γ(s))ds.
t0

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Demonstração do Teorema de Picard
Seja (t0 , x0 ) ∈ U. Fixe δ > 0 tal que Bδ (t0 ) × Bδ (x0 ) ⊂ U. Seja C = C (δ)
constante de lipschitz de F e M(δ) = sup{∥F (t, x)∥|(t, x) ∈ Bδ (t0 ) ×
Bδ (x0 )}.  
δ 1
Tome ϵ < min δ, , e defina
M(δ) C (δ)

Y = {γ :]t0 − ϵ, t0 + ϵ[→ Bδ (x0 )contı́nuas, γ(t0 ) = x0 }.

Note que Y é espaço métrico completo com a seguinte distância:

d(γ1 , γ2 ) = sup ∥γ1 − γ2 ∥.

t∈]t0 −ϵ,t0 +ϵ[

Vamos definir agora o Operador de Picard:

L:Y →Y
γ 7→ L(γ) :]t0 − ϵ, t0 + ϵ[ → Bδ (x0 )
Rt
aaaaaaaaaaaaa|t 7→ L(γ)(t) = x0 + t0 F (s, γ(s))ds

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Demonstração do Teorema de Picard
Mostremos que L está bem definido
Rt
L(γ)(t0 ) = x0 + t00 F (s, γ(s))ds = x0 ;
L(γ)(t) ∈ Bδ (x0 ), ∀t ∈]t0 − ϵ, t0 + ϵ[: Seja t ∈]t0 − ϵ, t0 + ϵ[

Rt
d(L(γ)(t), x0 ) = sup ∥x0 + t0 F (s, γ(s))ds − x0 ∥
t∈]t0 −ϵ,t0 +ϵ[
Rt
= sup ∥ t0 F (s, γ(s))ds∥
t∈]t0 −ϵ,t0 +ϵ[
Rt
≤ sup t0 ∥F (s, γ(s))∥ds
t∈]t0 −ϵ,t0 +ϵ[
≤ |t − t0 |M(δ)
δ
< ϵM(δ)aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaϵ <
M(δ)
< δ,

Portanto, L está bem definida.

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Demonstração do Teorema de Picard

Mostremos agora que L é contração. Sejam γ1 , γ2 ∈ Y

Rt Rt
d(L(γ1 ), L(γ2 )) = sup ∥x0 + t0 F (s, γ1 (s))ds − x0 − t0 F (s, γ2 (s))ds∥
t∈]t0 −ϵ,t0 +ϵ[
Rt
= sup ∥ t0 [F (s, γ1 (s)) − F (s, γ2 (s))]ds∥
t∈]t0 −ϵ,t0 +ϵ[
Rt
≤ sup t0
∥F (s, γ1 (s)) − F (s, γ2 (s))∥ds
t∈]t0 −ϵ,t0 +ϵ[
≤ sup |t − t0 |C (δ)∥γ1 (t) − γ2 (t)∥
t∈]t0 −ϵ,t0 +ϵ[
≤ ϵC (δ)d(γ1 (t), γ1 (t))

1
∴ L é contração tomando sua taxa de contração λ como ϵC (δ) (pois ϵ < ).
C (δ)

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Demonstração do Teorema de Picard

Por fim, lançando mão do Teorema do Ponto fixo de Banach e da proprie-

dade provada anteriormente, constatamos que existe
γ0 :]t0 − ϵ, t0 + ϵ[→ Bδ (x0 ) tal que γ0 (t) = L(γ0 )(t), ∀t ∈]t0 − ϵ, t0 + ϵ[.
Assim existe solução para a EDO com γ0 (t0 ) = x0 .

Observação
Note que no momento em que conhecemos o valor de δ e a função que
descreve a EDO, consequimos o valor de ϵ, que se mantém constante
dentro de todo compacto no domı́nio U. Esse ϵ é chamado de tempo de
existência de solução, e é constante em todo U. É de interesse de muitos
estudiosos dessa área, determinar qual é o maior tempo de existência
possı́vel para a solução de uma EDO.

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Demonstração do Teorema de Picard

Provemos agora a unicidade da solução:

Sejam γ1 : I1 → Rd e γ2 : I2 → Rd duas soluções quaisquer tais que
γ1 (t0 ) = γ2 (t0 ) para algum t0 ∈ I1 ∩ I2 .
Seja I = {t ∈ I1 ∩ I2 |γ1 (t) = γ2 (t)}. I = ̸ ∅ pois t0 ∈ I, além disso, I é
fechado pela continuidade de γ1 e γ2 . Mostremos que I é aberto.

Seja s0 ∈ I, assim γ1 (s0 ) = y0 = γ2 (s0 ) para algum (s0 , y0 ) ∈ U. Pela prova

anterior aplicada a (s0 , y0 ), encontramos: δ > 0 tal que para ϵ suficiente-
mente pequeno, L : Y (s0 , y0 , δ, ϵ) → Y (s0 , y0 , δ, ϵ) é contração e admite
um único ponto fixo. É claro que γj |]s0 −ϵ,s0 +ϵ[ ∈ Y (s0 , y0 , δ, ϵ), j ∈ {1, 2}.
Temos também, por hipótese que γj′ (t) = F (t, γj (t)), ∀i ∈]s0 − ϵ, s0 + ϵ[.

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Demonstração do Teorema de Picard

Portanto, pelo Teorema Fundamental do Cálculo,

Z t
γj (t) = y0 + F (s, γj (s))ds, ∀t ∈]s0 − ϵ, s0 + ϵ[.
s0

Assim γj |]s0 −ϵ,s0 +ϵ[ é ponto fixo, j ∈ {1, 2}.

Pela unicidade do ponto fixo, γ1 (t) = γ2 (t) ∀t ∈]s0 − ϵ, s0 + ϵ[. Portanto
I é aberto.
Como I1 ∩ I2 é conexo e I é aberto e fechado em I1 ∩ I2 , I = I1 ∩ I2 .
□

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Exemplo EDO sem unicidade de soluções

2
Considere a seguinte EDO: x ′ = F (t, x) = x 3
Podemos verificar que F não é localmente lipshitziana em 0:

 F (x ) − F (x )   x 23 − x 23   1 1
     
3 3
2 1   2 1 x 2 + x1

= 3 3  =  2
   
1 1 2 
x2 − x1

x2 − x13
  3   3
x2 + x23 x13 + x13
 

Essa expressão converge para infinito quando x1 −→ 0 e x2 −→ 0.

Observe que conseguimos encontrar pelo menos duas soluções para a EDO
 3
t
acima no ponto x0 = 0: γ1 (t) = e γ2 (t) = 0.
3

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Exemplo EDO sem unicidade de soluções

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Outras informações sobre a pesquisa

Nessa mesma Iniciação Cientı́fica foram estudados alguns outros temas:

1 Teorema de Peano;
2 Existência de soluções maximais.
Os próximos passos são a Teoria de Atratores e aplicações a Modelos Bioló-
gicos.

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Referências

LIMA, Elon Lages. Espaços Métricos. 6. ed. Rio de Janeiro: Impa,

2020. 308 p;
MORENO, Rebeca Carrasco. Modelos Matemáticos que Describen la
Evolución de Epidemias. 2021. 68 f. TCC (Doutorado) - Curso de
Matemática e Informática, Universidad Politécnica de Madrid,
Madrid, 2021;
VIANA, Marcelo; ESPINAR, Jose M.. Equações Diferenciais: uma
abordagem de sistemas dinâmicos. Rio de Janeiro: IMPA, 2021. 536
p. Disponı́vel em: https://edo.impa.br/. Acesso em: 11 ago. 2023.

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