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XXXXX/2025
I. RELATÓRIO FÁTICO
1
BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO (BNDS). Concessões de aeroportos no brasil:
evolução do modelo e desafios. blog do desenvolvimento. 2019. disponível em:
https://agenciadenoticias.bndes.gov.br/blogdodesenvolvimento/detalhe/Concessoes-de-aeroportos-no
-Brasil-evolucao-do-modelo-e-desafios/.Acesso em: 03 jul. 2023
1.2 O Contrato será regido e interpretado de acordo com as leis da República
Federativa do Brasil.
1.3 A Concessão será regida pelas Leis Federais nº 7.565 de 19 de dezembro de
1986, nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, nº 9.491 de 09 de setembro de 1997, no
11.182 de 27 de setembro de 2005, pelo Decreto Federal nº 7.205, de 10 de junho de
2010, pela Portaria nº 1.443 –A/MD, de 09 de setembro de 2010, sem prejuízo de
outras leis e regulamentos aplicáveis, notadamente os editados pela ANAC e pelo
DECEA2
9. Diante do exposto, este parecer conclui que, não poderia ser aplicado o
Regime Diferenciado de Contratações (RDC) no tocante a Concessão do Aeroporto de
Guarulhos a concessionária Cumbica S.A., uma vez que, segundo as informações contidas no
caso prático, o citado contrato de concessão tem um prazo de 25 (vinte e cinco) anos,
prorrogáveis por igual período, tendo por termo final 2035. Diante disso, esse parecer conclui
que, o contrato de concessão da Cumbica S.A. foi firmado no ano de 2010, logo, a Lei 12.462
de 05 de agosto de 2011 (Regime Diferenciado de Contratações) não poderia ser aplicada, já
que tal texto, sequer existia à época. No que tange a Lei 11.079/2004, que trata das
concessões de Parcerias Público-Privada, embora tal lei já existisse no mundo jurídico em
2010, nenhuma das mencionadas concessões a utilizaram como legislação aplicável, mas sim
a Lei que trata das concessões comuns. Portanto, este parece consolida o entendimento de
que, aplica-se ao contrato de concessão da Cumbica S.A. a Lei 8.987/95, que trata das
concessões comuns e a Lei 7.565 de 19 de dezembro de 1986, que dispõe sobre o Código
Brasileiro de Aeronáutica, assim como foram aplicadas nas demais concessões de aeroportos
aqui mencionados.
2
AGÊNCIA NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL. Contrato de concessão do aeroporto internacional
de São Gonçalo do Almirante. texto compilado até o termo aditivo 007, de 20 de novembro de
2020. Disponível em:
https://www.anac.gov.br/assuntos/paginas-tematicas/concessoes/aeroportos-concedidos/natal/docum
entos-relacionados/01contrato-de-concessao/contrato-de-concessao-no-001-anac-2011-sbsg-ate-o-ta
-007-2020.pdf/view. Acesso em: 05 jul. 2023
10. Dito isso, torna-se necessário evidenciar e analisar os fundamentos que
sustentam a teoria da imprevisão, acerca dos contratos administrativos. Logo, ao direcionar o
olhar para a origem da referida teoria, Maria Sylvia Zanella Di Pietro3, afirma que a teoria da
imprevisão foi instituída na França, pelo Conselho do Estado, órgão de alto escalão na
organização jurídico-administrativa do país; e conforme Diógenes Gasparini4, sua aparição se
deu em decorrência das dificuldades nos cumprimentos de obrigações contratuais no contexto
pós primeira guerra. O mesmo autor afirma que, de acordo com a mencionada teoria,
determinados fatos que podem ser considerados anormais e imprevisíveis "e que tomam o
cumprimento do contrato ruinoso para uma das partes, criam uma situação que não pode
ser suportada unicamente pelo contratante prejudicado e impõem a imediata revisão ".
3
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 ed. São Paulo: Editora Atlas S. A.
2004. p. 268 - 269.
4
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 8 ed. São Paulo: Editora Saraiva. 2003. p. 656.
5
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros
Editores, 2010. p. 652
transporte coletivo de passageiros, requerendo a condenação do ente público ao
pagamento de indenização, com fundamento na necessidade de manutenção do
equilíbrio econômico-financeiro do contrato, em razão da edição de leis municipais
que concederam o benefício de isenção de tarifa a pessoas com deficiência física,
após o início da execução do contrato – A manutenção do equilíbrio
econômico-financeiro do contrato administrativo de concessão do serviço público
tem previsão legal nos artigos 65, inciso II, alínea d, e § 5º, da Lei nº 8.666/93, e no
art. 9º, § 2º, da Lei nº 8.987/95, com fundamento na teoria da imprevisão, na
necessidade de manutenção das bases objetivas do contrato, nos termos da proposta
aceita pela Administração Pública, e na cláusula "rebus sic stantibus" – No caso, a
edição de lei, norma geral e abstrata, concedendo a isenção de tarifa a parte relevante
dos passageiros transportados, configura o denominado "fato do príncipe", assim
definida a atuação extracontratual do Poder concedente, que atinge diretamente a
relação contratual – (...) – Assim, não era exigível da concessionária que esse fator
fosse levado em conta na formulação da proposta – Os reajustes de tarifa concedidos
administrativamente disseram respeito apenas à correção monetária e ao
reajustamento de preços, decorrente do aumento regular do custo dos insumos, sendo
insuficiente para manter o equilíbrio econômico-financeiro original do contrato –
Assim, não houve recomposição ou revisão de preços, a fim de contemplar situações
excepcionais ou extraordinárias, como ocorreu no caso – Danos materiais fixados de
acordo com prova pericial – Correção monetária e juros moratórios de acordo com o
Tema nº 810 do C. STF e a EC nº 113/2021 – Sentença mantida – Recurso e remessa
necessária desprovidos.6
Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas
justificativas, nos seguintes casos:
(...)
II - por acordo das partes:
(...)
d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os
encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da
obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio
econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos
imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou
6
JUS BRASIL. TJ-SP. Apelação: APL XXXXX20188260629SP. Relator: Carlos von Adamek, Data de
Julgamento: 21/11/2022, 2ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 21/11/2022. Disponível em:
https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=recurso+volunt%C3%A1rio+do+munic%C3%ADpio+de+
tiet%C3%AA. Acesso em: 07 Jul. 2023
impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso
fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e
extracontratual.7
16. Tal dispositivo legal, que possibilita a alteração dos contratos administrativos em
busca de seu anterior equilíbrio inicial, seja em caso de fatos ou eventos supervenientes e
imprevisíveis ou até mesmo previsíveis, mas com reflexos incalculáveis, é derivado do próprio texto
constitucional que regula aspectos pertinentes às contratações efetuadas pela Administração Pública.
Logo, o artigo 37 da Carta Magna pátria, especificamente em seu inciso XXI, assegura o devido
processo licitatório, como regra para as contratações da Administração Pública, “com cláusulas que
estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da
lei,”.8
18. De mais a mais, Celso Antônio Bandeira de Mello9, em uma visão conceitual mais
comparativa, alude que a teoria da imprevisão "reapareceu com roupagem nova", referindo-se a
conhecida cláusula rebus sic stantibus. Desta forma, é possível inferir que, para o referido autor do
Direito Administrativo, ambos institutos teriam o mesmo sentido jurídico, com poucas distinções.
7
3 BRASIL, República Federativa do. Lei n° 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37,
inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da
Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União, Seção 1. Brasília, Distrito
Federal. p. 8269. 22 jun 1993. Disponível em:
httpshttps://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm. Acesso em: 27 jun 2023
8
BRASIL. República Federativa do. Constituição 1988. Constituição da República Federativa do
Brasil. Brasília: Senado Federal. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 09 jul. 2023
9
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros
Editores, 2010. p. 652
19. Embora este parecer esteja em consonância com o aspecto público do direito
brasileiro, não poderia ser excluído de apreciação por este instrumento jurídico, os artigos 478, 479 e
480, do Código Civil, que apresentam com precisão o real sentido da teoria da imprevisão, aqui
denominada cláusula rebus sic stantibus e a possibilidade de encerramento do contrato eventualmente
desequilibrado ou o estabelecimento do seu reequilíbrio econômico-financeiro. Os aludidos
dispositivos legais preconizam que:
20. Sobre o exposto acima, é importante evidenciar que, o ordenamento jurídico pátrio
confere uma relevante diferença entre os contratos administrativos regidos pelo Direito Público e
contratos privados regidos pelo Direito Privado. Os primeiros, devem considerar, primordialmente, a
supremacia do interesse público e a finalidade pública a que se destina o determinado contrato
administrativo. Sobre ambos os contratos, Helly Lopes Meireles alude:
21. Nesse sentido, pode-se afirmar que, embora os artigos mencionados do código civil
tragam uma definição jurídica acerca da teoria da imprevisão até mais clara do que as normas de
direito administrativo, há que se protestar a respeito das resoluções (encerramentos) dos contratos que
sofreram desequilíbrio no âmbito dos serviços públicos. Logo, o encerramento de um contrato pode
ser muito mais oneroso para a Administração Pública do que o reequilíbrio do mesmo, gerando
prejuízos para a administração e para os administrados usuários dos serviços públicos. Sabe-se que,
tais decisões de fato estão no contexto da discricionariedade, entretanto, não há espaço para uma
10
BRASIL, República Federativa do. Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o código civil.
Diário Oficial da União. Brasília. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 12 jul. 2023
11
MEIRELES. Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 42ª Ed. São Paulo: Malheiros Editora.
2016. p. 239
discricionariedade cega dentro da gestão pública, devendo o administrador observar as consequências
práticas das decisões ao encerrar um contrato de concessão de um determinado serviço público.
23. Nesse sentido, orientando a atenção para a principal figura deste parecer, sabe-se que
as concessões no Brasil são regidas através de duas leis: 1) a Lei 8987/93; e 2) a Lei 11.079/2011. A
primeira, refere-se às concessões comuns e ‘‘dispõe sobre o regime de concessão e permissão da
prestação de serviços públicos previsto no artigo 175 da Constituição Federal e dá outras
providências’’14; enquanto a segunda destina-se a regular as concessões de parceria público-privada e
‘‘institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da
administração pública’’15. De acordo com o entendimento de Floriano de Azevedo Marques Neto, em
sua obra "Concessões", o ordenamento jurídico brasileiro confere a algumas espécies de serviços
públicos, a aplicação de uma legislação específica no que tange às concessões. Para Marques Neto, tal
instituto seria denominado concessão com regime especial, onde determinados tipos de concessão
estariam submetidos a um regime jurídico especial, na medida que são disciplinadas por leis
12
BRASIL, República Federativa do. Lei n° 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o
regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da
Constituição Federal, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Seção 1. Brasília, Distrito
Federal. p. 1917. 14 fev 1995. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8987cons.htm. Acesso em: 27 jun 2023
13
BRASIL, República Federativa do. Lei n° 11.079, de 30 de dezembro de 2004. Institui normas
gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração
pública. Diário Oficial da União, Seção 1. Brasília, Distrito Federal. p. 6. 31 dez 2004. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l11079.htm. Acesso em: 27 jun 2023.
14
BRASIL. op. cit., p.1917
15
BRASIL. op. cit., p.6
específicas que, em alguns aspectos, discrepam do regime geral de concessões". Em seguida, o
referido autor enfatiza:
24. Uma vez citados os principais dispositivos legais que fundamentam tanto a teoria da
imprevisão quanto a possibilidade de pleito visando o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato
administrativo, cabe a este parecer discorrer a respeito das áleas contratuais. Segundo Cretella17, "álea
é o acontecimento futuro que influi na economia do contrato" e conforme Irene Nohara18 estas podem
ser classificada em (1) áleas ordinárias (desfavoráveis e previsíveis) e (2) áleas extraordinárias
(desfavoráveis e imprevisíveis), sendo que apenas a última poderia ensejar no restabelecimento do
equilíbrio contratual.
25. Já na visão conceitual de Maria Sylvia Zanella Di Pietro19, as áleas podem ser
ordinárias ou administrativas. No que tange às modalidades de áleas administrativas, que ensejarão
em possibilidade de reequilíbrio, a autora enuncia a (1) alteração unilateral; (2) fato do príncipe; e (3)
fato da administração.
16
MARQUES NETO. Floriano de Azevedo. Concessões. São Paulo: Editora Fórum, 2015. p.210-213
17
CRETELLA JUNIOR, José. Dos Atos Administrativos Especiais. Rio de Janeiro: Editora
Forense, 1998. p.27
18
NOHARA, Irene Patrícia. Direito Administrativo. 7° Ed. São Paulo: Editora Atlas, 2017. p.
449-450
19
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 ed. São Paulo: Editora Atlas S. A.
2004. p. 265
20
MEIRELES. Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 42ª Ed. São Paulo: Malheiros Editora.
2016. p. 270
desde que intolerável e impeditiva da execução do ajuste, obriga o Poder Público
contratante a compensar integralmente os prejuízos suportados pela outra parte, a fim
de possibilitar o prosseguimento da execução, e, se esta for impossível, rende ensejo
à rescisão do contrato, com as indenizações cabíveis.
27. Com base nas definições a respeito do fato do príncipe, fica claro que o ato
administrativo que incidirá diretamente no equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão
da Cumbica S.A., foi produzido pelo próprio poder público e que tal ato não foi direcionado ao
contrato em tela, mas refletiu indiretamente no mesmo, podendo gerar prejuízos de grande escala para
a empresa Cumbica S.A.
32. Isso ocorre, por que em determinados casos, a lei abre margem,
propositadamente, para que o gestor público possa tomar decisões provenientes da
governança pública, segundo parâmetros de conveniência e oportunidade, denominado ato
discricionário. Nesse sentido, para Antonio Cecílio Moreira Pires, os atos discricionários, no
que tange a Administração Pública, devem ser efetuados com “liberdade de escolha de seu
conteúdo, de seu destinatário, de sua conveniência, de sua oportunidade e do modo de sua
realização”22
34. Isto posto, ainda no que tange os conceitos pertinentes ao ato administrativo
discricionário, no entendimento de Celso Antônio Bandeira de Mello, tal ato confere:
uma certa esfera de liberdade, perante o quê caber-lhe-á preencher com seu juízo
subjetivo, pessoal, o campo de indeterminação normativa, a fim de satisfazer no
caso concreto a finalidade da lei.24
21
BRASIL. República Federativa do. Constituição 1988. Constituição da República Federativa do
Brasil. Brasília: Senado Federal. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 15 jul. 2023
22
PIRES, Antônio Cecílio Moreira. Direito Administrativo. 2° Edição. São Paulo: Editora Atlas.
2013. p.30-31
23
Ibidem
24
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros
Editores, 2010. p. 437
35. Deste modo, observando sobre um prisma jurídico, o Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Norte, por meio de acórdão, a respeito do ato administrativo
discricionário, exarou:
A competência discricionária não se exerce acima ou além da lei, senão como toda e
qualquer atividade executória, com sujeição a ela. O que a distingue da competência
vinculada é a maior mobilidade que a lei enseja ao executor no exercício, e não na
liberação da lei. Enquanto ao praticar o ato administrativo vinculado a autoridade
está presa à lei em todos os seus elementos (competência, motivo, objeto, finalidade
e forma), no praticar o ato discricionário é livre (dentro de opções que a própria lei
prevê) quanto à escolha dos motivos (oportunidade e conveniência) e do objeto
(conteúdo). Entre praticar o ato ou dele se abster, entre praticá-lo com este ou
aquele conteúdo (p. ex.: advertir apenas, ou proibir), ela é discricionária. Porém, no
que concerne à competência e à forma, o ato discricionário estarão sujeito aos textos
legais como qualquer outro.25
25
PIRES, Antônio Cecílio Moreira. Direito Administrativo. 2° Edição. São Paulo: Editora Atlas.
2013. p.30-31 APUD Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte
26
ALEXANDRE, Ricardo; DEUS, João de. Direito Administrativo Esquematizado. 1° Ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2015 p. 1094
27
BRASIL, República Federativa do. Lei n° 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o
regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da
Constituição Federal, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Seção 1. Brasília, Distrito
Federal. p. 1917. 14 fev 1995. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8987cons.htm. Acesso em: 27 jun 2023
encampação, caducidade, rescisão, anulação ou ainda por falência ou extinção da empresa
concessionária e falecimento ou incapacidade do titular, no caso de empresa individual.
39. Diante disto, a primeira tarefa designada para análise deste tópico é a respeito
de qual seria o tipo de extinção contratual adequado para a concessão da Cumbica SA. Logo,
com exceção do advento do termo contratual , já explanado acima, é possível discorrer sobre
a (1) encampação, que nada mais é do que a extinção do contrato motivado pelo interesse
público, fundamentado em legislação específica somente após o prévio pagamento da
indenização cabível (não há subsunção ao caso concreto em tela a este tipo de extinção); (2)
caducidade, tipo de extinção que tem como característica o inadimplemento de um dever, a
qual o concessionário descumpre com as metas ou termos existentes no contrato (não há
subsunção ao caso concreto em tela a este tipo de extinção); (3) anulação, modo de extinção
da concessão irá incorrer na existência de eventual irregularidade no contrato, mas
especificamente no que diz respeito à legalidade. (não há subsunção ao caso concreto em tela
a este tipo de extinção); (4) extinção da concessão pela falência ou extinção da empresa
concessionária e falecimento ou incapacidade do titular, no caso de empresa individual.(não
há subsunção ao caso concreto em tela a este tipo de extinção); e (5) rescisão, ao contrário do
que ocorre na caducidade, há o encerramento do contrato por iniciativa do concessionário,
que constata o descumprimento, das cláusulas pactuadas, pelo poder público, o que
justificaria tal providência (há subsunção do caso concreto a este tipo de extinção do
contrato).
28
Pietro, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 32° Ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2019. P.
625
40. É com base nesse entendimento de Maria Silva Zanella Di Pietro, que este
parecer vislumbra a possibilidade de indenização pelos investimentos não amortizados.
Entretanto, tal ato que põe fim à relação contratual entre o poder concedente e o
concessionário, é ato extremo, devendo ser recorrido em último caso, uma vez que os
prejuízos podem ocorrer de diversos os lados, tanto para a concessionária, quanto para o
poder concedente. Sobre isso, José Maria Pinheiro Madeira, afirma:
Não obstante, ainda que o sentido da palavra pareça distorcido, toda vez que ocorrer
a extinção da concessão ou permissão, há que ser feito um balanço quanto aos bens
anteriormente adquiridos e os remanescentes, bem como a respectiva prestação de
contas, a fim de se apurar se há algum valor a ser indenizado ao particular em
relação aos bens discriminados no edital como remanescentes, ao passo que estes
passam para a posse do Poder Concedente.29
41. Diante de todo o exposto, este parecer vislumbra ser possível a rescisão
contratual por parte da Cumbica S.A, por via judicial, pleiteando assim a indenização pelos
investimentos não amortizados, não permitindo assim que a Administração Pública enriqueça
sem causa. Entretanto, o presente parecer adverte que a legislação brasileira põe-se omissa a
respeito da indenização quando se trata de rescisão por parte da concessionária,
diferentemente do que ocorre na extinção do contrato por advento do termo contratual,
caducidade e encampação, afirma José Maria Pinheiro. Ou seja, tal omissão poderia ser
desfavorável ao pleito indenizatório da Cumbica S.A.
42. A partir deste ponto, o presente parecer analisará a legalidade no que tange a
desapropriação de determinadas áreas lindeiras no Município de Campinas, visando a
construção e manutenção de um centro de convenções e rede hoteleira como possibilidade de
exploração de receitas acessórias no contrato de concessão, ora discutido.
44. Logo, cumpre a este parecer, antes mesmo de opinar no tocante a legalidade da
desapropriação acima mencionada, esclarecer determinados pontos no que tange a correta
conceituação e entendimento do instituto da desapropriação.
47. Por conseguinte, resta claro que o caso prático aqui discutido, evidencia um
latente conflito de interesses públicos e sociais, protagonizados pelo Estado de São Paulo e o
Município de Campinas, a respeito da desapropriação aqui analisada.
30
MEIRELLES, Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 35ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
p. 608
31
HADARA, Kiyoshi. Desapropriação: Doutrina e Prática.9° Ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 16
32
BRASIL. República Federativa do. Constituição 1988. Constituição da República Federativa do
Brasil. Diário Oficial da União, Brasília. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 08 jul. 2023
48. Isto ocorre em razão de duas expectativas de desapropriação: a primeira, que
tem por interessado o Município de Campinas, pode ser percebida através do banco de dados
da Secretaria Municipal de Habitação de Campinas, uma vez que os terrenos da localidade
em tela, já estão cadastrados para futura desapropriação e construção de moradias populares,
configurando assim, uma possível desapropriação por interesse social, conforme previsto no
artigo 2, da Lei 4132/1392 e artigo 182 da Constituição Federal de 1988; já quanto à segunda
expectativa de desapropriação, vem a ser encabeçada pelo Estado de São Paulo e visa a
desapropriação para exploração de receita acessória, configurando, por sua vez, necessidade
pública, conforme previsto no artigo 3 do Decreto-Lei n° 3.365/1941.
49. Como se não bastasse o aludido conflito, o mesmo terreno lindeiro que está
cadastrado na Secretaria Municipal de Habitação de Campinas, também encontra-se inserido
como zona especial de regulamentação de interesse público (ZEIS), tanto nos moldes do
Plano Diretor Municipal, quanto nos termos da Lei Federal n° 13.456/2017. Destarte, a
fundamentação jurídica referente a ZEIS, além das supracitadas legislações, também pode ser
encontrada no Estatuto da Cidade, especificamente no artigo 4°, inciso V, alínea f, que
pontua: “Art. 4° Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos: (...) V –
institutos jurídicos e políticos: (...) f) instituição de zonas especiais de interesse social.33” A
esse respeito, José Matrodi, Suzana Silveira e Renan Rossi, argumentam:
33
BRASIL, República Federativa do. Lei 10.257/01. Estatuto da Cidade, Brasília. Diário Oficial da
União. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm. Acesso em: 13
jul. 2023
34
MASTRODI, Josué; SILVEIRA, Susana Maria Loureiro; ROSSI, Renan. A inefetividade da
desapropriação e das ZES na redução do déficit habitacional urbano. Rev. Dir, Cid. Rio de
Janeiro. Vol. 1, 2022. p.2479-2506
50. Diante do exposto, percebe-se que a ZEIS pode ser considerada como um
instrumento que visa permitir a regularização fundiária em imóveis definidos como ociosos,
tentado proteger, desta forma, o direito social à moradia, introduzido na Constituição pátria
em 2000, através da Emenda Constitucional 26. Segundo Ligia Melo, em sua obra A política
urbana e o acesso à moradia por meio da regulamentação fundiária, “todos devem ter acesso,
individualmente ou em grupo, podendo ser encarados sob a forma de prestações positivas
proporcionadas pelo Estado, direta ou indiretamente.”35
51. Ainda no que tange a ZEIS, é válido dar destaque a abertura que tais zonas
destinariam a regulamentação fundiária, haja vista sua importância, já que esta, possui
previsão constitucional, sendo consolidada como um dos objetivos da política urbana em
1988, afinal, os espaços urbanos da cidade devem ter sua regulamentação voltada ao
atendimento à promoção da função social destinada a propriedade.
35
CASIMIRO, Lígia Maria Silva Melo de. A política urbana e o acesso à moradia adequada por
meio da regularização fundiária. 2010. 288 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010.
36
CAMPINAS. Lei Complementar n° 189 de 8 de janeiro de 2018. Dispõe sobre o plano diretor
estratégico do município de Campinas. Diário Oficial, 2018. Disponível em:
https://leismunicipais.com.br/plano-diretor-campinas-sp. Acesso em: 10 jul. 2023
aludido Plano Diretor, foram instituídas “como Zonas Especiais de Regularização de
Interesse Social - ZEIS-R.”37, reservando para tal uma segurança jurídica que não pode ser
rompida por um mero ato administrativo.
54. Diante de todo o exposto, o presente parecer opina pela ilegalidade das
desapropriações de áreas lindeiras pelo Estado de São Paulo e a PPP para a construção de um
centro de convenções e rede hoteleira, com previsão editalícia, uma vez que as delimitações
das áreas foram consignadas através de Lei estadual, visando o interesse social e pautada
pelas promoções dos direitos de moradia e propriedade. Há que se pensar no peso do
interesse público na construção do centro de convenções e rede hoteleira, entretanto, tais atos
administrativos mitigariam a segurança jurídica relacionada à moradia popular, consolidada
pelo Plano Diretor do Município de Campinas.
56. A priori, destaca-se que, a futura concessão aqui analisada, será precedida de
obra pública, conforme previsão no artigo 2°, inciso III, da Lei 8987/1995 e terá como
modalidade licitatória, a menor tarifa; já no tocante à forma de compensação ao
concessionário pelos investimentos, consta no edital, unicamente, a receita tarifária. Logo,
reside aqui duas intrigantes inconsistências editalícias com relevante pertinência:
58. b) Quanto à compensação pecuniária instituída pelo presente edital, resta claro
que não há qualquer menção de transferência pecuniária nas formas estabelecidas pela Lei
11.079/200439, art. 6°, da Secretaria de Transportes Metropolitanos do Governo do Estado de
São Paulo à concessionária, então vencedora do certame licitatória, sendo apenas possível a
compensação através das receitas tarifárias. Ou seja, de acordo com a supracitada lei das
PPPs, especificamente em seu artigo 2°, parágrafo 3°, "não constitui parceria público-privada
(...) quando não envolver contraprestação pecuniária do parceiro público ao privado". Diante
do exposto, encontra-se aqui a latente possibilidade do aludido edital não se enquadrar nos
requisitos necessários para construir parceria público-privada, mas sim concessão comum.
60. A futura impugnação viria a ter embasamento tanto no artigo 164, da Lei
14.133, que afirma que "qualquer pessoa é parte legítima para impugnar edital de licitação
por irregularidade na aplicação desta lei"41, quanto no artigo 41 da Lei 8666/93 que consigna
39
BRASIL, República Federativa do. Lei n° 11.079, de 30 de dezembro de 2004. Institui normas
gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração
pública. Diário Oficial da União, Seção 1. Brasília, Distrito Federal. p. 6. 31 dez 2004. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l11079.htm. Acesso em: 27 jun 2023.
40
Ibidem
41
BRASIL, República Federativa do. Lei n° 14.133, de 01 de abril de 2021. Lei de Licitações e
Contratos Administrativos. Diário Oficial da União, Seção 1. Brasília, Distrito Federal. p. 8269. 01
abr. 2021. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14133.htm.
Acesso em: 01 jun 2023.
a mesma possibilidade. Também é possível ter por embasamento jurídico o próprio direito
constitucional de petição, previsto no art 5, XXXIV, da CF/88, que afirma: XXXIV - são a
todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: ‘‘o direito de petição aos
Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder’’42.
42
BRASIL. República Federativa do. Constituição de 1988. Constituição da República Federativa
do Brasil. Brasília. Diário Oficial da União. Disponível em: 09 jun. 2023
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