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HISTÓRIA DO CRISTIANISMO I

AULA 6: A REFORMA PROTESTANTE:


A TEOLOGIA REFORMADA E A REFORMA ANABATISTA

APRESENTAÇÃO
Nesta aula você compreenderá a teologia reforma ou teologia protestante, que consiste nas
principais doutrinas dos reformadores, a partir de dois teólogos de destaque. Você também
conhecerá um grupo conhecido como Anabatistas, surgido no mesmo período da Reforma
Protestante, porém com uma agenda de reforma mais radical.

OBJETIVOS
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:
• Compreender as principais doutrinas dos reformadores, classificados como magisteriais;
• Conhecer outra classe de reformadores, denominados radicais e considerados
protestantes do protestantismo.

META
Apresentar os a biografia e teologia de Ulrico Zwínglio e João Calvino e o movimento da reforma
anabatista.

1 A TEOLOGIA REFORMADA
HISTÓRIA DO CRISTIANISMO I 2

1.1 ULRICO ZWÍNGLIO

Zwínglio (1484-1531) fez parte da primeira geração de reformadores na Europa. Ele


nasceu na cidade Suíça de Glarus, de modo que sua família tinha um bom padrão de vida, o
que contribuiu para que Zwínglio tivesse uma boa educação. Estudou na Universidade de Viena
e na Universidade de Basiléia, sendo que nessa última recebera os títulos de Bacharel em artes
e mestrado em teologia.
Entre os anos de 1506 e 1516 Zwínglio trabalhou numa paróquia na cidade de Glarus,
ao passo que se interessou pelos escritos de Erasmo, com quem se encontrou em 1516.
Zwínglio também se tornou um humanista bíblico, ou seja, uma volta às fontes originais das
Escrituras. Pela influência de Erasmo, Zwínglio também acreditava na supremacia das
Escrituras em relação à hierarquia da Igreja.
Em 1519 ele assumiu o pastorado da principal igreja da cidade suíça de Zurique. Nesse
mesmo ano houve a chamada peste bubônica e, a atuação humanitária de Zwínglio ao auxílio
dos pobres e doentes nas ruas de Zurique, durante a peste, tornou-o muito popular. Durante o
período em que foi pastor em Zurique, Zwínglio contribuiu na implementação de mudanças na
igreja e também no poder público. Por exemplo, missas foram substituídas por cultos
protestantes; práticas católicas como quaresma foram abolidas. Em pouco tempo, as ideias
reformadoras não ficaram apenas em Zurique, mas se espalharam por outras regiões da Suíça
como as cidades de Berna e Basiléia.
Em 1530, toda essa região era protestante. Práticas católicas tradicionais como adoração
de imagens, veneração à Maria, oração pelos mortos, venda de indulgências foram proibidas
na Igreja. As igrejas protestantes na Alemanha preservaram muitos símbolos do catolicismo, o
que levou Lutero a chamar Zwínglio de fanático e, os católicos diziam que os seguidores de
Zwínglio eram rebeldes.
Em 1531 as divergências entre os ministros de Zwínglio e os católicos saíram do campo
das discussões teológicas e, se transformou num conflito armado. Várias pessoas morreram
inclusive, o próprio Zwínglio em nesse mesmo ano. Assim como Lutero, Zwínglio também
destacava a superioridade das Escrituras em relação à tradição. Zwínglio foi um humanista
cristão, ele acreditava que era necessário ler o texto bíblico em sua fonte original, a fim de ter
uma melhor compreensão das Escrituras.

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Uma diferença entre Lutero e Zwínglio dizia respeito à autoridade de todos os livros da
Bíblia. Como já estudamos, Lutero acreditava que livros como a Epístola de Tiago e Apocalipse
não eram livros apostólicos, assim era preciso reconhecer o “cânon dentro cânon”. Mas para
Zwínglio todos os livros da Bíblia são a Palavra de Deus, de modo que não existam partes da
Bíblia que sejam secundárias. Apesar disso, ambos os reformadores enfatizavam a
necessidade da iluminação do Espírito Santo na mente do leitor a fim de dar clareza a respeito
do texto lido.
Zwínglio também abordou assuntos como a providência e a predestinação, de modo que
Deus é soberano e tem o controle de todas as coisas. De acordo com Zwínglio todos os eventos
que ocorrem no mundo, desde os mais complexos até os mais simples são pré-ordenados por
Deus. Nós como criaturas, temos que aceitar até mesmo as contradições da vida e aceitá-las
como fazendo parte de um plano maior de Deus. A partir dessa concepção de que Deus é
soberano e controla toda a história humana que Zwínglio aborda o ensino a respeito da
predestinação.
De acordo com o reformador a predestinação o livre arbítrio estão relacionados com a
providência – a providência é a crença de que Deus controla e orienta todo o universo. Portanto,
Deus não apenas sabe todas as coisas, mas ele também faz todas as coisas. Os eventos não
são meros acasos, mas fazem parte do plano divino. Essa capacidade de saber e fazer tudo
são uma das características da natureza de Deus. Quando Deus criou a humanidade e os anjos
ele já sabia antecipadamente a respeito da queda deles. Quando Adão pecou e até mesmo
quando Satanás caiu, esses eventos não foram contra a vontade de Deus, pois faziam parte
dos projetos eternos dele.
Logo, se Deus sabe e faz todas as coisas, a salvação é o resultado da eleição divina e
não do esforço humano, de acordo com a concepção de Zwínglio. Assim como Deus
predestinou as pessoas para salvação, ele também teria predeterminado os condenados para
o inferno. Aquelas pessoas que reivindicam a eleição, mas em certo momento da vida
abandonam a fé cristã, esses nunca foram eleitos de fato. Aqueles que vivem no mal estão
rejeitados por Deus, mas pode ser que entre esses há pessoas que são predestinadas, ao
passo que a eleição pode se manifestar a qualquer momento. Portanto, não há como perder a
salvação, pois todos os eleitos já foram predestinados.

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Quanto às pessoas que viveram na Antiguidade e também aqueles que nunca ouviram
falar do evangelho, Zwínglio acreditava que alguns deles podem estar entre os eleitos, tendo
em vista que Deus os julgará de maneira diferente. Portanto, o reformador foi um defensor da
doutrina da predestinação. Em alguns momentos Zwínglio quis destacar tanta soberania de
Deus que alguns o chamaram de herético. Como Deus pode ser responsável por todas as
coisas, inclusive as ruins? Zwínglio então disse que Deus não é o culpado ou responsável pelo
pecado, mas ele pode tirar algo de bom do mal, a fim de executar seus propósitos eternos.
Zwínglio e Lutero tiveram outra divergência, desta vez relacionada à eucaristia. Lutero
achava a doutrina católica da transubstanciação um absurdo teológico. Embora Lutero
discordasse da doutrina da transubstanciação, ele acreditava que Cristo está presente nos
elementos da ceia, ou seja, no pão e no vinho. Posteriormente, historiadores da igreja deram o
nome de consubstanciação à essa doutrina luterana. No entanto, para Zwínglio, a ceia é um
memorial que aponta para a morte de Cristo. A fim de resolver esse conflito teológico.
Entre os dois reformadores, o príncipe Filipe de Hesse, realizou um encontro entre eles,
na cidade alemã de Marburg em 1529. Esse encontro ficou conhecido como Colóquio de
Marburg. Na discussão foi citado as palavras de Jesus no momento da ceia com seus discípulos
conforme registrado em Mateus 26. 26: “Enquanto comiam, tomou Jesus um pão e,
abençoando-o, o partiu, e o deu aos discípulos, dizendo: Tomai, comei; isto é o meu corpo”.
Lutero interpretou a última parte desse versículo “isto é o meu” literalmente, logo Jesus
estaria presente nos elementos da ceia. Todavia, para Zwínglio “isto é meu corpo” é uma
metáfora que simboliza um evento passado, ou seja, a morte de Cristo. No final do debate
ambos negaram a doutrina da transubstanciação, mas não chegaram a um consenso a respeito
da presença de Cristo nos elementos da ceia.
Zwínglio também falou a respeito do batismo, que assim como a ceia, ele também era
símbolo da nova aliança. Assim como a circuncisão era uma forma de rito de iniciação do
israelita, o batismo também um ato simbólico de incorporação como um membro do corpo de
Cristo. Para o reformador o batismo não tem uma função regeneradora, de modo que o batismo
é um testemunho público de um indivíduo regenerado pelo Espírito Santo.
Em momento algum Zwínglio menospreza o batismo, mas apenas enfatiza que esse ato
é um símbolo de algo mais profundo que aconteceu na interioridade humana. Zwínglio procurou
explicar sua posição conforme suas palavras abaixo:

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Assim o batismo é administrado na presença da igreja àquele que, antes de


recebê-lo, confessou a religião de Cristo ou tem a palavra da promessa, pela
qual se sabe que pertence à igreja. É por isso que, quando batizamos um adulto,
perguntamos se ele crê. E apenas se ele responder “sim” é que recebe o batismo.
A fé, portanto, não é concebida pelo batismo...Pelo batismo, a igreja recebe
publicamente quem já tinha sido recebido mediante a graça. Portanto, o batismo
não transmite graça, mas a igreja confirma que a graça foi outorgada à pessoa
que recebeu o batismo (OLSON apud ZWINGLIO, 2001, p. 415, 416).

Portanto, Zwínglio rejeita a ideia de que o batismo purifica o pecado do indivíduo, por se
tratar apenas de um ato simbólico.

1.2 JOÃO CALVINO

João Calvino nasceu em Noyon, perto de Paris em 1509. Estudou na Universidade de


Paris e depois se transferiu para a Universidade de Orléans, onde se formou em Direito.
Acredita-se que sua conversão ao protestantismo aconteceu entre 1533 e 1534. Ainda jovem
se associou a movimentos da Reforma em Paris. Pode-se dizer que Calvino fez parte da
segunda geração de reformadores, de modo que tiveram uma preocupação em sistematizá-la
a teologia da Reforma, a fim de se ter uma ideia clara a respeito da crença do movimento
protestante. Era preciso elaborar uma teologia sistemática baseada nas Escrituras e que fosse
capaz de se defender da crítica da igreja católica.
No ano de 1536, Calvino publicou uma obra intitulada Institutas da Religião Cristã, a qual
continha um total de seis capítulos. Pelos próximos vinte e cinco anos ele continuou a escrever,
de modo que em 1559 as Institutas da Religião Cristã era uma obra com oitenta capítulos
divididos em quatro capítulos.
No primeiro livro Calvino faz um tratado a respeito de Deus com um enfoque em seu
poder criador e em sua soberania sobre toda a criação. O segundo trata a respeito da
necessidade da redenção humana e, como ela foi executada através do sacrifício de Cristo. No
terceiro livro, Calvino discorre a respeito da maneira como a redenção é apropriada pelo homem
e, o último livro ela fala da igreja e como essa se relaciona com a sociedade.
Quando se fala em João Calvino, talvez a primeira palavra que vem a nossa mente é
predestinação. Entretanto, esse não é um assunto central da teologia calvinista. A preocupação

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desse reformador é ser o mais bíblico possível e apresentar de maneira clara a teologia
evangélica.
Em 1536, Calvino estava decidiu viajar para a cidade de Estrasburgo, onde se dedicaria
a uma vida de estudos. Todavia, o caminho de sua cidade Noyon para Estrasburgo estava
interditado, ao passo que foi preciso mudar a rota e passar pela cidade de Genebra, na Suíça.
Quando os protestantes daquela cidade ficaram sabendo que Calvino estava na cidade,
rogaram-lhe que ficasse na cidade e os ajudassem na Reforma. Por um momento, Calvino
relutou, tendo em vista que seu projeto pessoal consistia em apenas estudar e escrever; ele
não queria se envolver com questões eclesiásticas da Reforma. Um dos líderes do movimento
da Reforma em Genebra chamado Guilherme Farel foi um dos responsáveis a fazer com que
Calvino mudasse de ideia. O próprio João Calvino relatou esse momento:

Depois de saber que eu queria de todo coração, dedicar-me aos estudos


particulares, motivo pelo qual pretendia me manter livre de outras atividades e,
vendo que suas súplicas não dariam em nada, [Farel] começou a proferir a
imprecação de que Deus amaldiçoaria a reclusão e a tranquilidade de meus
estudos, se eu me retirasse e me recusasse a ajudar quando a necessidade era
tão urgente. Fiquei aterrorizado com essa imprecação, que desisti da viagem que
havia empreendido (OLSON apud CALVINO, 2001, p. 419).

Se Calvino tinha a intenção de ter uma vida tranquila, apenas dedicada aos estudos,
depois daquele encontro com Farel sua vida tomou outra direção. Ele passou o resto de sua
vida em Genebra e se tornou um dos mais influentes reformadores do protestantismo. Ele
morreu em 1564.
Nas Institutas Calvino aponta dois tipos de conhecimento: o conhecimento de Deus e o
conhecimento de nós mesmos. O verdadeiro conhecimento de nós mesmos acontece quando
reconhecemos nossas misérias o que nos move a buscar o conhecimento de Deus que é nossa
única suficiência. O reformador diz que em todos os homens existe uma semente da religião
plantada no coração, que é a capacidade da humanidade pensar em Deus.
No entanto, não basta apenas saber que Deus existe, mas deve-se procurar conhecer
qual o papel que cada pessoa tem que ocupar no projeto global de Deus.
De acordo com Calvino a humanidade está escravizada pelo pecado, razão pela qual é
impossível conhecer a Deus apenas por métodos naturais e, além disso, há uma distância entre
a criatura e o Criador. Por isso, é preciso que conheçamos a Deus mediante a revelação,

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principalmente por meio das Escrituras. Assim como os demais reformadores, Calvino destacou
a supremacia das Escrituras, as quais são a Palavra de Deus, na qual a autoridade da igreja
está fundamentada.
Assim como Zwínglio, Calvino também falou a respeito da soberania e providência divina.
Tudo o que acontece no universo está debaixo do governo de Deus. Todos os eventos, desde
os mais simples até os mais complexos acontecem de acordo com a vontade do Criador. Deus
usa até mesmo o mal cometido pelos homens para cumprir sua vontade. Até mesmo os homens
maus estão fazendo a vontade oculta de Deus. Apesar de Calvino ter falado a respeito da
predestinação, essa não é o centro de sua teologia. A doutrina da predestinação de Calvino
está relacionada com a justificação pela fé, nada muito diferente daquilo que foi ensinado pelos
demais reformadores.
No que se refere à doutrina a respeito da queda de Adão, Calvino ensina que a
humanidade se encontra em um estado de depravação, em decorrência do pecado. Sendo
assim, tanto a razão e vontade humana foram corrompidas pelo pecado, de modo que o homem
não possuiu condições, por si só, de buscar e conhecer a Deus.
Um dos principais assuntos abordados na teologia de Calvino diz respeito à igreja. Para
o reformador as marcas de uma igreja verdadeira é a pregação da Palavra de Deus. Além disso,
ele fez a distinção entre a igreja visível e a igreja invisível. A visível é a comunidade de cristãos,
enquanto a invisível é constituída dos eleitos, os quais são conhecidos apenas por Deus. Assim
como Agostinho, Calvino acreditava que a igreja visível é constituída dos eleitos e dos ímpios
e, apenas Deus no fim dos tempos vai fazer a separação entre o “trigo e o joio”. Quanto a igreja
Calvino disse que:

Onde quer que vejamos a Palavra de Deus sendo pregada puramente e ouvida
e os seus sacramentos sendo ministrados segundo a instituição de Cristo, não
se pode duvidar de maneira nenhuma que existe uma igreja de Deus[...]Se o
ministério tem a Palavra e a honra, se tem a ministração dos sacramentos,
merece, sem dúvida alguma, ser julgado e considerado igreja[...]Quando
dizemos que o ministério puro da Palavra e o modo puro de celebrar os
sacramentos são o penhor e a garantia suficientes pelos quais podemos
reconhecer uma igreja em qualquer sociedade, queremos dizer que no lugar em
que essas duas marcas existem, a igreja não deve ser rejeitada, ainda que essas
duas marcas existem, a igreja não deve ser rejeitada, ainda que repleta de falhas
em outros aspectos. Não estou sendo conivente com o erro, por mais
insignificante que seja, nem desejo incentivá-lo. No entanto, estou dizendo que
não devemos desertar uma igreja em função de um desacordo secundário caso

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está preserve a sã doutrina no tocante à piedade e o uso dos sacramentos


instituídos pelo Senhor (MCGRATH apud CALVINO, 2007, p. 226).

Observe que Calvino da ênfase a necessidade da igreja em pregar a Palavra de Deus e


ensinar doutrinas baseadas nos apóstolos e no Novo Testamento. Pode-se afirmar que Calvino
foi o grande sistematizador da doutrina protestante, ao passo que recomendamos a consulta
das Institutas, as quais contém a obra completa do pensamento do reformador.

2 A REFORMA ANABATISTA

2.1 A REFORMA RADICAL

Os reformadores do século XVI estão subdivididos em duas classes: reformadores


magisteriais e reformadores radicais. Na primeira classe de reformadores se enquadram Lutero,
Zwínglio, Calvino e os seus seguidores; já os reformadores radicais são representados pelos
anabatistas. A expressão “radical” tem o sentido de voltar às raízes, voltar às origens. Anabatista
significa literalmente “aquele que rebatiza”. Ao que tudo indica, os anabatistas surgiram nas
proximidades de Zurique, como resultado da reforma na Suíça, no início da década de 1520.
Eles estavam insatisfeitos com os rumos da Reforma, podendo também ser chamados de
protestantes do protestantismo.
Portanto, os anabatistas consideravam a Reforma Protestante incompleta ou equivocada
em alguns aspectos. Estas são algumas características dos anabatistas:
1 – Desconfiança em relação às autoridades do Estado;
2 – Rejeição do batismo de crianças, de modo que apenas os adultos deveriam ser batizados;
3 – Distribuição igualitária das propriedades;
4 – Ênfase no pacifismo e na não violência.
Os anabatistas acreditavam que a Reforma Protestante deveria restaurar não apenas a
teologia, mas também deveria levar os cristãos a viverem de forma íntegra; conforme os
princípios do evangelho. Outro detalhe é que pregavam a separação entre igreja e Estado. Os
ministros da igreja deveriam ser escolhidos e sustentados pela própria igreja e não pelo Estado.
O poder público tem um papel de extrema relevância na sociedade, a fim de garantir o bem-
estar da população.

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Consequentemente, cabe ao Estado tratar das questões seculares e a igreja das


questões espirituais. A igreja reformada na Suíça tinha estreitas relações com o Estado, pois
ser cristão em Genebra significava ser também um cidadão da cidade. Para os anabatistas, ser
cristão é uma convicção individual e não algo que deveria ser imposto, por isso, eles
enfatizavam a mudança de vida.

O começo da fé está no ouvir da Palavra. Mas a partir daí, deve seguir-se a


conversão, pela qual nos afastamos do pecado e vontade própria e nos
rendemos a Deus. Na conversão, por meio do sangue de Cristo, todos os
pecados são lavados e o convertido entra numa vida nova e santa. Isso não
significa que sejamos livres do pecado, mas que agora temos o poder de resisti-
lo. Se, por outro lado, nós reivindicamos nossa conversão e nos falta este poder,
nossa fé não é verdadeira. Tal pessoa é um hipócrita e deve ser excluída da
comunhão dos crentes. Isso, e a vida de perdição que a acompanha, deve ser a
mais temida do que a morte nas mãos dos perseguidores. Esta última, ao invés
de ser temida, deveria ser bem-vinda, pois é um sinal de que nos encontramos
na tradição dos profetas, apóstolos e cristãos primitivos (GONZALES, 2004, p.
93).

A igreja reformada em Genebra batizava crianças, o que foi rejeitado pelos anabatistas,
por acreditarem que uma criança não possui capacidade mental suficiente para decidir a
respeito de Cristo. Segundo eles, era necessário haver uma verdadeira regeneração produzida
pelo Espírito Santo. No início do movimento, eles se autodenominavam “irmãos” e, só
posteriormente foram chamados de anabatistas, de modo que se espalharam por toda a
Europa.
O dia 25 de janeiro de 1525 é considerado um dia marcante na história do movimento
anabatista. Jorge Blaurock, um exsacerdote católico e que havia se convertido ao
protestantismo, reuniu-se com seguidores radicais de Zwínglio. Eles discutiram, argumentando
que o Novo Testamento requeria dos cristãos muito mais daquilo que Zwínglio ensinava.
Era preciso restaurar o cristianismo primitivo. A igreja precisava viver de acordo com os
ensinos apostólicos. Fazia parte também desse grupo Félix Manz e Conrad Grebel, os quais
haviam sido discípulos de Zwínglio. Depois de um período de oração e estudos da Bíblia, esse
grupo decide realizar um batismo mútuo. No entanto, rebatizar as pessoas era considerado uma
heresia pela igreja protestante; mas os anabatistas acreditavam que o batismo devia ser
realizado apenas quando a pessoa tivesse convicção de que fora regenerada pelo Espírito
Santo. Por isso acreditavam que o batismo infantil não era válido, pois a criança não tem

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condições de se arrepender de seus pecados. Batismo é um símbolo da conversão, logo deveria


ser realizado apenas em adultos.
Quando Zwínglio ficou sabendo que os “irmãos” estavam rebatizando as pessoas,
ordenou que parassem com aquela prática, caso contrário, seriam punidos. O movimento
cresceu de modo que vários anabatistas saíram pela Europa com o objetivo de pregar a
necessidade de um arrependimento genuíno antes do batismo; tanto protestantes como
católicos foram rebatizados. A tônica da mensagem desses pregadores era de que havia
necessidade de um compromisso com Deus para que o indivíduo passasse pelas águas
batismais.
No início, Zwínglio procurou persuadir os anabatistas a pararem com o movimento, o que
não adiantou, de modo que Zwínglio e as demais autoridades promulgaram leis contra os
anabatistas. Por fim, as autoridades passaram a caçar e prender os anabatistas, de modo que
um de seus líderes, Félix Manz, foi preso e julgado; sua sentença foi: morte por afogamento. A
partir desse momento, todos os que fossem batizados ou se deixassem ser rebatizados eram
presos e, na maioria das vezes, condenados à morte por afogamento, apesar de haver muitas
mortes também por enforcamento e em fogueiras. A morte por afogamento era chamada, tanto
por católicos como por protestantes de terceiro batismo. Apesar da morte de centenas de
pessoas, o movimento anabatista cresceu e se espalhou, pois muitos fugindo da perseguição
migraram para outras regiões da Europa, e disseminaram suas doutrinas.
Além de hereges, os anabatistas também eram considerados rebeldes que poderiam tirar
a ordem da igreja e do estado. Um incidente, envolvendo um grupo de anabatistas na Alemanha,
contribuiu para alimentar a ideia de que eram desordeiros. Tudo aconteceu quando esse
pequeno grupo, constituído de pessoas que não possuíam terras e prestígio social invadiram
propriedades eclesiásticas e as dividiram entre os camponeses. Eles almejavam melhor
distribuição de renda e criticavam a riqueza do clero; Lutero foi contra essas ações radicais.
Os camponeses eram liderados por Thomas Munzer, porta-voz dos anabatistas e um dos
seguidores radicais de Lutero. Porém, Munzer rompeu com o reformador alemão e estabeleceu
sua própria doutrina, que pregava o fim da propriedade privada. Seus adeptos, principalmente
camponeses e aprendizes das cidades, revoltaram-se contra a nobreza, os sacerdotes e os
cidadãos mais ricos.

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Na Alemanha Central, o movimento tornou-se tipicamente revolucionário, com os


camponeses exigindo a abolição da servidão e a posse comunitária da terra. Lutero mais uma
vez manifestou-se contrário ao movimento popular. Tropas militares financiadas pela nobreza
reprimiram brutalmente o movimento camponês. O saldo da rebelião foi a morte de muitas
pessoas, entre as quais Thomas Munzer, morrendo decapitado. No entanto, essa não era a
conduta da maioria dos anabatistas, ao passo que eles não gostavam de se envolver em
conflitos e guerras, como se atesta através do texto abaixo:

A espada não deve ser desembainhada para defender a fé. Ao contrário, a


comunidade dos crentes deve estar pronta para ser uma comunidade sofredora;
de fato ela será uma comunidade sofredora, pois o mundo não entende os seus
caminhos, mas os despreza. Mas cristãos não devem causar a queda de maus
governos, nem devem se defender deles de qualquer maneira, exceto estando
prontos para suportar a perseguição. Nem mesmo contra um inimigo estrangeiro,
nem contra os turcos, os verdadeiros crentes podem se armar (GONZALES,
2004, p. 92).

Diante do exposto, os anabatistas eram contra a violência e foram rotulados de rebeldes


em razão de uma minoria ter ideias mais radicais. Na primeira geração de anabatistas, não
tivemos teólogo algum que elaborasse um corpo de doutrinas de maneira mais organizada e
abrangente.

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ATIVIDADES

Consolidando o conhecimento adquirido, vamos praticar:


Relate as principais pautas do movimento anabatista e aponte as semelhanças e diferenças
para a Reforma Protestante:

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta aula você pôde conhecer as contribuições de Ulrico Zwínglio e João Calvino, dois
teólogos referenciais da teologia reformada, além de compreender as pautas do movimento
anabatista ou reforma radical, cujos precursores acreditavam faltar algo na Reforma Protestante
e eram considerados desordeiros e sem um direcionamento teológico para sintetizar seus
pensamentos doutrinários.

REFERÊNCIAS

OLSON, Roger. História da teologia cristã. São Paulo: Vida, 2001.

MCGRATH, Alister E. Teologia histórica: uma introdução ao pensamento cristão. São


Paulo: Cultura Cristã, 2007

GONZÁLEZ, Justo L. Uma história do pensamento cristão: do início até o concílio de


calcedônia. São Paulo: Cultura Cristã, 2004

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