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POSCÊNIOS DA REFORMA PROTESTANTE NO SÉCULO XVI.

Júlio César de Souza Bernardo1

RESUMO

Este trabalho é resultado de uma reflexão sobre a Reforma Protestante em


suas diversas interpretações. Ele apresenta a Reforma Protestante do século XVI
como fruto da vontade Divina que se processou através dos tempos, desde os
supostos primeiros reformadores, como por exemplo, Pedro de Bruys e Henrique de
Lausanne, João Wycliff até Martinho Lutero, não negando as influências do contexto,
mas atribuindo seu desdobrar a transcendência e imanência de Deus na realidade
humana, separando-se do viés de muitos historiadores que atribuem à Reforma
Protestante a uma confluência das causas políticas, econômicas e sociais afirmando
a inexatidão da pesquisa quando se olha sob o prisma exclusivamente religioso,
mesmo sabendo que este pensamento ainda ocupasse o primeiro lugar entre os
europeus do século XVI.

Palavra-chave: Reforma protestante, século XVI, Vontade Divina.

1
Graduado em história pela UGB, Pós-graduado em Docência do Ensino Superior e Profissional e Graduando
em Teologia pelo FAECAD.
2
ABSTRACT

This work, facing the reality of the current century, shows the concept of the term
DIAKONIA as well as your application in a given social context and features some
challenges that are part of the reality. From that point, discusses some current
challenges and compares them with other historically found at some point, at some
time and place. The way were overcome or not, its challenges. Also clarifies that the
Christian need to face any challenge and make him understand that he works as a
"moderator" in the exercise of Diakonia, as well as finding ways to ensure that the
result is as close as possible to the ideal waited for the ecclesial community (Church)
that it represents.

Keyword: Diakonia, Christian, church community

3
POSCÊNIOS DA REFORMA PROTESTANTE NO SÉCULO XVI.

Júlio César de Souza Bernardo

INTRODUÇÃO

No insigne momento em que a Reforma Protestante completa seus


quinhentos anos, nos remete a rememorar a busca das origens da Igreja do tempo
apostólico. É possível perceber as benesses na vida dos cristãos proveniente desta
reforma religiosa que alterou os arquétipos da fé e o que se podia chamar de
conhecimento de Deus. Um texto bíblico é o pilar sustentador onde toda Reforma
2
Protestante se apoia é que “O justo vive da fé” (Romanos 1,17) viver da fé foi a
pedra principal do alicerce da Reforma Protestante no século XVI.
Ao ler este texto bíblico, Martinho Lutero ficou convicto de que a justificação
não se processa pelas penitências, boas obras e sim pela fé. O que aconteceu de
tão extraordinário na Reforma Protestante foi a ruptura que causou na sociedade
cristã medieval tardia e a forma como os de fé reformados passaram a expressarem
sua religiosidade, o resgate do conceito Igreja onde se distingue de: sociedade que
vivia em regime de cristandade e Igreja. A Reforma não buscou implantar uma nova
instituição religiosa e sim um retorno para as práticas da Igreja a os modus operandi
apostólicos.
Sob o viés de que este processo inicia-se bem antes, e que Deus é o agente
promotor do mesmo, utilizando-se do que lhe é próprio, sua imanência e
transcendência, a Reforma Protestante ganha outro aspecto tão importante, quanto
ao processo histórico proveniente de condições políticas, econômicas daquela
época ou uma revolta desencadeada por Lutero contra os abusos da igreja Católica,
algo que não se pode negar, mas não poderia orientar ou determinar o rumo que a
Reforma seguiria, Deus havia preparado um momento específico, na história para
que de uma vez por todas a liberdade em Cristo fosse uma realidade para Igreja.

2
Soares, Padre Matos. Bíblia Sagrada Traduzida da Vulgata e Anotada: São Paulo: 9ªEd, Edições Paulinas,
1955, p. 1355.
4
1. SOBRE A ECLESIOLOGIA.

1.1 CONCEITUAÇÃO DE IGREJA.

A reforma trouxe um novo significado para o termo Igreja, diferente do


entendimento medieval, não era mais uma sociedade que vivia sob a égide de uma
3
instituição e que possuía regras cristãs e sim, como disse Dreher sobre Lutero, a
Igreja é o santo povo de Deus no mundo e que a Escritura Sagrada é a fonte de
alimentação e de fortalecimento para a mesma. O autor afirma também que segundo
Lutero “a Palavra está para Igreja tanto quanto a Igreja está para a Palavra, ambas
não subsistem uma sem a outra”. Assim, entende-se por Igreja um grupo de
pessoas que vivem sob a orientação das Sagradas Escrituras e nelas tem toda a
sua conduta pautada. Vê-se ainda, segundo Dreher, que:

“Igreja se reconhece ali onde o Evangelho é pregado, onde os sacramentos


do Batismo e da Eucaristia são administrados conforme a instituição de
Jesus, onde o perdão dos pecados é anunciado e vivido, onde são
vocacionados e ordenados servidores eclesiásticos e onde a oração e meio
de santificação da santa cruz estão presentes: tentação e perseguição” 4.

A crítica de Lutero, de acordo com Dreher 5, baseia-se no que as Escrituras


apresentam sobre os sacramentos e a prática dos mesmos que segundo ele, só se
admitia dois: a Eucaristia (Ceia do Senhor) e o batismo. Ainda de acordo com
Dreher, para o reformador, a Igreja era identificada pela prática dos sacramentos
que se define como o que foi expressamente instituído por Cristo, conferindo-lhe
promessa, com a qual deve ser despertada a Fé. Compunha esta comunidade
especial todos os crentes, não fazendo distinção entre leigos e sacerdotes, todos
são iguais e seu ministério é de serviço e não de poder.
Assim, de acordo com Norman Geisler6, “o termo ekklesia significava para os
tempos apostólicos uma assembleia de crentes, especificamente seguidores de
3
Dreher, Martin Noberto. História do povo luterano: São Leopoldo: Sinodal, 2005, p 40.
4
Dreher, 2005, p 40.
5
Dreher, 2005, p 40.
6
Geisler, Norman. Teologia Sistemática volume 2. Rio de Janeiro: CPAD. 2010, p. 505.
5
Jesus”. A palavra Igreja com a inicial maiúscula usada neste trabalho se refere à
Igreja segundo o modelo dos tempos apostólicos, ... uma assembleia de crentes
unidos ao corpo espiritual de Cristo pelo Espírito Santo”. bem como a palavra igreja
em minúsculo referente ao termo a instituição Católica.
Segundo Norman Geisler7, Lutero afirma que: Onde Cristo não é pregado,
não há o Espírito Santo que cria, convoca e reúne a igreja cristã, sem a qual
ninguém pode vir a Cristo, o Senhor. É importante lembrar que, conforme Norman
Geisler8, o Novo Testamento e os primeiros cristãos não utilizavam o termo Igreja
relacionados a edifício dos quais não possuíam e sim no sentido espiritual
abrangente do qual todos os crentes em Jesus faziam parte.
Embora haja muitas linhas de entendimentos referentes a origem da Igreja,
parece haver uma concordância de que sua origem está associada a descida do
Espírito Santo no dia de Pentecostes, como define John Davis 9 (cinquenta dias após
a Páscoa) e seu caráter universal se descortina na admissão da família gentílica
(não judeus) do Centurião Cornélio por meio da ministração do Batismo
(sacramento) e o recebimento do dom do Espírito Santo de falar em outras línguas
como definido em (Atos dos Apóstolos 11.15)10.
Também é distinguida por Nichols11 que “... Jesus deixou clara a necessidade
de haver uma sociedade constituída de seus seguidores, a fim de oferecer ao
mundo o Evangelho e ministrar, em espírito, os ensinamentos que lhes dera”. Assim,
fica clara a intensão de que a Igreja difere dentro de uma dada sociedade onde Ela
está inserida, com uma Missão específica à ser cumprida.
Entende-se também que, a Igreja tem como base a eternidade de Deus e nele
está enraizada e por Ele subsiste uma vez que está determinada desde a fundação
do mundo conforme exarado em: (Efésios 1.4) “assim como Ele mesmo nos
escolheu antes da criação do mundo, por amor para sermos santos e imaculados
diante Dele” 12.

1.2 A IGREJA NO INÍCIO DA IDADE MÉDIA.


7
Geisler, 2010, p. 523.
8
Geisler, 2010, p. 505.
9
Davis, John D. Dicionário da Bíblia. São Paulo: Hagnos. 2002, p. 225.
10
Soares, 1955, p. 1328.
11
Nichols, Robert Hastings. História da Igreja. 12ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p 29.
12
Soares, 1955, p. 1407.
6
A Igreja Cristã do início da Idade Média possuía em seu seio, muitas pessoas
não convertidas a Cristo; eram cristãos pagãos. Tinha como causa principal a
adesão do Imperador que transformou o Cristianismo de seita odiada a Estatal e
com esta atitude fez o Cristianismo a religião da moda, não só imperador como todo
seu estafe faziam parte sem, contudo abandonarem suas verdadeiras crenças, por
força de decreto obrigou-se os súditos a professarem a religião de forma rígida
originada em uma política de apoio ao uso da força para obrigatoriedade da filiação
a igreja como afirma Roberto Hastings Nichols:

“Desse modo, surgiu a política imperial do uso do poder para reprimir a


idolatria e forçar o povo a se filiar á igreja. Mas uma vez, os métodos
missionários medievais resultaram na entrada para a igreja de multidões de
germanos e de outros povos que nunca tinham experimentado a conversão
cristã. O mal se agravou quando certos governos e conquistadores
obrigaram o seus povos a aceitar o Cristianismo”13.

Dessa forma, o esforço contra o paganismo aumentou dentro e fora da Igreja,


o cristianismo aparentemente quase foi vencido pelo paganismo onde as tradições
sociais passam em quase sua totalidade ser orientada pela cultura pagã. A vida da
Igreja passou maus bocados por muitos de seus líderes chafurdarem na lama da
imoralidade, muitos criminosos esconderam-se nas alas hierárquicas da igreja de
onde cometiam as maiores atrocidades vendendo seus bispados a quem pagasse
mais. Não é de se espantar que o número de sacerdotes escandalosos superasse
os de vida honesta.

1.2.1 O CAOS SE INSTALA NO SEIO DA IGREJA INSTITUIÇÃO.

A Igreja é sempre santa, imaculada onde os verdadeiros crentes permanecem


na orientação das Escrituras, um momento de invisibilidade da verdadeira Igreja

13
Nichols, 2004, p 83.
7
onde se ofuscou o brilho de Cristo pela prática do pecado antes condenado pela
Escritura Sagrada, nasceu uma instituição religiosa desviada dos preceitos bíblicos e
preocupada com seus interesses políticos e econômicos e a vontade de se
estabelecer como fonte de poder em todos os sentidos para o mundo de então. A
igreja altamente influenciada pela cultura pagã.
Ainda pode-se observar, segundo Nichols14 que “Outro motivo de aviltamento
da igreja papal foi o ensino de uma forma adulterada de Cristianismo. Essa igreja
permitiu que o Evangelho fosse substituído por uma religião de ritos sacramentais
que outorgavam uma salvação mágica; eram feitas orações ao espírito bondoso da
Virgem e dos santos; fora infundido um medo injustificado dos maus espíritos; havia
relíquias milagrosas; vestimentas aparatosas; maldições e absolvições eram
proferidas pelos sacerdotes”.
Nota-se assim que “Com objetivo de apresentar a comunidade messiânica a
si mesmo como noiva da qual se orgulha, sem mancha, ruga ou qualquer coisa
semelhante, mas santa e sem defeito... Há uma verdade profunda oculta aqui; o que
15
digo concerne ao Messias e a comunidade messiânica... (Efésios 5.27 e 32)” os
preceitos da Escritura Sagrada revelam que Messias devota pela sua Igreja grande
amor e por ela trabalha a fim de que não se contamine e perca a sua posição de
eleição dada por Deus.
Dessa forma, ao analisar tal situação percebe-se a degradação da religião
concernente a igreja papal e o total abandono do povo por seus líderes que
raramente se recordavam de suas responsabilidades, pouquíssimas vezes
inspecionavam suas paróquias e os bispos que se davam por satisfeitos com o ritual
em latim, uma língua já não dominada pelo povo e muito escassamente se pregava.
A crença do povo era de medo, pensavam que o mundo era cheio de demônios que
queriam destruir as almas, para se livrarem apelavam à intercessão dos santos, tais
práticas sufocavam a vida da Igreja de Cristo, como disse Roberto Hastings
Nichols16:

“O paganismo invadiu a igreja e se tornou infeccioso. Ao fim do século X,


numa grande parte da Europa Ocidental, praticamente todo o povo
pertencia a igreja e tinha título de cristão. Algo já iniciado no século IV por

14
Nichols, 2004, p 141.
15
Stern, David H. Bíblia Judaica Completa. 1ª ed. São Paulo: Editora Vida, 2011, p 1449.
16
Nichols, 2004, p 141.
8
Teodósio, como processo de cristianização do império, que acabou por
encher a igreja de pagãos”17

Assim, em meio este contexto percebe-se que o cuidado do Messias se


desponta em personagens que são despertados a ter uma vida mais próxima a
realidade da Escritura Sagrada. Como disse Roberto Hastings Nichols 18 que “Logo
no início do século XII, surgiram vários movimentos de oposição contra a atitude e o
estado da igreja por parte de homens que conheciam o grande mal nela existente e
que abandonaram seu culto e sua comunhão”. Jesus Cristo cabeça da Igreja
mostrou seu poder, prova disso aparece na Igreja do Ocidente um reavivamento.
Com isso, não se permite pensar que todo este desfile trágico no seio de uma
instituição onde estava inserida a Igreja passasse despercebido aos olhos de
crentes fiéis e à “cabeça de toda Igreja” (Efésios 1.22-23) 19
, dois destes
expectadores insatisfeito aparecem na França, dando início a um importante
movimento liderado por Pedro de Bruys e Henrique de Lausanne, estes contradiziam
a igreja papal em relação as superstições, a imoralidade do clero e algumas forma
de culto, originando-se o movimento Petrobrussiano, como disse Nichols Robert 20 e a
este aderiram muitas pessoas de todas as camadas.

1.2.2 OS MOVIMENTOS DE PROTESTO NA IGREJA PAPAL.

Os Cataristas marcados por características bem distintas se organizaram


como igreja rival, sua crença baseava-se em uma mistura de Cristianismo e outras
crenças orientais. “... acreditavam que a matéria fora criada por Satanás e que ela
era a sede e fonte de todo mal. Daí não poderem crer que o Filho de Deus tivesse
tido um corpo e uma vida humana...” como afirma Robert Nichols 21
. O Autor diz
também que suas crenças eram muito distantes do cristianismo, isto era prova do

17
Croce, José Elias. 500 anos da Reforma Protestante, Rio de Janeiro: Betel, 2017, p. 17.
18
Nichols, 2004, p 142.
19
Soares, 1955, p.1408.
20
Nichols, 2004, p 142.
21
Nichols, 2004, p. 142.
9
abandono ao ensino das Sagradas Escrituras e a origem de muitas heresias na
igreja papal.
Dessa forma, se espalharam pela Itália, França, Espanha, Países Baixos e
Alemanha em todas estas partes foram perseguidos e exterminados por Inocêncio
III. Citados por Robert Nichols “perseguidos pela Inquisição, que fora organizada
principalmente por causa deles” 22, uma terrível guerra de extermínio que durou vinte
anos... ”. As ordens dos Franciscanos e Dominicanos se formaram depois dos
Catarista dando prova que dentro da igreja papal era negligenciado pela liderança a
pregação e o ensino segundo verbera o texto sagrado “Meu povo é destruído por
falta de conhecimento Oseas 4.6” 23.

1.2.3 OS VALDENSES.

Não se pode negar a importância deste movimento liderado por Pedro Valdo,
um negociante de Lião, que foi movido pelo ensino do capítulo dez do Evangelho de
Mateus, distribuindo dinheiro aos pobres desse modo juntou um grande número de
seguidores, tão logo a igreja papal tomou ciência, trataram de excomunga-lo.
Espalharam por toda Europa Ocidental se organizaram como igreja à parte, embora
perseguidos pela Inquisição eram ativos no ensino e na distribuição de manuscritos
da Escritura Sagrada em língua popular segundo Robert Nichols24 e que:

“Muito semelhante aos Valdenses eram os dissidentes que a si chamavam


de “irmãos”. Essas pessoas tinham uma fé cristã muito simples e eram
conhecidas onde viviam por suas vidas cheias de bondade e pureza
incomuns 25”.

Ainda de acordo com Robert Nichols26 estes dois movimentos nada tinham
em comum com a igreja papal ou seu clero, realizavam seus cultos na língua comum

22
Nichols, 2004, p. 142/143.
23
Stern, 2011, p. 746.
24
Nichols, 2004, p. 143.
25
Nichols, 2004, p. 143.
26
Nichols, 2004, p. 143.
10
do povo, desprezavam as pomposas missas, prezavam pelo ensino e apreciavam a
leitura da Bíblia, possuíam muitas cópias de manuscritos de traduções da Bíblia ou
parte dela. Os valdenses e os irmãos correspondiam-se um com outro, e alguns
trabalho era realizados em conjunto, mantinha o trabalho missionário ativo, porém
em segredo por motivo de perseguições. Eram numerosos entre os camponeses e
também entre operários urbanos principalmente na Alemanha.

3. PRINCIPIA-SE A REFORMA.

Deus sempre tem suas estratégias, enquanto o contexto histórico fervilha sob
os protestos contra os abusos da igreja percebe-se o agir de Deus através de
exponenciais como João Wycliff que Segundo Nichols27 entre séculos XIV e XV
surgiram revoltas que a igreja papal não pode reprimir. Wycliff nascido entre os anos
de 1320 a 1330, era famoso e estava entre os mais cultos da universidade Oxford,
também era padre em Lutterworth caiu nas graças das classes pobres da Inglaterra.
Sua primeira investida contra o papado foi sobre o direito de cobrar impostos da
Inglaterra.
A ruptura entre o Estado Inglês e o papado muito contribuiu para difusão das
ideias de Wycliff, ele apelou ao povo inglês por meio de muitos escritos em
linguagem popular, atacou a igreja papal e declarou a Bíblia ser a única e verdadeira
regra de fé e prática. Criou a Ordem dos sacerdotes pobres “os irmãos Lollardos”
que foram uma força considerável na propagação da religião evangélica embora
muito perseguidos. Sendo um homem consideravelmente de posição importante, as
autoridades eclesiásticas nada fizeram contra ele além de classificá-lo com herege.
Sobre isso, diz Croce:

“As Sagradas Escrituras são de propriedade do povo e uma possessão que


ninguém pode arrancar do povo. Cristo e seus apóstolos converteram o
mundo para fazer conhecidas as escrituras, e eu oro de todo coração que

27
Nichols, 2004, p. 146.

11
por obedecermos ao que está contido neste livro, possamos provar a vida
eterna”28.

Assim, as ideias de Wycliff dá início a um avivamento, segundo Croce 29 era a


de que a Bíblia deveria ser colocada à disposição do povo no vernáculo e que a
diferença entre clero e os leigos baseado em ordenação, eram contrários as
Escrituras, o ministro tinha como principal função pregar e não deveria ocupar
cargos públicos e era contrário ao celibato, pois segundo ele, isto era abominação e
o seu produto era imoralidade, aberrações sexuais, abortos e infanticídios, entre
outros posicionamentos como cita Knight:

“O evangelho de Jesus Cristo é a única origem da verdadeira religião; que


não há nada no Evangelho que mostre que Cristo estabeleceu a missa; que
o pão e vinho; ainda depois de consagrados, ficam sendo pão e vinho; que
os que entram para os mosteiros ainda se tornam mais incapazes de
observar as ordens de Deus; e, finalmente, que a penitência, a confissão, a
extrema unção, não são precisas, nem se fundam nas Escrituras Sagradas”
30
.

3.1 O EVANGELHO NA BOEMIA.

Enquanto os Lollardos eram perseguidos na Inglaterra, Deus promoveu um


avivamento que despontava em outro lugar influenciado pelos escritos de Wycliff,
estes produziram entre os Boêmios sentimentos antipapais e uma nova revolta
maior se fez, e um novo líder surge chamado João Huss tinha forte apego
nacionalista, homem respeitado, culto e grande influência na Universidade de Praga,
grande pregador porta voz nacional dos anseios políticos e religiosos do seu povo.
Convicto das reivindicações apresentadas pelas Escrituras cativou o povo por
eloquência.
Conforme atesta Croce31 “João Huss não temia esbravejar contra os
desmandos da igreja Católica nem contra a idolatria que, de Roma aos mais
28
Croce, José Elias. 500 anos da Reforma Protestante, Rio de Janeiro: Betel, 2017, p. 26.
29
Croce, 2017, p. 27.
30
Knight, A.E. História do cristianismo. 2ª ed. – Rio de Janeiro: CPAD, 1983, p. 186.
31
Croce, José Elias. 500 anos da Reforma Protestante, Rio de Janeiro: Betel, 2017, p. 26.
12
escondidos recantos da Europa, vinha afastando o povo de Deus da salvação em
Cristo Jesus”. Intimado a ir perante o Concílio de Constança onde foi condenado a
fogueira e no momento de sua morte proferiu uma profecia citada por Boyer: “Podem
matar o ganso( na sua língua, “huss” é ganso), mas daqui a cem anos, Deus
suscitará um cisne que não poderão queimar”.32 Aproximadamente um século depois
Deus levanta a Martinho Lutero, ( o cisne da profecia de Huss) e não houve
possibilidade de lhe calar.

3.2 O EVANGELHO EM FLORENÇA – ITÁLIA.

Boyer33 registra que o povo de Florença concorria a famosa Catedral “Duomo”


cujo espaço não era suficiente para comportar a multidão que afluía para ouvir as
pregações feitas por Jerônimo Savonarola (1452-1498) e que por meio delas o
avivamento tomou conta da cidade. Os temas abordados eram sobre iminência do
julgamento divino, repreendia os vícios, o crime e a corrupção da igreja papal,
tocados pela pregação e, segundo o autor, “O povo abandonou a leitura das
publicações torpes e mundanas, para ler os sermões do ardente pregador” 34. O povo
abandonou os cânticos das ruas para cantar hinos a Deus.

“Em Florença, as crianças fizeram procissões, coletando as máscaras


carnavalescas, livros obscenos e todos os objetos supérfluos que
serviam à vaidade. Com isso formaram em praça publica uma
pirâmide de vinte metros de altura e atearam-lhe fogo”. 35

Segundo Boyer 36: se o contexto histórico e as condições políticas fosse as


mesmas que depois veio a ser na Alemanha no tempo de Lutero, poderia ser ele o
instrumento usado por Deus para iniciar a Grande Reforma, porém Deus tem seus

32
Boyer, Orlando. Heróis da fé: vinte homens extraordinários que incendiaram o Mundo. Rio de Janeiro:
CPAD, 1985, p. 21.
33
Boyer, Orlando. Heróis da fé: vinte homens extraordinários que incendiaram o Mundo. Rio de Janeiro:
CPAD, 1985, p. 15.
34
Boyer, Orlando. Heróis da fé: vinte homens extraordinários que incendiaram o Mundo. Rio de Janeiro:
CPAD, 1985, p. 15.
35
Boyer, 1985, p. 15.
36
Boyer, 1985, p. 15.
13
planos e nada se faz fora de sua vontade. “O coração do homem dispõe o seu
caminho; mas ao Senhor pertence dirigir seus passos (Provérbios 16.9)” 37. Havia um
momento escolhido por Deus para trazer a tona todos os seus desígnios, assim
como havia vaticinado João Huss em seu martírio sobre uma voz que seria
impossível calar.
A. Knight afirma que Huss ficou preso em Constância, acusado de heresia,
levado a uma masmorra úmida e suja, com pouca comida sob a intenção de minar
as forças e assim atentarem contra a sua vida, a tal intenção deu certo e reformador
ficou doente. Em julho de 1415 ficou fraco e muito doente, foi lhe negado o direito a
um advogado, creditava-se a ele duas acusações: “... crer nas doutrinas de Wycliff, e
a segunda de estar infectado com a lepra dos valdenses” 38. Condenado a morte na
fogueira proferiu as seguintes palavras; “Senhor Jesus, eu sofro humildemente esta
morte cruel por amor de ti, e rogo-te que perdoes aos meus inimigos” 39.

4. REFORMA PROTESTANTE, O LIMIAR DO MUNDO MODERNO.

Junto à aurora de um novo tempo, também chegavam tempos de martírio de


homens e mulheres que foram classificados como “hereges”, Afirma A.Knight que:
“Guilherme Sautree teve a honra de ser a primeira vítima desta nova lei” 40, a ele
seguiu-se João Badby... cujo martírio foi presenciado pelo jovem príncipe de Gales –
depois Henrique V... quando acenderam o fogo, ele pedira misericórdia, e Henrique
ordenara que fosse tirado das chamas... o príncipe perguntou-lhe: Queres
abandonar a heresia e conformar-te com a fé da santa madre igreja?... Mas João
Badby tinha estado a pedir misericórdia a Deus e não dos homens... Foi, em
consequência, levado segunda vez para chamas “41.
Dessa forma, obtém-se a noção de que Deus faz cumprir sua vontade em
meio o contexto histórico, a Reforma Protestante está próxima a eclodir e o
instrumento usado para este avivamento foi as Sagradas Escrituras que de certa

37
Soares, 1955, p. 705.
38
Knight, A.E. História do cristianismo. 2ª ed. – Rio de Janeiro: CPAD, 1983, p. 193.
39
Knight, 1983, p. 196.
40
Knight, 1983, p. 186.
41
Knight, 1983, p. 186.
14
forma foi popularizada e o conhecimento produziria a libertação como disse Jesus:
42
“Vocês conhecerão a verdade e a verdade os libertará. (São João 8.32) ”. Embora
não se pode negar a relação entre Renascença e Reforma o que é comum a elas é
o individualismo, mas cada uma segue sua direção própria e oposta.
Definindo assim, segundo Burns, sobre a Renascença e a Reforma:

“Em muitos sentidos, a Renascença e a Reforma tiveram íntima


relação entre si. Ambas foram produtos da poderosa corrente de
individualismo que ganhou ímpeto nos século XIV e XV. Uma e outra
compartilhavam o caráter de um retorno às fontes originais: no primeiro
caso às realizações literárias e artísticas dos gregos e romanos; no
segundo, às Escrituras e às doutrinas... No entanto, apesar dessas
importantes semelhanças, seria errôneo considerar a Reforma como mero
aspecto religioso da Renascença” 43.

4.1 AS MUNDANÇAS PROMOVIDA PELA RENASCENÇA.

Nichols44 relata sobre este movimento como o “propulsor das mudanças que
se instalou entre os séculos XIV a XVI trouxe transformações profundas e muito
significativas em todas as áreas, um despertar da natureza humana muito intensa ao
qual somente um termo pode descrevê-lo: Renascimento”. Não se nega que os
fatos históricos provocaram mudanças geográficas, sociais e econômicas a exemplo
de Colombo e Cabral entre 1492 e 1500 fez o mundo ganhar novas medidas e seu
tamanho e formato ficou mais exato.
Copérnico desvendou um mistério de como Sistema Solar que abriu portas a
novas ideias a respeito do universo, mas algo acelera a difusão de tantas novidades:
o mecanismo gravador gráfico de Johannes Gutenberg que deu início a revolução
da impressa em 1450, sendo potencializadora da propagação de ideias. Nichols
Robert diz que “A mente humana foi assim mais despertada e fortalecida para
futuros empreendimentos, o maior dois quais veio a ser a reforma protestante. A
45
Reforma não ocorreria enquanto os livros tivessem que ser escritos à mão” . O
Autor ainda ressalta quando afirma que “Assim, todo o maravilhoso pensamento

42
Stern, 2011, p. 1332.
43
Burns, 1997, p. 376.
44
Nichols, 2004, p 149.
45
Nichols, 2004, p. 149.
15
clássico, da literatura e da arte, foi repentinamente descoberto. Diante dele, os
homens se deslumbraram e foram despertados para outros empreendimentos” 46.
Outras situações que muito contribuíram para concretização da Reforma
Protestante foram as inquietações sociais se aguçaram ainda mais no final do século
XV, podemos destacar conforme Robert Nichols47 os enumera como “opressão dos
senhores sobre os camponeses” que cultivavam suas terras, de onde se ocasionava
muitas revoltas e choques armados. Estes camponeses recebiam ajuda dos
operários pobres das cidades e de todos explorados e espoliados de seus direitos
pelo sistema entre as insatisfações o ódio feroz contra sacerdotes exploradores e a
indiferença dos mesmos em libertar as classes oprimidas.
Diante destes e muitos outros descontentamentos sociais havia o desejo de
uma nova ordem dentro da religião que atendesse os apelos cristãos o de justiça
social. Tais situações cada vez mais constantes desdobravam em rebeliões cada
vez mais desesperadas e preparavam de certa forma o “espírito” para uma
revolução religiosa assim como foi a Reforma Protestante. A Alemanha reunia
condições para ser o estopim da reforma, não possuía um governo forte que os
liderassem contra os interesses do papado, e por este motivo foi escolhida por Leão
X como campo mais promissor para a venda das indulgências, conforme declara
Burns48: “Ao raiar o séc. XVI, a Alemanha estava madura para a revolução religiosa”.
Segundo Croce49 “todos estes acontecimentos se fortaleceram através do
estudo do Novo Testamento e a expansão do pensamento Libertador” conforme
citado no Evangelho Segundo escreveu João (capítulo 8.32) “Vocês conhecerão a
50
Verdade e Verdade os libertará” . O povo vivia oprimido tanto pela religião quanto
pelos abastados. Ainda hoje, muitos países estas questões são percebidas e o
cerceamento a liberdade espiritual e intelectual é evidente, mas os direitos são
defendidos nos evangelhos (Colossenses 2.8): “Cuidem para que ninguém os cative
por meio de filosofias e enganos vãos, seguindo as tradições humanas...”.

5. LUTERO O HOMEM QUE DEUS USOU PARA TRAZER A LUZ À REFORMA.

46
Nichols, 2004, p. 150.
47
Nichols, 2004, p. 151.
48
Burns, 1997, p. 383.
49
Croce, 2017, p. 32.
50
Stern, 2011, p. 1332.
16
“Ao raiar o séc. XVI, a Alemanha estava madura para revolução religiosa.
51
Faltava apenas aparecer um líder... Não tardou a surgir esse homem” . Lutero
nascido em Eisleben, em 1483. De uma família de camponeses, seu pai logo após
se casar abandonou os campos para trabalhar nas minas de ferro de Mansfeld onde
alcançou uma relativa prosperidade e se tornou importante naquela vila integrando o
conselho do lugar. Martinho Lutero em sua infância viveu em um ambiente familiar
de piedade simples medieval, mesclada de superstições características da Idade
Média, recebeu uma educação primorosa sendo profundamente religioso, porém
sem exageros.
Aos 18 anos entrou na universidade uma das mais famosas da Alemanha a
de Erfurt para cumprir o desejo do pai e vê-lo formado em direito, cursou quatro
anos iniciais a carreira profissional, aprimorou-se em filosofia medieval, era muito
aplicado nos estudos, fluente orador e polemista, gostava de música e era muito
sociável. “Já estava para iniciar a sua vida profissional, quando, repentinamente,
para desapontamento do pai e dos amigos, tornou-se monge, entrando para o
Convento dos Agostinhos em Erfurt” 52.
No mosteiro, iniciou uma de suas grandes batalhas espirituais, a busca por
salvação que o havia feito entrar para vida monástica e agora não encontrara a
salvação, a paz e segurança de quem trilha o caminho de Deus. Dedicava-se em
extremo a vida de penitência como jejuns, vigílias, flagelações e constantemente
confessava-se para os mais leves delitos, até que o aconselharam a controlar sua
rigidez e confessa-se menos. Sua vida no mosteiro foi exemplo e sua piedade o fez
famoso.
De acordo com Croce53 , “além das obras importantes na formação de Lutero
como a de Bernardo de Claraval, ele era ardente leitor da Bíblia e em especial dos
assuntos relacionados ao seu ensino de teologia”. A leitura da Bíblia foi condição
sine qua non na vida de Lutero conforme: (Hebreus 4.12) “Porque a palavra de Deus
54
é viva e eficaz...” ao se expor às Sagradas Escrituras torna se apto a realização
da vontade de Deus. “Pois sei quais planos tenho em minha mente para vocês, diz
51
Burns, 1997, p. 383.
52
Nichols, 2004, p 156.
53
Croce, 2017, p. 38.
54
Soares, 1955, p. 1444.
17
Adonai, planos de bem-estar e não de coisas ruins; de modo que possam ter
55
esperança e futuro” .
56
Segundo Nichols antes de se tornar o conhecido como reformador, Lutero
teve uma vida muito dinâmica a partir de sua entrada na vida monástica em 1505;
1507 foi ordenado; 1508 foi para Wittenberg e 1509 para Erfurt; em 1511 viajou a
Roma a negócios de sua Ordem onde rezou em muitas igrejas, viu muitas relíquias
de santos e ouviu muitas histórias sobre seus poderes milagrosos. Empenhou-se
para livrar seu pai do purgatório, subiu de joelhos a Scala Sancta, escada que
diziam ter trazida da casa de Pilatos e ao subi-la rezavam em cada degrau o Pai
Nosso.
Nichols ainda diz sobre Lutero que ele “Ao Chegar ao topo, surgiu a
pergunta: Quem sabe se tudo isto é verdade? ”57. Se escandalizou com muitas coisa
que viu em Roma, mas manteve sua fé fervorosa na igreja, voltou a mosteiro em
1512 tornou-se doutor em teologia em Wittenberg, sobre este episódio confessou
mais tarde que naquele momento era ignorante a respeito do Evangelho. Afirma
Nichols58 no final de 1512 e 1513 enquanto lia a Epistola aos Romanos encontrou
estas palavras “O justo viverá por fé” e isto incendiou lhe a mente.
Havia chegado ao fim uma busca incessante pela verdade que: “a salvação
lhe pertencia simplesmente pela confiança, pela fé em Deus por meio de Jesus
Cristo, e não por qualquer obra que ele próprio realizasse” 59. Debruçou sobre outras
obras como de Agostinho, Anselmo, e especialmente nos Salmos e as epístolas de
Paulo, a partir daí passou afirmar cada vez mais fortemente e com mais clareza que:
60
“Deus salva os pecadores mediante a fé no seu amor revelado em Cristo” . Não
podemos fazer nada para nossa salvação, somente podemos agir a partir dela.
Esta grande verdade inspirou Lutero, segundo Nichols essa é a verdade se
resume em: “A confiança em Deus todo misericordioso, que se revelou em Jesus
Cristo, outorga aquela comunhão com Deus, aquele companheirismo, comparado
com o qual, tudo o mais significa” 61. Esta experiência trouxe paz interior, e o cabedal
adquirido lhe impulsionou para reformar a igreja cristã que estava romanizada e
55
Stern, 2011, p 639.
56
Nichols, 2004, p 157.
57
Nichols, 2004, p 157.
58
Nichols, 2004, p 157.
59
Nichols, 2004, p 157.
60
Nichols, 2004, p 157.
61
Nichols, 2004, p 157.
18
paganizada. Embora seguisse por mais alguns anos trabalhando em Wittenberg sem
romper com igreja papal.
Passou a pregar explicando e aplicando as verdades bíblicas à vida de seu
tempo, esse tipo de preleção atraiu muitos estudantes e outras pessoas, pregava
muito e com notável fervor e simplicidade sempre alertando que não era uma nova
verdade. Sua compreensão a respeito desta verdade o obriga posicionar em relação
a autoridade da igreja papal. “Poderia um homem carregar fogo dentro de sua veste
62
sem queimar suas roupas (Provérbios 6.27)” , sua pregação baseada nesta
verdade o coloca na contra mão da instituição papal.
Nas proximidades de Wittenberg apareceu um enviado do Arcebispo da
Mogúncia seu nome Tetzel, vendia as indulgências emitidas pelo papa e estas
ofereciam diminuição das penas no purgatório e o perdão dos pecados, muitas
pessoas eram atraídas pela oferta e forte propaganda de Tetzel sobre a utilidade
das mesmas. Lutero teve conhecimento da venda de indulgências nas proximidades
e se convenceu que estas estavam desviando o povo do verdadeiro ensino a
respeito de Deus e do pecado e enfraquecendo a vida moral do povo.
Lutero não queria afrontar a igreja papal em sua decisão de fixar 95 teses
na porta da Igreja de Wittenberg, pois este era o costume das universidades
medievais, com tal atitude convidavam-se os interessados a debaterem sobre o
assunto em pauta. “Em 31 de outubro de 1517, véspera do dia de todos os santos,
quando enorme multidão comparecia à igreja do Castelo, na cidade Wittenberg,
Lutero colocou às portas dessa igreja 95 teses que tratavam do caso das
63
indulgências” . Embora Lutero no momento não percebesse mais esta atitude foi
um golpe no coração da igreja papal.
Deus estava forjado um homem na fornalha da perseguição e de ameaças de
morte, um homem forte para realização de seu intento trazer a forma à sua Igreja
afirma Nichols: “Um pobre monge, sustentado unicamente por sua fé em Deus,
enfrentou sorridente o tremendo poder que era julgado pelos homens como sendo
autorizado e amparado por Deus, para abrir as portas eternas. Iniciou naquele dia
uma nova era na história humana” 64.

62
Stern, 2011, p. 964.
63
Nichols, 2004, p. 159.
64
Nichols, 2004, p. 160.
19
6. DEUS ATRAVÉS DO TEMPO.

“Deus controla o tempo, Deus está fora do tempo, Deus vê todo o tempo, o
tempo todo” 65.

“As intervenções diretas de Deus na História não são a mesma coisa que
em teologia Sistemática se conhece como vontade expressa. Ora, a
vontade expressa de Deus é aquela que é por Ele manifestada com clareza
de intenções, mas que ainda assim pode não se concretizar, em razão do
direito que Ele próprio outorga aos homens de arbitrarem sobre seu futuro:
A ideia de intervenção de Deus na História parte do princípio que a vontade
do Senhor não é somente manifestada, mas plenamente feita real por Ele,
não importa o que aconteça. São intervenções diretas de Deus na História
os eventos que, pelo curso previsível das relações humanas ou de
condições naturais, jamais alcançariam o desfecho obtido” 66.

Sendo assim, a Teologia da História consiste em analisar a historiografia


secular, produzida a qualquer tempo e sobre qualquer período, em relação o
gerenciamento de Deus sobre processo histórico, e concordamos serem: (boas,
perfeitas e agradáveis obras de Deus) 67
pois, segundo Gunnar Berg: “Assim, não
nos colocamos a sentenciar se boas ou ruins, pois são do Senhor. Entretanto a partir
de como elas se manifestam, alcançando entendimento sobre estar o Senhor
comandando ou tolerando os desfechos humanos” 68.
Nota-se assim que, na História da humanidade, todos os fatos e atos estão
sujeitos à vontade de Deus, Ele é o condutor da história do mundo sendo o autor e
criador. Sob este viés não se questiona a soberania de Deus, tão pouco cedemos ao
despotismo cósmico. Professamos total certeza de que as intervenções diretas,
indiretas e as permissivas ou expressas são resultado do Amor e Justiça de Deus.
Gunar Berg esclarece sobre as ações de Deus no contexto histórico.

“As intervenções divinas na História têm finalidade, propósito. A despeito


da aparente obviedade dessa afirmação, sua explanação demonstra que
razões interventoras do Divino não são caprichos cósmicos. Sempre
intervém na História, Deus está garantindo a execução de seu plano divino
através dos séculos” 69.

65
Andrade, Gunar Berg. Teologia da História. 1ª ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2011, p. 53.
66
Andrade, 2011, p. 55.
67
Soares, 1955, p. 1368.
68
Andrade, 2011, p. 53.
20
5.1 A HISTÓRIA.SOB O PRISMA TEOLÓGICO

Entende-se estar em oposição aos mais respeitados teóricos da História e as


suas metodologias, mas por força de nossa fé na Palavra de Deus, verifica-se na
Bíblia a resposta definitiva para as questões relacionadas a humanidade e a sua
História. Revela Gunar Berg que “... Deus controla História e a conhece, Ele a
programou perspectivamente, e a domina retrospectivamente, pois é o Pai do
tempo. Desta forma, não teríamos a história como mera reflexão, como propôs
Collingwood” 70.
Seguindo a explicação do autor, ele diz que “tampouco seria a História
modelo cientificista previsível de ações humanas. Muito menos seria ela um
pensamento cuja força se empresta às conclusões particulares e pessoais dos
historiadores, como Voltaire. A Teologia prevê que a História é contribuinte da
formação do caráter cristão, conforme orientou o Senhor tantas vezes” 71
. A teologia
também crê na linearidade da história. E ainda pode-se notar na citação de Soares:

“Para que seja um sinal entre vós; e quando no futuro vossos filhos vos
interrogarem dizendo: Que significam estas pedras? Vós lhes respondereis:
As águas do Jordão desapareceram diante da arca da aliança do Senhor,
enquanto ela atravessava; por isso puseram estas pedras como monumento
eterno dos filhos de Israel” 72.

E também esclarecida por Valdeci Santos: “... apenas teocêntrica, mas teo-
referente. Isto não significa que o fator humano seja “ignorado em algum sentido,
mas ele não é o ponto de partida” 73.

69
Andrade, Gunar Berg. Teologia da História. 1ª ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2011, p 54.
70
Andrade, 2011, p. 12.
71
Andrade, 2011, p. 12 e 13.
72
Soares, Padre Matos. Bíblia Sagrada Traduzida da Vulgata e Anotada: São Paulo: 9ªEd, Edições Paulinas,
1955 p. 242.
73
Santos, Valdeci da Silva. Fides Reformata volume I, n I: São Paulo: Edições Mackenzie, 1996, p. 164.
21
5.2 O PROPÓSITO DE DEUS É O CERNE DA REFORMA PROTESTANTE.

Depois da vinda de Cristo a Reforma Protestante e o fato histórico mais


importante e de total relevância. Segundo Croce “o mundo estava travado e
74
encavernado nas políticas e nos pensamentos medievais” . A Reforma protestante
foi o regate que Deus proporcionou a sua Igreja, e consequentemente redefiniu a
mentalidade do homem moderno ocidental e conforme assevera Croce: no “palco da
história, o protestantismo fez mais do que promover uma ruptura da cristandade:
exacerbou as noções de individualismo (reafirmou a autonomia do indivíduo frente à
autoridade eclesiástica e às instituições religiosas) e concedeu especial importância
a alfabetização” 75.
Dessa forma, pode-se observar que a Reforma Protestante possui vários
desdobramentos em vasta extensão e em todas as direções e áreas da vida
religiosa e secular. Os princípios reformados concordavam como princípio central de
“o sacerdócio de todos os crentes e a possibilidade de o pecador dirigir-se a Deus,
pessoalmente, sem intermediários exceto Jesus Cristo”. 76
Essa Reforma em sua
orientação fundamental e em seu princípio básico de Protestantismo Reformado era:
“o de que a vontade de Deus, revelada na Bíblia, devia ser realizada” 77.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Reforma protestante completa seus quinhentos anos sendo um dos fatos


mais importantes na era cristã, claro que depois do advento do Messias, analisá-lo
sob o prisma da Teologia da História nos dá grande satisfação de assinalar que a
História dos homens segundo Marc Bloch “é a ciência dos homens, dos homens de

74
Croce, José Elias. 500 anos da Reforma Protestante, Rio de Janeiro: Betel, 2017, p. 49.
75
Croce, José Elias. 500 anos da Reforma Protestante, Rio de Janeiro: Betel, 2017, p. 50.
76
Nichols, Robert Hastings. História da Igreja. 12ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p 183.
77
Nichols, Robert Hastings. História da Igreja. 12ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p 184.
22
seu tempo!” 78
. Embora sejam eles (os homens) que a escrevam, pesquisem,
formulem as hipóteses, delimitam seus objetos de pesquisa sabendo serem os
elementos mais importantes para História o tempo e os homens a serem estudados
revelam a dependência dos homens de Deus.
Por motivos divinos onde não é possível entender como se processa na
História o livre arbítrio do homem e vontade soberana de Deus, simplesmente
sabemos que Deus domina a História, pois é Senhor do tempo, dos homens e nada
lhe foge do controle. Os acontecimentos escatológicos tem uma razão de existir,
determinam um tempo quando tudo finda. A desconstrução da História é um recurso
útil na tentativa produzir novas interpretações, mas partindo dos relatos bíblicos que
não se baseiam em mitos, mas em verdade e as narrativas bíblicas que não se
incluem entre os contos épicos de um povo.
Dessa forma, vê-se um relacionamento entre Deus e o Homem, este foi
abortado pelo pecado, contudo, restaurado por Jesus Cristo e permanece através de
sua Igreja. Deus restaurou a liberdade para que sua Igreja que é etnicamente
neutra, regenerada, universal, espiritualmente e igual, este corpo, foi eleito por Deus
desde a eternidade; seu ministério distinto, a Reforma Protestante baseou-se em
princípios fundamentais: Sola Scriptura, Sola Gratia; Sola Fide, Solus Christus e Soli
Deo Gloria. O que chamamos de Reforma, na realidade foi um reavivamento
espiritual na história da Igreja, como um todo.

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MODERNAS ÁS SOCIEDADES ATUAIS. – 26 ed., Rio de Janeiro: Editora ao Livro
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OU OFÍCIO DO HISTORIADOR. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.

BOYER, Orlando S. HEROÍS DA FÉ. – 2 ed., Rio de Janeiro: CPAD, 1985.

78
Bloch, Marc Léopold Benjamim. Apologia da História ou Ofício do Historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
editor, 2001, p 55.
23
BURNS, Edward McNall, LERNER, Robert E. e MEACHAM, Standish. HISTÓRIA
DA CIVILIZAÇÃO OCIDENTAL DO HOMEM DAS CAVERNAS ÀS NAVES
ESPACIAIS. - 38 ed., São Paulo: Editora Globo, 1980.

CROCE, José Elias. 500 ANOS DA REFORMA PROTESTANTE E SUAS LIÇÕES


PARA IGREJA ATUAL. Rio de Janeiro: Betel. 2017.

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DREHER, Martin N., KAYSER, Ilson, MOLZ, Claudio e SANDER, Luis M.


MARTINHO LUTERO: OBRAS SELECIONADAS VOLUME 2 O PROGRAMA DA
REFORMA ESCRITOS DE 1520, São Leopoldo e Porto Alegre: Editora Sinodal e
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SOARES, Pe. Soares. BÍBLIA SAGRADA TRADUZIDA DA VULGATA E


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HADASHAH [NT]. São Paulo, 2010.

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